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Resenha - Literatura colonial em Moçambique o paradigma submerso - Francisco Noa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS 
GEL 205 – Literaturas africanas de língua portuguesa – 1º. Semestre de 2023 
Profa. Dra. Larissa da Silva Lisboa Sousa 
 
Igor Andrade Barbosa 12/05/2023 
 
 
Noa, Francisco. LITERATURA COLONIAL EM MOÇAMBIQUE: O 
PARADIGMA SUBMERSO. 1999. Via Atlântica, 1(3), 58-69. 
 
Questionar o surgimento de uma literatura nacional em Moçambique é uma tarefa 
que, de maneira inerente, nos remete ao desenvolvimento histórico do território. Definir 
a produção textual moçambicana é refazer trajetos e analisar aqueles que foram os 
atuantes para o início da produção literária no país: a colonização e o colonialismo. 
Pensando no papel que essas forças dominadoras exerceram na cultura de Moçambique, 
Francisco Noa redige um texto teórico e analítico sobre o que conhecemos (ou, ao menos, 
achamos que conhecemos) como “literatura colonial”: uma produção literária de ficção 
durante a época colonial que reflete a perspectiva do colonizador sobre o mundo. 
 No texto “Literatura colonial em Moçambique: o paradigma submerso”, que se 
integra na preparação de uma tese de doutorado, Noa chama a atenção para a importância 
de se discutir o passado para, então, se indagar de que maneira ele está presente em nossa 
realidade. O autor constrói perfeitamente uma rede de reflexões que vai desde o 
questionamento sobre o que é essa literatura, até o questionamento sobre os fantasmas 
que ela evoca. Isso tudo para afirmar que falar de literatura colonial é considerar não 
somente movimentos essencialmente literários, mas também perspectivas ideológicas, 
psicológicas e culturais. 
Inicialmente, o pesquisador examina diversos apontamentos do que seria uma 
literatura colonial. Apoiando-se em teóricos da área, Noa coerentemente afirma que a 
literatura colonial é o reflexo da visão de um branco dominador que se considerava 
superior, protagonista, patriota e herói de um povo inferior, subalterno, sem cultura e que 
precisava de salvação. É uma literatura em que ao mesmo tempo que é escrita em louvor 
à metrópole portuguesa, é também escrita em conivência com o silenciamento do negro. 
Recorrendo brevemente ao contexto histórico da ocupação da África durante o 
século XIX e XX, o autor nos apresenta as três fases literárias que evidenciam diferentes 
perspectivas do colonizador ao decorrer dos processos coloniais: a fase exótica, a fase 
ideológica e a fase cosmopolita. A primeira fase, característica da década de 30, retrata a 
visão portuguesa encoberta pelo exotismo ao entrar em contato com o território 
moçambicano. É a fase em que a visão urbana do português se choca com a visão rural, 
o “mato”, africano. Ao analisar o trecho da obra “Sinfonia bárbara” de Eduardo Correia 
de Matos, Noa mostra claramente como a ideia do “exótico” está presente nas obras da 
primeira fase. Na segunda fase, que data a década de 40, encontramos a partir de trechos 
de obras de Rodrigues Júnior o manifesto de uma ideologia explicitamente 
preconceituosa. Por fim, na terceira fase, cosmopolita, o autor aponta um 
amadurecimento estético e discursivo em que encontramos em certo nível a ideia de 
multirracialidade e de igualdade na década de 60. Destacando Agostinho Caramelo e 
Eduardo Paixão, Noa demonstra como o cruzamento cultural e social já está evidente em 
suas produções literárias, o que garante a esse terceiro momento o título de “fase adulta”. 
Na conclusão, o pesquisador reitera sua ânsia em estudar as literaturas coloniais 
para efeitos que vão além da mera revisita aos textos com o intuito de examinar os 
manifestos da ideologia colonial. Na verdade, pretende revisitar um imaginário e todas 
suas implicações históricas e sociais para, como mesmo aponta, precaver o 
futuro/presente e superar as barreiras que impedem a comunicação entre diferentes 
culturas e civilizações, especialmente aquelas que foram subjugadas ou dominadas por 
diferentes formas de opressão. 
Ao final do texto, somos levados a refletir esses “paradigmas submersos” que nos 
impedem de reconhecer a literatura colonial como um processo evolutivo na forma e na 
temática e de admitir que ela está inserida nas raízes culturais e históricas do sistema 
literário de Moçambique. Francisco Noa se torna um autor notável para qualquer leitor 
que busca conhecer melhor a literatura moçambicana e reconhecer a partir de uma 
reflexão crítica que muitas de nossas ideias sobre o território africano estão ainda 
cristalizadas no que as três fases literárias apontavam: uma África enquanto reminiscência 
de tudo o que é mais exótico, uma África enquanto origem do preconceito racial e uma 
África enquanto território silenciado de sua diversidade social e cultural.

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