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Unidade 4 Livro Didático Digital Mariana Ribeiro Maniglia Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Diretora Editorial ANDRÉA CÉSAR PEDROSA Projeto Gráfico MANUELA CÉSAR ARRUDA Autora MARIANA RIBEIRO MANIGLIA Desenvolvedor CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS Mariana Ribeiro Maniglia Olá. Meu nome é Mariana Ribeiro Maniglia. Sou formada em Serviço Social pela UNESP e Psicologia pela UNIFRAN, possuo mestrado e doutorado (em andamento) em Psicobiologia pela USP. Minha experiência profissional envolve a prática na área de neuropsicologia e psicologia clínica. Além disso possuo experiência em atendimentos no Sistema Único de Saúde em Unidades Básicas de Saúde e Ambulatórios. Sou apaixonada pelo que faço e adoro transmitir minha experiência e conhecimento àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso fui convidada pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo! A AUTORA Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo projeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: ICONOGRÁFICOS INTRODUÇÃO: para o início do desenvolvimento de uma nova com- petência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de se apresentar um novo conceito; NOTA: quando forem necessários obser- vações ou comple- mentações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamen- to do seu conheci- mento; REFLITA: se houver a neces- sidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou discutido sobre; ACESSE: se for preciso aces- sar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso se fazer um resumo acumulativo das últimas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de au- toaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando o desen- volvimento de uma competência for concluído e questões forem explicadas; SUMÁRIO Transtornos da ansiedade ....................................................................... 11 Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) ............................................................11 Desenvolvimento ..........................................................................................................11 Características ................................................................................................................ 12 Critérios diagnósticos ................................................................................................ 14 Diagnóstico diferencial e comorbidades .................................................... 15 Transtorno de Ansiedade de Separação ........................................................................16 Desenvolvimento .........................................................................................................16 Características ................................................................................................................ 17 Critérios diagnósticos ................................................................................................ 19 Diagnóstico diferencial e comorbidades ................................................... 20 Fobias ...............................................................................................................23 Fobia Específica ...............................................................................................................................23 Desenvolvimento .........................................................................................................23 Características ................................................................................................................25 Critérios diagnósticos ............................................................................................... 26 Diagnóstico diferencial e comorbidades ....................................................27 Transtorno de ansiedade social ou Fobia Social ..................................................... 29 Desenvolvimento ........................................................................................................ 29 Características ............................................................................................................... 30 Critérios diagnósticos ................................................................................................ 31 Diagnóstico diferencial e comorbidades ....................................................32 Transtorno depressivo...............................................................................35 Desenvolvimento.............................................................................................................................35 Características .................................................................................................................................. 36 Critérios diagnósticos .................................................................................................................. 40 Diagnóstico diferencial e comorbidades ....................................................................... 41 Transtornos disruptivos ............................................................................43 Transtorno de Oposição Desafiante (TOD) ...................................................................43 Desenvolvimento .........................................................................................................43 Características ................................................................................................................44 Critérios diagnósticos ............................................................................................... 45 Diagnóstico diferencial e comorbidades ....................................................47 Transtorno de Conduta .............................................................................................................. 48 Desenvolvimento ........................................................................................................ 48 Características ............................................................................................................... 49 Critérios diagnósticos ................................................................................................ 51 Diagnóstico diferencial e comorbidades ................................................... 56 Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência8 UNIDADE 04 Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 9 Nesta unidade nós iremos aprofundar o conhecimento sobre alguns transtornos mentais. Nesta unidade os transtornos não fazem parte dos transtornos do neurodesenvolvimento. Isso significa que o início dos transtornos pode se dar em qualquer período da vida. Iremos ver como esses transtornos são classificados em cada capítulo! Nesta unidade você verá os seguintes transtornos: transtornos de ansiedade, fobias, transtornos depressivos e transtornos do comportamento disruptivo. Vamos comigo mergulhar neste universo?! INTRODUÇÃO Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência10 Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 4. Nosso objetivo é auxiliar você no desenvolvimento dos seguintes objetivos de aprendizagem até o término desta etapa de estudos: 1. Compreender os aspectos diagnósticos e as características dos transtornos de ansiedade na infância. 2. Compreender os aspectos diagnósticos e as características das fobias. 3. Compreenderos aspectos diagnósticos e as características dos transtornos depressivos na infância. 4. Compreender os aspectos diagnósticos e as características dos transtornos do comportamento disruptivo. Preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! OBJETIVOS Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 11 Transtornos da ansiedade OBJETIVOS Ao término deste capítulo você será capaz de compreender e de identificar os aspectos diagnósticos e as características dos transtornos da ansiedade. Essa competência é fundamental para a realização de diagnósticos diferenciais e comorbidades. E então? Vamos começar?! Os transtornos de ansiedade são reconhecidos como um dos mais prevalentes na população. A prevalência no Brasil é de 4,6% em crianças e 5,8% em adolescentes. Suas manifestações clínicas podem causar inúmeros prejuízos sociais, escolares e profissionais no indivíduo. Neste capítulo iremos aprofundar o conhecimento sobre o transtorno de ansiedade generalizada e o transtorno de ansiedade de separação, que são comuns e recorrentes em crianças e adolescentes. Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) Desenvolvimento Inúmeras pessoas relatam o sentimento de ansiedade e de nervosismo durante sua vida toda, entretanto, o início dos sintomas é usualmente confirmado na idade adulta. A principal característica do TAG é a preocupação excessiva acompanhada de sintomas físicos. O conteúdo da preocupação do indivíduo difere de acordo com a faixa etária. Crianças e adolescentes tendem a se preocupar mais com a escola e o desempenho esportivo, enquanto adultos mais velhos relatam maior preocupação com o bem-estar da família ou da sua própria saúde física. Em crianças e adolescentes com TAG, as ansiedades e as preocupações, frequentemente, envolvem a qualidade de seu desempenho, de sua competência na escola ou em eventos esportivos, mesmo quando seu desempenho não está sendo avaliado por Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência12 outros. Algumas crianças apresentam preocupação excessiva com a pontualidade. E também com eventos catastróficos, como terremotos ou guerra nuclear. As crianças com TAG podem ser excessivamente conformistas, perfeccionistas e inseguras. Tendem a refazer tarefas em razão de excessiva insatisfação com um desempenho menos que perfeito. Elas demonstram excessiva busca de aprovação. A incidência de TAG em crianças de até 12 anos é significativamente menor do que em crianças a partir desta idade. Além disso, o número de sintomas apresentados aumenta com a idade. Quanto mais cedo na vida os indivíduos têm sintomas que satisfazem os critérios para transtorno de ansiedade generalizada, mais tendem a ter comorbidade e mais provavelmente serão prejudicados. VOCÊ SABIA? A ansiedade é uma das patologias psiquiátricas mais comuns nas crianças, atrás apenas dos transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)! Características Os sintomas principais da ansiedade generalizada são preocupação excessiva e de difícil controle acompanhado de sintomas físicos. As caracteristicas de TAG em crianças e em adolescentes se diferem do diagnóstico de adulto. Os adultos com TAG, frequentemente, se preocupam com circunstâncias diárias da rotina de vida, como possíveis responsabilidades no trabalho, saúde e finanças, a saúde dos membros da família. As crianças com o transtorno tendem a se preocupar excessivamente com sua competência ou com a qualidade de seu desempenho. Durante o curso do transtorno, o foco da preocupação pode mudar de uma preocupação para outra. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 13 IMPORTANTE Cerca de 10% das crianças sofrem de algum transtorno ansioso, e cinco em cada dez passarão por algum episódio depressivo por causa da ansiedade. De acordo com Vianna, Campos e Landeira-Fernandez (2009) as crianças e adolescentes com TAG são como “mini adultos” em função da preocupação em excesso com compromissos, da rígida aderência às regras, ou por suas perguntas referentes aos perigos inerentes às situações. As autoras afirmam, ainda, que o diagnóstico é realizado tardiamente pois as preocupações apresentadas pelas crianças são vistas como senso de responsabilidade. As crianças com TAG apresentam sintomas como perfeccionismo, catastrofizam pequenas situações, possuem autocrítica exagerada e tornam um pequeno erro como um grande fracasso. Podem apresentar rigidez com regras, evitação de situações nas quais poderá ser julgada e superestimam o perigo. Geralmente, a intensidade, a duração ou a frequência da ansiedade e da preocupação é desproporcional à probabilidade real ou ao impacto do evento antecipado. A distinção entre as características patólogicas e da ansiedade não patológica é de extrema importância para evitar o diagnóstico errôneo. No TAG as preocupações interferem de forma significativa no funcionamento psicossocial do indivíduo, enquanto que na ansiedade não patológica as preocupações não são excessivas e fáceis de manejar. No TAG as preocupações são mais dissiminadas, intensas e angustiantes e ocorre sem precipitantes. Os sintomas de preocupação no TAG são acompanhados de sintomas físicos como inquietação, fatigabilidade, dificuldade de concentração, sensação de “brancos” na mente, irritabilidade, tensão muscular e insônia. É importante ressaltar que para o diagnóstico em crianças e adolescentes é exigido apenas a presença de um sintoma físico. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência14 IMPORTANTE Usar técnicas de relaxamento e de respiração com as crianças, expor devagar os filhos às circunstâncias diferentes e, principalmente, não se zangar, mas trabalhar em conjunto com as crianças para superar as dificuldades são dicas importantes para os pais. Critérios diagnósticos O transtorno da ansiedade generalizada é diagnosticado a partir dos sintomas presentes abaixo por no mínimo 6 meses. • Ansiedade e preocupação excessivas, ocorrendo na maioria dos dias por pelo menos seis meses, com diversos eventos ou atividades; • O indivíduo considera difícil controlar a preocupação; • A ansiedade e a preocupação estão associadas com três (ou mais) dos seguintes seis sintomas: NOTA Nota: Apenas um item é exigido para crianças. 1. Inquietação ou sensação de estar com os nervos à flor da pele. 2. Fatigabilidade. 3. Dificuldade em concentrar-se ou sensações de “branco” na mente. 4. Irritabilidade. 5. Tensão muscular. 6. Perturbação do sono (dificuldade em conciliar ou manter o sono, ou sono insatisfatório e inquieto). Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 15 • A ansiedade, a preocupação ou os sintomas físicos causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Os sintomas acima não podem ocorrer devido aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a outra condição médica, e a condição não é mais bem explicada por outro transtorno mental. Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno de ansiedade generalizada são: transtorno de ansiedade devido a outras condições médicas, transtorno de ansiedade induzido por substância/medicamento, transtorno de ansiedade social, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático. No transtorno de ansiedade devido a outra condição médica, os achados através da história clínica do paciente, os exames labotratoriais e físicos são levados em consideração e o diagnóstico é realizado com base na presença de uma outra condição médica, como por exemplo hipertireoidismo. IMPORTANTE A formação atual das famílias faz com que os filhos, sem irmãos, não tenham que esperar a sua vez para nada, e isso aumenta a presença de sintomas ansiosos na criança. No transtorno deansiedade induzido por substância/medicamento, a ansiedade e as preocupações são geradas a partir do uso de uma substância ou de um medicamento. Já no transtorno de ansiedade social, os indivíduos apresentam frequentemente uma ansiedade antecipatória focada nas próximas Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência16 situações sociais em que devem se apresentar ou ser avaliados por outros. Na condição do TAG os indivíduos se preocupam independentemente de estarem ou não sendo avaliados. No transtorno obsessivo-compulsivo as obsessões são ideias inadequadas que assumem a forma de pensamentos, os impulsos ou as imagens intrusivos e indesejados. E no TAG o foco da preocupação são os problemas que estão por vir, e a anormalidade é o excesso de preocupação acerca dos eventos futuros. No transtorno de estresse pós-traumático a ansiedade está invariavelmente presente. Mas o TAG não é diagnosticado se a ansiedade e a preocupação são mais bem explicadas por sintomas de TEPT. De acordo com Vianna, Campos e Landeira-Fernandez (2009) o TAG na infância ou na adolescência pode ser um precursor de outros transtornos psiquiátricos na vida adulta, como fobia social, transtorno de pânico e transtorno depressivo maior, e a falta de tratamento adequado pode levar a sérios prejuízos no funcionamento do indivíduo. IMPORTANTE Ensinar paciência exige envolver a criança nas situações: explicar a necessidade da espera e ensinar brincadeiras que não incluam tecnologia para que se distraiam. É preciso falar sobre o que está acontecendo quando estão no supermercado, por exemplo, em vez de excluí-las dessas atividades. Transtorno de Ansiedade de Separação Desenvolvimento Períodos de ansiedade excessiva pela separação de figuras de apego fazem parte da fase inicial do desenvolvimento normal e podem indicar o estabelecimento de relações de apego seguras. Por exemplo, em torno de 1 ano de idade, os bebês podem sofrer de ansiedade reativa a pessoas estranhas e se apegam especialmente à figura materna/paterna ou do cuidador. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 17 O comportamento de ansiedade de separação pode ser observado também em crianças pré-escolares que estão em período de adaptação escolar. O início do transtorno de ansiedade de separação pode ocorrer em idade pré-escolar ou em qualquer momento durante a infância e mais raramente na adolescência. As manifestações do transtorno de ansiedade de separação variam com a idade. As crianças menores podem não expressar preocupações ou medos específicos de ameaças definidas aos pais, à casa ou a si mesmas, e a ansiedade é manifestada somente quando a separação é vivenciada. À medida que as crianças crescem, emergem as preocupações; com frequência são preocupações acerca de perigos específicos como acidentes, sequestros ou assaltos, bem como preocupações vagas acerca de não se reencontrarem com as figuras paternas/maternas ou de cuidado. Em adultos, o transtorno de ansiedade de separação pode limitar a capacidade de enfrentar mudanças necessárias, como mudança de casa, de cidade ou casar-se. Os adultos com transtorno de ansiedade de separação são, em geral, excessivamente preocupados em relação aos seus filhos, cônjuges ou pais. Características O transtorno de ansiedade de separação caracteriza-se pela experimentação de ansiedade excessiva em função do afastamento de casa ou de figuras de vinculação. IMPORTANTE Apostar em brincadeiras de “esconde-esconde” como, por exemplo, aquelas em que alguém cobre o rosto e reaparece, ajuda o bebê a lidar, por meio de um jogo, com suas ansiedades de separação. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência18 A ansiedade excede o esperado com relação ao estágio de desenvolvimento do indivíduo, ou seja, não se enquadra às características esperadas em algumas fases do desenvolvimento. As crianças vivenciam sofrimento excessivo e recorrente ante a ocorrência ou a previsão de afastamento de casa ou de figuras importantes de apego; se preocupam com o bem-estar ou com a morte de figuras de apego, quando separados precisam saber o paradeiro das suas figuras de apego; também se preocupam com eventos indesejados consigo mesmos, como perder-se. As crianças ou os adolescentes com transtorno de ansiedade de separação são relutantes ou se recusam a sair sozinhos ou acompanhados de pessoas com pouco vínculo devido ao medo de separação. Eles têm medo ou relutância persistente e excessiva em ficar sozinhos ou sem as figuras importantes de apego em casa ou em outros ambientes, frequentemente, essas crianças ou adolescentes sentem a necessidade de saber onde eles estão ou de permanecer em contato, sendo muito comum o uso do telefone para este fim. As crianças com transtorno de ansiedade de separação podem não conseguir permanecer ou ir até um quarto sozinhas e podem exibir comportamento de agarrar-se. As crianças apresentam relutância ou recusa persistente em dormir à noite sem estarem perto de uma figura importante de apego ou em dormir fora de casa. Durante a noite, as crianças podem ir para a cama dos pais ou irmãos, e são relutantes ou se recusam a participar de acampamentos ou dormir na casa de amigos. Alguns sintomas físicos, como cefaleias, dores abdominais, náuseas e vômitos são comuns em crianças quando ocorre ou é prevista a separação das figuras importantes de apego. Já em adultos e em adolescentes se faz presente os sintomas cardiovasculares como palpitações, tonturas e sensação de desmaio. Quando adultos podem se sentir desconfortáveis ao viajarem sozinhos, podem desenvolver pesadelos repetidos nos quais o conteúdo expressa a ansiedade de separação do indivíduo. Os sintomas podem durar por um período de pelo menos quatro semanas em crianças e adolescentes com menos de 18 anos e geralmente dura seis meses ou mais em adultos. A presença dos sintomas causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo nas áreas Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 19 de funcionamento social, acadêmico, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Critérios diagnósticos O transtorno da ansiedade de separação é diagnosticado a partir dos sintomas presentes abaixo: • Medo ou ansiedade impróprios e excessivos em relação ao estágio de desenvolvimento, envolvendo a separação daqueles com quem o indivíduo tem apego, evidenciados por três ou mais dos aspectos abaixo: 1. Sofrimento excessivo e recorrente ante a ocorrência ou a previsão de afastamento de casa ou de figuras importantes de apego; 2. Preocupação persistente e excessiva acerca da possível perda ou de perigos envolvendo figuras importantes de apego, tais como doença, ferimentos, desastres ou morte; 3. Preocupação persistente e excessiva de que um evento indesejado leve à separação de uma figura importante de apego (por exemplo, perder-se); 4. Relutância persistente ou recusa a sair, afastar-se de casa, ir para a escola, o trabalho ou a qualquer outro lugar, em virtude do medo da separação; 5. Temor persistente e excessivo ou relutância em ficar sozinho ou sem as figuras importantes de apego em casa ou em outros contextos; 6. Relutância ou recusa persistente em dormir longe de casa ou dormir sem estar próximo a uma figura importante de apego; 7. Pesadelos repetidos envolvendo o tema da separação; 8. Repetidas queixas de sintomas somáticos quando a separação de figuras importantes de apego ocorre ou é prevista; Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência20 IMPORTANTE Segurança é essencial para a diminuição do sentimento de ansiedade e se desenvolve pautado na confiança no outro e no mundo, não na superproteção que evita os sofrimentos normais da vida. • O medo, a ansiedade ou a esquiva é persistente, durando pelo menos quatro semanas em crianças e em adolescentes e geralmente seis meses ou maisem adultos. • A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, acadêmico, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. NOTA É esperado que ao longo do tempo, com o crescimento e o amadurecimento, a ansiedade de separação diminua, pois, a criança já é capaz de entender o que ela significa. Se os sintomas não diminuírem, é importante buscar o auxílio de um profissional! Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno de ansiedade de separação são: transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de pânico, agorafobia, transtorno da conduta, transtorno de ansiedade social, transtorno de estresse pós-traumático, luto, transtornos depressivo e bipolar, transtorno de oposição desafiante, transtornos da personalidade. VOCÊ SABIA? Uma situação de estresse, como a morte de um parente, amigo ou animal de estimação, uma mudança geográfica ou de escola pode desencadear o transtorno de ansiedade de separação. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 21 No transtorno de ansiedade generalizada, o quadro ansioso envolve diversas preocupações, já no quadro de ansiedade de separação envolve, predominantemente, a separação das figuras de apego. As ameaças de separação podem levar a extrema ansiedade e mesmo a um ataque de pânico, no entanto, a ansiedade envolvendo a possibilidade de se afastar das figuras de apego e a preocupação com eventos indesejados ocorrendo com elas, usualmente não levam a um ataque de pânico inesperado. As crianças e adolescentes com transtorno de ansiedade de separação não são ansiosos quanto a ficarem presos ou incapacitados em situações em que a fuga é percebida como difícil, como acontece em crianças e em adolescentes com agorafobia. No transtorno da conduta é comum a esquiva da escola (evasão), no entanto, a criança ou o adolescente habitualmente ficam longe de casa em vez de voltar para ela, como aconteceria na ansiedade pela separação. IMPORTANTE A terapia comportamental é utilizada para tratar o transtorno de ansiedade de separação. Ela envolve ensinar os pais e cuidadores a manterem as cenas de despedida tão curtas quanto possível e treiná-los no sentido de reagir à lamentação de maneira sensata. No Transtorno de ansiedade social a recusa de ir à escola pode ser devida ao medo de ser julgado negativamente pelos outros, e não relativa à separação das figuras de apego. Após eventos traumáticos como desastres, sequestros ou assaltos, é comum o medo de separação das pessoas amadas. No transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), os sintomas centrais são relativos a intrusões e esquiva de lembranças associadas ao evento traumático, enquanto no transtorno de ansiedade de separação as preocupações e a esquiva estão relacionadas ao bem- estar das figuras de apego e à separação delas. Sintomas como anseio intenso ou saudades da pessoa falecida, tristeza intensa, dor emocional e preocupação com a pessoa falecida ou Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência22 com as circunstâncias da morte são respostas esperadas no quadro de luto. No transtorno de ansiedade de separação o medo de separação envolve figuras de apego. IMPORTANTE Capacitar as crianças a retornar à escola é um objetivo imediato. Isso exige que os médicos, os pais e os funcionários da escola trabalhem como uma equipe. Ajudar as crianças a formar um laço com um dos adultos da pré- escola ou da escola pode ajudar. Em Transtornos depressivos e bipolar ocorrem a relutância em sair de casa, mas a perturbação principal não é a preocupação ou o medo de eventos indesejados afetarem as figuras de apego, mas a baixa motivação para se envolver com o mundo externo. O oposto pode ocorrer, como indivíduos com transtorno de ansiedade de separação ficarem deprimidos quando são separados ou quando é prevista uma separação. O transtorno de oposição desafiante deve ser considerado apenas quando existe comportamento de oposição persistente não está relacionado à previsão ou à ocorrência de separação de figuras de apego. Alguns transtornos da personalidade podem apresentar sintomas parecidos ao de ansiedade de separação. No transtorno da personalidade dependente há uma tendência indiscriminada a depender de outra pessoa, enquanto o transtorno de ansiedade de separação envolve preocupação quanto à proximidade e à segurança das principais figuras de apego. Já no transtorno da personalidade borderline o medo envolve o abandono pelas pessoas amadas, mas sintomas de problemas na identidade, no autodirecionamento, no funcionamento interpessoal e na impulsividade são adicionalmente centrais a esse transtorno, enquanto não são centrais para o transtorno de ansiedade de separação. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 23 Fobias OBJETIVOS Ao término deste capítulo você será capaz de compreender e de identificar os aspectos diagnósticos e as características das principais fobias. Essa competência é fundamental para a realização de diagnósticos diferenciais e comorbidades. E então? Vamos começar?! As crianças que sofrem umas ou várias fobias apresentam sintomas de ansiedade constantes. As fobias as mais comuns compreendem um medo das alturas, da interacção pública, do sangue, dos insectos, ou dos animais. Fobia Específica Desenvolvimento A fobia específica se desenvolve após um evento traumático, por exemplo, um ataque de um animal, ou ficar preso no elevador; ou pela observação de outras pessoas que passam por um evento traumático, por exemplo, ver alguém se afogar. Também se desenvolve após um ataque de pânico inesperado na situação a ser temida, por exemplo um ataque de pânico inesperado no metrô, ou por transmissão de informações, por exemplo, ampla cobertura da mídia de um acidente aéreo. Embora a fobia específica seja situacional, muitas pessoas com fobia específica não conseguem se lembrar da razão para o início de suas fobias. A fobia específica geralmente se desenvolve na infância, entre 7 e 11 anos de idade. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência24 NOTA As crianças são influenciadas pela cultura em torno delas; se uma pessoa é forçada ou ansioso, a criança tende a desenvolver os mesmos sentimentos. Por exemplo, se um pai da criança tem medo das baratas, a seguir há uma possibilidade alta de que a criança desenvolva o mesmo. Quando a fobia específica está sendo diagnosticada em crianças, algumas questões devem ser consideradas. As crianças pequenas podem expressar medo e ansiedade chorando, tendo ataques de raiva, imobilidade ou comportamento de agarrar-se. As crianças pequenas geralmente não são capazes de compreender o conceito de esquiva ou de fuga. Os medos excessivos são bastante comuns em crianças pequenas, mas são considerados apropriados ao estágio de desenvolvimento e são transitórios. Nesses casos, um diagnóstico de fobia específica não deve ser feito. Para o diagnóstico de fobia específica em uma criança é importante avaliar o grau de prejuízo e a duração do medo, da ansiedade ou da esquiva, e se ele é esperado para o estágio do desenvolvimento da criança. Embora as fobias específicas se desenvolvam na infância e na adolescência, é possível que elas se estabeleçam em qualquer idade, usualmente como consequência de experiências traumáticas. Por exemplo, fobia a asfixia quase sempre aparece após um evento de quase asfixia em qualquer idade. A prevalência de fobia específica diminui no decorrer da vida, mas permanece como um dos transtornos mais comumente experimentados na velhice. Isso porque os idosos podem ter mais probabilidade de aceitar fobias específicas do ambiente natural, assim como fobias de queda. A fobia específica pode ocorrer em comorbidade com condições médicas em idosos, além dos idosos apresentarem maior probabilidadede atribuir os sintomas de ansiedade às condições médicas. Além disso, a presença de fobia específica em pessoas mais velhas está associada a redução na qualidade de vida e pode servir como fator de risco para transtornos demenciais. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 25 VOCÊ SABIA? Crianças de 4 a 6 anos costumam apresentar medo da escuridão, enquanto que crianças de 7 a 8 anos possuem medo de rejeição social, principalmente na escola. Esses medos são esperados no decorrer do desenvolvimento. Características A característica essencial da fobia específica é que o medo ou a ansiedade está relacionado à presença de uma situação ou de um objeto particular, que pode ser denominado estímulo fóbico. Os estímulos fóbicos podem ser categorizados como especificadores. A Fobia específica deve apresentar o medo ou a ansiedade intensa ou acentuada em um ou mais objetos ou situações fóbicas, por exemplo, animais, altura, doenças. Os sintomas são evocados quase todas as vezes que o indivíduo entra em contato com o estímulo fóbico. O grau do medo experimentado pode variar com a proximidade do objeto ou a situação temida e pode ocorrer com a antecipação da presença ou na presença real do objeto ou situação. A fobia pode assumir a forma de um ataque de pânico com sintomas completos ou limitados. Os comportamentos de esquiva podem ser óbvios como o medo de sangue e a recusa a ir ao médico, mas às vezes são menos óbvios como medo de cobras e evitar olhar para figuras que possuem contorno semelhante à forma de cobra. Muitas pessoas com fobias específicas sofrem e evitam durante muitos anos o objeto ou situação fóbica. Dessa forma, elas criam uma estratégia de não mais experimentar o medo ou a ansiedade em sua vida diária. Nessas circunstâncias, os comportamentos de esquiva ou a recusa persistente de se engajar em atividades que envolveriam exposição ao objeto ou à situação fóbica podem ser úteis para a confirmação do diagnóstico na ausência de ansiedade ou de pânico explícito. Os indivíduos com fobia específica reconhecem que suas reações ao estímulo fóbico são desproporcionais, e mesmo assim tendem a superestimar o perigo nas situações temidas. O medo ou a ansiedade é Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência26 desproporcional em relação ao perigo real apresentado pelo objeto ou pela situação ou mais intenso do que é considerado necessário. O contexto sociocultural do indivíduo também deve ser levado em conta. Por exemplo, em um contexto com violência constante o medo do escuro pode ser razoável. O medo, a ansiedade ou a esquiva é persistente, geralmente durando mais de seis meses, além de causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. NOTA O tratamento farmacológico das fobias Específicas raramente é utilizado na prática clínica, e são poucos os estudos sobre o uso de medicações nesses transtornos. Critérios diagnósticos O diagnóstico de fobia específica é realizado a partir da presença dos sintomas abaixo: • Medo ou ansiedade acentuados acerca de um objeto ou de uma situação (por exemplo, voar, alturas, animais, tomar uma injeção, ver sangue); NOTA Em crianças, o medo ou a ansiedade pode ser expresso por choro, ataques de raiva, imobilidade ou comportamento de agarrar-se. • O objeto ou situação fóbica quase invariavelmente provoca uma resposta imediata de medo ou de ansiedade; • O objeto ou situação fóbica é ativamente evitado ou suportado com intensa ansiedade ou sofrimento; • O medo ou ansiedade é desproporcional em relação ao Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 27 perigo real imposto pelo objeto ou pela situação específica e ao contexto sociocultural; • O medo, a ansiedade ou a esquiva é persistente, geralmente com duração mínima de seis meses; • O medo, a ansiedade ou a esquiva causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. É necessário identificar o estímulo fóbio no diagnóstico, por exemplo: • Animal (por exemplo, aranhas, insetos, cães); • Ambiente natural (por exemplo, alturas, tempestades, água); • Sangue-injeção-ferimentos (por exemplo, agulhas, procedimentos médicos invasivos); • Situacional (por exemplo, aviões, elevadores, locais fechados); • Outro (por exemplo, situações que podem levar a asfixia ou a vômitos; em crianças, por exemplo, sons altos ou personagens vestidos com trajes de fantasia). O diagnóstico pode ser realizado a partir de vários estímulos fóbicos comcomitantes. Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno de ansiedade de separação são: agorafobia, transtorno de ansiedade social, transtorno de pânico, TOC, transtornos relacionados a traumas e estressores, transtornos alimentares. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência28 NOTA O maior fator de risco de uma criança ou adolescente é ter um pai ou mãe ansioso. A fobia específica situacional pode se parecer com a agorafobia na sua apresentação clínica, mas se um indivíduo teme apenas uma das situações da agorafobia, então deve-se diagnosticar fobia específica. Caso o individuo tema duas ou mais situações agorafóbicas, então um diagnóstico de agorafobia é justificado. Por exemplo, se um indivíduo tem medo de aviões e de elevadores (carcterística também agorafóbica – transportes públicos), mas não tem medo de outras situações, como medo de multidão, então o diagnostico de fobia específica é mais cabível. Se as situações são temidas e evitadas devido a possível avaliação negativa, então é melhor diagnosticado de transtorno de ansiedade social em vez de fobia específica. Os indivíduos com fobia específica podem experimentar ataques de pânico quando confrontados com a situação ou o objeto temido. Se os ataques ocorrerem apenas em resposta ao objeto ou à situação específica, então é melhor diagnosticado como fobia específica. No transtorno obsessivo compulsivo o indivíduo apresenta pensamentos causadores de medo ou de ansiedade de um objeto ou situação como resultado de obsessões (por exemplo, medo de sangue devido aos pensamentos obsessivos acerca de contaminação), neste caso, se os outros critérios diagnósticos para transtorno obsessivo-compulsivo são satisfeitos, então este último transtorno deve ser diagnosticado. A fobia pode se desenvolver após um evento traumático, neste caso deve ser considerado transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) como diagnóstico. Se um comportamento de esquiva está limitado exclusivamente à esquiva de alimentos e estímulos relacionados a alimentos, então o diagnóstico de Fobia específica não é dado. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 29 SAIBA MAIS Para um maior aprofundamento sobre o tema, recomendamos a leitura do artigo A Criança com Transtorno de Ansiedade: Seus Ajustamentos Criativos Defensivos, disponível em: https://bit.ly/2pky1Sq. Transtorno de ansiedade social ou fobia social Desenvolvimento O transtorno de ansiedade social tem a idade de início entre 8 a 15 anos (dados dos Estados Unidos). Geralmente emerge de uma história infantil de inibição social ou de timidez e pode ocorrer no princípio da infância. O início também pode ocorrer no princípio da infância e pode seguir decorrente de uma experiência estressante ou humilhante, como o bullying, ou pode ser insidioso, desenvolvendo-se lentamente. As crianças com até 2,5 anos tendem a não se sentir confortáveis perto de pessoas não familiares, evitando estabelecer uma comunicação assertiva. Este comportamento é esperado para a idade e deve ser entendido como parte do desenvolvimento infantil normal. Entretanto, após este período, se o estranhamentopersistir e interferir na construção de uma vida social, é possível que este desconforto tenha se tornado patológico. VOCÊ SABIA? A inibição comportamental está associada ao medo de novidades, e inclui características como introversão, esquiva e medo de pessoas estranhas. Protegidos em demasia pelos pais, meninos e meninas com esse perfil tornam-se ainda mais retraídos, formando um ciclo vicioso e ganhando cinco vezes mais chances de desenvolver fobia social. https://bit.ly/2pky1Sq Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência30 Os adolescentes apresentam um padrão mais amplo de medo e de esquiva, incluindo os encontros. O início na idade adulta é relativamente raro e é mais provável de ocorrer após um evento estressante ou humilhante, ou após mudanças na vida que exigem novos papéis sociais. Os idosos podem expressar ansiedade social em níveis mais baixos, mas dentro de uma variedade mais ampla de situações, enquanto os adultos mais jovens expressam níveis mais altos de ansiedade social para situações específicas. Em idosos, a ansiedade social pode referir-se à incapacidade devido ao declínio do funcionamento sensorial, como prejuízo na audição ou visão, ou à vergonha em relação à própria aparência ou ao próprio funcionamento devido à condições médicas, como incontinência ou prejuízo cognitivo. Características A principal característica do transtorno de ansiedade social é um medo ou uma ansiedade acentuados ou intensos de situações sociais nas quais o indivíduo pode ser avaliado pelos outros. Em crianças, o medo ou ansiedade deve ocorrer em contextos com os pares, e não apenas durante interações com adultos. NOTA A ansiedade passa a ser um problema quando se torna disfuncional e impede a criança de realizar tarefas simples, como dormir, brincar com outra criança ou ir à escola. Nas situações em que o o indivíduo é exposto a essas situações sociais, ocorre o medo de ser avaliado negativamente. A preocupação envolve o julgamento de inúmeras manerias, por exemplo, em ser ansioso, débil, maluco, estúpido, enfadonho, amedrontado, sujo ou desagradável. O indivíduo com transtorno de ansiedade social teme agir, aparecer ou demonstrar sintomas de ansiedade (tais como ruborizar, tremer ou transpirar), que poderão ser avaliados negativamente pelos demais. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 31 NOTA Crianças tímidas, que sentem muito medo, fazem muita birra, regridem a fases anteriores – começam a fazer xixi na roupa, por exemplo – ou roem as unhas possivelmente são crianças ansiosas. Vivenciar situações sociais quase sempre provoca medo ou ansiedade intensa. Dessa forma, uma ansiedade apenas ocasional em situações sociais não seria diagnosticada como transtorno de ansiedade social. O grau e o tipo de medo e a ansiedade podem variar de acordo com diferentes ocasiões. Em crianças, o medo ou a ansiedade pode ser expresso por choro, ataques de raiva, imobilização, comportamento de agarrar-se ou encolher-se em situações sociais. As situações sociais frequentemente serão evitadas pelos indivíduos com transtorno de ansiedade social. A esquiva pode ser abrangente, como não ir a festas ou recusar ir à escola ou sutil, como preparar excessivamente o texto de um discurso. O medo ou a ansiedade é julgado desproporcional ao risco real de ser avaliado negativamente ou às consequências dessa avaliação negativa. Por vezes, a ansiedade está relacionada a um perigo real (como ser alvo de bullying). Mas em geral, os indivíduos com transtorno superestimam as consequências negativas das situações sociais. Nesses casos, o contexto sociocultural do indivíduo precisa ser levado em conta. A presença dos sintomas interfere significativamente na rotina normal do indivíduo, no funcionamento profissional ou acadêmico ou em atividades sociais ou de relacionamentos, e causa sofrimento clinicamente significativo. Critérios diagnósticos O diagnóstico de transtorno de ansiedade social é realizado a partir da presença dos sintomas abaixo: Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência32 • Medo ou ansiedade acentuados acerca de uma ou mais situações sociais em que o indivíduo é exposto a possível avaliação por outras pessoas. Por exemplo, em interações sociais, ser observado e situações de desempenho diante de outros; • O indivíduo teme agir de forma a demonstrar sintomas de ansiedade que serão avaliados negativamente; • As situações sociais quase sempre provocam medo ou ansiedade; • As situações sociais são evitadas ou suportadas com intenso medo ou ansiedade; • O medo ou ansiedade é desproporcional à ameaça real apresentada pela situação social e o contexto sociocultural; • O medo, ansiedade ou esquiva é persistente, geralmente durando mais de seis meses; • O medo, a ansiedade ou a esquiva causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Os sintomas não são consequência dos efeitos fisiológicos de uma substância ou de outra condição médica, e não são mais bem explicados pelos sintomas de outro transtorno mental. Se alguma outra condição médica estiver presente, o medo, a ansiedade ou a esquiva não deve estar relacionado ou é excessivo. O diagnóstico deve especificar se os sintomas do individuo estão restritos à fala ou ao desempenhar em público. Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno de ansiedade social são: a timidez normal, agorafobia, Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 33 transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de ansiedade de separação, transtorno depressivo maior, transtorno dismórfico corporal etranstornos da personalidade. A timidez é um traço de personalidade comum e não é por si só patológica. Nos Estados Unidos a prevalência de transtorno de ansiedade social em pessoas tímidas é de 12%. Pessoas com diagnóstico de agorafobia podem ter medo ou evitar situações sociais, não porque temem ser expostos ou avaliados, mas porque escapar pode ser difícil ou o auxílio pode não estar disponível no caso de incapacitação. IMPORTANTE Uma criança com transtorno de ansiedade social experimenta muita preocupação e temor ao interagir com outras pessoas e fica ansiosa quando é (ou pensa que é) o centro das atenções. É preciso deixar claro que os indivíduos com transtorno de ansiedade social podem ter ataques de pânico, mas a preocupação está relacionada ao medo de avaliação negativa, enquanto no transtorno de pânico a preocupação se relaciona aos próprios ataques de pânico. No transtorno de ansiedade generalizada, as preocupações sociais são comuns, mas o foco é na natureza das relações existentes e não no medo de avaliação negativa. As crianças com transtorno de ansiedade generalizada podem ter preocupações excessivas acerca da qualidade do seu desempenho, mas essas preocupações também são pertinentes ao desempenho e não a quanto o indivíduo está sendo avaliado pelos outros. No transtorno de ansiedade social, as preocupações focam no desempenho social e na avaliação dos demais. IMPORTANTE O fóbico social apresenta um grande desejo de causar uma impressão favorável nos outros e uma insegurança significativa na sua habilidade de atingir esse objetivo. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência34 As crianças com transtorno de ansiedade de separação podem evitar contextos sociais (incluindo recusa à escola) devido às preocupações de serem separados das figuras de apego. Geralmente ficam confortáveis em contextos sociais quando sua figura de apego está presente ou quando estão em casa, enquanto aquelas crianças com transtorno de ansiedade social podem ficar desconfortáveis quando ocorrem situações sociais em casa ou na presença das figuras de apego. Os indivíduosdiagnosticados com transtorno depressivo maior podem se preocupar em serem avaliados negativamente pelos outros porque acham que são maus ou não merecedores de que gostem deles. Em contraste, aqueles com transtorno de ansiedade social preocupam- se em serem avaliados negativamente devido a certos comportamentos sociais ou sintomas físicos. No transtorno dismórfico corporal, os indivíduos preocupam-se com a percepção de um ou mais defeitos ou falhas em sua aparência física que não são observáveis ou parecem leves para os outros. Essa preocupação, frequentemente, causa ansiedade social e esquiva. Por seu frequente início na infância e sua persistência durante a idade adulta, o transtorno de ansiedade social pode se parecer com um transtorno da personalidade. A sobreposição mais comum é com o transtorno da personalidade evitativa. Os indivíduos com esse transtorno têm um padrão mais amplo de esquiva do que aqueles com transtorno de ansiedade social. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 35 Transtorno depressivo OBJETIVOS Ao término deste capítulo você será capaz de compreender e de identificar os aspectos diagnósticos e as características do transtorno depressivo. Essa competência é fundamental para a realização de diagnósticos diferenciais e comorbidades. E então? Vamos começar?! Desenvolvimento O transtorno depressivo maior pode surgir pela primeira vez em qualquer idade, mas a probabilidade de início aumenta sensivelmente com a puberdade. O curso do transtorno depressivo maior é bastante variável. Alguns indivíduos raramente experimentam remissão (um período de dois meses ou mais sem sintomas ou apenas 1 ou 2 sintomas não mais do que em um grau leve), enquanto outros experimentam muitos anos com poucos ou nenhum sintoma entre episódios discretos. VOCÊ SABIA? O transtorno depressivo encontra-se cada vez mais frequente em crianças e em adolescentes. A ocorrência dos sintomas em crianças têm se mostrado maior na faixa etária entre seis e onze anos de idade. A cronicidade dos sintomas depressivos aumenta significativamente a probabilidade de transtornos da personalidade, ansiedade e abuso de substância subjacentes e diminui a probabilidade de que o tratamento seja seguido pela resolução completa dos sintomas. A recuperação em geral começa dentro de três meses após o início (para 2 em cada 5 indivíduos com depressão) ou em um ano para 4 em cada 5 indivíduos. Muitos indivíduos que estiveram depressivos por apenas alguns meses se recuperam espontaneamente. A duração do episóido Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência36 atual prediz muito da taxa de recuperação, além disso, características psicóticas, ansiedade proeminente, transtornos da personalidade e a gravidade dos sintomas auxiliam no entendimento do prognóstico. Durante muito tempo acreditava-se que as crianças não sofriam de depressão, entretanto, existem muitas evidências de que o transtorno depressivo também ocorre na infância, e não somente na adolescência ou na vida adulta. IMPORTANTE A depressão infantil é um distúrbio de humor que vai além da tristeza normal e temporária, ela é uma perturbação orgânica, que envolve variáveis sociais, psicológicas e biológicas. Em adolescentes, indivíduos psicóticos ou com histórico de transtorno bipolar, muitos diagnósticos de transtornos bipolares iniciam com um ou mais episódios depressivos. O diagnóstico de depressão mista também aumenta o risco de diagnóstico maníaco ou hipomaníaco futuro. O curso do transtorno depressivo maior, de modo geral, não se altera com o envelhecimento. Os tempos médios de recuperação parecem ser estáveis por longos períodos, e a probabilidade de estar em um episódio não aumenta ou diminui com o tempo. VOCÊ SABIA? Na perspectiva neurobiológica, a depressão é vista como uma provável disfunção dos neurotransmissores devido à herança genética e também ao fato de áreas cerebrais específicas terem anomalias e/ou falhas. Características Sintomas como sentimentos de tristeza, de irritabilidade e de agressividade, dependendo da intensidade e da frequência, podem ser indícios de quadros depressivos em crianças. As súbitas mudanças de Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 37 comportamentos nas crianças, não justificadas por fatores estressantes, são de extrema importância para identificar o diagnóstico de transtornos depressivos. Os sintomas dos critérios para transtorno depressivo maior devem estar presentes quase todos os dias para serem considerados presentes, com exceção de alteração do peso e da ideação suicida. O humor deprimido deve estar presente na maior parte do dia, além de estar presente quase todos os dias. Insônia ou fadiga usualmente são a queixa principal. A tristeza pode ser negada inicialmente, mas pode ser revelada por meio de entrevista ou inferida pela expressão facial e por atitudes. Fadiga e perturbação do sono estão presentes em alta proporção de casos; perturbações psicomotoras são muito menos comuns, mas são indicativas de maior gravidade, assim como a presença de culpa delirante ou quase delirante. A principal característica de um episódio depressivo maior é o período de pelo menos duas semanas durante as quais há um humor depressivo ou perda de interesse ou prazer em quase todas as atividades. Os sintomas devem persistir na maior parte do dia, quase todos os dias, por pelo menos duas semanas consecutivas. Em crianças e adolescentes, o humor pode ser irritável em vez de triste. Além disso, deve estar presente ao menos quatro sintomas adicionais, como mudanças no apetite ou peso, no sono e na atividade psicomotora, na diminuição de energia, nos sentimentos de desvalia ou culpa; na dificuldade para pensar, para concentrar-se ou para tomar decisões; ou pensamentos recorrentes de morte ou ideação suicida, planos ou tentativas de suicídio. IMPORTANTE A quantidade e a variedade de experiências ruins vivenciadas formam um conjunto de fatores de risco potenciais para o desenvolvimento da depressão. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência38 Os sintomas depressivos podem interferir na vida da criança de maneira intensa, prejudicando seu rendimento escolar e seu relacionamento familiar e social. Para alguns indivíduos com episódios mais leves, o funcionamento pode parecer normal, mas exige um esforço acentuadamente aumentado. O humor em um episódio depressivo maior frequentemente é descrito pela pessoa como deprimido, triste, desesperançado ou desencorajado. Alguns indivíduos queixam de sentirem "um vazio", sem sentimentos ou com sentimentos ansiosos. Os indivíduos podem apresentar queixas somáticas (como dores corporais) ao invés de relatar sentimentos de tristeza. Muitos referem ou demonstram irritabilidade aumentada. Em crianças e adolescentes, pode desenvolver-se um humor irritável ou rabugento, em vez de um humor triste ou abatido. Essa apresentação deve ser diferenciada de um padrão de irritabilidade em caso de frustração. A perda de interesse ou de prazer quase sempre está presente. Os indivíduos podem relatar menor interesse por passatempos, "não se importar mais" ou falta de prazer com qualquer atividade anteriormente considerada prazerosa. A presença de sintomas como retraimento social ou negligência de atividades prazerosas é comum. Em alguns indivíduos, há redução significativa nos níveis anteriores de interesse ou de desejo sexual. As alterações no apetite podem envolver redução ou aumento. As perturbações do sono podem assumir a forma de dificuldades para dormir ou dormir excessivamente. É frequente os sintomas de diminuição da energia, cansaço e fadiga. O indivíduo pode relatar fadiga persistente sem esforço físico, mesmo as tarefas mais leves parecem exigir um esforço substancial. As alterações psicomotoras incluem agitação ou retardo psicomotor. A agitação ou o retardopsicomotor devem ser suficientemente graves a ponto de serem observáveis por outros, não representando meros sentimentos subjetivos. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 39 NOTA São sintomas frequentes do transtorno depressivo infantil a autocrítica elevada, os sentimentos de inferioridade e o comportamento agressivo. A agressividade e a irritabilidade são vistas mais nos meninos. O sentimento de desvalia ou culpa associados com um episódio depressivo maior pode incluir avaliações negativas e irrealistas do próprio valor, preocupações cheias de culpa ou de ruminações acerca de pequenos fracassos do passado. Num geral, os indivíduos interpretam mal eventos triviais ou neutros do cotidiano como evidências de defeitos pessoais. A autorrecriminação por estar doente e por não conseguir cumprir com as responsabilidades profissionais ou interpessoais é comum. Muitos indivíduos relatam prejuízo na capacidade de pensar, de concentrar-se ou de tomar decisões. Em crianças, uma queda abrupta no rendimento escolar pode refletir uma concentração pobre. Os indivíduos queixam-se de distraimento ou dificuldades de memória. Em indivíduos idosos, as dificuldades de memória podem ser a queixa principal e ser confundidas com os sinais iniciais de uma demência. Quando o episódio depressivo maior é tratado com sucesso, os problemas de memória apresentam recuperação completa. Em indivíduos com transtorno depressivo os pensamentos sobre morte, ideação suicida ou tentativas de suicídio são comuns. Esses pensamentos podem variar desde um desejo passivo de não acordar pela manhã, até pensamentos transitórios, porém, recorrentes, sobre cometer suicídio ou planos específicos para se matar. As pessoas com ideações suicidas graves podem ter colocado seus negócios em ordem, podem ter adquirido materiais necessários para o ato suicida e podem estabelecer um local e momento para consumarem o suicídio. A medida mais significativa para redução de risco do suicídio é a resolução de pensamentos que motivam a ideação, e não a negação do plano suicida. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência40 Critérios diagnósticos O diagnóstico de Transtorno Depressivo é realizado a partir da presença dos sintomas abaixo: • Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é de humor deprimido ou perda de interesse ou de prazer. São eles: 1. Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, conforme indicado por relato subjetivo (sentir-se triste, vazio, sem esperança) ou por observação feita por outras pessoas (parece choroso). 2. Acentuada diminuição do interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia, quase todos os dias (indicada por relato subjetivo ou observação feita por outras pessoas). 3. Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta, ou redução ou aumento do apetite quase todos os dias. 4. Insônia ou hipersonia quase todos os dias. 5. Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observáveis por outras pessoas, não meramente sensações subjetivas de inquietação ou de estar mais lento). 6. Fadiga ou perda de energia quase todos os dias. 7. Sentimentos de inutilidade ou de culpa excessiva ou inapropriada (que podem ser delirantes) quase todos os dias (não meramente autorrecriminação ou culpa por estar doente). 8. Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou indecisão, quase todos os dias (por relato subjetivo ou observação feita por outras pessoas). Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 41 9. Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, uma tentativa de suicídio ou de plano específico para cometer suicídio. • Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo; • O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a outra condição médica. • A ocorrência do episódio depressivo maior não é mais bem explicado por outros transtornos mentais como transtorno esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno delirante. • Nunca houve um episódio maníaco ou um episódio hipomaníaco. NOTA Essa exclusão não se aplica se todos os episódios do tipo maníaco ou do tipo hipomaníaco são induzidos por substância ou são atribuíveis aos efeitos psicológicos de outra condição médica. Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno depressivo são: episódios maníacos com humor irritável, transtorno do humor devido a outra condição médica, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e tristeza. Em suspeitas de episódios maníacos com humor irritável ou episódios mistos deve-se realizar uma criteriosa avaliação clínica da presença de sintomas maníacos. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência42 No transtorno do humor devido a outra condição médica deve- se investigar outras causas orgânicas, como hipotireoidismo, através de exames laboratoriais e físicos. A distratibilidade e a baixa tolerância à frustração podem ocorrer tanto em um transtorno de déficit de atenção/hiperatividade quanto em um episódio depressivo maior, caso sejam satisfeitos os critérios para ambos, o TDAH pode ser diagnosticado em conjunto com transtorno de humor. Períodos de tristeza são inerentes à experiência humana. Esses períodos não devem ser diagnosticados como um episódio depressivo maior, a menos que sejam satisfeitos os critérios de gravidade (presença de cinco dos nove sintomas), a duração (na maior parte do dia, quase todos os dias, por pelo menos duas semanas) e o sofrimento ou o prejuízo clinicamente significativos. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 43 Transtornos disruptivos OBJETIVOS Ao término deste capítulo você será capaz de compreender e de identificar os aspectos diagnósticos e as características dos transtornos disruptivos. Essa competência é fundamental para a realização de diagnósticos diferenciais e comorbidades. E então? Vamos começar?! Transtorno de Oposição Desafiante (TOD) Desenvolvimento Os primeiros sintomas do transtorno de oposição desafiante podem surgir durante os anos de pré-escola e, raramente, mais tarde, como após o início da adolescência. O transtorno de oposição desafiante precede o desenvolvimento do transtorno da conduta, sobretudo, em indivíduos com transtorno da conduta com início na infância. Mas muitas crianças e adolescentes com transtorno de oposição desafiante não desenvolvem o transtorno da conduta. O transtorno de oposição desafiante também apresenta risco para o desenvolvimento de transtornos de ansiedade e transtorno depressivo maior. Os sintomas desafiantes, questionadores e vingativos respondem pela maior parte do risco para transtorno da conduta, enquanto os sintomas de humor raivoso/irritável respondem pela maior parte do risco para transtornos emocionais. VOCÊ SABIA? Desvios de conduta como crises de raiva, mentir ou matar aulas fazem parte do desenvolvimento da criança e do adolescente, desde que não sejam constantes. Quando ocorrem de maneira isolada ou de maneira esporádica são vistos como normais e não sinalizam transtornos. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência44 As crianças e adolescentes com transtorno de oposição desafiante estão sob risco aumentado para uma série de problemas de adaptação na idade adulta, incluindo comportamento antissocial, problemas de controle de impulsos, abuso de substâncias, ansiedade e depressão. A frequência dos comportamentos associados ao transtorno de oposição desafianteaumenta no período pré-escolar e na adolescência. Características O transtorno de oposição desafiante (TOD) caracteriza-se por um padrão global de desobediência, do desafio e do comportamento hostil. As crianças discutem excessivamente com adultos, não aceitam responsabilidade por sua má conduta, incomodam deliberadamente os demais, possuem dificuldade em aceitar regras e perdem facilmente o controle se as coisas não seguem a forma que eles desejam. A principal característica do transtorno é um padrão frequente e persistente de humor raivoso/irritável, de comportamento questionador/ desafiante ou de índole vingativa. Os sintomas do transtorno de oposição desafiante podem se limitar a apenas um ambiente, mais frequentemente em casa. Os indivíduos que apresentam sintomas suficientes para atingir o limiar diagnóstico, mesmo que isso ocorra somente em casa, podem ter prejuízos significativos em seu funcionamento social. Entretanto, nos casos mais graves, os sintomas do transtorno estão presentes em múltiplos ambientes. Como os sintomas do transtorno são mais evidentes nas interações com adultos ou com pares que o indivíduo conhece bem, eles podem não ficar tão evidentes no exame clínico. NOTA O TOD é caracterizado por um padrão persistente de conduta negativa, desafiadora ou até mesmo hostil. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 45 Para diagnosticar o TOD é necessária a presença de quatro sintomas ou mais durante os seis meses precedentes. Além disso, persistência e a frequência dos sintomas deverão exceder os níveis considerados normais para a idade, o gênero e a cultura do indivíduo. Por exemplo, explosões de raiva para uma criança pré-escolar seriam consideradas sintomas do transtorno de oposição desafiante somente se tivessem ocorrido na maioria dos dias nos seis meses precedentes, se tivessem ocorrido com pelo menos três outros sintomas do transtorno e se as explosões de raiva tivessem contribuído para o prejuízo significativo. Geralmente, os indivíduos com esse transtorno não se consideram raivosos, opositores ou desafiadores, e costumam justificar seu comportamento como uma resposta a exigências ou circunstâncias despropositadas. A avaliação diagnóstica deve levar em consideração o quadro e o contexto de desenvolvimento do indivíduo, se a criança vivencia interações problemáticas, então a probabilidade de se comportar dessa forma é grande. Nas situações em que a criança estiver vivendo em condições particularmente precárias, em que poderão ocorrer negligência ou maus- tratos, a atenção clínica para diminuir a influência do ambiente pode ser útil. Critérios diagnósticos O diagnóstico de transtorno de oposição desafiante é realizado a partir da presença dos sintomas abaixo: • Um padrão de (a) humor raivoso/irritável, (b) de comportamento questionador/desafiante ou (c) índole vingativa com duração de pelo menos seis meses, como evidenciado por pelo menos quatro sintomas de qualquer das categorias seguintes e exibido na interação com pelo menos um indivíduo que não seja um irmão. Humor Raivoso/Irritável 1. Com frequência perde a calma; 2. Com frequência é sensível ou facilmente incomodado; Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência46 3. Com frequência é raivoso e ressentido; Comportamento Questionador/Desafiante 4. Frequentemente questiona figuras de autoridade ou, no caso de crianças e adolescentes, adultos; 5. Frequentemente desafia acintosamente ou se recusa a obedecer a regras ou a pedidos de figuras de autoridade; 6. Frequentemente incomoda deliberadamente outras pessoas; 7. Frequentemente culpa outros por seus erros ou mau comportamento; Índole Vingativa 8. Foi malvado ou vingativo pelo menos duas vezes nos últimos seis meses. NOTA A persistência e a frequência desses comportamentos devem ser utilizadas para fazer a distinção entre um comportamento dentro dos limites normais e um comportamento sintomático. No caso de crianças com idade abaixo de 5 anos, o comportamento deve ocorrer na maioria dos dias durante um período mínimo de seis meses, exceto se explicitado de outro modo (Critério 8). No caso de crianças com 5 anos ou mais, o comportamento deve ocorrer pelo menos uma vez por semana durante no mínimo seis meses, exceto se explicitado de outro modo (Critério 8). Embora tais critérios de frequência sirvam de orientação quanto a um nível mínimo de frequência para definir os sintomas, outros fatores também devem ser considerados, tais como se a frequência e a intensidade dos comportamentos estão fora de uma faixa normativa para o nível de desenvolvimento, para o gênero e para a cultura do indivíduo. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 47 • A perturbação no comportamento está associada a sofrimento para o indivíduo ou para os outros em seu contexto social imediato ou causa impactos negativos no funcionamento social, educacional, profissional ou outras áreas importantes da vida do invidíduo. • Os comportamentos não ocorrem exclusivamente durante o curso de um transtorno psicótico, por uso de substância, de depressivo ou bipolar. Além disso, os critérios para transtorno disruptivo da desregulação do humor não são preenchidos. O diagnóstico deve especificar a gravidade atual dos sintomas conforme especificado abaixo: • Leve: Os sintomas limitam-se a apenas um ambiente (em casa, na escola, no trabalho, com os colegas); • Moderada: Alguns sintomas estão presentes em, pelo menos, dois ambientes; • Grave: Alguns sintomas estão presentes em três ou mais ambientes. Diagnóstico diferencial e comorbidades Os principais diagnósticos diferenciais a serem realizados no transtorno de oposição desafiante (TOD) são: transtorno da conduta, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, transtornos depressivo e bipolar, transtorno explosivo intermitente, transtorno da linguagem e transtorno de ansiedade social. O transtorno da conduta e o transtorno de oposição desafiante estão relacionados a problemas de conduta que colocam o indivíduo em conflito com adultos e com outras figuras de autoridade. Geralmente, os comportamentos do transtorno de oposição desafiante são de natureza menos grave do que aqueles relacionados ao transtorno da conduta e não incluem agressão a pessoas ou a animais, destruição de propriedade Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência48 ou um padrão de roubo ou de falsidade. Além disso, o transtorno de oposição desafiante inclui problemas de desregulação emocional que não estão inclusos na definição de transtorno da conduta. O TDAH é frequentemente comórbido com o transtorno de oposição desafiante. Para fazer um diagnóstico adicional de transtorno de oposição desafiante é importante verificar se a falha em obedecer às solicitações de outros não decorre somente em situações que demandam esforço e atenção sustentados ou que exigem que o indivíduo permaneça quieto. Os transtornos depressivo e bipolar envolvem características de irritabilidade e de afeto negativo. O diagnóstico de transtorno de oposição desafiante não deverá ser feito se os sintomas ocorrerem exclusivamente durante o curso de um transtorno do humor. Já no transtorno explosivo intermitente, as altas taxas de raiva podem ser acompanhadas de agressão grave dirigida a outros, o que não faz parte da definição de transtorno de oposição desafiante. O transtorno de oposição desafiante deve também ser diferenciado da incapacidade para seguir orientações decorrente de uma alteração na compreensão da linguagem, como perda auditiva ou dificuldade de compreensão. No Transtorno de ansiedade social há a recusa decorrente do medo de uma avaliação negativa, já no transtorno de oposição desafiante não há. Transtorno de Conduta Desenvolvimento O início do transtorno da conduta pode ocorrer no começo dos anos pré-escolares, embora os primeirossintomas significativos costumem aparecer durante o período que vai desde a segunda infância até a fase intermediária da adolescência. Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 49 IMPORTANTE O Transtorno de conduta engloba uma série de ações comportamentais persistentes que desobedecem os direitos dos outros e infringem regras e normas sociais. O transtorno de oposição desafiante pode ser um precursor comum do transtorno da conduta com início na infância. O transtorno da conduta pode ser diagnosticado em adultos, embora os sintomas geralmente tenham início na infância ou na adolescência, sendo raro o início depois dos 16 anos. O curso do transtorno é variável. Os transtornos com início na adolescência e com sintomas reduzidos e mais leves podem apresentar um ajuste social e profissional quando adultas. No entanto, o tipo com início precoce é um preditor de pior prognóstico e de risco para comportamento criminal, transtorno da conduta e de transtornos relacionados ao uso de substâncias na vida adulta. Os sintomas do transtorno variam de acordo com a idade à medida que o indivíduo desenvolve força física, capacidades cognitivas e maturidade sexual. Os primeiros sintomas tendem a ser menos graves, como mentiras ou furtos em lojas, ao passo que os problemas de conduta que surgem posteriormente tendem a ser mais graves, como o estupro e a agressão física. As diferenças acentuadas entre os indivíduos e o início dos sintomas predizem os comportamentos futuros, sendo que os mais danosos ocorrem com início em idades mais precoces. Na idade adulta, os sintomas de agressão, de destruição de propriedades, de falsidade e de violação de regras, incluindo violência contra colegas de trabalho, parceiros e crianças, poderão surgir no local de trabalho e em casa; e pode ser considerado o diagnóstico de um transtorno da personalidade antissocial. Características A principal característica do transtorno da conduta consiste em um padrão comportamental repetitivo e persistente no qual são violados Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência50 direitos básicos de outras pessoas ou normas ou regras sociais relevantes e apropriadas para a idade. Esses comportamentos devem se enquadrar em quatro grupos principais: • Conduta agressiva que causa ou ameaça causar danos físicos a outras pessoas ou animais; • Conduta não agressiva que causa perda ou danos a propriedade; • Falsidade ou furto; • Violações graves de regras. Na base do transtorno da conduta está a tendência permanente para apresentar comportamentos que incomodam e perturbam, além do envolvimento em atividades perigosas e até mesmo ilegais. Essas crianças e jovens não aparentam sofrimento psíquico ou constrangimento com as próprias atitudes e não se importam em ferir os sentimentos das pessoas ou desrespeitar seus direitos. Portanto, seu comportamento apresenta maior impacto nos outros do que em si mesmo. Frequentemente, o padrão de comportamento está presente em vários ambientes, tais como casa, escola ou comunidade e causam prejuízos clinicamente significativos no funcionamento social, acadêmico ou profissional. As crianças e adolescentes com o transtorno podem fazer provocações, ameaças ou assumir um comportamento intimidador (incluindo bullying). Iniciam brigas físicas com frequência. Utilizam armas que podem causar danos físicos graves, como bastões e garrafas. Podem ser fisicamente cruéis com pessoas ou animais. Cometem roubos com confronto à vítima ou forçam alguém à atividade sexual. A violência física pode assumir a forma de estupro, de violência ou, em casos raros, homicídios. Também ocorre a destruição deliberada de propriedade de outras pessoas, incluindo provocação de incêndios com a intenção de causar danos graves. Os atos de falsidade ou de furtos podem incluir invasão de casas, de edifícios ou de carros de outras pessoas. Podem mentir Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 51 ou quebrar promessas para obter bens ou favores ou evitar dívidas ou obrigações com frequência, ou furtar itens de valor considerável sem confrontar a vítima. Os indivíduos com transtorno da conduta também podem cometer violações graves às normas. As crianças com o transtorno costumam apresentar um padrão (iniciado antes dos 13 anos de idade) de ficar fora até tarde da noite, mesmo com a proibição dos pais. Também podem apresentar um padrão de fugir de casa, passando a noite fora. Para ser considerado um sintoma de transtorno da conduta, a fuga de casa deve ocorrer pelo menos duas vezes ou apenas uma vez se a criança não retornar por um longo período de tempo. Episódios de fugas de casa que ocorrem como consequência de abuso físico ou de abuso sexual não se qualificam para esse critério. Crianças com transtorno da conduta frequentemente faltam às aulas. O transtorno da conduta está frequentemente associado ao baixo rendimento escolar e a problemas de relacionamento com colegas, trazendo limitações acadêmicas e sociais ao indivíduo. São frequentes os comportamentos de risco envolvendo atividades sexuais, uso de drogas e até mesmo tentativas de suicídio. O envolvimento com drogas e gangues pode iniciar o jovem na criminalidade. Critérios diagnósticos O diagnóstico de transtorno de conduta é realizado a partir da presença dos sintomas abaixo: • Um padrão de comportamento repetitivo e persistente no qual são violados direitos básicos de outras pessoas ou normas ou regras sociais relevantes e apropriadas para a idade, tal como manifestado pela presença de ao menos três dos 15 critérios seguintes, nos últimos 12 meses, de qualquer uma das categorias adiante, com ao menos um critério presente nos últimos seis meses: Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência52 Agressão a Pessoas e Animais 1. Frequentemente provoca, ameaça ou intimida outros; 2. Frequentemente inicia brigas físicas; 3. Usou alguma arma que pode causar danos físicos graves a outros; 4. Foi fisicamente cruel com pessoas; 5. Foi fisicamente cruel com animais; 6. Roubou durante o confronto com uma vítima; 7. Forçou alguém a atividade sexual; Destuição de Propriedade 8. Envolveu-se deliberadamente na provocação de incêndios com a intenção de causar danos graves; 9. Destruiu deliberadamente propriedade de outras pessoas (excluindo provocação de incêndios); Falsidade ou Furto 10. Invadiu a casa, o edifício ou o carro de outra pessoa; 11. Frequentemente mente para obter bens materiais ou favores ou para evitar obrigações; 12. Furtou itens de valores consideráveis sem confrontar a vítima; Violações Graves de Regras 13. Frequentemente fica fora de casa à noite, apesar da proibição dos pais, com início antes dos 13 anos de idade; 14. Fugiu de casa, passando a noite fora, pelo menos duas vezes enquanto morando com os pais ou em lar substituto, ou uma vez sem retomar por um longo período; 15. Com frequência falta às aulas, com início antes dos 13 anos de idade; Transtornos psiquiátricos na infância e adolescência 53 • A perturbação comportamental causa prejuízos clinicamente significativos no funcionamento social, acadêmico ou profissional; • Se o indivíduo tem 18 anos ou mais, os critérios para transtorno da personalidade antissocial não são preenchidos. O diagnóstico deve determinar o subtipo do Transtorno conforme especificado abaixo: • Tipo com início na infância: Os indivíduos apresentam pelo menos um sintoma característico de transtorno da conduta antes dos 10 anos de idade. • Tipo com início na adolescência: Os indivíduos não apresentam nenhum sintoma característico de transtorno da conduta antes dos 10 anos de idade. • Início não especificado: Os critérios para o diagnóstico de transtorno da conduta são preenchidos, porém não há informações suficientes disponíveis para determinar se o início do primeiro
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