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GOVERNANÇA CORPORATIVA E COMPLIANCE PROF. ME. LUCIANO FERREIRA Presidente da Mantenedora Ricardo Benedito Oliveira Reitor: Dr. Roberto Cezar de Oliveira Pró-Reitoria Acadêmica Gisele Colombari Gomes Diretora de Ensino Prof.a Dra. Gisele Caroline Novakowski PRODUÇÃO DE MATERIAIS Diagramação: Alan Michel Bariani Edson Dias Vieira Thiago Bruno Peraro Revisão Textual: Camila Cristiane Moreschi Danielly de Oliveira Nascimento Fernando Sachetti Bomfim Luana Luciano de Oliveira Patrícia Garcia Costa Produção Audiovisual: Adriano Vieira Marques Márcio Alexandre Júnior Lara Osmar da Conceição Calisto Gestão de Produção: Cristiane Alves© Direitos reservados à UNINGÁ - Reprodução Proibida. - Rodovia PR 317 (Av. Morangueira), n° 6114 33WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 01 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................4 1 O OBJETIVO DAS CORPORAÇÕES ............................................................................................................................5 2 O DESENVOLVIMENTO DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ...................................................................................8 3 OS MÚLTIPLOS INTERESSES ................................................................................................................................. 11 4 CONCEITOS DE GOVERNANÇA CORPORATIVA E COMPLIANCE ........................................................................ 13 5 OS MARCOS HISTÓRICOS ...................................................................................................................................... 17 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................................... 19 ORIGEM E IMPORTÂNCIA ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: GOVERNANÇA CORPORATIVA E COMPLIANCE 4WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO Prezado(a) estudante, as organizações existem sob uma premissa de tempo de vida indeterminado, ou seja, depois que nascem não tem uma data específica para deixar de desenvolver suas atividades, logo não tem data para “morrer”. Nessa linha de pensamento, a maior missão de um gestor é fazer com que sua organização exista o máximo de tempo possível e possa continuar existindo com sucesso e de forma sustentável, mesmo após a sua saída. Uma das formas de auxiliar as organizações na busca desse sucesso sustentável e ampliação de sua existência está ligada a implementação das práticas de Governança Corporativa. Nesta unidade iremos compreender o objetivo das corporações e quais os principais grupos de interesse que as envolvem. Esses grupos, em geral, dão a tônica dos modelos de gestão e vão gerar as tensões para que possam atingir êxito, legitimando seus diferentes interesses. Compreenderemos também, que o desenvolvimento da Governança Corporativa foi capitaneado pelos chamados conflitos de agência, que ocorrem quando interesses pessoais de um gestor se tornam conflitantes aos interesses da organização. Conheceremos como o equilíbrio de múltiplos interesses dentro das organizações permitiu que as políticas de Governança Corporativa se tornassem ainda mais relevantes e, em sequência, tal conhecimento nos permitirá discutir os conceitos de Governança Corporativa e de Compliance, bem como a relação entre eles. Encerraremos essa Unidade com um resgate histórico, em ordem cronológica, de quatro momentos que alicerçaram o desenvolvimento dos conceitos de Governança, desde uma movimentação individual e voluntária de um ativista até o momento em que a estrutura formal do Estado transforma as chamadas boas práticas em ações regulatórias. Vamos começar! 5WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1 O OBJETIVO DAS CORPORAÇÕES Quando nos referimos às corporações devemos compreender que o seu conceito nos remete ao sinônimo de instituições, sociedades ou companhias. São grandes empresas que possuem um controle pulverizado, ou seja, não existe um acionista controlador e o percentual de ações que estão em livre circulação em bolsa de valores, para qualquer investidor interessado, é geralmente superior a 50%. Figura 1 - As grandes corporações. Fonte: Abel (2009). As corporações estão ligadas primordialmente a um modelo econômico capitalista alinhado em ideais ligados ao espírito de empreender, na busca racional e sistemática pelo lucro e na concentração da propriedade do capital. Historicamente, o desenvolvimento do modelo capitalista é parte integrante da evolução do mundo corporativo, bem como do desenvolvimento da ciência da administração. Uma característica marcante das corporações é, na medida da dispersão acionária, a gestão sendo realizada por um profissional de mercado contratado especificamente para isso, numa clara despersonalização da propriedade “quem comanda” não é “o dono”. Sendo, portanto, o palco principal da ascensão dos gestores não proprietários com o usufruto do poder. Assim sendo, fica claro que essas organizações constituídas por indivíduos investidores que subscreveram e integralizaram recursos e que claramente aceitaram e assumiram uma quantidade razoável de riscos desejam o máximo de retorno de seus investimentos. E fica ainda mais claro o entendimento de que se houver retorno aceitável haverá mais investimentos ou o contrário: retorno abaixo das expectativas ou inexistente potencializa a cessão do fluxo de recursos. Figura 2 - Resultados potencializando investimentos. Fonte: O autor. 6WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Nas duas últimas décadas do século XX, contudo, observou-se um ajuste entre as relações do chamado mundo corporativo e a sociedade. Iniciou-se um processo que �exigiu� que as empresas se preocupassem mais com demandas da sociedade, assumindo um papel que, originalmente, não era seu e gerando uma pressão nos investidores. Essa pressão elevou os riscos inerentes ao negócio, uma vez que as demandas das sociedades eram intensificadas pelos chamados stakeholders, indivíduos que são impactados pela empresa, e o atendimento destas demandas invariavelmente ocasiona uma redução de resultado operacional, afetando a remuneração dos investidores. SHAREHOLDERS (Proprietários, investidores) Acionistas ou cotistas Majoritários ou minoritários Ativos ou outorgantes Integrantes ou não de blocos de controle Com ou sem direito a voto INTERNOS (Efetivamente envolvidos com a geração e o monitoramento de resultados) Diretores Conselheiros Colaboradores EXTERNOS (Integrados à cadeia de negócios) Credores Fornecedores diretos e indiretos Clientes ENTORNO Comunidades locais (vizinhos) Sociedade em geral Governos ONGs Quadro 1 - Quem são os stakeholders? Fonte: Rossetti e Andrade (2019). Os stakeholders podem ser agrupados em quatro grupos: Os shareholders são de maneira geral os investidores, acionistas ou cotistas. Eles são responsáveis pelos investimentos que possibilitam o desenvolvimento de novos projetos dentro das organizações. São chamados cotistas em organizações de capital fechado e acionistas ou investidores em organizações de capital aberto. Dependendo do percentual de cotas (ou ações) que possuam, classificam-se em majoritários ou minoritários. Esse mesmo percentual ainda pode colocá-los na posição de integrantes de um bloco de controle ou não, determinante em momentos de votação. Podem ser ativos, participando de votação, ou outorgar esse direito a um terceiro e, ainda, podem possuir uma participação que prioriza o pagamento de dividendos em detrimento ao direito de voto ou que garante o direito a voto, mas deixa o pagamento de dividendos em segundo plano. 7WWW.UNINGA.BR GO VE RN ANÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Os stakeholders internos fazem parte da companhia, trabalhando nas atividades corriqueiras e correlatas da empresa. Os externos participam do dia a dia da empresa na figura de fornecedores de matérias-primas e insumos diversos ou como agentes de financiamento como bancos, por exemplo, ou como clientes, consumidores e usuários dos produtos ou serviços oferecidos. Os demais que estão no entorno podem ser os vizinhos e comunidades que recebem algum tipo de impacto relacionado às operações da empresa, bem como sociedade em geral que mesmo não estando tão próxima é impactada de alguma forma, também os governos nas três esferas (municipal, estadual e federal) e as organizações não governamentais (ONGs) e seus ativistas. Se em um primeiro momento a razão da existência das corporações era justificado e focado apenas no atendimento aos interesses dos shareholders, por meio da maximização do pagamento de dividendos e de ganhos de capital, agora, para os stakeholders o interesse, naturalmente diferentes, exigiram adaptações. Para os stakeholders internos, temos: • Gestores (CEO, CFO etc.): Remuneração que reflete a importância, responsabilidades, riscos e resultados inerentes aos cargos. • Conselhos de administração: Remuneração condizente a dedicação oferecida e proteção aos investidores. • Colaboradores: Remuneração adequada, participação em resultados, reconhecimento, plano de carreira, desenvolvimento pessoal, segurança. No caso dos stakeholders externos, temos: • Credores: Resultados operacionais que mantêm a capacidade de pagamento de dívidas, inclusive, permitem a contratação de novas dívidas. • Fornecedores: Regularidade na aquisição de insumos e serviços, capacidade de desenvolvimento de novos produtos ou serviços que permitam a formação de parcerias estratégicas, oferta de produtos ou serviços que agreguem valor aos insumos fornecidos. • Clientes: Regularidade no fornecimento de produtos ou serviços de qualidade com valor agregado, seguros e com preços economicamente viáveis. Para saber mais detalhes sobre governança corporativa e sua implantação dentro de uma grande empresa brasileira, assista o vídeo da PETROBRÁS. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=N-F8dYJOnJk. https://www.youtube.com/watch?v=N-F8dYJOnJk 8WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Já para os stakeholders do entorno: • Vizinhos e comunidades locais: Operações de baixo impacto, geração de empregos e renda. • Sociedade em geral: Ações de responsabilidade social, geração de renda e desenvolvimento. • Governos: Geração de empregos diretos e indiretos, legalidade operacional e pagamento de tributos e taxas. • ONG ‘s: Ações de responsabilidade social, proteção ambiental, proteção e desenvolvimento de grupos minoritários ou de interesse social. É importante relembrar que as relações entre as empresas e os stakeholders tenham se conformado, a partir dos anos 1980, com o aumento das pressões para o atendimento de interesses, a tendência parece ser a de reconhecer que a linha focada no interesse dos proprietários é mais robusta, tanto do ponto de vista conceitual quanto da percepção empírica de seus resultados, embora não se exclua outros interesses em jogo. 2 O DESENVOLVIMENTO DA GOVERNANÇA CORPORATIVA O crescimento das corporações está diretamente condicionado à dispersão do capital de controle das companhias. Isso foi facilmente observado em: • Processos de abertura de capital de empresas (IPO); • Processos sucessórios em empresas de constituição familiar; • Aumento nos números de investidores em bolsas de valores; • Fusão de empresas. A abertura de capital por parte da empresa que, até então, funcionava com capital fechado e com número conhecido de cotistas cresceu à medida que a alavancagem financeira obtida nesta modalidade era mais econômica do que a oriunda de contratos de empréstimos originários de instituições financeiras e de fomento. Os processos sucessórios em empresas familiares muitas vezes são potencializados pelo desejo de alguns membros de não mais participarem daquela atividade e da dificuldade da aquisição de participação pelo outro lado. Então, a vinda de novos sócios facilita a adoção de novos modelos e práticas de gestão. O aumento de interessados em investir em bolsas de valores adiciona mais pressão para que existam mais oferta de novos papéis. Essa pressão é atendida, além dos IPOs, com a fusão de empresas que, em muitos casos, geram o lançamento e oferta de novos papéis. Essa dispersão de capital promove, naturalmente, um “divórcio” entre a propriedade e o controle. As grandes companhias, organizadas como sociedades anônimas, não estão nas mãos dos proprietários de ações. A maior parte delas, a administração está, em tese, desligada da propriedade. Os gestores executivos são os que passam a ser os “donos” do negócio. Nem sempre são escolhidos pelos acionistas, tal a dispersão desses, e não são levados a seguir quaisquer instruções apresentadas pelos proprietários das ações. Segundo Rossetti e Andrade (2019) a dispersão do capital acionário resultou, assim, na constituição de duas novas categorias sociais: os proprietários passivos e os não proprietários usufrutuários. 9WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Portanto, reféns da condição de proprietários passivos, os acionistas passaram a ter, basicamente: I. Interesse em parte do lucro líquido na forma de dividendos II. Valorização das ações Isso ocasionou o desenvolvimento de dois grupos, com interesses distintos: o grupo de acionistas que não dispõem do controle e o grupo dos gestores que não dispõem de propriedade. Sem um efetivo controle, se um acionista não concorda com os rumos da companhia resta, apenas, a sua saída do negócio por meio da venda de suas ações. Quando este acionista tinha o controle da companhia, podia direcioná-la em função dos próprios interesses. Por outro lado, os gestores podem desenvolver um comportamento de maximizar os seus usufrutos pessoais, como: remuneração base, bonificação sobre os resultados e outros benefícios indiretos, idênticos aos que as empresas proporcionam aos seus fundadores, que acumulavam os papéis de proprietários e gestores. Além disso, os gestores poderiam se apropriar de indicadores visíveis de prestígio e poder, antagônicos aos objetivos de maximização dos lucros e do valor da companhia. Essa situação entre acionistas e gestores é conhecida como conflito de agência. Isso será mais bem detalhado na Unidade 2. Esse conflito é a razão fundamental do desenvolvimento da governança corporativa, mas não a única. Somaram-se a ela: • Abuso do poder de acionistas majoritários • Baixa participação de acionistas minoritários • Baixa transparência • Inconformidade estatutárias • Extrapolação de autonomia dos gestores • Conselheiros com baixa competência e mandatos vitalícios • Conflitos de interesse de acionistas • Manipulações contábeis • Diretrizes sem consenso Empresas vivem momentos de intensa adaptação às novas condições que se estabelecem nos mercados, inclusive, por mudanças culturais. É preciso se preparar! “Nestes próximos anos a única constante nas empresas será o fator mudança” (WATERMAN JR., 1989). 10WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Além destas razões históricas que propiciaram o “nascimento” da governança corporativa, somaram-se outras forças externas e internas, conduzindo a governança corporativa a uma posição de alta relevância entre as práticas de gestão, sendo: Razões internas da companhia: 1. Mudanças societárias 2. Realinhamento estratégicos 3. Reordenamentos organizacionais As mudanças societárias podem ser causadas por reestruturações societárias,reflexos de aquisições, fusões ou até mesmo cisões e de associações e controle consorciado. Por alianças estratégicas ou, em alguns casos, privatizações. Outro ponto de mudanças societárias nasce nos processos sucessórios com mudanças no controle acionário, em acordos de acionistas que proporcionam a formação de blocos de controle e em empresas, familiares ou não, que passaram da primeira geração de gestores. Os realinhamentos estratégicos acontecem com o fortalecimento dos conselhos de administração que passam a direcionar e monitorar o planejamento estratégico da companhia e um maior monitoramento aos riscos intrínsecos ao negócio. Acontecem, também, como respostas a mudanças no ambiente de negócios. Já os reordenamentos organizacionais acontecem quando a companhia decide pela profissionalização da gestão, pela reformulação do conselho de administração, em busca da meritocracia, na adoção de metodologias de prevenção de fraudes e separação entre investidores, gestores e conselheiros. Por outro lado, nas razões externas, é a companhia o determinante para o desenvolvimento da governança corporativa: 1. Mudanças no macroambiente. 2. Mudanças no ambiente de negócios. 3. Revisões institucionais. As mudanças no macroambiente são percebidas com o surgimento de novos concorrentes (diretos ou indiretos), com a privatização de empresas estatais ou a venda de participação acionária do Estado e a abertura de mercados por meio de acordos, blocos ou mercados comuns, quebra de barreiras, etc. No que se refere às mudanças no ambiente de negócios observamos a crescente complexidade de cenários nas novas arquiteturas de poder e em reestruturações setoriais. E as revisões institucionais incluem os temas ligados à regulação legal, ao desenvolvimento de práticas de governança corporativa, em estratégias mais ativas por parte de investidores institucionais e na reação dos mercados aos escândalos corporativos. A partir daí fica claro: governança corporativa não é apenas mais um modismo dentre outros modelos de gestão. 11WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3 OS MÚLTIPLOS INTERESSES A priori, o interesse básico e principal que precisa ser atendido por uma companhia está relacionado ao retorno oferecido aos acionistas. Em que, se pese o máximo retorno possível. Em contraponto, temos os objetivos corporativos apoiados no conceito-base do Triple Bottom Line. Isso não questiona, não recusa e não deslegitima o retorno dos investidores, mas pondera que as companhias também acumulariam ganhos se atuarem com olhos voltados para questões do Triple Bottom Line e podem sofrer em perdas e riscos se desconsiderar essas questões. O Triple Bottom Line vem de um conceito que prega a gestão empresarial com foco no impacto causado pela empresa no planeta, além dos resultados econômico-financeiros. Figura 3 - Triple Bottom Line. Fonte: Etzkowitz (2008). A sustentabilidade tem relação direta com as práticas de consumo e a relação com marcas. É na atividade das empresas que as principais mudanças podem e devem ser implementadas pela proposta Triple Bottom Line. Esse tripé é formado pelas perspectivas do planeta, das pessoas e do lucro, ou seja, uma empresa deve ser conduzida visando o resultado econômico, os impactos ambientais e a relação com seus stakeholders. É compreensível, então, notar que a sustentabilidade é algo muito maior do que simplesmente a preservação de recursos naturais do planeta. Já na década de 1960 o questionamento da maximização da riqueza dos investidores como objetivo único das companhias, desconsiderando-se radicalmente outros interesses, foi antecipado. As proposições na linha da responsabilidade corporativa fundamentam-se em um conjunto de considerações fundamentais: Figura 4 - Responsabilidade corporativa. Fonte: Rossetti e Andrade (2019). 12WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A cada dia aumentam as cobranças vindas de ativistas sociais, ativistas ambientais e do próprio mercado de capitais em relação às políticas adotadas pelas organizações a ponto de, inclusive, apresentar respostas a essas questões juntamente com demonstrações contábeis e de resultados, fazendo parte do rol de itens analisados pelos possíveis futuros e atuais investidores. A extensão da teoria da agência é um contraponto no qual toda a sociedade, incluídos fornecedores, clientes, colaboradores e outras partes interessadas, confiam nas ações desenvolvidas pelos gestores e estas atitudes impedem o desenvolvimento de comportamentos oportunistas. Logo, na gestão dos relacionamentos pressupõem-se que os gestores adotem políticas que satisfaçam todos os grupos que se relacionam com a companhia, objetivando a obtenção de sucesso – em longo prazo – por parte da companhia e que esse sucesso reflita em retorno aos acionistas. A longo prazo os resultados corporativos podem ser comprometidos se os gestores desconsiderarem os interesses dos stakeholders, adotando uma postura radical em relação a esse grupo, considerando-os apenas como elementos de obtenção de resultado, sem a devida preocupação e percepção de que os stakeholders também têm resultados a serem maximizados e corre-se o risco real de inviabilizar o sucesso nas operações da empresa. Logicamente que, dito tudo isso, alguns poderiam levantar questionamentos em relação à legitimidade dos interesses dos stakeholders, como também questionar a legitimidade dos interesses dos shareholders. No caso dos investidores é importante lembrar que a geração de riqueza nacional está fortemente ligada à disposição desses em assumir a postura de empreender, colocando em risco seu próprio capital. De certo modo, quando um investidor obtém sucesso nos negócios acaba por estimular outros investidores a fazerem o mesmo – assumirem riscos – para que no desenrolar do processo conquistem o retorno esperado e auxiliem na movimentação da estrutura econômica em que está inserido. Diferentemente das relações que as empresas têm com seus colaboradores, fornecedores ou clientes, que são regidas por contratos específicos, a relação com os proprietários não tem a mesma forma de proteção. Quando um investidor se torna sócio de uma empresa por meio de aquisição de cotas ou de ações só terá acesso novamente a esse capital se outro investidor, em algum momento, se interessar na aquisição. Já na perspectiva dos interesses dos stakeholders um ponto é muito claro: sem eles a empresa não existiria. Eles têm seus próprios objetivos, almejam seus próprios fins e objetivam também a maximização de seus retornos. Segundo Rossetti e Andrade (2019, p.124): Deste ponto de vista, o lucro não é a única categoria de retorno maximizável. Os salários e outros benefícios materiais e imateriais aos empregados são também formas de retorno de uma outra categoria de riqueza indispensável às companhias – o capital humano. Obviamente, de um lado, a aceitação desse conceito não implica que as companhias devam também focar no máximo retorno dessa categoria de capital, até porque seus detentores têm liberdade para buscá-lo onde possa ser otimizado – assim como a tem qualquer um dos demais stakeholders. De outro lado, a gestão moralmente consciente tratará de conciliar as demandas dos proprietários com as de outros grupos, até porque sem esses as empresas deixariam de existir (ROSSETTI; ANDRADE, 2019, p.124). Podemos, então, observar que tanto os interesses dos investidores quanto os interesses dos que são impactados pelo negócio são, sim, importantes e precisam ser considerados. Faz- se necessário analisar essas estratégias: empresas orientadas para os shareholders ou empresas orientadas para os stakeholders? Quais suas principais qualificações diferenciadoras? 13WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA QUALIFICAÇÕESORIENTAÇÃO PARA SHAREHOLDERS. STAKEHOLDERS. Países que enfatizam a abordagem: Inglaterra EUA Canadá Alemanha Japão Objetivo corporativo: Máximo retorno total do capital investido. Conciliação de conjunto ampliado de interesses. Indicadores de desempenho: Demonstrações patrimoniais e financeiras. Conjunto ampliado de indicadores de desempenho. Estruturas de governança corporativa: Representam os proprietários. Foco em oportunidades de crescimento e em riscos corporativos. Representam os proprietários e outros stakeholders. Quadro 2 - Comparando abordagens. Fonte: O autor. Devemos concluir que os shareholders e demais stakeholders têm, ambos, interesses legítimos. A legitimidade dos shareholders está no valor para a sociedade como um todo, desde de o espírito de empreendimento, de iniciativa, de inovação e de geração de riquezas, tendo o retorno sobre os investimentos condição sine qua non para a sua continuidade. Os stakeholders legitimam- se por serem grupos sem os quais as empresas deixariam de existir e pelo seu compromisso com a sobrevivência, o crescimento e continuidade das empresas. 4 CONCEITOS DE GOVERNANÇA CORPORATIVA E COMPLIANCE O que consideramos como governança corporativa se relaciona a um conjunto de práticas de negócio, alicerçadas sobre princípios comuns que foram desenvolvidas em todo o mundo a partir do final dos anos 1980. A discussão sobre o tema se inicia, portanto, a partir dos sólidos princípios que desde o início nortearam o movimento em prol da boa gestão. Na visão do IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – os princípios da governança geram valor e resultados a longo prazo. A definição do instituto é que a governança corporativa representa um sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre investidores, conselho de administração, gestores, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. Existe um conjunto de diversidades que cerca as questões relacionadas à governança corporativa: 1. Dimensões das empresas; 2. Estruturas de propriedade; 3. Fontes de financiamento predominantes (internas ou externas); 4. Tipologia dos conflitos de agência e harmonização dos interesses em jogo; 14WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 5. Tipologia das empresas quanto ao regime legal; 6. Tipologia das empresas quanto à origem dos grupos controladores; 7. Ascendência das empresas, que se modifica por fusões e aquisições; 8. Abrangência geográfica de atuação das empresas; 9. Traços culturais das nações em que as empresas operam; e 10. Instituições legais e marcos regulatórios estabelecidos nas diferentes partes do mundo. É óbvio, então, que por meio de uma diversidade de conceitos conseguimos reconhecer uma série de definições cujo tema pode ter todas corretas, mas com olhares ou focos diferentes. Se considerarmos a governança corporativa como a guardiã de direitos das partes com interesses em jogos nas empresas, é possível considerá-la como um sistema no qual corporações de negócio são dirigidas e controladas. A estrutura da governança corporativa especifica a distribuição dos direitos e responsabilidades entre os diferentes participantes da corporação, tais como: o conselho de administração, os diretores executivos, os acionistas e outros interessados, além de definir as regras e procedimentos para a tomada de decisão em relação às questões corporativas. E oferece também bases pelas quais os objetivos da empresa são estabelecidos, definindo os meios para se alcançarem tais objetivos e os instrumentos para se acompanhar o desempenho. A governança corporativa vem da busca pela transparência e responsabilidade que as empresas têm em questões que se relacionam com o negócio em si, estabelecendo processos e metodologias que ajustem os interesses entre os que são donos, mas não comandam e os que comandam sem possuir propriedade. Nessa mesma medida, a governança vem como um modelo de regulamentos que objetivam assegurar o direito dos acionistas majoritários ou minoritários, promovendo a relação entre eles e possibilitando o desenvolvimento de estratégias que lhes permitam acompanhar as atividades desempenhadas pelos gestores. Se a governança corporativa for definida sob a ótica de um sistema de relações, percebe- se que é um modelo de boas práticas que busca um aumento de valor da sociedade, facilitando seu acesso a capital e contribuindo para sua perenidade. Isso acontece com a interação entre todos os atores principais: investidores, gestores, conselheiros e auditores. Assim, a governança corporativa numa estrutura de poder envolve questões relacionadas aos processos de tomada de decisões, o que é, fundamentalmente, uma atividade comum de liderança demonstrando, inclusive, as eventuais assimetrias que cercam essas relações. Por fim, quando se observa a governança como um sistema normativo podemos considerá- la como um mecanismo, definido legalmente, condutor da gestão eficaz dos negócios norteado por estatutos, contratos e estruturas organizacionais. Resumidamente a governança corporativa é conceituada por expressões-chave, como: valores, direitos, relações, governo, poder e normas. Valores implica no sistema que rege as organizações em suas relações internas e externas. Os direitos implicam em um sistema de gestão que objetiva preservar e maximizar o retorno dos acionistas a longo prazo, defendendo o interesse dos acionistas minoritários e de outros interessados. As relações se enquadram nas práticas de relacionamento entre gestores, acionistas e conselheiros em um objetivo mútuo de maximização de resultados. O sistema de governo implica no controle e disciplina das relações da empresa com todas as partes interessadas no negócio. As estruturas e sistemas de poder envolvem as estratégias, as operações, a criação de valor e a destinação de resultados. As normas são os instrumentos empregados para obtenção da excelência da gestão em conjunto com a preservação do direito dos stakeholders. 15WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Tudo isso faz com que se compreenda um conjunto de estruturas e metodologias que visam atender os propósitos dos investidores, proteger as propriedades das empresas, implementar sistemas de controle e fiscalização dos gestores, normatizar as relações entre investidores, conselheiros e gestores, maximizar o retorno dos investidores, eliminar comportamentos oportunistas dos gestores, e, implementar transparência e publicidade as prestações de contas, Isso pode ser sintetizado nos quatro valores que dão sustentação aos conceitos de governança corporativa, sendo: • Fairness: é o senso de justiça. Visa o respeito aos direitos dos acionistas minoritários, buscando equidade entre todos os acionistas, seja na valorização da empresa, na divisão de resultados ou no direito a voto. • Disclosure: transparência e publicidade das informações que impactam o negócio e que envolvem riscos, resultados e oportunidades. • Accountability: prestação de contas regular e responsável, em padrões reconhecidamente aceitos, com chancela de auditorias. • Compliance: cumprimento de normas, regulamentos e leis nacionais e, em alguns casos, internacionais. Outra forma de compreender melhor os conceitos de governança corporativa é a metodologia desenvolvida por Rossetti e Andrade (2019, p. 143) que ficou conhecida como 8Ps, e que sintetiza o processo de governança em qualquer tipo de empresa. São eles: ➢ Propriedade, ➢ Princípios, ➢ Propósitos, ➢ Poder, ➢ Papéis, ➢ Práticas, ➢ Pessoas e ➢ Perpetuidade. Propriedade: A proliferação de sociedades anônimas de capital aberto, em que os proprietários não têm visibilidade e mudam a cada dia pelas negociações em bolsa, logo, a governança busca a remoçãode conflitos e de custos envolvendo gestores e acionistas. Princípios: Os princípios são a base ética da governança e têm como atributo essencial a universalidade, embora ajustes que levem em consideração as diferenças na cultura, nas instituições e nos marcos regulatórios que se observam entre os países são aceitáveis. Propósitos: O propósito fundamental da governança corporativa é o de contribuir para o máximo retorno total de longo prazo dos shareholders e harmonizável com os interesses também legítimos de outros stakeholders. Papéis: Os atores do processo de governança – investidores, conselheiros e gestores – têm papéis distintos no interior das companhias, independentemente de sua constituição legal, dos graus de concentração e da tipologia da propriedade. 16WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Poder: O poder efetivamente assumido pela tecnoestrutura organizacional e pelos gestores, resultante da dispersão e da passividade dos proprietários é, em princípio, fonte de conflitos e de disfunções. Práticas: Começam pela constituição e pelo empowerment dos conselhos de administração, da direção executiva e do sistema de auditoria, que são os órgãos-chave da governança. Pessoas: Quaisquer que sejam as dimensões das empresas, o seu regime estatutário e as estruturas societárias, as pessoas são, em síntese, o elemento-chave dos sistemas de governança. Perpetuidade: O objetivo último das organizações, salvo em casos excepcionais, é se manterem vivas, atuantes e com participação crescente em seus setores de atividade. Figura 5 - A amarração dos quatro valores fundamentais da governança corporativa. Fonte: Rossetti e Andrade (2019). Alinhado com tudo isso e remetendo aos quatro valores que dão sustentação a governança corporativa, vale um registro um pouco mais detalhado sobre o compliance, antecipando uma pequena parte do que abordaremos na Unidade 4. Compliance é o dever de estar em conformidade com todos os atos, normas e leis. É uma expressão aparentemente complicada, mas que representa algo muito simples. Trata-se da conformidade da organização a normas externas e internas, tais como leis, regulamentações e políticas corporativas. É um sistema de controles internos que permite detectar, esclarecer, monitorar e proporcionar maior segurança àqueles que, dentro da empresa exercem ou não atividades de gestão, se utilizam da contabilidade e relatórios financeiros para análise e tomadas de decisão, estão ligados e se relacionam com outros colaboradores e outros stakeholders. Ganhou relevância no início dos anos 2000 nos EUA, com o desenvolvimento de uma legislação específica sobre governança corporativa, em um momento posterior a alguns escândalos corporativos em grandes corporações. No Brasil o compliance se tornou mais evidente em 2013 com a aprovação da Lei 12846, que responsabilizou objetivamente as empresas por atividades ilícitas mesmo que tenham ocorrido sem a intenção ou conhecimento de seus gestores. 17WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 5 OS MARCOS HISTÓRICOS Os marcos históricos da governança corporativa são quatro: 1. O ativismo de Robert Monks. 2. O Relatório Cadbury. 3. Os Princípios da OCDE. 4. A Lei Sarbanes-Oxley Esses marcos são complementares e aconteceram a partir de problemas facilmente identificáveis e influenciaram e buscam influenciar os modos de governança. Robert Monks foi um ativista que mudou o curso da governança corporativa nos EUA. Ergueu sua voz para a proteção dos direitos dos acionistas, em especial para o pleno exercício do direito de voto. A obra recomendada é: Governança Corporativa na Prática de Djalma, de Pinho Rebouças de Oliveira. Apresenta, de forma estruturada, a explicação detalhada de “como” as empresas podem desenvolver e consolidar otimizadas governanças corporativas sustentadas por adequados conselhos de administração, os quais representam o foco central das decisões das empresas que têm esses modernos modelos de gestão. Os Conselhos de Administração das empresas e, consequentemente, os conselheiros têm um novo contexto de responsabilidades nas empresas e na economia brasileira. A maior interação com os acionistas ou quotistas das empresas também é de elevada importância para os resultados das empresas, pois essa situação proporciona, de forma natural, maior atratividade das empresas no mercado. Robert Monks participou do filme chamado The Corporation, um documentário canadense de 2003. O filme se desenrola a partir de uma polêmica decisão da Suprema Corte de Justiça americana concluindo que uma corporação, aos olhos da lei, é uma “pessoa”, e assim, são analisados os poderes das grandes corporações no mundo atual, a exploração da mão-de-obra barata no Terceiro Mundo e a devastação do meio ambiente também são alguns dos fatos explorados. 18WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Centrado em dois valores da governança corporativa, fairness e compliance, Monks foi um dos primeiros a evidenciar a importância da boa governança para a prosperidade da sociedade como um todo. Os principais pontos apresentados por Monks foram: o distanciamento entre proprietários e gestores cujos interesses dos proprietários não eram considerados, na busca pelo efetivo envolvimento desses proprietários nas atividades das empresas, na aproximação dos conselheiros com gestores e proprietários, na transparência, monitoramento e intervenção nas empresas. Monks foi um dos principais responsáveis pela disseminação do conceito de conflitos de agência. O relatório Cadbury centrou-se nos outros dois valores da governança corporativa, accountability e disclosure, com foco em aspectos financeiros e nos papéis dos investidores, dos conselheiros, dos gestores e dos auditores. Além de apresentar um conjunto de melhores práticas dentro das organizações, o relatório Cadbury defendeu a necessidade de ações de auditoria (internas e externas), na responsabilização de gestores e de conselheiros, nas prestações de contas realizadas com periodicidade e correção e na transparência no fornecimento de informações e análises de desempenho para os investidores. A OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – tornou-se um forte incentivador das práticas de governança corporativa defendendo que a adoção pelas corporações de práticas de gestão confiáveis atraía investidores para o mercado de capitais, reduziria custos de captação de recursos e alavancaria o desenvolvimento da economia. A OCDE estabelece, como regra de admissão de países em seu bloco, que eles desenvolvam políticas que facilitem e incentivem as empresas para que busquem a implementação de modelos de governança corporativa. Além de sugerir modelos de governança baseados em boas práticas, a OCDE também definiu regras específicas para os conflitos de agência. A Lei Sarbanes-Oxley definiu critérios mais rigorosos controles internos, auditoria, prestação de contas e gestão corporativa fundamentada em padrões éticos, instituindo penalidades rigorosas nos casos de violação de extenso rol de novas regras, tanto para os Conselhos de Administração quanto para a Diretoria Executiva das companhias. Foi uma resposta aos escândalos financeiros que aconteceram nos EUA e foi a primeira lei criada para regulamentar os processos de governança corporativa. Definiu padrões de auditoria, estabeleceu inspeções regulares nas operações das empresas e determinou sanções para a violação de regras. Lançou luz para a transparência, equidade, conformidade, prestação de contas e nos conflitos de interesses. 19WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CONSIDERAÇÕES FINAIS Compreender as razões que justificam a existência das organizaçõesnos dá um melhor entendimento das motivações dos investidores. Como as organizações não têm um ciclo de vida pré-definido, quanto mais tempo de atividade maior a chance de entrega do retorno esperado pelos investidores. Portanto, é função dos gestores garantir esse retorno no maior tempo possível e no maior patamar possível e, para tanto, uma modelagem de governança corporativa é de larga importância. A governança corporativa nasceu por conta dos chamados conflitos de agência. Essa situação de adversidade entre investidores e gestores é fomentada quando os gestores deixam de considerar que sua principal função está em garantir o retorno financeiro dos acionistas. Por assumirem riscos e sem uma estrutura legal de proteção, diferente do que acontece com outros stakeholders, o incentivo para que os acionistas mantenham seus investimentos está, sim, em um retorno adequado. O conflito de agência também é evidenciado quando os que comandam e não são donos (gestores) extrapolam o direito de oferecer a si mesmos algumas vantagens indevidas. A governança corporativa deixa claro o número de envolvidos na existência do negócio. Além dos investidores, os gestores, colaboradores, clientes, fornecedores, agentes financeiros, vizinhos, governos e ONGs tem interesse em que as atividades sejam realizadas a contento. Essas operações geram desenvolvimento técnico e financeiro e beneficia a todos. A governança corporativa se integra no objetivo de garantir que o impacto no funcionamento da empresa não gere nenhum reflexo indesejado. Historicamente o desenvolvimento dos modelos de governança se deu nos anos finais do século XX e no início do século XXI. Entre 1992 e 2010 um robusto conjunto de estudos desenvolvidos por Robert Monks nos EUA, deu voz e publicidade, principalmente, aos problemas dos acionistas minoritários. Em 1992, um primeiro relatório publicado no Reino Unido – o Relatório Cadbury – apresentou a necessidade de se desenvolverem conselhos de administração mais eficientes, comprometidos com os investidores e que contassem com um número representativo de conselheiros externos independentes. O relatório também apontou a necessidade de relatórios e controles mais eficientes, produzidos por auditores. Na segunda metade da década de 1990 foi a vez da OCDE encampar os ideais da governança corporativa, uma vez que a eliminação de barreiras econômicas propiciou o crescimento das corporações, levando junto a mobilização do mercado de capitais e o desenvolvimento das nações. Essa tríade só se sustentaria em modelos de governança. E em 2002 a Lei Sarbanes-Oxley foi aprovada pelo Congresso dos EUA sendo o primeiro instrumento legal a garantir o correto emprego das estratégias de gestão baseadas na governança corporativa. Na próxima unidade vamos esmiuçar mais os significados dos conflitos de agência sobre os direitos assimétricos dos investidores, as forças de controle interno e externo, as estruturas de governança e a busca pelo aumento da eficiência. Encontramo-nos lá! 2020WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 02 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................... 21 1 OS CONFLITOS DE AGÊNCIA ...................................................................................................................................22 2 OS INVESTIDORES E OS DIREITOS ASSIMÉTRICOS ...........................................................................................24 3 AS FORÇAS DE CONTROLE INTERNO E EXTERNO ...............................................................................................27 4 AS ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA ...................................................................................................................... 31 5 BUSCANDO ALTA EFICÁCIA ....................................................................................................................................33 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................................................................................36 AS PRINCIPAIS QUESTÕES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: GOVERNANÇA CORPORATIVA E COMPLIANCE 21WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO Após conhecer e discutir as origens e a importância da governança corporativa chegamos a uma frente importante: compreender com mais detalhes tudo que cercam e contribuem para os conflitos de agência. Se o interesse dos acionistas é o máximo retorno total de seus investimentos, os dos gestores podem ser outros e até conflitantes em relação aos dos acionistas, como a busca de status, altas remunerações, preferência por crescimento em detrimento de retornos, além de diversas formas de benefícios autoconcedidos. Explorar esse conceito é fundamental para a plena compreensão da governança. Compreenderemos, inclusive, que o conflito de agência também acontece entre os investidores, numa disputa na maioria desigual entre os majoritários – concentradores de propriedade – e os minoritários, em uma movimentação conhecida como o oportunismo dos acionistas. Um conflito comum, numa perspectiva muito semelhante ao conflito de agência, acontece entre os investidores majoritários e minoritários. Iremos conhecer e discutir as origens e impactos que a assimetria dos direitos entre os investidores pode causar e como essa questão influenciou no desenvolvimento de forças de controle internas e, também, externas as companhias. Iremos também discutir e entender como as forças de controle agem para que as organizações consigam realizar as entregas esperadas pelos investidores. Essas forças surgem dentro e fora das estruturas administrativas das empresas e são usadas para direcionar a conciliação dos interesses condicionado à entrega de resultados por parte dos shareholders com os interesses de outros stakeholders. Sequencialmente poderemos esmiuçar as estruturas de governança e perceber como as relações de poder influenciam no funcionamento das empresas e se essas relações podem ocasionar eventuais isolamentos, instabilidades ou alterações de rumos estratégicos que potencializem traumas ou contendas. Poderemos observar as relações entre proprietários, gestores e conselho de administração – modelo mais comumente apresentado – com um outro que leva em consideração a adição de mais um ator: os demais stakeholders. Essa Unidade finaliza com as considerações relacionadas à busca por processos de alta eficácia, com um objetivo muito claro: apresentar as diferenças que marcam os níveis de eficácia em empresas gerenciadas e empresas governadas. Vamos iniciar os trabalhos? 22WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1 OS CONFLITOS DE AGÊNCIA A dispersão do capital das corporações e a consequente separação entre a propriedade e a gestão está contida no grupo das várias hipóteses de conflitos potenciais entre acionistas e gestores ou entre acionistas majoritários e minoritários. Quais seriam, então, suas origens? Basicamente são marcadas pela forma com são originados os tipos de financiamento utilizados. Temos: Figura 1- Origens dos financiamentos corporativos. Fonte: O autor. Quando pensamos em financiamento interno lembramos das grandes empresas criadas por empresários talentosos que, basicamente, construíram seus empreendimentos com recursos originários dos seus próprios negócios. Alguns rejeitavam a alavancagem via, por exemplo, empréstimos em agentes de financiamento (denominado debt) bem como a possibilidade de buscar o mercado de capitais (conhecido como equity). Atuando em mercados com baixíssima concorrência e alta lucratividade permitiram-nos o acúmulo de grande quantidade de recursos que, então, foram reinvestidos nos negócios. Ofinanciamento externo foi a tônica do século XX e marcaram a economia da Inglaterra (debt, basicamente) e dos EUA (equity). Empreendedores com bons projetos, estratégias bem definidas, planos de negócios alinhados com as estratégias, movidos pelos desejos de rápida expansão e com competente atuação nos mercados financeiros, também construíram impérios, quase da mesma forma daqueles que fizeram a opção investimento interno. É interessante notar que tanto no financiamento interno quanto no externo observou-se, com o passar do tempo, uma pulverização do controle acionário. Foram os movimentos sucessórios dentro das organizações que potencializou essa migração. Nesse movimento de sucessão, não é raro encontrar herdeiros sem interesse em exercer as atividades de gestão, embora, ainda, com desejos de manter o controle do patrimônio. Esses acionistas, então, passam a buscar no mercado profissionais aptos a comandar o dia a dia dos seus empreendimentos. Temos, assim, os acionistas outorgando poderes para gestores – os outorgados. Essa relação de agência entre os outorgantes (acionistas) e os outorgados (gestores) é fundamentada na execução de decisões que maximizem o valor do empreendimento, a riqueza dos acionistas e o retorno de seus investimentos, contudo um problema surge quase que imediato: os gestores também têm seus próprios interesses e irão procurar maximizá-los. E neste momento, quando um gestor se depara com uma tomada de decisão que dá a ele a opção de maximizar o interesse dos acionistas em detrimento de maximizar o próprio interesse, temos um conflito de agência. O que é mais complexo nessa relação é perceber que os conflitos de agência são muito difíceis de serem evitados, pois não existe contrato completo, e não existe agente perfeito. 23WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A inexistência do contrato completo é conhecida como a axioma de Klein, sendo apresentado pelo economista Benjamin Klein em 1983. Esse conceito nasceu da observação de que os negócios estão cada vez mais marcados pelas incertezas e descontinuidades. Se, então, a melhor forma de reduzir os riscos de conflitos de agência seria estabelecer um contrato entre outorgantes e outorgado prevendo as situações encontradas pelo gestor e as possíveis respostas a elas, percebe-se que a quantidade de fatores e variáveis a serem considerados ocasionaria, ainda assim, muitos ocorrências imprevisíveis possíveis, logo, uma multiplicidade de reações a cada nova ocorrência, e ainda, uma crescente frequência de ocorrências imprevisíveis, ou seja, o contrato completo é utópico. Na visão de Rossetti e Andrade (2019, p. 86) entendemos que: Como todas estas realidades deságuam na impossibilidade de se definirem contratos completos, outorgam-se aos gestores, consequentemente, mais do que a execução de ações previsíveis: o direito residual de controle da empresa, resultante do livre arbítrio para a tomada de decisões em resposta a eventos não previstos. Esta condição outorgada é definida como managerial discretion, ou juízo gerencial. Juízo que pode estar mais a serviço dos objetivos dos gestores do que dos acionistas, gerando conflitos de agência (ROSSETTI; ANDRADE, 2019, p. 86). No caso da inexistência do agente perfeito, esse axioma foi proposto em 1994 pelos economistas Michael Cole Jensen e William Henry Meckling. Dadas as condições imprevisíveis que tornam impossível a definição ex-ante (expectativa em relação a eventos futuros) de contratos completos, somadas às condições que definem os comportamentos dos agentes, ou seja, a força do interesse próprio, se sobrepõe aos interesses de terceiros para a tomada de decisões. A ideia é de que objetivos alheios raramente movem as pessoas a serem tão eficazes quanto o são para a consecução de seus próprios interesses. Outro modelo de conflito de agência é o de acionistas majoritários e minoritários. Típico de mercados onde há a concentração de propriedade acionária – como a América Latina e, inclusive, o Brasil. Dois atores no centro dos conflitos de agência, são: O gestor oportunista Interesses conflituosos com os acionistas. Inerente apenas ao gestor ou equipe de gestores. Exemplos: benefícios descontextualizados auto concedidos; recebimento de bônus por crescimento, em detrimento do pagamento de dividendos; participação acionária em fornecedores ou clientes. O acionista oportunista Interesses conflituosos com os acionistas minoritários. Exercido apenas por acionistas com alta concentração de propriedade. Exemplos: práticas de nepotismo; participações acionárias cruzadas; uso exclusivo de informações privilegiadas; cooptação de colegiados corporativos. Dessa forma, verifica-se que os contratos incompletos e os comportamentos imperfeitos abrem espaços para o desalinhamento entre os interesses dos acionistas e os dos gestores, culminando em dois diferentes tipos de custos de agência: os custos atribuíveis ao oportunismo dos gestores e os custos incorridos pelos acionistas. 24WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Dos gestores: o Remunerações indevidas; o Benefícios excessivos autoconcedidos; o Decisões impactantes sem consenso; o Opção pelo crescimento em detrimento ao aumento do resultado; o Estratégias conservadoras demais renunciando a novas oportunidades; o Conflitos de interesse diversos; o Nepotismo; o Acesso e uso assimétricos de informações privilegiadas; o Resistência a avaliações de desempenho; o Foco no curto prazo; o Desqualificação e boicote ao Conselho de Administração; o Descompromisso com a perpetuação da empresa. Dos acionistas: o Elaboração, mantimento e estruturação de contratos; o Monitoramento dos outorgados; o Manutenção de sistemas complexos de informações gerenciais; o Concessão aos outorgados de benefícios para conciliação de interesses. Quadro 1 - Hipóteses de custos de agência. Fonte: Rossetti e Andrade (2019). 2 OS INVESTIDORES E OS DIREITOS ASSIMÉTRICOS Vamos considerar a empresa XPTO cujo total (100%) de ações está distribuído em 60% de ações com direito a voto e 40% de ações sem direito a voto. Isso poderia demonstrar uma assimetria de direitos por parte dos acionistas com direito a voto? A origem desta questão é a previsão legal para a emissão de classes de ações com direitos diferenciados, nesse exemplo ações com e sem direito a voto, atribuindo-se a essas últimas um dado conjunto de benefícios não necessariamente compensáveis pelo impedimento da atuação efetiva dos seus titulares nas Assembleias Gerais e em outros colegiados corporativos. Nesse caso, renuncia-se o direito ao voto, mas recebe-se o direito preferencial pelo recebimento de dividendos. Figura 2 - Observando as ações da XPTO. Fonte: O autor. 25WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Para conseguir o controle acionário da XPTO seria necessário ter em mãos mais de 50% das ações com direito a voto – nesse caso vamos considerar 50,1% destas ações. Figura 3 - Composição acionária XPTO. Fonte: O autor. Na XPTO há uma assimetria de direitos, pois se possuirmos 20,04% do total de ações e estas forem com direito a voto teremos controle absoluto da empresa. A possibilidade de emissão de dois tipos de ações permite que acionistas com ações que têm direito a voto controlem a companhia, inclusive, com bem menos da metade do capital acionário. E à medida em que as ações com direito a voto sejam cada vez menos expressivas em relação ao capital total, reduz-se a relação entre a posse dessas ações e o capital necessário para o exercício efetivo do controle da companhia. Se a legislação permite que o capital seja constituído por apenas um terço de ações ordinárias e dois terços de ações preferenciais, com apenas 16,7% do capital total, ou seja, com 50,1% de 33,33%, um acionista podeexercer legalmente o controle corporativo. Na bolsa de valores: Ações com código “PN”: Sem direito a voto (Código 4) Recebem mais dividendos Exemplo: Gerdau GGBR4 Ações com código “ON”: Com direito a voto (Código 3) Recebem menos dividendos Exemplo: Vale do Rio Doce VALE3 Ações com código “UNITS”: Pacote que possui 1 ação ON + (Código 11) 4 papéis PN (na média) Exemplo: Santander SANB11 Quadro 2 - Códigos mais comuns para ações. Fonte: O autor. 26WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Ainda existem os códigos: ➢ 5 (preferenciais classe A), ➢ 6 (preferenciais classe B), ➢ 7 (preferenciais classe C), ➢ 8 (preferenciais classe D), ➢ 1 (direito de compra), ➢ 9 (subscrição de ações ordinárias) e ➢ 10 (subscrição de ações preferenciais). Se no código da ação aparecer, ainda, a letra “F” as ações negociadas são uma fração de um lote padrão da empresa. A obra recomendada é: Mercado de Capitais, do professor Juliano Lima Pinheiro 9. ed. Atlas. Com exemplos práticos, questões e exercícios para aprofundar o conteúdo, contém uma análise completa e sistematizada dos principais conceitos do mercado de capitais e suas operações. De maneira didática, o conteúdo do livro está estruturado em quatro partes: Parte I — Ambiente financeiro: oferece uma visão integrada de diversos conceitos fundamentais para a compreensão do sistema financeiro, com abordagem sistêmica. Partes II e III — Mercado de capitais e Bolsas de valores: de caráter operacional, visam à criação de subsídios para o entendimento e a operação do mercado de capitais e das bolsas de valores. Parte IV — Análise de ações: indicada para pessoas que pretendem compreender e utilizar o mercado de capitais, apresenta as principais ferramentas para administração financeira e análise de ações como opção de investimento. 27WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3 AS FORÇAS DE CONTROLE INTERNO E EXTERNO Os conflitos de agência e seus custos inerentes e a assimetria de direitos entre os acionistas foram as razões essenciais que levaram o despertar da governança corporativa, ainda podemos adicionar as relações de poder tidas como perversas. A sustentação da governança procurou estabelecer forças de controle, que sintetizam os resultados de todas as formas de ativismo em boas práticas de governança. Elas são uma reação de stakeholders e shareholders que se consideraram traídos em seus direitos por causa dos conflitos de interesse, por oportunismos, por modelos gerenciais orientados para objetivos dos gestores e pelas mais variadas formas de expropriação praticadas por acionistas majoritários. As forças externas são caracterizadas por: • Ambiente legal e regulatório; • Padrões contábeis exigidos; • Controle pelo mercado de capitais; • Mercados competitivos; • Ativismo de investidores institucionais; • Ativismo de acionistas; • Atuação de fundos de private equity. Das forças externas, o ambiente regulatório é geralmente visto como de alta eficácia, principalmente em mercados em que as regras são mais duras e é mais alta a capitalização das empresas via mercado de capitais. Além disso, o número de companhias abertas tende a ser maior e o ambiente de negócios fica mais aquecido. A convergência para padrões mundiais de contabilidade alcançou maior expressão como força externa de controle com a adoção das normas do IFRS (International Financial Reporting Standards) pela Comunidade Econômica Europeia. A adesão a padrões contábeis que proporcionam maior segurança aos acionistas é uma força de controle em rápido processo de consolidação em praticamente todos os países, avançados e emergentes. O controle pelo mercado de capitais se dá pelos ágios e deságios de governança, pelos take-overs hostis e pelas disputas abertas por procurações de votos (proxy fights). Cotações desagiadas podem sinalizar má governança, maus resultados e/ou baixa confiança na corporação. Se resultarem em forte queda do valor de mercado da empresa, podem encorajar take-overs hostis – através dos quais um novo grupo controlador assume o comando, com objetivos de saneamento e reestruturação do negócio. Para dificultar, os take-overs, os gestores e conselheiros podem implementar cláusulas contratuais chamadas poison pills. No Brasil, as poison pills são instituídas apenas pelos acionistas e somente podem ser retiradas por intervenção, exclusiva, dos acionistas, conforme o art. 122 da Lei nº 6404/1976. 28WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 4 - Pílulas de veneno contra aquisições hostis. Fonte: Adaptado de Rossetti e Andrade (2019). No caso dos mercados competitivos a força de controle pode, na análise de alguns, ser menos importante que as proporcionadas pelo mercado de capitais, mas é importante compreender que: 1. Empresas com baixa competitividade, em geral, têm menos valor de mercado. 2. O valor de mercado reflete a competência dos gestores. É importante compreender que os altos e baixos são inerentes ao desenvolvimento dos negócios das empresas e podem criar um “desenho” muito parecido com a ascensão e declínio dos gestores envolvidos diretamente na gestão. Bons desempenhos potencializam a conquista de poder e de status das gestões, entretanto o contrário também é verdadeiro. Para compreender a influência como força de controle do ativismo de investidores institucionais, primeiro precisamos compreender o que caracteriza esse tipo de investidor. Esse tipo de investidor se caracteriza pela, em muitos casos, enorme quantidade de recursos financeiros que tem sob seu controle e que estão disponíveis para serem colocados no mercado de capitais. Em geral, esses investidores são: Fundos de Pensão e Fundos de Investimento. O poder desses fundos é considerável, uma vez que após o investimento feito é naturalmente o fundo quem assume uma posição de “controle” das operações da empresa com a conquista de assentos no conselho de administração. Os fundos são caracterizados pelo profissionalismo, foco e visão sistêmica dos negócios. O ativismo dos investidores, não apenas dos grandes como os fundos, desenvolve uma forma bastante eficiente e objetiva de controle. Com o aumento da concorrência entre companhias para conquistar novos investidores, esses acabam por expor com mais intensidade as suas exigências sobre boas práticas de governança – entenda-se aí a valorização dos investidores minoritários e a constituição de blocos de representação reunindo esses investidores. Logo, o poder de influência no mercado de capitais e na avaliação das companhias desses investidores cresceu e tem crescido intensamente. Já os fundos de private equity atuam de outra forma. É um tipo de investimento que acontece em empresas que ainda não abriram o seu capital e, assim, não tem ações negociadas em bolsa de valores. 29WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Normalmente essas empresas já têm uma estrutura consolidada com faturamento, porte médio, e atuam em mercados que estão em crescimento. O fundo torna-se sócio da empresa e atuará de modo a alavancar os negócios. A ideia é que, se esse trabalho em conjunto entre empresa e fundo for bem executado, acontecerá uma maximização no valor da empresa e por consequência, o negócio irá apresentar crescimento, terá um aumento de visibilidade de mercado, uma melhora de imagem institucional e um aumento de credibilidade, visto claramente pela adoção de práticas de governança, demonstrando sustentabilidade futura do negócio. Em relação aos valores da governança corporativa, esses fundos são focados em disclosure e accountability. Introduz-se normas rigorosas de preparação e de auditoria de demonstrações de resultados. Os conselhos de administração sãotambém objetos de atenção, principalmente quanto à sua composição e à presença de conselheiros independentes. Os fundos de private equity são especialistas nessa atividade com equipes e estruturas muito profissionais. A finalização desse processo de investimento se dá com a preparação do IPO (initial public offering, ou oferta pública inicial de ações) da empresa, concretizando a abertura de capital. Isso feito, o fundo deixa de participar de empresa e lucra com a valorização obtida do negócio. No caso das forças internas, temos: • Concentração da propriedade acionária; • Constituição de conselhos de administração; • Modelos de remuneração de administradores; • Monitoramento compartilhado; • Estruturas multidivisionais de negócios. Anteriormente já havíamos percebido que a concentração de propriedade acionária gera problemas, em especial quando constata-se que os direitos dos acionistas minoritários não são considerados, mas na perspectiva de força de controle, essa concentração se reflete como muito eficiente. As vantagens mais importantes atribuíveis à concentração da propriedade estão ligadas à possibilidade de que o monitoramento seja exercido pelos investidores controladores, com provável redução de conflitos e custos de agência. A presença do controlador direciona o processo de governança corporativa, reequilibrando os interesses de acionistas, gestores e demais stakeholders, sinalizando para o mercado uma solução satisfatória para os custos de agência. A importância dos conselhos de administração como força interna de controle é de tal ordem que não é possível separar as expressões “governança corporativa” e “conselho de administração”. Um código de boas práticas de governança não tem a menor possibilidade de sucesso se não considerar a constituição do conselho de administração. Sua existência é uma condição necessária à governança corporativa. Lógico que a simples criação do conselho não é suficiente para que o interesse dos acionistas e o monitoramento dos gestores seja implementado e seja eficiente. É necessário que o seu funcionamento aconteça de modo a permitir a interação com os gestores. O conselho precisa definir os propósitos empresariais principais da corporação, contribuir com a definição das diretrizes da gestão, bem como, da externalização de expectativas de resultados. O conselho deverá oferecer o direcionamento estratégico aos gestores, homologar com eles as diretrizes e, em um segundo momento, poderá desenvolver atividades de monitoramento das estratégias, das diretrizes e dos resultados. Essas são as prerrogativas que definem o papel do conselho de administração. 30WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Outro ponto importante em relação aos conselhos de administração está ligado ao seu tamanho e a sua composição. Em países como o Japão os conselhos são constituídos com muitos participantes, diferentemente do que acontece com o modelo adotado nos EUA composto por um número menor. Não existem regras na definição do tamanho dos conselhos. No caso da composição, temos os conselheiros internos, os externos e os externos independentes. Os internos têm atribuições profissionais com a empresa (investidores, gestores e até mesmo colaboradores), os externos têm ou podem ter tido alguma relação com a empresa (ex-gestores, ex-colaboradores, credores principais, fornecedores principais e até mesmo clientes importantes) e os externos independentes não têm, nem tiveram nenhuma relação profissional direta ou indireta com a empresa. Neste caso da composição vale a reflexão da representatividade e do equilíbrio de forças que pode proporcionar uma melhor gestão de conflitos. Feita a criação e homologação do conselho de administração segue-se com a implementação de mecanismos que possibilitem a avaliação de desempenho dos membros, que permita e estabeleça um programa de formação de novos conselheiros e que desenvolva um cronograma que permita a rotatividade dos conselheiros e ainda considerem tempo de mandato e desempenho. Os modelos de remuneração, como força de controle interno, atuam em um terreno muito difícil, por conta da alta sensibilidade provocada pelo tema, mas deve-se considerar que os comitês de remuneração, estruturados dentro do conselho de administração, são especialmente assertivos na proposta de modelos que vinculem desempenho à remuneração (bônus ou stock options), substituição de parte da remuneração por benefícios ou, complementarmente, desenvolver um benchmarking do que acontece no mercado em outras organizações. O monitoramento compartilhado pode se dar em duas frentes: o monitoramento de credores e o monitoramento de colaboradores. Credores e colaboradores são stakeholders que regularmente têm assento nos conselhos de administração, mas podem realizar essa atividade independentemente de estarem ou não participando do conselho. Em geral, o monitoramento dos credores se dá por conta de riscos de pagamentos preferenciais de dividendos à acionistas em detrimento do pagamento de dívidas, como proteção a um sistema financeiro de alavancagem em especial as agências e instituições de fomento e, também, a políticas de gestão que desconsiderem oportunidades de geração de riqueza em detrimento da não aceitação de compartilhamento de controle acionário. O monitoramento realizado por colaboradores se justifica para possibilitar uma melhor avaliação em agências de rating corporativo específicas nas questões de governança, como alerta para situações extremas como greves, em situações de desenvolvimento e implementação de novos projetos estratégicos e na importância do fator trabalho equiparável à do fator capital. Outros sistemas de monitoramento externos podem ser desenvolvidos, mesmo sendo controversos, a partir de outros stakeholders como: monitoramento de clientes, monitoramento de agências governamentais, etc. Por fim, o controle interno promovido pelo monitoramento executado por estruturas multidivisionais de negócios é muito mais simples do que possa parecer. Em empresas de maior porte, com muitos departamentos ou áreas de atuação diversas, não é raro observar uma “concorrência” entre departamentos ou áreas, de modo que cada uma delas observa o desempenho da outra em relação a resultados. Com orçamentos e relatórios financeiros separados fica fácil apontar maximização de lucros ou prejuízos. Mesmo os gestores sendo conscientes que uma simples comparação de resultado não reflete uma realidade específica de um setor ou de um projeto, internamente as equipes acabam concorrendo entre si. 31WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 4 AS ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA Para uma melhor compreensão das estruturas de governança devemos observá-las com uma visão sistêmica. Visão sistêmica é uma forma de entender as relações de forças que regem processos, organizações, fenômenos e outras interações complexas. Nessa visão, o todo deve ser levado em consideração ao se analisar as consequências de ações individuais das partes que o compõem. Considerando esse formato, uma visão abrangente dos atores e do ambiente de governança seria composto basicamente por: Um setor de “propriedade” composto por: • Acionistas preferenciais; • Acionistas minoritários; • Acionistas controladores. Um setor de “controle” composto por: • Acionistas controladores; • Assembleia geral; • Conselho fiscal. Um setor de “administração” composto por: • Conselho de administração; • Diretoria executiva; • Demais stakeholders. Um setor de “auditoria” composto por: • Conselho de administração; • Diretoria executiva; • Conselho fiscal; • Auditoria independente; • Comitê de auditoria; • Auditoria interna. Em diversos momentos esses atores participam de mais de um grupo, objetivando uma sinergia para atendimento dos resultados desejados pelos proprietários. A assembleiageral é o órgão soberano da organização e é dela que o poder exercido emana. O conselho de administração e a auditoria são independentes como os guardiões dos interesses dos proprietários e a diretoria executiva interage com o conselho, exercendo atividades de gestão em toda a empresa. 32WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Os múltiplos interesses podem ser exercidos as organizações de duas formas: Figura 5 - Triângulo básico da governança corporativa. Fonte: O autor. Nas inter-relações do conselho de administração com os proprietários, esses apresentam expectativas de resultado e avaliam o desempenho dos conselheiros. Os conselheiros defendem os interesses dos proprietários. Nas inter-relações dos proprietários com a diretoria executiva, os proprietários são os fornecedores do capital investido. Outorgam aos gestores o poder de tomar decisões que permitam a maximização dos seus investimentos. Nas inter-relações do conselho de administração com a diretoria executiva, o órgão colegiado da governança apresenta direcionadores e espera pela apresentação de estratégias e planos de ação que permitam o atendimento das expectativas dos proprietários. A diretoria executiva deverá ser formalmente avaliada pelo conselho. Figura 6 - O quadrilátero da governança corporativa. Fonte: O autor. 33WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Nas relações abertas aos interesses ampliados aos demais stakeholders, o que define a extensão e os objetivos do relacionamento é a assimilação pelos proprietários de responsabilidades corporativas ampliadas e o seu desejo/consentimento de renunciar ao recebimento do resultado para atender as reivindicações de interesses sociais ou ambientais, por exemplo. Os proprietários esperam, em contrapartida, uma melhora na reputação corporativa. É o conselho de administração que define as políticas de relacionamento com os stakeholders e é a diretoria executiva a responsável por implementar essas políticas. Um destaque deve ser dado em relação ao gestor principal dos negócios – que pode ser chamado de presidente, diretor executivo, CEO (chief executive officer), dentre outras especificações. É evidente que as diversas funções do conselho de administração e da diretoria executiva refletem-se nos diferentes atributos exigidos dos conselheiros e do CEO. Logicamente que existem condutas e posturas comuns, como as que reportam à integridade. Mas, assim como existem diferenças substantivas nos papéis e responsabilidades de conselheiros e gestores, há também nas capacitações requeridas de cada um. Espera-se que o CEO tenha compromisso com a empresa, seja capacitado, com comportamento positivo, seja eficaz conjuntamente com capacidade de tomada de decisões e que seja um bom ouvinte. A avaliação do CEO é outra ação importantíssima para o conselho de administração, pois gera um dos mais importantes sinais de efetividade de um modelo de governança. Em geral essa avaliação não fica restrita ao gestor principal. Tanto o CEO, como o conselho de administração e os conselheiros procedem às suas auto avaliações e submetem-se às de seus pares. Os resultados são checados e acontecem as análises dos possíveis desvios encontrados. 5 BUSCANDO ALTA EFICÁCIA Iniciamos relembrando os conceitos de eficiência e eficácia. Isso é importante para, além de não os confundir, reforçar que na análise da governança corporativa optamos por dar um foco fundamentado na eficácia. Eficaz é o que cumpre perfeitamente determinada tarefa ou função, atingindo o objetivo proposto. A eficácia está diretamente ligada ao resultado. Eficiente é o que executa uma tarefa com qualidade, competência, excelência, com nenhum ou com o mínimo de erros. A eficiência está ligada ao modo de fazer uma tarefa. O eficaz faz o que é certo para atingir o objetivo inicialmente planejado enquanto o eficiente faz com qualidade, mas nem sempre atinge um objetivo. Caso a corporação possua um conselho de administração bem construído, claramente sabendo da importância e de todas as suas prerrogativas, meio caminho já foi percorrido na busca da excelência em governança. Mas o que se discute agora é como podemos ainda mais fortalecer o conselho de administração e como esse fortalecimento pode auxiliar em um modelo de alta eficácia. Uma das melhores ações da implementação do conselho de administração é a possibilidade de trabalho em equipe, com diversidade de experiências e opiniões. “Nenhum de nós é tão esperto quanto todos nós” Condit (1993). 34WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Outros dois fatores são apresentados como fundamentais nessa busca pela eficácia: a garantia de desenvolvimento da direção executiva (CEO e sua equipe) e a implementação de monitoramento estratégico. O fortalecimento (empowerment) do conselho de administração se dá: I. Possibilitando que o conselho estabeleça uma liderança independente da direção executiva. II. Ampliando os canais e a frequência de comunicação com os investidores. III. Construindo um conselho com a melhor composição possível. IV. Estruturando reuniões e processos, ambos, pautados na eficiência. Já o desenvolvimento de toda a equipe da direção executiva é potencializado pela: I. Construção de uma equipe com a melhor composição possível. II. Relação clara de remuneração e benefícios atrelados ao desempenho. III. Oferecer possibilidades de desenvolvimento constante do setor de negócios da empresa. Em relação a implantação de ações de monitoramento estratégico, considerando objetivos de longo prazo, temos: I. A avaliação de oportunidades estratégicas que agreguem valor à empresa. II. A detecção dos fatores críticos de sucesso na curva de implementação das estratégias. III. O desenvolvimento de ferramentas e mecanismos que permitam antecipar e prevenir possíveis contratempos e manter a empresa competitiva no mercado. Em 1995, o economista John Pound publicou um artigo intitulado The Promise of the Governed Corporation (A promessa da corporação governada), em tradução livre, apresentando um contraponto sobre as corporações gerenciadas versus as corporações governadas. O autor afirma que o debate sobre governança corporativa gira há algum tempo em torno do poder e do estreitamento de controles sobre gerentes rebeldes. O desenvolvimento de ações de governança acaba por focar na realização de auditorias mais frequentes sobre o desempenho dos gerentes, na separação das atividades de CEO e de chairman (presidente do conselho de administração), na nomeação de conselheiros externos mais atuantes e no aumento da responsabilidade dos conselheiros perante os acionistas minoritários. Para saber mais detalhes sobre a importância do conselho de administração na retomada dos negócios após momento de crises, assista o vídeo do IBGC. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=jCDKIHgVm0g. https://www.youtube.com/watch?v=jCDKIHgVm0g 35WWW.UNINGA.BR GO VE RN AN ÇA C OR PO RA TI VA E C OM PL IA NC E | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Na visão do economista, ajustes de governança que simplesmente transferem poder entre partes não resultarão em si mesmo, em organizações mais rentáveis e menos expostas a surpresas, uma vez que, os ajustes não tratam dos principais problemas da governança corporativa – que seriam as falhas no processo decisório das empresas. O foco do poder deriva de um modelo por ele denominado empresa gerenciada, segundo o qual: a) os gerentes seniores se responsabilizam pelo exercício da liderança e pelo processo decisório; b) a função do conselho de administração consiste em contratar gerentes de alto nível, monitorar seu desempenho e demiti-los em caso de insucesso; c) o papel dos acionistas se resume em dissolver o conselho de administração, quando
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