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Autor: Prof. Robson Paz Vieira Colaboradores: Profa. Sandra Castilho Profa. Tânia Sandroni Governança Corporativa Professor conteudista: Robson Paz Vieira Mestre em Liderança/Ciência e Tecnologia em Saúde, MBA em Gestão Empresarial e Docência para o Ensino Superior e é bacharel em Ciências da Computação. Possui mais de dezessete anos de experiência acadêmica como professor na Universidade Paulista (UNIP) e como coordenador dos cursos de Administração e pós-graduação. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) V658g Vieira, Robson Paz. Governança Corporativa / Robson Paz Vieira. – São Paulo: Editora Sol, 2021. 132 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Governança corporativa. 2. Casos. 3. Administração. I. Título. CDU 658.012.432 U512.61 – 21 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades Universitárias Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez Vice-Reitora de Graduação Unip Interativa – EaD Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcello Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático – EaD Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Deise Alcantara Carreiro – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Kleber Souza Vitor Andrade Sumário Governança Corporativa APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................8 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8 Unidade I 1 HISTÓRICO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA: ORIGENS E FATORES DETERMINANTES ............... 11 1.1 Origens ...................................................................................................................................................... 11 1.1.1 Robert Monks e o fundo Lens .............................................................................................................11 1.1.2 Relatório Cadbury ................................................................................................................................... 12 1.1.3 Princípios da OCDE ................................................................................................................................. 13 1.1.4 Lei Sarbanes-Oxley ................................................................................................................................. 16 1.2 Fatores determinantes da evolução do capitalismo .............................................................. 16 1.2.1 Ética calvinista: séculos XVI e XVII ................................................................................................... 17 1.2.2 Doutrina liberal: século XVIII .............................................................................................................. 17 1.2.3 Revolução Industrial: século XVIII e XIX ........................................................................................ 17 1.2.4 Produção em série e novas escalas: século XIX .......................................................................... 18 1.2.5 Capital como fator de produção ...................................................................................................... 18 1.2.6 Sistema de sociedade anônima: século XIX e XX ....................................................................... 19 1.2.7 O crash de 1929....................................................................................................................................... 20 1.2.8 Ciência da administração: século XX .............................................................................................. 21 1.2.9 Gigantismo e poder das corporações ............................................................................................. 22 2 OBJETIVOS DAS ORGANIZAÇÕES .............................................................................................................. 25 2.1 Interesses das partes ........................................................................................................................... 25 2.2 Lógicas micro e macroeconômicas das empresas ................................................................... 27 2.2.1 Lógica financeira ..................................................................................................................................... 27 2.2.2 Lógica dos riscos assumidos ............................................................................................................... 27 2.2.3 Lógica da gestão ..................................................................................................................................... 27 2.2.4 Lógica do conflito de agência ........................................................................................................... 28 2.2.5 Lógicas macroeconômicas .................................................................................................................. 28 3 DEFINIÇÕES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ................................................................................... 28 3.1 Definições ................................................................................................................................................ 28 3.2 Modelo de governança anglo-saxão ............................................................................................ 31 3.2.1 Estados Unidos ......................................................................................................................................... 31 3.2.2 Reino Unido .............................................................................................................................................. 32 3.2.3 Canadá ........................................................................................................................................................ 33 3.2.4 Austrália ...................................................................................................................................................... 33 3.3 Modelo de governança alemão ...................................................................................................... 33 3.4 Modelo japonês ..................................................................................................................................... 34 3.5 Comparativo das governanças entre os países ........................................................................ 34 3.6 Governança no Brasil .......................................................................................................................... 35 4 PRINCÍPIOS E VALORES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ............................................................ 36 4.1 Os quatro princípios ............................................................................................................................ 36 4.1.1 Transparência............................................................................................................................................ 37 4.1.2 Equidade .....................................................................................................................................................40 4.1.3 Prestação de contas ............................................................................................................................... 42 4.1.4 Responsabilidade corporativa ............................................................................................................ 44 4.2 Agrupamento conceitual da governança com base nos princípios ................................ 46 4.3 Os 8 Ps da governança corporativa .............................................................................................. 47 4.3.1 Propriedade ............................................................................................................................................... 47 4.3.2 Princípios .................................................................................................................................................... 48 4.3.3 Propósitos .................................................................................................................................................. 49 4.3.4 Papéis ........................................................................................................................................................... 51 4.3.5 Poder ............................................................................................................................................................ 52 4.3.6 Práticas ........................................................................................................................................................ 53 4.3.7 Pessoas ........................................................................................................................................................ 53 4.3.8 Perpetuidade ............................................................................................................................................. 55 4.4 Vínculos e avaliações dos 8 Ps da governança corporativa ................................................ 57 Unidade II 5 O IMPERATIVO DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ............................................................................. 63 5.1 Governança corporativa no Brasil ................................................................................................. 66 5.2 A assimetria e a conciliação de interesses ................................................................................. 66 6 ATRIBUIÇÕES E RESPONSABILIDADES DOS AGENTES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ........... 67 6.1 Os atores da governança corporativa .......................................................................................... 68 6.2 Governança como sistema de relações ....................................................................................... 69 6.3 Estrutura da governança corporativa .......................................................................................... 70 6.3.1 Conselho de Administração ................................................................................................................ 71 6.3.2 Conselho Fiscal......................................................................................................................................... 71 6.3.3 Comitês ....................................................................................................................................................... 71 6.3.4 Auditoria independente e auditoria interna................................................................................ 72 6.3.5 Ouvidoria e corregedoria ..................................................................................................................... 72 6.3.6 CEO e diretores ......................................................................................................................................... 72 6.3.7 Acionistas e outros stakeholders ...................................................................................................... 73 6.4 O Conselho de Administração no processo de governança ................................................ 73 6.4.1 Grau de envolvimento como fator determinante ..................................................................... 73 6.4.2 Missão e áreas de atuação .................................................................................................................. 74 6.4.3 Dimensionamento e complementaridade .................................................................................... 75 6.4.4 Atributos, posturas e condutas ......................................................................................................... 76 6.4.5 Barreiras para avaliação dos conselhos ......................................................................................... 77 6.4.6 Diretoria Executiva no processo de governança ........................................................................ 78 6.4.7 CEO: atributos e posturas esperadas .............................................................................................. 79 6.4.8 O empowerment do Conselho de Administração e a eficácia da governança .............. 79 6.4.9 Relacionamento com os investidores (RI) .................................................................................... 80 Unidade III 7 OS ERROS DA GOVERNANÇA CORPORATIVA ...................................................................................... 84 7.1 Principais erros ...................................................................................................................................... 84 7.2 Conflitos de agência ........................................................................................................................... 87 7.3 Casos de erros de governança corporativa ................................................................................ 91 7.3.1 O caso do Banco Panamericano ....................................................................................................... 93 7.3.2 O caso Petrobras ...................................................................................................................................... 97 8 NOVOS DESAFIOS DA GOVERNANÇA CORPORATIVA .....................................................................100 8.1 Tendência à convergência...............................................................................................................102 8.2 Tendência à adesão ...........................................................................................................................107 8.3 Tendência à diferenciação ..............................................................................................................109 8.4 Tendência à abrangência .................................................................................................................110 8.5 Tendência da governança corporativa no Brasil ...................................................................110 8.6 Processo de disrupção e sua influência na governança corporativa ............................111 8.6.1 Compreensão do cliente .................................................................................................................... 112 8.6.2 Competências gerenciais ................................................................................................................... 113 8.6.3 Novos modelos de estratégia e de projetos ............................................................................... 115 8.6.4 Disrupção e a governança corporativa ........................................................................................ 116 8 APRESENTAÇÃO Esta disciplina trata de governança corporativa, apresentando seu histórico com as motivações externas que levaram à prática da governança nas corporações, verificando também seus conceitos e sua importância. Estudaremos os fatos que fizeram as empresas seguirem os modelos de governança corporativa, inclusive as exigências efetuadas pelo mercado – cada vez mais globalizado–, bem como as exigências legais que surgem em diversos países. Vamos demonstrar como a governança corporativa se estabelece em uma empresa, detalhando as principais atribuições e responsabilidades de todos os agentes da governança corporativa em uma organização, desde os sócios da empresa até os órgãos de fiscalização e controle, tais como: as auditorias internas e externas e os conselhos fiscais. Apresentaremos os erros ocorridos nas empresas, apontando as fraudes e os escândalos anteriores e posteriores à implantação deste modelo, além de efetuar um estudo sobre quais os novos desafios da governança corporativa em um mundo cada vez mais disruptivo e volátil. INTRODUÇÃO O tema governança corporativa é recente, principalmente se considerarmos que ele tem um crescimento maior nas últimas duas décadas, porém é muito importante para as grandes corporações, devido ao gigantismo e ao poder dessas empresas no mundo nos últimos anos. Todavia, suas origens remontam ao início do conceito capitalista no mundo, entre os séculos XVI e XVII, e se ampliam com fatos e fatores importantes, tais como: a Revolução Industrial, a ascensão do capital, o surgimento das primeiras empresas no formato de sociedades anônimas (S.A.), o crash da bolsa americana em 1929 e, ainda, o crescimento exponencial das instituições e o desenvolvimento da administração como ciência. Sabe-se que o administrador de empresas deve estar preparado para planejar, organizar, dirigir e controlar organizações de todo o tipo de porte. E, se pensarmos na evolução do capitalismo, o profissional da área deve ter o conhecimento detalhado da governança corporativa, que o auxiliará no desenvolvimento e aprimoramento das quatro funções da administração em sociedades de qualquer tipo e porte. Para uma melhor compreensão sobre esse tema tão atual e moderno, podemos utilizar a definição elaborada pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, s.d.): sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. 9 Portanto, é possível perceber a importância da disciplina para o curso, trazendo questões fundamentais para que o futuro administrador possa participar do processo de governança em uma empresa, caso seja esse seu caminho a ser percorrido. É importante salientar que a governança, ainda que já estabelecida em uma empresa, precisa de ajustes para que possa atender plenamente seus objetivos e, principalmente, para trazer informações e segurança a todas as partes envolvidas no processo empresarial. Digamos, por exemplo, que uma empresa queira abrir seu capital na bolsa de valores e, com isso, atrair um grande número de sócios a fim de comprarem suas ações no mercado. Sem dúvida, ela deverá fornecer seus dados e informações com precisão e segurança com a finalidade de que os futuros acionistas possam compreender seus objetivos, sua missão e visão, encontrando os valores (não somente financeiros) que beneficiem todas as partes envolvidas. Assim, o conceito de governança precisa ser considerado e estabelecido de forma consistente no planejamento estratégico desta organização. Este livro-texto foi concebido para que você possa compreender melhor sobre o conceito de governança corporativa, fazendo uma leitura de sua história, importância, praticidade e desafios. Também será possível entender melhor como uma organização deve se preparar internamente para que a governança esteja estabelecida de forma ativa, participante e eficiente. Com isso, podemos afirmar que o presente material aborda todos os itens que irão contribuir para aumentar seu conhecimento no assunto, bem como possibilitar a participação e/ou administração de uma empresa que possua governança em sua estrutura organizacional. Ao elaborarmos a estruturação deste livro-texto, procuramos nos apoiar em livros de autores consagrados como José Paschoal Rossetti, Djalma de Pinho Rebouças de Oliveira, Roberto Cintra Leite e outros, bem como nos manuais e códigos estabelecidos pelo IBGC, além de estudos e práticas já verificados no mercado. Bons estudos! 10 11 GOVERNANÇA CORPORATIVA Unidade I 1 HISTÓRICO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA: ORIGENS E FATORES DETERMINANTES Para que seja mais simples o entendimento conceitual e prático sobre governança corporativa, há a necessidade de uma revisão histórica sobre todo o processo que levou as empresas à adoção do referido modelo. Portanto, serão informadas as origens da governança, apontando e detalhando seus quatro marcos históricos, assim como as motivações básicas para o seu surgimento, considerando quais foram os fatores determinantes para que o sistema capitalista atual fosse criado, desenvolvido e estabelecido pelo mercado. 1.1 Origens O processo de governança corporativa nas empresas surge com fatores determinantes do capitalismo desde o pensamento reformista de Calvino, porém eles serão estudados posteriormente. Agora, vamos nos ater aos quatro pilares da moderna governança corporativa. 1.1.1 Robert Monks e o fundo Lens Robert Monks é um ativista acionista americano que, em 1992, constituiu um fundo de investimento voltado para empresas com problemas: o fundo Lens. Esse fundo possuía uma forma diferente de gestão, focada em resultados melhores para as instituições e, com isso, aumentava o seu valor no mercado. Na realidade, o fundo Lens é considerado um marco, porém Monks já trabalhava desde 1985 quando fundou a Institutional Shareholder Services, que tinha como objetivo efetuar consultoria para investidores institucionais. Ainda assim, o fundo é considerado um dos pilares da governança, pois sua estruturação foi uma novidade no mercado financeiro, uma vez que “o acionista presente, ativo e contributivo poderia levar as corporações a um desenvolvimento melhor do que o acionista ausente e passivo” (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p. 166). Evidentemente que não somente tal aspecto movia o fundo Lens de Robert Monks. Além dele, podemos destacar quatro princípios: • As empresas conseguirão suas recuperações com forte sustentação se tiverem seu código de ética e seu valor de atuação bem consolidados e compreendidos pelo mercado. 12 Unidade I • O resultado das corporações também possui forte ligação com seu modelo de ética. • O modelo administrativo das instituições modernas deve ser pautado em gerar riquezas para os proprietários e as comunidades onde atuam, ainda que sejam dinâmicas e complexas. • As bases de sustentação da liberdade e do desenvolvimento empresarial são a vontade e o direito de realizar investimentos. Assim, a lógica de Monks, que fica claramente verificada no seu fundo Lens, é que os acionistas ativos, em conjunto com a direção executiva da empresa na participação dos processos decisórios da corporação, atuam na regulação legal, autorregulação da empresa, fiscalização preventiva e gestão de externalidades e conflitos. Tal atuação, sem dúvidas, ocasionará à maximização do valor corporativo para o atingimento de resultados de longo prazo, atingindo o último estágio do ciclo de vida empresarial para a perenidade, ou seja, a perpetuação da instituição ao longo do tempo. Saiba mais Monks depois registrou suas teses, conclusões e práticas em livros, que também são considerados marcos da governança, a exemplo da obra a seguir: MONKS, R.; MINOW, N. Corporate governance. New York: Blackwell Publishers, 1995. 1.1.2 Relatório Cadbury O segundo pilar da governança tem origem no Reino Unido e possui relação direta com pressões externas para ajustes nas estruturas das grandes corporações que possibilitem melhor confiança e garantia aos investidores e demais partes envolvidas. As empresas do Reino Unido no início dos anos 1990 já possuíam conselhos de administração para suas tomadas de decisão, porém grupos influentes no mercado perceberam que uma parte delesatuava em diversas empresas, algo que poderia causar conflitos de interesse e de favores. Tal divergência era vista de forma não sustentável, porque os minoritários (sócios com pouca participação societária nas empresas) ficavam à mercê das decisões centralizadas desses conselheiros. Com isso, Adrian Cadbury, – presidente da empresa Cadbury Schweppes, que já possuía uma estrutura administrativa participativa –, foi encarregado de efetuar um código de melhores práticas de governança corporativa, cujas definições foram inseridas em um relatório que levou seu sobrenome: o Relatório Cadbury. 13 GOVERNANÇA CORPORATIVA Os princípios básicos de governança estavam focados na prestação de contas do responsável e na transparência, com ênfase na reestruturação dos conselhos de administração das empresas, considerando: • Conselho de Administração: reestruturação com regras de constituição dos seus membros e alocação da administração geral da empresa para o conselho com diretrizes básicas bem definidas. • Diretoria Executiva: estruturação dos componentes da Diretoria, com foco na separação das responsabilidades entre a Diretoria Executiva e o Conselho de Administração. Também foram apresentados no relatório a constituição e o papel dos demais conselhos que poderiam ser instituídos nas empresas, bem como a forma na qual os auditores internos e externos deveriam se comportar, considerando suas atribuições e responsabilidades. No quadro a seguir, serão verificados os pontos mais relevantes apontados no Relatório Cadbury, que direcionam as empresas na composição e estruturação dos agentes da governança corporativa nas organizações (na Unidade II, veremos com mais detalhes as atribuições e responsabilidades de todos os agentes envolvidos na governança das empresas atualmente): Quadro 1 – Relatório Cadbury Agentes da governança Principais atribuições e responsabilidades Conselho de Administração Reuniões regulares Conselheiros externos independentes Monitoração da Diretoria Executiva Equilíbrio de poder e autoridade Conselheiros não executivos Maioria dos membros independentes da direção Membros eleitos por mandatos determinados Verificações sobre estratégia, desempenho, destinação de recursos da empresa e padrões de conduta Ausência de conflitos de interesse entre seus participantes Conselheiros executivos Membros com atuação por três anos, no máximo Remunerações dos membros divulgadas de forma clara e objetiva Permitida participação de membros da Direção Executiva Auditoria (relatórios e controles) Auditores com relação objetiva e profissional Implantação de um comitê de auditoria com clara definição de autoridades e responsabilidades Relatório dos auditores deve ser verificado e ter o registro dos conselheiros Adaptado de: Rossetti e Andrade (2014, p. 172). 1.1.3 Princípios da OCDE A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) é um organismo internacional composto de mais de trinta países com o intuito de “trabalhar para construir melhores políticas para a 14 Unidade I melhoria da qualidade de vida” (OCDE, s.d.). Ela, portanto, dedica-se a encontrar soluções que auxiliem os países nos mais variados contextos, desde econômicos e financeiros até sociais e ambientais. Assim, a OCDE, desde o final dos anos 1990, passou a ter interesse nas questões referentes à governança corporativa, visto que havia o sentimento da necessidade de que tais princípios fossem estabelecidos e aplicados nas empresas ao redor do mundo, especialmente em um mercado globalizado, com maior eliminação de barreiras entre os países e investimentos sendo realizados pelas pessoas em qualquer mercado de capital. Melhores práticas de governança corporativa Crescimento das empresas Desenvolvimento dos países Mercado de capitais Figura 1 – Razão essencial do interesse da OCDE em governança Adaptada de: Rossetti e Andrade (2014, p. 174). A figura anterior apresenta, de forma clara, a tríade mercado-corporações-nações, que é a base do interesse da OCDE pelo tema de governança corporativa, uma vez que se está em um mercado capitalista, que necessita preservar e ampliar o fortalecimento de tal elo. Com isso, em 1999, o grupo formado pela OCDE para a criação de um trabalho apresentou os princípios da governança corporativa, que foram aprovados pelo organismo e tornaram-se a referência para todas as empresas no mundo, proporcionando as orientações gerais para iniciativas específicas de regulação. Mais tarde, foram feitas as revisões necessárias para a atualização desses princípios, acompanhando as mudanças constantes do mercado pelo mundo, porém mantendo suas bases: • Enquadramento das empresas: as empresas devem buscar as melhores práticas de governança corporativa, sendo elas sociedades anônimas ou não, promovendo a integridade e a transparência de suas informações. 15 GOVERNANÇA CORPORATIVA • Direito dos acionistas: as empresas devem criar conselhos e outros órgãos em sua estrutura organizacional, a fim de que protejam os direitos de todos os seus acionistas. • Tratamento idêntico aos acionistas: as empresas devem assegurar tratamento equânime aos acionistas, sejam eles majoritários, sejam eles minoritários (nacionais ou estrangeiros), dando acesso às suas informações de maneira ampla, regular e de modo confiável. • Divulgação e transparência: as empresas devem possuir governança para que assegurem que todos os fatos relevantes (tais como: balanços e demonstrações de resultado, objetivos e estratégia das empresas, entre outros) sejam divulgados de forma precisa e oportuna. • Responsabilidades dos Conselhos de Administração: a empresa terá, em seu modelo de governança corporativa, todas as atribuições e responsabilidades de seu Conselho de Administração definidas de forma clara e objetiva, sendo passível de fiscalização para casos de conflitos de interesse e tomada de decisões. • Gestão de riscos: a empresa deve garantir a identificação e a classificação dos riscos em suas ações e estratégias, considerando as origens, o grau de impacto, o tipo e a probabilidade de ocorrência, criando estruturas internas que possam monitorar e gerenciar esses riscos. • Avaliação da governança: a empresa deve possuir métodos estruturados que avaliam sua própria governança corporativa por meio de mecanismos de controle e auditoria com vistas a tomar as ações corretivas e preventivas necessárias. A OCDE continua atuando fortemente para que os princípios sejam seguidos pela maioria das empresas, atualizando dados necessários para as situações e novidades que surgem (como no caso da crise financeira de 2008 – Crise do subprime –, que originou uma nova revisão com outras recomendações, baseadas nas situações e falhas verificadas nas governanças corporativas daquela crise). Posteriormente, apresentaremos com mais detalhes tais erros no capítulo 7 deste livro-texto. Saiba mais Você sabia que o Brasil é um parceiro-chave da OCDE e possui uma cooperação mutuamente benéfica com este organismo internacional? Para entender integralmente como funciona essa parceria, acesse: ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT (OCDE). Uma cooperação mutuamente benéfica. OCDE, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3ruU1FE. Acesso em: 23 jul. 2021. 16 Unidade I 1.1.4 Lei Sarbanes-Oxley O quarto pilar da moderna governança corporativa é a Lei Sarbanes-Oxley, idealizada por dois congressistas americanos em 2002, Paul Sarbanes e Michael Oxley, que criaram uma série de medidas regulatórias para que as empresas fossem obrigadas a seguir, baseadas nas boas práticas de governança. A lei foi criada em resposta a escândalos financeiros que ocorreram nos Estados Unidos e que afetaram a vida de milhares de acionistas minoritários, agindo, portanto, para garantir os seus direitos e evitar a fuga de capitais do forte mercado acionário americano. Com ela, foram direcionados os seguintes princípios para as empresas, que têm a obrigatoriedade de atenderaos seus requisitos: • A governança corporativa deve verificar as conformidades legais e éticas das empresas. • A alta administração da corporação deve se responsabilizar pela prestação adequada das contas e dos resultados, efetuando a indicação dos encarregados pelas informações. • A instituição deve ser responsável pela total transparência e veracidade das informações disponibilizadas às partes interessadas. • A empresa deve tomar decisões estratégicas e administrativas pautadas na ética, no senso de propósito e no senso de justiça. Apresentaremos mais detalhes sobre a Lei Sarbanes-Oxley, incluindo seu histórico, detalhes, vantagens e procedimentos quando estudarmos acerca das exigências legais na Unidade II deste livro-texto. 1.2 Fatores determinantes da evolução do capitalismo Já vimos os quatro pilares históricos da governança corporativa e entendemos que seus conceitos e importâncias surgiram devido ao crescimento exponencial de algumas empresas nos últimos anos e da importância de informações, resultados e tratativas nos mercados financeiros de todo o mundo, interferindo direta e ativamente nas economias das nações. Observação O desenvolvimento, o aprimoramento e a evolução do capitalismo e das corporações interferem diretamente na busca pelas melhores práticas por conta das organizações. Esse processo evolutivo levou ao que chamamos de despertar da governança corporativa. Devemos nos atentar, portanto, para os fatores determinantes da evolução do capitalismo, para que fique mais clara a importância de os conceitos administrativos e estratégicos das empresas terem sido direcionados para a governança corporativa e todos os seus princípios e códigos de melhores práticas. 17 GOVERNANÇA CORPORATIVA Vamos apontar oito fatores determinantes que levaram ao agigantamento das corporações de forma cronológica, fato que acabou por resultar em um processo de separação entre a propriedade e a gestão, ou seja, verificamos que a administração estratégica das empresas atuais não necessariamente está nas mãos de seus donos. 1.2.1 Ética calvinista: séculos XVI e XVII João Calvino foi um teólogo cristão francês do início do século XVI. Ele participou de um movimento religioso protestante com base na conciliação entre a vida espiritual e religiosa com a vontade e o impulso empreendedor da época. Importante lembrar que naquele momento o mundo vivia a descoberta do Novo Mundo (as Américas), bem como via o aprofundamento do Renascimento, fazendo com que as pessoas buscassem o enriquecimento por meio do seu trabalho. A ética calvinista, ao contrário do ideal cristão, apresentava a vocação para o empreendimento produtivo através de ligação direta com a religiosidade, porém considerando que “a energia empresarial passou a ser vista, aos olhos calvinistas, como uma inviolável e sagrada determinação divina” (ROSSETTI; ANDRADE, 2011, p. 33). Tal manifestação religiosa, sem dúvida, fornece um impulso considerável para a evolução do conceito e da prática capitalista na economia. 1.2.2 Doutrina liberal: século XVIII O segundo fator determinante para o capitalismo foi o pensamento liberal que se desenvolveu a partir da segunda metade do século XVIII. Por meio dessa doutrina, podemos observar uma nova organização das forças produtivas que veio acompanhada de uma profunda alteração social, com a mudança exponencial na capacidade inventiva e produtiva da humanidade. Deve ser lembrado que, até esse momento, havia um prevalecimento da autocracia e do domínio atuante de um Estado forte, regulador e interventor na economia das pessoas e, consequentemente, das nações. Em 1776, a publicação do livro de Adam Smith chamado A riqueza das nações trouxe as ideias da mão invisível do mercado, que determina que o próprio sistema econômico se autorregula sem a necessidade de um Estado forte e interventor, associada a novas ideias que surgem com movimentos em várias partes do mundo, como a Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos da América, trazem a propriedade privada, o empreendedorismo e a livre concorrência como condições essenciais para a nova economia – o capitalismo. 1.2.3 Revolução Industrial: século XVIII e XIX A Revolução Industrial foi um período de enorme desenvolvimento das empresas que teve início no Reino Unido com o surgimento da máquina a vapor, por volta de 1760. Ela atendeu principalmente às empresas do setor têxtil, uma vez que o maquinário alterava a forma de produção, antes artesanal, para um processo de industrialização e produção em série. 18 Unidade I Ela provocou mudanças substanciais na economia mundial, aumentando a capacidade produtiva, trazendo lucratividade e riqueza jamais vistas anteriormente, ampliando a visão capitalista. Assim, a Revolução Industrial favoreceu a sociedade capitalista por meio de diversos fatores, conforme apresentam Rossetti e Andrade (2014, p. 35): A indústria de bens de capital, na esteira do desenvolvimento do setor siderúrgico e da difusão do vapor como força motriz, promoveu uma veloz substituição dos artesanatos e das corporações de ofícios pela manufatura fabril. A produtividade do trabalho aumentou com espantosa rapidez, a diversidade dos bens finais ampliou-se como jamais havia ocorrido e as oportunidades de investimento se multiplicaram. Complementando estes movimentos, estabeleceram-se novas exigências de implantação de infraestrutura, como a do transporte ferroviário e do setor naval, que suportassem os novos níveis de produção, a interligação dos mercados internos e o comércio internacional. Consequentemente, a Revolução Industrial deu início ao surgimento da produção em série em grandes escalas, que é o quarto fator determinante do capitalismo. 1.2.4 Produção em série e novas escalas: século XIX Com o surgimento das novas tecnologias apresentadas durante o processo da Revolução Industrial, vemos no século XIX o avanço das escalas de produção, provocando de forma contínua e permanente a diversificação da indústria e a produção em série, fatores que podem ser verificados nas empresas até os dias de hoje. Podem ser apontados como principais exemplos do avanço industrial e de suas consequências o aumento expressivo da produção de ferro e carvão, a expansão das ferrovias em vários países europeus e nos Estados Unidos da América, a estrutura portuária em acelerado crescimento devido ao aumento expressivo do transporte marítimo (na Inglaterra, em menos de cinquenta anos, os volumes transportados passaram de algumas centenas de toneladas para mais de 3 milhões de toneladas por ano), e os primeiros passos da indústria automobilística. Também pode ser verificado que esses passos levaram ao surgimento de outras invenções no século XX, ideias que alteraram significativamente a vida das empresas e das pessoas, tais como: a energia elétrica, as telecomunicações, as indústrias química, farmacêutica e alimentícia, além do petróleo e de toda a sua cadeia industrial. 1.2.5 Capital como fator de produção Após a Revolução Industrial e a alteração dos meios de produção e distribuição dos produtos, a indústria surgiu como parte da formação de riqueza nacional, antes dominada pela terra por meio da produção agrícola. 19 GOVERNANÇA CORPORATIVA Conforme Rossetti e Andrade (2014), com as indústrias originou-se uma nova classe econômica dominante formada pelos donos das empresas fabris, bem como pelos empreendedores dos setores de logística nos portos e nas ferrovias, produzindo impactos sociais, econômicos e institucionais, tais como: • Surgimento e crescimento exponencial do trabalhador assalariado. • Criação da economia de escala com o aumento da produtividade e a redução dos custos médios de produção. • Elaboração dos mercados de massa e da redução dos preços dos produtos. • Aparecimento das fusões e aquisições de empresas para a formação das grandes companhias. • Regulação das relações econômicas e condições para a formação das sociedades anônimas. Portanto, taisalterações acabaram por afetar de forma significativa a formação das empresas e os conceitos de administração. 1.2.6 Sistema de sociedade anônima: século XIX e XX Com o aparecimento das indústrias com a Revolução Industrial e o capital sendo direcionado para a produção, começou a ser amplamente utilizado, nos últimos anos do século XIX, o sistema acionário, uma vez que parte dos novos empreendedores era de origem humilde e necessitava de capital para criação e ampliação de suas fábricas, que se utilizavam de novos inventos, materiais e formas de produção. As sociedades anônimas já eram conhecidas desde o século XVII, porém com a ampliação dos processos produtivos, principalmente nos setores têxtil, ferroviário e marítimo, elas foram levadas aos mais diversos setores econômicos durante o final do século XIX e início do século XX. Rossetti e Andrade (2014) apresentam que, em 1899, 66,7% dos produtos manufaturados nos Estados Unidos da América vinham de sociedades anônimas. Contudo, em 1919, podíamos encontrar 87% da produção efetuada pelas empresas S.A. Tal crescimento leva à regulação legal por meio de códigos comerciais, ordenamentos jurídicos e leis efetuadas em diversos países: Intimamente associada ao desenvolvimento do sistema capitalista e do mundo corporativo, a sociedade anônima tornou-se mais do que uma forma de aglutinação de recursos para o crescimento dos negócios: ela foi um dos mais importantes instrumentos da organização social da propriedade. Como tal, em todos os países em que este instituto se estabeleceu, ele foi legalmente disciplinado com os objetivos de proteger os investidores de manobras expropriatórias, estimular o mercado de capitais e promover o crescimento das economias nacionais (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p. 44). As regulações em relação ao modelo de sociedade anônima, que cresciam vertiginosamente em vários países, surgiram para sanar as novas questões que se faziam presentes com a nova formatação societária. Observe esses aspectos a seguir: 20 Unidade I • A segurança do patrimônio dos acionistas investidores. • A diferença entre o capital investido pelos proprietários e pelos investidores no mercado de capitais. • A expectativa dos retornos nos resultados financeiros por meio da lucratividade nos processos produtivos das empresas. • O risco para a economia, com a possiblidade do aparecimento de uma crise que pudesse abalar a estrutura do mercado de capitais. O último item nos leva ao próximo fator determinante do capitalismo, que alicerça o despertar da governança. Observação Sociedade anônima é uma forma de empresa constituída por meio de uma instituição na qual o capital é formado por ações que podem ser negociadas na bolsa de valores e compradas pelos investidores, que se tornam acionistas da corporação, possuindo parte de seu capital. 1.2.7 O crash de 1929 Apesar das regulações efetuadas em quase todos os países que possuíam mercado acionário já no início do século XX, a sociedade anônima e o mercado de capitais encontraram sua crise nos Estados Unidos. Em 29 de outubro de 1929 houve a quebra da bolsa de valores nos Estados Unidos, fato que fez com que os banqueiros não tivessem forças para segurar a queda de todas as ações negociadas. Tal colapso foi o ponto-final em um processo que teve início em setembro daquele ano, com as ações subindo e descendo, algo sem precedentes, uma vez que sinais de problemas econômicos já eram sentidos nos Estados Unidos, porém ainda não haviam atingido o mercado de capitais. Esse setor sempre possui três denominadores comuns: a crença no mercado e na sua regulação, o incentivo do lucro e a euforia com o crescimento da riqueza. Eram exatamente esses itens que podiam ser encontrados nos Estados Unidos nos anos 1920, pois o país já estava entre as maiores potências econômicas mundiais naquela época. Houve euforia com as condições produtivas e econômicas, o que elevou os valores de boa parte das ações de forma exponencial, sem qualquer vínculo com a produtividade nos anos anteriores, fato que ocultou os problemas que estavam sendo sentidos por parte da população. Podem ser elencadas algumas causas para o crash: • Falta de demanda (procura): havia produtividade maior do que a possibilidade de compra da população, uma vez que os empregos não cresciam de forma exponencial quanto a produção das empresas nos mais variados setores da economia. 21 GOVERNANÇA CORPORATIVA • Concentração de renda: os mais ricos possuíam cada vez mais participação na riqueza gerada pela nação. • Especulação: havia a crença geral da população em relação à riqueza fácil com o aumento constante do preço das ações, levando a uma falsa sensação de possível enriquecimento sem esforço. • Imprudência: os mercados não tiveram prudência suficiente na tratativa de suas operações e negócios, pois era sabido que o crescimento das ações não tinha lastro produtivo ou de consumo. O crash levou o mercado, o sistema capitalista e o mundo corporativo a repensarem suas ações e regulações, bem como ampliou o interesse e a verificação da importância do planejamento, organização, direção e controle administrativo das empresas. 1.2.8 Ciência da administração: século XX O último fator determinante para o capitalismo, que possibilita o gigantismo das empresas e o aprimoramento das boas práticas de governança, foi o desenvolvimento da administração de empresas como ciência. O surgimento das empresas fabris após a Revolução Industrial e o aumento significativo de sua importância no mundo econômico trouxeram a administração a um novo patamar, pois foi verificada a necessidade de os processos administrativos serem cada vez mais eficientes, adaptando suas teorias e práticas de gestão. Assim, a administração evoluiu com o surgimento das teorias administrativas e suas características. Quadro 2 – Teorias administrativas e suas características Teorias Características principais Escola Clássica Taylor e Fayol Divisão de trabalho, estudo dos tempos e movimentos, e criação de normas administrativas Burocrática Max WeberRacionalidade e autoridade Relações Humanas e Comportamentais Elton Mayo Ênfase nas pessoas Produtividade – fator psicológico como influenciador Administração Estratégica Porter e Ansoff Visão de empresa como um todo Vantagens competitivas Qualidade Práticas japonesasQualidade total e círculos de controle de qualidade Teorias emergentes (sistemas e contingencial) Visão relativista Novos processos administrativos devido às alterações constantes do mundo externo Adaptado de: Rossetti e Andrade (2014, p. 55). 22 Unidade I O lado científico administrativo e a importância de um planejamento e de uma estrutura organizacional que possa atender às necessidades de todas as partes interessadas (stakeholders), tais como sócios, funcionários, clientes, fornecedores, governos, entre outros, são grandes alicerces para o despertar da governança no mundo corporativo. Neste ponto, já apresentamos todos os oito fatores que influenciaram o capitalismo e são a base para a governança, considerando principalmente o gigantismo e o poder das corporações nos dias atuais. 1.2.9 Gigantismo e poder das corporações Conforme Rossetti e Andrade (2014, p. 58), “impulsionado pelo conjunto de processos históricos que acabamos de descrever, o mundo corporativo registrou expressivos índices de crescimento ao longo de sua formação histórica”. Assim, após as duas Grandes Guerras, ainda durante o período da Guerra Fria, foi possível observar o crescente processo de concentração das empresas, muitas delas com receitas operacionais com valores superiores ao PIB (Produto Interno Bruto) de vários países do mundo, concedendo-lhes um poder econômico jamais visto anteriormente. Principalmente no ramo da tecnologia, algumas empresas possuem valor de mercado superior ao PIB da grande maioria dos países, por exemplo: Apple, Microsoft, Amazon e Facebook. Com isso, aumentou a necessidade da importância da governançacorporativa para que os investidores (sócios minoritários da empresa) pudessem ter a garantia de que a gestão da empresa, já dissociada do comando, teria planejamentos e ações que sempre tivessem como principal visão o aumento do capital e a valorização da companhia e, consequentemente, das suas ações no mercado acionário. Saiba mais Com o objetivo de verificar a comparação entre o PIB de alguns países e o valor de mercado da empresa Apple, acesse o site a seguir: KOLAKOWSKI, M. At $2.08 trillion, Apple is bigger than these things. Investopedia, 2021. Disponível em: https://bit.ly/3fnKdZA. Acesso em: 2 ago. 2021. Portanto, as instituições começaram a apresentar um processo de expansão e de importância na economia global inédito. Importante frisar que esse processo pôde ser verificado com maior clareza nos últimos anos por conta das empresas de tecnologia, porém teve início após a Grande Depressão em 1929, com o surgimento e/ou aprofundamento de fatores administrativos e econômicos, tais como: • Avanços tecnológicos: as constantes mudanças que surgem no mercado para as empresas com o desenvolvimento de novos produtos, serviços, processos e tecnologias. 23 GOVERNANÇA CORPORATIVA • Aburguesamento da sociedade: o aumento exponencial da classe média na maioria dos países capitalistas traz uma necessidade de oferta de bens e serviços cada vez maiores, ampliando a participação das empresas e abrindo espaços para melhores remunerações nos colaboradores administrativos de nível gerencial e estratégico. • Produção em série: a redução dos custos de produção e a consequente redução dos preços de venda para os clientes, por meio da consolidação do ganho de escala (com a utilização plena e eficaz dos fatores de produção pelas empresas), ampliou a manufatura em série de diversos itens. • Evolução do mercado de capitais: o crescimento e o desenvolvimento do mercado acionário nos mais diversos países do mundo direcionaram os recursos de investidores para os meios de produção com a compra de ações das empresas. • Aumento dos pequenos negócios (crescimento do empreendedorismo): escalada crescente de pequenas empresas com a percepção da importância do empreendedor na economia da nação e na criação de vagas de empregos. • Transnacionalização das empresas: nas últimas décadas, pôde-se perceber uma expansão internacional das empresas, com suas atuações em todos os continentes do globo, ampliando seus mercados consumidores e ofertando novos produtos e serviços. • Relação entre poderes políticos e econômicos: países que possuem empresas de dimensões gigantescas e grande crescimento de faturamento, lucratividade e valor de mercado têm criado medidas de proteção, facilitando a expansão dessas organizações. As maiores empresas, com isso, tendem a concentrar boa parte do Produto Nacional Bruto (PNB) dos seus países de origem (em sua maioria, países desenvolvidos economicamente), provocando não somente um aumento da participação do mercado financeiro na economia – principalmente o de capitais –, mas podendo impactar de forma negativa os países desenvolvidos por meio de um desastre econômico gerado por fraudes e/ou falências, que seriam danosos para toda a cadeia produtiva direta e indiretamente ligada ao seu segmento de mercado. Tal impacto pode afetar não somente a economia local, como outras de diversos países, provocando uma fuga de capitais semelhante àquela percebida durante a crise econômica de 2008, que abateu o mercado financeiro americano no momento do estouro da bolha imobiliária, causado por meio de negociações com títulos subprime (hipotecas de alto risco que foram ofertadas para pessoas que não possuíam ativos, empregos fixos e renda suficiente para quitação das dívidas acumuladas), levando à falência o banco de investimento tradicional Lehman Brothers, fundado em 1850. Na tabela a seguir, podemos ver a expansão histórica das quinhentas maiores companhias nos EUA em relação ao seu PNB: 24 Unidade I Tabela 1 Valores em bilhões de US$ (dólares dos Estados Unidos da América) 1960 1980 1995 2013 Produto Nacional Bruto 518,9 2.725,4 7.325,1 16.800,0 Receitas das 500 maiores empresas 197,4 1.436,0 4.228,7 12.210,5 % das receitas em relação ao PNB 38,0 52,7 57,7 72,7 Adaptada de: Rossetti e Andrade (2014, p. 142). Em resumo, vimos que as principais empresas saltaram, em um período de pouco mais de cinquenta anos, de 38% para 72,7% de participação no PNB, ou seja, elas compõem quase 3/4 do total produzido no país. Tal situação resultou, diretamente, no processo de dispersão de capital e na separação entre a propriedade e a gestão das empresas. 1.2.9.1 Dispersão do capital Com o aumento da participação das empresas na economia, há a pulverização do capital da sociedade, que aumenta de forma exponencial o número de acionistas interessados no crescente valor de mercado. Tal feito também proporciona a elevação da importância e da participação do mercado de capitais na economia, levando o governo, as instituições e as próprias empresas a um controle maior de seus atos administrativos, provocando a busca pelas boas práticas de governança. Essas situações geram uma série de fusões e aquisições entre as grandes companhias, que levam aos ajustes de controle e garantias dos acionistas minoritários (que veremos mais detalhadamente durante o estudo dos princípios da governança corporativa) e/ou fazem com que as empresas assumam processos de sucessão com procedimentos administrativos testados e aprovados no mercado. Nesta última, vemos que, aos poucos, as companhias percebem a necessidade da separação entre o proprietário (sócios-fundadores e seus familiares) e as pessoas responsáveis pela gestão administrativa do negócio. 1.2.9.2 Separação entre propriedade e gestão A dispersão da propriedade, que surge com o gigantismo das corporações e as necessidades de atender aos desejos e anseios do mercado e das demais partes interessadas (stakeholders), provoca uma série de transformações importantes nas organizações. São elas: • Os fundadores das empresas e seus sucessores não mais participam diretamente da administração, criando Diretorias e Conselhos de Administração que cuidam dos planejamentos estratégicos e das ações administrativas, reduzindo a participação da propriedade no controle e comando. • Os objetivos da empresa se ampliam além dos fatores econômicos (como a maximização dos lucros), atingem a responsabilidade socioambiental, o respeito aos acionistas e às demais partes interessadas, reduzindo conflitos internos e riscos desnecessários por falta de planejamento. 25 GOVERNANÇA CORPORATIVA • A busca pela redução dos conflitos de interesse que podiam ocorrer no caso de a propriedade estar diretamente vinculada à gestão, dando ênfase a questões individuais em detrimento da valorização e perpetuidade da organização. Todos os fatores determinantes da evolução do capitalismo levaram as empresas à busca de novas estruturas e conceitos que pudessem assegurar sua continuidade em um mercado altamente globalizado e competitivo, também visando à valorização da empresa, não somente em conceitos financeiros e contábeis. Assim, podemos afirmar que a governança corporativa desperta como um dos principais movimentos para que as empresas possam atingir os requisitos desejados por elas mesmas e pelo mercado, tendo como grandes impulsionadores as mudanças macroeconômicas com o avanço do capitalismo para a grande maioria das nações, bem como os realinhamentos estratégicos e organizacionais, visto que ela se torna parte dos objetivos principais das organizações. 2 OBJETIVOS DAS ORGANIZAÇÕES Toda e qualquer empresa possui uma lista de partes interessadas (stakeholders) que fazem parte direta ou indiretamente do seu negócio, sendo uma força atuante no processo administrativo. 2.1 Interesses das partes Os interesses dessas partes são legítimos e devem ser compreendidos pela empresa, pois é fator crítico de sucesso no mundo empresarial que osobjetivos da sociedade estejam alinhados a tais interesses, trazendo crescimento sustentável em longo prazo. Vimos que, em muitas empresas, já houve a separação entre a propriedade e a gestão, pois há o ideal de que a gestão esteja ciente das necessidades e dos desejos vindos do mundo externo, o que cria uma corporação com responsabilidade social e ambiental e torna esse sentimento fortemente arraigado em seu planejamento estratégico. Não se pode esquecer que os sócios são as pessoas que assumiram riscos (uma vez que utilizaram parte de seu capital para participarem como acionistas) com o intuito de maximizar o retorno de seus investimentos. Na qualidade de sócios, incluindo nesse espectro os acionistas minoritários, seus interesses serão avaliados de forma econômica, porém com visão de longo prazo, para que seu capital possa ter ganho significativo. Eles saberão que não somente recursos financeiros serão a tônica do processo de valorização do capital, uma vez que o mercado exigirá da empresa que seus lucros sejam consistentes, porém sustentáveis. Se tal retorno, pelos mais diversos motivos, não for entregue, o acionista negará recursos futuros, ou até mesmo deixará de ser participante da sociedade, vendendo suas ações, levando a sociedade a uma redução significativa de seus negócios, podendo causar problemas futuros irreparáveis. Portanto, observamos que o mercado – além de mais globalizado, competitivo, exigente e disruptivo – estabelece uma complexa teia de relações que não deve ser deixada de lado pelas empresas. Os atuais gestores precisam estar cientes da realidade do mundo corporativo atual, que exige das instituições uma série de outros quesitos tão importantes quanto seus retornos financeiros. Podemos citar, como exemplo, 26 Unidade I o investimento de impacto, que busca retorno financeiro, porém com resultados socioambientais bem detalhados por meio de indicadores criados para tal fim. Assim, são criados instrumentos de mercado direcionados para atingir esses objetivos, que trazem possiblidade de aumento de recursos para as empresas comprometidas em sua estratégia com as questões tanto sociais quanto ambientais. A gestão atuante da sociedade verificará os legítimos interesses de todas as partes envolvidas, considerando que: • Proprietários e investidores: possuem o interesse de aumentar seu capital pela valorização de seu investimento (crescimento do valor da ação e/ou distribuição dos dividendos). Para que isso ocorra, assumem riscos financeiros e esperam que a gestão efetue a administração para tal fim. • Colaboradores: neste grupo devem ser incluídos desde a Direção Executiva e os Conselhos de Administração até os empregados do nível operacional da empresa. Em qualquer nível, espera-se o retorno por meio dos salários, bonificações, benefícios, oportunidades de crescimento na carreira profissional e segurança. Os líderes, no grupo, são importantes para a consolidação e o entendimento dos objetivos da organização, que devem ser comunicados a todos de forma clara, simples, eficaz e transparente. • Fornecedores e clientes: ambos estão no grupo dos integrados à cadeia de negócio e referem-se às etapas de entrada e saída do macroprocesso organizacional. Enquanto fornecedores têm interesse para que a parceria seja mutuamente benéfica, trazendo crescimento e desenvolvimento conjunto das empresas, os clientes sempre demandam produtos e/ou serviços confiáveis, de qualidade e com sua proposta de valor bem alinhada a seu preço de venda, ou seja, a preços justos. • Credores: este grupo específico, também integrado à cadeia de negócios da organização, deseja resultados positivos constantes e consistentes nos quais parte dos recursos financeiros serão direcionados para a liquidação das dívidas contratadas (aqui, podermos incluir ainda alguns fornecedores, uma vez que eles também representam a parte dos credores da empresa, principalmente quando efetuam vendas a prazo). • Comunidades locais: este grupo, que está no entorno da companhia, tem interesse direto, principalmente em dois aspectos que atuam como força direta na gestão do negócio – a geração de empregos nas comunidades próximas ao local da empresa e no tratamento que ela assume em relação ao impacto ambiental causado por sua atividade. Podemos usar como exemplo do último item as empresas que liberam gases poluentes para a atmosfera, causando impacto nas comunidades próximas. Assim, as instituições que atuam na prevenção dos impactos gerados agem em prol de um desenvolvimento sustentável. • Sociedade, governos e ONGs (organizações não governamentais): há outros grupos no entorno das atividades empresariais que também têm interesses, tais como: bem-estar social, conformidade legal, preservação ambiental etc. Pode-se concluir que a governança corporativa tem como foco atender às lógicas micro e macroeconômicas, sempre com o intuito de manter o crescimento sustentável com vistas à perenidade. 27 GOVERNANÇA CORPORATIVA 2.2 Lógicas micro e macroeconômicas das empresas Para entender melhor as lógicas que envolvem o processo da governança e que estão diretamente vinculadas aos objetivos principais de toda e qualquer organização, vamos estudar as questões financeiras, os riscos assumidos, a gestão e os conflitos de agência, bem como os itens macroeconômicos que envolvem esse processo. 2.2.1 Lógica financeira A parte financeira do processo é simples de ser compreendida, porque se trata do conceito fundamental do capitalismo. O capital empregado em uma empresa tende a exigir seu retorno por meio de lucros constantes e sustentáveis. Esse lucro será gerado sempre que a gestão da empresa trabalhar de forma a ofertar produtos e/ou serviços que estejam entre os desejos e as necessidades do mercado consumidor. Desta forma, terá maior participação no mercado, aumentando suas vendas e, diretamente, ampliando seu ganho financeiro. Assim, a administração deve traçar as estratégias que conduzam a este fim. A gestão não deve esquecer que possui responsabilidades além do econômico-financeiro, até porque será exigência do mercado – uma vez que todas as partes interessadas atuam fortemente sobre a empresa–, mas deve ter como premissa que seus acionistas (majoritários ou minoritários) são a peça-chave para a existência e a permanência da instituição no mercado, pois são eles que assumem os riscos. 2.2.2 Lógica dos riscos assumidos Os riscos assumidos pelos investidores estão intrinsicamente ligados à lógica financeira e devem ser entendidos como objetivo fundamental para a gestão em sua estratégia. Apesar de o retorno no capital investido ser incerto (e por isso o mercado acionário é conhecido como renda variável, pois ela pode tanto aumentar quanto diminuir ao longo do tempo), ele é inquestionável, ou seja, as empresas precisam trabalhar para o cumprimento das metas e dos objetivos estabelecidos e comunicados, que são parte dos motivos que levaram os acionistas a se tornarem sócios da instituição. Quando consideramos que uma pessoa efetua a compra de ações de uma empresa na bolsa de valores com vistas à maximização do valor investido ao longo do tempo, parte das motivações surge das informações transparentes que a companhia forneceu ao mercado. 2.2.3 Lógica da gestão A empresa precisa ter em sua gestão pessoas capacitadas profissionalmente para que a conduzam ao caminho do sucesso ao longo do tempo. Portanto, uma corporação que efetue a gestão estratégica em seus Recursos Humanos, contratando e capacitando seus colaboradores, formará uma estrutura de gestão capaz de impulsionar os negócios. A administração da instituição deve sempre ser direcionada a atender os objetivos estabelecidos, com uma inter-relação ampla e produtiva não somente entre os setores, mas entre os níveis estratégico, tático e operacional. Não podemos deixar de mencionar que as empresas, que já são ativas em diversas 28 Unidade I partes do mundo, precisam alinhar sua administração para atenderaos requisitos locais sem esquecer das metas globais e de suas relações internas e externas. 2.2.4 Lógica do conflito de agência Por fim, ainda em relação às questões internas da empresa, ou seja, das lógicas microeconômicas, devemos mencionar os conflitos de agência que poderão existir durante a ação dos gestores em seus processos administrativos. Para que os objetivos sejam atendidos conforme desejado pelas partes interessadas, a gestão precisa possuir bonificações e benefícios que estejam diretamente vinculados ao retorno do capital investido, porém tais condições podem levar a problemas vinculados a ações estratégicas com objetivos não transparentes ou mesmo a fraudes e outros problemas vinculados. O conflito de agência será estudado com mais detalhes posteriormente. 2.2.5 Lógicas macroeconômicas Tem-se ainda as questões macroeconômicas, que levam as empresas para a governança corporativa a fim de que seus objetivos possam ser alcançados de forma mais eficaz. Quanto mais os quesitos envolvendo a gestão, os riscos e as finanças das empresas forem tratados de forma completa, eficaz e transparente, melhor será possível atender às demais partes interessadas que fazem parte das forças externas das organizações. Será assim que a governança auxiliará o mercado para manter as economias atuantes de forma sustentável. Consequentemente, podemos a partir de agora focar nos conceitos da governança corporativa e em seus modelos nos principais países do mundo e no Brasil. 3 DEFINIÇÕES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA Foram apresentadas as origens e as motivações que levaram as empresas e o mercado às boas práticas de governança corporativa. Sabemos que com o crescimento do capitalismo no mundo, associado ao gigantismo das sociedades e às novas realidades em um conceito mais dinâmico, globalizado e disruptivo de mundo corporativo, a governança surge como uma prática a ser desenvolvida pelas instituições, tornando-as, desta forma, corporações que buscam sua perpetuidade, com retorno do capital investido pelos proprietários e/ou acionistas, porém com atenção também focada na responsabilidade social corporativa. 3.1 Definições Governança corporativa pode ser definida, então, como: Conjunto de práticas administrativas para otimizar o desempenho das empresas – com seus negócios, produtos e serviços – ao proteger, de maneira equitativa, todas as partes interessadas – acionistas, clientes, fornecedores, credores, funcionários, governos –, facilitando o acesso às informações básicas da empresa e melhorando o modelo de gestão (OLIVEIRA, 2011, p. 16). 29 GOVERNANÇA CORPORATIVA Na definição é possível encontrar todos os princípios da governança (que serão estudados mais profundamente no próximo capítulo) associados a um modelo de gestão que possui suas práticas, ferramentas e normas que conduzem as empresas para sua sustentabilidade no mercado, gerando mais confiança nas relações com todos os stakeholders (partes interessadas). Em toda a história da administração, sempre foi possível verificar que novas práticas e métodos eram criados, desenvolvidos e implantados pelas organizações, buscando atender os novos anseios que surgiam na sociedade. Foi assim durante a criação das estruturas organizacionais e dos estudos de tempo e movimento, idealizados por Fayol e Taylor, respectivamente. Com o tempo, vieram as necessidades humanas, pois houve aumento do mercado de trabalho nas diversas empresas e a percepção da importância dos recursos humanos trabalhando em prol dos funcionários, que mais tarde foram considerados pelas corporações como colaboradores). No mesmo caminho evolutivo da administração, por conta dos aspectos que vimos anteriormente, a governança é desenvolvida e assumida pelas empresas para as novas etapas do processo evolutivo do mercado. Portanto, os administradores responsáveis pela gestão das sociedades precisam ter ferramentas que auxiliem na tomada de decisões que atenderão aos quesitos de todo o mercado, bem como necessitam comunicar de forma clara e transparente suas ações aos acionistas e às demais partes. A governança atua como um sistema dentro da estrutura organizacional da empresa, que amplia e fornece credibilidade às decisões da organização. Como descrito no Código das melhores práticas de governança corporativa do IBGC (2015, p. 20): Governança corporativa é o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e demais partes interessadas. As boas práticas de governança corporativa convertem princípios básicos em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum. A governança não deve ser verificada como uma forma de engessamento ou burocratização do processo administrativo, mas como recomendações que as instituições podem seguir para atingir mais facilmente seus objetivos de longo prazo, ampliando sua proposta de valor. Importante ressaltar que algumas dessas práticas já estão inseridas em leis e normas que implicam a obrigatoriedade do atendimento de certas determinações. Com o estudo do imperativo das normas ainda nesta unidade, haverá uma compreensão clara das obrigatoriedades para as organizações que queiram participar do mercado acionário nos mais diversos países, por exemplo. 30 Unidade I Conforme Rossetti e Andrade (2014), a governança pode ser vista nas empresas, como: • Guardiã de direitos: ao utilizar o sistema de governança corporativa na organização, ficam assegurados os direitos dos acionistas majoritários e minoritários de forma idêntica, bem como também são garantidos os direitos de todas as partes interessadas por meio da vinculação estratégica da empresa com suas responsabilidades sustentáveis a longo prazo. • Sistema de relações: criando-se uma estrutura organizacional que integre os atores da governança com seus papéis, poderes e atribuições bem definidos e controlados, a empresa apresenta os caminhos corretos para as tomadas de decisões que interferem direta ou indiretamente em sua participação no mercado, transformando-se em uma companhia confiável e perene. • Estrutura de poder: com os papéis e poderes bem estabelecidos, ampliando e atuando diariamente nas estruturas de auditoria e controle, as decisões e a liderança da empresa serão direcionadas ao atendimento dos objetivos traçados em sua estratégia corporativa. • Sistema normativo: apesar de não ser uma exigência para as empresas, ao assumir as práticas administrativas direcionadas pelo sistema de governança, elas trazem os quesitos e princípios básicos da boa prática de governança para suas normas internas. Além disso, ratifica-se que a governança se expandiu para leis e normas externas em várias partes do mundo para ampliar e incentivar o crescimento do mercado de capitais. Com isso, percebemos que as empresas sempre buscarão o máximo retorno total de longo prazo para seus sócios, mas para tal precisam iniciar um processo que envolve sua gestão estratégica e seus objetivos, atuando de forma a efetuar as ações administrativas necessárias para tal, com criação de vantagens competitivas e de estruturas organizacionais que a conduzam ao sucesso. Na figura a seguir, pode-se entender melhor o caminho trilhado pela empresa para atingir o retorno esperado pelos acionistas/proprietários, considerando as ações estratégicas que envolvem as decisões e as boas práticas de governança: Alocação dos recursos Redução de custos Resultados corporativos Máximo retorno total de longo prazo Gestão estratégica das demandas Objetivos e foco gerencial Vantagens competitivas Gestão da estrutura e dos processos organizacionais Figura 2 – Caminho para a governança Adaptada de:Rossetti e Andrade (2014, p. 131). 31 GOVERNANÇA CORPORATIVA O caminho trilhado pela empresa para atingir seu objetivo de retorno no longo prazo e, portanto, sua perpetuidade, deve passar necessariamente pelo planejamento estratégico com a criação de objetivos que serão as bases administrativas para que a organização tenha vantagem competitiva, estrutura organizacional focada nesses objetivos e sequência processual a fim de atingir o planejado. Esta estrutura, criada e aprimorada por meio de normas e ferramentas do sistema de governança, levará a alta administração a tomar decisões estratégicas com alocação eficaz de recursos, redução dos custos empresariais e criação de resultados positivos e estimulantes para o retorno de longo prazo. Enfim, a governança se apresenta como o sistema que cuidará para que a empresa atinja as boas práticas e possa ter crescimento sustentável. Sua definição fica clara e ela passa a ser utilizada em diversos países que criaram seus próprios modelos para atender às características econômicas e sociais de tais nações, considerando diversos aspectos, tais como: financiamento, propriedade, controle, proteção aos minoritários, liquidez e abrangências dos modelos de governança. 3.2 Modelo de governança anglo-saxão O primeiro modelo de governança que será estudado é o anglo-saxão, que, segundo Rossetti e Andrade (2014), tem como foco principal a pulverização do controle acionário e a separação da propriedade e da gestão. Esse modelo pode ser verificado em vários países com os mesmos moldes, mas com pequenas alterações situacionais. 3.2.1 Estados Unidos Com o crescimento e o desenvolvimento econômico dos Estados Unidos, principalmente no final do século XIX e início do século XX, começaram a surgir as grandes empresas fabris, que tornam a sua administração mais complexa e focada para atender aos anseios do mercado acionário, que já era forte no país antes da crise de 1929. Assim, o aumento da procura de renda variável como investimento por parte dos acionistas (minoritários, em sua maioria) sempre fez parte da cultura econômica e social norte-americana, que é uma tremenda força externa para que as empresas estabeleçam práticas de boa governança. Rossetti e Andrade (2014, p. 347) nos explicam sobre esses aspectos, cronologicamente, de forma bem detalhada: A propriedade dispersa, as tradições liberais e o monitoramento das companhias pelo mercado exigiam, em contrapartida, elevado grau de transparência das companhias, ausência de conflitos de interesse na composição de seu quadro de administradores (conselheiros e executivos), apuração de resultados rigorosamente auditados e controle de informações privilegiadas. Mas estas contrapartidas não se observaram ao correr do tempo. Acumularam-se vícios conflitantes com os interesses dos acionistas dispersos e distantes das companhias. Avolumaram-se as suspeitas de conflitos e de altos custos de agência, que acabaram por gerar o ativismo dos investidores institucionais por boas práticas de governança. 32 Unidade I Algumas falhas que foram vistas no modelo americano e precisaram de ajustes ao longo do tempo – inclusive com a criação da Lei Sarbanes-Oxley – serão mais bem estudadas na Unidade III, quando abrangermos os erros da governança corporativa. De toda forma, em uma país onde a participação acionária das pessoas sempre foi vista como uma das principais formas de investimento pessoal, a governança precisava assumir um modelo de grande proteção aos minoritários, com forças externas atuantes e direcionadas, destacando quatro pontos fundamentais no modelo: • Segurança: definição de indicadores internos mensuráveis e auditáveis que possam ser comunicados de forma transparente às partes interessadas, mitigando riscos de pânico e de contágio no mercado de capitais, provocando crises financeiras. • Agências de rating: controles externos que utilizam métodos de avaliação e, com isso, apresentam a classificação de risco que serve como balizador para os investidores. • Manutenção das carteiras: exigência de que parte percentual das carteiras dos investidores estejam sempre disponíveis no mercado para as compras e vendas diárias do mercado de capitais. • Remuneração de administradores: salários, bonificações e benefícios pagos para os responsáveis pela gestão e, portanto, pela tomada das decisões estratégicas da empresa, devem ser transparentes e dentro de parâmetros aceitáveis, que evitem e não incentivem ações fraudulentas. Pode-se concluir que o modelo americano de governança está em constante evolução para se adequar às realidades do mercado, mantendo sua consistência e credibilidade. 3.2.2 Reino Unido O modelo do Reino Unido é muito parecido com o estabelecido nos Estados Unidos, até mesmo porque, historicamente, há uma semelhança estrutural das corporações nesses dois locais. Assim como nos Estados Unidos, foram as pressões externas, associadas a alguns erros ocorridos ao longo dos anos, que levaram todo o mercado a buscar as boas práticas da governança. Algumas crises que ocorreram, desde o crash da bolsa em 1929 nos Estados Unidos até a crise financeira de 2008/2009 (subprime), atingiram diretamente o mercado do Reino Unido, levando-o a tomar ações muito próximas e, muitas vezes, em conjunto para reduzir problemas futuros. Apesar das semelhanças que existem entre os dois modelos, podemos destacar algumas diferenças entre ambos: • A separação completa entre as funções do presidente do Conselho de Administração e da Diretoria Executiva. • A presença constante dos conselheiros independentes, atuando de forma constante e obrigatória nas suas atribuições. 33 GOVERNANÇA CORPORATIVA • As informações obrigatórias que as empresas precisam fornecer de forma transparente a todas as partes interessadas, como seus fatores-chaves dos negócios e os riscos envolvidos em seus processos estratégico e operacional. 3.2.3 Canadá Pela proximidade geográfica e constante troca de materiais e informações entre os dois países desenvolvidos da América do Norte, o modelo de governança canadense possui semelhanças bem evidentes com o modelo americano, principalmente quando citamos as formas de regulação do mercado de capitais. Com a presença muito forte de empresas canadenses nas bolsas de valores americanas, a Lei Sarbanes-Oxley pode exibir a necessidade de atender a todos os normativos especificados. Ainda assim, o modelo canadense também apresenta algumas similaridades com aquele do Reino Unido, principalmente na forma de atuação do Conselho de Administração e de suas obrigações na estrutura organizacional criada para as boas práticas da governança. 3.2.4 Austrália Mais uma vez por motivos históricos, o modelo australiano é muito semelhante aos demais apresentados, tendo como principais distinções em relação aos padrões americano, inglês ou canadense: • A forma e os limites de remuneração dos gestores e conselheiros. • A formação do Conselho de Administração, dos comitês e demais conselhos corporativos. • A centralização da responsabilidade das auditorias internas e externas. 3.3 Modelo de governança alemão O modelo alemão, por sua vez, apresenta uma série de diferenças para com o anglo-saxão, visto que sua forma de orientação é focada no crédito bancário de longo prazo, que é a fonte de capitalização tradicional do mercado na Alemanha. Por ser um mercado no qual os bancos possuem um grande controle sobre todo o processo acionário, tendo uma estrutura patrimonial concentrada em grandes acionistas e bancos, as pressões são internas para que as empresas tenham um sistema de boas práticas. Boa parte dessas características estão diretamente ligadas à história da Alemanha no século XX, vinculada a duas grandes guerras mundiais, uma devastadora hiperinflação que culminou no surgimento de uma liderança autoritária com poder extremamente concentrado, seguida de uma divisão territorial pós-Segunda Guerra Mundial, que só foi resolvida após a queda do murode Berlim, no final de 1989, com a unificação das duas Alemanhas. Tais características levam a governança alemã a criar estruturas com interesses plurais e decisões mais democráticas e consensuais, conforme nos explicam Rossetti e Andrade (2014, p. 359): 34 Unidade I Por exigências regulatórias, as empresas com mais de 2.000 empregados têm conselhos compostos em duas camadas: são bicamerais. Os acionistas, os sindicatos e os empregados indicam os membros de um Conselho Supervisor (Aufsichtsrat), que indica os membros do Conselho de Administração (Vorstand). É este colegiado que monitora a gestão, homologando os planos estratégicos e exercendo o controle dos resultados das operações. Ainda assim, o modelo alemão evolui constantemente, uma vez que várias alterações ocorrem também no mercado, tais como: a integração dos países europeus com a União Europeia, o aumento exponencial da globalização dos mercados e a constante fusão e incorporação de empresas em todas as partes do mundo. Por isso, a Alemanha ainda criou regulamentos e normas para as suas empresas com vistas às boas práticas da governança corporativa, considerando algumas atitudes que aumentam a confiabilidade do mercado de capitais. Entre elas, podemos destacar a oferta de apenas uma classe de ações com direito ao voto, a transparência da tomada de decisões com comunicação constante a todas as partes interessadas, além da criação e implantação de códigos de conduta nas corporações. 3.4 Modelo japonês O modelo japonês está se adaptando às boas práticas de governança nos últimos anos, aplicando normas e estruturas que se assemelham aos modelos vistos, principalmente ao alemão, uma vez que seu mercado de ações é financiado também pelo mercado bancário, assim como na Alemanha. O aspecto mais importante a ser considerado aqui é a alteração brusca de cultura social que a governança impõe, principalmente quando consideramos a separação entre a propriedade e a gestão. A sociedade japonesa possui um sentido coletivo muito forte, bem como uma tradição sobre a propriedade da empresa, que é transmitida entre as gerações e que conduzem os códigos de ética e moral administrativa. Tanto que as forças que levam a governança nas empresas, em sua grande maioria, são internas, ou seja, suas necessidades partem da percepção da alta administração para acompanhar as mudanças constantes do mercado. Um dos exemplos é o tradicional Conselho de Administração das empresas, que é formado exclusivamente por pessoal interno que já tenha apresentado valores condizentes com os ideais empresariais, muitas vezes calcados no tempo de serviço (senioridade) e na capacitação técnica e gerencial (serviços prestados à instituição). Assim, o modelo japonês tenta conciliar a tradição com os novos rumos que as corporações devem trilhar no atual mercado globalizado e disruptivo. 3.5 Comparativo das governanças entre os países Para que possam ser verificadas as semelhanças e as diferenças entre os modelos de governança nos países apresentados, vamos estudar o quadro a seguir, que resume as características: 35 GOVERNANÇA CORPORATIVA Quadro 3 Características Modelo anglo-saxão Modelo alemão Modelo japonês Controle Dispersão Concentração Concentração com cruzamentos Propriedade e gestão Separadas Sobrepostas Sobrepostas Proteção legal a minoritários Forte Baixa ênfase Baixa ênfase Liquidez das ações Muito alta Baixa Em evolução Forças de controle mais atuantes Externas Internas Internas Governança corporativa Estabelecida Adesão crescente Ênfase crescente Abrangência dos modelos de governança Baixa Alta Alta Adaptado de: Rossetti e Andrade (2014, p. 344). 3.6 Governança no Brasil O Brasil também enfrentou as mudanças constantes de um novo mercado mais globalizado e de organizações cada vez mais gigantes e com mais importância na economia das nações. Por sua vez, as empresas perceberam a importância de seguir um modelo de boas práticas, seja por imposição do mercado, seja de normas e leis estabelecidas, ou por ação das partes interessadas nos processos estratégicos. Assim, forças internas e externas modelaram a governança em nosso país, considerando: • As leis governamentais, como a Lei das S.A., por exemplo. • A regulação da CVM (Comissão dos Valores Mobiliários – autarquia responsável para que os participantes do mercado acionário possam seguir as normas estabelecidas, fiscalizando tal atuação). • Os segmentos de listagem criados na B3 (bolsa de valores brasileira). • As alterações nas estruturas organizacionais, com a criação e implantação de órgãos participantes do processo de governança nas empresas. • O crescimento econômico brasileiro nos últimos anos, com a participação cada vez mais ativa das empresas no mercado de capitais. • As mudanças globais que interferem diretamente no mundo corporativo e na economia brasileira. 36 Unidade I Com isso, foi visto que o mercado acionário amplia sua atuação, direcionando as empresas para a governança, bem como outras instituições, a exemplo do IBGC. O IBGC foi fundado em 1995 por um grupo de empresários, conselheiros, executivos e estudiosos, com o intuito de fortalecer a atuação dos conselhos de administração. Seu primeiro nome foi Instituto Brasileiro de Conselheiros de Administração (IBCA), mas com a ampliação dos seus conceitos e a incorporação de outros quesitos (diretoria, auditoria etc.) se viu obrigado, em 1999, a alterar sua nomenclatura para a atual – IBGC. Seu propósito, conforme o Instituto Brasileiro de Direito e Ética (IBDEE, s.d.), é “ser referência em governança corporativa, contribuindo para o desempenho sustentável das organizações e influenciando os agentes de nossa sociedade no sentido de maior transparência, justiça e responsabilidade”. Desta forma, serve como um condutor e orientador das práticas de governança para as empresas brasileiras, criando o código e atuando fortemente por meio de ações, eventos, cursos e certificações. Por fim, deve-se ratificar as ações internas tomadas pelas corporações de forma voluntária com vistas a atender às necessidades do mercado e ampliar suas ações administrativas. É crescente, por exemplo, a participação das empresas nos segmentos de listagem da B3 que exigem altos níveis de governança corporativa, como o Novo Mercado, por exemplo. Sendo assim, o Brasil está vinculado de forma significativa aos principais mercados de capital do mundo por meio da constante atuação de leis, normas, regimentos, códigos e estruturas internas das organizações. 4 PRINCÍPIOS E VALORES DA GOVERNANÇA CORPORATIVA 4.1 Os quatro princípios Como visto anteriormente, a governança corporativa corresponde aos procedimentos e às estratégias administrativas de uma empresa para otimizar seu desempenho, sendo associada à proteção de todas as partes interessadas na forma mais equalitária possível. Com isso, pode-se afirmar que ela necessita de valores que darão “sustentação, amarrando concepções, práticas e processos de alta gestão” (ROSSETTI; ANDRADE, 2014 p. 140). Tais valores, também conhecidos como princípios da governança corporativa, foram desenvolvidos visando à mitigação de processos negligentes, danosos e/ou de corrupção nas ações empresariais por parte de seus líderes, pois essas atitudes geram diversos problemas no mercado, impactando negativamente não somente a instituição envolvida, mas todo o processo do mercado de capitais. Ações indevidas geram incertezas no mercado de capitais que, de maneira direta, vão interferir no mercado acionário (conhecido como bolsa de valores), causando apreensão e o que é chamado de aversão ao risco, provocando a fuga de capitais e a consequente queda dos índices de mercado. Devemos observar que esses princípios também têm como base principal, portanto, a mitigação de conflitos de interesse e de atos indevidos por parte dos atores do processo (a alta administração de uma empresa, por exemplo), trazendo a otimização dos valores de mercado da corporação e buscandoa 37 GOVERNANÇA CORPORATIVA perenidade da organização, ou seja, que ela possa ter perpetuidade no mercado, sempre presente, sólida, eficaz e atuante. Evidentemente que esses princípios devem ser compreendidos e assumidos como parte da estratégia empresarial, envolvendo a alta administração com seu comprometimento com a governança, seja pela imperatividade imposta por normas legais nos diversos países e nos mercados acionários estabelecidos em várias partes do mundo, seja por instituições que incentivam e protegem a adoção das boas práticas de governança pelas instituições públicas ou privadas. Portanto, a governança corporativa pode ser estabelecida por qualquer tipo de empresa, nas mais diferentes formas de estrutura organizacional que podemos encontrar, não importando seu porte (pequenas, médias, grandes ou multinacionais), sua forma de controle (controle familiar, gestão participativa, diretoria e conselho administrativo etc.), seu segmento de mercado ou sua natureza (pública ou privada). Tais princípios estão descritos tanto em normas legais como a Lei Sarbanes-Oxley, dos Estados Unidos, como no Código das melhores práticas de governança corporativa do IBGC. Estudaremos com maior profundidade as influências legais e de mercado para a governança corporativa e seus participantes diretos e indiretos na Unidade II. Saiba mais O Código das melhores práticas de governança corporativa foi criado em 1999 e já se encontra em sua quinta edição, ele é “uma referência de consulta visando a uma reflexão e aplicação em cada caso, sempre levando em conta o arcabouço regulatório (compulsório e facultativo) a que a organização está submetida” (IBGC, 2015, p. 18). Sua composição é dividida em cinco partes: Sócios, Conselho de Administração, Diretoria, Órgãos de Fiscalização e Controle, e Conduta e Conflito de Interesses. Acesse-o integral e gratuitamente em: INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA (IBGC). Código das melhores práticas de governança corporativa. 5. ed. São Paulo: IBGC, 2015. Disponível em: https://bit.ly/3i162jn. Acesso em: 21 jul. 2021. Agora veremos os quatro princípios que norteiam a governança e fazem parte de qualquer manual ou procedimento de boas práticas nas empresas. 4.1.1 Transparência O primeiro princípio nos diz respeito à transparência (Disclosure) das informações que a empresa deve ter em relação às suas ações e atos administrativos, atendendo não somente aos acionistas, 38 Unidade I mas a todas as partes interessadas (stakeholders – clientes, fornecedores, governos, mercado, bancos, colaboradores, entre outros), bem como precisa fornecer dados que sejam percebidos por todos não apenas como o cumprimento de ações estabelecidas por lei. Conforme Silva (2016, p. 84), a transparência deve ser entendida como “mais do que a obrigação de informar, a administração deve cultivar o desejo de informar”. Vimos a importância de uma boa comunicação empresarial, tanto externa quanto interna, neste princípio, uma vez que a empresa deverá não se limitar às informações econômicas formalmente exigidas, como no caso das instituições listadas na bolsa de valores do Brasil (B3 – Brasil, Bolsa e Balcão), que possuem a obrigação da divulgação de seus balanços nos prazos estabelecidos por lei. Assim, pode-se citar, por exemplo, o artigo 176 da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (conhecida como Lei das S.A.), que dispõe sobre quais as demonstrações financeiras obrigatórias de apresentação ao fim de cada exercício social: • Balanço patrimonial. • Demonstração dos lucros ou prejuízos acumulados. • Demonstração do resultado do exercício. • Demonstração dos fluxos de caixa (Redação dada pela Lei n. 11.638, de 2007). • Demonstração do valor adicionado (se companhia aberta e incluído pela Lei n. 11.638, de 2007). A alta administração da empresa deve verificar que além da divulgação obrigatória das informações mais relevantes e exigidas por lei, que envolvem os seus resultados e suas ações que irão nortear os investidores no mercado, outros dados precisam ser transmitidos com vistas a demonstrar a boa prática da governança, a preocupação com assimetrias que possam ocorrer no mercado, e o possível vazamento e a utilização de informações que possam ser utilizadas de forma relevante ou privilegiada, com prejuízos às partes interessadas e à imagem da empresa. De acordo com o IBGC (2015, p. 20), as empresas devem ser transparentes também nos fatores intangíveis que “conduzem à preservação e à otimização do valor da organização”. Pode-se destacar, segundo Edson Cordeiro da Silva (2016), algumas informações que podem ser divulgadas, ampliando a abrangência da transparência da empresa no mercado. São elas: • Estrutura organizacional da empresa, apresentando todos os instrumentos internos de governança corporativa. • Gestão societária da empresa com suas participações, responsabilidades e atuações, definindo os limites de competência e alçadas dos administradores. 39 GOVERNANÇA CORPORATIVA • Relatório anual da administração com a inclusão das ações de responsabilidade social e sustentabilidade, como o Balanço Social já apresentado por diversas empresas. • Estatuto social e/ou contrato social bem definido com a inclusão das cláusulas de mediação e arbitragem para a tratativa de processos da solução de conflitos. • Políticas e diretrizes de governança corporativa. • Política de divulgação de informações relevantes. • Política de negociação de ações, da distribuição de dividendos, reinvestimentos e desmobilização. • Divulgação dos acordos de acionistas e cotistas. • Código de ética e código de conduta concorrencial. • Política de remuneração, benefícios e seguro de responsabilidade civil e/ou contrato de indenidade. • Portal de governança corporativa com fácil acesso e consulta pelos conselheiros. • Relacionamento com investidores (RI) de fácil acesso e consulta pelos investidores e demais públicos estratégicos, assim como divulgação dos dados nas demais redes sociais definidas pela DRI. Todas essas informações repassadas às partes interessadas de forma simples, clara, objetiva, completa e com a devida transparência trarão benefícios à empresa na relação com os investidores e em sua apresentação como organização comprometida com a otimização do seu valor de mercado e com a sua perpetuidade, uma vez que reduz o seu custo de capital com a maior procura por parte de investidores que foram conquistados pela confiança na corporação. Conforme descrito por Giancarlo Giacomelli et al. (2017), a transparência das empresas no conceito da governança corporativa possui dimensões que devem ser mais bem compreendidas: • Disponibilização: quanto mais abrangente e precisa for a disponibilização das informações a todas as partes envolvidas, melhor será a verificação por parte do mercado da confiança da empresa e de seus gestores na busca por valorização do negócio. Destaca-se que a informação deve ser confiável, e não somente entregue. Já foi verificado historicamente que a simples divulgação de resultados que possuem dados distorcidos propositalmente por parte da alta administração da instituição levará, em um momento no futuro, a problemas diretamente ligados à corporação, bem como a situações negativas em relação às características e ao controle do meio acionário, provocando crises, instabilidades e perda/fuga de capital investido. • Desejo: como vimos, deve estar inserida no planejamento estratégico da empresa, como parte de seus valores, a transmissão de informações ao mercado de forma clara e precisa, ampliando a disponibilização de dados além daqueles exigidos de maneira legal e formal. 40 Unidade I • Independência: a empresa deve ter a consciência de transmitir informações, sejam elas boas ou ruins. Isto é, quando ocorrem prejuízos ou ações e atitudes que não a levaram às suas melhores performances. Como exemplo, podemos citar a Petrobras, que já atrasou a divulgação de suas demonstrações financeiras paraentregar ao mercado o valor correto dos prejuízos causados por ações danosas (corrupção) durante um período de sua existência. Com isso, fica transparente e claro o sentido informacional ao mercado, demonstrando que erros e falhas podem ocorrer e que é necessário que sejam apontados para que ações de correção e prevenção futuras sejam tomadas e acreditadas pelos investidores. • Coibição: em complemento ao item anterior, a informação transparente também coíbe, mitiga e reduz quaisquer atos e práticas administrativas que possam ser prejudiciais à empresa, reforçando a confiança na estrutura da governança dentro da organização. Portanto, a transparência deve estar estabelecida nas diretrizes estratégicas da empresa, sendo assumida como responsabilidade de todos os órgãos participantes de sua estrutura da governança, desde a Diretoria e o Conselho de Administração, até o Comitê de Divulgação, se houver, e/ou o setor de relacionamento com os investidores, que serão responsáveis pela criação e pelo monitoramento da comunicação às partes interessadas. 4.1.2 Equidade O segundo princípio refere-se à equidade (Fairness) ou senso de justiça, que está ligado diretamente ao tratamento que a empresa deve dar a todos os seus acionistas, sejam majoritários (que possuem a maior parcela das ações disponíveis), sejam minoritários (investidores que possuem pequenas parcelas – ações – do capital da empresa). Importante ressaltar que o senso de justiça não se limita aos acionistas, estendendo-se a todas as partes interessadas, uma vez que a instituição não deve possuir políticas discriminatórias, inclusive em relação aos seus fornecedores, concorrentes e mercado. Como visto no princípio da transparência, a corporação que segue de forma correta as boas práticas de governança terá seu código de conduta concorrencial (para que trate com respeito e dentro de padrões de ética empresarial seus concorrentes no mercado), seu Balanço Social (que tratará das ações de responsabilidade socioambiental vinculadas direta ou indiretamente com sua produção de bens e/ou serviços), Política de Remunerações e Benefícios (apresentando a empresa como um ambiente de trabalho ético e com possiblidades de desenvolvimento de carreira profissional aos seus colaboradores), além das políticas e códigos relacionados ao mercado acionário, evitando atitudes e transações que possam prejudicar acionistas e investidores. Tal princípio, com isso, visa mitigar atitudes que talvez sejam legais, porém que tenham quesitos que ultrapassam as ações de moral e ética. Um exemplo é a política interna que impede que um acionista controlador possa vir a realizar alguma negociação com outra empresa em que também seja sócio, 41 GOVERNANÇA CORPORATIVA evitando conflito de interesses capazes de levar a alterações de preços para um ganho individual em detrimento do coletivo. O principal modelo no mercado acionário acerca do tema é o que denominamos tag along, sendo considerado como uma garantia para os investidores minoritários em certas ocasiões. Ele, que em tradução livre quer dizer “ir junto”, é um instrumento do mercado acionário que foi criado para proteger o acionista minoritário, que, sem tal proteção, ficaria à mercê das atitudes dos acionistas majoritários, muitas vezes prejudiciais aos pequenos investidores no mercado de ações. Pode-se tomar como exemplo desse mecanismo de segurança a troca do controle acionário de uma empresa, ou seja, aquela em que o acionista minoritário possui ações e será adquirida por meio de fusão ou aquisição por outra empresa no mercado. Com o tag along, as suas ações serão negociadas (provavelmente adquiridas pela nova instituição majoritária compradora) por um valor idêntico ou muito próximo àquele oferecido ao acionista majoritário. Por meio dessa proteção, o minoritário pode tomar a decisão de manter ou não as ações com a mudança da empresa controladora, sem se preocupar com o quesito financeiro do processo, uma vez que está garantido seu direito de vender suas ações ao preço estabelecido (ou bem próximo) na venda da instituição. Tal mecanismo é importante porque pode ter a situação do acionista de longo prazo (buy and holder), que é surpreendido pela informação da venda da empresa que possuía ações há um determinado tempo. Com a proteção, seu estudo se limitará à continuidade ou não da situação de acionista minoritário na empresa sob nova direção. Importante citar que tal mecanismo serve somente para as ações classificadas como ordinárias (no mercado acionário brasileiro, elas são negociadas com a expressão ON), não sendo estendido para ações preferencias (PN) ou Units. Saiba mais Com o objetivo de entender melhor sobre os tipos de ações: ordinárias (ON) e preferenciais (PN), acesse: B3. Ações. B3, [s.d.]. Disponível em: https://bit.ly/2W2v0Gf. Acesso em: 23 jul. 2021. O mercado acionário brasileiro, que é efetuado pela B3, também criou os segmentos especiais de listagem para desenvolver melhor esse mercado em nosso país. Podemos encontrar cinco níveis de segmento especial (Bovespa Mais, Bovespa Mais Nível 2, Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1) em que as empresas necessitam cumprir regras e normas estabelecidas, além daquelas já garantidas pela Lei das S.A. 42 Unidade I Essas regras envolvem diversos aspectos, tais como: quais tipos de ações são permitidas no capital social da empresa, o percentual mínimo de ações que deve estar em circulação no mercado acionário, as obrigações do Conselho de Administração, entre outros. Com isso, o segmento chamado de Novo Mercado possui o padrão de governança corporativa altamente diferenciado, no qual as empresas necessitam seguir uma série de regras que trazem auxílio aos acionistas minoritários. Entre elas, podemos encontrar o exemplo claro da equidade, uma vez que essas corporações somente podem emitir ações ordinárias (ON) e devem garantir um tag along de 100%, ou seja, todas as ações necessitam ser negociadas sob as mesmas condições de preço, não importando se os acionistas são majoritários ou minoritários, cumprindo, dessa forma, o senso de justiça para todos os envolvidos. 4.1.3 Prestação de contas O terceiro princípio é a prestação de contas (Accountability) e está vinculado diretamente às melhores práticas de contabilidade e de auditoria. Evidentemente que a prestação de contas sobre as informações contábeis da empresa já está descrita de forma clara na Lei das S.A. (como já visto), porém as instituições com governança corporativa devem se atentar ao fato de que tal prestação de contas caminha além das normas legais, uma vez que os atores dessa governança na organização têm a responsabilidade de demonstrar as suas atuações em cada etapa dos atos administrativos gerados durante o exercício de suas funções, bem como deixar transparente o processo de eleição dos atores no âmbito da governança corporativa. Assim, pode ser destacada uma série de relatórios e eventos que fazem parte da prestação de contas de uma empresa: • Os relatórios das assembleias de acionistas e/ou cotistas. • Os registros das atas do Conselho de Administração, comitês do Conselho de Administração e Diretoria. • A apresentação do planejamento estratégico com a apresentação transparente do orçamento de custeio e investimentos. • Os relatórios de avaliação de desempenho dos projetos. • A divulgação de indicadores de desempenho dos mais variados setores. • A avaliação de desempenho dos atores da governança, tais como a Diretoria e outros órgãos da administração. • O parecer de auditorias independentes sobre as demonstrações financeiras apresentadas. • A divulgação do rating da governança corporativa, demonstrando sua classificação de risco 43 GOVERNANÇA CORPORATIVA De acordo com o IBGC (2015), a prestação de contas deve ser estabelecida em um prazo razoável atendendo a todos os critérios estabelecidos. Isso ocorre porque informações transparentes e disponibilizadas de maneira equalitária a todos trarão maisconfiabilidade nas ações tomadas pela gestão. Lembre-se que, com o gigantismo das corporações, as novas tendências do mundo administrativo e os fatores capitalistas ampliados no mercado, houve cada vez mais uma separação entre a propriedade e a gestão e, portanto, é necessária uma prestação de contas efetiva que corrobore os atos administrativos, afastando a possibilidade de conflito de interesses entre os membros da gestão. Saiba mais Atualmente as empresas públicas já possuem normas e regras que direcionam para a transparência de dados e a prestação de contas efetiva e precisa, como é o caso da lei a seguir: BRASIL. Lei complementar n. 131, de 27 de maio de 2009. Acrescenta dispositivos à Lei complementar n. 101, de 4 de maio de 2000, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências, a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Brasília, 2009. Disponível em: https://bit.ly/3x9XASZ. Acesso em: 21 jul. 2021. A referida lei possui todos os dados constantes no Portal da Transparência: Disponível em: http://www.portaltransparencia.gov.br/. Acesso em: 21 jul. 2021. Assim, as empresas privadas também possuem suas normas e regras estabelecidas (como no caso das companhias de sociedade limitada de capital aberto que têm ações negociadas na bolsa de valores do Brasil), mas devem expandir as informações, prestando contas das mais variadas informações. Tais dados, via de regra, são dispostos nos sites das empresas em um espaço denominado como relação com investidores – RI. Saiba mais Com a finalidade de visualizar melhor e entender como funciona o RI em sua integralidade, acesse: WEG. Resultados do 2T21. 2021. Disponível em: https://ri.weg.net/. Acesso em: 2 ago. 2021. 44 Unidade I É possível perceber que não somente as informações financeiras são apresentadas para todas as partes interessadas, mas: • A estrutura societária e todos os atores que compõem o ambiente da governança corporativa da empresa. • As ações executadas pela empresa que envolvem diretamente os acionistas e/ou investidores, tais como: distribuição de juros e dividendos, programas de ADR (American Depositary Receipt – que são como recibos de ações da WEG disponíveis para compra aos investidores nos Estados Unidos por meio de sua negociação na bolsa de valores americana). • Os mais variados tipos de publicações e comunicados que são distribuídos ao mercado e às demais partes interessadas. • Um espaço de atendimento com o investidor. Concluímos, então, que “a prestação de contas pode ser um instrumento eficaz no sistema de governança corporativa de organizações públicas e privadas” (GIACOMELLI et al., 2017, p. 94), garantindo maior segurança e estabilidade ao mercado. 4.1.4 Responsabilidade corporativa O quarto pilar é a responsabilidade corporativa, que inclui o que conhecemos como Compliance, porém não se limitando a ele. Quando se fala da conformidade no cumprimento das regras estabelecidas, apresentamos a responsabilidade que a organização tem com todas as informações geradas. Mais uma vez é importante ressaltar que não somente a transparência e a prestação de contas serão suficientes para garantir que todas as informações estejam de acordo com o estabelecido, não sendo aceita a divulgação de dados falsos ou incompletos. No momento em que uma empresa faz a divulgação de seus atos e fatos administrativos, bem como de suas demonstrações financeiras, ela deve ter a responsabilidade de zelar e certificar que todas as informações são fidedignas, uma vez que externalidades negativas podem gerar uma série de acontecimentos que irão provocar problemas não somente na instituição, mas no mercado geral. Tal visão está alinhada ao conceito de perenidade da empresa, pois ratifica que sua administração está focada na geração de valor para o acionista/investidor. Ainda assim, como foi dito, não somente os dados financeiros devem servir para que a corporação apresente sua responsabilidade corporativa perante o mercado e a sociedade. Também devem haver fatores socioambientais que estão ligados direta ou indiretamente à sua atividade. Um exemplo claro de responsabilidade corporativa, que necessita de um cumprimento de regras além dos fatores financeiros, é o caso do rompimento das barragens nas empresas do grupo Vale em Mariana e Brumadinho. Tal fato levou a empresa a prejuízos que vão desde o pagamento de multas e o 45 GOVERNANÇA CORPORATIVA custo nas ações realizadas após as tragédias até a queda do valor das ações na B3 por fuga de capital (seja pela percepção do investidor de um lucro menor devido aos custos, seja pela análise individual ou coletiva da falta de administração com foco em sustentabilidade e controle ambiental). Mais uma vez, com esse exemplo, é possível ver a preocupação de todas as partes interessadas nas possibilidades administrativas que a empresa possui de criar estratégias de longo prazo que sejam lucrativas e sustentáveis. Outro aspecto relacionado à ideia de responsabilidade corporativa é o de que as políticas e estratégias adotadas devem ter foco também no médio e no longo prazos, e não apenas no curto prazo, quando a empresa pode obter bons resultados às custas de piores resultados no futuro. A responsabilidade corporativa é o pilar que incentiva a perenidade da instituição, melhorando sua imagem e fortalecendo políticas que priorizam a geração de valor ao longo do tempo (GIACOMELLI et al., 2017, p. 38). Portanto, podemos deduzir que o pilar de responsabilidade corporativa está intimamente vinculado ao conceito de ética empresarial, pois suas decisões são tomadas com vistas a garantir não somente uma valorização do capital da empresa, mas um bom relacionamento com todas as partes interessadas. As companhias atuais que operam com governança corporativa em sua administração têm apresentado uma série de ações que ratificam o comprometimento, tais como: • Responsabilidade social e ambiental fazem parte do planejamento estratégico da empresa e são amplamente divulgados: um exemplo deste item pode ser apresentado por meio das informações prestadas e pelas atitudes administrativas da Natura – que, além de pioneira no quesito de preservação ambiental em seu ramo de negócios (cosmético), insere em sua visão e em seus valores itens relacionados ao bem-estar da população e a não utilização de animais para testes com seus produtos. • Novos modelos de análise e auditorias são solicitados: com a mudança constante no atual mundo disruptivo que estamos verificando, novas análises precisam ser verificadas e outras formas de auditoria e verificação de dados, atos e fatos administrativos são considerados pelo mercado e pelos investidores. Um exemplo é a utilização de dados dos clientes por parte das empresas, fato que culminou na criação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (a LGPD – Lei n. 13.709), sendo ela já exigida e apresentada pelas empresas a todas as partes interessadas. • Divulgação de balanços sociais que incluem ações da empresa: como vimos anteriormente, já é parte integrante da maioria das organizações a apresentação de indicadores sociais que demonstrem a preocupação estratégica da empresa em relação à sustentabilidade, ou seja, a garantia de bem-estar para as gerações futuras. Com isso, exibimos os quatro princípios básicos que norteiam a governança e que, juntos, compõem o argumento conceitual, que é componente básico das boas práticas que serão praticadas pela empresa. 46 Unidade I 4.2 Agrupamento conceitual da governança com base nos princípios A importância desses princípios está na forma como eles se complementam e direcionam a empresa para que ela possa atuar dentro das boas práticas, seguindo conceitos de ética, conceitos legais, sistema de relações e poder, e os direitos dos stakeholders.Entendem-se como posturas essenciais para a boa governança a integridade ética, permeando todos os sistemas de relações internas e externas: o senso de justiça, no atendimento das expectativas e das demandas de todos os “constituintes organizacionais”; a exatidão na prestação de contas, fundamental para a confiabilidade na gestão; a conformidade com as instituições legais e com os marcos regulatórios dentro dos quais se exercerão as atividades das empresas; e a transparência, dentro dos limites em que a exposição dos objetivos estratégicos, dos projetos de alto impacto, das políticas e das operações das companhias não sejam conflitantes com a salvaguarda de seus interesses (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p. 142). Assim, percebe-se que suas inter-relações devem ser avaliadas e verificadas pelos agentes da governança com muita atenção, pois farão parte dos processos administrativos da organização: Direitos das partes interessadas 4 princípios da governança Sistemas normativo Ética Responsabilidades corporativa Estrutura de poder Estratégias Sucessão Definição de papéis Sistemas de relações Internos: proprietários + gestores Externos: partes interessadas Figura 3 – Inter-relações dos agentes da governança nas empresas Adaptada de: Rossetti e Andrade (2014, p. 142). Podemos, por fim, apresentar os objetivos principais que uma estrutura de governança tem em uma empresa com a adoção dos seus quatro princípios: • Processo decisório: direcionamento das decisões da empresa com vistas aos interesses de longo prazo, com sustentabilidade (responsabilidade socioambiental) e perenidade. • Simetria informacional: condução correta e precisa das informações transmitidas, evitando ruídos e situações negativas causadas por desinformações. • Respeito às partes interessadas: garantia de todos os seus direitos e na prestação de contas com transparência, responsabilidade e equidade. 47 GOVERNANÇA CORPORATIVA • Aumento do controle interno: evitamento de surpresas que possam provocar fatos negativos, pois a cultura do compliance existe e é ativa em todas as etapas da empresa. Baseado nesses quatro princípios, que atuam como bases do processo, devemos ampliar ainda mais os conceitos, demonstrando o que se convencionou chamar de os 8 Ps da governança corporativa. 4.3 Os 8 Ps da governança corporativa Os 8 Ps da governança corporativa devem ser detalhados de forma a compreender melhor sobre toda a estrutura do conceito nas organizações. 4.3.1 Propriedade A propriedade na governança tem vínculo direto com a estrutura da companhia, bem como o seu regime legal, ou seja, depende de vários fatores que vão desde a pulverização da propriedade (com ações sendo negociadas na bolsa de valores com diversos acionistas minoritários, por exemplo) até o tipo de sociedade: anônima de capital aberto, anônima de capital fechado, pública ou privada, entre outros aspectos que direcionam as razões da governança. Para ampliar o entendimento, será iniciado o processo de propriedade para uma empresa que tem suas ações negociadas na B3 e que se encontra no segmento de listagem do Novo Mercado (que será detalhado posteriormente). Neste caso, há uma quantidade grande de investidores que compram e vendem suas ações no mercado, formando um rol de acionistas (na sua grande maioria, minoritários – pois possuem poucas ações da empresa em sua carteira de ações) com os mais variados tipos de interesse. Entre eles, podem ser encontrados investidores de longo prazo, que efetuam análises dos dados e fundamentos da companhia (análise fundamentalista) e que mantêm suas ações porque acreditam que a corporação irá gerar valor futuro para o seu dinheiro investido. Por meio dessa estratégia, fica evidente que a instituição precisa gerar informações confiáveis e transparentes para que os acionistas – que fazem parte do quadro societário da empresa – continuem investindo nas ações da companhia a longo prazo, mantendo a sua confiabilidade no mercado e o seu valor de mercado. Com tal finalidade, a empresa deverá estar preparada em sua estrutura para assumir as boas práticas de governança e cuidar de questões-chaves, tais como: • Coesão entre os membros de sua administração estratégica para que as ações tomadas tenham como foco a valorização da companhia a longo prazo. • Preparação dos sucessores em empresas mais familiares, buscando gestores profissionais no mercado, provocando a separação entre a propriedade e a gestão. • Aumento do compliance nos mais variados processos e busca pela perfeita auditoria, com o intuito de mitigar os riscos envolvidos nas atitudes administrativas da companhia. • Criação e utilização de um regulamento interno que seja a sua diretriz, inclusive divulgando de forma transparente para todas as partes envolvidas. 48 Unidade I Lembrete Releia os itens “1.2.9.1 – Dispersão do capital” e “1.2.9.2 – Separação entre propriedade e gestão” para assimilar de forma clara a alteração dos conceitos de propriedade nas empresas que surgiram nos últimos anos devido ao gigantismo das corporações. Por sua vez, nas sociedades anônimas com o capital fechado, em que podemos encontrar um número muito menor de acionistas (uma vez que suas ações não são negociadas em bolsa de valores), a governança tem uma visão de transparência entre os poucos sócios, garantindo que não ocorram conflitos de interesse entre as ações tomadas por alguns desses sócios no processo decisório. Consequentemente, a propriedade não tão pulverizada busca a governança porque encontra nesse movimento as formas de estrutura e de controle que facilitam e tendem a garantir não somente a sua valorização constante, mas a perenidade da companhia no mercado. Sabemos que a perpetuidade da empresa envolverá os quesitos familiares, com os processos de sucessão entre os sócios proprietários do negócio. Também pode ser citado o exemplo da importância da governança em relação à propriedade quando falamos das empresas públicas, visto que há um interesse maior em pauta nelas, pois o negócio público pertence ao povo daquela nação, que tem o direito de saber das ações tomadas pela empresa. A governança, aqui, cuida da propriedade pública do negócio, uma vez que (como visto anteriormente) a transparência já exigida por lei não é suficiente para que se possam verificar se os atos estão direcionados conforme os conceitos administrativos e as boas práticas. Por fim, a governança tratará da propriedade de forma distinta em cada um dos casos apresentados, porém sempre com foco na preservação e valorização da empresa. 4.3.2 Princípios Os princípios já foram verificados, mas devemos ter a convicção de que, em conjunto, eles serão “a base ética da governança” (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p. 143). As empresas, portanto, precisam agir com senso de justiça, transparência, responsabilidade corporativa e conformidade para que estejam aptas a praticar a governança no mercado. Evidentemente, com o gigantismo das empresas, elas atuarão em diversos países do mundo (tanto na atuação produtiva com plantas fabris quanto na venda de produtos por meio de representantes, distribuidores ou mesmo filiais) e ocorrerão diferenças culturais e de posicionamento no mercado, bem como alterações devido a legislações e marcos regulatórios localizados. Essas distinções devem ser verificadas pelas sociedades para que elas possam atender aos desejos e às necessidades das demandas locais, porém não podem ser afetados os princípios básicos das boas práticas de governança, pois temos a existência de certos princípios éticos que não devem ser negociáveis. 49 GOVERNANÇA CORPORATIVA Como exemplo, digamos que a empresa está presente em diversos países, inclusive negociando nas mais diversas bolsas de valores, e que precisa apresentar os dados contábeis conforme estabelecido pelos países. Todavia, em alguns dos locais não há a necessidade de apresentação de informações importantes e complementares aos dados financeiros. Apesar de a instituição nãoestar descumprindo qualquer norma ou lei naquele país, se ela deixar de ser transparente e ter senso de justiça para seus investidores locais, como tem para os demais investidores ao redor do globo, não estará vinculada aos princípios básicos, que são as peças fundamentais da governança. Com isso, ela deve tê-los estabelecidos em sua estratégia, bem como assegurar uma estrutura organizacional que apoie, incentive e execute as funções de governança, garantidos por meio de código de conduta e ética que estão além das exigências legais. 4.3.3 Propósitos Com relação aos propósitos, vale ressaltar que a empresa deve ter a governança alinhada à sua missão e visão. Lembrando que, conforme Chiavenato (2005, p. 33): “a missão funciona como o propósito orientador para as atividades da organização” e a visão é a expectativa futura que ela deseja. Portanto, é fundamental que estejam inseridos em seus valores e na sua cultura organizacional os quesitos que levam às boas práticas, pois trata-se do próprio propósito orientador da corporação. Como exemplo da cadeia de valor, utilizaremos aquela proposta por Natura (s.d.): Conciliar objetivos de negócios, ambientais, sociais e humanos, desde a extração de matérias-primas – que darão origem aos nossos cosméticos – até o descarte das embalagens após o uso pelo consumidor, é o que perseguimos no dia a dia na Natura. Assim, podemos perceber que os objetivos do negócio estão diretamente ligados ao máximo retorno do valor no longo prazo, fato que não impede que sejam seguidos outros itens que somarão e serão reconhecidos como critérios de excelência em análises efetuados, inclusive, no mercado de capitais. Este objetivo das empresas, claro e legítimo, é harmonizável com interesses também legítimos de outros stakeholders. Ademais, é do interesse dos investidores que as demandas das demais partes com interesses em jogo nas companhias sejam administradas estrategicamente, até porque está se estabelecendo a convicção de que a validação e a reputação das corporações são função de posturas fundamentadas no conceito-base do triple bottom line, que implica avaliações integradas de elementos econômico-financeiros, sociais e ambientais (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p.145). O que foi visto com os propósitos da governança é a busca pelo equilíbrio fundamental entre os múltiplos interesses que surgem com a participação da empresa na sociedade, fato que está intimamente 50 Unidade I ligado ao princípio da responsabilidade corporativa, que ultrapassa a fronteira do lucro para um ambiente que seja percebido como um ganho de valor sustentável. Esses propósitos ganham, a cada dia, maior relevância nas decisões dos consumidores, fornecedores, colaboradores e, diretamente, com os investidores que aplicarão seus recursos financeiros em empresas que sigam padrões de ética e responsabilidade. O triple bottom line (triplo resultado) apresenta a ideia de resultados financeiros associados a situações que sejam benéficas para as pessoas (incluindo todos os envolvidos, não somente por conta da maximização do valor da instituição, mas devido a itens como ética, liderança e cultura organizacional). Quando a corporação assume os propósitos como base em sua cultura e estratégia, estamos lidando com o que é chamado de capitalismo consciente, que aponta para uma nova realidade empresarial, focada no respeito à sociedade em fatores como coletivo e meio ambiente. Tal mudança foi gerada, em parte, por conta da alteração que é perceptível no comportamento dos consumidores, principalmente da geração Z (indivíduos nascidos entre 1995 e 2010), que buscam adquirir bens e serviços de empresas que possuem valores acima dos aspectos financeiros-econômicos. Se as pessoas se mobilizam como clientes e/ou investidores para que possam participar das atividades dessas empresas com propósitos, é importante perceber que tal movimento também é refletido diretamente nos recursos humanos das organizações, uma vez que sabemos que as corporações com propósitos acabam por atrair e reter, com maior facilidade, colaboradores mais ativos e preparados, tornando-se cada vez mais engajados com a instituição. Parte importante dessa afirmação deve-se ao fato de que a cultura organizacional das empresas está intimamente ligada a crenças, princípios e valores positivos dos seus colaboradores, levando-os a trabalhar com motivação e confiança no que está sendo ofertado ao mercado, e que vai além dos produtos ou serviços para os clientes e consumidores. Assim, para que a organização possa ter em sua missão e seus valores e propósitos que consolidem esta realidade, é preciso observar os seguintes aspectos: • Descobrimento: a alta administração deve entender quais os propósitos das partes interessadas. • Alinhamento: deve vincular a sua cadeia produtiva e levar esses conceitos como parte fundamental de sua estratégia. • Aderir: deve fixar os valores éticos, sustentáveis e sociais em seu dia a dia, fazendo com que sua liderança seja capaz de atuar conforme determinado perante os colaboradores, utilizando-se das melhores formas de comunicação. • Sustentar: deve manter as ações e decisões sempre pautadas naquilo que conduziu a empresa para um processo de responsabilidade socioambiental, juntando a sua perenidade com a visão de longo prazo benéfica a toda a comunidade e ao planeta. Por fim, parte desses princípios também foi força impulsionadora de alguns quesitos presentes na 4ª Revolução Industrial (ou Indústria 4.0, como tem sido mencionada em reportagens e em livros técnicos), 51 GOVERNANÇA CORPORATIVA tais como: a própria sustentabilidade com formas melhores e mais práticas de produção, a entrega de produtos que causem menor impacto ambiental ao planeta (por exemplo, a manufatura de carros elétricos), e o tratamento diferenciado que os recursos humanos da organização devem ter em sua relação com os colaboradores. 4.3.4 Papéis Os papéis em uma instituição devem estar bem definidos e serem comunicados a todas as partes interessadas de maneira transparente e eficaz. O movimento da governança corporativa cria, amplia e determina parte da estrutura organizacional de uma empresa para que ela esteja moldada a atuar conforme as boas práticas. Os atores do processo de governança – proprietários, conselheiros e gestores – têm papéis distintos no interior das companhias, independentemente de sua constituição legal, dos graus de concentração e da tipologia da propriedade (ROSSETTI; ANDRADE, 2014, p. 145). A separação que ocorreu entre a propriedade e a gestão por parte das empresas conduziu para que ficassem evidentes quais ações deveriam ser tomadas e em que nível, porém todas elas seriam verificadas, questionadas, auditadas e aprovadas ou reprovadas por outros órgãos ou setores que já existiam ou foram até mesmo criados pelo movimento da governança para tal propósito. Importante lembrar que cada componente dos diversos setores responsáveis pela governança na empresa irá possuir atributos inquestionáveis. Qualquer uma dessas responsabilidades, bem como o detalhamento dos atores da governança serão estudados de forma aprofundada na Unidade II. Contudo, para que possa ser compreendida, neste momento, a importância dos papéis em um processo de governança, vejamos o que Rossetti e Andrade (2014, p. 145) nos apresentam como alguns pontos cruciais: Cabe aos proprietários, reunidos em Assembleias Gerais ou Conselho de Sócios, atribuições privativas que a Lei e os Estatutos Sociais lhes confere, entre as quais a definição da estrutura de poder da companhia e a eleição dos administradores com assento no conselho de administração. Reformas em estatutos sociais, mudanças na estrutura acionária e apreciação da prestação de contas incluem-se também entre seus papéis inquestionáveis. Já aos conselheiros cabe a proteção e a valorização do patrimônio tangível e intangível da companhia, a otimização do retorno do investimento, o zelo pelos valores e crenças,a definição de direcionadores estratégicos, a escolha, o acompanhamento e a avaliação dos gestores. Porém, aqui devemos ressaltar que esses papéis precisam ser, além de claramente definidos, divulgados pela empresa, sendo de conhecimento das partes interessadas não somente sua composição, como parcelas de seus atos administrativos. Tal divulgação, via de regra, pode ser verificada pelo setor de RI, que as empresas de capital aberto listadas na bolsa de valores possuem. 52 Unidade I Itens como acúmulo de funções, separação dos papéis entre os proprietários e a gestão (inclusive em empresas familiares, que, cedo ou tarde, deverão trabalhar com eficiência nos seus processos de sucessão), obrigatoriedade da auditoria, seja interna ou externa (que possua independência para atuar) e direcionamentos estratégicos que alteram a cultura organizacional e os propósitos básicos da companhia devem ser tratados como ações inadequadas que afetarão a governança e, consequentemente, a visão que o mercado possui da empresa. Resumidamente, os papéis bem definidos serão a base de sustentação para as boas práticas de governança corporativa de uma instituição, clarificando a importância e a responsabilidade das dimensões de família, sociedade e empresa. 4.3.5 Poder O poder é um item importante na governança, porque deve estar claro nas responsabilidades e autoridades dos diversos atores do processo na empresa, com o intuito de evitar os conflitos e as disfunções, sem qualquer vínculo com o grau de pulverização do capital de controle, ou seja, não importando a quantidade de minoritários que possui. Essa premissa parte do princípio de que há uma separação entre propriedade e gestão, e uma busca de boas práticas de governança; a corporação terá uma estrutura organizacional, formada pelos níveis estratégicos e táticos, focada nos requisitos básicos para o atendimento dos processos. Assim, todas as decisões e ações tomadas pela alta administração da empresa serão executadas visando à maximização dos seus valores, com outros compromissos assumidos de responsabilidade corporativa (responsabilidades socioambientais, por exemplo) e necessariamente compartilhadas entre os diversos atores da governança, auditadas por órgãos independentes tanto externa quanto internamente e informadas de forma clara e transparente. Por meio dessa prática, há a certeza de que não ocorrerão disputas de poder, inclusive por conta de processos de sucessão entre os descendentes dos sócios majoritários, que levam as empresas a tomar ações desastrosas, com consequências muitas vezes destrutivas. Há muitos exemplos de corporações que eram importantes no mercado e vistas com perenidade que sucumbiram devido a erros nos processos de sucessão, principalmente alavancados por disputas de poder e tomadas de ações não benéficas. É importante que a empresa possua, além das dinâmicas que levam à governança, a presença de líderes capazes de conduzir os processos administrativos e gerenciais, sendo inspiradores e exemplos para as suas equipes, com competência reconhecida. Sabemos que liderança é o comando de um grupo de pessoas e será responsável por direcionar os seus liderados para o cumprimento de metas e a execução dos processos que foram planejados na estratégia empresarial. Por fim, entendemos que a liderança também trabalhará os diversos conflitos que existirão durante os processos. Evidentemente que não somente por conta do poder, mas diretamente vinculado a este fato, um processo de governança na empresa dependerá de líderes motivados e motivadores, pois eles deverão tomar as decisões que a impulsionarão. 53 GOVERNANÇA CORPORATIVA Portanto, diante da necessidade de ter uma estrutura organizacional bem definida, com níveis de autoridade e responsabilidade claros e transparentes, e líderes que inspirem e conduzam suas equipes, as empresas devem considerar que acomodações e discordâncias nos processos podem trazer prejuízos ao todo, bem como é de caráter obrigatório o crescimento profissional dos colaboradores (o plano de carreira) baseado em conceitos de meritocracia e a busca pela mitigação de conflitos internos entre os gestores dos diversos setores da organização. 4.3.6 Práticas As práticas da governança corporativa devem estar focadas na elaboração da estrutura organizacional e na constituição de seus poderes e funções, de forma a compreender e executar as boas práticas em todas as suas ações, desde as decisões estratégicas tomadas pela Diretoria Executiva até as funções de controle e verificação das decisões, tanto do Conselho de Administração quanto dos órgãos de auditoria criados para tal fim. A empresa, assim, tem a obrigatoriedade de deixar claro seus processos e demonstrá-los de forma transparente em sua estrutura organizacional, que deve ser de conhecimento de todos, não somente no seu formato, mas nas atividades direcionadas a cada parte da estrutura. Rossetti e Andrade (2014, p. 146) nos dizem o seguinte: A partir da construção dessas estruturas, estabelecem-se então relações funcionais entre elas, centradas nos processos de formulação, homologação e monitoramento das estratégias corporativas, das políticas operacionais e dos resultados gerados. Instituem-se e implantam-se, paralelamente a estas relações funcionais, sistemas de controle, focados em riscos internos e externos que podem afetar não simplesmente os resultados das operações mas, em condições extremas, a própria sobrevivência das companhias. Fica evidente que o processo de estruturação da empresa, com propósitos, papéis e poderes bem definidos e divulgados, será o responsável pela capacidade dela exercer suas atividades administrativas conforme as boas práticas de governança. Algumas práticas podem ser exemplificadas, tais como: o empowerment (fortalecimento) dos órgãos que constituem a estrutura de governança da empresa, a comunicação precisa, clara e transparente tanto interna quanto externamente, e a gestão focada na valorização da sociedade, evitando conflitos de interesse e custos de agência. 4.3.7 Pessoas Este item é importante para o sucesso de todo o processo de governança corporativa, pois toda a empresa é composta de pessoas que participam dos processos estratégicos, táticos e operacionais. 54 Unidade I Já foi visto no item que trata de poder que os líderes precisam estar alinhados às estratégias corporativas para que possam comunicar e impulsionar seus liderados ao atingimento dos objetivos estabelecidos. Porém, não importa o tamanho da empresa, seu regime estatutário ou sua composição, todos os colaboradores que participam dos processos precisam ter consciência da importância do cumprimento das boas práticas de governança. Quaisquer ações, independentemente de serem benéficas ou prejudiciais, são tomadas por pessoas e suas relações interpessoais e, a partir delas, podemos mitigar ou eliminar riscos desnecessários nos processos empresariais, tais como: • Não alinhamento das ações da empresa com sua missão, visão, valores, ética e cultura organizacional. • Não coerência entre as ações e decisões dos diversos atores nos ambientes da estrutura organizacional implementada. • Conflitos internos gerados nos mais diversos níveis organizacionais, considerando as regras morais e harmoniosas entre as pessoas. • Diversos tipos de problemas relacionados à forma não clara e/ou não estruturada da empresa lidar com a dinâmica do poder dos cargos em seus mais variados setores. • Conflitos entre os propósitos estabelecidos pela empresa e aqueles dos proprietários, sejam eles majoritários, sejam eles minoritários. Importante afirmar que uma boa estrutura de Recursos Humanos é essencial em uma empresa com governança, pois virão desse setor as comunicações e ações voltadas a atender as necessidades e os desejos de seus colaboradores, que, por sua vez, executarão as atividades previstas nos diversos processos. Porém, não somente o RH, bem como todas as lideranças e os envolvidos no processode governança na estrutura criada para sua garantia devem buscar o crescimento e a valorização da instituição no mercado. Conforme Rossetti e Andrade (2014, p. 146): Lida-se com pessoas, com as suas crenças e os seus costumes, quando se promove a separação de papéis e se definem os modelos de relações entre os diferentes grupos de atores – acionistas, conselhos e diretores executivos – que interagem na operação dos processos e práticas de governança. Em síntese: a sistematização de um bom sistema de governança – focado na busca incessante da eficácia estratégica, da excelência operacional, da otimização do retorno dos investimentos, de geração de riqueza e de aumento do valor de mercado das companhias – tem, em suas bases, a construção de boas e de bem definidas relações entre as pessoas que militam no interior dos ambientes que o compõem. Pode-se concluir, então, que a empresa necessita possuir um clima organizacional focado nos melhores valores que sejam favoráveis a todos os aspectos envolvidos, desde o fortalecimento das 55 GOVERNANÇA CORPORATIVA relações até a valorização da instituição no mercado. Para tal, toda a sua estrutura deve ser direcionada a um conceito de liderança bem definido e alinhado com seus princípios, assim como deve ter o RH com uma gestão estratégica que possibilite tomadas de decisões que sejam reconhecidas tanto interna quanto externamente. 4.3.8 Perpetuidade O último aspecto a ser estudado é a perpetuidade da empresa, ou seja, ela deve se manter viva, atuante e com a participação crescente em seus setores de atividade. As corporações necessitam de perenidade, não importando seu tamanho ou estrutura, pois desde as familiares (que buscam sucessão entre os herdeiros de seus fundadores) até aquelas de capital aberto com propriedade pulverizada por meio da negociação das suas ações em bolsa de valores, todas sempre agirão de forma a garantir que seus produtos e/ou serviços sejam ofertados e criem necessidades e desejos nos clientes. Apontaremos na sequência itens que são essenciais para a perpetuidade de uma sociedade. São eles: • Ciclo de vida dos negócios: a empresa precisa entender em qual etapa do ciclo de vida ela se encontra para que possa compreender quais ações e decisões devem ser tomadas a fim de garantir sua valorização e, com isso, alcançar a sua perpetuidade. Sabemos que as corporações possuem quatro etapas: nascimento (surgimento da organização no mercado); crescimento (etapa em que a empresa precisa rever suas estratégias e seus processos de negócio com vistas a alcançar a maturidade e não sucumbir); maturidade (quando a instituição atingiu o seu auge de vida empresarial, precisando de ações que a conduzam sempre à inovação e proposta de valor ao produto e/ou serviço ofertado aos clientes); e a velhice (constante renovação para que a companhia se torne tradicional quando verificada a sua existência, porém sofrendo constantes transformações e se alinhando às novas exigências impostas pelo mercado). A figura a seguir nos auxilia no entendimento das etapas do ciclo de vida de uma empresa: Nascimento Crescimento Maturidade Velhice Figura 4 – Ciclo de vida das empresas Adaptada de: Hashimoto (2010, p. 58). 56 Unidade I • Harmonia e coesão entre os sócios: devemos salientar que tal alinhamento precisa ser observado considerando todo o quadro societário, desde os sócios majoritários até os minoritários. Por conta disso, vale ratificar o que já foi exposto anteriormente em relação aos quatro princípios da governança: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa. • Inovação: como vimos no item do ciclo de vida, a organização deve compreender os processos de inovação e as alterações das necessidades e desejos do mercado para que possa se manter viva, gerando lucros consistentes e sustentáveis. Essa inovação tem de ir além dos processos produtivos, atingindo também a utilização dos mais modernos níveis de gestão no mercado, por meio de ferramentas disponíveis, como no caso dos métodos ágeis para os projetos da empresa. Diante do mundo disruptivo e globalizado em que vivemos, a inovação da organização é ponto crucial para sua perpetuidade. • Estratégia de longo prazo: as empresas têm a obrigação de planejar suas ações em longo prazo, ou seja, acima de cinco anos. Tal estratégia deve considerar as oportunidades e ameaças do mercado, bem como seus pontos fortes e fracos internamente (conhecida como matriz Swot). • Resultados sustentáveis: neste item, as organizações devem sempre considerar suas ações socioambientais, a fim de que possam ser vistas como sustentáveis e tragam benefícios a todas as partes interessadas (stakeholders), além do retorno do valor investido pelos acionistas. • Interesses mútuos conciliados: para evitar conflitos de interesse capazes de prejudicar a empresa, afetando diretamente sua participação no mercado, sua lucratividade e, consequentemente, sua perpetuidade, ela precisa trabalhar para que ocorra uma conciliação entre os desejos dos grupos acionários, que percebem que o planejamento e a execução das ações são direcionados para a valorização da companhia de forma sustentável. • Temas importantes na gestão do negócio: as questões mais importantes dos negócios e da gestão dos diversos setores da empresa, sejam vinculados diretamente ou não aos atores da governança corporativa, necessitam caminhar com direcionamento focado no controle de todas as operações e todos os processos decisórios (por meio das estruturas criadas para tal, como as auditorias e os conselhos, por exemplo) e no acompanhamento e mitigação dos riscos envolvidos nos processos. • Empresa comandada por pessoas altamente qualificadas: há a necessidade de qualificação no comando da empresa, com pessoas que tenham responsabilidade e autoridade para a tomada de decisões que são imprescindíveis para a perpetuidade da corporação, considerando o equilíbrio, a interação e o relacionamento saudável entre as suas áreas. • Liderança: como já visto, a empresa necessita de líderes que estejam comprometidos e focados em resultados, bem como sejam capazes de orientar e motivar suas equipes a alcançar os objetivos estipulados nos planejamentos. • Sustentabilidade: a empresa deve ter foco nos quesitos sociais e ambientais, além do lado econômico-financeiro. 57 GOVERNANÇA CORPORATIVA A perpetuidade, portanto, é objetivo que deve estar presente em todas as empresas, sendo trabalhado constantemente por meio das ações estratégicas e táticas que possibilitem a sua continuidade ao longo do tempo. 4.4 Vínculos e avaliações dos 8 Ps da governança corporativa Como visto, os 8 Ps da governança corporativa são fatores decisivos para o sucesso da empresa, não estando vinculados somente aos quesitos de boas práticas de governança. As organizações devem trabalhar, não importando sua tipologia (públicas ou privadas, abertas ou fechadas etc.), buscando os padrões que auxiliam na tomada de decisões com vistas à maximização de seu valor de mercado de forma perene e sustentável. Lembrete A governança corporativa surge para atender às novas necessidades apresentadas pelo mercado com o avanço do capitalismo em todas as partes do mundo e o gigantismo das corporações, que afetam de forma direta o mercado de capitais. Além disso, há a expansão da governança, uma vez que ela auxilia a corporação a procurar formas de sustentabilidade em suas ações. Para tal, é importante que possamos compreender as relações diretas entres os 8 Ps, bem como verificar quais os métodos de avaliação possíveis para que a empresa possa atender a todos os requisitos básicos das boas práticas. A figura a seguir apresenta as inter-relações entre os 8 Ps: Práticas Perpetuidade Propriedade Princípios PapéisPropósito Poder Pessoas Figura 5 – Inter-relações entre os 8 Ps da governança Adaptada de: Rossetti e Andrade (2014, p. 144). 58 Unidade I Compreendemos que a propriedade é o ponto inicial do processode governança. Mecanismos legais exigem que as instituições e o mercado separem a propriedade da gestão para ter melhor preparo estratégico, só assim a empresa poderá lidar, em sua alta administração, com as ações e tomadas de decisão. Aqui, surgem os princípios básicos da governança, que devem ser transmitidos para todas as partes interessadas, considerando o senso de justiça, a transparência, a prestação de contas e a conformidade nos processos. São eles que dizem que a empresa deve trabalhar seus propósitos (missão, visão e valores), distribuir de forma organizada e transparente os papéis dos seus colaboradores nos processos e, com isso, delimitar poderes por meio de conselhos e órgãos auditores que sempre zelarão pela maximização do seu valor. A instituição apenas conseguirá atingir o nível citado se colocar em prática suas definições e atribuições, bem como suas ações e controles. Essa prática, por fim, requer uma gestão estratégica do RH e de uma compreensão de todos os colaboradores, que serão conduzidos por líderes reconhecidos, responsáveis por atuar e manter o clima organizacional. Finalmente, com todos os aspectos considerados e estabelecidos no processo de governança, a perpetuidade se dará de forma ativa e dinâmica, utilizando as mudanças constantes do ambiente externo, como oportunidades para sua continuidade. Sabemos que a perpetuidade faz parte do ciclo de vida institucional e não deve ser um objetivo específico, mas a determinação final de todos os fins da empresa em longo prazo. Portanto, as corporações que possuem governança corporativa precisam estar sempre atentas a todos os princípios. Há formas de avaliar se a governança está atuante, verificando-se se a empresa está seguindo os passos de forma correta. O IBGC, além de apresentar o Código das boas práticas, efetua regularmente estudos sobre o tema, avaliando empresas dos mais diferentes portes. Rossetti e Andrade (2014, p. 150) nos apresentam um dos métodos de avaliação efetuado: Em compêndio editado pelo IBGC, Governança Corporativa em empresas familiares, são apresentados os resultados da metodologia de avaliação situacional aplicada em nove empresas familiares brasileiras, no período de 2006-2011: os “8 Ps” – uma proposta metodológica para levantamento de hiatos. As características das nove empresas (setores de atividade, dimensões econômicas e estágios geracionais), as variáveis adotadas, as métricas, as médias avaliadas, os pontos positivos encontrados nas empresas e as razões dos hiatos são revelados nessa avaliação. Então, foi percebido que a avaliação aponta não somente os pontos positivos e que devem ser mantidos e ampliados pela empresa, como os hiatos (as fragilidades ou pontos fracos), que precisam ser investigados e solucionados com brevidade para que a governança atue com as boas práticas. 59 GOVERNANÇA CORPORATIVA Neste estudo, Rossetti e Andrade (2014) citam que o IBGC encontrou situações que levam as empresas às fragilidades no processo, tais como: • Falta de formalização nos processos dos acionistas (como o não registro de uma ata de reunião, por exemplo). • Ausência de código de conduta que aponte os valores e princípios da companhia. • Carência de um plano estratégico definido e apresentado. • Problemas nos canais de comunicação da empresa, que dificultam o entendimento dos papéis dos diversos atores do processo de governança. • Estrutura organizacional contaminada, ou seja, sem critérios de meritocracia. • Distúrbios com colaboradores em diversos níveis da estrutura organizacional. • Auditorias e controles efetuados de forma incompleta ou atuando de modo incorreto no processo. • Insuficiência de incentivo à inovação e à motivação dos colaboradores. A maioria das falhas (hiatos) apresentadas estão diretamente vinculadas a problemas gerados internamente e que devem ser tratados de forma transparente e com justiça por todos os acionistas envolvidos, utilizando-se das atribuições e responsabilidades dos diversos agentes da governança corporativa na empresa. Lembrete A governança deve ser entendida como um sistema de normas internas que serão a base das relações empresariais com todas as partes interessadas (tanto externa quanto internamente). Elas surgem por meio das forças externas que passam a atuar fortemente sobre as empresas, fazendo com que a governança corporativa se torne imperativa para o direcionamento das empresas em relação às boas práticas. 60 Unidade I Resumo Esta unidade apresenta em seu início as origens da governança corporativa, apontando como fatores determinantes alguns fatos históricos que levaram ao crescente capitalismo, ao surgimento das grandes corporações, à ciência da administração e à busca por modelos que trouxessem boas práticas para as organizações. Assim, as empresas criaram estruturas organizacionais focadas em atender às necessidades de todas as partes interessadas, além de normas e regulamentos criados por governos e instituições participantes do mercado de capitais com vistas ao desenvolvimento sustentável dos negócios. Vimos que esses fatores foram a base para a criação dos moldes da governança, uma vez que são incorporados nos objetivos das organizações, ou seja, todo o modelo é assumido pela alta administração como parte integrante do planejamento estratégico. Com isso, a tomada de decisões se torna mais transparente e assume as lógicas macro e microeconômica que regem as corporações. A partir daí, pode-se destacar não somente o lado financeiro, mas as questões de gestão e os riscos assumidos que, invariavelmente, devem obedecer às responsabilidades corporativas sociais e ambientais. Na sequência, ampliamos os conceitos de governança corporativa e de sua importância, também apresentando seus modelos em vários países do mundo, tais como: Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália, Alemanha, Japão e, logicamente, Brasil. Apesar do cerne do modelo ser idêntico em todos eles, destacamos características fundamentais que os diferenciam com base na estrutura social e econômica de cada nação. Com isso, chegamos aos princípios que estão presentes em todos os modelos: transparência de ações com comunicação clara e eficaz a todas as partes interessadas, equidade (ou senso de justiça) no tratamento com todos os acionistas (majoritários e minoritários), prestação de contas e responsabilidade corporativa, que não inclui somente os quesitos financeiros. Para ampliar os conceitos e os entendimentos sobre os princípios da governança, observamos o que é denominado 8 Ps: Propriedade, Princípios, Propósitos, Papéis, Poder, Práticas, Pessoas e Perpetuidade. Por fim, verificamos os vínculos e as possíveis avaliações para que possam ser verificadas as ações das empresas na condução das boas práticas de governança corporativa. 61 GOVERNANÇA CORPORATIVA Exercícios Questão 1. Observe o quadro a seguir, que destaca os modelos de governança corporativa, e avalie as afirmativas. Quadro 4 Baseado no mercado Baseado em bancos Elemento Estados Unidos Vários bancosAlemanha Banco principal Japão Controle interno/Conselho de Administração Preferencialmente com membros externos, com forte influência sobre o CEO Dois níveis de conselho: diretores e supervisão Preferencialmente internos Propriedade Amplamente difusa Concentrado na família, bancosSeparação do cash flow e controle Mais difusa entre corporações e bancos Voto Alguma concentração nos fundos de investimentos Bancos votam como custodiantes e como proprietários Voto por número de ações Mercado de capitais Líquido e eficiente Líquido Menor influência Controle corporativo Vigoroso Pouca atividade Pouca atividade Fonte: ÁLVARES, E.; GIACOMETTI, C.; GUSSO, E. Governança corporativa: um modelo brasileiro. Rio de Janeiro: Elsevier/Campus, 2008, p. 20. I – No modelo anglo-saxão, no qual se encaixam os Estados Unidos, observam-se a pulverização do controle acionário e a separação entre propriedade e gestão.II – Os modelos de governança de diferentes países apresentam características que dependem de aspectos históricos, sociais e culturais. III – No modelo alemão, a orientação é focada no crédito bancário de longo prazo, que é a fonte de capitalização tradicional do mercado do país. É correto o que se afirma em: A) I, II e III. B) I e II, apenas. C) I e III, apenas. D) II e III, apenas. E) II, apenas. Resposta correta: alternativa A. 62 Unidade I Análise das afirmativas I – Afirmativa correta. Justificativa: no quadro, nota-se que a propriedade, no modelo dos EUA, é amplamente difusa. Neste modelo, que se baseia no mercado, há a tendência a se separar a propriedade da gestão. II – Afirmativa correta. Justificativa: os modelos administrativos, em geral, estão condicionados à história e à cultura de cada país. III – Afirmativa correta. Justificativa: no cenário alemão, os bancos exercem grande controle sobre o processo acionário; com isso, ocorrem pressões internas para que as empresas adotem um sistema de boas práticas. Questão 2. (Esaf 2012) Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), governança corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. Neste contexto, também aponta o IBGC os seguintes princípios básicos de governança corporativa, todos passíveis de aproveitamento no âmbito do setor público, exceto: A) Equidade. B) Responsabilidade corporativa. C) Legalidade e legitimidade. D) Transparência. E) Prestação de contas (accountability). Resposta correta: alternativa C. Análise da questão Os quatro princípios da governança são: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa.