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4 Sustentabilidade Unidade I Profa. Karen Gimenez Apresentação do professor-autor Karen Gimenez, 53 anos, 35 de experiência profissional, nascida em São Paulo e residente em Cotia (SP). Formação Jornalista pela FMU/Fiam, Bacharel em Geografia pela USP (com ênfase na área ambiental), especialista em Estratégia Empresarial pela UniNove. Certificada como Master Coach, Master em PNL e Coach em Inteligência Financeira. Lugar institucional Atua como professora de pós-graduação na UNIP, desde agosto de 2015, lecionando nos cursos de Engenharia Logística, Psicologia Organizacional, Departamento de Pessoal, Psicologia Positiva e Inteligência Emocional, Gestão de Projetos e Inteligência de Mercado. Entre as disciplinas ministradas atualmente ou já ministradas estão: Coaching em Logística, Coaching e Treinamento, Liderança do Futuro, Negociação e Interdisciplinaridade, Gestão do Conhecimento, Comunicação no Ambiente Empresarial, Negociação e Administração de Conflitos e Liderança Positiva. É também pesquisadora associada do NACE- Escola do Futuro - USP Trajetória profissional Iniciou sua carreira como jornalista na mídia tradicional atuando em veículos como Jornal Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Revista Superinteressante e revistas técnicas na área industrial e de ciência durante doze anos. Migrou para as áreas de Comunicação Empresarial, Responsabilidade Social e Sustentabilidade, nas quais atuou por mais doze anos trabalhando tanto para organizações da Sociedade Civil (Programa Universidade Solidária, Instituto Ethos, Fundação Odebrecht, Instituto Holcim, Holcim Foundation for Sustainable Construction, WWF, Fundação Nacional da Qualidade) quanto para o Setor Público (Ministério da Agricultura e Instituto Nacional de Meteorologia), além de empresas privadas dos setores energético, mineração, alimentício e transporte, especializando-se em Gerenciamento de Crises. Desde 2012, atua como prestadora de serviços nas áreas de desenvolvimento gerencial e empresarial (Coaching Executivo e de Negócios), consultoria em Comunicação, Recursos Humanos, Responsabilidade Social, Sustentabilidade, Gerenciamento de Crises e Mediação de Conflitos. SUMÁRIO 1 O QUE É SUSTENTABILIDADE E O QUE ELA ENGLOBA ................................... 4 1.1 Conceitos relacionados à Sustentabilidade ..................................................... 4 2 GRANDES TEMAS DA SUSTENTABILIDADE NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE9 2.1 O impacto do homem no equilíbrio da vida na Terra ...................................... 9 2.2 Mudança no consumo e nas matrizes energéticas ....................................... 11 2.3 Políticas e problemas ambientais no Brasil ................................................... 13 2.4 A Amazônia ........................................................................................................ 16 3 O PAPEL DAS EMPRESAS E AS CERTIFICAÇÕES ........................................... 19 3.1 Tudo começa no planejamento ........................................................................ 19 3.2 Mercado sustentável e consumo consciente ................................................. 19 3.3 Certificações ambientais .................................................................................. 22 4 REPUTAÇÃO SUSTENTÁVEL. O PAPEL DA COMUNICAÇÃO ......................... 26 4.1 Construção da Reputação com base na Sustentabilidade ........................... 26 4.2 Relacionamento com o público interno .......................................................... 28 4.3 Responsabilidade Social e Marketing relacionado a Causas ....................... 28 REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 30 INTRODUÇÃO Caro aluno (a), Seja bem-vindo (a) à disciplina Sustentabilidade dentro do seu curso de Psicologia Organizacional. Vamos juntos navegar nesse fantástico mundo em que pessoas, recursos naturais e economia andam juntos em prol do nosso planeta para que ele seja um lugar melhor para viver. Sustentabilidade é um tema que permeia outros dois aspectos além do meio ambiente. Os aspectos social e econômico formam o chamado tripé da sustentabilidade, definido pela ONU – Organização das Nações Unidas - que, inclusive, relacionou objetivos a serem alcançados até 2030, para que a Terra se desenvolva com base na sustentabilidade. O chamado Desenvolvimento Sustentável, termo cunhado na própria ONU, foca na perpetuação e no equilíbrio da vida no planeta. Na conceituação da ONU, “desenvolvimento sustentável é aquele capaz de suprir as necessidades da geração atual, garantindo a capacidade de atender às necessidades das futuras gerações”. E qual a relação do tema com um curso de Psicologia Organizacional? Garanto a vocês que essa relação é muito próxima. O assunto é cada vez mais recorrente dentro das empresas, que se engajam progressivamente na agenda 2030. E esse engajamento é multidisciplinar. Envolve todas as áreas da organização, seja na gestão do cotidiano, na promoção do envolvimento das pessoas, bem como nas áreas técnicas e naquelas que ajudam a, diretamente, viabilizar a empresa financeiramente. Ao conhecer um pouco mais o tema, você notará que as empresas podem, inclusive, lucrar adotando um modo de gestão sustentável, o que traz, inclusive, ganhos para sua reputação – desde que a organização se comprometa efetivamente com a sustentabilidade – e não fique apenas no discurso. Você verá, independentemente da sua área de atuação, a importância do seu papel na concretização e na disseminação da sustentabilidade na sua cadeia produtiva. Vamos descobrir passo a passo como tudo isso funciona. Um grande abraço Profa. Karen Gimenez 4 1 O QUE É SUSTENTABILIDADE E O QUE ELA ENGLOBA Começaremos alinhando conceitos. Esse alinhamento é muito importante para que todos tenham a mesma percepção sobre os elementos de que estamos tratando e conheçam também um pouco da história de quando a sustentabilidade começou a despertar a atenção de populações e de autoridades em todo o mundo, bem como entendam como esse conceito vem transformando a vida das pessoas e o modo de operar das empresas. 1.1 Conceitos relacionados à Sustentabilidade Sustentabilidade: em uma primeira análise do termo, podemos dizer que se trata de algo que tem capacidade de se sustentar, que pode ser utilizado sem que esse mesmo recurso se esgote ou implique o esgotamento de algum outro. É esse o direcionamento a ser seguido. Levando-se em conta que a vida, seja a do homem, seja a do planeta, é composta de vários aspectos interligados, não podemos definir sustentabilidade como algo ligado a um único aspecto. Popularizaram-se definições como sustentabilidade ambiental ou sustentabilidade econômica, mas quando analisamos esses conceitos, vemos que eles fogem à essência do termo, que é a interligação de vários aspectos que formam a nossa sociedade. Não podemos isolar a questão ambiental da econômica ou da social, os chamados três pilares da sustentabilidade. Se trabalharmos o conceito isoladamente, ao falarmos sustentabilidade econômica, por exemplo, estamos dizendo que apenas os aspectos financeiros importam, tornando equivocada a interpretação do conceito básico de sustentabilidade, que considera a relação entre diversos aspectos da vida associados em três grandes grupos: economia, meio ambiente e sociedade. Por isso, quando dizemos que algo é sustentável, esse algo precisa sê-lo nesses três aspectos. Desenvolvimento Sustentável: baseando-se na definição de sustentabilidade, na percepção dos riscos da exploração cada vez maior de recursos naturais - a ponto de alguns não conseguirem mais se recuperar –, bem como do impacto dessa não recuperação na qualidade de vida do homem, e ainda com o crescenteaumento das desigualdades sociais, a ONU – Organização das Nações Unidas - começou a difundir a pauta da sustentabilidade para o debate entre os países. A partir daí surgiu a expressão desenvolvimento sustentável, sendo aquele “capaz de suprir as necessidades da geração atual, garantindo a capacidade de atender às necessidades das futuras gerações”. O termo começou a ser disseminado nos anos 1970, mais especificamente na Conferência da ONU, em 1972, conhecida como Conferência de Estocolmo, por ter sido realizada na capital da Suécia, Estocolmo. O relatório – em inglês – sobre essa conferência pode ser baixado gratuitamente no site da ONU1. Na ocasião, foi criado 1 Disponível em <http://www.un-documents.net/aconf48-14r1.pdf.> Acesso em: 20/06/2019. 5 o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma ou ONU Meio Ambiente), uma área específica da ONU para tratar do tema2. Apesar de ter pautado uma conferência da ONU, a questão da sustentabilidade não ganhou a devida popularidade na época. O termo começou a ocupar a mídia, embasar políticas públicas locais e mundiais e se tonar mais presente nas conversas mais populares nos anos 1990, a partir da Eco 92 – Conferência da ONU voltada para o meio ambiente, que aconteceu no Rio de Janeiro, em 1992. Alguns anos antes, em 1987, a ONU havia publicado um levantamento das questões ligadas aos desafios da sustentabilidade em forma de um livro, intitulado Nosso Futuro Comum. Desde então, a ONU vem tentando engajar países – e consequentemente as suas empresas e instituições – em objetivos e propostas para que, cada um cumprindo a sua parte, seja possível a concretização do desenvolvimento sustentável e, por conseguinte, a garantia da qualidade de vida e salubridade das próximas gerações. O documento mais recente recebeu o nome de agenda 2030, por estabelecer as metas que devem ser alcançadas pelos países, até essa data, para que possam continuar crescendo de maneira sustentável. Agenda 2030: é uma proposta da ONU que reúne dezessete objetivos do desenvolvimento sustentável para o planeta. Esse documento foi redigido em 2015, substituindo uma antiga versão chamada Oito Objetivos do Milênio, difundido pela mesma ONU, no ano 2000. Esse documento é recomendado como norteador para elaboração de políticas públicas e para fomentação de ações privadas. São estes os objetivos: Figura1. Objetivos do Desenvolvimento Sustentável Disponível em:<https://nacoesunidas.org/pos2015/.> Acesso em: 20/06/2019. 1. Erradicação da pobreza. 2. Fome zero e agricultura sustentável. 3. Saúde e bem-estar. 4. Educação de qualidade. 5. Igualdade de gênero. 6. Água potável e saneamento. 7. Energia limpa e acessível. 8. Trabalho decente e crescimento econômico. 9. Indústria, inovação e infraestrutura. 2 Disponível em <https://nacoesunidas.org/agencia/onumeioambiente/> Acesso em: 20/06/2019 6 10. Redução das desigualdades. 11. Cidades e comunidades sustentáveis. 12. Consumo e produção responsáveis. 13. Ação contra a mudança global do clima. 14. Vida na água. 15. Vida terrestre. 16. Paz, justiça e instituições eficazes. 17. Parcerias e meios de implementação. Você pode ver cada um desses objetivos definidos em detalhes, com as propostas de ação no site da ONU Brasil. No Brasil, o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, uma das principais instituições voltadas para apoiar as empresas que buscam se enquadrar no conceito de desenvolvimento sustentável, criou um conjunto de indicadores, inclusive para micro e pequenas empresas. Mais detalhes no site do Instituto Ethos5. Sobre a agenda 2030, você pode encontrar mais dados no site da ONU, em português6. Biodiversidade: quando falamos em sustentabilidade, é comum encontrarmos o termo associado à preservação da biodiversidade. Com toda razão, pois biodiversidade (também conhecida como diversidade biológica) engloba toda a variedade de vida encontrada na natureza, tanto no que diz respeito aos animais quanto à vegetação. Essa biodiversidade, cuja preservação tanto preocupa os cientistas, pode ser descrita como o sistema no qual se apoia a existência do homem. Sem ela teríamos problemas para conseguir alimento, água, recursos naturais para a fabricação dos nossos produtos de consumo. Teríamos até a nossa capacidade de respirar comprometida. Os sistemas de vida são interligados, um depende do outro para poderem sobreviver. Vamos pegar, como exemplo, os pássaros, os morcegos e as abelhas. Eles são responsáveis pela manutenção de uma grande quantidade de vegetação existente hoje. São os chamados agentes polinizadores porque carregam sementes, pólen e néctar de um lugar para o outro, fazendo com que a vegetação se reproduza. A supressão desses animais pode comprometer uma boa parte da produção de alimentos no mundo. Essas ligações são pouco perceptíveis para leigos, o que pode dificultar, em alguns momentos, o entendimento da preocupação com as abelhas, por exemplo. No site da Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária -, há diversos materiais técnicos mostrando a importância das abelhas na preservação da vida do homem 7. Na própria relação entre as plantas, encontramos a interdependência. Uma determinada árvore só sobrevive à sombra, por isso ela nasce ao lado de uma outra maior que lhe dará essa proteção. No caso dos animais, a questão da cadeia alimentar 7 Você retira uma espécie e o sistema todo pode se desequilibrar. Entram também nesse sistema complexo o regime de chuvas e de abastecimento de água. Daí a necessidade de estudos técnicos para a liberação do desmatamento de uma área, por exemplo, mesmo que seja para plantação de alimentos. No YouTube, há um vídeo que conta como a supressão de uma espécie animal no parque norte-americano de Yellowstone trouxe profundos desequilíbrios ao parque, inclusive ao seu sistema hídrico e como o problema foi resolvido8. Responsabilidade Social Corporativa (RSC): o papel social das empresas é discutido há séculos, nos livros de filosofia, sociologia e de economia, mesmo que com outros nomes e sem o mesmo destaque que o tema vem tendo no último século. As definições variam de autor para autor; há, inclusive, alguns que contestam a atribuição de um papel social ao mundo empresarial. Uma das definições mais simples do tema é a de Srour (1998, p. 295): “a responsabilidade social remete para a constituição de uma cidadania organizacional no âmbito interno da empresa e para a implementação de direitos sociais no âmbito externo […]”. É como se a empresa fosse uma pessoa da qual fosse cobrada uma postura cidadã diante da sociedade em que vive. Pensamento semelhante tem Ashley (2003) quando diz que a Responsabilidade Social Corporativa é um compromisso que a empresa tem com a sociedade onde está inserida e que, por meio dela, deve buscar contribuir para a melhoria da vida de todos que dela fazem parte. Trata-se de um conceito um pouco mais restrito que o de Sustentabilidade, mas nem por isso menos importante. Vale ressaltar aqui a importância de se diferenciar os dois conceitos. Quando uma empresa tem alguma ação voltada para Responsabilidade Social, não quer dizer, necessariamente, que ela esteja promovendo uma ação sustentável. Só será se essa ação contemplar os três pilares: social, ambiental e econômico. Mas nem todos pensam assim. Há economistas que acreditam que a contribuição com a sociedade ou com parte dela não é papel das empresas. O mais conhecido deles é Milton Friedman (1912-2006), que durante muitos anos foi professor da Universidade de Chicago, nos EUA. Friedman defendia que o papel das empresas é maximizar o lucro e atender às expectativas de seus acionistas, devendo os temas sociais ficarem a cargo dos governos. Ideologias à parte, o que vemos hoje é a valorizaçãocrescente pela sociedade – e consequentemente pelo consumidor de produtos e serviços – de marcas que estejam engajadas em atividades e em processos produtivos socialmente inclusivos e ambientalmente responsáveis. Esse alinhamento é tanto presente nas ações de marketing quanto na promoção da qualidade do produto ou serviço oferecido. Há empresas que se engajam em causas específicas – combate ao câncer, segurança no trânsito, patrocínio a ações educativas, por exemplo –, ou trabalham no desenvolvimento das comunidades do entorno de suas unidades, entre outras possibilidades. Muitos projetos de Responsabilidade Social Empresarial se dão por meio de parcerias com ONGs (Organizações Não Governamentais), pois nem sempre a empresa possui expertise ou a equipe necessária para a implementação ou criação 8 dos projetos. O financiamento de projetos pode se dar por meio de recursos da própria empresa ou por meios de leis de incentivo. As leis de incentivo, em termos gerais, revertem impostos pagos, ou a pagar, em verba para projetos sociais. Também há leis de incentivo feitas pelos estados e pelos municípios. As principais leis federais que as empresas podem utilizar são: Lei Rouanet. Lei do Audiovisual. Lei de Incentivo ao Esporte. Programa Nacional de Oncologia (Pronon). Programa Nacional de Acessibilidade (Pronas). É importante que a empresa se informe em quais dessas leis pode encaixar seus objetivos sociais. As ONGs que atuam em projetos de Responsabilidade Social costumam conhecer os trâmites. Falaremos mais sobre o tema em outra unidade. Vale ressaltar também que esse engajamento com a sociedade não pode deixar de lado o compromisso com o público interno. Vamos tratar do tema com mais detalhes no segundo bloco desta disciplina. 9 2 GRANDES TEMAS DA SUSTENTABILIDADE NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE Como parte integrante da vida na Terra, o homem sempre interferiu na dinâmica do planeta. Essa intervenção foi aumentando com o desenvolvimento tecnológico, com a conquista de novas terras e com o crescimento da população. Essa dinâmica fez com que, ao longo do tempo, surgissem questões globais relacionadas ao equilíbrio da vida no planeta. Se por um lado muita tecnologia ajudou a promover o desequilíbrio, essa mesma tecnologia pode ajudar na recuperação. 2.1 O impacto do homem no equilíbrio da vida na Terra Estima-se que os primeiros humanos surgiram na África há cerca de 200 mil anos. Nômades, porque eles ainda não conheciam a agricultura, esses homens foram, aos poucos, se espalhando pelo planeta. Fixaram-se em algumas regiões da Ásia e da Europa, chegando posteriormente às Américas. Esse deslocamento gradativo, aliado a outros fatores, ajudaram na distribuição desigual da população pelo mundo, bem como na formação de sociedades mais antigas, como a grega e a romana. Outras são bem mais novas, como a nossa, brasileira, que dependeram de projetos de expansão e de conquista, principalmente dos europeus. A antiguidade de cada civilização, a densidade demográfica (número de pessoas por km2), o colonialismo e o avanço tecnológico são elementos que contribuíram para a supressão de recursos naturais. A população humana cresceu muito rapidamente nos últimos dois séculos. Há um vídeo, feito pelo Museu de História Natural de Nova Iorque, que mostra como se deu esse crescimento e o avanço do homem por todos os continentes9. Desde 200 mil anos atrás – quando do surgimento do homem moderno – até o ano 1800, a população humana alcançou 1 bilhão de indivíduos. Apenas um século depois, em 1900, esse número subiu para 1,6 bilhão. Um século depois, no ano de 2011, a população humana na Terra atingiu os 7 bilhões. Em pouco mais de um século, essa população cresceu seis vezes o que ela demorou 200 mil anos para crescer. A projeção da ONU é que em 2100 esse número chegue a 10 bilhões. Será que a Terra suporta o consumo de 10 bilhões de pessoas da forma como esse consumo é feito hoje? Muitos cientistas apostam que não. O tema é base de milhares de estudos, bem como de conferências e acordos internacionais de uso racional dos recursos naturais. O tema mais recorrente é o clima, pois ele impacta todo o sistema de vida na Terra e também é impactado por ele. Vamos conhecer os mais importantes. 10 Quadro 1. Principais conferências e acordos ambientais globais A NO TÍTULO DESCRIÇÃO 1 972 Conferência de Estocolmo (ONU) Temas como pobreza, poluição e preservação dos recursos naturais. São definidos vinte e seis princípios e cento e nove ações voltadas para proteção ambiental. 1 979 Primeira Conferência Mundial do Clima (ONU) Debate técnico voltado para os impactos ambientais e econômicos referentes ao clima. 1 988 IPCC - Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas (ONU) Criação do órgão científico sobre mudanças climáticas, vinculado à ONU. 1 990 Segunda Conferência Mundial do Clima Análise das últimas pesquisas sobre aquecimento global e revisão das diretrizes e decisões da primeira Conferência. 1 992 Eco 92 Assinatura de cinco tratados mundiais: Agenda 21, Convenção da Biodiversidade, Convenção do Clima, Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Princípios para a Administração Sustentável das Florestas. 1 994 UNFCC Início das atividades do UNFCC (Convenção- Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima). 1 997 Protocolo de Kyoto Assinatura de acordo de compromissos ambientais para os países mais industrializados do mundo e sua execução a partir de 2005, com meta de redução de 55% das emissões. Ratificado por 192 países, inclusive o Brasil. Estados Unidos não assinou. Ao longo dos anos sofreu alterações. 2 000 Cúpula das Nações (ONU) Definição dos oito objetivos do Milênio para 2015. 2 002 Rio + 10 Revisão das decisões e ações da Eco 92. Aumento da abrangência do conceito de Desenvolvimento Sustentável. Acordo entre bancos privados e públicos promovido por iniciativa do International Finance Corporation (IFF), ligado ao Banco Mundial, e do 11 2 002 Princípios do Equador (IFF) banco privado ABN Amro. Prevê a inclusão de critérios sociais na classificação de risco para concessão de empréstimos e de financiamentos, permitindo juros mais baixos para empresas e projetos que comprovem inciativas ambientais e sociais. Adotada voluntariamente por bancos do mundo inteiro, inclusive brasileiros. 2 015 Acordo de Paris Compromisso de todos os países do mundo para revisão de suas práticas, com objetivo de reduzir o aquecimento global. Assinado por 169 países, inclusive o Brasil. Não assinado pela Rússia, Venezuela e alguns países da África e do Oriente Médio. 2 012 Rio + 20 Segunda revisão da Eco 92 – com a assinatura do documento “O futuro que queremos” -, com compromisso dos países para o desenvolvimento sustentável. Esse documento está relacionado à agenda 2030. Fontes: IFC (International Finance Corporation), UNFCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima), ONU (Organização das Nações Unidas) e OMM (Organização Meteorológica Mundial). 2.2 Mudança no consumo e nas matrizes energéticas Até meados do século XX, a humanidade pouco se preocupava com a qualidade ambiental das matrizes energéticas, com o excesso de consumo e com o descarte de resíduos. Em prol do desenvolvimento, passamos por diversas fases da história em que a aceleração da produção implicou o uso de recursos naturais altamente poluidores. Na época da Primeira Revolução Industrial – 1760/1830 –, as máquinas a vapor movidas a carvão passaram gradativamente a dominar a cena, levando a um segundo momento – até aproximadamente 1870 –, em que foram ganhando espaço as produções em escala e com alcance mundial. Com isso, houve aumento do uso do carvão mineral e de pesquisa sobre outras matrizesenergéticas. É importante lembrar que, naquela época, o foco era expandir e baratear a produção, sem qualquer preocupação ambiental ou social. Valia tudo para produzir mais. Em meados do século XIX, começaram também as primeiras pesquisas relacionadas ao petróleo, o qual se consolida, no século XX, como matriz energética, substituindo gradativa – mas não totalmente – o carvão por diesel, gasolina ou gás natural. Este último pode ou não ter o petróleo como origem. Por que motivo a matriz energética é um tema que tanto preocupa os especialistas em relação à questão ambiental? Pelo seu poder poluente. As chamadas “matrizes sujas” como carvão, petróleo e seus derivados jogam determinados elementos químicos no ambiente que trazem prejuízos para a vida na Terra. Esses elementos ajudam na formação do chamado “efeito estufa” e 12 contribuem para os chamados “buracos” na camada de Ozônio. No caso da camada de Ozônio, há outros gases mais perigosos do que os emitidos por essas matrizes energéticas, como mostraremos em seguida. Efeito estufa – quando na medida certa e de origem natural – é benéfico para a vida no planeta. Ele age como uma camada protetora e reguladora da temperatura, permitindo a dinâmica de vida vegetal e animal. O problema é que a ação do homem vem tirando esse equilíbrio, levando o efeito estufa a patamares acima dos considerados saudáveis, ajudando a intensificar o aquecimento global e transformando a função inicial de proteção em uma ameaça de desequilíbrio do clima. Os principais gases que intensificam o efeito estufa são o dióxido de carbono (resultado do uso de carvão mineral, dos combustíveis fósseis e do desmatamento) e o metano, produzido nos aterros sanitários e lixões e também como resultado do processo digestivo do gado. Outra camada protetora que temos na terra é a de Ozônio, que nos guarda da radiação solar. Essa camada também é ameaçada pela emissão de poluentes e, principalmente, de um gás chamado CFC. Esse gás, durante muitos anos, esteve presente nas embalagens aerossóis. É encontrado também em sistemas de refrigeração e no sistema de fabricação de plásticos. O que percebemos, com o acima exposto, é o relevante papel das empresas em todo o processo de equilíbrio climático. Vamos falar mais sobre essa participação das empresas ainda durante esta disciplina. No final desta página, há links para dois vídeos que ilustram como se dá o efeito estufa10 e como funciona a Camada de Ozônio11. Esse desequilíbrio, vindo de diversas origens e fortemente influenciado pela maneira como o homem lido com o meio ambiente, leva a uma das principais preocupações que se tem com o planeta, o aquecimento global. O aumento da temperatura média da Terra intensificado pelo homem (sim a Terra também tem eras mais frias e mais quentes naturalmente) pode trazer problemas se ultrapassar 1,5ºC. Segundo o IPCC, se esse aumento atingir os 3,5ºC, cerca de 70% da vida na terra poderá ser comprometida. Com 4ºC, praticamente toda a vida na Terra estaria comprometida. Veja alguns efeitos estimados pelo descontrole do aquecimento global: Desequilíbrio da distribuição das chuvas - mais inundações e mais secas. Alterações na vegetação - desertificação, desaparecimento de florestas e de outros biomas e, consequentemente, desaparecimento de rios e comprometimento da qualidade do solo. Mudanças do sistema de ventos alternando fortes tempestades, furacões e ciclones, com períodos de seca e de calor intenso. Aumento do nível médio do mar pelo derretimento das geleiras e, consequentemente, invasão das águas nas cidades costeiras. A NASA, agência espacial americana, divulgou uma animação mostrando aumento da temperatura no último século e as implicações no regime das marés12. 13 2.3 Políticas e problemas ambientais no Brasil Desde que o cuidado com o meio ambiente se tornou uma preocupação mundial, o Brasil desenvolveu ou aperfeiçoou uma série de leis voltadas para o tema. Afinal, o País abriga a maior floresta tropical do mundo e dois dos principais fornecedores de água doce do planeta: o rio Amazonas e o Aquífero Guarani. O aquífero é uma reserva de água no subsolo que ocupa 1,2 milhão de quilômetros quadrados, quase todo em território brasileiro, nas regiões Sul, Sudeste e Centro- Oeste. A Legislação ambiental atual foi feita em 2008 e é considerada tecnicamente eficaz entre os especialistas internacionais. Ela está disponível no site do Ministério do Meio Ambiente. Quando falamos de meio ambiente, é comum que haja uma associação imediata ao desmatamento e a outros temas ligados a áreas de preservação. Mas é muito importante olharmos também para o chamado meio ambiente urbano, que diz respeito às questões das áreas urbanas, principalmente das grandes cidades. Esses problemas vão desde a falta de áreas verdes - que ajudam tanto a regular o clima quanto a reduzir inundações, com o escoamento natural da água da chuva pelo solo - até o saneamento básico insuficiente e ainda a produção e a destinação incorreta do lixo das pessoas e das empresas. Poucos estados brasileiros têm coleta de lixo acima dos 90% dos domicílios, como mostram os mapas a seguir. É importante ressaltar que os mapas mostram áreas regulamentadas e com estrutura urbana. Há diversas regiões isoladas não atingidas pelo mapeamento. É importante ressaltar também que a coleta de lixo e a destinação correta do lixo são conceitos diferentes. É comum vermos na mídia flagrantes de lixo coletado incorretamente e cuja destinação se dá fora do que é determinado pela lei, em lixões a céu aberto ou aterros irregulares, e fora das especificações técnicas. A situação em relação ao sistema de esgotamento sanitário é pior. Há regiões em que cerca de 20% dos domicílios podem contar com esse serviço e justamente regiões com grandes áreas de proteção ambiental, como mostram os mapas. 14 Figura 2. Domicílios com coleta de lixo em 2018 (%) Fonte: Pnad 2018/IBGE Figura 3. Domicílios com tratamento de esgoto em 2018 (%) Fonte: Pnad 2018/IBGE Depois de quase duas décadas de debates, em 2010 o Brasil definiu a sua Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), um conjunto de leis que define como o Brasil deve tratar seu lixo domiciliar, industrial e eletrônico, podendo ou não ser reciclados. Nessa política estão desde as formas de descarte, o tratamento a ser dado e até o sistema de logística. A PNRS pode ser considerada uma medida tanto ambiental quanto de saúde pública. Ela parte do princípio da não geração de resíduos. Em sendo impossível essa não geração, que esta seja a mínima possível. Ela também propõe o reaproveitamento desse resíduo. Quando não for possível o reaproveitamento, que 15 seja feita a reciclagem. Em último caso, que haja a destinação final dentro de padrões seguros e ambientalmente corretos. A política versa também sobre os processos fabris, estimulando tecnologias limpas, sistemas de reaproveitamento e reciclagem, avaliação do ciclo de vida do produto, desenvolvimento de tecnologias de tratamento, além de sistemas de gestão integrada entre a produção e a destinação dos resíduos gerados pela produção. Essa política regula ainda as compras governamentais dentro de critérios ambientais e incentiva o consumo sustentável para toda a população. Prevê o fim dos lixões - os prazos vêm sendo prorrogados pelo não cumprimento. A data inicial era 2014 e a previsão atual é 2024 –, bem como o incentivo à regulamentação do trabalho dos catadores. Introduz o processo de logística reversa em que o fabricante de um determinado produto se torna responsável também pela destinação final da embalagem ou outros resíduos gerados. É possível encontrar hoje, por exemplo, fabricantes de lâmpadas e pilhas montando uma rede de locais de recolhimento. Alguns oferecem até prêmios para o consumidor que levarprodutos ao local de coleta. O fim dos lixões é um dos principais desafios. Sua substituição por aterros sanitários controlados para destinação do que não pode ser reaproveitado ou reciclado deve ser prioridade. Os aterros utilizam tecnologias de monitoramento e de segurança para impedir que a decomposição desse lixo contamine o solo e a água. O lixo produz gás que pode ser utilizado como energia – nos aterros esse aproveitamento é previsto. Ele tem também como resíduo um líquido perigoso chamado chorume, que pode contaminar grandes áreas de solo se for levado pelos rios. Nos projetos dos aterros, o chorume precisa ser tratado. O contato do lixo com o solo é impedido por mantas isolantes. Outro sério problema dos lixões é a falta de controle de acesso a eles. Milhares de famílias adentram esses locais sem qualquer equipamento de proteção em busca de algo que possam vender para sobreviver e até em busca de comida. Um dos marcos de discussão da situação das famílias vivendo do lixo veio à tona no final dos anos 1980 quando o diretor de cinema Jorge Furtado produziu um filme de curta-metragem chamado Ilha das Flores14. Esse filme mostra a trajetória de um tomate, do plantio, da venda e do descarte por uma família de classe média até o consumo por uma família que o encontrou no lixão. São vários elementos ambientais, sociais, econômicos e de saúde ligados à questão do lixo. E mesmo com a política definida em 2010, o Brasil ainda tem um longo caminho a seguir. Para monitorar o processo, foi criado um indicador, o ISLU – Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana. O terceiro levantamento foi feito em 2018 e os números ficaram aquém do esperado. As principais conclusões desse levantamento foram as seguintes: 53% do lixo urbano brasileiro ainda é destinado incorretamente; A coleta atinge em média 76% dos municípios brasileiros (há uma certa diferença dos dados apresentados pelo mapa do IBGE nesse quesito (pág. 17), mas é consenso que o sistema ainda é deficiente; 61% dos municípios não têm uma fonte fixa de arrecadação para custear o sistema de coleta e destinação de lixo domiciliar; Apenas 3,7% dos resíduos são reciclados. 16 O problema é grave e depende de mudanças em todos os setores da sociedade: do produtor que não segue as determinações da logística reversa ou não desenvolve seu processo industrial para reduzir a geração; das políticas públicas não implementadas na coleta e na destinação em muitas regiões; até o consumidor final que faz o descarte inicial incorreto ou ainda não adotou hábitos referentes a consumo sustentável. A produção cinematográfica e em vídeo sobre o problema do lixo no Brasil é rica e bastante ilustrativa. Em 2010, o Brasil chegou a ser premiado no Festival de Berlim de Cinema com o documentário Lixo Extraordinário15, em que o fotógrafo Vick Muniz mostra como é possível melhorar a vida dos catadores unindo os conceitos de lixo e arte. Veja no final desta página diversas sugestões de vídeos sobre o problema do lixo e o trabalho dos catadores16. 2.4 A Amazônia Figura 4. Mapa da Amazônia Fonte: NASA (2016) Um dos patrimônios naturais mais importantes do mundo, a Amazônia tem 60% de sua área em território brasileiro, ficando os outros 40% espalhados em oito países vizinhos. Alvo de constantes ameaças e debates, a Amazônia, com seus 7 milhões de km2, corresponde a mais de metade das florestas tropicais existentes em todo o mundo e abriga a maior biodiversidade do planeta. Por mais que haja 17 pesquisas, pode-se dizer que ainda se sabe pouco sobre ela. A floresta é um agente de grande importância na regulação do clima – principalmente do sistema de chuvas – de toda a América do Sul e impacta todo o planeta. Seu desaparecimento pode levar à transformação climática em todo o continente, com o surgimento de grandes áreas semiáridas ou desertificadas e outras sujeitas a constantes tempestades e inundações. Essas mudanças terão reflexos nos outros continentes também. Muito cobiçada pela agricultura – pela sua grande extensão de área virgem -, a Amazônia não é o paraíso agrícola com que muitos sonham. A composição do seu solo é mineralmente pobre. O que a deixa em pé não é a qualidade mineral do solo, mas a própria floresta com o que ela mesma descarta: restos vegetais e animais mortos, que formam uma espécie de moto-contínuo de nutrição dentro do próprio bioma e que a vegetação nativa consegue explorar com eficiência. A derrubada da floresta, com a introdução da agricultura tradicional, pode exaurir esse solo rapidamente, sendo necessária a aplicação de constantes aditivos para ampliar o período de fertilidade, ou então levando-se ao desmatamento de novas áreas em busca de um novo solo. Por isso tantas áreas são abandonadas poucos anos depois do início do plantio. Essa pobreza mineral do solo faz com que muitas áreas que não conseguem mais ser regeneradas, ou onde não há mais produtividade na plantação, sejam utilizadas para pastagens, em processo extensivo de criação de gado. Além de ocuparem espaços que anteriormente foram de floresta, a criação de gado traz um outro elemento preocupante, quando falamos de preservação ambiental, que é a produção de gás metano. O processo digestivo do boi deixa um gás residual muito rico em metano, um dos maiores poluentes da atmosfera. Os tipos de agricultura mais recomendáveis para a Amazônia são o extrativismo – em que se recolhem óleos, frutos e sementes de árvores nativas sem a sua derrubada – ou a chamada agrofloresta, na qual a agricultura funciona em sistema de consórcio com a floresta; ela é introduzida sem a derrubada da floresta e com culturas que convivam bem com as árvores nativas. Há uma relação direta de sobrevivência entre a floresta e a bacia hidrográfica, cujo principal rio é o Amazonas. Em alguns pontos, a largura do rio pode chegar a 11 km, na época de seca, e a 45 km, na época de chuvas. Esse fato é de grande importância para a manutenção da floresta, para a pesca, para navegação e para fornecimento de água. A capacidade do transporte fluvial existente na Amazônia é subaproveitada, bem como em rios de todo o Brasil. A história brasileira mostra a priorização das rodovias no lugar das hidrovias, sendo estas últimas mais sustentáveis, desde que planejadas e operacionalizadas com os devidos cuidados ambientais. A manutenção da floresta em pé pode ser lucrativa para a indústria, com as pesquisas em biotecnologia voltadas para as áreas farmacêutica e de alimentos. Por ser um sistema vivo em constante integração, a Floresta Amazônica – bem como outras semelhantes – tem seu limite próprio de recuperação natural. O que isso significa? Até um determinado ponto, ela se recupera sozinha do desmatamento e, em um segundo momento, somente com ajuda do homem. Depois, por não conseguir mais ter os elementos mínimos de integração do seu bioma funcionando, a floresta começa a diminuir até desaparecer, como se fosse uma pessoa emagrecendo continuamente até morrer. Há diferentes estimativas em 18 relação a esse “ponto de virada” da floresta, mas a maioria dos pesquisadores indica que, a partir dos 25% de destruição, não seria mais possível recuperar a Amazônia, nem mesmo com a ajuda do homem. O processo se tornaria irreversível. A maioria dos indicadores mostra que a destruição atual da floresta está entre 17% e 20%. 19 3 O PAPEL DAS EMPRESAS E AS CERTIFICAÇÕES As empresas – de qualquer tamanho e segmento – podem atuar de maneira sustentável sem comprometer sua lucratividade. Para operar dessa maneira, é necessário conhecimento técnico, planejamento e uso de ferramentas de gestão. Mais do que verbas volumosas, a gestão sustentável necessita de informação. A atuação sustentável vai de pequenas práticas do dia a dia até o planejamento estratégico e o desenvolvimento de produtos e serviços. Vamos falar dessas práticas e também das certificações relacionadasao tema. 3.1 Tudo começa no planejamento Para que as atuem de maneira sustentável e com lucratividade, é recomendado elencar os aspectos sustentáveis desde a concepção do modelo de negócio. Empresas já em funcionamento podem rever seu planejamento e até seu modelo de negócio para implementar aspectos sustentáveis neles. É importante ressaltar que, quando falamos em aspectos sustentáveis, estamos tratando de elementos bem mais robustos do que a troca de copos plásticos por canecas ou a separação de lixo. Quando desenhamos um modelo sustentável de negócio, consideramos desde a utilização – ou não – de um espaço físico, por exemplo. Será que conseguimos gerir nossa área ou nosso negócio com os profissionais trabalhando remotamente, o que traria uma redução substancial de recursos, bem como dos poluentes durante o deslocamento? Podemos inserir aqui também a qualidade de vida do profissional, pensando no braço social da sustentabilidade. Um modelo sustentável de negócio pede planejamento estratégico que leva em conta esses valores. Os aspectos da sustentabilidade devem considerar ainda o desenho dos produtos, as matérias-primas escolhidas, a seleção de fornecedores e também as pequenas práticas diárias, como redução ou eliminação da impressão de papéis, separação de lixo. Enfim, evitar desperdício em absolutamente tudo – até de tempo – entre outros elementos da rotina da empresa. Dar canequinhas para os funcionários e comprar matéria-prima de procedência duvidosa só porque é mais barata foge do processo de sustentabilidade. Falaremos mais sobre isso na próxima aula, quanto vamos tratar da imagem e da reputação das empresas sustentáveis. 3.2 Mercado sustentável e consumo consciente As exigências do consumidor mudam com o passar do tempo. Dos anos 1970 até a década de 1990, por exemplo, a tendência de consumo era voltada para a ostentação. Grandes e potentes carros, itens de luxo, tudo consumido em grande quantidade. Giles Lipovetsky e Jean Serroy falam na obra A estetização no mundo - Viver na era do capitalismo artista sobre as tendências de consumo na era dos grandes magazines, sucedidos pelos shopping centers. 20 Desde então, a sociedade vem mudando seus valores, e muitos consumidores vêm repensando suas compras. Empresas engajadas na sustentabilidade costumam ser bons lugares para se trabalhar e – por toda preocupação necessária com o processo produtivo – tendem a oferecer produtos de boa qualidade. Consumir de maneira consciente vai além de comprar produtos feitos com matérias-primas naturais ou embalagens recicladas ou reaproveitáveis. Há diversos elementos que compõem os três pilares da sustentabilidade e podem ser investigados. Alguns deles, inclusive, são determinados nas leis de alguns países para permitir ou não a importação de produtos. Um exemplo é a União Europeia em relação aos cosméticos testados em animais. Empresas desse setor que buscam o mercado europeu não conseguem entrar na maioria dos seus países se seus produtos – ou as matérias-primas - forem testados, em sua cadeia produtiva, nos animais. Precisamos aprender a ler as embalagens. Produtos certificados costumam ter selos que atestam sua origem ou seu modo de produção. Nas latas de atum, por exemplo, quando encontramos o selo Dolphin Safe, sabemos que aquela pesca utilizou técnicas que protegeram os grupos de golfinhos. O que acontece muitas vezes é que eles são capturados juntamente com os atuns e, em seguida, descartados mortos. Os selos Cruelty Free são outro exemplo. Mostram que naquele processo produtivo não houve crueldade com animais. Nem sempre tudo está nos rótulos, daí a importância de pesquisarmos as marcas que compramos e também acompanharmos as notícias pela mídia. Uma produção sustentável não tem em sua cadeia produtiva (em todas as etapas desde a extração da matéria-prima até a entrega do produto nas mãos do consumidor) elementos como trabalho escravo análogo à escravidão ou com práticas abusivas, emissões além dos padrões permitidos, campanhas publicitárias preconceituosas ou que ofendam determinados grupos. Empresas assim são as que buscam eficiência energética, utilizam embalagens reduzidas, reutilizáveis e/ou recicláveis, matéria-prima certificada e extraída de maneira responsável, entre outros. Costumam também ser empresas consideradas boas para se trabalhar e que se engajam em causas sociais e/ou ambientais. A agricultura pode ser mais sustentável. O grande aliado é a tecnologia. São constantemente desenvolvidas e aperfeiçoadas técnicas voltadas para o aumento da produtividade em pequenos espaços, inclusive para permitir produção próxima das grandes cidades. Há experiências até de se utilizar topos de edifícios para cultivos, formando telhados verdes que ajudam a regular o clima, que trazem renda para a gestão do edifício e que podem se transformar em projetos de inclusão, empregando moradores de rua, por exemplo. Pensar de maneira sustentável é olhar o processo como um todo, com seus impactos diretos e indiretos. Dois outros pontos importantes na construção de um processo produtivo sustentável são a matriz energética (até para empresas de serviço) e a logística reversa, temas já citados em aulas anteriores e que serão retomados aqui com mais profundidade. Já vimos o quanto as chamadas fontes “sujas” de energia, como carvão, o petróleo e seus derivados são responsáveis por grandes quantidades de emissão. A boa notícia é que elas não são as únicas alternativas energéticas. Dependendo da 21 região em que estamos, já é possível utilizar a energia vinda do vento (eólica), aproveitar os raios do sol (solar). Há também pesquisas avançadas para o uso da energia gerada pelo movimento das marés (maremotriz). Os biocombustíveis – dependendo do seu processo produtivo e das emissões deixadas pelas misturas – também podem ser classificados como energia limpa. A questão dos biocombustíveis e das usinas hidrelétricas é delicada, pois a sua estrutura de geração (no caso das hidrelétricas) ou seus processos produtivos (no caso de alguns biocombustíveis) costumam destruir ecossistemas ou desmatar grandes áreas, comprometendo sua classificação como energia limpa. Conforme citamos na aula anterior, as empresas de determinados setores, principalmente as de produtos perigosos ou de alto risco como agrotóxicos, pilhas, baterias e lâmpadas, por exemplo, precisam implementar ações de recolhimento da embalagem de seus produtos ou dos próprios produtos depois de usados (logística reversa). A prática mais comum é a colocação de postos de coleta no lugar de venda ou outros locais frequentados por seus consumidores. Um outro exemplo de indústria que recolhe seus produtos usados é a de pneus. São cinco os setores prioritários na prática da logística reversa prevista pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (agrotóxicos, pneus, pilhas e baterias já adotavam a prática antes da lei): 1. Produtos e componentes eletrônicos. 2. Embalagens plásticas de óleos lubrificantes. 3. Lâmpadas de mercúrio, vapor de sódio e mista. 4. Embalagens e resíduos de medicamentos. 5. Embalagens em geral (papel, papelão, aço, vidro, alumínio, longa vida). De posse dos produtos ou das embalagens, esses fabricantes se responsabilizam por sua destinação. Há empresas especializadas nesse tratamento. Alguns produtos, como os pneus ou as embalagens – quando dotados de poder calorífico –, podem se transformar em combustível, alimentando fornos de outras indústrias, como alguns tipos de plástico que não podem ser reciclados. A prática da logística reversa não é exclusividade de produtos perigosos. Empresas cujos produtos utilizam garrafas pet ou latinhas como embalagem podem ajudar a organizar ou a financiar cooperativas de catadores, por exemplo, cumprindo tanto uma função ambiental quanto social e geradora de renda. A indústria de eletrônicos, ao recolher aparelhos antigos, pode reformá-los ou formarparcerias com pequenas empresas de conserto de eletrônicos e doá-los para projetos que atendem pessoas de baixa renda. Os exemplos são muitos, como redes de lanchonetes que recolhem e destinam o óleo utilizado em suas frituras. Há casos de empresas de cosméticos que incentivam a devolução das embalagens de seus produtos em suas lojas mediante cupons de desconto. Na indústria têxtil, uma fábrica de meias recolhe pés de meias usados – independentemente de serem de sua fabricação ou não, para reaproveitar os fios na produção de cobertores destinados a pessoas em situação de vulnerabilidade. 22 Veja como funciona o sistema de logística reversa previsto pela Política Nacional de Resíduos Sólidos. Figura 5. Logística reversa Fonte: Senado Federal (2017) É possível implementar muitos elementos de sustentabilidade em qualquer processo produtivo ou na prestação de serviços. Além de alguns conhecimentos específicos, como citamos no início deste capítulo, para mover essa roda de transformação do mundo, é fundamental estar aberto a mudanças, como não se conformar em como os processos são feitos hoje, ter dentro de si o propósito de fazer algo melhor para as pessoas e para o ambiente, com a consciência de que, quando esses processos são bem elaborados e implementados, também trazem ganhos para a própria empresa. 3.3 Certificações ambientais Um dos indicadores de sustentabilidade de uma organização é sua certificação ambiental. Dependendo da área de atuação, uma empresa pode receber selos e certificações de diversas instituições acreditadas ou uma certificação mais abrangente, como a ISO, cujos detalhes veremos daqui a pouco. Para obter qualquer um desses selos, a empresa precisa cumprir uma série de requisitos documentais e práticos e, em muitos casos, passar por auditorias periódicas. Anteriormente citamos como exemplo, na indústria da pesca, o Dolphin Safe, emitido pelo Programa Internacional para a conservação dos Delfins (Apcid), que atesta que a pesca do atum foi feita sem a morte de golfinhos. No Brasil, o tema fica a cargo do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente). Falamos também do Cruelty Free, selo de uma organização internacional de mesmo nome, que atesta que nem o 23 produto, nem as matérias-primas e o processo produtivo, em nenhuma etapa, utilizaram testes em animais. Há diversos tipos de selos e certificações. Embalagens feitas em papel e produtos em madeira podem receber o selo FSC - Forest Stewardship Council –, que atesta que, na fabricação daquele item, o manejo da madeira foi feito de maneira sustentável. Na área de construção civil, projetos com eficiência energética podem receber o Leed - Leadership in Energy and Environmental Design, que avalia a eficiência energética de uma edificação em diversos níveis, entre outros. São diversos selos vindos de instituições nacionais ou internacionais, com variados níveis de medição e rigidez, a grande maioria voltada para a fabricação do produto. Figura 6. Selos de certificação Fontes: AICPD, Cruelty Free, FSC e LEED Quando pensamos na questão ambiental como um todo, a certificação mais conhecida e abrangente é a ISO 14000 e suas subdivisões. Vamos entender como funciona. ISO (International Organization for Standarization), ou Organização Internacional de Normalização, é uma instituição internacional fundada logo após o fim da Segunda Guerra Mundial com o intuito de unificar padrões empresariais - principalmente industriais - para a reconstrução da economia europeia. Suas normas se tornaram referência no mundo todo e abrangem diversos aspectos do universo empresarial. Vão desde definição de tamanhos e unidades, gestão da qualidade, identificação de livros, linguagens de programação, calibração de máquinas e laboratórios de ensaio, entre outros temas. Na questão ambiental, o que rege é a norma ISO 14000 e suas subdivisões. A mais conhecida e aplicada no Brasil é a ISO 14001, voltada para a gestão ambiental. Ao implementar as práticas da norma, as empresas passam por auditorias periódicas para manter ou não a certificação. Nessas auditorias, são verificados itens como: cumprimento da legislação; impactos ambientais das atividades; procedimentos e planos de ação para eliminar ou mitigar impactos ambientais; qualificação e treinamento das equipes. Esses padrões são constantemente revisados e atualizados mundialmente. No Brasil, a ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas - é a responsável pelas certificações da ISO. A ISO 14001 é aplicada com base em uma ferramenta bastante comum na gestão empresarial, que é o PDCA (plan-do-check-act) que, em português, significa planejar, fazer, checar e verificar: 24 Figura 7. ISO 14001 Fonte: ISO14.001 – Poli/USP/PECE (2016) Além da ISSO 14001, o sistema ISO 14000 conta com outras normas para auxiliar na implementação do processo ambiental. São elas: ISO 14004: trata do Sistema de Gestão Ambiental, voltada para o uso interno da Empresa. ISO 14010: rege as Auditorias Ambientais. ISO 14031: mostra os indicadores de Desempenho Ambiental. ISO 14020: voltada para Rotulagem Ambiental. ISO 14040: regem a análise do Ciclo de Vida de um produto. ISO 14063: define o processo de Comunicação Ambiental. Comprometimento ambiental Diagnóstico inicial Política ambiental 25 Dentre as citadas acima, destacamos a ISO 14063, voltada para a Comunicação Ambiental, pela afinidade do tema com a proposta deste MBA. Ela trata de como as informações ligadas à questão ambiental serão disseminadas pela empresa. Esse sistema – demonstrado abaixo - obedece a alguns princípios voltados para transparência na transmissão das informações; relevância dessas informações para o projeto ambiental e para os públicos envolvidos, interatividade, amplo acesso, bem como credibilidade e monitoramento do que é divulgado, além de linguagem acessível. Figura 8. ISO 14.063 Fonte: ISO 14063 (2006) Por que ter certificações como a ISSO são importantes para a empresa? Para melhoria da sua reputação – tema que exploraremos no próximo tópico –, para ter certeza da implementação correta e segura das ações e também para busca de mercados. Há empresas – e também em diversos órgãos do governo – em que a ISO 14001, e/ou outras certificações, são pré-requisitos para entrar na cadeia de fornecedores. 26 4 REPUTAÇÃO SUSTENTÁVEL. O PAPEL DA COMUNICAÇÃO O relacionamento das empresas com a sociedade vai além da dicotomia fornecedor-cliente e do uso dos meios de comunicação tradicionais para divulgar seus produtos ou serviços. O processo de construção de reputação de uma empresa está intimamente ligado ao seu processo de comunicação aliado às suas boas práticas diárias. Transparência, abertura de canais de múltiplas vias, entre outras práticas, são maneiras que ajudarão a empresa a se colocar no mercado e conquistar seu consumidor e seu lugar na sociedade, desde que elas reflitam dados reais da organização. 4.1 Construção da Reputação com base na Sustentabilidade Pouco ou nada adianta a empresa gastar milhares ou até milhões de reais em campanhas para promover sua reputação – seja ou não ligada à sustentabilidade – se as suas ações cotidianas não condizem com o que essa empresa divulga. No caso das questões ambientais, essa prática tem até um nome: chama-se greenwashing, ou “lavagem verde”. Propagar um processo produtivo sustentável e descartar resíduos em local inadequado, sem o devido tratamento; promover um programa de educação ambiental em sua região e não cuidar da separação de lixo internamente na empresa; divulgar a distribuição de copos de vidro e canecas em substituição a equivalentes descartáveis, como práticas ecológicas, e desperdiçar matéria-prima na fabricação de seus produtos são exemplos de greenwashing. Essa “lavagem” pode acontecer também nos outros pilares da sustentabilidadede maneira semelhante, mas daí sem o verde atrelado ao nome. Esses exemplos mostram que a construção da reputação de uma organização está diretamente relacionada ao quanto o plano de comunicação corresponde àquilo que efetivamente esse aplica no dia a dia. Por isso, para divulgar, é preciso primeiramente praticar. Algumas campanhas podem até ajudar a promover determinada marca ou associá-la a algum conceito. Mas, se não houver a prática, a construção dessa imagem tenderá a ruir de uma hora para outra. E por que é tão importante para uma empresa construir a sua reputação e por que motivo isso vai além de oferecer um bom produto ou serviço? Porque o consumidor compra experiências, soluções para seus problemas e gosta de gastar seu dinheiro com empresas que refletem os seus valores. Uma boa reputação agrega valor ao produto. As práticas corretas que embasam essa boa reputação ajudam a empresa, inclusive, a se reorganizar. A busca pela construção de uma reputação ligada à sustentabilidade pode fazer com que essa organização reveja suas práticas, por exemplo. Levando em conta os três pilares da sustentabilidade, a comunicação se insere fortemente no pilar social, mesmo quando tem temática ambiental ou econômica, pois está ligada às práticas de relacionamento. Levar as informações para toda a sociedade sobre seus processos produtivos, práticas ambientais e sociais, a publicação de balanços e relatórios faz parte do papel ético das empresas. Muitas reúnem esses dados em publicações anuais, chamadas de 27 relatório de sustentabilidade. Esses relatórios seguem metodologias internacionais – a mais conhecida é o GRI – Global Reporting Iniciative – que implicam a comprovação dos dados apresentados, os chamados testes de materialidade. Os relatórios anuais (ou bienais), sozinhos, não são suficientes para a construção da reputação de uma organização. Esses documentos costumam ser utilizados em concorrências públicas ou nas prospecções com clientes de grande porte, mas o processo comunicacional cotidiano implica muitas outras ações, entre elas a comunicação contínua com a sociedade e a comunicação com público interno – que veremos logo a seguir. Quando falamos dessa comunicação cotidiana, ela se dá por diversas frentes: on e off-line. Cada empresa tem a sua estratégia. Para isso, ela precisa analisar profundamente seu público, tanto aquele com quem se relaciona diretamente, bem como com a população que, indiretamente, sofre os impactos da sua atividade, e também com a sociedade em geral. Os meios e as linguagens devem ser adequados a cada público. Quem define essas escolhas são os hábitos de cada um deles. Em época de conectividade e redes sociais, a empresa precisa ter consciência de que o seu relacionamento se dá pela chamada “via de duas mãos”. A organização fala, mas também precisa escutar, o que se dá por meio de comentários em redes sociais ou em outros canais diretos. Daí a necessidade de se colocar profissionais especializados para coordenar esses trabalhos. Construção da reputação e comunicação têm técnicas específicas para serem implementadas. Cortar o espaço de comentários nas redes sociais, ou apagar os que apresentam críticas, ou ainda responder e-mails ou outras reclamações apenas com respostas-padrão costumam ser sinais de pouca transparência e pouca abertura ao diálogo. São vários os caminhos para implementar uma estratégia de comunicação para a construção da reputação: transparência no detalhamento da produção e composição de produtos, nas informações corporativas, visitas às unidades produtivas, comitês com a comunidade, programas de construção colaborativa, informativos digitais e físicos, redes sociais, rodas de conversa, entre diversas outras possibilidades, que vão variar conforme as características do público e dos recursos da empresa. O importante é que haja um planejamento específico para essa área e que ele seja um item que faça parte do modelo de negócio da empresa, que integre seu planejamento estratégico anual e que tenha uma verba destinada para esse fim. Ações eventuais e descoordenadas, assim como a falta de práticas que as sustentem, não constroem a reputação de uma organização. Boa reputação dá lucro, mas, quando é maculada, dá prejuízo. A construção da reputação de organização sustentável da indústria de cosméticos Natura, por exemplo, foi um dos principais elementos que abriu as portas para a empresa no mercado europeu. Em caminho oposto, a construtora Odebrecht precisou entrar com pedido de recuperação judicial após os impactos de seu envolvimento nas investigações sobre corrupção entre os anos de 2015 e 2019. O caso da Odebrecht é um exemplo claro do poder de impacto da reputação de uma empresa, já que o que levou o declínio da organização não teve relação com a qualidade técnica de seus projetos e obras, mas de sua conduta ética. 28 Processo semelhante se deu com a mineradora Vale, cujas práticas ambientais e de segurança resultaram nos acidentes de Mariana, em 2015, e o de Brumadinho, em 2019, ambos em Minas Gerais: não foi a qualidade técnica do mineral extraído por ela que impactaram negativamente a reputação da organização. 4.2 Relacionamento com o público interno A reputação de uma organização perante a sociedade e o mercado é de grande relevância para a sua sobrevivência, mas não é suficiente. Para manter sua estrutura sólida, a empresa precisa mais do que oferecer empregos a bons profissionais. Ela também precisa construir a sua reputação perante eles, primeiramente para atrair talentos. Há diversos rankings, inclusive, que medem a reputação da empresa para o público interno. O mais conhecido no Brasil é o Great Place to Work, instituição mundial que gera o ranking, em diversos países, das melhores empresas para se trabalhar. Depois de atrair os talentos, a empresa precisa retê-los. Enganam-se aqueles que acreditam que um bom salário é suficiente para manter profissionais em uma empresa. É crescente a quantidade de profissionais que buscam trabalhar em alguma organização com a qual eles se identifiquem, com quem compartilhem seus valores e que se sintam reconhecidos. Daí a importância das práticas de sustentabilidade e de processos transparentes de comunicação também com o público interno. Ambientes saudáveis, física e psicologicamente, para se trabalhar, possibilidade de os empregados serem ouvidos, acesso amplo a informações e aos benefícios que a empresa propõe para a sociedade e trabalho com propósito (a percepção de que estão em um time que traz melhorias para a sociedade) estão entre os principais elementos para a construção da reputação de uma organização com seus funcionários. Os profissionais precisam sentir que a importância que eles têm para a organização como pessoas vai além de uma mensagem esporádica de agradecimento e do depósito do salário. 4.3 Responsabilidade Social e Marketing relacionado a Causas As empresas estão inseridas dentro da dinâmica social, impactam e sofrem os impactos dela. A instalação de uma empresa em um determinado local tanto pode trazer empregos e mais segurança, por exemplo, quanto barulho contínuo, trânsito, poluição, entre outros problemas. Dentro da proposta de ser uma organização sustentável, está a manutenção de um bom relacionamento com o entorno de suas instalações. Muitas organizações projetam esse relacionamento em seus programas de Responsabilidade Social, cuja definição você viu na parte 1 deste caderno. Há, inclusive uma norma ISO que rege o tema, a ISO 26000 São várias as possibilidades de investimento nesse relacionamento, que podemos chamar popularmente de “política de boa vizinhança”. Além das práticas 29 internas de gestão responsável, empresas atuam no fortalecimento do seu entorno ou da sua região. Desenvolvem ou patrocinam programas educativos, esportivos ou culturais, auxiliam na instalação e na manutenção de infraestrutura nascidades ou bairros em que estão inseridas, desenvolvem programas de capacitação, geração de emprego, fomento ao empreendedorismo, entre outras ações, com foco na melhoria das condições de vida da sua região. Uma outra possibilidade de participação é o chamado marketing relacionado a causas, que é quando a empresa, normalmente em parceria com organizações não governamentais, investe em algum tema de cunho social. Esse tema pode estar ou não ligado ao tipo de negócio da empresa. Pode haver uma ligação imediata como, por exemplo, um fabricante de motocicletas ou uma montadora de automóveis se envolver em ações – investimento em pesquisas, por exemplo - e campanhas de segurança no trânsito. Pode haver uma relação direta com o público, mas não diretamente com o produto ou serviço, como uma empresa de cosméticos femininos investindo em prol da cura do câncer de mama. Ou ainda a empresa pode se engajar em uma ou mais causas de grande alcance mesmo não tendo qualquer relação com seu negócio ou seu público direto, como um banco promovendo a prática de esporte em comunidades de baixa renda. Um ponto de atenção das empresas em seus programas de Reponsabilidade Social é a coerência com as suas práticas cotidianas e o tratamento dado ao seu público interno. Por exemplo: uma empresa que investe em educação para população de baixa renda (até três salários mínimos, por exemplo), mas não contempla nenhum benefício a funcionários ou famílias de funcionários que se encontram nas mesmas condições desse público-alvo, não é coerente. O relacionamento com o público externo precisa ter coerência com as políticas aplicadas ao público interno. 30 REFERÊNCIAS ASHLEY, P. A. (coord.). Ética e responsabilidade social nos negócios. Rio de Janeiro: Saraiva, 2003. FRIEDMAN, M. Capitalismo e liberdade. São Paulo: Abril Cultural, 1984. (Coleção Os Economistas). LIPOVETSKY, G.; SERROY, S. A estetização do mundo: Viver na era do capitalismo artista. São Paulo: Cia das Letras, 2014. SROUR, R. H. Poder, cultura e ética nas organizações. São Paulo: GEN Atlas, 1998. ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Disponível em: https://nacoesunidas.org/conheca-os-novos-17-objetivos-de-desenvolvimento- sustentavel-da-onu/amp/. Acesso em: 20 jul. 2019. ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU. Disponível em: https://nacoesunidas.org/tema/agenda2030/. Acesso em: 20 jul. 2019. INDICADORES Ethos. Instituto Ethos, São Paulo, 11 jul. 2009. Disponível em: https://www.ethos.org.br/conteudo/indicadores. Acesso em: 20 jul. 2019. COMO LOBOS mudam rios. [S. l.: s. n.], 2014. 1 vídeo (4 min). Publicado pelo canal Sustainable Human. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ysa5OBhXz-Q. Acesso em: 20 jul. 2019. MUDANÇAS Climáticas. [S. l.: s. n.: s.d.]. 1 vídeo (9 min). Publicado pelo canal INPEvideoseduc. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ssvFqYSlMho. Acesso em: 20 jun. 2019. E SE A CAMADA de ozônio desaparecesse? [S. l.: s. n.], 2018. 1 vídeo (2 min). Publicado pelo canal DW Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=P Ilg6RdmGHA. Acesso em: 20 jul. 2019. ILHA das flores. Direção de Jorge Furtado. Porto Alegre: Casa de Cinema de Porto Alegre, 1989. 1 vídeo (13 min). Disponível em: https://vimeo.com/238439307. Acesso em: 3 set. 2021. LIXO Extraordinário. [S. l.: s. n.], 2010. 1 vídeo (3 min). Publicado pelo canal Downtown Filmes. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=_pyR9qCd2F8. Acesso em: 20 jul. 2019. 31 DOCUMENTÁRIO: No olho do furacão – Gritando em silêncio. [S. l.: s. n.], 2018. 1 vídeo (30 min). Publicado pelo canal Faraó Pictures. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3y61Pmptx5A. Acesso em: 20 jul. 2019.
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