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Estudos da tradução e interpretação

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2018
Estudos da tradução E 
IntErprEtação Em Língua 
dE sInaIs
Prof.ª Adriana Prado Santana Santos
Prof. Luiz Henrique Milani Queriquelli
Copyright © UNIASSELVI 2018
Elaboração:
Prof.ª Adriana Prado Santana Santos
Prof. Luiz Henrique Milani Queriquelli
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
SA237e
 Santos, Adriana Prado Santana
 Estudos da tradução e interpretação em língua de sinais. / Adriana Prado 
Santana Santos, Luiz Henrique Milani Queriquelli– Indaial: UNIASSELVI, 2018.
 230 p.; il.
 
 ISBN 978-85-515-0173-3
 1.Surdos – Meios de comunicação – Brasil. 2.Interpretes para surdos - 
Treinamento – Brasil. 3.Língua de sinais – Estudo e ensino – Brasil. I. Queriquelli, 
Luiz Henrique Milani. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.
CDD 419 
III
aprEsEntação
Caro acadêmico! É com grande entusiasmo que apresentamos a você 
a disciplina Estudos da Tradução e Interpretação em Língua de Sinais.
O livro de estudos foi desenvolvido com muito estudo e dedicação 
para apresentar as orientações teóricas e recursos que servirão como base para 
conduzi-lo ao conhecimento acerca das questões e debates que envolvem a 
Tradução e Interpretação em Língua de Sinais.
A tradução e a interpretação estão envolvidas diretamente na vida 
social da comunidade surda, na sua escolarização e letramento. O material 
aborda diferentes concepções teóricas, com o intuito de problematizar o 
tema e possibilitar uma visão ampla dos diversos aspectos relacionados ao 
processo de tradução e interpretação das línguas em geral, dando ênfase 
para a Língua de Sinais do nosso país: a Língua Brasileira de Sinais – Libras 
ou LSB – (Língua de Sinais Brasileira).
Os estudos relacionados com a tradução e interpretação em Língua 
de Sinais têm tido muito destaque pela modalidade visual/espacial das 
Línguas de Sinais, que foi desenvolvida pelas comunidades surdas, por meio 
de aspectos culturais e de identidade.
Assim como toda língua, as Línguas de Sinais são dinâmicas e estão 
sempre em processo de desenvolvimento e ampliação. Assim, é necessário 
conhecermos e nos aprofundarmos no campo dos estudos de Tradução e 
Interpretação dessa língua, a fim de discutirmos o conceito e tipos de tradução 
que integram a cultura da comunidade surda.
Na Unidade 1 do livro, vamos buscar compreender o que é tradução, 
veremos quais são os tipos de tradução conforme a tipologia definida por 
Roman Jakobson e confrontaremos os conceitos de tradução e interpretação 
segundo autores como Schleiermacher, Mounin, Maria Cristina Pires Pereira, 
dentre outros.
Na Unidade 2, vamos entender os problemas teóricos e práticos 
da Tradução e Interpretação em diversos ambientes, os tipos discursivos 
e gêneros textuais envolvidos na tradução e interpretação em Língua de 
Sinais, o processo cognitivo (memória, inferências, soluções de problemas) 
e a aplicação aos estudos da tradução e interpretação. Ainda, problematizar 
e orientar a atividade tradutória e interpretatória, para uma tradução e 
interpretação fidedigna e ética. 
IV
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto 
para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há 
novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é 
o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um 
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova 
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também 
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
Na Unidade 3, apresentaremos políticas e propostas vigentes na 
área de tradução e interpretação, criadas pelo Ministério da Educação e 
pelas associações de Tradutores Intérpretes no âmbito nacional. Ainda, as 
tecnologias como apoio para formação do Tradutor Intérprete de Língua de 
Sinais, o trabalho do profissional Tradutor Intérprete com o aluno surdo e o 
professor regente. 
Finalizaremos o livro com um minidicionário, com alguns sinais 
em Libras, para que você, acadêmico, aprenda e treine no cotidiano, 
oportunizando um aprendizado básico para desenvolver habilidades na 
Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de Sinais – Libras.
Bons estudos!
Prof.ª Adriana Prado Santana Santos
Prof. Luiz Henrique Milani Queriquelli
NOTA
V
VI
VII
UNIDADE 1 – ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA 
 DE SINAIS ..................................................................................................................... 1
TÓPICO 1 – TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO .............................................................................. 3
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3
2 QUESTÕES GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO ................................................................................ 4
3 DIVERSIDADE LINGUÍSTICA ........................................................................................................ 6
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 8
4 NEGOCIAÇÃO ENTRE TEXTOS E ENTRE CULTURAS ............................................................ 10
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 14
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 15
TÓPICO 2 – TIPOS DE TRADUÇÃO .................................................................................................. 17
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 17
2 TRADUÇÃO INTRALINGUAL ........................................................................................................ 17
2.1 O PAPEL DA TRADUÇÃO INTRALINGUAL PARA A HISTÓRIA DA LÍNGUA .............. 21
3 TRADUÇÃO INTERLINGUAL ......................................................................................................... 24
3.1 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL RELIGIOSA E O FOCO NO TEXTO DE PARTIDA ....... 26
3.2 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL LITERÁRIA E O FOCO NO TEXTO DE CHEGADA .... 29
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 31
4 TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA ................................................................................................... 33
LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................................
38
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 40
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 41
TÓPICO 3 – FUNÇÕES DO TRADUTOR E DO INTÉRPRETE .................................................... 43
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 43
2 INTERPRETAÇÃO SIMULTÂNEA E INTERPRETAÇÃO CONSECUTIVA ........................... 43
3 ESPECIFICIDADES DE CADA PAPEL ............................................................................................ 46
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 49
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 51
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 52
UNIDADE 2 – TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS, 
 COGNITIVAS E PRÁTICAS ...................................................................................... 55
TÓPICO 1 – LINGUAGEM E TEORIA ............................................................................................... 57
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 57
2 MODALIDADES DAS LÍNGUAS: UM BREVE OLHAR ........................................................... 61
2.1 SISTEMA GRAMATICAL DA LÍNGUA ORAL AUDITIVA ..................................................... 63
2.2 SISTEMA GRAMATICAL EM LÍNGUA DE SINAIS ................................................................. 67
2.2.1 Locação/ponto de articulação ............................................................................................... 76
2.2.2 Movimento (M) ....................................................................................................................... 76
2.2.3 Configuração de mãos (CM) ................................................................................................ 77
sumárIo
VIII
2.2.4 Não manuais/expressões faciais e corporais ....................................................................79
2.2.5 Orientação/direção ...............................................................................................................87
2.2.6 Sintáticos ...............................................................................................................................90
2.2.7 Semântica e pragmática .......................................................................................................90
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................94
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................96
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................98
TÓPICO 2 – ESTRATÉGIAS APLICADAS NA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM 
LÍNGUA DE SINAIS
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................99
2 A TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LIBRAS: SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ....101
2.1 A TRADUÇÃO COMO PROCESSO ...........................................................................................104
2.2 TÉCNICAS PARA INTERPRETAÇÃO .......................................................................................109
3 MODELOS DE TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO ...................................................................116
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................121
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................125
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................127
TÓPICO 3 – ATIVIDADES DE TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO ..........................................129
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................129
2 PROBLEMATIZAÇÃO E A ÉTICA PROFISSIONAL .................................................................131
2.1 O PROFISSIONAL TRADUTOR INTÉRPRETE E SUAS ATRIBUIÇÕES .............................136
2.2 CÓDIGO DE ÉTICA BRASILEIRO .............................................................................................141
3 HABILIDADES NA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO ...........................................................144
3.1 O TRADUTOR INTÉRPRETE EDUCACIONAL ......................................................................146
3.2 O GUIA-INTÉRPRETE .................................................................................................................149
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................155
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................157
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................159
UNIDADE 3 – POLÍTICAS E CONTRIBUIÇÕES NA ÁREA DE TRADUÇÃO E 
 INTERPRETAÇÃO .....................................................................................................161
TÓPICO 1 – LEGISLAÇÃO E FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL - TRADUTOR 
 INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS ....................................................................163
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................163
2 A FORMAÇÃO DO TRADUTOR E INTÉRPRETE ....................................................................165
2.1 ESFERA NACIONAL ....................................................................................................................166
3 FORMAÇÃO NA ESFERA INTERNACIONAL ...........................................................................177
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................179
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................184
AUTOATIVIDADE ..............................................................................................................................185
TÓPICO 2 – TECNOLOGIAS COMO APOIO AO PROFISSIONAL TILSP ............................187
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................187
2 USO DA TECNOLOGIA COMO SUBSÍDIOS ............................................................................188
2.1 TIPOS DE TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO ................................189
2.1.1 Aplicativos tradutores ..........................................................................................................189
2.1.2 Luvas que transformam
textos em Língua de Sinais .......................................................193
2.1.3 Glossários ...............................................................................................................................194
2.1.4 Youtube ..................................................................................................................................195
IX
2.1.5 WhatsApp/Skype/Imo .........................................................................................................195
2.1.6 Ensino a distância .................................................................................................................195
2.1.7 Revista de vídeo registro .....................................................................................................196
3 RELAÇÃO COM SEUS INTERLOCUTORES ..............................................................................197
3.1 O PROFISSIONAL TILSP E O ALUNO SURDO ......................................................................198
3.2 O PROFISSIONAL TILSP E O PROFESSOR ..............................................................................199
3.3 O PROFESSOR REGENTE E O ALUNO SURDO .....................................................................200
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................202
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................203
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................204
TÓPICO 3 – TRADUTOR INTÉRPRETE DE LIBRAS: INCLUSÃO E VOCÁBULOS 
 EMPREGADOS PARA USO PROFISSIONAL .........................................................205
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................205
2 INCLUSÃO: DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO PROFISSIONAL TILSP ........................206
3 VOCÁBULOS USADOS POR TILSP .............................................................................................209
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................214
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................219
AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................220
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................221
X
1
Esta unidade tem por objetivos:
• identificar diferentes conceitos de tradução;
• compreender operações de tradução entre duas línguas ou no interior de 
uma mesma língua;
• distinguir as conotações que a atividade tradutória já ganhou na história;
• identificar causas para a diversidade linguística, o fenômeno fundante da 
tradução;
• discernir características dos tipos de tradução: intralingual, interlingual e 
intersemiótica e sociolinguística;
• compreender as implicações de uma tradução com foco sobre o texto-fonte 
ou o texto-alvo;
• reconhecer especificidades da interpretação em relação à tradução lato 
sensu.
UNIDADE 1
ESTUDOS DA TRADUÇÃO E 
INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE 
SINAIS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. Durante seus estudos ou no 
final de cada unidade, você encontrará atividades que contribuirão para seu 
conhecimento e aprendizado dos conteúdos apresentados.
TÓPICO 1 – TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
TÓPICO 2 – TIPOS DE TRADUÇÃO
TÓPICO 3 – FUNÇÕES DO TRADUTOR E DO INTÉRPRETE
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
1 INTRODUÇÃO
Você já parou para pensar que grande parte da vida moderna seria 
impensável sem a tradução? Como você pode imaginar, é uma das atividades 
mais antigas da humanidade e, em um mundo cada vez mais diverso como o 
nosso, continua sendo mais necessária do que nunca.
Em um sentido amplo, ou seja, entendendo tradução como interpretação, 
podemos afirmar que não há atividade linguística sem tradução. Como 
veremos adiante, podemos admitir que o aprendizado de qualquer língua passa 
necessariamente pela tradução. 
Ainda, pensando no propósito específico do material em questão, cabe 
acrescentar que a atividade tradutória, na cultura dos surdos, ocupa um lugar 
igualmente central, pois ela se faz presente tanto na comunicação destes com os 
ouvintes, como entre os próprios surdos.
Ao que parece, são muitas as implicações da tradução na nossa vida, certo? 
Você verá, porém, que elas vão muito mais além do que podemos imaginar. Na 
próxima seção, vamos abordar a definição de tradução, percorrendo uma relativa 
variedade conceitual. 
Na seção seguinte, vamos discutir a diversidade linguística como 
fenômeno que confere razão de ser a essa atividade. E, na última seção, enfim, 
pretendemos defender a definição de tradução como uma negociação entre textos 
e culturas. 
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
4
2 QUESTÕES GERAIS SOBRE A TRADUÇÃO
O conceito de tradução vem sendo objeto de debate há muito tempo. Em 
termos diacrônicos, sabemos que a palavra portuguesa deriva do vocábulo latino 
traducere, que significava levar/conduzir (ducere) além (tra). 
Hoje, no entanto, o sentido empregado pelos latinos já evoluiu para uma 
diversidade de outros sentidos. Não é incomum vermos, por exemplo, alguém 
falando em traduzir com o sentido de “revelar, explicar, manifestar, explanar, 
representar, simbolizar”, dentre outros usos. 
Como Guerini e Costa (2006) argumentam, o sentido de passar de uma 
língua para outra é uma metáfora do ato físico de transferir. Concluímos que 
os demais sentidos atribuídos às palavras “traduzir” e “tradução” são gerados 
a partir de extensão metafórica, ou seja, em todos eles, pressupõe-se o ato de 
transferir, de passar algo de um lado para outro. 
Nos termos dos autores, “traduzir designa, de modo restrito, uma operação 
de transferência linguística e, de modo amplo, qualquer operação de transferência entre 
códigos ou, inclusive, dentro de códigos” (GUERINI; COSTA, 2006, p. 4).
IMPORTANT
E
Há pouco, falamos que a prática tradutória está presente tanto na 
comunicação dos surdos com os ouvintes, como entre os próprios surdos e também 
vale para o interior de qualquer língua. Paz (2012, p. 9) radicaliza a importância da 
tradução intralingual para a constituição da linguagem, ao considerar o processo 
essencial para os estágios iniciais de aquisição:
Aprender a falar é aprender a traduzir: quando uma criança pergunta 
à sua mãe o significado desta ou daquela palavra, o que realmente 
pede é que traduza para a sua linguagem a palavra desconhecida. A 
tradução dentro de uma língua não é, nesse sentido, essencialmente 
diferente da tradução entre duas línguas, e a história de todos os 
povos repete a experiência infantil.
Podemos assumir que não existe linguagem sem tradução. Logo, reputamos 
como algo normal para a antiguidade do fenômeno, embora devamos ressalvar 
que, ao longo dos tempos, seu status mudou por diversas vezes. Ora a translação 
de textos era considerada uma atividade nobre, equivalente ao processo criativo, 
ora era considerada uma atividade vil, decorrente dos vícios humanos.
TÓPICO 1 | TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
5
A primeira e mais positiva das visões, a visão de tradução como criação, 
pode ser bem observada entre os antigos romanos. A gênese da literatura e 
da ciência latina está na tradução e imitação de modelos
gregos, sendo que o 
conceito clássico de imitação significava essencialmente recriação e superação do 
modelo. Uma prova de como a tradução estava no centro da inventividade latina 
é a quantidade de termos que os romanos tinham para a atividade. 
Para diferentes nuances do fenômeno, dávamos diferentes nomes, 
como “verter”, “converter”, “transverter”, “imitar”, “explicar”, “interpretar”, 
“exprimir”, “render”, “transferir”, “transladar”; nomes que vêm de “translação” 
e “translator”. Eis o que explica Furlan (2001, p. 13):
Na tradução artística, com uma invenção latina, houve a produção de 
uma romanização não só da expressão, mas também do conteúdo, com 
ênfase no texto de chegada, e o novo valor se denominou com os verbos 
uertere e o composto conuertere, transuertere e imitari. Explicare também 
compartilha as noções, mas em São Jerônimo assume o significado de 
acentuação sobre a funcionalidade semântica mais que sobre o ornato 
retórico. Outras acepções latinas oferecem os verbos interpretari, que 
parece colocar a atenção sobre o conteúdo, a dependência e o esforço de 
fidelidade da cópia; exprimere, que parece enfatizar a marca formal do 
calco; e reddere, que indicaria a correspondência formal não literal entre 
original e tradução. No latim tardio e na Idade Média vai predominar 
o termo transferre e, ainda mais, de seu derivado participial, o verbo 
translatare, que oferece o substantivo translatio e o agente translator.
A segunda e mais negativa das visões foi produzida, paralelamente ao 
paganismo, no pensamento judaico-cristão que, até a Idade Média, promoveu a 
visão da tradução como deturpação da palavra.
Uma das causas da visão pejorativa deriva do mito bíblico da Torre de Babel, 
segundo o qual, Deus, para obstruir o trabalho dos homens, que tentaram construir uma 
torre tão alta quanto os céus, originou a diversidade de línguas entre si, levando-os ao 
desentendimento e ao fracasso no projeto. Consequentemente, a tradução, que derivaria 
da necessidade surgida com a punição divina, era comumente mal vista no antigo mundo 
judaico-cristão.
NOTA
Bassnett (2003, p. 1) corrobora o entendimento ao observar que, até o 
medievo, a tradução era “considerada uma atividade marginal, que só começou 
a ser vista como um ato fundamental do intercâmbio humano no século XX”. 
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
6
A função de mediação cultural, franqueada por Bassnett (2003), é um 
aspecto fundamental da atividade em discussão. Analogamente, Rónai (1976, p. 
3-4) comenta que, em geral, as definições dadas à tradução disfarçam a natureza 
transcultural. Em seus termos:
Ao definirem “tradução”, os dicionários escamoteiam prudentemente 
o aspecto e limitam-se a dizer que traduzir é passar para outra língua. 
A comparação mais óbvia é fornecida pela etimologia: em latim, 
traducere é levar alguém pela mão para o outro lado, para outro lugar. 
O sujeito do verbo é o tradutor, o objeto direto, o autor do original a 
quem o tradutor introduz em um ambiente novo [...]. Mas a imagem 
pode ser entendida também de outra maneira, considerando-se que é 
ao leitor que o tradutor pega pela mão para levá-lo para outro meio 
linguístico que não o seu.
 
Do ponto de vista cultural, existiriam duas perspectivas distintas do ato 
tradutório: a do tradutor conduzindo o autor para a outra língua, e a do translator 
que leva, não o autor, mas o leitor para o outro “lado”, ou seja, para a cultura 
alheia. Assim, na primeira perspectiva, aquela que Rónai (1976, p. 4) chama de 
“tradução naturalizadora”, o tradutor “conduz uma obra estrangeira para outro 
ambiente linguístico, adaptando-a ao máximo aos costumes do novo meio”. 
Há a retirada das características exóticas, o esquecimento que reflete uma 
realidade longínqua, essencialmente diversa. Na segunda perspectiva, que o 
autor chama de “tradução identificadora”, o intérprete “conduz o leitor para o 
país da obra que lê e mantém cuidadosamente o que tem de estranho, de genuíno, 
e acentua a cada instante a sua origem alienígena” (RÓNAI, 1976, p. 4). 
Perceba que as definições dão destaque ao papel do tradutor e do leitor 
como sujeitos ativos no processo. Pereira (2008), no entanto, observa que não são 
raras algumas tentativas de definir a tradução que deixam de lado elementos 
essenciais dela. Tais tentativas acabam reduzindo o conceito de tradução para a 
mera substituição de material textual em uma língua-fonte por material textual 
equivalente em outra língua-meta, ou à simples transferência do conteúdo de um 
texto para os meios próprios de outra língua. 
Embora não sejam inteiramente erradas, as definições deixam lacunas 
importantes, pois descrevem um processo somente entre línguas, esquecendo-
se de dois elementos essenciais: os sujeitos envolvidos e a situação (o contexto). 
Assim, nas abordagens redutivistas, o tradutor é encarado como um mero 
reprodutor de textos, uma espécie de adaptador de voltagem entre línguas, sem 
nunca alçar a posição de autor.
Em dissonância ao tipo de visão em questão, declaramos que 
procuraremos sempre abordar a tradução em uma perspectiva que inclui não 
só os códigos linguísticos, mas também os sujeitos envolvidos no processo e no 
contexto em que atuam.
3 DIVERSIDADE LINGUÍSTICA
Para Guerini e Costa (2006), o mito da Torre de Babel, que mencionamos 
há pouco, pode ser interpretado como uma expressão da interminável tarefa 
TÓPICO 1 | TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
7
É importante ressaltar que a variedade linguística existe dentro de uma mesma 
língua, e essa variação, na medida que se intensifica, pode levar ao surgimento de novas 
línguas, o que torna a operação tradutória sempre necessária e atual.
IMPORTANT
E
A língua portuguesa, por exemplo, por muitos considerada uma só, tem 
variedades díspares a ponto de seus falantes não as reconhecerem mais como 
variedades de um mesmo sistema. Estamos falando do português europeu 
e do português brasileiro, variedades diatópicas que já guardam profundas 
diferenças, não só no léxico (vocabulário), mas também na fonologia (regras para 
a articulação dos sons), na prosódia (entonação, acentuação e atração de clíticos) 
e na morfossintaxe (regras de concordância, sistema pronominal etc.). Muitas 
edições de obras estrangeiras têm uma tradução no Brasil e outra, sensivelmente 
diferente, em Portugal.
Para saber um pouco mais sobre as causas da diversidade linguística, leia, 
a seguir, o texto de Fábio de Oliveira, que é um breve artigo que aborda a questão 
de uma forma leve e informativa.
do tradutor, que decorre de um fenômeno primordial: a grande diversidade de 
línguas existentes.
Steiner (2005) entende que a diversidade é uma consequência da própria 
individualidade dos seres humanos, ou seja, cada um de nós é naturalmente 
diferente, e é natural que nos expressemos de modos singulares. Embora 
negociemos nossas diferenças com vistas à comunicação, os limites das diferenças 
se tornam cada vez mais salientes, na medida em que os limites sociais também se 
alargam. Nos termos de Steiner (2005, p. 72):
[...] o fato de que milhares e milhares de línguas diferentes e 
mutuamente incompreensíveis foram e são faladas em nosso pequeno 
planeta é uma expressão clara do enigma profundo da individualidade 
humana, da evidência biogenética e bissocial de que não existem dois 
seres humanos inteiramente iguais.
Quando Steiner (2005) afirma que milhares de línguas diferentes foram e 
são faladas por razões biogenéticas e biossociais, ele chama a nossa atenção para 
o fato de que, desde que o ser humano desenvolveu a faculdade da linguagem, 
as línguas variaram e mudaram por inúmeros fatores, como sexo dos falantes, 
idade, classe social, região geográfica, registro (culto ou informal) etc. 
Com tantos fatores condicionando o comportamento das línguas e sua 
mudança, é natural que quanto
mais a população humana se multiplica e suas 
diferenças biológicas e culturais se agravam no tempo e no espaço, mais as línguas 
se diferenciam e se multiplicam.
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
8
POR QUE TODO MUNDO NÃO FALA A MESMA LÍNGUA?
Fábio de Oliveira 
As línguas foram surgindo nas várias regiões do mundo de forma 
independente. Algumas têm a mesma origem, como o hindu, o sueco, o inglês e o 
português. Vieram de uma grande língua comum, chamada protoindo-europeu, 
que há milhares de anos era falada na Ásia. 
O idioma deu origem a quase todas as línguas ocidentais e algumas 
orientais. “Supõe-se que o indo-europeu tenha sido uma língua só, que foi se 
diferenciando com o tempo”, explica o professor de linguística Paulo Chagas de 
Souza, da Universidade de São Paulo.
É que as línguas são vivas – elas se transformam com o uso. Mesmo as que 
vieram de uma raiz comum, foram sendo modificadas pouco a pouco pela prática 
de cada grupo falante, que seleciona os termos adequados ao seu ambiente e à 
cultura. Os esquimós, por exemplo, criaram palavras capazes de descrever 40 
tons de branco. Os termos não fazem o menor sentido para um povo que mora no 
deserto, concorda?
O Império Romano teve uma forte função na difusão e na construção 
de muitas das línguas que são faladas hoje. Naquela época, na região de Roma, 
falava-se o latim, uma língua derivada do protoindo-europeu, que floresceu na 
região do Lácio. 
Na medida em que o império avançava, conquistando novos territórios, 
o idioma foi sendo imposto aos povos dominados, mas não sem sofrer influência 
das línguas locais, com mudanças de pronúncia e enxertos de palavras. Com o 
enfraquecimento do domínio dos césares, as diferenças foram se intensificando e 
construindo dialetos, que se transformaram em idiomas próprios. Foi assim que 
surgiu o português, o italiano e o francês, por exemplo.
Hoje são faladas 7.099 línguas ao redor do mundo, segundo o compêndio 
Ethnologue, um livro que cataloga os idiomas do nosso planeta desde 1950. 
Entretanto, a gente não ouve a maioria delas. Mais de 90% das línguas estão na 
boca de apenas 6% dos habitantes da Terra. O restante da população mundial usa 
menos de 400 idiomas.
O português brasileiro
O português demorou mais de 200 anos para se consolidar no Brasil. 
No final do século 17, o tupinambá, um dos dialetos do tupi, era o que mais se 
escutava por aqui. Para não perder o predomínio político na colônia, Portugal 
proibiu que crianças, filhos de portugueses e indígenas aprendessem outra língua 
LEITURA COMPLEMENTAR
TÓPICO 1 | TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
9
que não fosse o português. Entretanto, a língua que falamos hoje não é idêntica à 
língua que se fala em Portugal. 
O “português brasileiro” também é resultado de um amplo e complexo 
processo de transformação sofrido ao longo dos anos, com importantes 
contribuições dos escravos africanos e de imigrantes que vieram de vários cantos 
do mundo. Ainda hoje, 237 línguas são faladas no país. Do total, 216 estão vivas. 
Delas, 201 são indígenas e 153 correm risco de ser extintas.
4 coisas que você não sabia sobre idiomas
1 O Ethnologue lista 237 línguas no Brasil. 216 estão vivas e 21, extintas. Das 
vivas, 201 são indígenas e 15, não indígenas. 56 estão em perigo e 97, morrendo.
2 Na Espanha, são 15 no total, entre elas o basco e o catalão. Na ditadura de 
Franco, as línguas foram proibidas, mas o decreto caiu no fim dos anos 1970.
3 Na Índia, um país com mais de 1 bilhão de habitantes, o número de línguas 
catalogadas chega a 462. Do montante, 448 estão vivas e 14, extintas.
4 Nos Estados Unidos, o número de línguas catalogadas chega a 231. 220 estão 
vivas e 11, extintas. Das vivas, 196 são indígenas e 24, não indígenas.
Mãe de (quase) todas
Muitas das línguas que você sabe que existem vieram de uma raiz comum.
FONTE: Dossiê 376/Superinteressante.
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
10
O protoindo-europeu
Boa parte da população mundial, incluindo países das Américas, da 
Europa e até a Índia, fala línguas que se agrupam no que os linguistas chamam 
de filo protoindo-europeu. A origem é incerta: há os que defendem que tenha 
surgido na Anatólia, atual Turquia, há 9 mil anos, e outros, ao norte do Mar 
Negro, há 5 mil anos.
Rumo ao Norte
Um dos ramos diretos do indo-europeu é o germânico. Engloba as línguas 
de povos do norte da Europa, muitos dos quais ficavam fora dos limites do 
Império Romano (os bárbaros, que, na primeira acepção da palavra, queria dizer 
estrangeiro). Da lista, são incluídos o inglês, o alemão, o holandês, o sueco e o 
dinamarquês.
“Quo vadis?”
A frase citada significa “para onde vais” em latim, língua que nasceu no 
Lácio, região próxima a Roma. Com a expansão do Império Romano, migrou 
para regiões onde hoje estão países como Espanha, França e Portugal. Com o 
declínio dos romanos, cada um dos locais começou a falar o latim do seu jeito. 
Surgiram o português e seus coirmãos.
FONTE: Superinteressante. São Paulo, n. 376, jun. 2017, p. 31-33.
4 NEGOCIAÇÃO ENTRE TEXTOS E ENTRE CULTURAS
Há pouco, dissemos que a atividade linguística consiste em negociar 
nossas diferenças em relação à comunicação, sendo que os limites das diferenças 
se tornam cada vez mais salientes na medida em que os limites sociais também se 
alargam. A tradução, portanto, pode ser entendida como uma negociação entre 
textos e entre culturas.
Eco (2007) enxerga a tradução como negociação, em vários níveis e entre 
vários atores: o autor, seu texto original, as culturas de saída e chegada, os leitores 
prováveis, as editoras e, naturalmente, o tradutor – o maior dos negociadores. 
Segundo Eco (2007), para o tradutor profissional, há muito a negociar. Ele negocia, 
por exemplo:
• uma estratégia de tradução (influenciada, possivelmente, pelo autor, pela 
editora, pelos leitores potenciais ou almejados);
TÓPICO 1 | TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
11
• a noção de fidelidade que se pretende, ou que se julga mais adequada à situação;
• o tamanho do texto e outras idiossincrasias editoriais (não raramente, frase por 
frase, palavra por palavra).
Eco (2007) defende que a noção de negociação, em certa medida, depõe 
a obsoleta noção de fidelidade. Ele, que antes de tradutor é autor de obras 
originais, não só aceita a negociação de sentidos nas traduções dos seus textos 
autorais, como também estimula sua alteração, desde que se tencione recriar a 
mesma sensação estética, a mesma emoção, quem sabe a mesma surpresa que ele 
pretendeu em princípio. Eco (2007), portanto, afirma ser tolerável e geralmente 
inevitável em relação à deformação da superfície do texto em proveito de seu 
significado profundo, de seu núcleo expressivo.
Assim, falamos de tradução entre línguas e de tradução entre variedades 
de uma mesma língua, que podem ser sutis ou abissais. No entanto, também 
podemos traduzir de um meio para outro, de um gênero para outro, ou de um 
sistema semiótico para outro, sendo a negociação mais controversa. 
Chamamos de tradução intersemiótica quando, por exemplo, uma obra 
literária é adaptada para o cinema, ou para quadrinhos, ou ainda quando um 
poema é transformado em canção. Gostaríamos de abordar uma operação que 
talvez esteja no meio de dois polos, entre a tradução entre línguas fônicas e a 
tradução intersemiótica: a tradução entre línguas fônicas e línguas gestuais.
Desde que a linguística moderna varreu uma série de preconceitos 
históricos, frutos do fonocentrismo, que pairavam sobre as línguas gestuais, 
equiparando o status destas ao de todos os demais sistemas de signos linguísticos 
humanos (cf. QUERIQUELLI, 2018), a tradução envolvendo línguas gestuais e 
línguas fônicas se tornou um terreno extremamente fértil. 
Um exemplo da fertilidade é o trabalho de Klamt (2014),
que encarou a 
tarefa de traduzir para o português o poema “Voo sobre o Rio”, composto por 
Fernanda Machado em Libras – Língua Brasileira de Sinais. Nele, a poetisa 
descreve suas percepções ao sobrevoar a cidade do Rio de Janeiro. Nos primeiros 
versos, a autora coloca o leitor na perspectiva de alguém que se aproxima da 
Terra e a vê primeiro bem pequena, ao longe, depois mais próxima, até que ela 
preencha todo o campo de visão. A imagem a seguir reproduz a parte do poema:
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
12
FIGURA 1 – INÍCIO DO POEMA “VOO SOBRE O RIO”
FONTE: Klamt (2014, p. 115)
PLANETA-TERRA-PEQUENO
PLANETA-TERRA-MÉDIO
PLANETA-TERRA-GRANDE
A tradutora assim explica suas estratégias tradutórias (ou negociais) 
para o trecho:
Os sinais mostram as três dimensões referidas anteriormente. Na ponta 
do dedo da poetisa, o planeta terra é minúsculo e distante; quando 
polegar e demais dedos se juntam em letra “o” (“grávidos no espaço”), 
já está mais próximo; por fim, quando o efeito de aproximação da 
câmera chega ao seu máximo nível, o planeta Terra é grande e próximo 
e a configuração das mãos lembra o embalar de um ser frágil. Assim, 
no início do poema, estes três sinais foram traduzidos como: O astro 
distante: terra. / (gotícula de terra viaja na ponta do dedo) / O planeta de 
percorrer com as mãos: terra. / (o tamanho da terra quando polegar e dedos se 
encontram grávidos no espaço) / O chão coberto de terra (mãos de embalar um 
ser frágil) (KLAMT, 2014, p. 115).
TÓPICO 1 | TEORIA GERAL DA TRADUÇÃO
13
Perceba que a tradutora toma o cuidado de não impor soluções familiares 
ao falante nativo de português. Talvez seria mais cômodo recriar um poema 
mostrando a descida ao planeta Terra, com elocuções típicas do português 
brasileiro, mas a tradutora cede à negociação e traz a língua alheia para dentro da 
sua: “o astro distante: terra/gotícula de terra viaja na ponta do dedo”; “o tamanho 
da terra quando polegar e dedos se encontram grávidos no espaço”. Repare 
que é uma negociação não apenas entre soluções textuais bilaterais, mas entre 
convenções e perspectivas culturais.
Mais adiante, no poema, há um trecho em que é apresentado um 
diálogo entre um casal de pássaros, utilizando um recurso típico da Libras: as 
chamadas boias, ou seja, a suspensão de um enunciado com uma das mãos 
para a intercalação de um segundo enunciado com a outra mão. Tal trecho é 
reproduzido na imagem a seguir:
FONTE: Klamt (2014, p. 116)
A tradutora, por sua vez, comenta as opções feitas em relação à parte do poema:
Nos trechos II e III, ocorre um diálogo entre os dois pássaros: a 
mão direita sempre representa o pássaro-fêmea e a mão esquerda o 
pássaro-macho. Uma mão é suspensa, sem movimento, representando 
um dos pássaros que é o receptor da mensagem, enquanto a outra 
representa o pássaro produtor da mensagem, que realiza uma ação ou 
fala por meio do movimento e dos sinais não manuais. É interessante, 
ainda, notar que todos os sinais foram produzidos com a mesma 
configuração de mão, que assume a forma, ao mesmo tempo, da cabeça 
e da asa das aves. Traz-se aqui, então, um trecho do texto de chegada, 
em Português, para mostrar como a dualidade entre o feminino e o 
masculino foi representada graficamente: [...] O de corpaço busca. / A 
de corpóreo sorri, se enfeita. / Ela espia, gira o corpo de vergonha. / Ele não 
compreende. / Põe-se esbelto, ele dirige a vista e investe. / Ela não nota, não 
se vira. / Ele fala no dorso; ela não vira as costas (KLAMT, 2014, p. 116).
Assim, temos em Klamt (2014) um bom exemplo de tradução como 
negociação, ao mesmo tempo, entre textos e entre culturas. Não é uma negociação 
convencional que se faz entre textos de línguas fônicas modernas; não é uma 
negociação radical que se faz entre sistemas semióticos diferentes, mas é uma 
negociação delicada, entre línguas de natureza sensivelmente diferentes, que 
exige, com a licença da analogia, uma destreza diplomática do tradutor para 
não ferir as propriedades poéticas do texto-fonte, que é gestual, e para recriá-
lo na língua alvo, também respeitando suas propriedades linguísticas e suas 
particularidades culturais.
FIGURA 2 – DIÁLOGO ENTRE PÁSSAROS NO POEMA “VOO SOBRE O RIO”
PÁSSARO-MACHO-
OLHAR-DÚVIDA
PÁSSARO-OLHARPÁSSARO-MACHO-
ARRUMAR
14
Neste tópico, você aprendeu que:
• Abordamos diferentes nuances do conceito de tradução. Começamos por uma 
definição mais geral, a de levar um significado para além de uma língua em 
direção à outra língua e, em seguida, vimos como o conceito se desdobrou em 
outros, como “revelar, explicar, manifestar, explanar, representar, simbolizar” etc. 
• Vimos também que a tradução pode acontecer entre duas línguas ou no interior 
de uma mesma língua. Em última instância, não há atividade linguística sem 
tradução. 
• Discutimos também as diferentes conotações que a atividade tradutória 
já ganhou na história, extremamente positiva na antiguidade clássica, por 
exemplo, símbolo de invenção, criação e engenhosidade e extremamente 
pejorativa na tradição judaico-cristã, símbolo de discórdia, obscuridade e 
degeneração da verdade.
• Discutimos que a tarefa do tradutor decorre de um fenômeno primordial: 
a grande diversidade de línguas existentes. Tal diversidade, por sua vez, 
advém de razões biogenéticas e biossociais (sexo dos falantes, idade, classe 
social, região geográfica, registro culto ou informal etc.) e, com tantos fatores 
condicionando o comportamento das línguas e sua mudança, é natural que 
quanto mais a população humana aumenta e suas diferenças se agravam, mais 
as línguas se diferenciam e se multiplicam. Assim, a diversidade das línguas é, 
por excelência, a razão de ser da tradução.
• Debatemos a tradução vista como um ato de negociação entre textos e entre 
culturas. Tal negociação acontece em vários níveis e entre vários atores: o 
autor, seu texto original, as culturas de saída e chegada, os leitores prováveis, 
as editoras e, naturalmente, o tradutor – o maior dos negociadores. 
• Analisamos os argumentos de Eco (2007), segundo o qual a noção de negociação 
depõe a obsoleta noção de fidelidade. Mencionamos o caso da tradução 
intersemiótica, em que a negociação se torna crítica, e ainda discutimos um 
caso intermediário: a tradução entre uma língua fônica e uma língua gestual. 
• Comentamos a experiência de tradução para o português de um poema 
composto em Libras, sugerindo que a tradutora procedeu para uma negociação 
delicada, respeitando as propriedades poéticas do texto-fonte, que é gestual, 
e também buscando trazer as idiossincrasias da cultura que o produziu, 
permeando o texto em português de uma estranheza positiva, fruto de um 
sincretismo cultural bem-sucedido.
RESUMO DO TÓPICO 1
15
1 Relacione os itens com as afirmações a seguir:
I- Visão da tradução na antiguidade clássica.
II- Visão da tradução na antiga tradição judaico-cristã.
III- Tradução como atividade linguística básica.
IV- Causa primordial da necessidade da tradução.
V- Tradução como negociação entre textos.
VI- Tradução como negociação entre culturas.
( ) Um texto não reflete apenas as propriedades estritamente linguísticas 
de uma língua (léxico e gramática, por exemplo), mas também espelha 
convenções muito particulares à cultura do seu autor. A tradução envolve 
equalizar as diferenças entre o mundo do autor e o mundo do leitor.
( ) Em termos estritamente linguísticos (léxico, morfologia, sintaxe etc.), as 
línguas são invariavelmente distintas. Portanto, na versão de um texto 
de uma língua para outra, o tradutor tem perdas e ganhos em termos de 
escolhas vocabulares, construções sintáticas, equivalências morfológicas etc.
( ) As pessoas são naturalmente diversas entre si, e a diversidade se estende à 
linguagem, fazendo com que, quanto mais as diferenças
se agravam, mais 
as diferenças linguísticas se acentuam.
( ) Estamos operando traduções a todo momento, quando explicamos algo 
para alguém, quando mudamos de contexto, quando mudamos de veículo 
de comunicação ou gênero discursivo, quando estamos adquirindo 
linguagem, quando lidamos com línguas estrangeiras.
( ) A tradução era vista como uma deturpação do sentido original das palavras 
e como causa primordial da discórdia entre os homens.
( ) A tradução era vista como um processo criativo, assumindo sentidos como 
os de criar, verter, converter, transverter, imitar, explicar, interpretar, 
exprimir, render, transferir, transladar, dentre outros.
2 Diante do que foi apresentado no primeiro tópico, como você explicaria 
a seguinte afirmação: “quanto mais as diferenças entre seres humanos se 
aprofundam, mais a tradução se faz necessária”?
3 (Adapt. de concurso para tradutor/intérprete de Libras da UFSJ/2016). 
Existem tentativas de simplificar o conceito do que é uma tradução, como 
sendo a substituição de material textual em uma língua-fonte (LF) por 
material textual equivalente em outra língua-meta (LM) ou a transferência 
do conteúdo de um texto para os meios próprios de outra língua. Apesar 
de sucintos, ainda existem pontos não explicitados nas definições, pois 
descrevem um processo somente entre línguas, em que os sujeitos envolvidos 
e a situação (contexto) nem são mencionados. Com base no enunciado, 
marque a opção INCORRETA:
AUTOATIVIDADE
16
a) ( ) O tradutor ora é encarado como um mero reprodutor de textos, uma 
espécie de adaptador de voltagem entre línguas, ora alça a posição 
de autor.
b) ( ) A tradução é o termo geral que define a ação de transformar um texto a 
partir da língua-fonte, por meio de vocalização, escrita ou sinalização, 
em outra língua-meta.
c) ( ) É aceitável que a tradução procure uma correspondência de aspectos 
linguísticos, porém seus objetivos de interação podem ser perdidos em 
uma busca obsessiva de equivalência entre as línguas.
d) ( ) A tradução é uma atividade que abrange a interpretação do significado 
de um texto em uma língua – o texto-fonte – e a produção de um 
novo texto em outra língua, sendo que tal texto resultante também é 
chamado de tradução.
17
TÓPICO 2
TIPOS DE TRADUÇÃO
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
No primeiro tópico, você deve recordar que já abordamos alguns tipos 
de tradução. Falamos em traduções que acontecem dentro da própria língua 
(intralingual), traduções que acontecem entre línguas diferentes (interlingual) 
e também comentamos, quando falávamos sobre a negociação entre textos, 
traduções entre veículos ou gêneros diferentes, ou entre sistemas semióticos 
diferentes (intersemiótica).
A divisão corresponde à clássica tipologia proposta por Jakobson (1969) 
em seu ensaio “Aspectos linguísticos da tradução”. No presente tópico, portanto, 
vamos aprofundar a tipologia.
2 TRADUÇÃO INTRALINGUAL
Jakobson (1969) abre seu ensaio relativizando um preceito da filosofia 
da linguagem proposto por Russell, o qual, levado às últimas consequências, 
impossibilitaria a tradução. Russell (1950 apud JAKOBSON, 1969) sugere que 
ninguém poderá compreender a palavra “queijo”, por exemplo, se não tiver um 
conhecimento não linguístico do queijo. 
Entretanto, argumenta que, se seguirmos o preceito russelliano, seremos 
então obrigados a dizer que ninguém poderá compreender a palavra queijo se 
não conhecer o significado atribuído à palavra no código lexical do português. Na 
verdade, porém, qualquer representante de uma cultura culinária que desconheça 
o queijo compreenderá tranquilamente a palavra portuguesa se souber que, na 
língua, ela significa “alimento obtido pela coagulação do leite” e se tiver, ao 
menos, um conhecimento linguístico de leite coalhado.
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
18
Jakobson (1969) faz a digressão para defender que o significado de um 
signo linguístico não é mais que sua tradução por um outro signo correspondente, 
especialmente um signo no qual ele se ache desenvolvido de modo mais completo, 
como afirmou Peirce (1946 apud JAKOBSON, 1969). Feita a defesa, o autor 
distingue as três maneiras de interpretar um signo verbal que já conhecemos. Ele 
pode ser traduzido em outros signos da mesma língua, em outra língua, ou em 
outro sistema de símbolos não-verbais. O linguista assim define em seus termos 
os três tipos em questão:
• A tradução intralingual ou reformulação (rewording) consiste na interpretação 
dos signos verbais por meio de outros signos da mesma língua.
• A tradução interlingual ou tradução propriamente dita consiste na interpretação 
dos signos verbais por meio de alguma outra língua.
• A tradução intersemiótica ou transmutação consiste na interpretação dos 
signos verbais por meio de sistemas de signos não-verbais.
A tradução intralingual envolve os fenômenos da sinonímia e da paráfrase. 
Segundo Jakobson (1969, p. 65), “a tradução intralingual de uma palavra utiliza 
outra palavra, mais ou menos sinônima, ou recorre ao circunlóquio. Entretanto, 
via de regra, quem diz sinonímia não diz equivalência completa”. 
A impossibilidade da sinonímia perfeita apresentada pelo autor é 
uma marca da abordagem que representa: o funcionalismo. Na perspectiva 
funcionalista, cada palavra guarda, em alguma medida, um significado único. 
Assim, uma palavra como “calor”, embora possa ser tomada como sinônimo 
relativo de “quentura”, tem nuances semânticas particulares.
Contudo, é inegável que estamos a todo momento fazendo operações de 
sinonímia e paráfrase quando usamos a língua, ora com finalidades pontuais 
e espontâneas, ora de modo metódico. Pense, por exemplo, quando você fala 
sobre algo complicado para alguém e a pessoa não entende. O que você faz? 
Provavelmente vai explicar de outra forma para ela, com outras palavras, certo? 
É um procedimento de tradução intralingual. 
Frequentemente, fazemos tal tipo de operação para nós mesmos, quando 
queremos clarear o nosso pensamento. Rónai (1976, p. 1) faz o seguinte comentário:
[...] ao vazarmos em palavras um conteúdo que em nosso pensamento 
existia apenas em estado de nebulosa, fenômeno constante em todos 
os momentos conscientes da vida, estamos também traduzindo, mas 
praticamos a tradução intralingual, operação esta que tem as próprias 
dificuldades e cujo resultado muitas vezes nos deixa insatisfeitos.
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
19
Muitas vezes, quando lemos textos antigos escritos na nossa própria 
língua, temos de fazer um certo esforço para entendermos algumas palavras, 
construções, elocuções específicas. O tipo de esforço também pode ser visto como 
uma tradução intralingual. 
Steiner (2005, p. 54) a chama de tradução diacrônica no interior da própria 
língua que, para ele, é um fenômeno “tão constante, que nós o realizamos tão 
inconscientemente, que raramente paramos para observar seja sua complexidade 
formal, seja o papel decisivo que exerce na própria existência da civilização”. 
O que acontece naturalmente na leitura ou no pensamento pode, muitas 
vezes, se tornar um projeto editorial. É o que ocorre, por exemplo, quando 
algumas editoras resolvem retextualizar alguns clássicos literários para leitores 
modernos, ou popularizar alguns ícones da ciência e da filosofia. 
Temos muitas edições que apresentam “Hamlet, de Shakespeare, para 
crianças”, “A eletrodinâmica dos corpos em movimento, de Einstein, para os 
leigos”, “O discurso do método, de Descartes, para não iniciados”. Tal tipo de 
tradução intralingual recebe o nome de “adaptação”.
O maior épico da literatura portuguesa, por exemplo, “Os Lusíadas”, de 
Camões, já foi adaptado muitas vezes. No Brasil, uma das mais conhecidas é a 
adaptação na forma de um romance em prosa feita por Rubem Braga. Compare, a 
seguir, os textos de Camões
e Braga, correspondentes à parte da narrativa em que 
Baco, por inveja, tenta impedir o sucesso dos navegantes portugueses:
Versos das estrofes 30 e 32 do Canto I dos Lusíadas:
O padre Baco ali não consentia
No que Júpiter disse, conhecendo
Que esquecerão seus feitos no Oriente,
Se lá passar a Lusitana gente.
[...]
Teme agora que seja sepultado
Seu tão célebre nome em negro vaso
D'água do esquecimento, se lá chegam
Os fortes Portugueses, que navegam.
Tradução intralingual de Rubem Braga (1997, p. 13):
Ele [Baco] não se conformava: – Por que eu, filho de Júpiter, tenho de 
deixar que outros usurpem minha fama? Que um povinho arrogante 
tome o lugar conquistado por mim, por Alexandre da Macedônia e 
pelos romanos? Não, não permitirei que isso aconteça. Essa frota 
jamais chegará ao Oriente.
No primeiro tópico, mencionamos que as línguas são diversas por conta 
de vários fatores. Um deles, ao menos, as diferenças decorrentes das idades 
dos falantes, já apareceu no segundo tópico indiretamente, quando falamos em 
tradução intralingual diacrônica. 
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
20
Os outros fatores de variação, contudo, também induzem operações de 
tradução interna para uma língua: classes sociais, comunidades de fala, região, 
sexo, dentre outros. Steiner (2005, p. 70-71) faz a seguinte reflexão:
Não há duas épocas históricas, duas classes sociais, duas localidades 
que usem as palavras e a sintaxe para expressar as mesmas coisas 
[...]. Nem dois seres humanos. Cada uma das pessoas se serve, 
deliberadamente ou por costume espontâneo, de duas fontes de 
suprimento linguístico: a língua corrente que corresponde ao seu grau 
de letramento e um tesouro privado [...]. A língua de uma comunidade, 
por mais uniformes que sejam seus contornos sociais, é um agregado 
inesgotavelmente múltiplo de átomos de fala, de significados pessoais 
em último caso irredutíveis. 
Guerini e Costa (2006, p. 9), por sua vez, corroboram a posição de Steiner 
ao afirmar que:
As diferentes camadas das sociedades humanas também costumam 
usar um idioma diferente, embora a diferença varie bastante de 
sociedade para sociedade. Exemplos não faltam: há comunidades que 
usam uma língua para a religião, outra para o governo, outra para 
literatura, outra para a comunicação do cotidiano [...]. Junto com 
uma língua comum para uma dada comunidade, teríamos, portanto, 
inevitavelmente, um grande leque de variantes segundo a época 
histórica, a localização geográfica, a classe social, a faixa etária, até 
chegar ao próprio indivíduo. 
Normalmente, crescemos com a ilusão de que, no ambiente lusófono, 
por exemplo, todos falam a mesma língua, embora sintamos um estranhamento 
quando temos que traduzir certos enunciados do nosso idioleto para a língua de 
outras pessoas com quem convivemos. 
A causa de tal estranhamento fica, portanto, bem esclarecida diante das 
reflexões que vimos aqui: em um país em que supostamente todos falam a mesma língua, a 
verdade é que há muitas línguas coexistindo. Elas são chamadas erroneamente de sotaques, 
mas deveríamos nos referir a elas como dialetos ou mesmo línguas, motivo pelo qual faz 
todo o sentido falarmos em tradução. Pereira (2008) refere-se ao processo como tradução 
sociolinguística.
IMPORTANT
E
Para ilustrar como a tradução passa a ser mais necessária na medida em 
que as variedades linguísticas de uma mesma língua se emancipam em direção 
a novas línguas, traremos aqui um caso ilustrativo para a língua portuguesa: as 
chamadas versões (ou cópias) do Testamento de Afonso II. 
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
21
Notamos, de forma geral, dois movimentos aparentemente antagônicos 
produzidos pelos processos tradutórios: um centrífugo, que motiva a estratificação de 
uma língua, produzindo variedades linguísticas; e outro centrípeto, que condiciona a 
normatização e estabilização de uma língua.
IMPORTANT
E
2.1 O PAPEL DA TRADUÇÃO INTRALINGUAL PARA A 
HISTÓRIA DA LÍNGUA
Na história das línguas, podemos encontrar diferentes casos de traduções 
que exerceram um papel crucial na consolidação política, identitária e cultural 
das línguas. Podemos citar, por exemplo, a tradução do grego para o latim da 
Odisseia de Homero feita por Lívio Andrônico, em 240 a.C., que inaugurou a 
literatura latina e serviu de modelo de língua para muitos poetas latinos e falantes 
de latim que vieram depois; a tradução do Antigo Testamento do hebraico para o 
latim feita por São Jerônimo, em cerca de 400 d.C., que serviria de modelo para o 
latim eclesiástico praticado dali em diante; e, principalmente, a tradução da Bíblia 
feita por Martinho Lutero, em 1534, que notoriamente contribuiu para estabelecer 
o alemão moderno. 
Também, devemos considerar o papel político desempenhado pelas 
traduções no período de colonização, fato que produziu efeitos sobre os modos de 
circulação, normatização e consolidação das línguas e das culturas nos diferentes 
espaços geopolíticos colonizados.
Exemplificando, na história da língua portuguesa, um caso de movimento 
centrífugo diz respeito ao Testamento de Afonso II, de 1214, um documento 
de grande valor, considerado o primeiro documento real escrito em português. 
Do documento, restaram duas das 13 cópias feitas e distribuídas por diferentes 
entidades. Cada uma das 13 cópias originais era destinada para uma região 
específica do reino. 
As duas cópias que restaram, em muitos momentos, parecem estar escritas 
em línguas diferentes, embora tratem de uma estratificação da língua portuguesa 
em variedades diferentes. Como veremos adiante, as cópias consistiram em 
translações conscientes de textos, visando a línguas-alvo específicas. 
Já o movimento centrípeto pode ser exemplificado com os casos 
mencionados anteriormente, de tradução da Odisseia de Homero por Lívio 
Andrônico, do Antigo Testamento por São Jerônimo e da Bíblia por Lutero.
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
22
Conforme argumentamos em Severo e Queriquelli (2012, p. 214-215),
Tanto naqueles casos em que traduções constituem marcos na 
promoção da diversidade linguística, quanto nos casos em que a 
tradução motiva a normatização de línguas, temos a figura do tradutor 
e o papel da tradução como implicados em processos de estabilização, 
variação e mudança das línguas.
O Testamento de Afonso II, datado de 27 de junho de 1214, é o primeiro 
documento real conhecido escrito em língua portuguesa. Conforme Costa (1979), 
seu autor, D. Afonso II, quando escreveu, tinha apenas 28 anos de idade e pouco 
mais de três anos de reinado. Ele era, porém, uma pessoa muito doente e decidiu 
fazer o testamento para garantir a paz e a tranquilidade da família e do reino, no 
caso de morrer prematuramente. 
Afonso II tomou providências para garantir a sucessão pela via masculina 
ou, na falta desta, pela filha mais velha. Ainda, no caso de uma possível menoridade 
do herdeiro, ele confiou ao Papa a proteção de seus irmãos e do reino. Segundo 
Costa (1979, p. 308):
Na disposição dos bens, além da rainha, dos filhos e filhas, contempla 
o Papa, as dioceses galegas de Santiago de Compostela e de Tui, alguns 
mosteiros e Ordens militares. Das dioceses portuguesas contemplou 
apenas a de Idanha, bispos de Coimbra, Évora, Lamego, Lisboa, Porto 
e Viseu, além de outras pessoas, de executarem as suas disposições 
testamentárias.
As 13 cópias do testamento destinavam-se, portanto, aos herdeiros das 
diferentes regiões do reino. As duas cópias remanescentes eram destinadas ao 
arcebispo de Braga e ao arcebispo de Toledo. Afonso II fez ainda outros dois 
testamentos, ambos redigidos em latim, um datado de 1218, e o outro, de 1221.
As duas cópias escritas no vernáculo apresentam diferenças consideráveis:
• Ambas foram escritas por mãos diferentes, como se pode observar pelo tipo
e corpo de letra que em cada uma delas aparece (não estão identificados os 
copistas).
• A cópia de Braga (doravante B) tem 27 linhas, e a de Toledo (doravante T), 
37 linhas.
• Alguns sons são representados com grafias diferentes em uma e outra.
• Também divergem certas formas linguísticas (ordem de palavras, sinônimos etc.).
Costa (1979, p. 311) defende que as cópias foram feitas a partir de um 
ditado simultâneo: “as variantes entre os exemplares [...] levam a supor que o 
original do testamento foi ditado para serem simultaneamente escritos vários 
exemplares por diferentes notários”. 
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
23
Castro (1991) não descarta a hipótese de Costa (1979), mas, considerando 
uma série de diferenças radicais entre os dois textos, defende que derivam de 
uma tradução a partir de um original em latim ou a partir de um original escrito 
no vernáculo então falado na capital do Reino (Coimbra). Algumas das diferenças 
destacadas por Castro (1991, p. 194-196) são as seguintes:
a) Variação na ordem das palavras:
(linha 2) B meu reino e me(us) uassalos
T meus uassalos e meu reino
(linha 9) B todas mias devidas
T mias deuidas todas
(linha 21) B out(ras) cousas
T cousas outras;
b) Variação entre vocábulos e sua ausência:
(linha 6 ) B do arcebispo de Santiago
T do de Santiago
(linha 8) B se a raina morrer
T se a reina dona Vrr(aca) morrer
(linha 8) B Da out(ra) meiadade
T Da outra mia meiadade
(linha 8) B fazã desta guisa
T facan ende desta guisa
(linha 12) B no dia
T en dia
(linha 12) B ssi eu en
T se en
(linha 13) B en’os out(ro)s logares
T en outros logares
(linha 18) B q(ue) os de ... aq(ue)stes
T q(ue) os de ... a aq(ue)stes
(linha 18) B todos nõ poderem
T nõ pode(er)en
(linha 24) L mãdo aq(ue)les
B mãdo a aq(ue)les
(linha 25) B come outra
T como a outra
(linha 26) B facer guarda
T faco eu aguardar;
c) Variação entre vocábulos:
(linha 7) B como uirẽ por derecto
T como uiren por guisado
(linha 8) B aq(ue)stas
T estas
(linha 16) B e dito
T e nomeado
(linha 17) B se alguus de me(us) flios ouuerẽ
T se alguno de meus flios ouuer
(linha 20) B no meu logar
T no meu logo
(linha 26) B nouea
T nona
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
24
Em relação às preferências pessoais de um e outro copista, certas variações 
de formas linguísticas atestam a existência de dialetos significativamente 
diferentes, tão diferentes entre si quanto o galego, o português, o espanhol e 
o catalão. É interessante observar que Braga se encontra no extremo norte do 
território português, na divisa com a Galícia, próxima de Guimarães e ao Porto, e 
Toledo fica no centro do território, entre Coimbra e Lisboa. 
Pouco tempo antes do momento em que é escrito o Testamento, a capital 
tinha sido transferida de Guimarães para Coimbra. Significou a independência 
política de Portugal e também a independência linguística em relação ao galego-
português. Podemos inferir que a cópia destinada para Braga é escrita em um 
dialeto mais próximo do galego-português do que a cópia destinada para Toledo, 
fato que ilustra a promoção da estratificação linguística de uma língua, com 
variedades e variantes linguísticas emergindo no processo tradutório.
De um modo geral, a língua da cópia destinada para Toledo é muito mais 
próxima do atual português brasileiro do que a língua da cópia destinada para 
Braga, seja em aspectos fonético-fonológicos, morfológicos, sintáticos, lexicais e 
semânticos, seja em aspectos discursivos. 
Análises aprofundadas das diferenças podem ser encontradas não apenas 
em Avelino de Jesus da Costa (1979) e Ivo Castro (1991), mas também em Edwin 
Willians ([1938] 1975), Joseph Huber ([1933] 1986), Ana Maria Martins (1985), 
Anthony Naro ([1971]1973) e Joseph Maria Piel (1942). 
A partir das análises, o que podemos afirmar é que, em relação às cópias 
feitas a partir de um ditado, a partir de um original latino, ou partir de um esboço 
escrito em um dialeto vernáculo (provavelmente de Coimbra), estamos diante 
de um caso de tradução deliberada pelo copista-tradutor. Cada um dos copistas-
tradutores evidentemente sabia que o público-alvo da sua cópia falava uma 
língua distinta e respeitou as particularidades dessa língua.
3 TRADUÇÃO INTERLINGUAL
Como já definimos brevemente, a tradução interlingual envolve dois 
códigos: a língua de partida e a língua de chegada, também chamadas de língua-
fonte e língua-alvo. Trata-se do conceito mais comum de tradução que o senso 
comum manipula no cotidiano. 
Ao conceituar tal tipo de operação, Jakobson (1969, p. 64) observa que “no 
nível da tradução interlingual, não há comumente equivalência completa entre as 
unidades de código”. Ao traduzir de uma língua para outra, o foco da atividade recai 
sobre a mensagem e não sobre suas partes constituintes. Nas palavras do autor:
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
25
[...] ao traduzir de uma língua para outra, substituem-se mensagens 
em uma das línguas, não por unidades de códigos separadas, mas 
por mensagens inteiras de outra língua. Tal tradução é uma forma de 
discurso indireto: o tradutor recodifica e transmite uma mensagem 
recebida de outra fonte. Assim, a tradução envolve duas mensagens 
equivalentes em dois códigos diferentes (JAKOBSON, 1969, p. 64). 
Já ressaltamos a importância da tradução em muitos âmbitos da experiência 
humana, no entanto, não é exagero acrescentar que a difusão do conhecimento 
e das instituições em geral não teria atingido níveis globais de expansão sem o 
recurso à tradução. 
Guerini e Costa (2006, p. 11) aludem ao fato quando consideram que “com 
frequência, não avaliamos bem sua importância. Na prática, [porém], a própria 
existência da civilização humana em escala mundial depende muito da tradução 
contínua dos diferentes tipos de texto [técnicos, literários, esportivos, religiosos, 
políticos]”. Trazendo a discussão para questões mais contemporâneas, os autores 
ainda apresentam um dado surpreendente:
No Brasil, por exemplo, calcula-se que a tradução interlingual 
representa cerca de 60 a 80% dos textos publicados e que 75% do saber 
científico e tecnológico provém das traduções, alimentando vários 
setores da vida nacional. Sem a tradução, muitos setores simplesmente 
não funcionariam, por exemplo, o de softwares, medicamentos, 
automobilístico etc (GUERINI; COSTA, 2006, p. 11).
No Tópico 1 da unidade, discutimos a importância dada à atividade na 
antiguidade clássica, especialmente entre os romanos. Os escritores Cícero (106 
a.C - 43 a.C) e Horácio (65 a.C - 8 a.C) foram os primeiros a discutir a distinção 
entre “tradução literal” e “tradução do sentido”. Considerando que, como já 
discutimos, a tradução para aquela cultura era entendida como recriação, ambos 
advogavam em favor da tradução do sentido, em detrimento de verter palavra 
por palavra. Bassnett (2003, p. 81) relembra que 
As posições de Cícero e Horácio sobre tradução tiveram grande 
influência em gerações sucessivas de tradutores e ambos entendem a 
tradução dentro do contexto alargado das duas funções principais do 
poeta: o dever humano universal de adquirir e disseminar a sabedoria, 
e a arte especial de fazer e dar forma ao poema.
Podemos pontuar pelo menos dois grandes momentos da tradução 
interlingual na história: aquele que nasce entre os romanos e é retomado mais 
tarde pelo moderno, que imprime uma abordagem científica sobre a tradução 
com vista aos textos literários, passando a admitir uma rica diversidade na 
translação entre línguas; e aquele que se instala nos tempos medievais, quando 
as intermináveis disputas sobre a tradução de textos religiosos focavam a 
preservação da palavra original.
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
26
3.1 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL RELIGIOSA E O FOCO
NO TEXTO DE PARTIDA
Como avaliam Guerini e Costa (2006, p. 12):
Se a ênfase de Cícero e Horácio era no texto de chegada para o 
enriquecimento da língua e da literatura latina, com a tradução da 
Bíblia, por exemplo, temos uma mudança de foco e a preocupação era 
com o texto de partida, pois o objetivo era o de “espalhar a palavra de 
Deus” e estar o mais próximo possível da palavra divina. 
Procurando semear suas doutrinas sem perverter os sentidos originais, as 
religiões sempre tiveram a tradução como atividade essencial para a sua disseminação 
entre os povos. As principais religiões do mundo, dentre elas o cristianismo, o 
islamismo, o hinduísmo e a religião tradicional chinesa, em certa medida, podem 
creditar o seu sucesso às contínuas traduções de seus textos doutrinários.
A saga da história tradutória da Bíblia, por exemplo, começa no século 
3 a.C., quando o Antigo Testamento foi vertido do hebraico para o grego, em 
um projeto coletivo que envolveu mais de 70 tradutores de 12 tribos judaicas. A 
edição ficou conhecida como Septuaginta (ou versão dos setenta). 
Mais tarde, a Septuaginta seria transvertida para o copta (língua dos 
cristãos egípcios), o etíope e o gótico. Todas as traduções foram marcadas 
por uma preocupação explícita de manter a essência do texto original judaico 
a despeito das demais línguas destinadas e suas respectivas culturas (uma 
evidente falta de equilíbrio na negociação). No entanto, na translação ao latim, 
a postura começa a mudar.
Em latim, a Bíblia passou por pelo menos duas traduções. A primeira 
delas foi feita de forma fragmentária e coletiva, e reflete variedades do latim 
vernacular. Trata-se da Vetus Latina, também conhecida como a Bíblia dos Pais 
da Igreja, versão que se associa à doutrina patrística. A segunda delas, a mais 
famosa de todas, é atribuída ao São Jerônimo e ficou conhecida como Vulgata, 
acabada por volta de 1400 d.C.
A Vulgata viria a ser, a partir de então, o texto basilar para todas as 
demais traduções que se fariam posteriormente. E não foram poucas: “se em 1450 
existiam já 33 diferentes traduções, e em 1800 o número tinha saltado para 71, 
no final do século XX havia edições integrais em mais de 250 línguas e edições 
parciais em cerca de 1.300 outras línguas” (GUERINI; COSTA, 2006, p. 13).
A disputa sobre a melhor forma de traduzir a palavra sagrada naturalmente 
avivou a controvérsia entre tradução literal e tradução livre.
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
27
Enquanto que, historicamente, defendia-se que a Bíblia deveria ficar sempre 
próxima das raízes hebraicas (porque seriam contíguas à palavra de Deus), São Jerônimo, 
especialmente na tradução do Novo Testamento, afirmou ter preferido o sentido à palavra. 
Significou uma guinada em direção a uma maior atenção ao texto de chegada, algo que 
vinha sendo preterido na história das traduções do cristianismo.
IMPORTANT
E
Guerini e Costa (2006) também salientam que, na Umbanda, São Jerônimo 
é o sincretismo de Xangô, deus associado às leis e à sabedoria, o que sugere uma 
interpretação da tradução como instrumento de acesso ao saber.
São Jerônimo foi um dos primeiros a se preocupar com os surdos ao afirmar, 
em um comentário na Epístola de Paulo aos Gálatas (I, 3), que “os surdos podem aprender 
o Evangelho através dos sinais”. É o primeiro documento que cita os sinais como meio para 
a instrução dos surdos.
NOTA
Ao lado da Vulgata, a versão de Lutero (publicada em 1534) é outra 
tradução bíblica que abalou os paradigmas medievais e merece uma consideração 
especial. Entretanto, não ignoramos que, não apenas o texto de Lutero, mas toda 
tradução da Bíblia para outras línguas teve um valor político e cultural singular, 
especialmente no Ocidente: 
O Ocidente dedicou muita atenção às traduções, pois o seu texto central, 
a Bíblia, foi escrito em uma língua que não podia ser compreendida 
prontamente e, por isso, [os estados teocráticos] foram obrigados a 
confiar nos tradutores para legitimar seu poder (LEFEVERE, 2003, p. 3). 
Seriam dignas de atenção, por exemplo, a tradução para francês, publicada 
em 1528 por Jacques Lefevre d’Étaples (ou Faber Stapulensis); a tradução para o 
espanhol, publicada na Basileia em 1569 por Casiodoro de Reina (Biblia del Oso); 
a tradução para o tcheco, publicada em Kralice entre 1579-1593; a tradução para o 
inglês, conhecida como Bíblia do Rei James, publicada em 1611; e a tradução para 
o holandês, conhecida como The States Bible, publicada em 1637. 
UNIDADE 1 | ESTUDOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO EM LÍNGUA DE SINAIS
28
Todas as traduções, guardadas as devidas proporções, causaram muito 
impacto cultural e linguístico em seus países. Entretanto, a tradução de Lutero para 
o alemão merece algum destaque particular, principalmente pelas declarações e 
explicações que ele deixou a respeito das suas escolhas.
Em uma das anotações feitas por seus alunos e colaboradores durante 
encontros informais (as chamadas “Conversas à mesa”), Martinho Lutero (1532 
apud FURLAN, 2004, p. 13) afirma que “a verdadeira tradução é a adaptação do 
que foi dito em uma língua estrangeira à própria língua”. Ocorre que a “própria 
língua” de Lutero não estava bem consolidada quando ele se propôs a traduzir a 
Bíblia. Naquela época, o que hoje conhecemos como alto-alemão era um conjunto 
de dialetos distintos, nem sempre compreensíveis entre si. 
Ciente da importância política e religiosa de unificar a língua, Lutero se 
comprometeu a compor um alemão standart a partir daqueles dialetos existentes, 
a fim de que o povo pudesse se identificar com aquela língua e, por tabela, com 
aquela Bíblia. Assim, na sua “Carta Aberta sobre a Tradução”, publicada em 1530, 
ao criticar traduções anteriores, decalcadas do latim, Lutero afirma:
Assim, quando Cristo fala: Ex abundantia cordis os loquitur. Se eu 
fosse seguir esses asnos, eles me apresentariam a letra e traduziriam 
assim: Aus dem Überfuss des Herzens redet der Mund [Da abundância 
do coração fala a boca]. Diga-me: isso é falar alemão? Que alemão 
entenderia uma coisa dessas? Que coisa é abundância do coração? 
Nenhum alemão poderia dizer isso, a não ser que quisesse dizer que 
alguém tem um coração demasiado grande ou tem coração demais; 
embora isto também não seja correto. Pois, abundância do coração não 
é alemão, assim como não é alemão abundância da casa, abundância da 
estufa, abundância do banco, porém assim fala a mãe em casa e o homem 
comum: We das Herz voll ist, des gehet der Mund über [A boca fala daquilo 
de que o coração está cheio]. Isto é falar um bom alemão, pelo que eu 
me esforcei, e infelizmente nem sempre consegui ou o encontrei. Pois 
as letras latinas dificultam muito a formulação para se falar em bom 
alemão (LUTERO, [1530] 2006, p. 105).
As declarações e explicações de Lutero sobre as suas opções tradutórias 
são repletas de comentários do tipo, marcados por um humor ácido. Interessa 
ressaltar que, do projeto de tradução de Lutero, sobressai uma evidente 
insinuação: de modo semelhante a Jerônimo, Lutero indica uma mudança de 
foco, que se desloca do texto de partida para o texto de chegada. A alternância de 
foco promovida pelos dois tradutores ventilou as concepções sobre tradução no 
Ocidente e gerou efeitos principalmente no âmbito da tradução literária, como 
veremos a seguir.
TÓPICO 2 | TIPOS DE TRADUÇÃO
29
3.2 A TRADUÇÃO INTERLINGUAL LITERÁRIA E O FOCO NO 
TEXTO DE CHEGADA
Até o século XIX, a literatura monopolizou um espaço na sociedade que 
acumulava as funções de árbitro de costumes, veículo do conhecimento e meio 
de entretenimento. Assim, a tradução literária foi até então um tópico de amplo 
debate teórico e, consequentemente, um campo de muita experimentação. Todo 
o movimento de inflexão, crítica, experimentação e reflexão sobre a tradução, 
iniciado no embalo das revoluções modernas, deixou um vasto

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