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Organizadores Thiago do Vale Machado Cinara Carneiro Neves 2023 Organizadores Thiago do Vale Machado Cinara Carneiro Neves ORGANIZADORES Thiago do Vale Machado Médico Médico intensivista pediátrico. Mestre em Saúde da Criança e Adolescente pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Especialista em Cuidados Paliativos Pediátricos pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês, em Cuidados Paliativos no Instituto Pallium - Argentina. Médico da equipe de Cuidados Paliativos Pediátricos do Hospital Infantil Albert Sabin (CPP-HIAS). Cinara Carneiro Neves Médica intensivista pediátrica. Mestre em Saúde da Criança e do Ado- lescente pela Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Cuidado Paliativo Pediátrico pelo Hospital Sírio Libanês. Coordena- dora da Comissão de Cuidados Paliativos Pediátrico do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), da Unidade de Cuidados Prolongados do HIAS e da Unidade de Tratamento Especial do Hospital Infantil SOPAI. Supervi- sora da Residência Medica de Pediatria da Escola de Saúde Pública do Estado Ceará (ESP-CE). Membro do Comitê de Dor e Cuidado Paliativo da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e do Comitê de Bioética da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Cuidados paliativos pediátricos Todos os direitos reservados Editoração: João Joaquim Freitas do Amaral Imagem da capa: Naiana Maria Leite Mesquita Projeto Gráfico: Maherle - maherle@gmail.com Cuidados paliativos pediátricos Todos os direitos reservados Editoração: João Joaquim Freitas do Amaral Imagem da capa: Naiana Maria Leite Mesquita Projeto Gráfico: Maherle - maherle@gmail.com Ficha catalográfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Cuidados paliativos pediátricos / organização Thiago do Vale Machado, Cinara Carneiro Neves. -- Campestre de Goiás, GO : Gráfica e Editora Aliança, 2023. Vários autores. Bibliografia. ISBN 978-65-997210-1-4 1. Cuidados paliativos 2. Cuidados paliativos em pediatria 3. Pediatria I. Machado, Thiago do Vale. II. Neves, Cinara Carneiro. 23-165365 CDD-616.029 Índices para catálogo sistemático: 1. Cuidados paliativos : Ciências médicas 616.029 Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129 Cuidados Paliativos Pediátricos_07 junho 2023.indd 8Cuidados Paliativos Pediátricos_07 junho 2023.indd 8 01/08/2023 17:28:4901/08/2023 17:28:49 AUTORES Alexsandro Santos Pereira Enfermeiro. Ex-membro da Comissão de Cuidados Paliativos Pediátricos do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Enfermeiro da equipe de Cuidados Paliativos do Grupo Oto/Kora Saúde. Ana Valeska Siebra e Silva Enfermeira. Doutora em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Saúde Pública pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Professora do programa de Mestrado Acadêmico em Cuidados Clínicos da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Mestrado Profissional em Saúde da Criança e do Adolescente da UECE. Coordenadora do Time de Acesso Vascular (TAV) do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Cuidados paliativos pediátricos Todos os direitos reservados Editoração: João Joaquim Freitas do Amaral Imagem da capa: Naiana Maria Leite Mesquita Projeto Gráfico: Maherle - maherle@gmail.com Ficha catalográfica Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Cuidados paliativos pediátricos / organização Thiago do Vale Machado, Cinara Carneiro Neves. -- Campestre de Goiás, GO : Gráfica e Editora Aliança, 2023. Vários autores. Bibliografia. ISBN 978-65-997210-1-4 1. Cuidados paliativos 2. Cuidados paliativos em pediatria 3. Pediatria I. Machado, Thiago do Vale. II. Neves, Cinara Carneiro. 23-165365 CDD-616.029 Índices para catálogo sistemático: 1. Cuidados paliativos : Ciências médicas 616.029 Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129 Cuidados Paliativos Pediátricos_07 junho 2023.indd 8Cuidados Paliativos Pediátricos_07 junho 2023.indd 8 01/08/2023 17:28:4901/08/2023 17:28:49 Anna Kelly Krislane de Vasconcelos Pedrosa Médica. Especialista em Cuidados Paliativos pela Universidade de Fortaleza (Unifor) e em Preceptoria Médica pelo PROADI-SUS/Oswaldo Cruz. Médica paliativista pediátrica do- Sistema Hapvida Fortaleza. Supervisora da Residência Medica de Pediatria Geral do Hospital Infantil Albert Sabin/ESP. Preceptora da Residência Médica em Pediatria Geral do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Benedita Beatriz Elias Dias Assistente Social. Especialista em Pediatria pela Escola de Saúde Pública do Ceará/Hospital Infantil Albert Sabin (ESP-CE/HIAS). Especialista em Gestão das Políticas Sociais pela Faculdade UniBF. Assistente Social da Comissão de Cuidados Paliativos Pediátricos do HIAS. Bruna Cunha de Alcântara Matos Médica oncologista pediátrica. Coordenadora médica do Serviço Paliativo Oncológico do Centro Pediátrico do Câncer do Hospital Infantil Albert Sabin (CPC-HIAS). Coordenadora médica do Serviço Paliativo Pediátrico do Hospital infantil Luís de França. César Augusto Ferreira Gomes de Andrade Médico intensivista pediátrico. Mestre em Saúde da Criança e Adolescente pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Especialista em Bioética e Cuidados Paliativos pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Médico da Comissão de Cuidados Paliativos Pediátricos do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Cinara Carneiro Neves Médica intensivista pediátrica. Mestre em Saúde da Criança e do Ado- lescente pela Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em Cuidado Paliativo Pediátrico pelo Hospital Sírio Libanês. Coordena- dora da Comissão de Cuidados Paliativos Pediátrico do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), da Unidade de Cuidados Prolongados do HIAS e da Unidade de Tratamento Especial do Hospital Infantil SOPAI. Supervi- sora da Residência Medica de Pediatria da Escola de Saúde Pública do Estado Ceará (ESP-CE). Membro do Comitê de Dor e Cuidado Paliativo da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e do Comitê de Bioética da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Clara Monte Arruda Psicóloga hospitalar. Especialista em Pediatria pela Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE) e em Neuropsicologia pelo Centro Universitário Christus (Unichristus). Psicóloga do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Cristiane Rodrigues de Sousa Pediatra. Mestre em Saúde da Criança e Adolescente pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Docente do Curso de Medicina da Universidade de Fortaleza (Unifor). Coordenadora médica do Programa de Assistência Ventilatória Domiciliar do Hospital Infantil Albert Sabin (PAVD-HIAS). Fernanda Gomes Lopes Psicóloga. Doutoranda em Ética, Bioética e Saúde Coletiva pela Fiocruz. Mestre em Cuidados Continuados e Paliativos pela Universidade de Coimbra. Especialista em Cancerologia pela Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE), em Psicologia Hospitalar, Psicologia da Saúde e Oncologia pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP). Psicóloga do Centro Pediátrico do Câncer do Hospital Infantil Albert Sabin (CPC- HIAS). Flávia Dias Silveira Nefrologista pediátrica. Gerente da Unimed Lar e da Unimed Urgente. ex-coordenadora do Programa de Assistência Domiciliar ert Sabin (HIAS). Isabel Regiane Cardoso do Nascimento Psicóloga. Doutoranda e Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Docente da UECE e da Faculdade Ari de Sá. Especialista em Cancerologia na modalidade de Residência Multiprofissional pela Escola de Saúde Pública do Ceará/Instituto do Câncer do Ceará (ESP-CE/ICC). Jamile Silva de Oliveira Castro Queiroz Assistente Social. Especialista em Infectologia na modalidade de Residência Multiprofissional pela Escola de Saúde Pública do Ceará/Hospital São José (ESP-CE/HSJ). Preceptora da Residência Multiprofissional do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Coordenadora da Ouvidoria HIAS SUB-REDE SESA. Jamille Fernandes Carneiro Pediatra Geral. Médicado Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Larissa Loiola Batista Assistente social. Mestre em Avaliação de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Especialista em Pediatria pela Residência Multiprofissional do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Coordenadora da Residência Multiprofissional em Pediatria do HIAS. Maria Juliana Vieira Lima Psicóloga. Mestre em Psicologia pela Universidade Fortaleza (UFC). Especialista em Pediatria Escola de Saúde Pública do Ceará / Hospital Infantil Albert Sabin (ESP-CE/HIAS), em Psicologia da Saúde pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP) e em Cuidados Paliativos Multiprofissionais pela Faculdade Farias Brito/Escutha (FFB/Escutha). Maria Líllian Maia Fernandes Enfermeira. Mestre em Fibrose Cística pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Especialista em Cuidados Paliativos, Auditoria em Enfermagem, Obstetrícia e Enfermagem do Trabalho. Enfermeira paliativista do Hospital Sopai, da Comissão de Controle e Infecção Hospitalar (CCIH) e Emergência do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Marta Maria Sampaio Serrano Médica pediatra. Ex-coordenadora da Unidade de Pacientes Especiais do Hospital Infantil Albert Sabin (UPE-HIAS). Natasha Simões Montenegro Mello Médica. Residente de Pediatria pela Unimed. Médica emergencista pediátrica da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Praia do Futuro. Plantonista da Emergência e Enfermaria Pediátrica no do Hospital Unimed Sul (HUS). Plantonista da Emergência Pediátrica do Hospital Otoclínica/Otosul. Thiago do Vale Machado Médico intensivista pediátrico. Mestre em Saúde da Criança e Adolescente pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Especialista em Cuidados Paliativos Pediátricos pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês, em Cuidados Paliativos no Instituto Pallium - Argentina. Médico da equipe de cuidados Paliativos Pediátricos do Hospital Infantil Albert Sabin (CPP-HIAS). Vanilla Oliveira Alencar Psicóloga hospitalar. Especialista em Pediatria pela Escola de Saúde Pública do Ceará do Ceará (ESP-CE), em Cuidados Paliativos Multiprofissionais pela Faculdade Farias Brito/Escutha (FFB/Escutha). Psicóloga do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) e do Hospital Otoclinica Aldeota. Prefácio “A morte deveria ser assim: um céu que pouco a pouco anoiteces- se e a gente nem soubesse que era o fim…” Como dizia Mário Quinta- na, bem que a morte poderia chegar repentina, sem sofrimento, sem ansiedades, sem omissões, sem exageros, sem traumas, sem dor. No entanto, quando cuidamos de crianças com doenças crônicas e amea- çadoras à vida, temos que encarar nossas próprias angústias e assistir ativamente, nas dimensões de seu corpo, mente e espírito, bem como ao suporte oferecido à sua família. O objetivo dos Cuidados Paliativos é garantir, tanto quanto pos- sível, o conforto e o bem-estar da criança e da família, mesmo que a criança tenha uma condição que não possa ser curada e que, em última instância, resulte em um fim prematuro de sua vida. Seu objetivo não é apressar ou retardar a morte, mas melhorar a qualidade de vida expe- rienciada pela criança e pela família durante o processo de morte. Para a organização desse livro, somou-se a experiência de mais de 5 anos do serviço de Cuidados Paliativos pediátricos no Hospital In- fantil Albert Sabin (HIAS) e quase 10 anos no Centro Pediátrico do Cân- cer (CPC). Estão reunidos profissionais de diversas áreas que durante sua integração com a equipe de cuidados paliativos engajaram-se ati- vamente nesse cuidado. Tem sido um privilégio trabalhar ao lado de tantos que escolhe- ram aplicar suas habilidades profissionais e pessoais para acompanhar as famílias nos piores momentos de suas vidas. Neste contexto, o pre- sente livro foi elaborado, tendo em vista que o aumento na demanda por cuidados paliativos representa um avanço e uma oportunidade de educação continuada. Ressaltamos que a formação de uma equipe pa- recerista foi essencial no vínculo com a equipe assistencial, onde expe- riências e conhecimentos vêm sendo semeados e contribuindo para a formação paliativista de novos profissionais. Os quatro primeiros capítulos trazem o conceito e os princípios dos Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP), as preocupações bioéticas e morais no contexto paliativista, além da história, formação e apre- sentação da equipe de CPP no HIAS e no CPC. Adiante, apresenta-se o processo de trabalho dos cuidados paliativos (conferência familiar, plano de cuidados e controle de sintomas) e posteriormente a organi- zação e funcionalidade da equipe multiprofissional. Em seguida, estão contemplados a organização dos serviços de assistência domiciliar (PAD e PAVD), os quais solidificam a continuidade do cuidado. Por fim, o capítulo de Cuidados de Final de Vida ampara os profissionais numa melhor assistência nas últimas horas. Infelizmente, ainda não conseguimos prever o tempo, muito me- nos evitar a morte. Em referência a nossa precursora Cicely Saunders, continuaremos cuidando: “continuaremos nos importando pelo fato de você ser você até o último momento de sua vida e, faremos tudo que estiver ao nosso alcance, não somente para ajudá-lo a morrer em paz, mas também para você viver até o dia de sua morte. ” Dr. Thiago do Vale Machado 1 Conceitos e princípios de Cuidados Paliativos Pediátricos ..............................................................19 Cinara Carneiro Neves Anna Kelly Krislane de Vasconcelos Pedrosa 2 Bioética em Cuidados Paliativos Pediátricos ..........................24 Cinara Carneiro Neves Thiago do Vale Machado 3 Cuidados Paliativos Pediátricos do HIAS.................................29 Alexsandro Santos Pereira César Augusto Ferreira Gomes de Andrade Isabel Regiane Cardoso do Nascimento Jamile Silva de Oliveira Castro Queiroz 4 Cuidados Paliativos no Centro Pediátrico do Câncer ...............45 Bruna Cunha de Alcantara Matos 5 A Conferência Familiar ........................................................... 58 Larissa Loiola Batista Maria Juliana Vieira Lima Fernanda Gomes Lopes 6 Plano de Cuidados .................................................................. 66 Thiago do Vale Machado Maria Líllian Maia Fernandes 7 Controle de Sintomas ..............................................................71 Thiago do Vale Machado Ana Valeska Siebra e Silva Sumário 8 A Atuação em equipe nos Cuidados Paliativos Pediátricos ............................................. 87 Larissa Loiola Batista Maria Juliana Vieira Lima Fernanda Gomes Lopes Maria Líllian Maia Fernandes 9 Aspectos Psicológicos nos Cuidados Paliativos Pediátricos ..............................................91 Maria Juliana Vieira Lima Vanilla Oliveira Alencar Clara Monte Arruda 10 Aspectos sociais em Cuidados Paliativos Pediátricos ........................................... 100 Larissa Loiola Batista Benedita Beatriz Elias Dias Jamile Silva de Oliveira Castro Queiroz 11 Desospitalização pelo PAD ....................................................103 Flávia Dias Silveira Natasha Simões Montenegro Mello 12 Desospitalização pelo PAVD .................................................. 110 Cristiane Rodrigues de Sousa Jamille Fernandes Carneiro Marta Maria Sampaio Serrano 13 Terminalidade em Cuidados Paliativos Pediátricos ................ 117 Bruna Alcântara Thiago do Vale Machado 19Cuidados Paliativos Pediátricos Conceitos e princípios de Cuidados Paliativos Pediátricos1 Cinara Carneiro Neves Anna Kelly Krislane de Vasconcelos Pedrosa O conceito de Cuidados Paliativos foi atualizado no decorrer dos anos, mas mantendo seu sentido primário: aliviar e cuidar. O termo pa- liativo advém do verbo paliar, do latim palliare (cobrir com um manto) e de palliatus (aliviar sem chegar a curar) cujo significado seria aliviar, atenuar.1,2 Assim, esta prática médica nos remete ao texto de Hipócra- tes3, que pode ser assim traduzido: “Quanto à medicina, tal como eu a concebo, pensoque o seu ob- jetivo, em termos gerais, é o de afastar os sofrimentos do doente e di- minuir a violência das suas doenças, abstendo-se de tratar os doentes graves para os quais a medicina não dispõe de recursos”. Desse modo, salienta-se a importância de aliviar os sofrimentos do paciente e diminuir a intensidade com a qual a doença o agride. Nes- te ínterim, compreende-se que cuidados paliativos abrange o exercício do cuidado ampliado do paciente e de sua família, envolvendo corpo, mente e espírito, visando qualidade de vida durante o todo o processo, da doença ao luto e não apenas durante a terminalidade.4-6 Conforme definição mais atual da OMS (2018).2,6 “Cuidados Paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus familiares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento de pacientes adultos e pe- 20 Cuidados Paliativos Pediátricos diátricos e suas famílias que enfrentam problemas associados a doen- ças potencialmente fatais, incluindo o sofrimento físico, psicológico, social e espiritual dos pacientes e de seus familiares”. Assim, é considerado elegível para tais cuidados ampliados todo paciente portador de doença ameaçadora da vida, estando ou não em estágio de fim de vida.7 A Sociedade Brasileira de Pediatria - SBP (2021) confirmando o que fora anteriormente publicado pela OMS, organizou em seis grupos as crianças com perfil para tais cuidados (Quadro 1).1,2 21Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 1 - Grupos de situações envolvidas elegíveis a Cuidados Paliativos. Grupos Situações Envolvidas Exemplos de doenças e condições Grupo 1 Crianças com condições agudas de risco de vida, das quais a recuperação pode ou não ser possível Qualquer doença ou lesão crítica, desnutrição grave Grupo 2 Crianças com condições crônicas de risco de vida que podem ser curadas ou controladas por um longo período, mas que também podem morrer Malignidade, tuberculose multirresistente, HIV / AIDS Grupo 3 Crianças com condições progressivas de risco de vida para as quais não há tratamento curativo disponível Atrofia Muscular Espinhal, Distrofia Muscular de Duchenne Grupo 4 Crianças com condições neurológicas graves que não são progressivas, mas podem causar deterioração e morte Encefalopatia estática, tetraplegia espástica, espinha bífida Grupo 5 Recém-nascido que são gravemente prematuros ou têm anomalias congênitas graves Prematuridade grave, anencefalia, hérnia diafragmática congênita, trissomia do 13 ou 18 Grupo 6 Membros da família de um feto ou criança que morre inesperadamente Morte fetal, encefalopatia hipóxico-isquêmica, sepse avassaladora em criança previamente saudável, trauma por acidente de veículo motorizado, queimaduras, etc. Fonte: Cuidados Paliativos Pediátricos: O que são e qual sua importância? Cuidando da criança em todos os momentos. SBP, 2021¹ 22 Cuidados Paliativos Pediátricos Os princípios norteadores do cuidado paliativo estão muito bem definidos e foram adaptados para a população pediátrica, uma vez que está claro que não se pode extrapolar para o paciente pediátrico todos os conceitos e estratégias utilizadas em adultos. A SBP então organi- zou tais princípios em 20211,6: 1. Os cuidados devem ser dirigidos à criança ou adolescente, orien- tados para a família e baseados na parceria. 2. Devem ser dirigidos para o alívio dos sintomas e para a melhora da qualidade de vida. 3. São elegíveis todas as crianças ou adolescentes que sofram de doenças crônicas, terminais ou que ameacem a sobrevida. 4. Devem ser adequados à criança e/ou à sua família de forma inte- grada. 5. Ter uma proposta terapêutica curativa não se contrapõe à intro- dução de cuidados paliativos. 6. Os cuidados paliativos não se destinam a abreviar a etapa final de vida. 7. Podem ser coordenados em qualquer local (hospital, hospice, do- micílio etc.). 8. Devem ser consistentes com crenças e valores da criança ou ado- lescente e de seus familiares. 9. A abordagem por grupo multidisciplinar é encorajada. 10. A participação dos pacientes e dos familiares nas tomadas de de- cisão é obrigatória. 11. A assistência ao paciente e à sua família deve estar disponível du- rante todo o tempo necessário. 12. Determinações expressas de “não ressuscitar” não são necessá- rias. 13. Não se faz necessário que a expectativa de sobrevida seja breve. 23Cuidados Paliativos Pediátricos REFERÊNCIAS 1. Departamento Científico de Medicina da Dor e Cuidados Paliati- vos. Cuidados Paliativos Pediátricos: O que são e qual sua impor- tância? Cuidando da criança em todos os momentos. Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021;1:1-9. 2. World Health Organization. Integrating palliative care and symp- tom reliefinto paediatrics: a WHO guide for healthcare planners, implementers and managers. Geneva: World Health Organization; 2018. Licence: CC BY-NC-SA 3.0 IGO. 3. Hipócrates. The art. Hippocrates. Trad. W. H. S. Jones. (The Loeb Classical Library.) Cambridge, Havard University Press, 1972; II:193. 4. Pinho AAA et al. Repercussões dos cuidados paliativos pediátri- cos: revisão integrativa. Rev. Bioética [online]. 2020 [Acessado 23 Novembro 2021]; 28(4):710-717. Disponível em: https://doi. org/10.1590/1983-80422020284435 5. Piva JP, Garcia PCR, Lago PM. Dilemas e dificuldades envolven- do decisões de final de vida e oferta de cuidados paliativos em pediatria. Rev. Bras. de Terapia Intensiva [online]. 2011 [Acessa- do 23 Novembro 2021]; 23(1):78-86. Disponível em: https://doi. org/10.1590/S0103-507X2011000100013 6. Iglesias SBO, Zollner ACR, Constantino CF. Cuidados paliativos pe- diátricos. Resid Pediatr. 2016;6(0 Supl.1):46-54. 7. Ministério da Saúde. Manual de Cuidados Paliativos. Coord. D’Alessandro MPS, Pires CT, Forte DN et al. São Paulo: Hospital Sí- rio Libanês; 2020. 175p. 24 Cuidados Paliativos Pediátricos Bioética em Cuidados Paliativos Pediátricos Cinara Carneiro Neves Thiago do Vale Machado INTRODUÇÃO Em pacientes criticamente doentes, o intenso desenvolvimento tecnológico no processo de intervenção médica levou ao aumento da expectativa de vida tal como o aumento da taxa de sobrevida. Diante da presença de uma doença crônica complexa, e em fase de final de vida, o fascínio da tecnologia com inúmeras possibilidades terapêuticas para um investimento técnico podem não ser efetivos e ocasionar mais sofrimento e dor ao paciente e sua família.1 Muitos dilemas éticos podem surgir nesse processo. Isso pode ser decorrente das incertezas científicas em relação à evolução do paciente, da falta de consenso médico e social sobre os padrões éticos no tratamento e a necessidade de adequar recursos técnicos e sociais para atender ao paciente crônico doente.2 A bioética tem como finalidade indicar os limites e as finalidades da intervenção do homem sobre a vida, identificar os valores referencialmente propostos, denunciar os riscos das possíveis aplicações.2,3 2 25Cuidados Paliativos Pediátricos PRINCÍPIOS DA BIOÉTICA Os princípios que norteiam a bioética e são importantes no contexto dos cuidados paliativos pediátricos são: beneficência, não maleficência, justiça e autonomia.3 A beneficência infere que as ações devem ser para o bem e o respeito do outro. Os limites são a dignidade do ser humano e o bem geral da humanidade. Para a não maleficência, a arte médica não deve ser usada para causar males. E todo tratamento deve ser para aliviar ao doente, melhorar o seu bem-estar e se possível, reverter seu estado de saúde.2,4 No âmbito da justiça, os recursos disponíveis devem ser ajustados conforme demanda, oferecendo a cada pessoa o que é necessário, conforme sua necessidade. Os custos do tratamento devem beneficiar somente o paciente e gastos inúteis ou fúteis devem ser evitados.2-4 A autonomia também deve ser respeitada e reforça a capacidade de o paciente fazer suas próprias escolhas.Na pediatria, o poder decisório, em geral, está segurado aos pais e responsáveis. Embora no Brasil, a autonomia esteja designada a partir dos 18 anos, conforme a idade e a capacidade intelectual, o desenvolvimento cognitivo e emocional, a criança ou adolescente muitas vezes em conciliação médica com a família, podem participar e persuadir no processo de tomada de decisões.3,4 OUTROS PRINCÍPIOS Quando o paciente é “incapacitado” para demonstrar seus valores morais e preferências, os pais podem tomar o direito de decisão, deste que a decisão possa sempre buscar o bem. O princípio em questão seria o do melhor interesse. O poder pátrio pode ser removido e o Estado passa a intervir quando pode colocar uma criança em risco significativo 26 Cuidados Paliativos Pediátricos de sérios danos, podendo ser iminente e exigindo medidas imediatas para preveni-lo.4 Quando uma decisão é tomada com a participação da equipe multidisciplinar e da família, podemos inferir o princípio da decisão compartilhada. Nesse processo, devem ser tomadas antes de crises ou emergências, com a elaboração do Plano de Cuidados. Dessa forma, temos o princípio das diretrizes antecipadas de cuidado, em que poderão ser estabelecidas metas e objetivos de cuidados com avaliação conjunta da família respeitando-se o princípio da beneficência e não- maleficência para esse paciente: “Vamos ganhar algum benefício em continuar esse tratamento? Não estamos causando mais prejuízos ou malefícios? Não seria cruel, indigno ou desumano continuar insistindo nesse tratamento? 4 Ademais, temos ainda o princípio do duplo efeito em que uma determinada ação pode ser boa ou neutra (não causa o mau), mas podendo acontecer efeito negativo. Esse princípio pode ser usado para justificar eticamente o uso de sedação paliativa no tratamento de dor ou de sintomas intoleráveis em pacientes de final de vida.4,5 Eutanásia X Distanásia X Ortotanásia A eutanásia é uma ação ou omissão cujo objetivo é provocar ou antecipar a morte, motivada por compaixão. 5,6 No Brasil, é um crime previsto pelo código penal, termos do §1º, do art. 121.4 A distanásia é uma morte lenta às custas de muito sofrimento com prolongamento de vida por meios artificiais e desproporcionais. O ato de fazer distanásia é uma obstinação terapêutica, o que desrespeita à dignidade humane e fere o princípio ético da não-maleficência.2,4,6 Segundo o atual Código de Ética Médica (CFM, 2019) estabelece que é dever ético do médico propiciar os cuidados paliativos aos pacientes, vítimas de doença incurável, indicando que evitará a realização de 27Cuidados Paliativos Pediátricos procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários, evitando a futilidade de tratamentos.6 A ortotanásia é o que objetiva os cuidados paliativos, preservando o direito à morte digna, evitando tratamentos e procedimentos fúteis e o sofrimento injustificado em situações de irreversibilidade. Permitir que a morte aconteça no seu tempo, respeitando o processo de evolução natural da doença.2,4,6 DILEMAS ÉTICOS Todo tipo de tratamento que possa prolongar a vida do paciente crônico precisa ser analisado e considerado o benefício que tal terapia pode ter em relação às preferências da família e da criança. Em situações de irreversibilidade, muitas vezes as famílias en- contram-se desamparadas e o intenso sofrimento pode dificultar a to- mada de decisões. Isso pode ser decorrente de dúvidas em relação ao diagnóstico, prognóstico e tratamento proposto, pelas dificuldades de compreensão clínica do paciente e dificuldades emocionais (estresse, depressão, ansiedade) ou por questões religiosas que possam interfe- rir. 5,7,8 Nesse contexto, almeja-se que algumas situações adversas que possam ocorrer possam ser minimizadas através das diretrizes antecipadas de cuidado, mostrando aos cuidadores como é o processo de evolução da doença e quais dificuldades poderão ser encontradas. Assim, a família terá tempo hábil para definir vantagens e desvantagens de cada possibilidade, além de decisões seguras e éticas que possam ser tomadas de forma compartilhada, minimizando conflitos e permitindo a construção de um melhor plano de cuidados.2,4,5,8 Caso não haja um consenso tais questões podem ser discutidas pelo Comitê de Ética do Hospital, permitindo defender o melhor interesse da criança.2,4 28 Cuidados Paliativos Pediátricos REFERÊNCIAS 1. Lago, P. M. et al. Cuidados de final de vida em crianças: perspectiva no Brasil e no mundo. Jornal de Pediatria, 2007, v. 83, n. 2, 109-116. 2. Barbosa S; Zoboli I; Iglesias, S. Cuidados Paliativos: na prática pediátrica. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019. 3. Silva JS; Jouan CE, Junior PM (org.). Bioética em Pediatria. São Paulo, SP: Memnon, 2021. 4. Rubio AV, Souza JL. Cuidado paliativo: pediátrico e perinatal. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019 5. Macauley R, Hain R. ‘Children are notsmalladults’ - thedistinctivenessofethics in children. In: Goldman A; Hain, R; Liben (ed.). Oxford textbook of palliative care for children. Oxford University press,3ª ed., 2021. 6. CFM-Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica: Resolução CFM nº 2.217, de 27 de setembro de 2018, modificada pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 2019. 7. Piva JP, Garcia PCR, Lago PM. Dilemas e dificuldades envolvendo decisões de final de vida e oferta de cuidados paliativos em pediatria. Revista Brasileira de terapia intensiva, São Paulo, 2011, v. 23, n. 1, 78-86. 8. Carvalho RT, Parsons VER (org.). Manual de Cuidados Paliativos da ANCP. Porto Alegre: Sulina; 2012. 29Cuidados Paliativos Pediátricos Alexsandro Santos Pereira César Augusto Ferreira Gomes de Andrade Isabel Regiane Cardoso do Nascimento Jamile Silva de Oliveira Castro Queiroz Entre os hospitais pediátricos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) do município de Fortaleza-CE, o Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) oferece tratamento em várias especialidades pediátricas e disponibiliza uma estrutura composta por centro de urgência e emergência, enfermarias, unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal, centro cirúrgico destinado a cirurgias eletivas e de urgência, ambulatórios, serviço de atendimento domiciliar, dentre outros. Além de equipe médica especializada, o hospital conta com equipe multiprofissional formada por enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, terapeutas ocupacionais, odontólogos, fisioterapeutas, nutricionistas, farmacêuticos e fonoaudiólogos. A instituição é referência para a região Nordeste no diagnóstico de doenças raras, oferece apoio do ambulatório de genética médica e suporte de tecnologia terciária para melhorar a qualidade de vida de crianças e adolescentes em condições crônicas complexas (CCC), auxiliando na sobrevivência até a idade adulta de muitas crianças com patologias pediátricas raras. Cuidados Paliativos Pediátricos do HIAS 3 30 Cuidados Paliativos Pediátricos Algumas das CCC apresentam-se sem possibilidade de cura e quando chegam à fase avançada, avolumam-se as fragilidades e complexidades de sintomas físicos, vulnerabilidades sociais, emocionais, sofrimento psíquico e questões espirituais nos pacientes e seus familiares. Muitos casos que envolviam tomadas de decisões difíceis, eram discutidos no âmbito do comitê de bioética da instituição, entretanto, considerando o crescente número de pacientes com CCC atendidos no hospital, emergiram muito mais dilemas bioéticos no cotidiano dos profissionais de saúde da instituição. Esse cenário exigia que a intervenção dos profissionais de saúde deveria envolver um diagnóstico precoce e condutas terapêuticas antecipadas, dinâmicas e ativas, respeitando-se os limites do próprio paciente. Frente a essa realidade, foi constatada a necessidade de organizar o serviço de cuidados paliativos no HIAS. Inicialmente, no processo de planejamento do serviço, ocorreram reuniõesda gestão hospitalar com a comissão de bioética, corpo clínico e equipes de saúde do hospital, administração, unidade de epidemiologia e os profissionais com expertise em CPP. Foram pesquisados protocolos e literaturas científicas nacionais e internacionais na área que apontassem a construção do serviço mais adequado ao perfil de pacientes do HIAS. Ao mesmo tempo que se planejava o serviço, existia uma preocupação com a formação e treino dos profissionais que iriam compor o serviço. Esta formação não poderia restringir-se aos aspectos médicos (controle de sintomas), deveria abarcar igualmente as áreas da ética, comunicação e apoio no luto. As reuniões foram importantes para apontar quais os recursos humanos com formação acadêmica e profissional adequadas para compor a equipe que ofereceria os serviços, os materiais e logísticas disponíveis, o perfil de morbidade e mortalidade dos pacientes atendidos no hospital, as unidades hospitalares onde ocorriam predominância de óbitos, quais cuidados eram disponibilizados 31Cuidados Paliativos Pediátricos a família, a modalidade de serviço que melhor se enquadraria na instituição, o investimento financeiro proposto para montar o serviço e os obstáculos e resistências que envolveriam as equipes de saúde para “aceitar” os cuidados paliativos nas unidades hospitalares. A preocupação inicial era que o serviço deveria ser integrado na prestação de cuidados de saúde em parceria com as equipes assistenciais, fosse financeiramente sustentável e apropriado à idade dos pacientes, diagnóstico, cultura e condição socioeconômica das famílias. A partir dessas reflexões, no ano de 2017, o HIAS organizou o seu próprio serviço de Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP). Trata-se de uma equipe multidisciplinar mínima, composta por médico paliativista, enfermeiro, psicóloga e assistente social, acionada conforme a percepção do médico assistente através de solicitação de parecer. O serviço foi instituído pela diretoria hospitalar vigente por meio de portaria administrativa caracterizando o serviço como consultivo e volante, para oferecer retaguarda assistencial e suporte técnico- pedagógico nas diversas unidades de internação do hospital, exceto a unidade de oncopediatria, pois já contavam com uma equipe de cuidados paliativos especializada nas necessidades dos pacientes oncológicos. Foi definido que o plano de cuidado terapêutico seria discutido e elaborado por meio da conferência familiar (abordado no tópico a seguir), uma ferramenta de abordagem sistêmica mais sofisticada de manejo comunicacional e envolvimento com a família. Esse arranjo organizacional permite produzir o cuidado compartilhado com as equipes assistenciais de referência, complementando a atenção às complexas necessidades do paciente e seus familiares. Vale ressaltar que a equipe consultora do serviço de CPP não assume a coordenação dos cuidados, servindo como um grupo de suporte que orienta condutas paliativas. 32 Cuidados Paliativos Pediátricos FORMULÁRIO DA SOLICITAÇÃO DE PARECER E DA CONFERÊNCIA FAMILIAR A equipe dos cuidados paliativos pediátricos recebe solicitação das enfermarias e UTIs para avaliação dos pacientes de várias especialidades médicas. O parecer é solicitado por meio de formulário específico (Anexo 1), que foi elaborado pelo serviço de CPP e validado pelo escritório de gestão da qualidade do hospital. O formulário é diferente do documento disponível para solicitação de parecer das demais especialidades médicas, pois, faz-se necessário incluir informações para melhor manejo de complicações, sintomas estressantes e entendimento relacionado ao momento que o paciente está vivendo e a evolução da doença. Inicialmente, o serviço de CPP pretendia responder às solicitações de parecer num prazo de 48 a 72 horas. Porém, devido à grande demanda do hospital, isso não foi possível. A partir de um processo de constante aprendizado, desde o início da atuação da equipe dos cuidados paliativos pediátricos até os dias atuais, o formulário de solicitação de parecer foi aprimorado. Após ações educativas realizadas com as equipes das unidade, o prazo de devolutiva foi melhor cumprido, pois foram traçados critérios de elegibilidade para admissão nos cuidados paliativos pediátrico: 1) conflito bioético, 2) tratamento de sintomas refratários, 3) vulnerabilidades sociais, 4) cuidados de fim de vida, 5) sofrimento intenso da família e do paciente relacionado ao diagnóstico e ao prognóstico, 6) conflitos intrafamiliares que interfiram na tomada de decisão e 7) limitação terapêutica. Nos casos em que paciente não se enquadre nesses critérios, serão ofertados cuidados paliativos primários e as condutas serão de competência da equipe médica assistente. Em alguns casos, os planos terapêuticos exigem a implementação de programas de transição para outras instituições de cuidados paliativos para adultos. 33Cuidados Paliativos Pediátricos Quando o paciente atender aos requisitos de inclusão supracita- dos, após avaliação e feedback do parecer da equipe médica assistente, a família é abordada e posteriormente agendada uma conferência fami- liar. Neste momento, devem estar presentes membros da equipe assis- tente da unidade onde o paciente está internado, familiares, responsá- veis ou cuidadores do paciente e a multiprofissional de CPP do HIAS. A data para realização da conferência familiar fica dependendo de muitas variáveis, tais como: distância e meio de deslocamento do endereço residencial da família (se é na capital ou cidade do interior do Estado do Ceará), e a disponibilidade dos familiares de participar. Infelizmente, em alguns casos não é possível realizar a conferência. O objetivo dessa conferência é construir um plano de cuidado para o paciente em parceria com a família e a equipe de saúde assis- tente. Para isso, nesse momento, é importante conhecer a estrutura familiar do paciente, aspectos econômicos, religiosos e espirituais, a rede de proteção social disponível, a habilidade da família para cuidar da criança (com ou sem dispositivos médicos) no domicílio, esclarecer dúvidas sobre a patologia, tais como a evolução da doença e o prognós- tico do paciente. PERFIL DOS PACIENTES ATENDIDOS O perfil dos pacientes na pediatria com internações hospitalares, no decorrer dos últimos anos, vem se modificando, sendo cada vez mais frequente a necessidade de assistência a crianças que são diagnosticadas com doenças crônicas e que ameaçam a vida.1 O número global estimado de pacientes pediátricos que necessitam de cuidados paliativos (CP) no final da vida é de quase 1,2 milhão. As doenças congênitas e genéticas são as maiores responsáveis pela indicação deste tipo de cuidado, seguidas das condições neurológicas crônicas, depois pelas onco-hematológicas. Existe uma proporção ligeiramente maior de meninos do que de meninas. Entre 34 Cuidados Paliativos Pediátricos os diferentes grupos que podem receber a indicação da abordagem paliativa, observa-se uma gama importante de crianças que serão acompanhadas por longos períodos, muitas até a vida adulta.1-3 Doenças como fibrose cística, epidermólise bolhosa, cardiopatias graves, anemia falciforme, e outras, fazem parte desse nicho importante do paciente, e são classificadas como "situações que exigem longos períodos de tratamento intensivo, visando prolongar a vida, mas existindo sempre o risco de morte prematura". Ao mesmo tempo, crianças que apresentam distúrbios meta- bólicos, doenças neurodegenerativas e alterações cromossômicas (Síndrome de Edwards ou Trissomia do 18) se encaixam nas "situações progressivas, sem opção curativa, nas quais o tratamento é paliativo desde o diagnóstico", evidenciando-se a necessidade do cuidado a lon- go prazo, visto tratar-se de um adoecimento crônico e complexo. Doenças genéticas, paralisia cerebral e encefalopatias são condições comuns, classificadas no grupo de "situações irreversíveis não progressivas, acompanhadasde incapacidade grave, tornando a criança vulnerável ao desenvolvimento de complicações de saúde", em que se beneficiaram grandemente do suporte de uma equipe de CP. Não obstante, crianças com câncer, sepses, algumas doenças cardíacas, renais e hepáticas, encontram-se no grupo de “Situações que podem comprometer a vida, em que o tratamento curativo pode ser possível, mas, ainda assim, pode falhar”.4,5 Não há um perfil definido em relação às condições elegíveis para CP na neonatologia, mas de modo geral elencam-se algumas condições elegíveis como:6 1) Recém-nascido (RN) no limite da viabilidade, com extremo baixo peso e idade gestacional muito prematura, como os menores de 24 semanas ou 500 g se não houver retardo de crescimento. E aqueles com peso < 750 g ou IG < 27 semanas, que tenham desenvolvido complicações sérias, que limitem a vida com o passar do tempo; 35Cuidados Paliativos Pediátricos 2) Malformações congênitas múltiplas, que impliquem em limitação da vida; 3) Problemas genéticos, como as trissomias do 13, 15 e 18 ou a osteogenesis imperfecta e ainda erros inatos do metabolismo, cuja evolução seja desfavorável, mesmo quando há terapia disponível; 4) Problemas renais como síndrome de Potter, agenesia ou hipoplasia renal bilateral importante, insuficiência renal grave, alguns casos de rins policísticos, com necessidade de diálise; 5) Alterações do sistema nervoso central como anencefalia, acrania, holoprosencefalia, encefalocele gigante, hidroanencefalia, doen- ça neurodegenerativa que exija ventilação mecânica; 6) Problemas cardíacos, como a acardia ou cardiopatias complexas inoperáveis; 7) RN que não respondam ao tratamento apesar de todos os esforços para ajudá-lo a se recuperar: sobreviventes de paradas cárdio-respiratória (PCR) de repetição; injúrias cerebrais severas, como a hemorragia intracraniana grave com leucomalácia; asfixia perinatal severa com encefalopatia hipóxico-isquêmica; disfunção de múltiplos órgãos; enterocolite necrotizante ou vólvulo com perda de grandes extensões do intestino (síndrome do intestino curto). O perfil dos pacientes acompanhados no primeiro semestre (setembro de 2017 a abril 2018) de implantação do Serviço de Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP) evidenciou que a maioria dos pacientes (n=50) eram do sexo feminino (54%), com média de idade de 6 anos e procedentes do Interior (62%). Verificou-se uma maior frequência dos pedidos dos pareceres provenientes das Unidades mais críticas e fechadas (UTI), com 51%. Identificou-se, também, que 47% dos pacientes admitidos estavam em Ventilação Mecânica Invasiva, 34% possuíam traqueostomia e 36% estavam sob tubo orotraqueal. 36 Cuidados Paliativos Pediátricos Uma quantidade significativa dos pacientes em seguimento pelo serviço de CPP era diagnosticada com anormalidades cromossômicas (36%), dentre elas a mais frequente foi a Síndrome de Edwards (45%). Destaca-se que durante esse período, 54% das crianças em seguimento evoluíram a óbito, 16% receberam alta com acompanhamento ambulatorial e 8% receberam alta com acompanhamento do Serviço de Assistência Domiciliar do Hospital. Ressalta-se que o número expressivo de pacientes acompanhados nos seis primeiros meses de implantação do Serviço sugere uma mudança da perspectiva do modelo assistencial centrado na doença para uma compreensão ampliada do cuidado. A prática do profissional da saúde volta-se para a integralidade do paciente, onde os aspectos psicossociais e espirituais são integrados à prática desenvolvida no serviço, limitando-se não somente à doença em si, mas com foco no paciente e sua família. A demanda do serviço aumentou consideravelmente nos últimos anos, principalmente em relação a quantidade de pareceres solicitados. Dessa forma, a estratégia foi a construção de um fluxograma que pudesse analisar critérios de elegibilidade prioridade para o agendamento de conferências familiares (Anexo 2). ORGANIZAÇÃO ATUAL DO SERVIÇO, FUNÇÃO DOS PROFISSIONAIS E ABRANGÊNCIA DE ATUAÇÃO A equipe de cuidados paliativos pediátricos do HIAS é constituída por psicólogo (a), assistente social, médico (a) e enfermeiro, compondo uma equipe multiprofissional, que atua com objetivo de minimizar o sofrimento na perspectiva da qualidade de vida de pacientes com diagnósticos que ameaçam a vida. Busca-se conhecer além do diagnóstico, o paciente, sua família e percurso terapêutico, com foco no cuidado integral, lançando olhar para a rede de apoio familiar e comunitário, no sentido de intervir em conjunto com equipe e família. 37Cuidados Paliativos Pediátricos O trabalho da equipe interdisciplinar de CPP está voltado prioritariamente para os princípios e a dimensão bioética, educativa, com intervenção planejada, atenta aos sujeitos envolvidos no processo de saúde-doença, desenvolvendo um trabalho integral nos aspectos físicos, emocionais, sociais e espirituais. Destarte, infere-se que a abrangência de atuação da equipe de CPP do referido hospital estabelece um processo de atenção totalitária ao paciente e à família. Tal cuidado é resultado de um trabalho implementado segundo reflexões coletivas – família e equipe, sendo estas fundamentadas a partir das múltiplas demandas apresentadas pela equipe e o núcleo familiar. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS)7, cuidado paliativo é uma abordagem que melhora a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias que enfrentam os problemas associados a doenças que ameaçam a vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento, da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento da dor e outros problemas, físicos, psicossociais e espirituais. Nesse sentido, durante seu surgimento, a equipe de cuidados pa- liativos pediátricos do HIAS vivenciou desafios e avanços em sua imple- mentação, tornando a realidade da sua atuação mais complexa dentro da unidade hospitalar. Com viés consultivo e matricial, buscou oferecer suporte às equipes para intervenções de alívio para dor e demais sin- tomas, ajustes de medicações e compartilhamento de conhecimento com a equipe assistencial sobre o novo modelo de cuidado, integrando os aspectos emocionais e sociais ao processo de cuidado. Alguns desafios foram identificados, à medida que havia a compreensão equivocada sobre o conceito de cuidados paliativos por parte da equipe assistencial, possibilitando o não reconhecimento da indicação de cuidados paliativos durante a assistência, formando barreiras consideráveis para a intervenção e diagnóstico precoce. A singularidade da pediatria no que diz respeito ao enfrentamento da morte8, dificuldades emocionais, resistência às mudanças também foram alguns dos desafios que foram identificados nesse processo. 38 Cuidados Paliativos Pediátricos Historicamente, os cuidados paliativos foram associados apenas às doenças incuráveis e irreversíveis, seu propósito sendo utilizado apenas para cuidados finais de vida. Essa ideia contribuiu para a solicitação de parecer em momentos de terminalidade e fechamento de ciclo de vida, principalmente envolvendo limitação de suporte de vida (LSV), configurando indicação tardia.9 Desse modo, a atuação da equipe também está voltada para a clarificação e democratização de informações junto à equipe assistencial, acerca dos conceitos de cuidados paliativos e o objetivo do modelo de cuidado, considerando que a família necessita de tempo e de informações para compreender as possíveis vantagens dos cuidados paliativos e, dependendo de como a equipe apoia esse processo, percebe as motivações do cuidado e progressivamente desenvolve confiança e cumplicidade, possibilitando a compreensão de que o tratamento curativo e paliativo devem ser complementares e integrados, aplicados em conjunto durante a evolução da doença.9 Destarte, conforme Manual de Cuidados Paliativos da ANCP10 e do Ministério da Saúde em conjunto com Hospital Sírio Libanês11, sintetiza a abrangência de atuação da equipe de cuidados paliativoscom alguns princípios norteadores: • Início precoce do acompanhamento em cuidados paliativos junto a tratamentos modificadores da doença. Incluir toda a investigação necessária para compreender qual o melhor tratamento e manejo dos sintomas apresentados; • Reafirmação da vida e a importância desta; • Compreensão da morte como processo natural, não antecipando nem postergando a mesma; • Promoção e avaliação, reavaliação e alívio impecável da dor e de outros sintomas geradores de desconforto; • Percepção do indivíduo em integralidade; 39Cuidados Paliativos Pediátricos • Suporte ao paciente, com enfoque na melhora da qualidade de vida; • Compreensão dos familiares como parte importante do processo de adoecimento do paciente e também no processo de luto após o óbito do paciente. Sob a perspectiva da Bioética, salientamos que a atuação dos cuidados paliativos pediátricos deve ter também como princípios norteadores a beneficência, não maleficiência, autonomia e justiça, tais direcionamentos representam a forma mais abrangente de atuação.12 Percebe-se, portanto, que a abrangência de atuação dos cuidados paliativos tem como base para intervenção a equipe, paciente e família, tendo como norteador o conhecimento de saúde ampliada, que fortalece a assistência, possibilitando resultados efetivos nos cuidados em saúde. REFERÊNCIAS 1. Castilho RK, Silva VCS, Pinto CS. Manual de cuidados paliativos da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Rio de Janeiro: Atheneu; 2021. 2. Carvalho RT, Souza MRB, Franck EM, Polastini RTV, Crispim DH, Jales SMCP, Barbosa SMM, Torres SHB. Manual da residência de cuidados paliativos. São Paulo: Manole; 2018. 3. Worldwide Hospice Palliative Care Alliance. World Health Organization. Global Atlas of Palliative Careatthe Endof Life. Genebra: WHO; 2020. 4. Ferreira EAL, Gramasco H, Iglesias SBO. Reumatologia infantil e cuidados paliativos pediátricos: conceituando a importância desse encontro. Resid. Pediatr. 2019;9(2):189-92. doi: 10.25060/ residpediatr-2019.v9n2-21 40 Cuidados Paliativos Pediátricos 5. Silvia RS, Amaral JB, Malagutti W. Enfermagem em Cuidados Pa- liativos: cuidando para uma boa morte. São Paulo: Martinari; 2019. 6. Iglesias SBO, Zollner ACR, Constantino CF. Cuidados paliativos pediátricos. Resid. Pediatr. 2016;6(0 Supl.1):46-54. doi: https:// doi.org/10.25060/residpediatr-2016.v6s1-10 7. World Health Organization. Nationalcancercontrolprogrammes: policies andmanagerialguidelines. 2nd ed. Genebra: WHO; 2002. 8. Organização Mundial da Saúde. Integração de cuidados paliativos e alívio de sintomas em pediatria: um guia da OMS para planejadores, implementadores e gestores de saúde. Brasília: Organização Mundial da Saúde; 2018. 9. Lima SF, Lamy ZC, Motta VBR, Roma TM, Gomes CMRP, Souza TP. Dinâmica da oferta de cuidados paliativos pediátricos: estudo de casos múltiplos. Cad. Saúde Pública.2020;36(9):1-13. doi: https:// doi.org/10.1590/0102-311X00164319 10. Carvalho RT, Parsons HA. Manual de Cuidados Paliativos. Disponível em https://cuidadospaliativos.org/uploads/2020/12/ Manual-Cuidados-Paliativos.pdf. Acesso 20/03/23. 41Cuidados Paliativos Pediátricos SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE Tipo de documento: FORMULÁRIO FOR.CPP.001 Título do documento: SOLICITAÇÃO DE PARECER À COMISSÃO DE CUIDADO PALIATIVO PEDIÁTRICO ELABORAÇÃO: 10/02/2020 REVISÃO: 26/06/2022 VERSÃO: 02 COMISSÃO DE CUIDADOS PALIATIVOS PEDIÁTRICOS – CUIDANDO JUNTOS Data do Pedido de Parecer: ___/____/20___ Prontuário: __________________ Data de Internação no Hospital: ___/____/___ Setor do Pedido de Parecer/Leito: ________/_______ Nome Paciente: _______________________________________________ Data de Nascimento: ___/____/___ Município de Origem: ______________________________ Sexo: ( ) M ( ) F Familiar/Responsável: ______________________________ Contato: (____) __________________ CONDIÇÕES ELEGÍVEIS PARA CUIDADOS PALIATIVOS EM CRIANÇAS Grupos Situações envolvidas Exemplos de doenças e condições Grupo 1 Crianças com condições agudas de risco de vida, das quais a recuperação pode ou não ser possível Qualquer doença ou lesão crítica, desnutrição grave Grupo 2 Crianças com condições crônicas de risco de vida que podem ser curadas ou controladas por um longo período, mas que também podem morrer Malignidades, tultirresistente, HIV/AIDS Grupo 3 Crianças com condições progressivas de risco de vida para as quais não há tratamento curative dispnível Atrofia muscular espinhal, Distrofia muscular de Duchenne Grupo 4 Crianças com condições neurológicas graves que não são progressivas, mas podem causar deteriorização e morte Encefalopatia estática, tetraplegia espástica, espinha bífida Grupo 5 Recém-nascidos que são gravemente prematuros ou têm anomalias congênitas graves Prematuridade grave, anencefalia, hernia diafragmática congênita, trissomia do 13 ou 18 Grupo 6 Membro da família de um feto ou criança que more inesperadamente Morte fetal, encefalopatia hipóxico-isquêmica, sepse avassaladora em criança previamente saudável, trauma por acidente de veículo motorizado, queimaduras, etc. Diagnóstico principal: ___________________________________________________________________________ Doença Neurológica Doença genética Doença Pulmonar Doença cardiológica Doença da Gastro-Hepato Doença autoimune / hematológica Doença Renal Doença ligada a prematuridade Você ficaria surpreso se este paciente morresse nos próximos 6 meses: ( ) Sim ( ) Não Parecer do(s) Especialista(s): ( ) Sim ( ) Não Patologia irreversivel confirmada em parecer? ( ) Sim ( ) Não Obs.: __________________________________________________________________________________________________ Dispositivos invasivos: Sim ( ) Não ( ) Cateterismo intermitente Sonda de alimentação Traqueostomia VNI / VMI Sonda vesical de demora Gastrostomia Oxigenioterapia Acesso Venoso Central / PICC Qual a demanda para a Comissão de Cuidado Paliativo Pediátrico? Conflito bioético Tratamento de sintomas refratários Pendência social Cuidado de fim de vida Sofrimento intenso da família/paciente diante do diagnóstico e prognóstico Conflito intrafamiliar que interfira na tomada de decisão Limitação terapêutica Outro: ________________________________________________________________________ Informações essenciais ao caso (Não citadas acima): ______________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________ Fo nt e: C ui da do s Pa lia tiv os P ed iá tri co s: O q ue s ão e q ua l s ua im po rtâ nc ia ? C ui da nd o da c ria nç a em to do s os m om en to s. SB P, 2 02 1. _________________________ Solicitante Parecer ANEXO 1 42 Cuidados Paliativos Pediátricos RESPOSTA AO PEDIDO DE PARECER COMISSÃO DE CUIDADOS PALIATIVOS PEDIÁTRICOS – CPP – CUIDANDO JUNTOS Data Resposta do Parecer: ___/____/20___ Data do recebimento do parecer: ___/____/20___ Setor atual de internação do paciente: ______ Paciente internado desde o nascimento? ( ) Sim ( ) Não Número de internações nos últimos 6 meses: _________ Admitido em UTI/Rea nesta internação? ( ) Sim ( ) Não Paciente internado na UPE? ( ) Sim ( ) Não Paciente acompanhado em domicilio? ( ) Sim ( ) Não Qual programa: _______________________________ Paciente com episódio de Parada Cardiorespiratória nesta internação? ( ) Sim ( ) Não Detalhes do episódio de Parada Cardiorespiratória: _______________________________________________________________________________ Informações adicionais: _______________________________________________________________________________________________ Índice(%) LANSKY (menores de 16 anos) KARNOFSKY (maiores de 16 anos) 100 Sem nenhuma restrição, normal Sem nenhuma restrição, normal 90 Restrições mínimas em atividades físicas extenuantes Atividade normal, pequenos sinais ou sintomas de doença 80 Ativo, cansando-se facilmente Atividade normal com esforço, alguns sinais e sintomas da doença 70 A maior parte do tempo restrito, poucas brincadeiras ativas Toma conta de si próprio, não consegue manter atividade normalmente ou trabalhar. 60 Consegue caminhar, envolve-se pouco com brincadeiras ativas. Ocupa-se com atividades tranquilas. Requer assistência ocasional, mas está habilitado a tomar conta do que precisa e dos frequentes cuidados médicos. 50 Consegue se vestir, mas passa a maior parte do dia na cama, não brinca ativamente. Envolve-se em brincadeiras e atividades passivas. Requer considerável assistência e frequentes cuidados médicos. 40 Maior parte do tempo na cama, participa de atividades passivas. Incapacitado, necessita de cuidado e assistências especiais. 30 Acamado, necessita de assistência mesmo em brincadeiras passivas. Incapacidade severa, hospitalização está indicada, mas a morte não está iminente. 20 Maior parte do tempo dormindo. Muito doente, necessitando de hospitalização e cuidados de suporte. 10 Não brinca e não sai da cama. Moribundo. 0 Não responsivo. Morte. Físico:_______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ Social/Familiar:________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ Psicológico:___________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ Espiritual:____________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________ _ La ns ky S B, Li st M A, La ns ky LL , R itt er -S te rr C, M ill er D R. T he m ea su re m en t o f p er fo rm an ce in ch ild ho od ca nc er p at ie nt s. Ca nc er . 1 98 7 Ka rn of sk y DA , B ur ch en al JH : T he cl in ica l e va lu at io n of ch em ot he ra pe ut ic ag en ts in ca nc er , i n M ac Le od C M (e d) : E va lu at io n of C he m ot he ra pe ut ic Ag en ts . N ew Y or k, NY , C ol um bi a Un ive rs ity Critério de Elegibilidade para acompanhamento: __________________________________________________________________________ Avaliação da Performance (Prévia / Atual): Lansky: _____/_______ Karnosky: _____/_______ Avaliação da Comissão de Cuidado Paliativo Pediátrico no caso: Equipe de Cuidados Paliativos 43Cuidados Paliativos Pediátricos Solicitar Parecer Médico Assistente - Prestar orientações à equipe - Registrar parecer no prontuário Médico ao CPP** - Realizar conferência familiar - Estabelecer plano de cuidados Equipe da CPP** - Realizar visitas - Fortakecer vínculos - Acompanhar evolução - Acolher luto Equipe da CPP** - Responder parecer aplicando os critérios de elegibilidade*** - Emitir parece em até 72 horas Equipe do CPP** ** CPP - Comissão de Cuidados Paliativos Pediátricos (Médicos, Enfermeiros, Psicólogos e Assistentes sociais - Revisar história; - Aplicar escala de funcionalidade; - Agendar a conferência familiar conforme critério de prioridade***; - Alinhar plano com equipe assistente e família fortalecendo vínculo; Registrar parecer em prontuário. Equipe do CPP, equipe assistencial e familiar Diagnóstico de doença crônica, limitante e ameaçadora a vida* Atende aos critérios de elegibilidade para inserção no CPP? SIM NÃO ANEXO 2 44 Cuidados Paliativos Pediátricos ***Critérios de prioridade para realização da conferência familiar 1 Proximidade do fim de vida com pacientes já vinculados 2 Agravamento do quadro clínico, conforme critério de elegibilidade 3 Pacientes já vinculados evoluindo com limitação de terapia 4 Pacientes não vinculados evoluindo com limitação de terapia 5 Proximidade de fim de vida com pacientes sem vinculação 6 Conflitos com equipe assistente que iterferiram na tomada de decisão e no processo de cuidados 7 Conflito intrafamiliar que interfira na tomada de decisão e no pprocesso de cuidados 8 Acolhimento de intenso sofrimento relacionado a diagnóstico e prognóstico 9 Dificuldade no processo de desospitalização Obsrvação 1: Prioridade da UTI em detriment da enfermaria, em todos os critérios ****Critérios de elegibilidade ara inserção no CPP (Crianças e adolescentes com doença crônica limitante e ameaçadora a continuidade de vida que estejam videnciando: 1 Conflito Bioético 2 Tratamento de sintomas refratórios 3 Pendências sociais 4 Cuidados de fim de vida 5 Sofrimento intenso da família do paciente em relação ao diagnósticos e prognósticos 6 Conflitos intrafamiliar que interfira na tomada de decisão 7 Limitação tarapêutica 45Cuidados Paliativos Pediátricos Bruna Cunha de Alcântara Matos INTRODUÇÃO O Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS), inscrito junto ao Ministério da Saúde (MS) como Unacon Exclusivo de Oncologia Pediátrica, operacionaliza a assistência oncológica pediátrica no anexo denominado Centro Pediátrico do Câncer (CPC) desde 2010. Ainda em 2009, foi implantada com base no “modelo mais frequente” (Academia Nacional Cuidados Paliativos-ANCP) e viabilizada por meio da parceria entre o corpo profissional do CPC com a Associação Peter Pan (APP) através do Programa Raio de Sol, o serviço de Cuidados Paliativos Pediátricos Oncológicos do Ceará. CONCEITO PARA O SERVIÇO A perspectiva da filosofia dos CP de conferir mais dignidade ao tempo de vida e da clínica ampliada como importante diretriz da Política Nacional de Humanização, com sua máxima de desenvolver as potencialidades da pessoa para ela viver com e apesar da doença, a unidade de cuidados paliativos conta com uma equipe plural e com o apoio de um importante segmento que é o voluntariado (Quadro 1). Cuidados Paliativos no Centro Pediátrico do Câncer4 46 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 1 - Equipe de cuidados paliativos oncológicos pediátricos do CPC Profissionais Especialidades 1 Médico oncologista pediátrico e paliativista 2 Médico paliativista, especialista em dor 3 Psicóloga 4 Enfermeira 5 Assistente Social 6 Terapeuta Ocupacional 7 Fisioterapeuta 8 Nutricionista 9 Fonoaudióloga 10 Coordenadora de Voluntariado 11 Coordenadora de Programas Sociais Fonte: pesquisa direta Os profissionais acima listados são representantes das suas profissões e são aqueles diretamente envolvidos com a unidade de cuidados paliativos. Além disso, outros profissionais colaboram e participam de forma mais pontual e indireta com os objetivos das ações de CP. Esta equipe conta, ainda, com o apoio efetivo de uma estagiária de psicologia, dos residentes do programa da Residência Integrada em Saúde das ênfases de Pediatria e da Cancerologia que tem o CPC como cenário das suas práticas.A abrangência da unidade envolve enfermaria, unidade de terapia intensiva, hospital-dia e atendimento domiciliar. A admissão se dá por encaminhamento do médico assistente, reunião médica semanal e via discussão de casos na reunião semanal interdisciplinar de CP, baseada no prognóstico reservado e refratário ao tratamento curativo. 47Cuidados Paliativos Pediátricos Os diagnósticos prevalentes são leucemia linfóide e mielóide aguda, neuroblastoma, tumores do sistema central e ósseos. O tempo de seguimento dos pacientes varia por patologia e condições clínicas que podem ser entre um mês e dois anos. O fator disparador para a inclusão das demais profissões é a confirmação do caso na reunião semanal de CP e pelos atendimentos no ambulatório de suporte. Os serviços ofertados são: atendimento médico de suporte; controle da dor; cuidados de enfermagem; atendimento psicológico; assistência fisioterápica, odontológica, de terapia ocupacional e nutricional para manutenção da qualidade de vida; assistência social, atividades lúdicas e programa de realização de sonhos. Os usuários do programa são os pacientes e seus familiares. OBJETIVOS DO CUIDADO O serviço tem como objetivo alcançar a melhor qualidade de vida para os pacientes e suas famílias quando ocorre uma progressão da doença sem resposta às terapias curativas. Definir um plano de cuidado sistematizado que enfoque o controle de sintomas físicos, assim como assuntos de ordem psicológica, social e espiritual. Realizar cuidado multimodal ao paciente e seus cuidadores e familiares. Após a identificação de critérios de inclusão ou elegibilidade para os Cuidados Paliativos, é realizada uma ampla avaliação do doente, buscando os parâmetros que apoiem de forma cuidadosa o diagnóstico do processo de cuidado final de vida. A avaliação clínica do doente deve conter elementos fundamentais que possibilitem a compreensão de quem é a pessoa doente. Deve-se identificar suas preferências e dificuldades, a cronologia da evolução de sua doença e os tratamentos já realizados, quais as suas necessidades atuais e sintomas, o exame físico, os medicamentos propostos, as demais decisões clínicas e a impressão a respeito da evolução, além do prognóstico e as expectativas com relação ao tratamento proposto. 48 Cuidados Paliativos Pediátricos A abordagem dos Cuidados Paliativos valoriza a história natural da doença, a história pessoal de vida e as reações fisiológicas, emocionais e culturais dos pacientes e familiares diante do adoecer, o que faz com que o plano de cuidados seja altamente individualizado e variável ao longo do tempo. Com o intuito de facilitar a comunicação entre os diversos profissionais da equipe e orientar as linhas gerais do plano de cuidados do paciente em um determinado momento, utilizamos a seguinte estratégia de estratificação, dividindo as ações paliativas nas seguintes fases, baseado também nas escalas de avaliação funcional que poderá ser a escala de Lansky ou Escore de ECOG ou de Zubrod: Cuidado paliativo precoce O paciente é portador de doença que ameaça sua vida e apresenta bom status funcional. Nesse momento é improvável que a morte ocorra em decorrência de sua doença de base. Em caso de instabilidade clínica aguda, deve ser encaminhado para UTI e receber suporte avançado de vida em caso de PCR. A prioridade é o tratamento curativo ou restaurativo, utilizando os princípios da beneficência e autonomia. Prognóstico estimado em meses a anos. Cuidado paliativo complementar O paciente é portador de doença que ameaça sua vida e apresenta status funcional intermediário. Nesse momento é improvável que o paciente possa responder de maneira completa ou satisfatória ao tratamento curativo. No entanto, pode se beneficiar de procedimentos ou tratamentos invasivos que 49Cuidados Paliativos Pediátricos proporcionem melhora de sintomas e qualidade de vida, respeitando o desejo do paciente ou de seus representantes legais. Em caso de instabilidade clínica aguda, a transferência para UTI deve ser ponderada, levando-se em consideração as condições potencialmente reversíveis, podendo ser definido limite de esforço terapêutico. Prognóstico estimado em semanas a meses. Cuidado paliativo pleno O paciente é portador de doença que ameaça a vida e apresenta baixo status funcional. Todas as ações devem buscar a melhor qualidade de vida possível e o controle de sintomas desconfortáveis (tratamento de infecções, correção de distúrbios hidroeletrolíticos, analgesia, etc.), utilizando os princípios da autonomia e não maleficência. Não adicionar ou manter terapias fúteis. Não deve ser encaminhado para UTI, respeitando o desejo do paciente ou de seus representantes legais. Prognóstico estimado em dias a algumas semanas. Cuidado paliativo de fim de vida O paciente é portador de doença que ameaça a vida, com baixo status funcional e declínio rápido e irreversível do estado geral. Esta piora acentuada pode ser evidenciada pelo comprometimento do nível da consciência e instabilidade cardiopulmonar. Suspender todas as terapias fúteis, focando exclusivamente no controle de sintomas. Não deve ser encaminhado para UTI, respeitando o desejo do paciente ou de seus representantes legais. Prognóstico estimado em horas a poucos dias. 50 Cuidados Paliativos Pediátricos Em todas as fases, deve ser prestado apoio aos pacientes e familiares, abordando os diagnósticos, condutas e prognóstico, além do controle rígido da dor e outros sintomas desconfortáveis e assistência psicossocial e espiritual. Após definição da indicação do paciente e modalidade, o caso clínico é apresentado em reunião clínica semanal que ocorre às terças, quartas e quintas pela manhã na sala dos médicos do primeiro andar do CPC, sob coordenação da chefia médica e de todos os médicos do CPC, para discussão dos casos clínicos da enfermaria e UTI, dos casos mais graves do ambulatório, incluindo pacientes sob tratamento curativo e paliativo. O grupo reunido também delibera sobre rotinas do serviço, problemas gerais do CPC, soluções e encaminhamento de demandas cabíveis para setores e órgãos responsáveis dentro e fora do HIAS. É possível também a participação de residentes médicos. Quanto aos CP, esta é uma etapa decisiva, quando a equipe estabelece consenso sobre a progressão da doença e acerca das evidências de falha dos protocolos determinativos. A documentação de base são os prontuários, os protocolos, as evidências científicas e a lista de pacientes, que é elaborada por qualquer médico da equipe. Ao final é lavrada ata. 51Cuidados Paliativos Pediátricos Início da Definição de Seguimento do Paciente PACIENTE EQUIPE MULTIDISPLINAR Tratamento de suporte de toda a equipe para controle de sintomas Tratamentos curativos Óbito do paciente i) prognóstico reservado: ii) refratariedade aos protocolos Comunicação com o acompanhamento de um psicólogo Evolução do quadro Evolução do quadro Ambulatório de suporte Protocolos curativos Suporte a família Suporte a família • Os casos são discutidos pela equipe multidisciplinar, levando-se em consideração seu estado clínico, psicológico e inclusive a rede familiar e social que o assiste de forma sistêmica • Suporte amplido para a família, oferecendo atendimento psicológico e permitindo a presença d mais dum acompanhante quando os pacientes encontra-se internado. Caso clínico Intervenções 52 Cuidados Paliativos Pediátricos PLANOS DE CUIDADO Esse plano é iniciado pelo planejamento da Conferência Familiar, estratégia por meio da qual a família dos pacientes em CP é convocada para se reunir com a equipe no sentido de ser acolhida em seu sofrimento e ajudada nos níveis emocional, cognitivo e social a se confrontar com a complexa tarefa de enfrentamento e planejamento de otimizar qualidade de vida, mediante uma doença ameaçadora da vida, até explicar sobre a morte e morrer de um filho. Por meio dela se conhece melhor a configuraçãofamiliar e seu sofrimento, ouve- se seus pontos de vistas, crenças, medos, angústias e dúvidas, bem como se fortalecem o vínculo e a confiança com a equipe. Os dias preferenciais para estes encontros são a segunda e a quarta-feira, que são agendados de acordo com a demanda dos casos críticos, podendo se repetir sempre que precisar. Persegue-se a meta de que pelo menos três profissionais se façam presentes em cada reunião, preferencialmente, médico, assistente social e psicólogo. As pessoas da família que são convidadas a participar podem variar em cada caso, de acordo com o vínculo com o paciente. A equipe inicia viabilização da Conferência Familiar seguindo Protocolo de Comunicação utilizando como ferramenta o modelo SPIKES, protocolo de comunicação em seis passos, criado e coordenado por um grupo de oncologistas norte-americanos, que sintetiza as principais diretrizes a serem seguidas pelos profissionais de saúde. Nessa reunião são definidos o cuidador e os familiares da rede de cuidados. Nesse fluxo é esclarecido sobre a falta de resposta ao tratamento curativo proposto e esclarecer dúvidas sobre possíveis tratamentos alternativos. Além disso, é viabilizado o significado de cuidado de suporte. A equipe avalia a unidade de seguimento em que será possível a intervenção e inclusão como regime domiciliar, 53Cuidados Paliativos Pediátricos ambulatorial e hospitalar. Após a finalização do plano são definidas a equipe multidisciplinar, planejamento de cuidado total e identificação do prontuário. Segue abaixo, resumo do fluxo de Plano de cuidado após inclusão do paciente e definição de modalidade: Definir Atendimento Sinalizar Equipe Conferência Familiar Durante a semana, há o encontro interdisciplinar que acontece todas as quartas-feiras pela manhã no auditório ou sala de Psicologia, com a equipe da unidade de CP, podendo contar com a presença de outros profissionais do CPC e residentes devidamente autorizados, voltada para a discussão dos casos apontados na reunião do corpo clínico, sobretudo os que estão evoluindo com franca progressão da doença e os que já foram comunicados sobre cuidados paliativos complementar ou plenos. Seguida à discussão, são construídos consensos em torno de condutas a serem efetivadas, respeitando-se a singularidade dos envolvidos. A reunião também está aberta para que os participantes discutam sobre possível inclusão de novos casos, implementação de ações e checagem das ações em curso. Os documentos que apoiam essa reunião são a lista de casos informada pelos médicos de CP, os casos em acompanhamento interdisciplinar e seus protocolos, constando pacientes novos e antigos. Ao final é lavrada ata com assinatura dos presentes. 54 Cuidados Paliativos Pediátricos SEGUIMENTO PELA UNIDADE DE ATENDIMENTO Seguimento ambulatorial O paciente indicado é encaminhado para o Ambulatório de SUPORTE em que se realiza atendimento médico, objetivando controle de sintomas e/ou definindo a necessidade de recursos terapêuticos com quimioterapia ou radioterapia paliativa – na tentativa de evitar progressão acelerada da doença, sempre priorizando a qualidade de vida, respeitando a beneficência e não maleficiência. Nessa unidade, é definido projeção de seguimento com qualidade de vida. Nesse momento, provemos a realização dos desejos do paciente e realização de sonhos. Otimizamos a clarificação dessa indicação de cuidado para melhor aceitação e adesão do Suporte Multidisciplinar. Acionamos o Programa de Assistência Domiciliar, Programa Melhor em Casa ou Equipe de Unidade de Saúde do município residente, para atendimento e insumos para seguimento em regime ambulatorial quando necessário, de acordo da demanda do paciente. Utilizamos protocolos de suporte: PROTOCOLO DE DOR; PROTOCOLO QUIMIOTERAPIA E RADIOTERAPIA PALIATIVA DE ACORDO COM A PATOLOGIA; PROTOCOLO INTERVENÇÃO MULTIPROFISSIONAL. Seguimento Domiciliar O cuidado com os pacientes de CP em domicílio abrange os pacientes que residem em um raio de localização de até 60 km de distância do CPC e que, diante de necessidades identificadas na reunião interdisciplinar, recebem visita das assistentes sociais do CPC e do médico paliativista para cuidados com a dor. De acordo com a demanda do caso e com a disponibilidade dos outros profissionais, estes podem se somar aos que comumente vão assistir os pacientes. Esta ação tem apoio do HIAS e da ONG Peter Pan (APP), por meio do projeto Visita Amiga que disponibiliza o transporte, o 55Cuidados Paliativos Pediátricos motorista e diversos itens de mobiliário, eletrodomésticos e utensílios de acordo com a disponibilidade do estoque de doações. A APP também chega a viabilizar pequenas e médias reformas da estrutura física do lar para a melhoria das condições de higiene e cuidados do paciente. O material hospitalar é fornecido pelo HIAS/ CPC e inclui cadeiras higiênicas, cadeiras de rodas, cama hospitalar, sondas de aspiração, concentrador de oxigênio e medicações simples. O intuito é melhorar a atuação do plano terapêutico, modificando-se quando possível o domicílio. A melhor adaptação do paciente ao seu lar reduz os índices de reinternação e diminui os óbitos hospitalares. A documentação que serve de base é a agenda do serviço social e os prontuários dos pacientes, mediante relatórios médicos. Seguimento hospitalar Nesse momento, dentro da evolução clínica do paciente, poderá haver a necessidade da intervenção hospitalar que pode ser definida por dois status: Estabilidade Clínica ou Cuidados Final de Vida. Na internação, intensificamos a Empatia da Equipe, realizando uma nova Conferência Familiar para definir seguimento de Cuidados Final de Vida e início do Luto. A equipe inicia o trabalho de suporte de enfrentamento da evolução para terminalidade. A partir dessa evolução, iniciamos o PROTOCOLO DE ANALGESIA CONTÍNUA e dependendo da evolução iniciamos o PROTOCOLO SEDAÇÃO PALIATIVA. O Suporte Familiar devido ao medo e angústias apresentados pelo Paciente e Familiares é intensificado com toda equipe multiprofissional junto ao serviço de Medicina Integrativa. A equipe inicia o PROTOCOLO DE DIRETRIZES ANTECIPADAS adaptada ao paciente e seu entendimento mediante a avaliação da equipe de Psicologia, e iniciamos os últimos desejos e sonhos, preparando a uma Morte Tranquila e segura. 56 Cuidados Paliativos Pediátricos CONSIDERAÇÕES FINAIS Os pacientes devem ser incluídos na paliação durante todo o curso da doença, desde o seu diagnóstico, porque assim consegue-se proporcionar sobrevida com qualidade, incluindo previsão de suporte para a família. REFERÊNCIAS 1. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de Cuidados Paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic;2009. 2. American Academy of Pediatrics. Committee on Bioethics and Committee on Hospital Care. Palliative care for children. Pediatrics.2000; 106(2Pt1):351-7. DOI: http://dx.doi.org/10.1542/ peds.106.2.351. 3. Informed consent, parental permission, and assent in pediatric practice. Committee on Bioethics, American Academy of Pediatrics. Pediatrics. 1995;95(2):314-7. 4. Baile WF, Buckman R, Lenzi R, Glober G, Beale EA, Kudelka AP. SPIKES-A six-step protocol for delivering bad news: application to the patient with cancer. Oncologist. 2000;5(4):302-11. DOI: http:// dx.doi.org/10.1634/theoncologist.5-4-302 5. Constantino CF, Barros JCR, Hirschheimer MR, eds. Cuidando de Crianças e Adolescentes sob o olhar da Ética e Bioética. Rio de Janeiro: Atheneu; 2009. 6. Barbosa SMM, Lecussan P, Oliveira FFT. Particularidades em Cuidados Paliativos: Pediatria. In: Oliveira RA, ed. Cuidado Paliativo. 57Cuidados Paliativos Pediátricos 7. Davies B, Brenner P, Orloff S, Sumner L, Worden W. Addressing spirituality in pediatric hospice and palliative care. J Palliat Care. 2002;18(1):59-67. 8. Dussel V, Bernadá M, Bustamante M, Blanco MC, García WG, Grunauer M, Jerez C, Barbosa SMM, Nespral A. Versión Educación en Cuidados Paliativosy Final de la Vida en Pediatría. Cuidados Paliativos Pediátricos: ¿Por Qué Importan? EPEC-Peds Latino América; 2016. 9. Glass KC, Carnevale FA. Decisional challenges for children requiring assisted ventilation at home. HEC Forum. 2006;18(3):207-21. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s10730-006-9008-z 10. Hain R, Heckford E, McCulloch R. Paediatric palliative medicine in the UK: past, present, future. Arch Dis Child. 2012;97(4):381-4. PMID: 22039176 DOI: http://dx.doi.org/10.1136/archdischild-2011-300432 11. World Health Organization. Integrating palliative care and symptom relief into paediatrics: a WHO guide for health care planners, implementers and managers. Geneva: World Health Organization; 2018. Licence: CC BY-NC-SA 3.0 IGO. 12. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento Científico de Medicina da Dor e Cuidados Paliativos. Cuidados paliativos pediátricos: o que são e qual sua importância? Cuidando da criança em todos os momentos [Internet]. São Paulo: Sociedade Brasileira de Pediatria; 2017 [acesso 27 jul 2022]. Disponível: https://bit.ly/2HrUo0U. 58 Cuidados Paliativos Pediátricos Larissa Loiola Batista Maria Juliana Vieira Lima Fernanda Gomes Lopes INTRODUÇÃO A conferência familiar (CF) é um instrumento terapêutico utilizado por equipes de cuidados paliativos como um momento de diálogo planejado entre paciente, família e equipe assistente. Um dos objetivos da conferência familiar é possibilitar uma comunicação efetiva que favoreça a participação ativa do paciente e sua família no processo de tomada de decisão.1,2 Também chamadas de reuniões familiares, esse tipo de intervenção permite que a equipe entenda os interesses e valores da família, respeitando a autonomia da criança e/ou adolescente. A CONFERÊNCIA FAMILIAR NOS CUIDADOS PALIATIVOS No Hospital Infantil Albert Sabin, a CF ocorre após a resposta do parecer da equipe assistencial, com a constatação de que o paciente se encontra nos critérios de elegibilidade para acompanhamento da equipe especializada. A Conferência Familiar 5 59Cuidados Paliativos Pediátricos Em decorrência da grande demanda de solicitações, elencamos a ordem das prioridades para realização das conferências, sendo: 1. Proximidade do fim de vida com pacientes já vinculados; 2. Agravamento do quadro clínico, conforme critérios de elegibilidade; 3. Pacientes já vinculados evoluindo com limitação de terapia; 4. Paciente não vinculados evoluindo com limitação de terapia; 5. Proximidade de fim de vida com pacientes sem vinculação; 6. Conflitos com equipe assistente que interfiram na tomada de decisão e processo de cuidados; 7. Conflito intrafamiliar que interfira na tomada de decisão e no processo de cuidados; 8. Acolhimento de intenso sofrimento relacionado a diagnóstico e prognóstico; 9. Dificuldade no processo de desospitalização. É importante salientar que há prioridade da UTI em detrimento da enfermaria, em todos os critérios. Para realização da CF é essencial que haja planejamento e preparação da equipe, começando pelo agendamento prévio com o principal cuidador e o convite a outros membros da rede de apoio que sejam significativos e sintam-se confortáveis em participar do momento. Salienta-se que as conferências devem ser marcadas e sinalizadas com antecedência para que a família possa se preparar, porém não muito tempo antes de ocorrer, pois podem desencadear momentos de ansiedade e angústia durante a espera. Na marcação da conferência, é importante que seja explicado o objetivo da reunião, ressaltando que tem como foco a vinculação e o planejamento de cuidados. O ideal é que tenha mais de um cuidador nas 60 Cuidados Paliativos Pediátricos reuniões para que as informações não fiquem restritas a uma só pessoa e a equipe consiga ter outros olhares sobre a dinâmica familiar, além da presença da rede de apoio em um momento tão delicado. Os profissionais devem estar atentos à fala e à linguagem não- verbal dos familiares, promovendo uma escuta qualificada de forma a estabelecer vínculo. Muitos sentimentos podem emergir nesse momento e é crucial que haja validação e manejo adequado, além de disponibilidade por parte da equipe presente. Protocolos são importantes para guiar a reunião, mas sempre se deve levar em consideração que cada família tem sua história e pode apresentar demandas diferentes no momento da conversa em equipe. Por isso, é crucial que haja disponibilidade e tempo de qualidade para o momento. Na conferência, alguns pontos que podem facilitar e guiar o processo de comunicação, conforme Iglesias.3 A seguir destacamos algumas orientações que consideramos essenciais: 61Cuidados Paliativos Pediátricos Comunicação Orientações Postura Mostrando abertura, atenta à família. Alerta, mas não tensa. Móveis Sem barreiras entre os presentes. Preferencialmente, a conferência deve ser realizada em círculo com todos podendo se olhar e estando sentados. Ambiente Fechado, silencioso e privativo. É sugerível que haja lencinho de papel e água disponíveis para a família. Pessoas presentes É ideal que não haja mais profissional do que familiar/ paciente na sala. Caso estejam presentes muitos membros da equipe, torna-se importante avisar à família para que ela não se assuste. No início da conferência, todos os membros presentes da equipe e da família devem se apresentar. Dirija sua fala para todos os familiares presentes. Roupas e acessórios Simples e não extravagantes, que não chamem atenção. Cuidado com o uso do celular no momento da conferência. Expressão facial Empático e mostrando seus sentimentos. Maneirismos Sem maneirismos que possam distrair os presentes. Nada deve chamar mais atenção do que o que quer comunicar. Volume de voz Audível, no volume mediano. Ritmo da voz Médio, nem lento e nem acelerado. Lembre-se de que as pausas são importantes e a repetição é cansativa. Distância Interpessoal Aproximado. Só deve haver toque ou abraço quando o momento for propício e tiver abertura dos presentes. As mãos devem estar sempre à mostra, pois inspira confiança. Toque Presente, caso haja contexto para tal e abertura da equipe. Cabeça Positiva. Postura Corporal Voltada para a pessoa. Não ficar de lado ou de costas. Comunicação Disponível e honesta. Linguagem Acessível à compreensão da família. Pode utilizar recursos gráficos, bonecos, imagens, metáforas, dentre outros, para ajudar. 62 Cuidados Paliativos Pediátricos Além dos pontos elencados, a conferência necessita de uma preparação e deve acontecer com começo, meio e fim. • Começo: Preparação para o encontro e recapitulação da história da família, da doença, do tratamento e da internação. Lembrando que sempre é importante ouvir primeiro os familiares, para só posteriormente fornecer informações. • Meio: Escuta atenta, verdade honesta e gradual, com fornecimento de informações, momento para tirar dúvidas e planejar os cuidados. • Fim: Recapitulação da conferência e do plano de cuidados, realização de pactuações e encaminhamentos, com indicação dos próximos passos e afirmação da disponibilidade. A equipe pode utilizar um instrumental para registrar as informações coletadas nas reuniões, com o objetivo de ter uma visualização mais ampla da configuração da família e da rede de cuidados do paciente, como por exemplo a utilização de genograma e ecomapa. Devem ser elencados a rede familiar e social, os serviços públicos disponíveis no território, informações sobre o entendimento da família acerca do diagnóstico e da abordagem dos cuidados paliativos. Abaixo, segue exemplo do material utilizado: 63Cuidados Paliativos Pediátricos Estágio de doença atual: Inicio da doença Progressão da doença Fim de vida Compreensão da família em relação ao significado de CPP: Presente Parcial AusenteAceitação da família em relação ao plano abordado com a Comissão: Presente Parcial Ausente Cuidados de fim de vida: Sim Não SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE Tipo de documento: FORMULÁRIO FOR.CPP.002 Título do documento: CONFERÊNCIA FAMILIAR DA COMISSÃO DE CUIDADOS PALIATIVOS PEDIÁTRICOS ELABORAÇÃO: 10/02/2020 REVISÃO: 26/06/2022 VERSÃO: 02 Nome Paciente: __________________________________________________________ Data da Conferência: ____/____/20___ Equipe presente - CPP: ____________________________________________________________________________ Equipe assistente presente: ________________________________________________________________________ Familiares presentes: _____________________________________________________________________________ Organização Psicossocial: Número de familiares em mesmo domicílio: _____ Principal cuidador: __________________________________ Renda familiar: Sem renda < 1 salário-mínimo Possui benefício social: ( ) Sim ( ) Não Se sim, qual: _______________________________________ 1 salário-mínimo 2 salários-mínimos 3 ou > salários-mínimos Espiritualidade presente: ( ) Sim ( ) Não Obs: ____________________________________________________________________________ Genograma: Ecomapa: Legenda Genograma: Mulher Homem Paciente Pessoa Entrevistada Gravidez Aborto Óbito Relacionamentos Ligado Muito Ligado Distante - - - - - - - - - - - - - - - - Conflituoso Relação Rompida Legenda Ecomapa: ________ linhas contínuas: ligações fortes, relações sólidas; ------------ linhas tracejadas: ligações frágeis, relações tênues; ___//___ linhas com barras ou talhadas: aspectos estressantes, relações conflituosas; → ← ↔ setas: fluxo de energia e/ou recursos; Ausência de linhas: ausência de conexão. Acompanhamento ambulatorial após a alta? ____________________ Previsão de alta: ( ) Sim ( ) Não Data: ___ / ____ / 20____ Quais: _________________________________________________________________________________________________________________ G 64 Cuidados Paliativos Pediátricos COMISSÃO DE CUIDADOS PALIATIVOS PEDIÁTRICOS – CPP – CUIDANDO JUNTOS Plano de cuidados CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA Capítulo I – Princípios Fundamentais – Artigos XXII: Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados. RESOLUÇÃO CFM No 1.805/200616: Art. 1o É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. Art. 2o O doente continuará a receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, assegurada a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar. Parecer Médico(a) __________________________________________________________________________________________________ Data: ___ / ___ / 20___ __________________________________________________________________________________________________ __________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Assinatura __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Parecer do Enfermeiro(a) __________________________________________________________________________________________________ Data: ___ / ___ / 20___ __________________________________________________________________________________________________ __________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Assinatura __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Parecer do(a) Assistente Social __________________________________________________________________________________________________ Data: ___ / ___ / 20___ __________________________________________________________________________________________________ __________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Assinatura __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Parecer do Psicólogo(a) __________________________________________________________________________________________________ Data: ___ / ___ / 20___ __________________________________________________________________________________________________ __________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ Assinatura __________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ 65Cuidados Paliativos Pediátricos Ao final da conferência familiar, deve ser elaborado um plano de cuidados personalizado, de acordo com as necessidades do paciente e sua família. Deve-se discutir as opções terapêuticas de forma clara e objetiva, esclarecendo que a tomada de decisão é partilhada, favorecendo e estimulando o protagonismo do paciente e sua família nesse cuidado. CONSIDERAÇÕES FINAIS As conferências familiares mostram-se como importante instrumento terapêutico para os pacientes em cuidados paliativos pediátricos. Além de facilitar a vinculação, promove um cuidado mais adaptado às necessidades dos pacientes e seus familiares. REFERÊNCIAS 1. Neto Galriça I. A conferência familiar como instrumento de apoio à família em cuidados paliativos. Rev Port Clin Geral. 2003; 19(1): 68-74. 2. Crispim D, Brandão A. Condução de uma reunião de família em cuidados paliativos. In: Carvalho RT, Souza MRB, Franck EM, Polastrini RTV, Crispim D, Jales SMCP, et al (Org.). Manual da residência de cuidados paliativos: abordagem multidisciplinar. Barueri: Manole; 2018. 621-631. 3. Iglessias, S.B.O. et al. É possível comunicar notícias difíceis sem iatrogenia? Sociedade Brasileira de Pediatria [online]. 2018, n.2. [Acessado 13 Dezembro 2021], pp. 1-9. Disponível em: <https:// www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/20291d-DocCient_-_E_ possivel_comunicar_noticias_sem_iatrogenia.pdf>. 66 Cuidados Paliativos PediátricosThiago do Vale Machado Maria Líllian Maia Fernandes É de primordial importância em conjunto com os demais cuidar do paciente, promover qualidade de vida, e buscar o controle de sintomas ao paciente desde o diagnóstico. Seu objetivo principal é sem dúvida melhorar a qualidade e estabelecer cuidado integral e ativo, atuando em todas as dimensões dos sintomas que vierem a se apresentar. O termo cuidado abrange práticas e significados diversos, variando de acordo com a cultura a qual se insere. O Cuidado Paliativo apresenta-se como uma esfera do cuidado, que surgiu com o objetivo de suprir a uma demanda crescente de pacientes fora das possibilidades de cura terapêutica e que vinham sendo marginalizadas e mal assistidas pelo modelo tecnicista da medicina, com o foco na doença em determinado doente.¹ Segundo a OMS, o tratamento paliativo é aquele direcionado a pacientes que possuem uma doença incurável e que deve ser acompanhada por uma equipe multidisciplinar. Faz parte do planejamento de cuidados: 1. Esclarecer o diagnóstico; 2. Informar prognóstico e estágio de doença; 3. Discutir o plano terapêutico com familiares; Plano de Cuidados 6 67Cuidados Paliativos Pediátricos 4. Discutir sobre a desospitalização, quando possível; 5. Identificar necessidades dos cuidadores; 6. Conhecer a realidade social da família; 7. Definir limitação de recursos fúteis em casos mais avançados; 8. Melhorar a comunicação entre equipe assistente e família. Devem ser avaliadas as necessidades da criança através de um plano de cuidados, discutido e desenvolvido com a criança e a sua família, onde podem ser acolhidos suas crenças e valores.2,3 Quando as discussões incluem especificamente os objetivos da família, percebe- se uma diminuição do sofrimento infantil e menos arrependimento decisório.4 O planejamento para um futuro incerto deve ser base para conversas sobre os diversos aspectos da qualidade de vida, incluindo o bem-estar, as necessidades e as realidades espirituais, psicossociais, econômicas, de desenvolvimento e culturais dos pacientes e familiares. Nesse sentido, deve-se abordar quaisquer potenciais conflitos ou incertezas relacionadas ao cuidado a fim de determinar que tipo de atenção é aceitável para o paciente e sua família em diversas circunstâncias.5 A comunicação de objetivo de cuidados deve acontecer antes das intercorrências, da piora clínica progressiva e do fim de vida. A discussão de planejamento de cuidados não deve ser de decisões imediatas. É um processo interativo que apoia os pacientes para: 1. Considerar sua qualidade de vida e preferências de cuidado no contexto de sua capacidade de tomada de decisão atual e futura. 2. Vislumbrar o que o futuro reserva em relação às suas atividades psicossociais e funcionais. 3. Identificar e discutir quais escolhas de cuidado podem ser preferidas antes do imediatismo de tais decisões. 68 Cuidados Paliativos Pediátricos 4. Designar e discutir preferências com um substituto para tomar decisões médicas caso um paciente não possa participar. 5. Comunicar sobre escolhas com a equipe por meio de métodos formais e informais. Para iniciar um plano de cuidados é importante ressalvar alguns pontos na comunicação para estabelecer os objetivos.6 1. Compreensão do prognóstico: Pedir permissão- Tudo bem se conversarmos sobre sua doença ou a doença de seu filho (a) e como ela está evoluindo? O que o paciente sabe? O que a família já sabe? Quais as suas preocupações? Você gostaria de ouvir detalhes ou prefere um panorama geral? Tem algo que te preocupa em especial? 2. As informações devem ser repassadas em pequenas porções. 3. E ao final pergunta-se: Você tem alguma dúvida ou vontade de saber mais sobre o que pode acontecer futuramente com essa doença? 4. Objetivos: Identificar valores, crenças, desejos e propósitos: O que é mais importante para você? 5. O que você mais deseja para o seu filho? 6. Quais as suas expectativas. 7. Medos: Considerar e acolher a ameaça da perda. Após a construção da parte preliminar do plano de cuidados, o próximo passo é traçar um plano de controle de sintomas que possa antecipar uma variabilidade de sintomas possíveis e garantir possibilidades de tratamento, considerando a forma de uso, as indicações, as possibilidades de administração e os possíveis efeitos colaterais que possam estar envolvidos. Além disso, deve ser proporcionada uma reavaliação continuada das medicações de uso, 69Cuidados Paliativos Pediátricos incluindo a possibilidade de suspender medicações não essenciais. A prescrição antecipada, o planejamento e a preparação para o inesperado são fundamentais. Um fluxograma de gerenciamento de sintomas às vezes pode ser útil para orientar os profissionais e pais sobre os sintomas prováveis e fornecer conselhos claros sobre o gerenciamento desses sintomas.2,3,7 Em condições de terminalidade, pode-se considerar a possibilidade de descontinuar intervenções inadequadas nesta fase, como coleta de exames laboratoriais, fluidoterapias endovenosas (incluindo transfusão de hemocomponentes), rotina de sinais vitais, monitorização invasiva e não invasiva excessivamente, procedimentos como hemodiálise, mecanismos de circulação extracorpórea), ventilação mecânica invasiva. Deve ficar bem claro que, às vezes, quando as opções de tratamento invasivas, são retiradas, após discussão com a família e outros profissionais, que o cuidado nunca é retirado.3,8 Detalhar toda a equipe assistente multiprofissional e de cuidados paliativos com suas respectivas funções e participação no cuidado da criança. Incluindo todo o processo de comunicação de más notícias, cabendo aos profissionais de maior vínculo, devidamente treinados em habilidades de comunicação avançadas, responder com honestidade e fornecer informações, oferecer conforto e compreensão aos momentos difíceis 2. O plano de cuidados de fim de vida acordado precisará ser documentado, incluindo um plano de ressuscitação personalizado definindo qual tratamento de emergência deve ser usado e o que não deve ser usado. O plano deve permitir uma revisão contínua de cuidado e mudança de metas para atender aos desejos da família. É imprescindível que toda a equipe seja informada das mudanças e mantida em dia com os cuidados com a criança.2-4 70 Cuidados Paliativos Pediátricos REFERÊNCIAS 1. Carvalho, Ricardo T et al (eds). Manual da residência de cuidados paliativos. Barueri: Manole, 2018. 2. Widdas D, Mcnamara K, Edwards F. A core care pathway for children with life-limiting and life-threatening conditions. 3. ed. Bristol: Together for Short Lives, 2013. 3. Aidoo E, Rajapakse D. Endoflifecare for infants, childrenandyoungpeoplewithlife-limitingconditions: planningand management: the NICE guideline 2016. ArchivesofDisease in Childhood-EducationandPractice, 2018, v. 103, n. 6, 296-299. 4. Decourcey D D. et al. Advance care planning and parent- reportedend-of-life outcomes in children, adolescents, and young adults with complex chronic conditions. Criticalcare medicine, [S.l.], v. 47, n. 1,jan. 2019. p. 101-108. 5. Grunauer M, Hynson J. Planning care. In: Goldman A, Hain R; Liben S (ed.). Oxford textbook of palliative care for children.Oxford university press,3ª ed., 2021. p. 341-35. 6. Iglessias, S.B.O. et al. É possível comunicar notícias difíceis sem iatrogenia? Sociedade Brasileira de Pediatria [online]. 2018, n.2 p. 1-9. 7. Barbosa S, Zoboli I, Iglesias S. Cuidados Paliativos: na prática pediátrica. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019. 8. Together for short lives. Basic Symptom control in paediatric palliativecare.The Rainbow sChildren's Hospice guidelines, 2017. 71Cuidados Paliativos Pediátricos Thiago do Vale Machado Ana Valeska Siebra e Silva DOR A identificação da dor, bem como de seus fatores contribuintes, as causas subjacentes através de uma Anamnese e exame físico detalhado,considerando o aspecto dor total, torna-se imprescindível para o controle adequado da dor. Avaliar circunstâncias associadas ou não à condição da doença de base ou limitação de vida: dor neuropática, dor gastrointestinal, dor neurológica, dor por lesões/úlceras de pressão, necessidade de bolus para dor aguda devem ser analisadas.1-4 Além disso, a aplicação de escalas de dor conforme uso institucional, incluindo escala adaptada para pacientes não comunicantes ou com comprometimento cognitivo.5-7 Controle de Sintomas 7 72 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 1 - Escala FLACC-R Categorias Pontuação 0 1 2 F Face Sem expressão particular ou sorriso Presença ocasional de careta ou sobrancelhas salientes, introspecção, desinteresse. Parece triste ou preocupado Sobrancelhas esporadicamente o constantemente salientes, queixo trêmulo. Face aparentemente estressada: expressão assustada ou de pânico P Pernas Posição normal ou relaxada Desconforto, inquietação, tensão. Tremores ocasionais Chutes ou pernas soltas. Aumento considerável da espasticidade, tremores constantes ou sacudidas A Atividade Em silêncio, posição normal, movimentando-se facilmente Contorcendo-se, movimentando o corpo para frente e para trás, tensão. Moderadamente agitado(por exemplo: movimento da cabeça para a frente e para trás, comportamento agressivo), respiração rápida, superficial, suspiros intermitentes Corpo arqueado, rígido ou trêmulo. Agitação intensa, cabeça chacoalhando (não vigorosamente), tremores, respiração presa em gasping ou inspiração profunda, intensificação na respiração rápida ou superficial C Choro Sem choro (acordado ou dormindo) Gemidos ou lamúrias, reclamações ocasionais, impulsos verbais ou grunhidos ocasionais Choro regular, gritos ou soluços, reclamações frequentes. Repetidos impulsos verbais, grunhidos constantes C Consolabilidade Consciente, relaxado Tranquilizado por toques ocasionais, abraços ou conversa e distração Difícil de consolar ou confortar. Rejeita o cuidador, resiste ao cuidado ou a medidas de conforto Orientações para aplicação da escala 1. Cada uma das cinco categorias (F) Face, (P) Pernas, (A) Atividade, (C) Choro, (C) Consolabilidade é pontuada de 0-2, resultando num escore total entre zero e dez. 2. Pacientes acordados: Observe pelo menos 1-2 minutos. Observe pernas e corpo descobertos. Reposicione o paciente ou observe a atividade, avalie tonicidade e tensão corporal. Inicie intervenções de consolo se necessário. 3. Pacientes dormindo: Observe por pelo menos 2 minutos ou mais. Observe corpo e pernas descobertos. Se possível, reposicione o paciente, toque o corpo e avalie tonicidade e tensão. 4. A FLACC revisada pode ser utilizada para todas às crianças não verbais. As descrições adicionais (em negrito) são descritores validados em crianças com dificuldades cognitivas. A enfermeira pode revisar com os pais os descritores dentro de cada categoria. Pergunte a eles se há comportamentos adicionais que melhor indiquem a dor em seus filhos. Adicione esses comportamentos na categoria apropriada da escala. Fonte: The Regents of the University of Michigan, 2009. Bussotti EA, Guinsburg R, Pedreira MLG. Traduzido para a língua portuguesa, 2013. 73Cuidados Paliativos Pediátricos Algumas medidas não farmacológicas, apesar de não terem evidência científica podem promover um relaxamento, melhorando o bem estar da criança e reduzem a ansiedade parental, podendo ser implementadas pela equipe multiprofissional: Termoterapias, mudanças ambientais (alterações de luminosidade, redução de ruído), almofadas adaptadas para melhor acomodação, técnicas de distração/ calmantes, além de técnicas de acupuntura, massagem terapêutica, musicoterapia, fisioterapia, Terapias por Estimulação Elétrica Nervosa Transcutânea (TENS) e Ludoterapia.1,2,3,7 Em relação ao tratamento farmacológico da dor, deste 2012, a OMS determinou o tratamento da dor pediátrica em dois patamares: dor leve com uso de analgésicos comuns (Aine‘s e derivados) e dor moderada a grave com uso de opioides fortes, excluindo - se o uso de opioides fracos como tramadol e morfina. A morfina continua sendo o “padrão ouro”) em crianças com dor persistente de intensidade moderada e intensas relacionadas a patologia de base, além da analgesia básica.1,3,8 Quadro 2 - Analgesia simples com AINE´s para dores leves Paracetamol VO/enteral: 10-15 mg/kg 6/6h Dipirona VO/enteral/EV/SC (4/4h-6/6h) - Lactentes: 10 mg/kg (máximo 1 g); - Pré-escolares: 15 mg/kg (máximo 1g); - Escolares: 25 mg/kg (máximo 2 g); - Adolescentes: 25-30 mg/kg (máximo 3 g). Ibuprofeno VO/enteral > 6 meses 5-10 mg/kg (máximo 40 mg/kg): 6-6h – 8/8h Cetoprofeno VO/enteral: 1 mg/kg 11 anos 50 mg (máximo 300 mg) 6/6 h – 8/8 h); Cetorolaco IV/IM/SC: > 6m: 0,25 - 0,5 mg/kg/dose (máximo 60 mg) 6/6h – 8/8h. 4,9,10 74 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 3 - Analgesia primária para dor moderada a severa com opioides - Tramadol VO/enteral/EV: -1-2m/kg dose de 6/6h – 8/8h - Morfina VO/enteral: RN-30dias: 0,075 mg-0,15mg; Lactentes 1-6m: 0,08-0,2 mg > 6m: 0.05–0.1 mg/kg (máximo 5 mg) cada 2– 4h - Morfina por bolus SC ou IV: RN–30dias 0,025–0,05 mg/kg: 6/6h; Lactentes 1-6m: 0,1 mg/kg; > 6m: 0.05-0.1 mg/kg (máximo 5 mg) cada 2–4 h - Morfina por infusão contínua SC ou IV: RN–30dias 0,005–0,01 mg/kg/h; Lactentes 1-6m: 0,01–0,03 mg/kg/h ; > 6m: 0,01-0,02 mg/kg/h máximo 0.5-1 mg/h) 4,9,10 Ao iniciar morfina, sempre lembrar de deixar bolus de resgate, o que corresponde a 10% da dose diária utilizada, seja de uso enteral ou endovenosa. Pode ser considerado além do tratamento usual da dor, a possiblidade de complementar analgesia com medicações adjuvantes. Em situações que apresentam grande dificuldade do controle de dor ou em processo de fim de vida, pode ser optado pela rotação dos opioides, escalonamento de doses e adicionar analgésicos simples ou terapias adjuvantes, incluindo medidas não farmacológicas. Para situações mais específicas no controle de dor ou dificuldade de manejo deve ser considerado o acompanhamento do profissional especializado em cuidados paliativos pediátricos.9,11,12 75Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 4 - Analgesia com outros opioides - Fentanil Bolus EV/SC e Intranasal (A solução injetável pode ser administrada por via IN): Neonato a Crianças < 2 anos: 1 mcg/kg como uma única dose; Crianças 2-18 anos: 1-2 kg/kg máximo 50mcg. - Fentanil infusão continua SC/EV: Lactente: 0,15-0,5 mcg/kg/hora; Criança: 0,25- 1 micrograma/kg/hora; Criança > 1 ano: 0,25–0,5 mcg/kg por dose, lentamente ao longo de 3-5min, - Fentanil transdérmico (patch): A dose é calculada pela dose equivalente à média do total de morfina usada por dia. A cada 2mg de morfina por dia corresponde a 1mcg/h de fentanil. Diminuir a infusão IV para 50% da vazão original 6 horas após o adesivo aplicado e interromper a infusão IV 12 horas após a aplicação do adesivo. - Metadona VO/enteral/IV: Criança de 1-12 anos: 0,03-0,1 mg/kg/dose (máximo de 5mg/dose inicialmente) 1-4 vezes diário. Criança >12 anos: 0,1-0,2 mg/kg a cada 6-12 horas (máximo de 5 mg/dose inicialmente). 4,9,10 Deve ser considerado analgesia para dor neuropatica em pacientes com lesões do sistema somatosenssorial, incluindo pós-quimioterapia e compressões tumorais, comprometimento norciceptivo e neuropático misto. Pela dificuldade de avaliação da dor neuropática em menores de 5 anos, o tratamento sempre deve ser considerado. As recomendações sugerem a gabapentina, antidepressivos tricíclicos e opioides como metadona. 1,4,9,11,12. 76 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 5 - Analgesia com adjuvantes - Gabapentina VO/enteral: Neonato a criança de 1 ano: 5 mg/kg; Criança de 2 a 11 anos: 5-10 mg/kg => Aumentar progressivamente a cada 48h, se necessário, até o máximo de 20 mg/kg/dose (máxima dose 600 mg). A partir de 12 anos: aumentarem números de comprimidos progressivamente a cada 48horas. A dose diária máxima pode ser aumentada de acordo com a resposta a um máximo de 3600 mg/dia. - Dexdetomidina EV/SC: Infusão contínua de 0,2-1 mcg/kg/h. - Ketodex protocolo (cetamina + precedex): EV/SC/IM: 1mcg de cetamina + 1mcg de dexdetomidina, IN: 1 mcg de cetamina + 2mcg de dexdetomidina. - Clonidina VO/Enteral/EV/SC Bolus oral/enteral/IV: Criança >1 mês: Iniciar 1 mcg/ kg/dose 3-4 vezes ao dia. Aumente gradualmente conforme necessário e tolerado até um máximo de 5 mcg/kg/dose 4x/dia. Infusão contínua IV: Iniciar 0,25 mcg/ kg/hora, aumentando em incrementos de 0,1 mcg/kg/hora até obter sedação adequada, chegando de 1-2mcg/kg/hora). 1,4,9,10,11 DISPNEIA Deve-se observar qual patologia de base envolvida, tratamento de causas reversíveis, sintomas emocionais envolvidos e estabelecimento de um plano de tratamento com intervenções não farmacológicas e farmacológicas, além da reavaliação regular do plano estabelecido. Pode ser simultânea com outros sintomas como ansiedade, dor, fadiga, náuseas e algumas experiências psicológicas (depressão, desamparo, perda de vitalidade, medo). Devido a deterioração dos sinais vitais, em geral está presente nos pacientes em final de vida.1,12,13 77Cuidados Paliativos Pediátricos Muitas escalas ainda são imprecisas para avaliação da dispneia na infância, principalmente em crianças com limitação de suporte de vida. Algumas medidas não farmacológicas como: reposicionamento postural e de vias aéreas, adequação de um ambiente mais ventilado, se possível; técnicas de respiração, acupuntura, fisioterapia e aspiração de vias aéreas.1,12,13 O uso do oxigênio pode não trazer benefício em pacientes com patologias não hipoxêmicas. Muitas vezes um fluxo de ar frio pode ser suficiente. O uso de VNI deve ter indicação individualizada e pode ter restrição em final de vida. O cateter/cânula de alto fluxo ainda possui evidências limitadas quanto ao uso em final de vida, apesar de a maioria dos estudos retrospectivos indicarem melhora no conforto do paciente, maior oxigenação, redução da frequência respiratória e redução no uso de opioides.4,13,14 O uso de opioides para controle da dispneia é bastante citado na literatura apesar de evidências bem duvidosas. A dose recomendada corresponde a metade da dose de analgesia.4,9,12 NÁUSEAS/ VÔMITOS Para uma melhor abordagem do tratamento deve-se compreender a ação dos principais antieméticos no bloqueio dos receptores de órgãos locais da complexa regulação do trato gastrointestinal e de mecanismos neurológicos centrais, fatores físicos e hormonais. Muitas medicações disponíveis desse grupo são combinadas em um mesmo efeito no seu receptor e isso poderia resultar em maiores efeitos colaterais e atrasar o controle do sintoma.1,4,15 78 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 6 - Controle de náuseas e/ou vômitos. Êmese induzida após quimioterapias, radioterapias e outras drogas: Antagonistas dos receptores de serotonina (5HT3): Ondansetrona VO/enteral/EV/SC: 0,15mg/ kg.dose 8/8h máx de 16 mg); Antagonistas de neuroquinina (NK1): Aprepitanto EV: 2-3mg/kg (dose máxima de 125 mg), avaliar antes e depois de uso de quimioterapias; Glicocorticóides: Dexametasona VO/enteral/IV/SC: 0,25 mg de 8/8h, até o máximo de 1mg; iniciar com 1mg, 3x/dia, até o máximo de 2mg 3x/dia, oral/enteral/ endovenos. 6-11 anos: iniciar com 2mg, 3x/dia, até o máximo de 4mg 3x/dia, oral/ enteral/endovenosa Em doenças que alterem o movimento (posturais/equilíbrio): anti-histamínicos e anticolérgicos: Meclizina VO/enteral: > 12 anos: 25- 100mg/dia; Dimenidrato VO/ enteral/EV/SC: 1,25mg/kg dose; Escopolamina VO/enteral/EV/SC: 0,3-0,6mg/kg (dose máxima de 1, 5mg/kg.dia); Em gastroparesia e pseudo-obstrução intestinal: Procinéticos- Agonista 5-HT4: Metoclopramida VO/enteral/EV/SC: 0,1-0,15mg/kg, até 3x/dia (máximo de 10 mg/ dose, 30mg/dia); Bromoprida VO/enteral/EV/SC: 0,5 -1 mg/kg de 8/8h, via oral/ enteral/EV; Antidopaminérgico periférico: Domperidona VO/enteral: 0,25 mg/kg de 8/8h antes das refeições. Em hipertensão intracraniana: Dexametasona VO/enteral/EV/SC: mesmas doses equivalentes de acordo com a idade ao uso de terapia induzida por medicações. 4,9,10 CONVULSÕES E AGITAÇÃO As agitações como as convulsões são sintomas de repercussões da patologia de base e a recidiva das crises pode estar associada a uma causa específica. Prioritariamente as medidas para o tratamento e o suporte prévio oferecido provavelmente farão grande diferença e parecem ter maior efetividade do que o resgate de bolus em si.4 79Cuidados Paliativos Pediátricos De qualquer forma, o controle das crises convulsivas segue o habitual em pediatria. Em contexto de final de vida, quando as crises se tornam acentuadas, a recomendação é o resgate apenas quando interferir na hemodinâmica ou em outro sintoma que possa angustiar as famílias. No caso que as famílias não conseguem tolerar quando as crises se tornam demasiadamente frequentes, muitas vezes é optado por fazer o resgate diversas vezes e essas crianças acabam sendo sedadas diante de uma agitação terminal ou com crises convulsivas recorrentes, necessitando de suporte de O2, acentuando a dispneia e sendo encaminhadas à UTI.4,16,17 Por consequência, quando não se tem um plano de cuidados defi- nidos e discutido previamente com a família, muitas crianças acabam sendo sujeitas a intubação e ventilação mecânica, pois dificilmente se consegue traçar planos de sedação paliativa antes do ocorrido. O tratamento das convulsões segue o protocolo de pediatria da instituição. DISTONIAS No tratamento das distonias, a investigação diagnóstica torna- se crucial, pois permite excluir patologias com tratamento específico, além da avaliação e identificação de outras desordens neurológicas e motoras.18,19 O tratamento consiste em medicações sintomáticas e objetivo é priorizar melhora funcional e da qualidade de vida. Também deve ser esclarecido que a titulação das medicações será gradual, e é necessário um teste terapêutico de 3 meses para esclarecer se a medicação é ou não eficaz. Nas crises agudas a recomendação é de benzodiazepínicos, como diazepam que promovem o relaxamento muscular em doses mais elevadas que as usadas para tratamento convulsivo (0,5mg/kg/ dose).18,19 80 Cuidados Paliativos Pediátricos Alguns procedimentos cirúrgicos podem ser indicados para o controle das distonias, incluindo bomba intratecal de baclofeno, toxina botulínica em casos mais avançados e difícil controle com medicações usuais. Uma abordagem de equipe multidisciplinar holística com fisioterapia, terapia e terapia de fala e linguagem (incluindo tecnologia assistida) devem ser implementadas para todos os pacientes 18,19. Quadro 7 - Tratamento das distonias - Baclofeno: 2,5-5mg 3x/dia até 30-40mg/dia. - Diazepam: 0,5mg/kg.dia em 3-4 tomadas ao dia. - Clonazepam: 0,01mg/kg.dia dividido em 3x/dia. - Levodopa: 1mg/kg.dia até 10mg/kg.dia - Clonidina: 1mcg/kg.dia até 20mcg/kg.dia - Triexifenidil 1-2 mg/dia (máximo < 10kg: 30mg/dia; > 10kg: 60mg/ dia) 18,19 INSÔNIA Quando a depressão ou a ansiedade são um fator responsável pela insônia, deve-se considerar a psicoterapia e o tratamento farmacológico, apesar de poucas evidencias na pediatria. Mudanças no estilo de vida, incluindo melhor higiene do sono e exercícios, mudanças no ambiente, podem ser úteis para melhorar o sono.1,9,20 A recomendação com amitriptilina em baixa dose pode ser útil como agente farmacológico para o tratamento da insônia em crianças com doenças terminais, principalmente se também houver dor neuropática.9 81Cuidados Paliativos Pediátricos Quando indicado clinicamente, o tratamento da dor persistente com uma infusão de fundo de opióides ou a preparação de opióides de liberação controlada oral melhorará o sono e minimizará a necessidade de analgesia inovadora. A melatonina também pode ser considerada, principalmenteem crianças com condições neurológicas e com ritmo circadiano alterado. Medicamentos sedativos mais fortes ou agentes psicoterapêuticos podem ser necessários em casos muito graves.9,20 SINTOMAS ORAIS A recomendação inicial do controle das mucosites se baseia na higiene bucal, a qual deve ser realizada com escovação dentária (com cerdas extramacias) com creme dental sem laurel e uso de soluções antissépticas (clorexidina 0,12% sem álcool). Idealmente deve ser realizada antes e durante o tratamento quimioterápico. Algumas soluções para mucosites que fazem parte do protocolo da instituição podem ser utilizadas, apesar de que muitas vezes os pacientes relatam desconforto. A alternativa mais propícia e que deve ser realizada por profissional habilitado inclui a laserterapia, indicando que contribui para a cicatrização e reparação do tecido lesado.21 Em relação a sialorréia, o controle medicamentoso (apesar de pou- cas evidências) pode ser realizado com medicações anticolinérgicas, dentre elas a atropina e a escopolamina. O sulfato de atropina 0,5% (na forma colírio/gotas) via sublingual, na dose de 1-2 gotas de 4-6h pode ter eficácia em pacientes com paralisia cerebral. A escopolamina, em uso inalatório, com doses de 0,5mg/kg/dose-3x/dia, na sua forma endo- venosa pode ter boa absorção e poucos efeitos colaterais. A via trans- dérmica pode ser uma opção interessante apesar do alto custo. A forma em gel de escopolamina (0,25mg/0,1ml) pode ser manipulada e deve ser aplicada massageando a região submandibular. Entre outras opções, te- mos a propantelina disponível em solução oral (1mg/ml), cápsula (15mg) para uso oral e gel (10 mg/g) para uso transdérmico auricular. 82 Cuidados Paliativos Pediátricos A aplicação da toxina botulínica pode ser uma alternativa e apresenta um bom perfil de segurança em pacientes encefalopatas. O tratamento cirúrgico está indicado em pacientes com sintomas refratários a opções terapêuticas anteriores, necessitando ser avaliado pela equipe especialista.22,23 EXTUBAÇÃO PALIATIVA Apesar dos questionamentos éticos que delimitam a extubação paliativa, o procedimento não é considerado prática de eutanásia, pois permite que a doença possa seguir seu curso natural, sendo respaldado pelo código de ética médica. Atualmente, o protocolo instituído por Affonseca e colaboradores (2019)24 apresenta uma série de etapas que devem ser rigorosamente seguida: 1) O processo de tomada de decisão (através do consenso entre a equipe, família e paciente, se possível), esclarecimento de todo protocolo a ser instituído e possíveis desfechos, além do estabelecimento de aspectos técnicos. 2) A preparação prévia, com otimização das medidas de conforto (controle de dor e dispneia), otimizar medidas de redução de secreção, acolhimento espiritual/religioso da família/paciente). 3) A fase operacional consiste na redução de parâmetros até fisiológicos (PEEP até 5, FiO2 até 21%, ventilação espontânea (FR 5-10 mrpm, com suporte ventilatório até PS 8-12, conforme idade e TOT). 4) Desconexão da VM e extubação do paciente (se tiver TQT, desconectar). 5) Encorajar a família a participar do cuidado. Esclarecer dúvidas da equipe previamente. 83Cuidados Paliativos Pediátricos 6) Paciente deverá ser continuamente reavaliado, com acompanha- mento integral da equipe de cuidados paliativos, devendo ser uti- lizado medicações para controle de sintomas dor e dispneia (os mais prevalentes - opióides e benzodiazepínicos). SEDAÇÃO PALIATIVA É a redução proposital e monitorada do nível de consciência, como último recurso, visando aliviar o sofrimento intolerável, decorrente dos sintomas refratários do paciente em terminalidade. Antes de iniciar a criança deve está sendo acompanhada por pediatras paliativistas e não apresentar outras possibilidades de terapias para o controle de sintomas refratários. A família deve ser comunicada, evidenciando o objetivo em questão do cuidado. Além disso a equipe multidisciplinar e de especialistas devem estar compactuadas, de modo que a perspectiva da criança e a experiência do sofrimento, suas crenças e desejos sejam valorizados. A droga de escolha nos protocolos gerais pediátricos é o midazolam (bolus de 0,03-0,05mg/kg e contínuo iniciando com 0,05mg/kg/h, titulando-se conforme os sintomas). Outras opções podem ser utilizadas até como adjuvantes como dexdetomidina, clonidina, antipsicóticos (levozine, neozine, clorpromazina), propofol, haloperidol, fenobarbital, tiopental). As medicações que auxiliam no restante do controle dos sintomas devem permanecer na prescrição, incluindo analgésicos. Outras medicações que não modificarão o desfecho clínico ou que estão opostas ao objetivo de cuidado poderão ser suspensas (devendo-se “higienizar” prescrição).25-27 A sedação paliativa deve ser abordada antes do contexto de terminalidade como estratégia futura dentro do planejamento de cuidados e diretivas antecipadas. Nesse contexto, a documentação de não reanimação deve ficar clara nos prontuários, além da descrição atualizada, objetiva e clara das conferências entre equipes e com os familiares.25 84 Cuidados Paliativos Pediátricos Seguindo os preceitos técnicos (indicação correta e dose correta), a sedação paliativa está de acordo com as resoluções do CFM (1805/2006 de 28/11/2006 e 1995/2012 de 31/08/2012 e com o código de Ética Médica (2018/2019). A sedação paliativa difere da eutanásia em relação a intenção e o processo. A primeira visa aliviar o sofrimento intolerável com doses individualizadas, tituladas e monitoradas (em geral, benzodiazepínicos), enquanto que a segunda visa a morte com doses fixas padronizadas de drogas letais (curares e barbitúricos).25 REFERÊNCIAS 1. Together for short lives. Basic Symptom control in paediatric pal- liative care. The Rainbows Children's Hospice guidelines, 2017. 2. Aidoo E, Rajapakse D. 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Fifteen-minute consultation: Approach to investigation and management of childhood dysto- nia. Archives of Disease in Childhood-Education and Practice, 2021, 106.2: p. 71-77. 19. Prestes AC, Bufara DC. Manejo e investigação das distonias. CE- NEP, 2022. 20. De Campos PF et al. A insônia na pediatria e as principais formas de abordagem diagnóstica e terapêutica. BrazilianJournalofDe- velopment, 2021. 21. Mendes HS, Quispe R. Mucosite oral. In. Ferreira, EALF; Barbosa SMM; Oliveira, SB. Cuidados Paliativos Pediátricos. 1ed.Medbook, 2023, p.123-128. 22. Volpon LC, Leite FA. Sialorréia. In. Ferreira EALF; Barbosa SMM.; OLIVEIRA SB. Cuidados Paliativos Pediátricos. 1ed.Medbook, 2023, p. 135-140. 23. Iglesias SBO et al. Gastrintestinais/ aspectos nutricionais. In: Zo- boli I, Iglesias S. Cuidados Paliativos: na prática pediátrica. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019. 24. Affonseca, CA et al. Extubação paliativa: experiência de 5 anos em um hospital pediátrico. Jornal de Pediatria, 2020, v. 96, p. 652-659. 25. Barbosa S. Sedação paliativa. In: Zoboli I, Iglesias S. Cuidados Pa- liativos: na prática pediátrica. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019. 26. Cassefo G, Issaka MFCA, Nakaema KE. Sedação Paliativa. In.: Car- valho et al (ed.). Manual da Residência de Cuidados Paliativos: Abordagem Multidisciplinar. 2ed., Manole,2022. 27. Davis D, Baker J. Care in the final hours and days. In: Goldman A; Hain R, Liben S (ed.). Oxford textbook of palliative care for chil- dren. Oxford university press,3ª ed., 2021, p. 353-360. 87Cuidados Paliativos Pediátricos Larissa Loiola Batista Maria Juliana Vieira Lima Fernanda Gomes Lopes Maria Líllian Maia Fernandes INTRODUÇÃO Os Cuidados Paliativos visam um cuidado holístico ao paciente e seus familiares, incluindo suas necessidades biológicas, psicológicas, sociais e espirituais. Portanto, a assistência deve ser integral, com articulação de diferentes categorias profissionais.1, 2 Torna-se importante, que cada componente da equipe tenha bons conhecimentos sobre sua área, e saiba trabalhar com outros profissionais, articulando saberes e ações em prol da qualidade de vida dos pacientes. O trabalho em equipe deve ser pautado na superação do modelo tradicional de equipe multidisciplinar, onde cada profissional atua de maneira independente, sem articulação com os demais, organizando- se a partir de uma relação vertical, com coordenação da equipe médica, mas sim no modelo interdisciplinar, que busca a manutenção de relações horizontais, com articulação de suas ações, promovendo a cooperação mútua, em prol de uma assistência integral através de diálogos e trocas.3 A Atuação em Equipe nos Cuidados Paliativos Pediátricos 8 88 Cuidados Paliativos Pediátricos EQUIPE DE CUIDADOS PALIATIVOS Conforme indicação do Manual da Residência em Cuidados Paliativos4, a equipe básica de cuidados paliativos deve ser composta por médico, enfermeiro, psicólogo e assistente social. Os demais profissionais, como fonoaudiólogo, nutricionista, odontólogo, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e farmacêutico são considerados como equipe estendida. Apesar dessa distinção, torna-se importante compreender a relevância de cada uma dessas categorias para uma assistência de qualidade, que abranja as múltiplas necessidades do sujeito. Na prática, o que se busca é um cotidiano de ações compartilhadas, com espaços de encontro formais e informais. A comunicação exige diálogo e cooperação para trocas efetivas de conhecimentos, ações e relações. Para tal, propõem-se a atuação através de um modelo colaborativo centrado no indivíduo. O modelo colaborativo permite uma interação horizontal entre os membros da equipe, observa a individualidade do paciente e das suas necessidades; preza por uma comunicação efetiva, dialogal e não violenta.5 Assim, na discussão e planejamento do plano de cuidados dos usuários, bem como na sua execução, é crucial considerar a atuação de toda a equipe interprofissional, com alinhamento das condutas e da comunicação. Tratando-se da especificidade de cada área no contexto dos Cuidados Paliativos, quem faz o quê? Preparamos esse breve resumo das atribuições de cada profissão, não no intento de reduzi-las a isso, mas de disparar reflexões e fomentar a necessidade de introduzir todos os membros da equipe no cuidado a nossos pacientes. • Médico → Diagnosticar, prognosticar e tratar visando conforto e qualidade de vida. 89Cuidados Paliativos Pediátricos • Assistente Social → Garantir acesso aos direitos sociais que influenciam o processo de adoecimento e cuidados. • Psicólogo → Minimizar o sofrimento decorrente do adoecimento e hospitalização, bem como processo de terminalidade. • Enfermeiro → Avaliação (prescrição, vias de acesso, pele, mucosa oral...) para controle de sintomas. • Fonoaudiólogo → Prevenção de agravos e promoção de cuidados orais. • Nutricionista → Realizar prescrição dietética e acompanhar nutricionalmente (conforto e não perfil nutricional). • Fisioterapeuta → Prevenção de agravos e promoção de conforto motor e respiratório. • Terapeuta Ocupacional → Estimulação sensorial, motora, perceptiva e cognitiva. • Farmacêutico → Orientação farmacoterápica e dispensação de medicamentos. • Dentista → Orientação bucal e laserterapia. Portanto, toda equipe deve ter como objetivo a qualidade de vida e a dignidade do processo de morrer dos pacientes e familiares. Permitir o alívio de sintomas, a prevenção de agravos e promoção de oportunidades para experiências significativas, como despedidas e fechamentos. 90 Cuidados Paliativos Pediátricos CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos cuidados paliativos, torna-se imprescindível a presença de diferentes profissionais para o cuidado integral do paciente. O conhecimento do que cada um realiza e a articulação de diferentes saberes demonstra ser um critério de qualidade do serviço assistencial. Portanto, para que sejam bem-sucedidos na realização de um bom trabalho em equipe, seus membros devem saber ouvir, interpretar e aproximar as diferentes linguagens profissionais, além de saber conviver de modo harmônico, respeitando-se as diferenças. REFERÊNCIAS 1. International Association for Hospice and PaliativeCare (IAHPC). Global Consensus basedpalliativecaredefinition. The Interna- tionalAssociation for Hospiceand Palliative Care. 2018; Houston, Texas Tradução para português feita por Cristiane Terz, Danielle Soler, Fernando Kawai, Helloisa Brogiatto João Batista Garcia, Lu- ciana Messaand Morgana Matos. 2. World Health Organization. National cancer control programmes: policies andmanagerialguidelines. Geneva: WHO, 2002. 3. Roqueteet al. Multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e trans- disciplinaridade: em busca de diálogo entre saberes no campo da Saúde Coletiva. R. Enferm. Cent. O. Min., 2012, v. 2, n; 3, p. 463-474. 4. Carvalho RT et al. (editores). Manual da Residência de Cuidados Paliativos: abordagem multidisciplinar. Barueri, SP: Manole, 2018. 5. Freitas Jet al. A formação profissional em saúde para o trabalho em equipe. In: MoreiraM. Casos clínicos interprofissionais: da teoria à prática clínica. Salvador: Editora Sanar, 2020, p. 33-41. 91Cuidados Paliativos Pediátricos Maria Juliana Vieira Lima Vanilla Oliveira Alencar Clara Monte Arruda INTRODUÇÃO Os cuidados paliativos pediátricos estão envoltos em questões de cunho psicológico que são de crucial relevância para o entendimento e seguimento dos casos. Deste modo, este capítulo versará sobre os aspectos do luto, da comunicação e da espiritualidade a fim de que possa ser um orientador para as condutas nas unidades, visto que tais aspectos podem ser identificados e, minimamente, manejados por toda equipe de saúde. LUTO A atuação na perspectiva da atenção integral convoca os profissionais que constituem equipes de cuidados paliativos a intervirem na assistência aos pacientes e familiares enlutados. Cabe, então, aos diferentes atores desse cuidado o dever de identificar Aspectos Psicológicos nos Cuidados Paliativos Pediátricos 9 92 Cuidados Paliativos Pediátricos e intervir nas respostas do luto que demandam atenção, visto a multidimensionalidade do cuidar, já que este não se encerra com a morte.1 O luto é um processo natural, universal e esperado, sem tempo pré-definido, vivenciado diante de situações de rompimento de uma relação significativa, em que haja morte ou não.2,3,4 Trata-se de uma resposta adaptativa frente a uma experiência de perda que desperta intensas transformações na vida de quem o vivencia. Tal processo consiste em uma experiência que engloba as diversas nuances da vida das pessoas, transpassado por aspectos biológicos, sociais, psicológicos, cognitivos e espirituais. A concepção do mundo presumido, seguro e confiável desloca-se para o imprevisível e ameaçador, diante da possibilidade da perda real, causando impactos significativos na vida dos que ficaram. O enlutado se vê diante de uma nova forma de vivenciar o mundo, agora sem a existência da pessoa, em um lugar desconhecido e inseguro, no qual precisará se readaptar. Para compreender o desenvolvimento desse processo é necessário que se conheça a história de vida do enlutado e o significado da relação que mantinha com o falecido. É um processo individual, pois a forma como foram construídos os vínculos com o que foi perdido e o modo como os mantém são características particulares. O processo de luto começa a se desenvolver a partir do momento em que o diagnóstico é assimilado, considerando as perdas reais e simbólicas que ocorrem na vida do paciente e sua família no decorrer do adoecimento. O luto antecipatório consiste em uma outra forma de apresentação do luto, na qual paciente e família experienciam as perdas graduais que surgem no decorrer da doença. Pode manifestar-se diante da perda da funcionalidade de um sujeito ativo e das modificações dos papéis familiares ocupados pelos envolvidos. 93Cuidados Paliativos Pediátricos Para algumas pessoas, o luto antecipatório pode ser um facilitador diante da iminência da perda real ou um complicador do luto pós-morte. O modo como o cuidado foi construído, bem como as relações estabelecidas entre a família e equipe de saúde são fatores fundamentais para o desenvolvimento do luto que antecipa a perda e a maneira como ele irá se desdobrar após a morte. Assim, as intervenções que ocorrem antes do falecimento do paciente possuem um caráter preventivo das complicações na elaboração do luto. Uma das formas de apreender as reações dos indivíduos frente às perdas é através do modelo e processo dual do luto, proposto por Stroeb e Schut.5 Os autores discutem sobre três dimensões que coexistem no processo de luto: orientação para a perda, orientação para o restabelecimento e oscilação. Consideram a existência de um processo que é caracterizado pelo dinamismo e pela oscilação e que regula o enfrentamento, como um movimento que vai e volta, através da flutuação do enlutado em momentos nos quais confronta ou evita as diferentes nuances do luto (Figura 1). Oscilação Contexto da vida diária Orientação para a perda Trabalho de luto Intromissão da dor Quebra dos laços/ recolocação Navegação/Evitamento das tarefas de restabelecimento Orientação para o restabelecimento Atender às mudanças da vida Fazer coisas novas Distração da dor Navegação/Evitamento da dor Novos papéis identidade/ relações Figura 1. Processo Dual do Luto. (Stroeb e Schut, 1999). 94 Cuidados Paliativos Pediátricos Parkes2 afirma que a dor da perda é o preço que se paga por amar alguém. Cuidar de pessoas que perdem um ente amado é se dispor a ocupar um lugar de acolhimento à dor e transformações significativas na vida dos que ficam. Compreender a família como foco do cuidado após a morte de um paciente requer treinamento e preparo dos profissionais da saúde que integram a equipe de cuidados paliativos para que sejam capacitados a conduzir de forma singular as especificidades de cada enlutado. COMUNICAÇÃO No contexto da saúde e, mais ainda, dentro da relação equipe- paciente-família, estamos nos comunicando a todo momento. É impossível não nos comunicarmos e, mesmo nas situações em que não desejamos, transmitimos alguma mensagem através dos nossos comportamentos, seja de forma intencional ou não.6 O processo de comunicação envolve a troca de mensagens que partem de um emissor e são direcionadas a um receptor que, por sua vez, deverá interpretá-las. Portanto, pode ser entendido como um processo interativo, dinâmico e interpessoal, através do qual nos socializamos e compartilhamos informações e experiências. A comunicação ocorre de forma verbal e não verbal, o que quer dizer que ela engloba tanto aspectos do conteúdo que é compartilhado por meio de palavras, mas também por elementos não verbais, como expressões faciais, postura, tom de voz, entre outros. Quando compartilhamos uma informação com alguém, é comum acreditarmos que a outra pessoa compreendeu a mensagem exatamente da forma como gostaríamos. Entretanto, muitas vezes isso não se confirma, já que diversos elementos podem se estabelecer entre a informação que é compartilhada, o emissor dessa informação e a pessoa que a recebe, e acabar funcionando como ruídos que comprometem a interpretação e compreensão da mensagem. 95Cuidados Paliativos Pediátricos Uma comunicação é eficaz quando a compreensão de quem recebe uma mensagem é exatamente a mesma da intenção de quem a compartilhou.6 Na área da saúde, reconhecemos que uma comunicação eficaz envolve mais do que informar sobre o estado atual de um paciente, pois inclui a necessidade de escutar e acolher as emoções diante dessas informações, respeitar e aceitar os sentimentos expressos e esclarecer dúvidas que surgem nesse processo. Na relação com pacientes em cuidados paliativos, pode ser frequente a necessidade de os profissionais de saúde compartilharem e trocarem informações com o paciente e com seus familiares. Quando estas notícias apresentam potencial de alterar de forma negativa a expectativa que aquelas pessoas têm sobre o futuro do paciente7, elas passam a ser entendidas como uma notícia difícil. A comunicação de um óbito ou de prognóstico reservado são exemplos de notícias difíceis e, por isso, tornam mais importante ainda o estabelecimento de uma comunicação eficaz, cuidadosa e acolhedora. É importante considerar que uma notícia, por si só, não necessariamente é recebida com o mesmo impacto ou determina as mesmas reações entre as pessoas que a recebem, porque isso está intimamente relacionado com os aspectos psicossociais de cada indivíduo. Diante de notícias difíceis ou de um processo de luto, muitos profissionais podem perceber dificuldades no momento de estabelecer o contato com o paciente e/ou seus entes queridos, ou até mesmo acreditar que esse contato pode acarretar ainda mais sofrimento para aquelas pessoas. Nesse contexto, o momento da comunicação também poderepresentar uma situação estressora para muitos profissionais, principalmente para aqueles em que as notícias difíceis são frequentes. Entretanto, quando se estabelece uma relação que permite que as pessoas envolvidas possam expressar suas dúvidas e anseios e tenham suas emoções respeitadas, o efeito que se tem é justamente o oposto: a percepção de segurança e confiança no processo de cuidado. 96 Cuidados Paliativos Pediátricos Algumas estratégias podem nos ajudar a estabelecer uma relação favorável no momento da comunicação, tanto em seu aspecto verbal como não-verbal. O momento da comunicação pode ser planejado levando-se em conta alguns desses aspectos: Aspectos Verbais Aspectos Não-Verbais • Utilizar-se de linguagem simples e clara, adaptada à forma de com- preensão de cada pessoa. • Tecnicismos e eufemismos são evi- tados. • O ponto de partida da comunicação é a compreensão da família e/ou pa- ciente, ou seja, o que ela já sabe. • Comunicar de forma gradual • A utilização de analogias e metáforas pode ser facilitadora, com o cuidado do tipo de comparação que poderá ser feita e com respeito à situação e ao paciente. • Atitudes coerentes com a mensa- gem que estamos transmitindo a nível verbal. • Encontrar um ambiente seguro, com menos barulho e possibilidade de to- dos acomodarem-se sentados. • Estabelecer tom de voz tranquilo, calmo. • Realizar pausas e adaptar o ritmo conversa à compreensão dos fami- liares e/ou paciente. • Pode ser favorável apresentar uma postura corporal aberta (evitando manter braços e pernas cruzadas, por exemplo). • Dispor de lenço de água. Através desses e outros elementos, somos capazes de comunicar nosso interesse, transmitir segurança e honestidade e nos mostrarmos disponíveis para oferecer suporte às pessoas envolvidas no cuidado com crianças e adolescentes em cuidados paliativos. 97Cuidados Paliativos Pediátricos ESPIRITUALIDADE Considerando o princípio básico dos cuidados paliativos de zelar pelos aspectos biopsico sócio espirituais dos pacientes, ressaltamos aqui as possibilidades de atenção e cuidado com a dimensão espiritual; cabendo esta não apenas aos religiosos, mas à toda equipe de saúde. De antemão, vale ressaltar a diferença de compreensão dos conceitos de espiritualidade e religiosidade. A espiritualidade trata- se de algo mais amplo que diz respeito à relação do sujeito com o que é sagrado e divino para ele. A religião, por sua vez, é um sistema de crenças, rituais e símbolos organizados para promover uma aproximação dos sujeitos com o divino.1 Nota-se que, mesmo sendo um importante aspecto constituinte dos indivíduos, abordar o cuidado espiritual na área da saúde ainda é um tema de difícil manejo. Isso se deve a algumas noções equivocadas, tais como: entendimento de que só quem cuida da dimensão espiritual é um religioso, preconceitos e prejuízos em torno de religiões; além de não haver formação adequada acerca do tema para os profissionais da saúde. Ressalta-se que estamos falando da relação com o sagrado e com o que é importante para cada um, então, esse deve ser um espaço livre de julgamentos e com permissão para vivências que façam sentido para os pacientes e seus familiares. No público pediátrico é importante considerar a existência de possibilidades para poder abordar a família e traçar planos de cuidado que abarquem a espiritualidade. As famílias podem ser abordadas com algumas perguntas norteadoras: • O que é sagrado para eles? • A família acredita em Deus? • A família tem alguma religião? 98 Cuidados Paliativos Pediátricos • Gostariam de realizar algum ritual na unidade, tais como batismo, benção, unção ou oração? • Gostariam de trazer algum religioso para realizar um momento na unidade? • Há algum desejo que o paciente e/ou a família gostariam de realizar? • De que forma nossas unidades podem proporcionar o cuidado à dimensão espiritual de modo que a família se sinta confortável e acolhida? De posse dessas informações, a equipe pode planejar e realizar momentos que façam sentido para seus usuários. Lembrando aqui da necessidade máxima de respeito a todas as religiões e credos. Vale destacar também no momento do óbito ou do processo ativo de morte, a importância dos rituais de despedida. Estes são rituais de passagem que servem para materializar a perda, favorecendo um processo de luto mais adaptativo para a família e possibilitando uma morte digna para os pacientes. Deste modo, é importante que nossas unidades permitam que esses rituais aconteçam e que as famílias possam despedir-se dignamente dos seus filhos. Nesses momentos, pode ser possível: • pôr uma roupa especial na criança, • tocar uma música significativa, • permitir que a criança vá para o colo dos genitores, • ampliação no horário de visita, • vinda dos irmãos da criança, e • presença de pessoas significativas ao redor do leito. Essas ações são alinhadas com toda a equipe (assistente e de cuidados paliativos) e a família. São momentos de grande emoção e importância para o fechamento e elaboração da perda. 99Cuidados Paliativos Pediátricos CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao abarcar os aspectos psicológicos em torno dos cuidados paliativos neste capítulo, objetivamos desmistificar e trazer à tona os temas para que toda equipe de saúde pudesse ter acesso aos seus conteúdos, facilitando, assim, a identificação de demandas e o manejo adequado com o cuidado ao paciente e seus familiares. REFERÊNCIAS 1. Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de Cui- dados Paliativos. 3 edição. Rio de Janeiro: Atheneu; 2021. 2. Parkes CM. Amor e Perda: as raízes do luto e suas complicações. São Paulo: Summus; 2009. 3. Franco MHP. Luto no século 21. São Paulo: Summus; 2021. 4. Casellato G (org.). Luto por perdas não legitimadas. São Paulo: Summus; 2020. 5. Stroebe M, Schut H. The Dual Process ModelofCopingwithBerea- vement: RationaleandDescription. Death Studies. 1999; 23(3): 197- 224. 6. Segovia C, Serrano M. Comunicação em Situações Críticas. Porto Alegre: Hospital Moinhos de Vento; 2017. 7. José S et al. A comunicação de notícias difíceis acerca da aborda- gem aplicada à oncologia: uma revisão bibliométrica. Research, SocietyandDevelopment. 2020; 9 (9): e569997570-e569997570. 100 Cuidados Paliativos Pediátricos Aspectos sociais em cuidados paliativos pediátricos 10 Larissa Loiola Batista Benedita Beatriz Elias Dias Jamile Silva de Oliveira Castro Queiroz INTRODUÇÃO Os pacientes em cuidados paliativos pediátricos perpassam por diversos desafios inerentes ao adoecimento. Para além da questão clínica, emergem fatores sociais, econômicos e psicológicos que permeiam a vida dos indivíduos. Ao considerar que a equipe de paliação surge em prol de aliviar sofrimento e promover qualidade de vida, é importante trazer à tona os aspectos sociais que causam inquietações nos pacientes e em suas famílias e como a equipe multiprofissional pode contribuir para intervir na dor social fruto do adoecimento.¹ ASPECTOS SOCIAIS NO PROCESSO DE ADOECIMENTO Ao compreender que a vulnerabilidade social e o contexto de violação de direitos - cenário no qual parte considerável da população 101Cuidados Paliativos Pediátricos brasileira está inserida - são fontes causadoras de sofrimento das famílias e pacientes acompanhados pela equipe de cuidados paliativos, é importante atentar o olhar para as nuances da realidade social, permeada pela dificuldade de acesso às políticas públicas e as diversas configurações familiares. Deve-se levar em consideração os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus elementos de risco na população, também conhecidos como determinantes sociais na saúde.1 É necessário compreender as condições de vida do paciente a fim de que a intervenção daequipe estabeleça nexo entre essa realidade, os riscos de agravamento do adoecimento e as indicações de tratamento. Nesse contexto, a atuação da equipe de cuidados paliativos deve ser baseada no acolhimento e na escuta ativa das demandas das famílias, na intenção de conhecer as dinâmicas intrafamiliares e as possibilidades e limites emergentes em tal meio, em convergência com as possíveis articulações intersetoriais em prol de promover acesso à serviços e políticas. Para além de uma visão biológica do paciente, deve-se ter um olhar crítico para os aspectos sociais que estão envolvidos no processo de saúde e doença. 1) Organização familiar; 2) Renda familiar; 3) Acesso à educação, transporte, saneamento, habitação; 4) Rede de apoio social e familiar; 5) Acesso à serviços de saúde do território; 6) Espiritualidade e cultura; 7) Vulnerabilidade ou risco social. 102 Cuidados Paliativos Pediátricos Desse modo, os cuidados paliativos e os aspectos sociais que os envolvem devem ser compreendidos também na perspectiva de distintas questões sociais que estão associados a doenças que ameaçam à vida. Estas, encontram-se distantes de uma abordagem isolada e centrada em apenas um aspecto do adoecimento. O conhecimento desses aspectos por parte dos profissionais pode contribuir para ampliação e fortalecimento das redes de apoio social e auxílio efetivo no cuidado à criança em condição crônica, por meio de um plano de cuidados que busque melhorar sua qualidade de vida tanto no início quanto no curso da doença.² Portanto, é fundamental que a equipe interdisciplinar esteja atenta aos condicionantes sociais para compreender melhor a limitação das famílias e planejar de acordo com cada realidade as possibilidades de intervenção.3 A compreensão das diversas organizações familiares e de suas realidades, além do conhecimento das redes intersetoriais e das possibilidades vigentes de articulação, são potencialidades exercidas pela equipe de cuidados paliativos que tornam possível refletir e engajar o processo de desospitalização de pacientes acompanhados, considerando o ambiente doméstico-familiar um espaço de promoção de convivência social e qualidade de vida. REFERÊNCIAS 1. Buss PM, Pellegrini Filho A. (2007). A saúde e seus determinantes sociais. Physis: revista de saúde coletiva, 17, 77-93. 2. Cavalcanti PB, Saturnino CIN, Miranda APRS de. Serviço social e cuidados paliativos. Serv. Soc. e Saúde [Internet]. 26º de setembro de 2019 [citado 24º de julho de 2022];18:e019005. 3. Carvalho, RT. et al. Manual da residência de cuidados paliativos. BARUERI: Manole, 2018. 1004p. 103Cuidados Paliativos Pediátricos Desospitalização pelo PAD11 Flávia Dias Silveira Natasha Simões Montenegro Mello ‘’Desospitalização’’ era um termo até então desconhecido, até surgir a necessidade de proporcionar um destino digno aos usuários moradores dos hospitais, e consequentemente melhorar a gestão dos leitos hospitalares. Nesse caminhar, o conceito tomou forma e consolidou-se, deixando de ser o simples ato de transferir o cuidado com o paciente em hospital para o domicílio, e passou a se organizar de maneira integrada, multidisciplinar e coordenada em rede, um processo que vai do momento da admissão hospitalar até os cuidados de fim de vida. O Programa de Assistência Domiciliar (PAD) foi fundado em julho de 2000 com o objetivo de desospitalizar crianças e adolescentes de 0 a 17 anos com necessidades especiais, de modo que haja um cuidado continuado, realizando atendimento multidisciplinar em domicílio. Atualmente o PAD conta com uma equipe multiprofissional composta por médicos pediatras, cirurgião pediátrico, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, fonoaudiólogo, assistente social e motoristas. 104 Cuidados Paliativos Pediátricos O programa tem como metas, principalmente, a desospitalização segura dos pacientes portadores de doenças crônicas que necessitam de cuidados continuados no domicílio; reinserir o paciente sob cuidados especiais no seu contexto familiar, e dar assistência multidisciplinar humanizada, visando a integralidade e ao respeito à singularidade da criança sob seus cuidados. Diante do cenário, pode-se afirmar que a desospitalização se insere no processo de cuidar, na educação em saúde, no cuidado integral, na gestão de leitos, no planejamento para alta, na humanização e tem como protagonista o paciente. O princípio de uma assistência domiciliar pressupõe de 3 grandes desafios: manifestação do desejo da família e do paciente de ser assistido em casa, conhecimento sobre os critérios para inclusão na assistência domiciliar, definição da modalidade de assistência domiciliar que o paciente se enquadra. O PAD se enquadra no modelo de assistência domiciliar AD2 (Quadro 1). Apesar dos critérios gerais para modalidade da assistência domiciliar, o PAD apresenta seus próprios critérios de inclusão (Quadro 2), que foram definidos ao longo dos últimos 20 anos de experiência do programa. 105Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 1 - Modalidades de assistência domiciliar Modalidade Perfil do usuário Permanência AD1 Problemas de saúde controla- dos / compensados Habitualmente continua Dificuldade física de locomoção até a unidade de saúde Necessidade de cuidados de menor complexidade, incluindo recuperação nutricional, de me- nor frequência, com menor ne- cessidade de recursos de saúde Dentro da capacidade de atendi- mento das UBS AD2 Problemas de saúde e dificulda- de física de locomoção até uma unidade de saúde Habitualmente tem- porária, pode ser contínua, se não houver estabilização suficiente para cui- dados em AD1 Necessita de maior frequência de cuidado, recursos de saúde e acompanhamento contínuo, até estabilização do quadro Necessidade de, pelo menos, uma visita por semana AD3 Semelhante ao AD2, mas que faça uso de equipamentos / pro- cedimentos especiais Habitualmente contínua 106 Cuidados Paliativos Pediátricos Quadro 2 - Critérios de inclusão do PAD HIAS Estar internado no HIAS Crianças 0-17 anos portadores de doenças crônicas que necessitem de cuidados continuados (gastrostomia; sonda enteral; traqueostomia; dependência de oxigenioterapia; cuidados paliativos exclusivos, etc.) Estabilidade clínica (ausência de intercorrências graves < 7 dias; necessidade de baixo fluxo de o2 <4l/min, ausência de infecção) Pelo menos 2 cuidadores passíveis de treinamento Residência em Fortaleza Aceitação do programada pela família (assinatura do termo de adesão ao PAD) Em setembro de 2020, o PAD passou por uma restruturação, sendo feita uma ampla divulgação do trabalho da equipe. Nessa ocasião, as equipes da assistência hospitalar do HIAS receberam as orientações quanto ao processo de inclusão dos pacientes com perfil PAD. Então a desospitalização segue em etapas, primeiro a identificação do paciente que preencha critérios que se enquadrem no programa. Desde então, a coordenação do PAD faz busca ativa semanal dos pacientes com tal perfil no HIAS; seguindo de articulações intra-hospitalar com os médicos da assistência visando planejar a viabilização da alta das crianças sinalizadas. Médico e enfermeiro da assistência preenchem a Ficha de Inclusão do PAD, anexando a esta o relatório de alta, documentos, receitas e prescrição para domicílio, além de relatório para oxigenoterapia e parecer dos cuidados paliativos, caso existam. Ainda no prazo de até 48horas, a equipe do PAD executa o primeiro contato com a criança e os familiares responsáveis, agendando o treinamento sobre os cuidados no domicílio, estabelecendo o início do vínculo com paciente, família e cuidadores, quando estabelecem planos de cuidados presentes e futuros após a alta. Além da entrevista com assistente social do programa e assinatura dos termos de adesão ao PAD. 107Cuidados Paliativos Pediátricos Após resolvidas estaspendências iniciais, a equipe do PAD, juntamente com a equipe da assistência, faz o checklist necessário para alta hospitalar (Quadro 3). Quadro 3 - Checklist para alta hospitalar Verificar compreensão do cuidador sobre o programa Assinatura do Termo de Adesão ao PAD Avaliação da assistente social do PAD Treinamento dos cuidadores, estando aptos ao cuidado em domicílio Orientação sobre recebimento de medicamentos e insumo Solicitação de locação do oxigênio domiciliar quando necessário. Atualmente só vão para o domicílio após testarem pelo menos 24h o concentrador de oxigênio no hospital, sendo verificada manutenção da saturação de O2. Solicitação do transporte até o domicílio pela equipe assistente. Estando em domicílio, as crianças são visitadas pela equipe multidisciplinar de acordo com a demanda específica de cada uma. Em geral, as visitas médicas ocorrem a cada 15 dias, as de fisioterapia semanalmente, de enfermeiros, técnicos de enfermagem e fonoaudiologia de acordo com o plano e a estratégia de cuidados individual. Além do atendimento clínico, dispõe também de cirurgião pediátrico que pode realizar avaliação e troca de traqueóstomos (a cada 3 meses) e de gastrostomias (mensal) em domicílio. Juntamente com o cirurgião, há enfermeiro especializado em estomatoterapia, prestando cuidados de ostomias e lesões de pele, além de orientações de cuidados possíveis de serem realizados pelos cuidadores. 108 Cuidados Paliativos Pediátricos Há também os critérios para alta do PAD, ou seja, são as vias de saída do PAD, são eles: 1) Estabilidade clínica, sem reinternações nos últimos 3 a 6 meses, com insumos e dieta judicializadas, com possibilidade de acompanhamento mensal em domicílio (transferência para Melhor em Casa); 2) Pacientes com 17 anos e 6 meses a 18 anos, que ainda necessitam de assistência no domicílio (transferência para SAD Messejana); 3) Pacientes pequenos ou locomoção preservada, com possibilidade de seguimento multidisciplinar ambulatorial, com dieta e insumos judicializados (alta para o ambulatório do paciente crônico e para o ambulatório das especialidades). A beleza da assistência domiciliar está no cuidado humanizado e integral à criança doente, viabilizando sua estadia em casa de forma segura. Atualmente o PAD tem ampliado sua esfera de cuidados, acolhendo também crianças em cuidados paliativos exclusivos, proporcionando-lhes um fim de vida com mais conforto nos seus lares ao lado de seus familiares. Além disso, após a restruturação do PAD em setembro de 2020, foi instituída uma rede de apoio, a criação do ambulatório de atendimento ao paciente crônico, para o qual são encaminhadas as crianças que já não necessitam da assistência da equipe no domicílio e que podem receber alta do programa para acompanhamento e atendimento ambulatorial. Realizadas parcerias com outros programas de atendimentos domiciliares (Melhor em Casa, SAD de Messejana), para os quais são encaminhadas as crianças que já não demandam tantos cuidados em domicílio, estáveis, sem reinternações frequentes, ou que já estejam próximo aos 18 anos. 109Cuidados Paliativos Pediátricos A equipe do PAD entende que o processo de desospitalização não é simples, mas com a organização de suas ações é possível contribuir para a otimização dos leitos hospitalares, a diminuição de reinternações desnecessárias, o aprimoramento e planejamento de estratégias de cuidados individualizadas em conjunto com as famílias, e fortalecer os vínculos entre profissionais, pacientes e famílias, sendo capaz de transformar a vida de muitas famílias. Apesar dos desafios enfrentados diariamente, a recompensa vem da alegria de ver essas crianças vivendo, no sentido mais completo da palavra, em seus lares. REFERÊNCIAS 1. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica - Caderno de Atenção Domiciliar. Brasília: Ministério da Saúde. 2013. 2v. 2. Ministério da Saúde - Desospitalização: Reflexões para o cuidado em saúde e atuação multiprofissional. Brasília: Ministério da Saúde. 2020. 3. Ministério da Saúde - Modalidades de Atenção Domiciliar. Julho/2021. (www.gov.br) 110 Cuidados Paliativos Pediátricos Desospitalização sob o PAVD 12 Cristiane Rodrigues de Sousa Jamille Fernandes Carneiro Marta Maria Sampaio Serrano As condições crônicas complexas têm ganhado destaque no cenário pediátrico como consequência das conquistas técnico- científicas, com maior sobrevida dos doentes. As crianças e adolescentes portadores de tais condições possuem necessidades especiais de saúde, como o uso de tecnologia, cuidados de equipe multidisciplinar e o uso frequente dos serviços de saúde. A dependência de tecnologia corresponde ao uso de um dispositivo e/ou equipamento, como traquéostomo, sonda de gastrostomia e o suporte ventilatório, tanto na modalidade invasiva como não-invasiva, para suprir a deficiência física associada a dependência de qualquer um destes dispositivos para compensar a perda de uma função orgânica vital. Normalmente o fluxo percorrido pelos pacientes com condição crônica complexa envolve longos períodos de internação, principalmente quando há dependência tecnológica. A necessidade de suporte ventilatório muitas vezes resulta em internação de longa permanência em leito de terapia intensiva, estando distante dos familiares e dificultando a rotatividade dos leitos de UTI para pacientes agudamente doentes. 111Cuidados Paliativos Pediátricos As vantagens da transferência do paciente para um leito de cuidados intermediários e posteriormente a desospitalização são inúmeras, incluindo menor custo para o Hospital e a liberação de um leito de uti, além de permitir o contato próximo com o cuidador principal, de forma que seja permitido o aprendizado sobre a melhor forma de cuidar desse perfil de paciente, podendo-se então iniciar a organização do processo de uma futura internação domiciliar. Os avanços tecnológicos extrapolaram o ambiente hospitalar e a ventilação mecânica em domicilio surgiu como uma alternativa real e efetiva no manejo dos pacientes dependentes de ventilação mecânica. Experiências exitosas mostram que a desospitalização com assistência ventilatória domiciliar apresenta poucas complicações quando bem acompanhada por equipe multidisciplinar. Os pacientes com doença neuromuscular podem receber suporte ventilatório invasivo ou não invasivo. A seleção do tipo de ventilação depende do quadro clínico, principalmente em relação a progressão da doença. Entende-se a desospitalização como a retirada do paciente do ambiente hospitalar de forma segura e responsável, com base em um minucioso processo de planejamento, quando o paciente já não é mais de alta complexidade e sim de alta dependência, contando com a família protagonizando o processo de cuidado no domicílio, sob o apoio da Rede de Atenção à Saúde. A oportunidade do acompanhamento domiciliar possibilita a reinserção social e a integração ao ambiente familiar, permitindo uma melhoria na qualidade de vida dessas crianças e de suas famílias. A desospitalização deve garantir a continuidade dos cuidados assistenciais no domicílio do paciente. Para que isso ocorra, é necessário seguir o protocolo de indicações de desospitalização de cada hospital objetivando uma alta segura. Incluem-se como pré-requisitos para internação domiciliar: • Estabilidade clínica por no mínimo 2 semanas; 112 Cuidados Paliativos Pediátricos • Compromisso e treinamento dos cuidadores; • Assistência domiciliar por equipe multidisciplinar, com equipe mínima composta por pediatra, enfermeiro, fisioterapeuta, nutri- cionista e assistente social. Além disso, ressalta-se a importância de acompanhamento com psicólogo, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e odontólogo. ASSUNTOS QUE DEVEM SER ABORDADOS NO TREINAMENTO DO CUIDADOR • Conhecimentoda doença – quadro clínico principal, sinais clínicos de infecção e piora clínica, sinais de perigo iminente e progressão da doença; • Cuidados com o manuseio do paciente – lavagem das mãos sempre antes e depois do manuseio, postura no leito e uso de artifícios, como coxins e talas ortopédicas; • Higiene – cuidados de banho e higiene pessoal; • Aspiração de vias aéreas e do traqueóstomo – quando e como realizar (técnica de aspiração e material utilizado); • Cuidados com a traqueostomia – limpeza do estoma, técnica para recolocação da cânula traqueal em caso de deslocamento acidental ou substituição por obstrução ou ruptura da cânula, reconhecimento de possíveis complicações como saída de secreção, granuloma e obstrução; • Cuidados com a gastrostomia – limpeza do estoma, procedimento na substituição da sonda em caráter de urgência (exteriorização acidental ou obstrução), reconhecimento de possíveis complica- ções como infecção de pele, dor à infusão de dieta, granuloma, obstrução; 113Cuidados Paliativos Pediátricos • Manuseio da bolsa autoinflável – manuseio no auxílio à tosse e eliminação de secreções, utilização nas intercorrências (queda de saturação e/ou defeito do ventilador mecânico); • Manuseio do ventilador mecânico – cuidados com circuito e filtros, compreensão da tela de configuração (parâmetros e alarmes), utilização da bateria e procedimento nos casos em que o equipamento apresentar defeito; • Oxigênio – necessidade de uso, cuidados com o cilindro e montagem do sistema para fornecimento do oxigênio; • Medicações – indicações clínicas dos medicamentos prescritos, posologia, preparação e administração por sonda de gastrostomia; • Alimentação – preparação da dieta enteral, volume, forma de administração e intervalos; • Material médico-hospitalar - quantidade e regularidade da distribuição dos materiais, bem como utilização correta e armazenamento. CRITÉRIOS DE DESOSPITALIZAÇÃO PELO PAVD Para solicitação de inclusão no Programa de Assistência Ventilatória Domiciliar (PAVD) do HIAS, o paciente que possui dependência de ventilação mecânica invasiva ou não invasiva deve residir em Fortaleza e ter dois cuidadores. A solicitação de inclusão no PAVD é preenchida em formulário específico e enviado para análise da coordenação médica e técnica do programa, para avaliar se o paciente apresenta perfil clínico e social adequados para inclusão. A análise criteriosa da condição clínica e das necessidades de suporte, além das condições sociais e do contexto familiar é uma etapa fundamental do processo. A avaliação pré-admissional deve incluir a análise das condições de residência e orientações quanto a ambiência ideal para o 114 Cuidados Paliativos Pediátricos cuidado do paciente. O domicilio deve se localizar em área segura e de fácil acesso à equipe de saúde e ao serviço móvel de urgência caso seja necessária uma possível reinternação. Durante a formação do vínculo com a equipe assistente e com a equipe do acompanhamento domiciliar, são propostas ações e conferências familiares visando a melhoria das condições de saúde e dos contextos familiares e sociais necessários para um processo de desospitalização seguro. É solicitado, após estabilidade clínica, transferência da UTI para a Unidade de Pacientes Especiais (UPE), unidade de cuidados intermediários onde será realizada a transição para o domicílio. O período de permanência na Unidade de treinamento é de extrema importância para o sucesso da desospitalização, pois permite o treinamento dos cuidadores sob supervisão da equipe multidisciplinar, além do conhecimento da doença e o reconhecimento de sinais de piora clínica que necessitam de intervenção. Durante o período em que é realizado o treinamento dos cuidadores, é iniciada a adaptação do paciente ao ventilador mecânico portátil que será usado no domicílio, objetivando equilíbrio dos parâmetros ventilatórios e estabilidade clínica do ponto de vista respiratório. Esse equipamento deve possuir bateria interna e externa, peso que permita transporte manual, tela com configuração em idioma nacional e locação de Empresa que permita assistência técnica 24 horas/dia. Além disso, deve-se solicitar e disponibilizar os equipamentos e acessórios, como oxímetro de pulso com sensor compatível com a faixa etária do paciente, cilindro de oxigênio (para uso em caso de intercorrências), aspirador de secreção e nebulizador. Diante de dependência de oxigênio será necessário uso de concentrador de oxigênio. Os cuidadores devem ser informados dos riscos e da evolução da doença durante o período de transição para o domicílio, com registro em termo de consentimento livre e esclarecido. 115Cuidados Paliativos Pediátricos ROTINA DE VISITAS DO PACIENTE ACOMPANHADO PELO PAVD • Fisioterapeuta: Fisioterapia Respiratória e Motora 2-3 x /semana ou a depender da presença de intercorrências; • Enfermeiro (a): 1 x semana; • Pediatra: visita médica a cada 15 dias ou a depender da presença de intercorrências; • Nutricionista: visita mensal, com mensuração do peso e cálculo das necessidades nutricionais dos pacientes; • Assistente social: acompanhamento de demandas sociais do paciente e da família; • Cirurgião pediátrico: troca de gastrostomia 6/6 meses e traqueostomia 3/3 meses ou a depender da necessidade. A monitorização do paciente é realizada por oximetria de pulso e pela tela de monitorização do ventilador mecânico, que mostra os parâmetros atingidos pelo paciente de modo contínuo. O cuidador precisa estar disponível para o cuidado contínuo. Dessa forma, entende-se a importância da presença de dois cuidadores habilitados no cuidado desse paciente, de forma que na ausência de um deles, por exemplo em situações de adoecimento, pode-se confiar o cuidado ao outro responsável capacitado. Além disso, ressalta-se a importância do suporte psicossocial para essa rede de apoio, de forma que se sintam seguros e acolhidos. Pela condição de dependência tecnológica, os pacientes podem permanecer em internação domiciliar por muitos anos. Para avaliar a eficiência e a qualidade da assistência domiciliar, são acompanhados os indicadores de infecção, hospitalização e óbito. Além disso, ressalta-se que a disponibilização de leitos de terapia intensiva para pacientes com quadros clínicos graves, portadores ou não de condições 116 Cuidados Paliativos Pediátricos crônicas complexas, mas agudamente doentes tem grande impacto na assistência hospitalar especializada. REFERÊNCIAS 1. Briassoulis G,Filippou O,Natsi L,Mavrikiou M,Hatzis T.Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. Q J Med 2004;97;504-518 2. Fortaleza-Ceará. Portaria SESA/CE nº 1790. Diário Oficial do Estado do Ceará.Fortaleza,10 de outubro de 2007;série 2 ;Ano X ;nº193. Institui o Programa de Assistência Ventilatória Domiciliar - PAVD do Hospital Infantil Albert Sabin e dá outras providências 3. Falkson,S; Knecht,C; Hellmers,C ;Metzing,S. The Perspective of Families with a Ventilator - Dependent Child at Home. A Literature Review. Journal of Pediatric Nursing 36 (2017) 213-224 4. Macauley,R. To trach or not to trach, that is the question. Paediatric Respiratory Reviews 29(2019)9-13 5. Moreira,MCN;Albernaz,LV;Sá,MRC;Correia,RF;Tanabe,RF. Recomendações para uma linha de cuidados para crianças e adolescentes com condições crônicas complexas de saúde.Cad. Saúde Pública 2017;33(11)e00189516 6. 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A dificuldade em estimar o prognóstico dessas patologias (períodos estáveis intercalando com períodos instáveis) pode permear dúvidas em relação ao planejamento de cuidados.1,2 Em geral, o pediatra não consegue responder aos pais quanto tempo uma criança nessas condições tem para viver. Isso decorre de muitas alterações e complicações imprevisíveis. Muitos fatores como infecção e evolução para sepse, insuficiência respiratória, podem causar alterações e deixar sequelas importantes. A própria progressão de doença pode levar a outras comorbidades, mas diferente dos adultos, muitos dos órgãos estão estáveis e bem funcionantes garantindo uma boa recuperação, até mesmo o câncer em condições de quimioterapia agressiva, pode haver reversão de muitos sintomas a longo prazo.1-3 É imprescindível avaliar a linha de base clínica daquela criança, principalmente aquelas com sequelas neurológicas importantes, além dos eventos clínicos anteriores e a progressão geral de sua condição.4 118 Cuidados Paliativos Pediátricos No entanto, muitos sinais de deterioração podem surgir e indicar o processo de morte. Nesse sentido, a família deve ser antecipada sobre tais situações, as quais podem implicar num processo que impede a reversibilidade e permitir que sejam abordadas de forma realista suas "esperanças e desejos" enquanto se preparam para as últimas horas e dias de vida da sua criança.2,4,5 A fase final de vida é definida pela literatura como as últimas duas semanas de vida, a última semana ou as últimas 48h de vida. A terminologia defende que nessa fase avançada e irreversível, o paciente entra num estado catabólico acelerado. O estado catabólico ocorre em razão da ação de várias citocinas, principalmente de interleucinas (IL-1 e IL-6) e fator de necrose. Isso culmina com a perda de massa gorda e depois massa magra, com evolução para caquexia e queda da energia vital e evolução para falência de múltiplos órgãos.5 Apesar da terminalidade seja permeada de incertezas, alguns sinais e variados sintomas, que individualmente ou mesmo combinados, poderão indicar que provavelmente a criança virá a óbito dentro de horas ou dias: dor, dispneia, secreções respiratórias excessivas, náuseas /vômitos, agitação e convulsões.6-8. Nesse processo de morte (últimos dias ou horas de vida), o paciente se torna cada vez mais cansado, mais fraco e sonolento, com menos interesse de sair da cama, receber visitas, ou saber o que está acontecendo ao seu redor, além da incapacidade de tolerar alimentos ou bebidas; uma queda acentuada na diurese e nas evacuações; alterações do nível de consciência (sonolência excessiva ou confusão, períodos de abstinência, crises convulsivas incontroláveis e até agitação). Essas condições podem ser observadas uma mudança no padrão respiratório (uma respiração ruidosa, com maior dificuldade ou irregular), uma perfusão periférica mais prejudicada (o que pode ser relacionado a uma aparência mais pálida ou acinzentada), incluindo uma dificuldade de manter a temperatura corporal. Observa-se ainda uma adinamia intensa e aumento da dor com necessidade de analgesia em maior frequência e ressurgimento de outros sintomas que anteriormente 119Cuidados Paliativos Pediátricos estavam controlados. É importante frisar, que a lucidez, consciência e audição podem se manter presentes até o último momento, trazendo as mais belas despedidas e simplesmente ir durante o sono com o último suspiro.2,4,5,6, 7, 8, 9 A atenção no manejo adequado do controle dos sintomas e sinais são fundamentais, e caso contrário, a família e o doente, poderão sofrer desnecessariamente e o processo de morte se prolongar. Ademais, o acolhimento da família durante a progressão da doença e o entendimento da irreversibilidade, assegurando que os cuidados médicos possam estar em acordo com os valores do paciente e a família, além do suporte ao luto é fundamental.1,2,5 De qualquer forma, muitos dos cuidados de terminalidade consistem no acompanhamento com a equipe multidisciplinar juntamente com a equipe de cuidados paliativos para realizar diversas abordagens, prioritariamente antecipadas: • Identificar prognóstico de dias ou horas, se possível- mostrar sinais e sintomas que podem sugerir evolução para o processo de morte; • Sinalizar uma possível previsão da morte, relacionar com experiências de pacientes com patologias semelhantes, evidenciando como irá acontecer, além de quais os sintomas a serem controlados; • Devem-se discutir diretivas antecipadas; • Preparar para uma morte próxima, tal como a escolha do local, organização de estratégias de conforto e cuidado do paciente, • E assegurar a família o acolhimento, controle de sintomas, principalmente da dor, presença ativa da equipe multidisciplinar, ajuste do médico e da psicologia; além de avaliar a parte burocrática (atestado de óbito, funeral, ajuda de custo, enterro, tanatologia).10 120 Cuidados Paliativos Pediátricos As decisões do que fazer e quando fazer devem ser sempre fundamentadas no princípio básico dos norteadores, como beneficência, não maleficência, autonomia, prognóstico e tratamento dispensável. A equipe, tem que avaliar previamente sobre as questões de nutrição parenteral, hidratação parenteral, diálise, UTI, transfusões, manobras de RCP, retiradas de medicações e equipamentos, sedação paliativa e permanência ou não no hospital.2,4,5,10 Na assistência das últimas horas o objetivo principal é diminuir o sofrimento e o desconforto do paciente e de seus familiares, controlando os sintomas e oferecendo suporte psicoemocional, evitando o prolongamento do sofrimento e do processo de morte. A família necessita estar bem assistida pois é possível que venha à tona sentimentos como conflitos, medos, ansiedades, culpas, dúvidas e emoções diversas como raiva e barganha. Deve-se reforçar os cuidados de higiene e conforto. Reforçar a presença de equipe de saúde. Certificar-se que a dor está controlada (uso de escalas), além dos outros sintomas desagradáveis. O cuidado deve iniciar pelo conforto clínico: hidratar lábios, boca e olhos, manter paciente limpo e seco, preparar para as incontinências (fraldas), mudanças de decúbito a cada 2 horas, avaliar suporte hídrico, adequar alimentação que no caso poderá ser reduzida e até suspensa, oxigenoterapia se necessária, reajustar vias de administração de medicação (podendo ser priorizado via SC-hipodermóclise), ajuste de doses, suspender medicações não essenciais (higienizar prescrição), e se necessário, deve-se iniciar a sedação Paliativa (orientado no capítulo de controle de sintomas).2,5,11 Nesse contexto, durante a preparação para o enfrentamento da morte, é possível que seja relembrado e repetido todos os objetivos do cuidado, encorajar a comunicação entre os familiares, procurar saber os desejos pessoais do paciente, encorajá-los a dizer ao paciente que ele é amado e que ele será lembrado, falar sobre morte no contexto espiritual e cultural da família, ajudar o paciente e a família a lidar com sentimentos de culpa ou de arrependimento e discutir assuntos 121Cuidados Paliativos Pediátricos preocupantes como local e custos de funeral, orientando a burocracia. Não devemos impor ponto de vista e preferencialmente tratar cada situação sempre com empatia, respeito e dignidade. A privacidade da família e do paciente deve ser valorizada, visando alcançar conforto e qualidade de vida. Podem ser oferecidos flexibilização de horários devisitas, permissão para manifestação religiosa/espirituais, acolhimento e suporte emocional à família estendida (incluindo avós e irmãos), realização de desejos antes, durante e pós óbito, proporcionar registro de legados do paciente e participação ativa dos cuidadores. Em relação ao local de morte, a escolha do ambiente hospitalar poderia ser favorável: em casos que seja necessário oferecer um melhor manejo de sintomas, principalmente quando dor incontrolável, dispneia e sangramentos maciços); nos casos de oferecer melhor conforto e higiene; em necessidade de otimizar suporte psicológico para quadros clínicos dramáticos; no contexto de sedação paliativa contínua e profunda; ou quando a família no seu domicílio não tem estrutura física adequada e suporte para óbito, tal como risco de luto complicado pela família.4,5 Quando a escolha é o domicílio do paciente, esse ambiente proporciona a manutenção da individualidade e do papel do lugar na despedida (exemplo o espaço, os pertences, a história, a religiosidade, a raiz da sua origem como interior e naturalidade), e possa ser capaz de oferecer acolhimento, conforto e segurança, diante de parentes e amigos.4,5 REFERÊNCIAS 1. Decourcey DD et al. Patterns ofc are at the end of life for children and young adults with life-thretening complex chronic conditions. The Journal of pediatrics, 2018, v. 193, e2, p. 196-203. 122 Cuidados Paliativos Pediátricos 2. Machado TV. Protocolo clínico de controle de sintomas para crian- ças com condições crônicas complexas em terminalidade.2022. 153 f. Fortaleza. Dissertação [Mestrado em Saúde da Criança e do Adolescente] –Centro de Ciências da Saúde, Universidade Esta- dual do Ceará; 2022. 3. Aidoo E, Rajapakse D. End of life care for infants, children and young people with life-limiting conditions: planning and manage- ment: the NICE guideline 2016. Archives of Disease in Childhood- -Education and Practice, 2018, v. 103, n. 6, p. 296-299. 4. Together for short lives. Basic Symptom control in paediatric pal- liative care. The Rainbows Children's Hospice guidelines, 2017. 5. Barbosa S, Zoboli I, Iglesias S. Cuidados Paliativos: na prática pe- diátrica. Rio de Janeiro: Atheneu, 2019. 6. 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Medbook, 2023. 123Cuidados Paliativos Pediátricos 124 Cuidados Paliativos Pediátricos Os quatro primeiros capítulos trazem o conceito e os princípios dos Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP), as preocupações bioéticas e morais no contexto paliativista, além da história, formação e apresentação da equipe de CPP no HIAS e no CPC. Adiante, apresenta-se o processo de trabalho dos cuidados paliativos (conferência familiar, plano de cuidados e controle de sintomas) e posteriormente a organização e funcionalidade da equipe multiprofissional. Em seguida, estão contemplados a organização dos serviços de assistência domiciliar (PAD e PAVD), os quais solidificam a continuidade do cuidado. Por fim, o capítulo de Cuidados de Final de Vida ampara os profissionais numa melhor assistência nas últimas horas. Dr. Thiago do Vale Machado