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SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO REV. ASHBEL GREEN SIMONTON DANIEL MIRANDA RESENHA: O Drama da Doutrina RIO DE JANEIRO 2023 DANIEL MIRANDA RESENHA: O Drama da Doutrina Trabalho apresentado à disciplina Teologia Sistemática I do Seminário Teológico Presbiteriano Reverendo Ashbel Green Simonton, como requisito para obtenção de nota. Prof. Pr. Daniel Oliveira Kozlowiski. RIO DE JANEIRO 2023 2 VANHOOZER, Kevin. O Drama da doutrina. São Paulo: Vida Nova, 2016. pp. 17-50. O livro “O Drama da Doutrina”, é um livro complexo, e propõe diversas questões quanto ao papel da teologia. Kevin J. Vanhoozer é um grande escritor e professor de Teologia. Seus estudos em Westminster e Cambridge, bem como sua atuação profissional em Edinburgh, referendam seu cartão de visitas. Títulos acadêmicos ou experiências profissionais não são os requisitos para fazer de alguém um especialista ou teórico em sua área. Porém, “a obra de Vanhoozer autentica o que já era de se esperar de um Ph.D. formado em Cambridge”. O autor chama a atenção para qual seria a nossa origem, qual ciência possui mais importância na definição do ser? Ele destaca que, apesar de termos avançado a tal ponto de “mapear a galáxia” ainda não conseguimos nos situar totalmente. O capítulo é mais analítico do que descritivo, e usa principalmente as questões relativas aos pressupostos que se evidenciam quando fazemos essas perguntas. Nas páginas que serão observadas aqui (17-50), trataremos da introdução do livro, que destacará, dentre outras coisas, os pressupostos do autor, a natureza da doutrina, a verdade, a e a situação “dramática” das questões suscitadas. Kevin Vanhoozer, desenvolve seu método teológico sob a analogia da dramaturgia. Esta introdução, que tem por título “O caminho da verdade; a matéria da vida”, expressa realmente, o que o autor propõe: os caminhos que cada área de estudo percorre até encontrar a “sua verdade”. Mas a pergunta que ele quer responder, e consegue com louvor demonstrando o drama que é a doutrina e toda a história da redenção, é qual o papel da teologia na vida prática do cristão. Como disse o filósofo puritano William Ames: “A teologia é a ciência de viver na presença de Deus”. O Cenário: A Teologia e a Virada Linguístico-Cultural. O autor inicia seu diagnóstico sobre a igreja atual que “desprovida da sã doutrina (...) é levada por modismos culturais e intelectuais”. O excesso de acomodações filosóficas e culturais tem descaracterizado a igreja e a tornado fraca, deixando a sã doutrina de lado. Muitos teólogos hoje, ao invés de terem uma base de autoridade, estão confusos quanto que base vão usar. Não obstante não usarem as Escrituras como infalível autoridade, tendo em vista que, se assim não for, nada mais faz sentido, uma vez que tudo o que cremos é oriunda dela, hesitam quanto qual fonte de autoridade utilizar. Em outra obra, Vanhoozer trata dos prolegômenos, com o que devo começar a Teologia? Com a Bíblia, com Deus, com a igreja? Sua resposta está na obra “Teologia Primeira”. A Bíblia coincide com a revelação, ou um testemunho da revelação, ou 3 uma expressão da experiência de alguém sobre a revelação ou o produto da linguagem e da vida da igreja? Vanhoozer então, destaca quatro candidatos a revelação divina: As proposições bíblicas, a pessoa de Cristo, a espiritualidade cristã e as práticas da igreja. Basicamente, todos esses candidatos, não possuem firmamento e são derrubados em suas argumentações pois, cada um deles considera a doutrina como uma formulação de “segunda ordem” de algo que advém da primeira ordem. Para explicar esse ponto, vamos nos concentrar em dois desses quatro candidatos: As proposições bíblicas e a pessoa de Cristo. No centro da discussão Cristológica está a questão: De onde obtemos o nosso conhecimento sobre a pessoa e a obra de Jesus Cristo? A resposta é simples o suficiente: o único Jesus que a Igreja conheceu ou pode conhecer é o Jesus da Escritura. Assim, se a Escritura nos diz o que precisamos saber sobre a segunda pessoa da Trindade, ainda nos resta outra pergunta: É a fonte, isto é, a Bíblia e seus sessenta e seis livros, dos quais obtemos nosso conhecimento sobre Jesus, um livro confiável? Isto abre a porta para três possibilidades: 1. A Bíblia está livre de todos os erros no todo e nas partes; 2. A Bíblia está livre de erros em algumas de suas partes, mas é falsa em outras partes; 3. A Bíblia não é totalmente confiável e não pode ser confiada a qualquer verdade. Quem escolhe qualquer uma destas proposições depende de algum pressuposto básico a partir do qual o investigador começa sua análise. Em nosso mundo moderno, há basicamente duas maneiras pelas quais os homens escrevem teologia, e cada uma delas envolve um pressuposto que acaba de forma bem diferente. Com toda a probabilidade, a maioria dos estudiosos de hoje escolheria a opção dois. Mas quem escreve teologia corretamente começa com a pressuposição de que a Bíblia é um livro divino. Eles não negam que houve autores humanos que estavam envolvidos na escrita da Palavra de Deus. Os escritores da Sagrada Escritura foram divinamente inspirados pelo Espírito Santo, de modo que foram impedidos de escrever qualquer coisa que fosse falsa. A autoria divina do Espírito Santo garantiu que o produto final seria a Palavra de Deus sem erros, exatamente como o Jesus histórico foi o Filho de Deus sem pecado que foi concebido pelo mesmo Espírito Santo no ventre da Virgem Maria. Visto que Deus não pode mentir, nenhuma parte da Escritura é falsa. Tomar posse de uma doutrina não é apenas entende-la, mas assentir, ou seja, assimilar nas emoções e na imaginação, que para ele são o sentido da palavra coração nas Escrituras. 4 Este problema não é novo, o que é novidade é o declínio da influência do Iluminismo e a crescente influência da modernidade em legitimar toda ação humana. Logo, toda doutrina criada a partir dessa virada linguístico-cultural está debaixo da acomodação dos teólogos atuais as condições pós-modernas. Na ânsia de ser relevantes a doutrina deixa de ser vital, e agora assume um papel de figuração na nova linguagem. Uma premissa importante para o autor é que a Bíblia fala à nossa mente e à nossas emoções, a imaginação é uma ferramenta cognitiva. Devido a isso, o autor utiliza a dramaturgia como metáfora e analogia para explicar a teologia, ou a doutrina, pois, assim como na teologia, para que haja dramaturgia deve haver Fala e Ato. Um novo “fosso horrendo” “Nenhuma dicotomia é tão fatal para a noção de teologia doutrinária quanto a ideia de teoria e prática”. Para o autor, o que nos permitirá atravessar esse fosso horrendo da dicotomia entre teoria e prática, é o entendimento da teologia como sabedoria. O caminho que se demonstra sobre essa ponte, é o caminho que Cristo ensinou nas Escrituras. A verdade, como “no sentido de confiável”. A verdade também o é no sentido de aquilo que Deus pensa. Ora, a verdade não é apenas o caminho confiável, mas é o que Deus pensa em sua mente e revela-nos em sua Palavra, logo verdade é pensar como Deus pensa. A vida é estar incluído, por meio de Cristo, na vida do Dele próprio. Notamos que, até aqui, Vanhoozer evidencia a influência de Nicholas Lash, seu preceptor no doutorado. Vanhoozer desenvolveu essa perspectiva teológica a partir do descaso para com a doutrina, até mesmo nos arraiais conservadores. Doutrinas são roteiros, vagos, mas definitivos, que as pessoas de fé encenam; doutrinas são o drama em que vivemos a vida”. A fim de superarmos a divisão entre teoria e prática, ao invés de termos que escolher dentre elas, ao invés de preterir uma em função doutra, podemos adotar esse pensamento diante de ambas.E se, a doutrina é um drama, seu suspense reside nisto: será que os leitores encontrarão o caminho? No “teatro de operações exegéticas” o autor expõe as “n” interpretações possíveis para as Escrituras e demonstra como, com o passar do tempo, os exegetas se afastaram das Escrituras e se tornaram frios no seu trato. Procurando não se envolver com a interpretação teológica das Escrituras, resta então, algumas opções: desconstrução, estruturalismo ou até mesmo linguística. Por exemplo, John Mackintosh Shaw, ex-professor de Teologia Sistemática no Queen's College, refere-se aos termos: resgate, justificação, propiciação, expiação e reconciliação como metáforas ou figuras de linguagem (Christian Doctrine, 207). A partir deste 5 tipo de visão, pode e conclui-se que a revelação divina não pode ser uma comunicação da verdade. Deve a interpretação ser julgada? Para Vanhoozer, sim. Há certa semelhança entre um processo de interpretação textual e o processo de julgamento forense. O júri chegará a um veredicto interpretando provas, a maior parte formada por testemunhos ou escritos. Como se toma posse de uma doutrina? O assentimento intelectual não é suficiente, a doutrina precisa conquistar a as emoções e imaginação. Para Vanhoozer, a palavra coração na Bíblia, denota emoção e imaginação, isso veremos mais à frente. E, ainda, não basta apenas entender as proposições bíblicas devemos assentir: “Portanto, a teologia canônico-linguística extrai suas principais coordenadas das próprias Escrituras, fazendo do que chamaremos de práticas canônicas a norma para o discurso e par ao pensamento da igreja a respeito de Deus. Então, a ideia de Sola Scriptura retorna, mas sem postular a Bíblia como um manual repleto de dados propositivos, mas considerando-a um roteiro que demanda encenação fiel, ainda que criativa. As Escrituras são a norma para o caminho, a verdade e a vida cristãos, mas somente quando não são encaradas simplesmente como um manual de verdades propositivas.” p.39 Diferente do que se poderia pensar, Vanhoozer suscita suas questões não dos seus pensamentos abstratos, mas da situação atual da igreja. Para Vanhoozer a prática do Sola Scriptura é a melhor maneira de edificar a igreja e glorificar a Cristo. O que está em jogo, então é o julgamento da verdade, ou seja, “a capacidade dos seres humanos de reconhecer a Deus e tornar concreta a imagem dele na vida”. E como último argumento a ser levantado, o autor levantou os quatro candidatos a Inspiração divina, mas, então, o que é inspiração? O que a Bíblia quer dizer por inspiração? Recentemente na teologia, a Bíblia foi chamada de inspirada no mesmo sentido de que as peças de Shakespeare podem também ser chamadas de inspiradas. Ou seja, elas são inspiradoras; elas nos excitam, elas elevam nossas ideias, elas ampliam nossos pontos de vista e nos dão uma compreensão da natureza humana e é sob este sentido de inspiração, que geralmente é dito que nem todas as partes da Bíblia são igualmente inspiradas. As genealogias, leis cerimoniais e 6 medidas para construção do templo, por exemplos, são desnecessárias e sem inspiração. Mas isso é o que a Bíblia quer dizer por inspiração? Nós, certamente deveríamos ser muito cautelosos com o que queremos dizer quando discutimos esse assunto. Se duas pessoas tiverem dois significados diferentes em mente, sua conversa terá objetivos cruzados e um não poderá entender o outro. Da mesma forma, se uma pessoa por si mesma estuda sobre a inspiração (ou qualquer outro assunto) e não tem um conceito claro do que está estudando, ela não pode confundir ninguém por tanto tempo, visto que mantém seu pensamento para ela mesma; mas seus pensamentos em sua própria mente serão confusos, e lhe vai faltar compreensão. Infelizmente, isso é muitas vezes o que acontece nesse caso. A harmonia das partes é um ponto mais valioso. Pois, embora o incrédulo afirme que existem inúmeras inconsistências em toda Bíblia, a exposição paciente pode convencê-lo de que seu ensino é mais consistente do que ele pensa. Mas o público moderno tem uma crença enraizada de que a Bíblia é autocontraditória, e é extremamente difícil convencê-lo de outra forma. No entanto, a tentativa de mostrar a consistência lógica da Bíblia é, creio eu, o melhor método de defesa da inspiração. Mas, porque é tão intrincado e difícil, é natural que se pergunte sobre um método mais fácil. Mais uma vez, devemos considerar a natureza e os limites da “prova”. A prova demonstrativa, como ocorre na geometria, depende de axiomas não provados. Por mais válida que seja a demonstração, se duas pessoas não aceitarem os mesmos axiomas, não serão convencidas pela mesma prova. Existe, então, alguma proposição que o crente e o incrédulo aceitarão sem prova? Em tempos passados, houve áreas de acordo. Muitos não cristãos admitiam que Deus existe, por exemplo. Durante a Reforma, a veracidade da Escritura foi tão amplamente aceita, que as evidências pareciam fornecer provas conclusivas a qualquer mente normal. Mas essa situação não existe mais. Não só a maioria das pessoas rejeita a veracidade da Bíblia, mas muitas também rejeitam a crença em Deus. Nos tempos passados, geralmente concordava-se que os padrões morais de Jesus eram admiráveis. Mas hoje suas ideias sobre o casamento e os problemas trabalhistas são rejeitadas até mesmo por algumas igrejas chamadas de igrejas cristãs, e o resto de sua moralidade é, na melhor das hipóteses considerado inadequado. Quanto mais consistente a incredulidade for, menos acordo pode ser obtido. Contanto que o incrédulo seja inconsistente, podemos forçá-lo a fazer uma escolha. Se ele inconscientemente admira Jesus Cristo ou valoriza a Bíblia, ao mesmo tempo em que nega a inspiração verbal e plenária, podemos, pela lógica, insistir que ele aceite ambas, ou nenhuma delas. Mas não podemos, pela lógica, impedi-lo de escolher, nem de negar uma premissa 7 comum. Segue-se que, na teoria lógica, não existe proposição na qual um crente consistente e um incrédulo consistente possam concordar. Portanto, a doutrina da inspiração, como qualquer outra doutrina cristã, não pode ser demonstrada para a satisfação do pensamento claro de um incrédulo. Se, no entanto, pode-se mostrar que a Bíblia (apesar de ter sido escrita por mais de trinta e cinco autores durante um período de mil e quinhentos anos) é logicamente consistente, então o incrédulo teria que considerá-la como um acidente extremamente importante. Parece mais provável que uma única mente superior possa produzir esse resultado do que ele acontecer acidentalmente. A consistência lógica, portanto, é a evidência da inspiração; mas não é a demonstração. Os acidentes estranhos realmente ocorrem, e não há provas de que a Bíblia não é um acidente. Talvez improvável, mas ainda assim possível. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 1. VANHOOZER, Kevin. O Drama da doutrina. São Paulo: Vida Nova, 2016. pp. 17-50. 2. CHEUNG, Vicent. Ensinai as Nações, 2005. 3. CLARK, Gordon H., Uma Visão Cristã dos Homens e do Mundo. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2013. 4. WARFIELD, B. B., Mysticism and Christianity: Biblical and Theological Studies. Presbyterian and Reformed Publishing Company. pp. 450-451. 5. CLARK, Gordon H., God’s Hammer: The Bible and Its Critics. Trinity Foundation, EUA. 6. BÍBLIA DE ESTUDO DE GENEBRA. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil; São Paulo: Cultura Cristã, 2009. 7. ROBBINS, John. Christ and Civilization. The Trinity Foundation: 2003. Disponível em: https://www.trinityfoundation.org/journal.php?id=110. Acesso em: 06 set. 2023. 8. ROBBINS, John. The Bible and the Draft. The Trinity Foundation: 2005. Disponível em: https://www.trinityfoundation.org/journal.php?id=13. Acesso em: 06 set. 2023.
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