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Tratamento de Choque
Desprogramando tias do zap, tios do churrasco,
justiceiros sociais de teclado e zumbis de internet
Madeleine Lacsko
Copyright © 2020 Madeleine Lacsko
Todos os direitos reservados. Este ebook ou qualquer parte dele não pode ser
reproduzido ou usado de forma alguma sem autorização expressa, por escrito, da autora,
exceto pelo uso de citações breves em uma resenha do ebook. 
Primeira edição, 2020 
ISBN 978-65-00-07895-4  
www.madeleinelacsko.com.br 
Ao meu filho Lourenço, pelo amor e humor debochado. 
A todos que estiveram ao meu lado nesses anos de travessia do deserto,
principalmente aos que contribuíram com compreensão, afeto, escuta, conhecimento
e todo tipo de ajuda. 
Sem vocês, o caminho não faria sentido. 
“O maior obstáculo ao conhecimento não é a ignorância mas sim a ilusão do
conhecimento.”
Daniel Boorstin
Contents
 
Title Page
Copyright
Dedication
Epigraph
O QUE ESPERAR DESSE LIVRO
ZUMBI DE ESTIMAÇÃO
ORÁCULO
NÓS AMAMOS ODIAR
TIPOS DE VICIADOS
ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA
TESTE SEU NÍVEL DE ALFABETIZAÇÃO
A DIFERENÇA ENTRE FATO, OPINIÃO E FANTASIA
ALGORITMOS E RELACIONAMENTOS
A MENTE ANALÓGICA
REDES SOCIAIS: HERÓIS OU VILÕES?
GUIA DE ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA
o fim?
About The Author
O QUE ESPERAR DESSE LIVRO
Espero que esse livro possa ajudar você e as pessoas que você
ama. Foi produzido não só com base nos meus estudos e na minha
experiência profissional, mas também nos meus erros e cicatrizes.
 
Sofrer ataques cibernéticos sistemáticos durante anos e tentar
seguir todas as orientações técnicas que me foram dadas foi parte
fundamental do meu aprendizado.
 
Nesse processo identifiquei como se minimizam as
consequências na vida real, como é um sofrimento solitário e o
fenômeno que eu chamo de efeito-lepra: ninguém quer ficar ao lado
de pessoas atacadas.
 
Decidi fazer esse livro voltado para o público em geral porque,
hoje em dia, todo mundo tem um familiar ou amigo que ou é atacado
ou ataca nas redes.
 
Eu quero muito evitar que outras pessoas tenham de fazer o
mesmo caminho longo que eu fiz. Ofereço a vocês um atalho e
espero ajudar.
 
Também ofereço dicas a quem, de alguma forma, procurou em
grupos da internet as emoções e laços que faltam na vida e acabou
enredado em algo que não era exatamente o que buscava. Muitas
dessas pessoas não sabem como resolver essa situação.
Se fizer alguma diferença na sua vida ou de alguém que você
ama, todo esse meu caminho tortuoso terá valido a pena. Caso você
deseje ou tenha tempo, compartilhe sua experiência e suas opiniões
comigo. Obrigada pela confiança!!!
 
ZUMBI DE ESTIMAÇÃO
Cada um de nós ama alguém que simplesmente enlouqueceu
depois das redes sociais. Nos últimos anos, desde que a política
entrou na moda, parece que o debate ficou ainda mais agressivo.
 
 
Ter essa impressão é fácil, difícil é compreender esse fenômeno
e resolver. Será que a nossa geração tem algum tipo de
agressividade especial e se alimenta da necessidade de atacar
grupos contrários? Isso sempre foi da alma humana, só melhoramos
as ferramentas.
Com a pandemia, tanto a convivência quanto o uso das redes
sociais se tornaram mais intensos. Os zumbis da internet, dos quais
costuma-se zombar com apelidos como tias do zap, tiozão do
churrasco ou justiceiro social de teclado, viraram uma tensão para a
convivência.
Ficou muito mais difícil fingir que a gente não está vendo o
quanto uma pessoa querida exagera no alinhamento com algumas
ideias ou na agressividade para defender um grupo. Durante uma
pandemia, fica difícil não sentir mágoa quando alguém que amamos
fala de outras pessoas de forma desumana.
Por outro lado, cada um de nós fica mais sensível. Temos a
necessidade de falar com as pessoas que amamos sobre situações
que nos causam indignação, medo e tristeza. Para resgatar os
relacionamentos, é preciso entender sobre algoritmos mesmo que a
gente não tenha vontade nem de saber o que essa palavra significa.
Muitos de nós ainda compreendem o debate público nas redes
sociais como um lugar em que todos podem exercer a liberdade de
expressão. Todos somos livres para dizer o que quisermos dizer,
todos somos livres para avaliar quem está certo e quem está errado.
Pense bem: se fosse isso mesmo, a gente chegaria nessa
pancadaria toda?
Repare que esse clima tomou até a mídia tradicional, que se
dobrou ao espetáculo desagradável da gritaria e da agressividade. A
mídia tradicional tem incomodado muitas pessoas, só que essas
julgam ter encontrado liberdade nas redes sociais, o que é um erro.
Nossa cabeça analisa o mundo de acordo com todas as
informações que recebemos e as experiências que tivemos na vida.
Se você, como eu, passou dos 30 anos, ainda pensa muita coisa
com a lógica de um mundo que não existe mais.
Hoje, a dinâmica dos relacionamentos sofre uma grande
interferência da coleta de dados e dos algoritmos. Ficar fora das
redes não torna ninguém imune a essa interferência, já que muitos
dos serviços necessários para participar da sociedade, ter uma
profissão e estudar, passam pela internet.
Não tenho dúvida de que a tecnologia sempre traz avanços e
tem benefícios que ainda nem descobrimos. Só que tecnologia é
projetada e usada por humanos, que têm o bem e o mal dentro de
si.
Se você convive com alguém que foi cooptado por uma espiral
de ódio, fake news, justiçamento social ou cancelamento, já sabe
que não adianta argumentar com a pessoa ou pedir que seja
razoável. Não falamos aqui de comunicação racional, mas de
comunicação com base em emoções.
Quando estamos convencidos pelo coração, é muito difícil que
fatos mudem a nossa opinião, mesmo que racionalmente saibamos
da existência de algo errado ali. Que atire a primeira pedra quem
nunca viveu uma paixão.
Pense em alguém que se apaixona, mas não por uma pessoa,
por uma ideia ou por fazer parte de um grupo de pessoas. Pouco vai
adiantar dizer que aquilo é exagerado, colocar os fatos na mesa,
dizer que faz mal. Paixão é paixão.
Nossa sorte é que há uma diferença brutal entre as paixões que
surgem do coração e aquelas que são plantadas nele usando
inteligência artificial. Se nossas paixões humanas parecem ser às
vezes invencíveis e ter ritmo próprio, nós podemos domar as
artificiais.
Imagine que você pudesse decifrar o mecanismo que fez você
se apaixonar perdidamente por alguém que está fazendo a maior
confusão na sua vida. Seria a solução perfeita para todas as dores
do coração, tão importantes que são fonte inesgotável da arte, em
todas as culturas e em todas as épocas.
Se esse alguém que está fazendo confusão na sua vida é o
grupo que lhe converte em alguém muito agressivo no debate
político na internet, espalhador de fake news ou que tem ideias fixas
sobre alguns temas, tenho boas notícias: você está a alguns passos
de desarmar esse mecanismo.
Aprender como funcionam os algoritmos das redes sociais e de
que forma eles despertam nosso pior lado é o que pode nos libertar
dessa rede de obsessão e agressividade aparentemente sem
limites.
Este trabalho é uma espécie de “manual para principiantes”.
Você não precisa saber nada muito profundo sobre redes sociais e,
aliás, nem o significado da palavra “algoritmo” para aplicar na sua
vida e na sua relação com pessoas que ama as estratégias e táticas
descritas adiante.
Espero que possa ajudar você a melhorar as relações com
alguém de que você gosta muito diante desse fenômeno
contemporâneo de ver as pessoas que amamos abduzidas pelo
circo do ódio e radicalismo que mora nos nossos celulares.
Se for possível, após a leitura, compartilhe comigo suas
experiências e observações. É fundamental para dar continuidade a
esse trabalho de conscientização, que assumi como missão depois
de eventos pessoais muito marcantes que vou contar aqui. Em
todas as redes sociais, eu sou @madeleinelacsko. Você também
pode entrar em contato comigo pelo site
www.madeleinelacsko.com.br
http://www.madeleinelacsko.com.br/
ORÁCULO
Por que você confiaria em mim para saber sobre isso? Afinal, não
temos como estudar isso ainda num curso formal,as próprias
universidades estão pesquisando sobre como as redes sociais
afetam a nossa vida, nosso equilíbrio psicológico e nossas relações
sociais.
 
 
Meu conhecimento foi adquirido numa combinação entre
circunstâncias da vida que fogem totalmente do meu controle e
numa formação profissional não-linear. Minha primeira formação é
jornalista, mas venho de um meio social muito diferente dos meus
colegas.
Sou filha de bancário e dona-de-casa, a primeira geração da
família que fez curso superior. Exatamente por não me encaixar de
cara nesse meio, mantive vivos outros olhares sobre a vida e, em
2001, quando fiz um curso do Knight Center for Journalism in the
Americas, percebi que a internet seria uma revolução no mundo da
informação.
Na época, eu confesso que fiquei bem triste. Estava acabando a
faculdade e havia aprendido coisas bem trabalhosas, como revelar
fotografia, datilografar em máquina elétrica, cortar o fitão de
gravação de rádio para editar o trecho certo da fala de alguém. No
mesmo ano em que recebia o diploma, descobria que isso logo seria
história de museu.
Comecei a me dedicar ao jornalismo de dados há 20 anos e,
depois de algum tempo, percebi que me faltava algo: experiências
práticas. Resolvi passar para o outro lado, conhecer por dentro
aquilo que eu investigava, principalmente a política, o Judiciário e a
defesa de direitos do cidadãos.
Isso ocorreu exatamente quando as redes sociais começaram a
ficar mais populares, em 2008. Eu participei da equipe que
implementou as redes sociais do Supremo Tribunal Federal, a
primeira Suprema Corte do mundo a aderir a elas. Depois, trabalhei
de uma forma diferente com redes na campanha que erradicou a
pólio em Angola, como Consultora Internacional em Comunicação
para o Desenvolvimento.
Mas a experiência que mais me acrescentou, tanto em termos de
novos conhecimentos quanto de vivência prática, foi como Diretora
de Comunicação da Change.org. É uma plataforma de abaixo-
assinados cujo negócio principal está no mercado de dados dos
usuários, exatamente como as redes sociais, mas com ética.
Tive a oportunidade de trabalhar e manter contato com Paul
Hilder, idealizador do blockbuster da Netflix “Privacidade Hackeada”.
Aí eu aprendi na prática quais dados podemos coletar das pessoas,
o que é possível fazer com esses dados e quais são os limites
éticos do uso desses dados. Hoje, muitas empresas estão tentando
entrar nesses limites.
Mas eu só fui entender mesmo qual era o poder dessa máquina
movida a Inteligência Artificial a partir de 2016, quando me tornei
vítima dela. É algo tão diferente e tão poderoso que eu demorei
quase três anos para compreender que aquele processo na minha
vida era exatamente a mesma técnica que eu havia aprendido em
detalhes!!!
Eu sabia como fazer, quais eram as possibilidades e que efeitos
esperar. Mas eu havia usado para coisas “do bem”, digamos assim.
Conseguimos que o estádio da FIFA em Salvador substituísse a
licitação do acarajé de microondas pela presença das tradicionais
baianas de acarajé da cidade. Uma grande marca de lingerie decidiu
fazer uma linha comercial dedicada a mulheres que passaram por
cirurgia de câncer de mama. Conseguimos que um programa de TV
realizasse o sonho de uma avó de conhecer pessoalmente o
Agnaldo Rayol.
Todas essas coisas aconteceram pelo impacto conseguido pelo
uso da internet e dos dados das pessoas que tínhamos na
plataforma. A informação certa chegou às pessoas que se
mobilizariam e dariam força a essas causas. Como eu, que havia
feito isso, não percebi quando esse mesmo mecanismo foi usado
contra mim?
Porque os efeitos são muito diferentes a depender da emoção
que é ativada. Eu pensava que entendia esse mundo porque havia
estudado bastante e trabalhado com ele. Só que eu havia
subestimado o poder das emoções. Foi só quando eu compreendi o
quanto elas movem o mundo que pude compreender
verdadeiramente este universo.
Daí eu fui refazendo todos os meus passos, percebendo onde eu
errei, o que eu pensei que estava acontecendo e o que eu descobri,
depois que rastreei dados, que havia acontecido. Também precisei
estudar mais, e fiz com a ajuda de muita gente que entende mais de
tecnologia do que eu.
Somente quando eu compreendi exatamente como funcionava o
mecanismo de ataque eu pude perceber que era ele em operação
quando um ataque começava. E, como eu já havia aprendido o
suficiente, passou a ser menos doloroso e mais simples reagir e
encerrar.
Gastei muito mais tempo do que gostaria seguindo todos os
manuais de “como se defender de ataques na internet” e vendo que
nenhum deles dá resultado. Mas isso é assunto para outro livro. A
questão é que os manuais de como não ser manipulado e nem se
deixar envolver por redes de ódio também estão errados.
E eu sei porque eu já me deixei levar, já errei muito e só
consegui começar a usar o melhor das redes sociais a partir do
momento em que assumi verdadeiramente que tomo muitas
decisões com o coração e que racionalidade não é melhor nem mais
importante que emoção.
Gostamos de pensar que somos racionais e tomamos muitas
decisões racionais. Lá no fundo, sabemos que não é assim. Para
ser verdadeiramente eficiente, a Inteligência Artificial precisa ser
programada também de acordo com essa premissa.
Para não ser manipulado em redes sociais, é preciso identificar
nossas emoções e compreender como os algoritmos são
programados para mexer com elas. Espero ajudar você nessa
tarefa.
NÓS AMAMOS ODIAR
Quantos novos nomes de celebridades você conheceu nas redes
sociais nos últimos tempos porque o mundo estava revoltado com
algo que fizeram? Tem o que faz festa na pandemia, protagoniza
evento racista, os eternos machistas, o que bate em mulher, a turma
que humilha empregados e muitos outros do mesmo gênero.
 
 
Por que eles são tão mais numerosos do que as pessoas novas
que a gente conhece por iniciativas legais, como atender crianças
carentes, descobrir coisas importantes, criar estratégias inovadoras
para a educação? Será que o mundo está mesmo no fundo do
poço?
Antes da existência da internet, quando eu ainda trabalhava na
imprensa movida a lenha, costumávamos dizer que nada dá mais
audiência que desgraça, violência e vida alheia. Imagine se eu
conseguisse mandar a você exatamente o tipo de desgraça,
violência ou fofoca que cala fundo no seu coração e provoca
reações incontroláveis? Podemos, explico como mais adiante.
Voltemos aos nossos sentimentos. O que mais nos impulsiona a
compartilhar conteúdos é o ódio. Não, não somos um poço de ódio.
Mas quando algo mexe com a gente, tendemos a compartilhar mais
para chamar a atenção dos outros porque consideramos muito
grave e temos um senso de urgência. Só que, muitas vezes,
fazemos por impulso, sem nem saber se é verdade. Se muita gente
faz, vira uma bola de neve, a tal da “viralização”.
Em 2013, dois professores da Universidade da Pensilvânia, nos
Estados Unidos, Joseph G. Campbell e Katherine L. Milkman,
resolveram medir esse fenômeno. Sim, eles colocaram na ponta do
lápis o peso que as emoções têm para o compartilhamento.
Isso é bem importante porque, até o momento, não existe uma
fórmula pronta para elaborar um conteúdo viral. Ou seja, aqui você
não vai aprender isso. Mas eu vou te ajudar a identificar os tipos
mais comuns de conteúdos elaborados só para viralizar e que,
provavelmente, não te ajudam em nada e nem falam a verdade,
mas calam no coração.
No caso específico, não foram analisadas correntes de internet,
fake news, nada disso. Mas é bem importante prestar atenção
nesses dados porque a gente se reconhece neles e estabelece um
padrão de comportamento que temos com todo tipo de
compartilhamento.
Os professores classificaram diversos artigos do New York Times
pelo tipo de emoção que despertam nos leitores e então verificaram
quais deles eram mais enviados por email para outras pessoas. Isso
é possível porque as plataformas dos jornais coletam esses dados,
cada endereço eletrônico gera uma resposta ao jornal de quem leu,
por quanto tempo, se continuou no jornal, se compartilhou,enfim,
tudo.
Quando as histórias são divididas simplesmente entre positivas e
negativas, as positivas, sobretudo com dicas práticas, são mais
compartilhadas. Entram aí dicas para consumidores, sobre
comportamento, lugares para comer, cursos, filmes. Mas, quando é
feito outro recorte, por emoção gerada, o mal vence o bem.
Os conteúdos que mais têm chance de viralizar são os
enquadrados em emoções de alta excitação. Cuidado aqui com o
duplo sentido, o estudo fala especificamente em ódio, medo e
ansiedade. Então, foram feitos outros experimentos. Naqueles com
campanhas publicitárias, as mais compartilhadas são as mais
divertidas. Nos experimentos com relatos de experiências do
consumidor, as mais compartilhadas são as que dão mais raiva.
Faço questão de transcrever as orientações deste estudo, que
são voltadas ao marketing em geral, pensando primeiro nas
empresas, marcas e eventos. Mas tenho certeza de que você vai
reconhecer direitinho como estão agindo muitos políticos
ultimamente.
“Ao procurar gerar publicidade boca-a-boca, os profissionais de
marketing costumam tentar atingir influencers ou formadores de
opinião. Embora essa abordagem seja abrangente, o valor e a
relação custo-benefício são duvidosos. Em vez de visar pessoas
‘especiais’ pode ser mais benéfico focar na elaboração de conteúdo
viral”, diz o estudo, que também ensina qual o tipo de conteúdo tem
mais chance de viralizar. Esse é o pulo do gato.
A primeira dica é excitar e não relaxar o público. Opa, reconhece
aqui a torta de climão que virou o debate político? Pois é. A “dica”
era primeiro para empresas e marcas, que sempre tentavam falar
dos benefícios dos produtos. A conclusão é que conteúdos que
deixem os consumidores tranquilos e relaxados não vão ser tão
virais quanto aqueles que os excitam de alguma forma.
E aí vem o complemento, respire fundo: “emoções negativas não
fazem nenhum mal quando empolgam”. Como assim? Não fazem
mal para quem, cara pálida? Vem aqui no grupo de whatsapp da
família ver que beleza está isso! Calma, a abordagem é pragmática,
falando para empresas e marcas sobre como promover seus
produtos.
No marketing “old school”, aquele da era anterior às redes
sociais (lembra?), o mantra dos profissionais era fugir das emoções
negativas. Ninguém queria associar uma marca a qualquer tipo de
emoção negativa como ansiedade e menos ainda medo e ódio. Mas
o estudo mostrou que essas emoções, quando mobilizam as
pessoas, podem ser benéficas para a marca porque viralizam.
Quer um exemplo prático fora da política? Está no estudo. A
BMW resolveu criar uma série de filmes para internet, com objetivo
de viralização, com foco na criação de ansiedade.
Vários deles tinham perseguições de carro e havia títulos como
Emboscada e O Refém. Para a teoria de marketing da época, era
suicídio, pois associaria a marca a emoções negativas. Mas o efeito
foi o contrário, a emoção e ansiedade dos filmes geraram milhões
de compartilhamento e boa reputação.
Também havia uma dica de como lidar com o consumidor. E nela
você também vai reconhecer muito da transformação do debate
político. É preciso dar mais importância a quem está com ódio e
raiva do que a quem ficou desapontado mas está disposto a uma
conversa razoável.
Sob o ponto de vista moral ou da racionalidade, parece uma
loucura afirmar isso. Mas a análise é técnica e pragmática, levando
em conta resultados de marketing medidos nas postagens.
Tristeza bloqueia compartilhamentos. As emoções que nos
empolgam, sejam boas ou ruins, potencializam os
compartilhamentos. As ruins até mais. Mas compartilhar coisa triste
é raridade.
Os conteúdos que as pessoas menos compartilham são os que
causam emoções de tristeza, o que é um fator muito comum para
que campanhas de saúde pública tenham problemas. O resultado é
melhor quando o foco é no medo e ansiedade, mas aí há um debate
ético importante a se fazer.
Já no caso da resposta aos consumidores, a prioridade não é
mais fazer justiça ou prestar um bom serviço, mas garantir a
preservação da imagem da empresa. Dependendo do quanto uma
única experiência ruim é compartilhada, mesmo que o cliente não
tenha razão, a reputação da empresa pode ser rapidamente
destruída.
O estudo cita um caso bem interessante. Uma mãe sentiu-se
ofendida com a propaganda de um remédio. Quem você atenderia
primeiro, essa pessoa que nem é consumidora e provavelmente não
tem razão ou alguém que postou um relato de problemas com o
medicamento, como uma infiltração na embalagem?
Na lógica de antes das redes, é óbvio: o cliente real com um
problema real é a prioridade. Mas agora, tudo mudou. O caso da
mãe ofendida com a propaganda realmente ocorreu e, em menos de
um dia, virou um grupo de mães que começaram a postar em todas
as suas redes textos, memes e vídeos contra o remédio.
O conteúdo feito por elas obviamente é mais excitante, sob
medida para ativar as emoções de ódio e ansiedade contra as
pessoas que fizeram a propaganda e, consequentemente, sobre a
marca do remédio. Rapidamente elas viralizaram e, depois de um
tempo, ninguém nem sabe mais como aquilo começou, só fica com
a sensação de que o tal do remédio não presta.
Bom, o estudo é sobre marketing e a dica para as marcas é dar
sempre mais atenção às reclamações que provocam ansiedade do
que àquelas que revelam desapontamento.
Sabe por quê? Porque é da nossa natureza dar mais atenção
àquilo que nos provoca ansiedade, então é mais provável que a
gente repasse, mesmo sem saber se é verdade, o que desperta na
gente determinados sentimentos.
A partir do momento em que uma pessoa se conscientiza disso,
ela se apropria do comportamento e, em vez de ser manipulada a
pensar que decidiu tal coisa ou se juntou a tal protesto ou
movimento, realmente analisa se está sendo manipulada pelos
sentimentos ou não.
Proponho um exercício: pense nas últimas vezes em que você
sentiu muita raiva com algum conteúdo nas redes sociais. Quantos
deles foram feitos sob medida para isso, sem preocupação com
informar você ou com o seu bem estar? Reveja, será surpreendente
ver essas publicações com outro olhar.
TIPOS DE VICIADOS
Ninguém mais se fala, fica todo mundo com a cara enfiada no
celular. Quantas vezes você já ouviu essa frase e de quantas
pessoas diferentes? Nossa tendência é simplificar as coisas, fazer
uma relação simples de causa e efeito. Celular vicia. Ponto.
 
 
É uma forma normal de racionalizar. Antes do celular, a gente
conversava no almoço de domingo. Chegou o celular, paramos de
conversar. Portanto, se deve ao celular o vício. Faz sentido, mas
não aborda o essencial: o que leva cada um a virar um zumbi.
É um erro pensar que são iguais todos os casos de pessoas que
são zumbis de rede social, ou seja, que vivem conectadas a ponto
de deixar a convivência de lado. Partindo desse princípio, não
conseguimos resolver o problema da vida real que leva a pessoa a
ficar presa nas redes.
Se você quer desprogramar um zumbi de redes sociais, o
primeiro passo é entender qual foi a programação. E aqui eu não
falo de tecnologia da informação, mas de sentimentos e relações
humanas.
Dizer a alguém que está viciado em celular ou qualquer coisa do
gênero serve para desabafar, mas muito provavelmente não vai
mudar nada na situação. É preciso compreender os motivos de
tanta fixação, que podem variar muito.
Redes sociais têm programação semelhante à das máquinas de
video poker: você não sabe qual resultado virá, então fica tentando
muitas vezes, sem parar.
Os primeiros experimentos foram feitos com ratos. Eles
aprendiam que apertar uma alavanca trazia comida, mas às vezes
ela vinha e às vezes não. Na impossibilidade de entender o padrão,
eles pressionavam a alavanca sem parar.
É o que fazemos nas redes sociais. Não sabemos o que vai
acontecer cada vez que entramos nelas, então nosso cérebro fica
tentando entender qual é o padrão. Se eu postar uma foto, tenho
mais mensagens e mais curtidas? Pode ser que sim ou não. Se eu
comentar, terei mais comentários? Pode ser que sim ou não.
Como nosso cérebro não decifra a lógica, atéporque toda a
programação é feita exatamente para isso. Nós continuamos
ansiosos cada vez que recebemos avisos de algum evento, seja
curtida, comentário ou mensagem. Não sabemos se será bom ou
ruim, como reagem a nós.
É diferente da interação na vida cotidiana, onde os parâmetros
das reações dos outros são mais claros para o nosso cérebro.
Existe até um nome técnico para isso na psicologia, “Esquemas
de Reforço Variável”. Todos nós já experimentamos a sensação boa
de fazer sucesso nas redes e isso ocorre por meio de hormônios
cerebrais, principalmente a dopamina.
Então, queremos sentir de novo. Só que nunca sabemos se cada
atualização ou interação vai ser a que trará essa sensação
novamente, então ficamos atualizando as redes sem parar.
O vício não é no tema que as pessoas discutem, é no
mecanismo da plataforma. Se a pessoa está com fixação em grupos
de política, não é política que a motiva. Ela é motivada pelas doses
de dopamina das redes e pelo relacionamento social que vem
desses grupos.
E é a partir daqui que nós passamos aos diferentes tipos de
sentimentos relacionados aos zumbis de internet. Uma coisa é usar,
no meio da pandemia, todos os recursos possíveis para ficar perto
das pessoas importantes para nós. Outra coisa é ter nas redes
sociais vínculos pessoais mais fortes do que com pessoas
conhecidas.
Você pode conhecer pessoas nas redes sociais e acabar se
aproximando delas, é natural, apenas uma forma diferente de se
conhecer. Mas é muito diferente quando as pessoas criam vínculo
com um grupo que só se une por uma determinada ideia ou paixão,
sem conhecer as pessoas direito.
Pense num fã-clube: qual o espaço que ele deve ter na nossa
vida? É o mesmo espaço que devem ter os grupos de política, por
exemplo.
Partindo desse ponto, vamos encontrar diferentes razões pelas
quais pessoas que você ama preferem manter vínculos sociais
pelas redes, até com desconhecidos, o tempo todo, como se fossem
zumbis. Interromper esse processo depende de duas coisas:
conhecer como funciona a rede e resolver o problema real fora dela.
O ponto de partida é entender o nível de emoções intensas a
que a pessoa está exposta, com atenção especial para a
agressividade.
É comum que pessoas busquem na rede a emoção que falta na
vida real, principalmente quando se sentem frustradas. Mas também
é possível que a pessoa seja refém da explosão emocional de um
grupo e aí a abordagem precisa ser diferente.
Os alvos
Quando vemos uma pessoa ser atacada na internet, nossa
primeira reação é dizer para não se preocupar e deixar para lá.
Já pensamos que não vale a pena gastar tempo com isso, afinal
todo mundo já ouviu falar dos tais “trolls”, o pessoal que entra na
internet só para infernizar os outros. Ocorre que essa era já passou,
a tecnologia evoluiu.
Hoje, é possível fazer com que as pessoas sofram
consequências reais e graves na vida por armações de um grupelho
pela internet. Às vezes, o alvo pode ser a pessoa. Por exemplo, no
final de um relacionamento conturbado, uma parte resolve se vingar
da outra organizando uma série de falsas queixas ao empregador
dela ou resolve postar um vídeo íntimo na internet.
Mas uma pessoa pode ser atingida como dano colateral também.
O problema não é com ela, mas sua vida ou seu negócio serão
utilizados como um jogo de emoções estimulantes entre um grupo.
Um caso interessante é da loja de móveis Wayfair, que entrou na
dança das acusações de pedofilia por puro acaso e viveu um
inferno.
Uma usuária anônima, que se identificava por
PrincessPeach1987, postou uma enquete na rede social Reddit com
a foto de uma linha de armários da Wayfair. A pergunta era: “Será
que a Wayfair está envolvida em tráfico humano com a sua linha
WFX Utility? Ou será que são só armários incrivelmente caros?
(Repare nos nomes dos armários) isso me dá nojo se for realmente
verdade :(“
Os armários tinham nomes de mulheres e eram extremamente
caros, então uma pessoa anônima resolveu perguntar se o preço
era porque a empresa não comercializava armários, vendia
mulheres e meninas dentro de armários.
Parece brincadeira, né? E pode até ser. Mas virou uma crise
para a empresa. Uma usuária francesa do Twitter, também anônima,
identificada como Ervaa_, postou uma série de fotomontagens com
rostos de meninas que supostamente seriam vendidas dentro dos
armários da Wayfair.
Isso ganhou uma proporção absurda em horas. A empresa teve
de explicar que aquela linha de armário é técnica, destinada à
indústria, por isso é cara. Não adiantou nada.
No final das contas, devido a brincadeiras feitas por contas
anônimas, uma empresa enorme, que tem advogados e gabinete de
gerenciamento de crise, teve de suspender a venda de uma linha de
armários que custavam em média US$ 10 mil.
Além disso, teve de mudar todos os nomes dos produtos, já que
a antiga tradição de colocar nomes de mulheres se tornou uma
ameaça à imagem.
Imagine se você ou o negócio da sua família ficarem na mira
dessas pessoas? Pode ser o caso de alguém que você ama. A
pessoa pode estar sendo difamada na internet por vingança pessoal
ou porque um grupo unido pelo esporte de atacar outras pessoas se
encontrou com ela. Vai adiantar dizer à pessoa que ela não deve
ligar? Claro que não.
Se você realmente quer ajudar, precisa primeiro compreender o
que acontece. Isso se faz de duas formas: primeiro ouvindo a
pessoa e depois compreendendo um pouco sobre o universo digital.
Nessa segunda parte, eu vou te ajudar com um capítulo especial de
exercícios de Alfabetização Midiática. Você vai poder avaliar em que
ponto está, o que já sabe e o que precisa aprender.
Nem todo ataque terá consequências na vida da pessoa de que
você gosta mas, se ela fica sozinha para viver isso, ficará cada vez
mais obcecada e, consequentemente, enlouquecida nas redes
sociais.
É muito doloroso viver um sofrimento real e com potencial de
grandes danos sem ser compreendido por quem amamos.
Na maioria desses casos, nem família nem amigos entendem a
dinâmica das redes o suficiente para compreender o drama que a
pessoa vive. Então, se ela começar a sofrer consequências
emocionais, psicológicas e até profissionais e financeiras, vai
receber uma tonelada de conselhos inúteis e insensíveis.
E isso não ocorre porque as pessoas sejam insensíveis, mas
porque não imaginam que ataques na internet sejam nada além de
gente maluca xingando. Só quando compreendemos como as redes
funcionam conseguimos avaliar o tamanho do problema, oferecer a
ajuda adequada às pessoas que amamos e colaborar para a
solução.
A primeira avaliação a fazer é o real impacto que o ataque pode
ter na vida da pessoa, verificando o tamanho da rede que ataca, a
persistência e a influência. Aqui pouco importa se o ataque é
verdadeiro ou uma acusação estapafúrdia, interessa se provoca
emoções empolgantes, que motivam o grupo a agir imediatamente
contra a pessoa atacada.
Tudo é uma questão de proporções. Já acompanhei em tempo
real um ataque planejado por um punhado de moleques no
whatsapp contra uma moça lésbica que respondeu de forma ríspida
ao xingamento de um deles.
Ela tinha pouco mais de mil seguidores e uma loja de roupas no
Instagram. Com poucas horas da ação deles, todos donos de perfis
anônimos, precisou fechar a loja e o perfil.
O que fazer se você verificar que a pessoa que você ama está
transtornada porque realmente há a possibilidade de ser arruinada
por uma mistificação dessas? Ninguém ainda tem um remédio para
isso, mas tenho algumas sugestões.
A primeira é aprender sobre o funcionamento das redes ou pedir
a ajuda de alguém que saiba para monitorar as postagens,
denunciar como imprópria na plataforma e arquivar. A pessoa jamais
deve responder diretamente a quem a ataca, isso só maximiza o
ataque. É um erro que cometi muitas vezes e aprendi e não repetir.
O ideal é que a pessoa atacada não tenha que fazer isso porque
é desgastante emocionalmente. Uma ajuda fundamental é reunir um
grupo de solidariedade para monitorar as redes e arquivar ataques.
O foco principal deve ser nos que mais postam e não naqueles
queentram de embalo, só fazendo comentários para ser da turma.
Com tudo em mãos, a única forma de parar um ataque é recorrer às
autoridades.
Existem diversas formas de fazer isso e eu recomendo duas. A
primeira é procurar a Delegacia de Polícia (que pode ser virtual) e
fazer um boletim de ocorrência de difamação. Eles chegarão até a
pessoa e, se a vítima quiser, dão início a um processo penal contra
ela.
A outra forma é recorrer ao Juizado Especial Cível, que não
precisa nem de advogado. Os funcionários instruem como recorrer e
pessoas difamadas têm direito a dano moral. Os canais de
reclamação das redes sociais muito raramente fazem seu papel.
Sejamos francos, todos têm direito à imagem e a honra, mas
essa trabalheira toda, parando a vida da gente, só vale a pena
quando realmente se avalia que há risco de sofrer consequências
reais dos ataques, para além das psicológicas e emocionais. Há
casos em que as pessoas não enxergam que apesar de
desagradáveis, são ataques que jamais vão dar certo.
Meu melhor exemplo é o que ouvi uma vez, de moça muito
corajosa, que ajudou a desmascarar o estuprador Roger
Abdelmassih. Ela estava muito triste e preocupada com uma série
de vídeos difamatórios contra ela feitos por uma pessoa que tem
muitas informações pessoais dela mas apóia integralmente o
estuprador em série.
Nesse caso, mesmo que a difamadora diga a verdade e consiga
fazer um discurso muito contagiante, não conseguirá arranhar a
reputação da minha amiga, conforme planejava. O caso foi muito
público, as mulheres que o denunciaram são vistas pelo Brasil
inteiro como muito corajosas e há um sentimento generalizado de
repulsa pelo estuprador.
Para quem está dentro do furacão de difamação e mensagens
de xingamento, isso não é tão claro. Quem difama pode querer
apenas incomodar aquela pessoa, tirar o sono, deixar
desconfortável. E ela, que é uma pessoa muito honesta e que preza
pela própria reputação, estava transtornada.
Como você se sentiria se todos os dias, o dia todo, recebesse
mensagens difamatórias e soubesse de vídeos falando mal de
você?
Nesses casos, o melhor a fazer é unir várias pessoas para
conversar com a que está sendo atacada e deixar claro que ela não
corre risco. É bom oferecer apoio e não minimizar porque se trata de
algo muito estressante. Há pessoas que se sentem melhor
buscando a Justiça nesses casos também e elas têm todo o direito.
Ouvir, acolher, procurar entender melhor o funcionamento das
redes e, sobretudo, não despejar sobre a pessoa soluções prontas
que ignoram essa realidade é o melhor a fazer se alguém que você
ama tem sido atacado pelas redes sociais.
Busque compreender mais sobre ataques antes de recorrer à
resposta pronta e errada de que são apenas uns tontos falando
bobagem na internet.
Minimizar é a tendência geral, já que nós ainda não conhecemos
muito sobre isso. No Brasil, particularmente, mesmo pessoas da
área de comunicação, marketing e tecnologia da informação
minimizam ataques por desconhecimento dos estudos mais
recentes.
Para se ter ideia da gravidade, alguns tipos de ataques já são
considerados terrorismo doméstico pelo FBI.
Os franco-atiradores
Essa é uma dura verdade, mas pode ser que a gente ame
alguém da ala dos difamadores. Sabe aquele grupo do qual falei
que se une pelos ataques que faz aos outros, como o da empresa
de armários? Pois é, eles são mais comuns do que se pensa.
Ultimamente, eles falam bastante sobre política ou sobre o que
eles acham que seja política. Na verdade, todo tema é uma
desculpa para viver emoções excitantes. Sempre haverá um grande
escândalo que querem esconder de você e por isso você precisa
espalhar já para todos os seus contatos e agir antes que derrubem o
vídeo.
Reconhece a linguagem? Pois é. É feita sob medida para
engajar um grupo por diversas razões -e entre elas não está
informar nem fazer com que essas pessoas se sintam bem ou sejam
livres. O difícil é entender o que leva alguém a perder
completamente os freios morais e passar a atacar os outros.
As pessoas que se deixam levar por esses grupos não são
aquelas loucas por política, muito dedicadas a uma religião ou
ideologia, nada disso. Isso é apenas a desculpa que dão para si. As
características em comum entre essas pessoas são psicológicas, já
que a união é feita por processos psicológicos das redes sociais.
O grande ponto é o ressentimento. A pessoa sente que a vida
lhe deve algo, que ela tem direito a algo que lhe é negado. Pode ser
o amor, a atenção da família, o cargo que queria, o reconhecimento
profissional, o sucesso financeiro. E pouco importa se a pessoa tem
razão ou não, se é bem sucedida ou não, importa sentir que deveria
ter algo que não tem.
Nos grupos, a pessoa vai achar a justificativa para isso, o inimigo
que deve combater para viver em plenitude a vida que lhe foi
negada. O problema vai ser o comunismo, os imigrantes, os
evangélicos, uma grande conspiração, o STF, o Congresso
Nacional, os globalistas, pouco importa.
Importa é ter muita gente concordando que essa pessoa sempre
mereceu muito mais e foi injustiçada, o que pode ser ou não
verdade. Na maioria das vezes, os que se crêem grandes gênios
incompreendidos não são gênios e são incompreendidos apenas
por si mesmos. Mas as dores do coração são poderosas.
Pense em pessoas que eram meio deixadas de lado pela família
na correria da vida. Gente que a família não queria ouvir ou
ridicularizava, diminuía. Muitas dessas pessoas começaram a ser
tratadas de outra forma quando entraram nesses grupos e
começaram a mandar fake news no grupo de whatsapp da família.
Em vários casos, quando um membro da família resolveu
abordar a pessoa sobre o absurdo e a agressividade das postagens,
a resposta foi: “ah, agora você me nota, né?”. Imagine um grupo de
várias pessoas na mesma situação sem um especialista para dar
conta de tantos rancores. É o que vivemos hoje.
Uma pessoa que você ama pode ter resolvido direcionar todos
os seus vínculos emocionais para gente que nem conhece e se
esconde atrás de perfis virtuais. Não é criando caso ou dizendo que
a pessoa está viciada que esse ciclo vai ser interrompido, é
compreendendo qual o problema de convivência.
Já conversei com várias pessoas que fazem ou fizeram parte
desses grupos. Aqueles que saem o fazem quando finalmente
compreendem o funcionamento das redes e percebem que estão
deixando que esse sistema manipule o que têm de pior. Aprendem
que são eles que devem manipular o sistema, não o oposto.
Pessoas de quem eu gosto, principalmente mulheres muito
doces, são capazes de ir ao perfil de um desconhecido dizer os
piores impropérios convencidas de que precisam fazer isso
urgentemente devido a uma mensagem do grupo de Whatsapp.
Não sabem quem mandou a mensagem, não checam se é
verdade, não conhecem a pessoa que atacam e nem se importam
com as consequências. Elas se sentem necessárias e importantes.
Talvez elas sempre tenham sido muito queridas pelos que estão à
sua volta, mas a comunicação sobre isso não foi eficiente.
É inútil ficar desmentindo mentiras ou convencendo de que
ataques são imorais a menos que esse processo ande em paralelo
com a aproximação emocional, acolhimento e aprofundamento no
conhecimento sobre o funcionamento das redes. Confrontar de
forma dura faz com que a pessoa cada vez mais se abrigue no
grupo virtual.
Por meio desse processo, que precisa ser contínuo, a pessoa
percebe que não faz sentido pensar na relação com um grupo virtual
como se fosse o vínculo com pessoas que conhece. Em alguns
casos e, arrisco dizer, sempre que possível, buscar a ajuda de um
terapeuta só beneficia e acelera.
Você já deve ter visto na imprensa casos diagnosticados de
pessoas que ficaram realmente viciadas na tecnologia. Isso é
porque as redes são projetadas para, por meio dos avisos, da
espera em carregar e de vários outros recursos, ativar no nosso
cérebro disparos de um hormônio chamado dopamina.
Ficamos viciados nessa sensação. Mas os casos em que a
pessoa abandona o cotidiano em nome da dopamina são médicos e
são raros numericamente.O nosso problema maior ainda é não
conseguir entender em que mundo estamos e perder tempo demais
tentando resolver problemas da forma errada.
A internet não é só uma mudança de tecnologia, precisamos
entender como uma mudança do contexto em que vivemos.
Todas as vezes em que tentamos resolver nossos problemas
sem levar em conta que o contexto mudou fazemos apostas
erradas. Aprender quais são as mudanças de contexto é o que vai
nos fazer conseguir usar a nossa experiência de vida nas questões
desse mundo digital.
ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA
O que é um analfabeto para você? O mundo evolui tão rápido que
até outro dia a gente considerava analfabeto quem sabia, no
máximo, assinar o nome. Depois descobrimos que existem os
analfabetos funcionais, os que lêem o som das palavras mas não
entendem o significado das frases. Agora, muitos de nós viramos
analfabetos.
 
 
Como assim???
Calma, o conhecimento está caminhando tão rápido que atropela
a gente, mas eu vou te atualizar de uma forma simples, trocando em
miúdos esse novo conceito dos especialistas. A pessoa considerada
alfabetizada agora, de acordo com aquele teste de que toda hora
falam na mídia, o PISA, não é a que sabe ler e escrever, é mais que
isso.
Antes das redes sociais, decifrar os textos era o suficiente para
um ser humano entender o contexto e poder participar dele
expressando exatamente o que desejava. Agora, isso não basta
mais. Há uma outra necessidade que, em inglês foi chamada de
Media Literacy, que traduzimos como Alfabetização Midiática.
A expressão quer dizer a capacidade de aprender a "ler" a mídia,
de entender o que está por trás da mensagem, as técnicas
utilizadas, a diferença entre informação e propaganda, perfis
verdadeiros e falsos, postagens humanas e automatizadas,
mensagens espontâneas e feitas para gerar engajamento.
Sem saber isso, mesmo quem sabe ler não entende o contexto
das redes sociais. E isso coloca a pessoa numa situação pior que a
de um analfabeto porque ela tem a ilusão de saber.
É como se, por exemplo, uma pessoa analfabeta julgasse saber
ler e, por isso, resolvesse ler uma receita médica e tomar os
remédios que entende estarem prescritos na dose que
compreendeu ser a correta. Qual a chance de dar certo?
Como isso se aplica, na prática, na vida digital? Uma pessoa
experiente, com nível universitário, pode se colocar a discutir na
internet com um robô programado por inteligência artificial porque
não imagina que ele pode parecer um perfil humano e dar respostas
variadas.
Quer outro exemplo? Você pode, sem querer, passar num grupo
de Whatsapp com pessoas que não conhece - ou até, Deus me
livre, que conhece - informações sobre amigos ou familiares que
serão usadas para ataques virtuais contra eles. Isso porque, sem
imaginar que informações são importantes, não ficamos alerta
quando perguntam sobre elas.
O conceito de alfabetização mudou porque o mundo mudou.
Com as mídias sociais, cada cidadão foi promovido à categoria de
meio de comunicação. Só que quantos de nós aprendemos as
técnicas de comunicação necessárias para checar informações e
fazer com que os outros entendam o que realmente estamos
tentando expressar? É hora de correr atrás do prejuízo.
As novas gerações
A transformação nas comunicações deixou numa espécie de
limbo geracional as pessoas que têm mais de 17 anos. São pessoas
que vivenciaram a transição digital, em diferentes graus. Quanto
mais idade a pessoa tem, mais tempo ela viveu a dinâmica de um
mundo analógico e mais adaptações precisará fazer para que seu
raciocínio opere na frequência do mundo digital.
Não quer dizer que as pessoas mais velhas necessariamente
demorem mais ou tenham mais dificuldades para compreender o
que muda nos relacionamentos, forma de pensar, expectativas e
maneiras de consumir informações. Tudo depende da capacidade
de adaptação e vontade de aprender de cada indivíduo.
E por que eu falei exatamente 17 anos? Porque a área da
Educação já percebeu essas mudanças e foi, gradativamente,
fazendo uma transição no que formalmente é considerado ser
alfabetizado. Quem tinha 15 anos em 2018 já foi avaliado numa
dinâmica que considera a diversidade do mundo digital. A transição
nessa compreensão não foi brusca, mas foi bastante rápida.
Tomo aqui como exemplo algo bem específico que a gente
sempre vê na mídia quando ao assunto é educação, o PISA. Falo
do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), feito nos países membros anualmente com estudantes de
15 anos de idade.
Quem tinha 15 anos de idade no último teste, feito em 2018, está
na primeira turma de estudantes já avaliada após uma reformulação
completa no conceito de alfabetização.
Até a edição anterior, o conceito de plena alfabetização tinha o
foco em leitura e compreensão de textos. O que se incluiu agora?
Capacidade de encontrar informações e de avaliar fontes.
Todos os que têm mais de 17 anos não tiveram posta à prova, no
sistema educacional, a capacidade de encontrar informações que
deseja e verificar se são confiáveis.
Agora, essas habilidades passaram a integrar o que se define
como capacidade de leitura, ou seja, alfabetização.
Quando pensamos naquela divisão clássica de conhecimentos
feita nas escolas, podemos até pensar que a leitura e a
comunicação são tão importantes quanto ciências e matemática, por
exemplo.
Segundo os educadores, trata-se de graus diferentes de
importância. Capacidade de leitura é o conhecimento mais
importante de um ser humano.
"A capacidade de leitura não é apenas o fundamento para obter
bons resultados em outras áreas do sistema educacional, mas
também um pré-requisito para a participação com sucesso na
maioria das áreas da vida adulta", segundo a OCDE. Mas o que é a
tal “capacidade de leitura”? Um conceito que acompanhou as
mudanças dos últimos 20 anos.
No ano 2000: "Capacidade de leitura é entender, usar e refletir
sobre textos escritos, de forma a que o indivíduo atinja os próprios
objetivos de desenvolvimento de conhecimento e potencial e
participe na sociedade".
Em 2009 já se sentiu o efeito das novas tecnologias na
capacidade de leitura, que passou a ganhar um conceito a mais,
interação: "Capacidade de leitura é entender, usar, refletir sobre e
interagir com textos escritos, de forma a que o indivíduo atinja os
próprios objetivos de desenvolvimento de conhecimento e potencial
e participe na sociedade".
Em 2018, nova mudança. Agora, capacidade de leitura também
engloba a capacidade de avaliar. Além disso, passou-se a
considerar que texto não é apenas o que vem escrito, engloba todas
as modalidades possíveis de comunicação digital. "Capacidade de
leitura é entender, usar , avaliar, refletir sobre e interagir com textos
escritos, de forma a que o indivíduo atinja os próprios objetivos de
desenvolvimento de conhecimento e potencial e participe na
sociedade".
A rigor, segundo a OCDE, não houve mudança na definição de
capacidade de leitura, o que mudou foi o mundo. A definição
recebeu alterações pontuais para que signifique hoje o mesmo nível
de capacidade que significava há 20 anos.
"Estabelecer e conquistar objetivos não são os motivadores
apenas da decisão de interagir com textos, fazer seleção de textos e
passagens de texto, mas também decisões de parar de interagir
com determinado texto, passar a interagir com outro, comparar e
integrar a informação avaliada de diversas fontes", explicam os
especialistas em educação que fazem o PISA.
A comunicação extrapolou a barreira do debate de ideias e da
compreensão de texto, passa a ser habilidade importante
compreender o contexto, sua posição nele e decidir com o que e
quem interagir.
TESTE SEU NÍVEL DE ALFABETIZAÇÃO
Claro que a vida adulta é muito mais complexa que a adolescência,
até mesmo para nossos amigos adolescentes de 40 anos. Mas o
passo-a-passo do PISA continua sendo o melhor manual para a
gente avaliar como se posiciona em termos de alfabetização nesse
novo mundo digital.
 
 
Você não vai precisar fazer o PISA, mas compreenderquais são
os 7 níveis de alfabetização no mundo de hoje para se localizar e
entender se há mais habilidades que precisa desenvolver. As
diferenças entre um nível e outro são sutis, mas decisivas.
Uma dica importante é primeiro reparar se ali há algum conceito
ou ideia em que você jamais havia pensado antes ou de que ainda
não havia ouvido falar.
Provavelmente são esses os seus maiores entraves para estar
no nível mais alto e, de repente, lidar com eles pode ser muito mais
simples do que você pensa.
Há 3 HABILIDADES BÁSICAS que determinam que uma pessoa
tem capacidade de leitura:
1. Localizar informação: acessar e colher informação em um
texto, procurar e selecionar textos relevantes.
2. Compreender: representar o sentido literal, compreender
conclusões e fazer as próprias conclusões.
3. Avaliar e refletir: avaliar qualidade e credibilidade, refletir
sobre forma e conteúdo, detectar conflitos e lidar com eles."
O desempenho das pessoas não é linear em todas as
capacidades aí citadas, ele varia. É combinando essas variações
que o PISA chega a 7 níveis diferentes de compreensão de texto -
lembrando sempre que texto não é mais só aquilo que está escrito,
engloba também vídeos, imagens, áudios e até o universo dos
memes.
Os níveis são: 1b, 1a, 2, 3, 4, 5 e 6. Cada nível tem, além das
habilidades descritas nele, todas as dos níveis anteriores. Apenas
quem está nos níveis 5 e 6 é plenamente capaz de diferenciar
fatos de opinião na nova realidade da informação.
Níveis de proficiência em capacidade de leitura, segundo a
avaliação do PISA:
Nível 1b: Localizar uma peça única de informação explícita
colocada em local evidente, num texto curto e com simplicidade
sintática, em contexto e tipo que conhece bem, como narrativa ou
listas simples. São textos que geralmente dão apoio ao leitor
repetindo a informação ou adicionando fotos e símbolos familiares.
Os leitores podem interpretar os textos fazendo conexões simples
entre informações parecidas.
Nível 1a: Localizar mais que uma peça de informação explícita,
reconhecer o tema principal e o propósito do autor em um texto
sobre tema que domina ou fazer uma conexão simples entre a
informação do texto e o conhecimento do cotidiano. São textos em
que a informação principal é bem destacada e o leitor é
explicitamente direcionado a ela, sem levar em conta ou havendo
um mínimo de informações conflitantes.
Nível 2: Localizar uma ou mais peças de informações. Pode
reconhecer a ideia principal em um texto, entender relações ou
interpretar significados em uma parte limitada do texto mesmo
quando a informação não é tão explícita e necessita um pouco de
raciocínio. Nesse nível, as tarefas envolvem comparações ou
contrastes baseados em um único elemento do texto. A reflexão
típica deste nível requer fazer comparações ou conexões entre o
texto e conhecimento externo, recorrendo à experiência e atitude
individual.
Nível 3: Localizar e, em alguns casos, reconhecer relações entre
várias peças de informações. Integrar várias partes de um texto em
ordem para identificar a ideia principal, entender a relação ou
interpretar o significado de uma frase ou palavra. É preciso levar em
conta vários fatores para comparar, contrastar ou categorizar. A
informação não é tão evidente ou há competição de informações,
como obstáculos no texto, por exemplo, ideias que são contrárias às
expectativas ou expressas em formato de negação. A reflexão
requer conexões, comparações e explicações ou a avaliação de um
elemento do texto. Necessário demonstrar bom conhecimento do
texto com relação ao conhecimento familiar e cotidiano. Não chega
a requerer compreensão detalhada do texto, mas pelo menos busca
de apoio em senso comum.
Nível 4: Localizar e organizar várias peças com informação
embutida. Interpretar nuances de linguagem de parte do texto
comparando com o todo. Compreensão e categorização de textos
num contexto em que não está familiarizado. Capacidade de criar
hipóteses ou avaliar o texto de forma crítica usando conhecimento
do senso comum ou acadêmico. Demonstrar grande compreensão
de textos longos e complexos com cujo conteúdo ou forma não tem
familiaridade.
Nível 5: Localizar e organizar várias peças com informação
profundamente embutida, concluindo quais informações no texto
são relevantes. Reflexão por meio de criação de hipóteses ou
avaliação crítica a partir de conhecimento especializado. Entender
completamente e em detalhe texto cujo conteúdo ou forma não é
familiar. Nesse nível - e não nos anteriores - o leitor é capaz de lidar
com conceitos que são contrários às suas expectativas ou crenças.
Nível 6: Capacidade de tirar múltiplas conclusões, fazer
comparações e contrastes que são detalhados e precisos. Completo
e detalhado entendimento de um ou mais textos e integrar
informação de mais de um texto. Lidar com ideias não familiares na
presença de informações explícitas que concorrem com elas e gerar
categorias abstratas para interpretações. Criar hipóteses ou fazer
avaliações críticas do texto sobre um assunto em que não são
familiarizados, levando em conta múltiplos critérios e perspectiva e
aplicando entendimento sofisticado para além do que está no texto.
Uma condição importante para identificar e realizar tarefas neste
nível é a precisão de análise e a atenção fina ao detalhe que é
quase imperceptível nos textos.
É muito interessante ler a sequência, ainda que a gente não seja
especialista para compreender exatamente todas as nuances da
avaliação.
Acompanhe que localizar a informação é algo tratado com tantas
camadas quanto uma cebola, com diferentes níveis de capacidade,
não apenas pela capacidade de ler e domínio tecnológico, mas
também pelo repertório de ideias e conceitos.
Quanto maior o domínio da leitura, menor a ideia de verdade
absoluta e maior a capacidade de compreender aquilo que é
diferente das nossas crenças e valores.
Precisamos lembrar também da importância do conceito de
interação. Já vimos a complexidade que se tornou saber ler, vamos
pensar agora na série de habilidades que precisamos ter para nos
expressar.
Os princípios são os mesmos: ter em mente o que queremos
dizer às pessoas. O que cai definitivamente por terra é aquela frase
antiga: “eu sou responsável pelo que eu digo e não pelo que você
entende”.
Na verdade, pode até não ser responsável, mas acaba sofrendo
as consequências. Precisamos compreender o caminho que será
trilhado pela informação para que as pessoas entendam da maneira
mais clara possível o que queremos dizer.
A DIFERENÇA ENTRE FATO, OPINIÃO E
FANTASIA
No PISA, há uma preocupação muito grande com a diferenciação
entre opinião e fato porque o debate é sobre capacidade de leitura.
Se a gente levar esse conceito para as redes sociais, esticamos um
pouco, temos um território onde se confunde opinião, fato e fantasia.
 
 
Fora do mundo virtual, é muito comum a gente saber identificar
quando um raciocínio nosso é ou parte de uma fantasia sem nexo
nenhum com a realidade, ancorada apenas no nosso universo
interno, coisas que às vezes não sabemos explicar.
Um exemplo prosaico: sabe aquela pessoa de quem você tem
ranço? Uma pessoa com quem o santo não bate de jeito nenhum,
com quem você simplesmente não vai com a cara, sente uma
energia ruim mas sabe que a tal pessoa nunca lhe fez nada e você
não tem motivo para se sentir assim.
Saber que não há motivação para aquilo de ruim que você sente
e, muitas vezes, pensa sobre uma pessoa tem impacto na forma
como você age com ela e fala dela. Imagine se você não fosse
capaz de perceber essa diferença?
Avalia se você realmente confundisse um ranço besta com o
sentimento que tem por alguém que já te prejudicou. Nesse caso,
sua forma de agir socialmente seria um tanto confusa e geraria
problemas ou pelo excesso de desconfiança ou pela falta de
abertura ao outro.
Nas redes sociais, as fantasias são frequentemente confundidas
com opiniões que, supostamente, teriam peso para contrapor fatos.
O resultado final é a contestação da realidade com impressões,
ou seja, viver num universoparalelo, criado para que tudo seja
como queremos que seja. Precisamos ter muita clareza da diferença
de conceitos entre FATO, OPINIÃO e IMPRESSÃO.
FATO - Algo que pode ser comprovado de forma inequívoca.
Exemplo: “As eleições no Brasil são feitas com urnas
eletrônicas”. É possível verificar se é verdade ou não de maneira
inequívoca, portanto é um fato.
OPINIÃO - É a avaliação pessoal, com base em fatos e teorias.
Exemplo: “As autoridades não lidam bem com os
questionamentos sobre segurança das urnas eletrônicas”.
Qual é o FATO que conheço e do qual eu parto para opinar?
Há pessoas que questionam publicamente a segurança das
urnas eletrônicas.
Qual é a minha OPINIÃO sobre o assunto?
Sou comunicadora e sei que a estratégia de minimizar
preocupações das pessoas, mesmo quando são absurdas e
infundadas, dá a impressão de que as autoridades estão
escondendo algo. Minha opinião é que poderiam agir de outra
forma.
Qual é a minha OPINIÃO sobre a segurança das urnas
eletrônicas?
Eu não tenho opinião formada porque não domino tecnicamente
a área de segurança digital nem conheço os fatos necessários para
emitir essa opinião.
IMPRESSÃO - É o que eu sinto sobre o tema, tendo a
consciência de que não se trata de opinião nem serve para
contrapor dados de quem realmente entende do assunto
tecnicamente.
Exemplo: “Eu tenho impressão de que as urnas eletrônicas
são mais seguras que as de papel”.
Qual o FATO por trás dessa afirmação?
Nenhum e, por isso, é impossível que seja uma opinião. É uma
afirmação que eu sou livre para fazer e revela um sentimento que
tenho decorrente de algumas experiências. Cobri muitas eleições e
sinto que havia muito mais problemas quando as urnas eram de
papel, pela falta de controle e demora nas apurações.
E por que isso NÃO é uma OPINIÃO?
Porque eu tenho consciência de que a minha análise parte do
sentimento que eu tenho com relação a essas experiências, não de
FATOS. Eu não tenho acesso ao número total de problemas e a
extensão deles nas duas modalidades de eleição.
Então você não pode dizer nada se não estudou aquilo o
suficiente?
Pelo contrário! Todos nós somos livres para dizer tudo isso que
sentimos diante de uma situação, afirmação ou pessoa. O que não
podemos é pensar que esse sentimento serve como contestação de
uma OPINIÃO (a avaliação de quem conhece os fatos) ou pior
ainda, para desdizer um FATO em si.
Essa diferenciação é importantíssima e fundamental para a
nossa interação em sociedade e para que a gente consiga
representar bem nosso papel como cidadãos.
Lembremos daquele conceito de que parte da capacidade de
leitura é decidir com o que interagir e com o que parar de interagir.
Saber com clareza a diferença entre FATO, OPINIÃO e
IMPRESSÃO evita que a gente faça interações típicas de quem não
domina a capacidade de leitura na nossa época, ou seja, tenta
colocar no mesmo patamar diferentes tipos de expressão, que
devem ser colocadas em patamares diferentes num debate.
As pessoas não fazem isso porque são estúpidas ou
desinformadas, mas porque as mudanças tecnológicas alteram
nossa percepção da interação e, de certa forma, trazem uma
confusão entre o universo privado e o debate público.
Já não eram linhas muito bem definidas com a mídia analógica
no caso de celebridades e autoridades, o que é o universo público e
particular de cada um difere dependendo da cultura.
Agora que todos nós viramos um meio de comunicação, cabe a
cada um de nós estabelecer esses limites de maneira consciente e
a base para esse processo é o conhecimento.
ALGORITMOS E RELACIONAMENTOS
Há um elemento importantíssimo que passou a ser parte do debate
público: o celular. Ele passou a ser uma muleta nas relações
humanas, seja nas interações da nossa vida privada, profissional ou
pública.
 
 
O celular acelera o compartilhamento de informações, facilita
uma série de tarefas do cotidiano mas, tenho de admitir, trouxe
como principal mudança o dom de evitar, quase como passe de
mágica, interações incômodas com pessoas.
A gente pode responder com emoji, dar block, fingir que não viu,
marcar como não lido, mandar mensagem de voz. São inúmeros os
recursos para fugir de um olho no olho sincero.
Agora não nos comunicamos mais ajustando o ritmo de uma
pessoa ao da outra e seguindo um fluxo de interação. Cada um
decide qual é o seu tempo e, se não quiser, não precisa reagir ao
tempo do outro nem da situação em si.
Estar desprevenido tem um novo significado. Nós decidimos
quando queremos contato com a pessoa e se isso vai incluir ou não
ouvir a voz, encarar o olhar ou sentir o cheiro.
Imagina que você precisa contar uma coisa super chata para
alguém. Vou aqui projetar as várias maneiras de fazer isso hoje em
dia.
A primeira é old school: encontro pessoal. Estão os dois numa
mesa, um de cada lado, olho no olho. Você avalia a situação pelo
estado emocional do outro, para ver primeiro se realmente dá para
falar. Então, encontra a melhor forma de dizer e, à medida que vai
falando, mede as reações da pessoa pelas expressões faciais e
gestos. Daí decide o tom, as palavras, o caminho da conversa e até
se desiste dela. O olhar é muito poderoso para conectar pessoas e
despertar empatia, parte muito importante do processo de
comunicação.
A segunda hipótese também é old school: você telefona. Você se
prepara para ligar, pensa em como vai falar, liga, sente o clima pela
voz da pessoa e provavelmente inicia uma conversa mais leve para
saber se dá para contar ou não a coisa super chata. Dependendo
disso, vai ou não adiante. Quem já teve a experiência de bater o
telefone na cara de alguém ou de tomar um telefone na cara depois
de uma bela discussão sabe bem que isso tende muito mais a
degringolar do que a conversa olho no olho.
Agora vamos a uma terceira hipótese: você decide contar essa
coisa muito chata para um amigo por email. Só essa decisão já
pode dar a maior encrenca mas, enfim, você pensa bem no que
escrever, faz o texto, relê, pode até dar para alguém de confiança
revisar antes de mandar. Nada disso garante que vai dar certo.
Muitas pessoas lêem imaginando a voz do outro, o tom, o olhar e
daí muda completamente o que elas entendem do texto.
E onde mesmo eu pretendo chegar com isso? Na consciência de
que nós já sabemos que precisamos nos preparar para interagir
com as pessoas, como devemos fazer isso e as consequências de
interagir.
Apesar de ser algo tão natural do nosso comportamento, acaba
ficando um pouco confuso diante da mediação do celular.
O ritual para fazer coisas tão diferentes quanto prestar contas de
um projeto para o chefe ou contar uma fofoca para a melhor amiga
passou a ser o mesmo: pega o celular, destrava, abre o whatsapp,
clica para gravar e manda.
Nós desenvolvemos tanta intimidade com o celular que um dos
maiores clichês é sentir-se nu ao perceber que está sem ele. E
nessa intimidade mora o perigo. Criamos uma confusão tão grande
entre público e privado que, arrisco dizer, não conseguimos definir
um limite entre aquilo que deveria existir exclusivamente no mundo
do pensamento e o que deve ser verbalizado.
Duas fronteiras importantes estão menos claras a partir do
uso do smartphone:
1. O que devo guardar nos pensamentos x O que devo dizer
2. Conversas privadas x Debate público
Todos temos consciência dessas fronteiras e nós sabemos que
uma ideia amadurece até a gente colocar em público para
desconhecidos.
Começa no pensamento, daí a gente tira o que faz sentido e
comenta com os mais íntimos, vai elaborando, comenta com
conhecidos e quando está maduro o suficiente para enfrentar as
críticas até de gente bem chata é que a gente põe em público. Mas
e os impulsos?
Sabemos conter nossos impulsos em diversas situações, em
outras perdemos as estribeiras. Às vezes nos arrependemos, outras
não. Faz parte.
Mas o conjunto de variáveis da convivência social acaba nos
incentivando a melhorar o comportamento e dominar nossos
impulsos em nome de uma boa relação com as pessoas. E por que
seríamos diferentes nas redes sociais? Algoritmos.
Se, na convivência interpessoal,promovemos aquilo que
achamos bom, de qualidade, que dá vontade de dividir, que é
interessante ou que dá status, pensamos que agimos assim em
qualquer ambiente.
Ocorre que, nas redes sociais, não é assim. O negócio das redes
sociais não é a informação ou difusão de notícias e ideias, é a
captação e venda de milhares de dados diferentes sobre milhões de
usuários. Esses dados são usados comercialmente, para
publicidade direcionada de todo tipo.
Se você quer compreender exatamente o que significa
publicidade direcionada, sugiro que veja o documentário
“Privacidade Hackeada”, que está disponível na Netflix e conta os
desdobramentos judiciais do escândalo de uso indevido de dados
pelo Facebook. Tento me fazer compreender por um resumo.
Já aconteceu de você pesquisar o preço de alguma coisa e
depois, em tudo quanto é site ou rede social que você entra tem
propaganda daquilo? Muito provavelmente.
Essa outra é um pouco mais rara, mas já tem muita gente
dizendo sim. Já te aconteceu de conversar sobre algo por telefone
ou até pessoalmente com uma pessoa e começar a aparecer
anúncio relativo ao tema do assunto em sites ou redes sociais?
Esse é o resultado da publicidade direcionada, uma verdadeira
revolução no mundo da publicidade e a única razão pela qual
aplicativos e sites passaram a valer bilhões.
Para montar modelos em que o cliente ideal é apresentado à
marca, potencializando os efeitos da propaganda, é necessário
coletar o máximo possível de dados do cliente.
Aqui não bastam as premissas antigas do marketing, como sexo,
faixa etária, faixa de renda, onde mora. Estamos falando de algo
mais profundo: investigar como age cada pessoa e montar um
padrão para estabelecer se aquela pessoa compraria determinado
produto. Montar esses padrões para uma infinidade de temas exige
coletar muitos dados das pessoas.
Atenção nesse ponto em que muita gente se confunde: não são
apenas os dados do que você posta ou seus dados pessoais, é uma
vigilância de tudo o que você faz e fala 24 horas por dia. Nós damos
autorização para que as redes captem o som dos nossos
microfones e as imagens das nossas câmeras até com o celular
desligado.
Cada clique que damos, o que postamos, o que fingimos não ter
visto no perfil dos outros, o que compartilhamos, em que tela
passamos muito tempo, as postagens das quais falamos com as
pessoas na vida real , o que nos fez vibrar, rir, xingar, calar.
Programa-se a inteligência artificial para sistematizar pelo menos
7 mil pontos diferentes de dados de cada usuário, coletados o
tempo inteiro.
A grande questão é como manter as pessoas plugadas e
interagindo com Facebook, Twitter, Whatsapp e Instagram o máximo
de tempo para coletar esses dados tão preciosos para os bilionários
do Vale do Silício. Aí é que entra o tal do ALGORITMO de que tanto
se tem falado em tudo quanto é canto.
O que é esse ALGORITMO? Tecnicamente, um algoritmo é uma
sequência lógica e finita de instruções para executar as várias e
finitas etapas de uma tarefa. Você passa essas instruções à tal da
inteligência artificial e é assim que ela fica “inteligente”.
Qual a tarefa? Manter as pessoas interagindo com a plataforma
o máximo possível de tempo e ofecerer os produtos dos clientes a
quem os compre.
Há uma indústria que consegue há muitos anos essa
interatividade constante: cassinos. Convencer pessoas a fazer
apostas totalmente desfavoráveis e sem sentido é um processo bem
complexo, mas possível.
No caso das plataformas, não há a perspectiva de ganho
financeiro para o usuário final, o cidadão comum, apenas para quem
é o cliente da plataforma, que a usa para vender produtos ou
serviços. O que oferecer então? Perspectiva de mais status ou
valorização social e disparos de dopamina no cérebro.
Aqui temos a união de batalhões de psiquiatras, psicólogos e
neurologistas com o que há de mais sofisticado na indústria da
tecnologia da informação.
São os experts em comportamento e funcionamento do cérebro
que vão descobrir, elaborar e ditar as melhores técnicas para nos
manter conectados e interagindo o maior tempo possível. Já os
experts em tecnologia da informação vão fazer a programação para
que essas técnicas funcionem.
Quais são os sentimentos que mais paralisam as pessoas e
provocam reações? Medo, raiva e ressentimento. Todos temos
essas emoções, mas em cada um de nós ela é provocada de
formas diferentes.
Os dados coletados com a interação na plataforma vão servir
para identificar o que exatamente nos provoca cada uma dessas
emoções. Então, o ALGORITMO vai fazer aparecer na sua rede
social os posts que causam esses sentimentos paralisantes.
Não se trata de maldade, mas de viabilizar uma indústria
bilionária cuja matéria-prima, os dados pessoais, precisa ser
voluntariamente entregue por seus donos.
E como isso vira dinheiro? Pelas campanhas de marketing das
empresas, feitas pela primeira vez na história de acordo com as
emoções dos clientes.
Essas campanhas são pensadas para provocar determinados
sentimentos e disparadas especificamente para os indivíduos
sensíveis a eles. Até aí, nada muito diferente da evolução da
indústria da propaganda.
O caos começa quando os políticos descobrem que podem
utilizar essas ferramentas para qualquer propósito, sem o
compromisso de falar a verdade, fazendo sua vontade prevalecer.
Para que você entenda exatamente como isso funciona, conto
um caso curioso do filme Privacidade Hackeada, ocorrido em
Trinidad e Tobago, pequeno país do Caribe que recebeu imigração
indiana historicamente.
A população é dividida entre os latinos e os indianos. A equipe
de campanha do lado indiano havia identificado que tinha grandes
riscos de perder, estava muito atrás nas pesquisas. Foi contratado
um serviço de campanha que usa esse tipo de manipulação digital.
E agora você vai entender do que eu estou falando.
A primeira avaliação é de que a principal dificuldade da
candidata indiana era entre os jovens latinos e eles não estavam
indecisos, eram contra tudo o que ela representa.
Qual seria então a solução? Convencê-los a não votar. Mas
como fazer uma campanha direcionada somente aos jovens latinos?
Os especialistas em comportamento resolveram fazer uma
campanha destinada a todos os jovens.
Foi criado um vídeo viral de protesto contra a corrupção,
protagonizado por artistas e influencers. Era uma música em que se
fazia um sinal específico com os braços para dizer que não iriam
votar.
E veja que interessante: não dava para saber que tinha relação
com a campanha política do lado indiano, parecia uma iniciativa
espontânea.
A rede social foi paga para distribuir esse vídeo especificamente
para jovens que ficavam muito mobilizados com discussões sobre
corrupção.
As pessoas que não ligam para o tema não recebem o vídeo,
não vêem nas redes, ele simplesmente não aparece para elas, é a
inteligência do algoritmo.
Qual foi o resultado? Quem recebeu começou a fazer os próprios
vídeos com o tal sinal com os braços dizendo que não ia votar.
Isso virou uma febre entre os jovens em Trinidad e Tobago e aí
vem a pergunta: como iria fazer o lado indiano ganhar?
Os dados coletados respondiam isso: os jovens indianos entram
em tudo quanto é modinha nas redes, mas obedecem os pais na
hora “h”. Os latinos dão mais autonomia aos filhos para decidir o
que fazer e comprar. O lado indiano venceu.
É uma manipulação sofisticada e subreptícia, toda baseada na
coleta de milhares de dados que a maioria das pessoas nem sabe
que não coletados e na análise deles por inteligência artificial.
O uso também é bastante estratégico. Imagine se alguém que
viu o vídeo dos influencers dizendo que não iriam votar pensou que
poderia se tratar de uma campanha pelo lado indiano. Qualquer um
que dissesse isso seria tido como louco.
Sabem por quê? Porque dar atenção apenas à mensagem e não
ao contexto é a forma de ler o mundo analógico e também a forma
de ser analfabeto no mundo digital. A mensagem passada nas redes
sociais não significa necessariamente a intenção e a crença de
quem a emite.
A comunicação ganhou uma camadaa mais: o efeito da
mensagem não é determinado só pelas palavras, mas pela forma
como é feita, o momento e com quem se escolhe ou não interagir.
Materiais contra a corrupção na política são perfeitos para fazer
campanha para um político específico não só neste caso, mas no
mundo todo.
Eles provocam emoções empolgantes e, embora a prática seja
exatamente o que o público-alvo mais abomina, ele não percebe.
Muita gente adere voluntariamente sem saber do que se trata.
Corrupção é algo que deixa as pessoas tão revoltadas que elas
se engajam em qualquer campanha e apóiam qualquer denúncia
sem pensar duas vezes.
Pode ser que elas estejam, sem saber, participando da
estratégia de comunicação de um corrupto. Pense bem: você já caiu
em uma dessas? Eu já, até estudar com mais profundidade sobre
Alfabetização Digital.
A MENTE ANALÓGICA
Quem pensa de forma analógica tende a reagir às informações que
recebe de acordo com duas premissas falsas:
 
1. Que a informação chegou por ser relevante e muito
divulgada.
2. Que é possível fazer um debate sobre o conteúdo.
As redes sociais possuem um modelo de negócio em que não é
possível priorizar qualidade e não existe debate.
Nenhuma informação chega até nós em rede social pela
relevância, chega pela capacidade de provocar emoções
empolgantes, sejam boas ou ruins. Reagir é uma escolha e a forma
de reagir é outra.
Podemos cometer o erro comum da nossa mente analógica,
ainda analfabeta midiática, de imaginar que é possível fazer
contraponto a ideias. Nos esquecemos do ALGORITMO.
Quando alguém nos responde numa rede social, a não ser no
caso de pessoas que são do seu relacionamento pessoal e você
sabe o que querem, pode estar querendo apenas falar para o seu
público, não quer conversar com você.
Se você responde a alguém que finge querer debater mas está
apenas numa estratégia para atingir seu público, você não está
debatendo, está fazendo outra coisa. Sabe o quê? Está
apresentando essa pessoa a toda a sua rede de contatos e
ampliando o que ela diz, mesmo que você discorde.
Suponhamos que você decida interagir com alguém que você
não conhece porque ficou muito revoltado com o que essa pessoa
fez e acha que precisa agir imediatamente para todo mundo ver
aquele absurdo. Qual será o efeito da sua ação? Apresentar a
pessoa para todos os seus contatos.
Um método comum para conseguir notoriedade em redes sociais
é provocar pessoas com uma base sólida de seguidores. E isso
pode ser feito usando perfis verdadeiros, falsos ou até robotizados
por inteligência artificial.
Quem tem uma biografia a defender e a honra a preservar tende
a ficar bem revoltado diante de acusações injustas e quer
esclarecer. Só que, ao mesmo tempo, dá relevância ao perfil que
ataca.
É dessa forma que se fortalece o que eu chamo de “Economia
do Ressentimento”. As redes sociais são a tempestade perfeita para
que pessoas ressentidas e sem nada a perder virem um verdadeiro
sucesso.
E elas realmente são um sucesso no sentido de fazer com que
os demais fiquem muito tempo nas plataformas interagindo e
fornecendo dados valiosos, precisamos reconhecer.
É aí que entram os tais “robôs”, perfis controlados manualmente
ou por inteligência artificial para disparar mensagens coordenadas.
Se você iniciar uma campanha publicitária ou um boato contra
alguém e programar vários robôs para repostarem aquilo ou
comentarem, o que a rede social entende? Que muita gente gostou.
Então, tem mais alcance.
No caso da disseminação de uma mentira, por exemplo, se tem
muitos comentários atestando que aquilo é verdade, tendemos a
acreditar. A gente pensa que não é possível juntar em tão pouco
tempo tanta gente contando a mesma mentira. Acontece que essa
“tanta gente” pode ser uma pessoa só que programou centenas de
perfis para postar.
A estratégia de xingar pessoas com muito alcance também
funciona dessa maneira. As postagens dessa pessoa já chegam a
muita gente. Se esse público vê um zilhão de comentários acusando
de ter feito ou dito algo terrível, começa a pensar que é verdade.
Os robôs ou perfis automatizados servem apenas para dar
volume e atingir pessoas reais com as informações que pisam nos
seus calos mais sensíveis.
Essas pessoas vão reagir emocionalmente e com senso de
urgência, sem nem pensar se é verdade ou se aquilo é uma
campanha organizada. E muita gente boa trabalha de graça em
linchamentos virtuais sem nem imaginar que está sendo usada.
Quanto mais fundo uma plataforma pisa no acelerador de sua
estratégia de coleta de dados, pior ficará o ambiente e mais longe
da realidade ficarão os usuários manipulados.
Nós chegamos a um nível tão tóxico do debate que as próprias
plataformas passaram a tomar providências. Se as pessoas
precisam perder todos os limites da civilidade para que os negócios
delas sejam viáveis, isso torna todos os demais negócios inviáveis,
já que foram estabelecidos nos limites da civilidade.
Todas as gigantes de diversos setores, inclusive da tecnologia,
resolveram colocar o pé na porta. Afinal, se elas têm de pagar pela
matéria-prima, mão-de-obra e reembolsar quando causam danos,
por que as redes sociais não precisam fazer nada disso e formam
uma indústria bilionária? Isso foi nos Estados Unidos.
As plataformas estão tomando providências para mudar suas
políticas, mas o engajamento por meio de emoções empolgantes
continua sendo a alma do negócio. E não param de pipocar
escândalos de uso indevido de dados, inclusive de monitoramento
de localização em tempo real, espionagem mesmo. Já houve até
testes em que usuários de redes sociais, sem saber, foram cobaias
em experimentos psicológicos.
No mundo inteiro os governos tratam desse tema, que é novo
para nós e altera completamente nossa capacidade de nos governar
como sociedade.
Aqui no Brasil, o Whatsapp baniu 400 mil números de telefones
utilizados para disparos robotizados feitos por 6 empresas
diferentes.
Eles detectaram o padrão robotizado por inteligência artificial.
Isso é exatamente o quê? Pense num número que manda mil
mensagens por minuto em 300 grupos. É gente? Não.
O problema é que, muitas vezes, os que estão no grupo acham
que é uma pessoa e interagem com o perfil. Há programas de
inteligência artificial que fazem ele responder como se fosse uma
pessoa. E isso não é tão distante da gente não. Quer um exemplo
de como se usa isso para o bem também?
Nos Estados Unidos, inventaram um programa de inteligência
artificial que faz o seu recurso de multas de trânsito. Você põe lá os
seus dados, explica o que ocorreu e a inteligência artificial elabora e
protocola o recurso. Pois bem, tem mais sucesso do que humanos
recorrendo.
Imagine então como esses 400 mil números robotizados que
disparavam mensagens podem ser convincentes. O papel deles é
fazer com que as pessoas reais, parte do mesmo grupo em que
estão, comecem a repassar as mensagens aos seus contatos.
Uma curiosidade que dá a medida do caráter de quem usa esse
tipo de recurso: como conseguem os números de celular. Hoje, no
Brasil, é preciso fornecer um CPF ou CNPJ para ter um número de
celular. Onde arrumar 400 mil? Mortos e pessoas acamadas.
O segredo para a manipulação é a mistura de plataformas. Nos
grupos, com toda essa manipulação, as pessoas se organizam para
divulgar algo ou atacar alguém em plataformas abertas.
Isso tem consequências reais na vida de muitas pessoas e,
como a maioria de nós conhece pouquíssimo do admirável mundo
novo em que vivemos, esse prejuízo é subestimado.
Sempre que se fala na responsabilização de quem causa dano a
outras pessoas pelas redes sociais começa uma gritaria.
O tema você já deve ter ouvido: argumentam que a real intenção
é o controle da internet e da sua liberdade de expressão. E, claro,
sabendo usar bem a estrutura de manipulação, você apavora
pessoas reais e elas vão se juntar à gritaria.
Com tudo o que você ficou sabendo sobre esse contexto até
agora, a gente faz o raciocínio manjado do acuse-os do que você é.
Quem acusa os outros de “atentar contra a sua liberdade de
expressão” quer, na verdade, um passelivre para tirar a liberdade
de quem bem entender.
A melhor maneira de você escravizar alguém não é acorrentar, é
fazer a pessoa acreditar que é livre. Se você não sabe que suas
emoções são sistematicamente manipuladas de forma calculada,
por pessoas que têm acesso a o que você sente e faz 24 horas por
dia, você é livre? Isso chama LIBERDADE? Claro que não.
Anonimato x Pseudônimo
Já viu o debate sobre poder ou não usar perfis anônimos e
pseudônimos nas redes sociais? Qual a sua opinião? Se você
chegou até aqui, já aprendeu a desconfiar de tudo o que envolve
gente poderosa e gritaria.
O pulo do gato para identificar os interessados em manipular
redes sociais e proteger delinquentes é verificar se tentam equiparar
duas coisas muito diferentes: anonimato e pseudônimo.
Trata-se de dois conceitos diferentes na lei e na cultura. A
Constituição Federal diz, em seu art. 5o, que é livre a expressão,
mas vedado o anonimato. Temos outras leis, abaixo da Constituição
Federal, que garantem o direito de usar pseudônimo.
Como é possível isso? Porque anonimato não tem nada a ver
com pseudônimo.
Na nossa história, muitos grandes artistas usaram pseudônimo.
O mais famoso é Fernando Pessoa. Eu posso citar uma infinidade
de razões muito legítimas para uma pessoa querer usar pseudônimo
nas redes sociais.
Você pode querer falar com seus amigos sem expor a sua
empresa ou a instituição em que trabalha. De repente, é um perfil só
para falar de futebol e isso infringe a política da sua empresa. Você
não gosta de se expor, tem timidez. Trata-se de um filho menor de
idade e você não quer a identificação dele na rede. Tudo isso é
legítimo.
A liberdade de expressão traz até o direito de criar personas,
perfis humorísticos, paródias, só não traz o direito de fugir das
consequências dos danos causados a terceiros. E isso não é uma
sutileza, é uma baita diferença.
Você já deve ter ouvido que ninguém fica impune na internet
porque todo computador tem uma identidade única, que pode ser
rastreada, o IP.
Dizem que é só entrar na Justiça e pedir a identificação. Não é o
que acontece na prática. Há várias formas de mascarar a identidade
e as redes sociais dificultam o processo o quanto podem.
O principal problema ainda é a ilusão do conhecimento sobre o
assunto entre os operadores do Direito.
Muitos advogados, promotores, juízes e desembargadores
pensam que entendem o contexto das redes sociais porque sabem
postar nas redes, então são ineficientes em exercer seu trabalho
porque são analfabetos na leitura do mundo real.
Há inúmeras sentenças e até manifestações de promotores e
advogados falando em “liberdade de expressão” no contexto de
perfis impulsionados mediante pagamento ou robotizados.
Por não saber que não analfabetos midiáticos, eles tentam
garantir a liberdade de expressão de um quando, na verdade, estão
dando a essa pessoa o direito de delinquir sem freios e causar
danos irreparáveis a outros.
Difícil saber quantas vidas já foram arruinadas porque muitos
operadores do Direito desconhecem o mais básico sobre o contexto
digital e não admitem.
Essa é uma chaga que o Brasil precisa resolver com urgência.
Não se pode pagar uma fortuna a pessoas que decidem sobre a
vida de outras com base num mundo que não existe mais.
Já vi inúmeras defesas apaixonadas da “liberdade de expressão”
em casos de vingança pessoal, por motivo pessoal, no qual um
grupo de combinou para fazer outra pessoa perder o emprego e
amigos.
Para você, que chegou até aqui, seria um caso cristalino. Para
operadores do direito que são analfabetos digitais, era imaginação.
Felizmente, há sempre os estudiosos, cientes da velocidade de
mudança do mundo, que perceberam a chave dessa história: a
mudança de contexto altera nossa percepção do que é verdade ou
não.
Numa sentença dada pelo ministro Gilmar Mendes em 14 de
agosto de 2020, já aparece bem claro este conceito de realidade.
“Essas transformações, ao ressignificarem o conceito de esfera
pública, passam a desafiar os limites estatais consagrados nas
legislações que tangenciam a liberdade de expressão”, diz o
ministro ao falar sobre redes sociais, algoritmos, automação e bots.
Muitos já perceberam a similaridade de comportamento entre
quem usa a fraude para manipular o debate público e os fora-da-lei
tradicionais.
Um fato curioso é a similaridade entre influenciadores anônimos
que fazem crowdfunding e presidiários que fazem o golpe do
sequestro relâmpago. Oi? Senta que lá vem história.
Na Justiça Criminal, tem algo conhecido há muito tempo e que
deixa as vítimas bravíssimas: o mercado de aluguel de contas
bancárias.
Quando alguém cai no golpe do sequestro relâmpago, fazendo
um depósito para ter de volta uma pessoa que nunca foi
sequestrada, imagina que o dinheiro será devolvido porque tem o
número da conta e a identificação da pessoa.
Não será. Esse tipo de criminoso se beneficia do anonimato.
Há pessoas que abrem dezenas de contas-corrente, às vezes
por cumplicidade e outras porque são ameaçadas pelo crime
organizado.
O controle é todo dos bandidos e a pessoa não faz a menor ideia
nem de quem opera qual conta. Ou seja, a transferência é feita, o
dinheiro é sacado e, apesar de saber quem é o dono da conta, a
vítima não verá o dinheiro de volta nem identificará o criminoso.
Esse mesmo esquema era usado por alguns influencers,
anônimos em plataformas como Google, Apoia.Se, Patreon e
PayPal.
Em vários processos judiciais nos quais as plataformas foram
intimadas, a Justiça verificou que a conta corrente que recebia
depósitos de doações e publicidade era uma dessas do esquema de
aluguel.
Recentemente, várias plataformas mudaram sua política no
Brasil e é preciso comprovar que o dono do canal é dono da conta
para sacar o dinheiro.
Não pense que fizeram isso porque têm o coração bom, mas
porque ficaram com medo que seus negócios, que valem muito,
passassem a ser utilizados em esquemas de lavagem de dinheiro
ou criminalidade. É preciso traçar a fronteira entre o que é a zona
legalizada da internet e o que é a marginalidade.
Vamos supor que a marginalidade fique na tal da “Deep Web”.
Se alguém recorre à Deep Web, já sabe que não é para boa coisa e
que nada é garantido.
Não podemos ter o mesmo ambiente na parte legalizada da
internet, as pessoas precisam ser responsabilizadas se
descumprirem leis e regras sociais.
A questão é como fazer isso sem tirar a liberdade de expressão
e o direito de usar pseudônimos. Durante muito tempo, a discussão
girou em torno da obrigatoriedade de fornecer todos os dados
pessoais às redes sociais, que teriam a obrigação de confirmá-los
para fornecer uma conta a alguém.
Já cheguei a achar isso uma boa ideia. Ocorre que, depois do
escândalo nos Estados Unidos, em que o FBI revelou que o Twitter
vendeu acesso aos dados dos usuários para vigilância 24 horas até
da Beyoncée, comecei a repensar. Há outras formas de identificar
as pessoas.
Meu amigo Jair Lorenzetti, que me ajudou a aprender quase tudo
o que eu sei sobre redes, é defensor de um modelo muito
interessante: certificação digital.
Hoje já temos no Brasil para CPF e, no caso de CNPJ, é
obrigatório.É um modelo em que a pessoa fica identificada para
efeitos legais, mas essa identidade não é pública.
Ela pode criar 40 perfis numa rede social, colocar foto de
cachorro, escrever poesia, falar do time de futebol, curtir a Lady
Gaga. Se, por exemplo, ameaçar alguém de morte e essa pessoa
for à polícia, automaticamente identifica-se o autor.
 
REDES SOCIAIS: HERÓIS OU VILÕES?
Há um dito antigo de que a diferença entre o remédio e o veneno
está na dosagem. As redes sociais trouxeram muitas inovações
excelentes e melhoram a vida de muita gente, mas há distorções
por uso inadequado.
 
 
Elas ocorrem propositalmente, com a intenção de manipular os
outros ou obter vantagem, mas também por desconhecimento ou
ilusão de conhecimento.
 
O tanto que conhecemos sobre a dinâmica das redes sociais e a
forma como decidimos interagir ou não com pessoas e grupos é o
que determina se nos beneficiaremos desse usoou se nos
deixaremos manipular.
Quem sou eu para formular regras de etiqueta no uso de redes
sociais ou até propor o que seria permitido ou não, né? Você tem
toda a liberdade de ser quem é.
A minha proposta é apenas deixar o cenário mais claro para que
você, dentro da sua liberdade, faça a escolha que quer fazer.
O ponto principal a se ter em mente é: comunicação em
redes sociais não é só o que dizemos, mas também com quem
e como interagimos.
Isso é importantíssimo principalmente para pessoas que têm
reputação profissional e moral fora da internet.
Não imagine que você pode ser uma pessoa online e outra
offline porque os dois mundos estão interligados e um tem impacto
no outro.
Toda vez em que a gente escolhe interagir com alguém, para
elogiar ou execrar, criamos um vínculo com a pessoa e seu grupo.
Um erro comum é espalhar o perfil de quem faz ofensas rasteiras
achando que ganhará apoio para repudiar. Não vai.
Na verdade, o que acontece é dar mais alcance ao perfil que
está fazendo isso e mostrar a mais pessoas que é possível se
expressar daquela forma.
Imagine quantas pessoas vão ver a postagem e gostariam muito
de xingar mas se contém? Agora têm mais um motivo para xingar
também.
Ah, mas então temos de ficar quietos? Não, apenas ser
estratégicos. É possível fazer a mesma crítica e o mesmo raciocínio
sem distribuir o link e a identidade da pessoa que talvez só tenha
exagerado no discurso exatamente para conseguir distribuição de
seu perfil para uma base maior.
Compartilhamentos dizem muito sobre quem somos, muito mais
do que nossas afirmações e postagens. Ao decidir compartilhar um
conteúdo, intencionalmente ou não, estabelecemos publicamente
um vínculo com quem produziu aquele conteúdo e começamos a
interagir com a base dessa pessoa.
Por que é importante saber disso e pensar a respeito? Outro dia
estive em um evento acadêmico em que um palestrante, homem
importante e com doutorado de uma prestigiosa universidade
europeia, falava sobre fraude, corrupção, ilegalidades, critérios e
investigação.
No meio da palestra, ele exibe um vídeo de um site que imita o
design jornalístico, mas é todo de fake news, montado para caçar
cliques e fazer dinheiro.
Para quem tem Alfabetização Midiática, foi um golpe certeiro na
reputação do acadêmico. Se ele não consegue distinguir um
picareta de um site informativo, como identifica esquemas
sofisticados de criminalidade?
Pode ser uma impressão injusta. Mas é fato que o acadêmico
em questão não consegue ler o mundo em que vive, não parecia
estar nem consciente disso e nem um pouco preocupado em
cometer injustiças.
Outro ponto é a nossa relação com órgãos de imprensa e
formadores de opinião. Muitos pensam que há uma rivalidade entre
eles e as redes sociais. Há o contrário: parceria e adaptação mútua.
No meio, fica o usuário.
Ainda é um território bastante pantanoso, mas o investimento em
emoções excitantes sem nenhum compromisso com o público já
começa a tornar-se realidade em muitos veículos tradicionais de
imprensa.
Tendemos a dar mais importância ao conteúdo do que à forma
como ele é divulgado ou por quem. Fomos treinados assim pela
educação analógica, onde isso fazia sentido. Não faz mais. Agir
nessa lógica pode gerar o resultado oposto ao que pretendemos.
GUIA DE ALFABETIZAÇÃO MIDIÁTICA
A tecnologia nos encanta e dá a impressão de ser algo
completamente novo. No caso das redes sociais, essa impressão
não é de todo verdadeira. Estamos falando de relações humanas,
uma mescla daquilo que está na luz com o que é deixado nas
sombras.
 
 
O problema no uso das redes é a sensação de intimidade e
anonimato em todos os ambientes. Tem gente que se comporta
como se estivesse na intimidade do próprio quarto sem perceber
que está bem no meio do coreto da cidade.
Não sou eu quem vou dizer o que você deve fazer no coreto e o
que deve fazer só no quarto, é você quem decide.
Meu papel aqui é deixar claro o que equivale ao seu quarto, à
sala da casa da sua família, ao coreto da cidade, à mesa de reunião
da empresa, etc. Vamos passar a pensar as redes sociais como o
que são: espaço público.
Há uma coisa que vale para todos: CONSCIÊNCIA.
Qualquer que seja seu tipo de personalidade ou sua intenção, o
importante é ter consciência de que tipo de efeito uma ação nas
redes sociais vai gerar.
Se você ficar clicando em muito filme de teoria da conspiração,
vai receber muita teoria da conspiração.Se você acha isso
divertidíssimo e queria mesmo saber mais sobre teorias da
conspiração, ótimo. Agora, se você estava buscando notícias,
recebeu teorias da conspiração e começou a acreditar nelas, temos
um problema.
Qual a medida de usar bem as redes? Ter o resultado esperado.
Você queria relaxar e ver bobagem mas, por algum motivo que
você não entendeu, acabou se metendo num bate-boca sem fim
com meia dúzia de estranhos?
Tem algo errado. E você tem instrumentos para conseguir usar
as redes sociais no lugar de se deixar usar por elas.
Aposto que você tem pensado sobre essa dinâmica e creio que a
forma mais eficiente de colocar esse novo contexto em prática nas
nossas vidas é pensar na diferença entre público e privado.
Nós não compartilhamos todos os nossos pensamentos e
sentimentos. Quando dividimos com os outros, temos graus
diferentes de intimidade. Nas redes sociais, a dinâmica deveria ser a
mesma, mas a gente ainda se confunde um pouco com o grau de
intimidade ou privacidade.
O principal é não ter falsas impressões, ter a consciência do que
é público ou privado para conseguir o efeito que você realmente
deseja falando para um grupo ou compartilhando seus sentimentos.
Graus de Privacidade
Todos nós temos pensamentos dos quais nos envergonhamos
ou arrependemos. Muito lixo passa pela nossa cabeça. Pensa em
alguém de quem você simplesmente não gosta e sem nenhuma
razão.
Provavelmente você já deve ter pensado: “ah, eu gostaria que
esse fulano morresse”. Não é algo que você gritaria no culto ou na
sala do seu chefe.
Nas redes sociais nós fazemos a todo momento esse tipo de
escolha. Claro que você tem todo o direito de chegar numa missa de
sétimo dia, subir no altar e gritar a plenos pulmões: “foi tarde esse
calhorda!!!”. Ocorre que vai haver consequências e você vai ter de
arcar com elas.
O problema das redes sociais é que muita gente crê que está
cochichando baixinho no ouvido da cunhada que o calhorda foi tarde
mas, como o mundo digital tem essa mudança de contexto, o que a
pessoa fez equivale a gritar no altar. Aí vai vir uma consequência
mais pesada do que a pessoa jamais imaginou.
Elencar nossos pensamentos e reações em graus de intimidade
é um exercício excelente para fazer um bom uso das redes sociais,
que podem ser grandes oportunidades de relacionamento com
gente interessante, conhecimento, lazer, aprendizado e até de
evolução profissional.
GRAU 0 - O SUPER ÍNTIMO
Sabe aquelas coisas que a gente pensa mas tem até vergonha
de ter pensado? Que, se a gente olhar no olho de alguém, não tem
coragem de falar aquilo daquele jeito? Que a gente sabe que vai
repensar e se arrepender dali a dois passos? Pois é, todo mundo
sabe muito bem, principalmente quando estamos reagindo a algo
que nos tira do sério ou toca em feridas da alma.
Não tem como evitar esse tipo de pensamento e reação, mesmo
que não nos faça bem. É necessário partir desses rompantes para a
elaboração dos nossos pensamentos e sentimentos. Muitas dessas
coisas sequer chegarão intactas aos ouvidos dos nossos mais
íntimos, do padre ou do psicólogo: já as teremos elaborado melhor.
Há coisas que pensamos e só pensamos. A intimidade com o
telefone celular pode borrar essa fronteira. Pense muito nisso
quando algo lhe provocar, lhe tirar do sério a ponto de ter sensações
físicas como coração acelerado.
GRAU 1 - MINHA GENTE
Há coisas que falamos para quem gosta da gente e conhece
nossos defeitos, os mais próximos, de confiança, que não vão
repassar a informação nem fazer julgamento. São as questões que
dizemos a quem pode acolher nossa intranquilidade e nos ajudar a
processar os fatos ousentimentos.
Essas questões são o primeiro grau daquilo que compartilhamos
nas redes sociais, em todas elas. Quando o que você tem a dizer ou
a sua reação a algo que viu estiver nessa categoria, use:
- Mensagem individual privada - seja por Whatsapp, Facebook,
Twitter ou Instagram.
GRAU 2 - UM MILHÃO DE AMIGOS
Há as coisas que dizemos aos que nos conhecem e conhecem
nosso caráter. Ainda estamos no círculo em que há amor e
afetividade, mas onde também podemos ser mal interpretados por
alguém e já tivemos de aparar arestas com alguns. É um ambiente
acolhedor, mas também podemos ser julgados ou nos sentir mal.
Quando o que você tem a dizer ou a sua reação a algo que viu
estiver nessa categoria, use:
- Mensagem direta
- Grupo só com pessoas que você conhece pessoalmente e com
quem tem relacionamento próximo
- Forme um grupo específico para debater esse tema
- Use (com moderação) o grupo da família
GRAU 3 - COLEGA NÃO É AMIGO
Aqui já saímos do círculo do amor, estamos no círculo do
respeito e do relacionamento. São as coisas que dizemos ou as
emoções que escolhemos demonstrar entre pessoas que têm um
nível de compreensão com os nossos deslizes, mas não esperamos
que nos defendam em situações embaraçosas ou controversas.
Também a questão de manter segredo é incerta, espera-se da
maioria, mas não de todos.
Não estamos falando de um grupo que ataca nem distorce, mas
de alguém que não tem um relacionamento próximo o suficiente
para contar que te defenda e acolha mesmo na discordância.
Quando o que você tem a dizer ou a sua reação a algo que viu
estiver nessa categoria, use:
- Grupos temáticos fechados: pode ser postagem, comentário a
postagem alheia ou compartilhamento de informação.
- Listas de transmissão: você pode criar um grupo para dividir
essa informação.
- Perfis fechados: nesse caso, você pode fazer posts ou
compartilhar esse tipo de informação.
GRAU 4 - SELVA
Aqui é a praça pública, onde você pode ou não ser visto por todo
mundo que você conhece, inclusive seus inimigos. O que estiver aí
pode tanto ser compreendido quanto distorcido. Têm livre acesso
todas as pessoas da sua família, do seu trabalho, de onde você
estuda, da sua igreja, do futebol, do grupo de voluntários, do clube
do livro.
Imagine que você reuniu todas as pessoas que você conhece, as
que gosta e não gosta, as que você ama e que odeia, as que lhe
acolhem e que lhe tratam mal, as que te dão apoio e as que podem
decidir sobre coisas importantes na sua vida. Agora escolha o que,
em que tom, de que forma e acompanhado de quem vai ser
apresentado a elas por você.
Perceba que não estou falando que você deve ser de uma forma
ou outra, melhor ou pior. Há dias em que queremos mesmo tocar
fogo em tudo e temos esse direito. O importante é ter a consciência
do que estamos fazendo. Pense nesse cenário principalmente
quando estiver reagindo a algo que mexe com você
emocionalmente.
Há pessoas que compartilham com uma enormidade de
desconhecidos fatos que eu manteria somente para mim. Não é
errado, é diferença de personalidade. Milhões de pessoas estão
encontrando suporte psicológico no enfrentamento de problemas
comuns compartilhando coisas que, para outras pessoas, seriam da
esfera da intimidade. São decisões pessoais.
Quando o que você tem a dizer ou a sua reação a algo que viu
estiver nessa categoria, use:
- Post aberto (texto, foto ou vídeo)
- Comentário em post aberto
- Compartilhamento em perfil aberto
- Compartilhamento em grupos com desconhecidos
o fim?
Este é o primeiro livro de uma série à qual dei o nome de Anatomia
do Mundo Digital, destinado a todas as pessoas que vivem
essa crise geracional de hoje.
 
Nossas crianças e adolescentes nasceram no mundo digital, não
conhecem outro. Nós, que somos jovens há algumas boas décadas,
vivemos nesse mundo pensando com a cabeça de um mundo que
não existe mais.
 
Meu amigo Jair Lorenzetti, que tem formação na área de Tecnologia
da Informação, me ajudou bastante a evoluir meu nível de
conhecimento. Vocês não imaginam como as coisas avançam
rápido nessa área.
 
Ele será meu parceiro nessa jornada de várias pequenas
publicações sobre universo digital destinadas a quem não entende e
nem tem vontade de entender nada sobre isso, mas sente os
impactos da mudança nos relacionamentos, na vida profissional e
no debate político.
Muita gente fala sobre inovação do mundo digital para empresários,
líderes, governantes e gestores do setor público. Eu já estive lá e
quero falar para as famílias, para o cidadão comum.
 
Não sei se nós, da geração raiz, um dia realmente vamos nos
adaptar a esse novo mundo. Aliás, agradeço a Deus pelo boom das
redes sociais só ter ocorrido depois que eu completei 30 anos.
 
É um pesadelo imaginar como teria sido a minha adolescência
ou como deve ser uma infância nessa era em que ninguém pode
errar e apontar o dedo para o menor erro dos outros é esporte
mundial.
 
Eu sei bem, não apenas como jornalista, mas como mãe e mulher,
como vidas podem ser viradas do avesso na era das redes sociais.
 
Atravessei um deserto de dor com a ajuda de muita gente boa e
generosa - sim, essas pessoas ainda existem - e, de quebra,
acumulei bastante conhecimento que não tinha sobre o impacto do
mundo digital na sociedade, nos nossos relacionamentos e no
debate político.
 
Não desejo a você a mesma jornada que eu trilhei. Tomei como
missão facilitar a vida das pessoas usando os dons que Deus me
deu: os da comunicação.
 
Se este livro ajudar a melhorar um único relacionamento familiar,
tirar alguém do desespero ou resolver um pesadelo profissional,
considero que a missão dele está mais do que cumprida.
 
Espero que tenha ajudado você, que você tenha gostado e que
participe da elaboração da série Anatomia da Vida Digital comigo.
 
Eu ficaria feliz demais em saber sua opinião sobre esse livro, sua
experiência pessoal de vida no mundo digital e também, claro, que
outros assuntos você gostaria de ver explicados de forma simples.
 
Obrigada pela confiança.
 
Sempre que quiser partilhar algo, estou à disposição em 
 
 
www.madeleinelacsko.com.br
 
Até a próxima!!!
 
About The Author
Madeleine Lacsko
 
Madeleine Lacsko tem uma trajetória profissional não-linear que a
credencia a informar seu público de forma humana, inovadora e
criativa, a partir de experiências que realmente vivenciou. 
 
Depois de 12 anos de carreira como repórter em São Paulo,
cobrindo principalmente política, polícia e cidades, a jornalista
percebeu que o cidadão tem uma espécie de desconfiança dos
jornalistas e resolveu ir ao coração do problema. Concluiu que
reportava muitas situações que jamais viveu e decidiu dar uma
guinada na carreira. 
 
Durante 7 anos, dedicou-se a trabalhar em diversos setores
diferentes, no Brasil e no Exterior. Foi a oportunidade de vivenciar a
administração pública, privada, organizações internacionais e
também de exercer na prática uma paixão antiga: o mindset digital
aplicado à política e à comunicação. 
 
Em 2008, foi convidada a trabalhar na comunicação do Supremo
Tribunal Federal por dois anos. Além de aprender muito sobre
administração pública, teve a oportunidade de participar da equipe
que implementou as mídias sociais do STF, a primeira Suprema
Corte do mundo a entrar no universo digital. 
 
Em 2010, foi Consultora Internacional em Comunicação para o
Desenvolvimento do UNICEF Angola, tendo feito parte da equipe
que erradicou a pólio no país. 
 
De volta ao Brasil, quis conhecer a iniciativa privada e teve uma
oportunidade no departamento de marketing da CCR. 
 
Em seguida, participou do lançamento da plataforma Change.org no
Brasil, tendo sido a primeira diretora de comunicação da B-Corp no
Brasil. 
 
A última parada antes do retorno à imprensa foi como assessora
parlamentar do presidente da Comissão de Direitos Humanos da
Assembleia Legislativa de São Paulo. 
 
Ao viver a experiência de ser gestora no setor público e privado, no
Brasil e exterior, a jornalista conheceu pordentro - e aprendeu a
utilizar - as principais técnicas de propaganda e manipulação que
impedem a informação de chegar da forma correta ao público
comum. 
 
Driblar essas táticas de comunicação faz com que saiba exatamente
como pegar no pé dos poderosos. Em 2015, voltou à imprensa
tendo, além dessa experiência, conhecimento e treinamento em
mídias digitais. 
 
Madeleine Lacsko já havia compreendido que não era apenas uma
nova tecnologia, era um "Mindset Digital", que dava à imprensa um
público com expectativas diferentes e formas diferentes de se
relacionar com a informação e com o poder. 
 
Dedicou-se a implementar núcleos de vídeo para mídias sociais
entranhados no dia-a-dia e na forma de produção e trabalho de
órgãos de mídia com operações tradicionais. 
 
O primeiro projeto foi no YouTube da Jovem Pan, o programa
Radioatividade, o primeiro do mundo a estrear ao vivo em
Periscope. Depois, implementou a TV Antagonista, canal de vídeo
do blog. Em 2017, foi convidada pelo tradicional jornal Gazeta do
Povo para implementar seu canal de vídeo. Também é colunista da
Gazeta do Povo. 
 
Recentemente, criou o curso ESTUDARPOLITICA.COM, onde
utiliza o conhecimento adquirido nos bastidores para explicar ao
cidadão comum a estrutura política e o funcionamento das
instituições brasileiras, algo que não aprendemos na escola. 
 
 
FORMAÇÃO E HISTÓRICO PROFISSIONAL 
 
Formada em Jornalismo com especialização em Marketing Político
pela USP, Madeleine Lacsko foi International Visitor do
Departamento de Estado dos Estados Unidos no International
Leadership Program em Jornalismo Investigativo. 
 
Fez diversas especializações em gestão, administração pública e
governo eletrônico. 
 
Fez dezenas de palestras, conferências e treinamentos sobre
comunicação e novas tecnologias no Brasil e exterior, para
jornalistas, membros do Judiciário, oficiais e praças da Polícia Militar
e público em geral. 
 
Recebeu diversos prêmios e condecorações, no Brasil e no exterior,
entre eles: 
ICDB - International Children's Day of Broadcasting Award,
concedido pelo Unicef em Nova York para a melhor produção de
programação infanto-juvenil do mundo 
Ordem do Mérito da Justiça Militar 
Diploma Mérito da Comunicação da Polícia Militar do Estado de São
Paulo 
Medalha de Mérito de Justiça e Disciplina da Polícia Militar do
Estado de São Paulo 
Reconhecimento Oficial da Força Aérea Brasileira 
Reconhecimento Oficial do Colégio de Presidentes de Tribunais de
Justiça 
Prêmio Anamatra de Direitos Humanos 
Prêmio da Parada LGBT do Rio de Janeiro 
 
CONTATO 
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	O QUE ESPERAR DESSE LIVRO
	ZUMBI DE ESTIMAÇÃO
	ORÁCULO
	NÓS AMAMOS ODIAR
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	A DIFERENÇA ENTRE FATO, OPINIÃO E FANTASIA
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