Buscar

Livro Texto Biomedicina Interdisciplinar II

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 95 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 95 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 95 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

144
Unidade II
Unidade II
5 DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS – HEPATITE A
5.1 Breve histórico
Caro aluno, muitas condições afetam o fígado a ponto de causar icterícia (o amarelamento da pele e 
dos tecidos) e isso é um sinal de complicação da função hepática. A história das hepatites virais remonta 
vários milênios. Informações contidas na literatura chinesa já faziam referência à ocorrência de icterícia 
entre sua população há mais de 5 mil anos. Surtos de icterícia foram relatados na Babilônia há mais 
de 2.500 anos.
Hipócrates foi o primeiro a notar “epidemias de icterícia”, que certamente antecederam sua 
grande perspicácia. Hepatites costumavam ser um fator em grandes campanhas militares; durante 
a Guerra Civil dos Estados Unidos, pelo menos 70 mil soldados foram acometidos por hepatite. Na 
Primeira Guerra Mundial, o número de casos de hepatite, sem dúvida, ocasionado provavelmente 
pelo vírus da hepatite A (HAV), ganhou proporções de pandemias, acometendo milhares de soldados 
no front da guerra.
Com o advento da insulina parenteral, em 1922, foi notório o surgimento de inúmeros casos 
de icterícia em clínicas de diabetes na Suécia. Tal fato deu-se em razão do uso de lancetas de mola 
(pressão) para a dosagem da glicemia. Essas lancetas eram limpas, mas não esterilizadas, antes de serem 
novamente utilizadas. No início da Segunda Guerra Mundial, os investigadores diferenciavam dois tipos 
de hepatites, com base em como a doença se disseminava: uma forma infecciosa, por meio de alimentos 
ou água contaminados, e outra forma que era contraída pelo sangue.
Supõe-se que na região Amazônica brasileira, o emprego em massa da vacina contra a febre 
amarela nas décadas de 1940 e 1950, utilizando ainda vacinas derivadas de plasma humano e 
seringas e agulhas não descartáveis, tenha sido um dos veículos responsáveis pela disseminação e 
propagação da infecção pelo vírus da hepatite B (HBV) e da hepatite D (HDV) entre sua população. 
Outro provável veículo de transmissão do HBV na região Amazônica, área sabidamente endêmica de 
infecção pelo HBV e HDV, seria o uso de lancetas não descartáveis para fins de punção digital no 
diagnóstico da malária.
Somente nas décadas de 1960 e 1970 é que os vírus causadores de hepatite foram identificados, 
em parte com a ajuda de um estudo escandaloso envolvendo crianças com deficiência mental (Escola 
Estadual de Willowbrook, Long Island, NY), em que as condições precárias de vida a que eram submetidas 
promoveu taxa de infecção próxima a 100%.
145
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Sabe-se que o vírus da hepatite A infecta apenas seres humanos e alguns outros primatas, 
principalmente por meio de água e alimento contaminados com matéria fecal. A hepatite A é, portanto, 
uma doença que tende a aparecer onde o saneamento e a higiene são precários. Tal como acontece com 
a poliomielite, as pessoas em países pobres tendem a contrair hepatite A no início da vida, quando os 
sintomas são geralmente leves.
No entanto, viajantes frequentes a esses lugares podem pegá-lo quando adultos e sofrer muito. 
Nos Estados Unidos, onde não ocorrem mais epidemias, os surtos são mais comuns em creches, entre 
homossexuais sexualmente ativos e em associação com água poluída ou alimentos não cozidos, como 
mariscos provenientes de água contaminada. Crianças pequenas infectadas quase nunca ficam ictéricas, 
mas são as principais fontes de contágio para adultos, que geralmente apresentam todos os sintomas 
clássicos de náuseas, vômitos, urina escura e olhos e pele amarelados.
Desde 1971, quando a hepatite A atingiu cerca de 50 mil americanos, principalmente na faixa etária 
de 15 a 24 anos, a doença apresentou tendência de queda em número e aumento de idade. Hoje 
mostra fortes laços “socioeconômicos”, uma forma educada de dizer que atinge com mais força as 
minorias carentes. Em 2007, havia apenas 2.979 casos relatados nos Estados Unidos de hepatite A 
aguda, mas o número anual de novas infecções pode chegar a 25 mil. Em maio de 2001, a Food and 
Drug Administration aprovou uma vacina chamada Twinrix contra hepatite A e B para pessoas com 
mais de 18 anos. Duas outras vacinas, Havrix e Vaqta, que protegem apenas contra a hepatite A, são 
licenciadas para crianças a partir de 1 ano de idade.
5.2 Agente etiológico
O vírus da hepatite A, um vírus de RNA de fita simples positiva, pertencente à família Picornaviridae, 
gênero Hepatovirus, é um patógeno hepatotrópico antigo, que infecta seres humanos há milênios. 
A análise de genomas atuais de HAV humanos sugere um ancestral comum recente de aproximadamente 
1.500 anos, sendo que possivelmente todas as variantes símias e humanas derivam de um ancestral 
comum que pode ter existido há 2 mil a 3 mil anos. HAV é principalmente (mas não exclusivamente) 
transmitido através da via fecal-oral e causa epidemias, com quadros anictéricos ou ictéricos.
Quase um século se passou desde que foi reconhecido que o vírus da raiva se torna não infeccioso 
pela exposição ao éter, enquanto o poliovírus é resistente a tratamentos semelhantes. Na década de 
1940, essas primeiras observações levaram a estudos sistemáticos que buscavam classificar os vírus 
humanos patogênicos com base em sua sensibilidade à inativação do éter. Vírus que eram sensíveis ao 
éter também eram tipicamente inativados pelos sais biliares, assim propôs-se que a sensibilidade ao éter 
refletia a presença de lipídeos na superfície do vírus.
146
Unidade II
Figura 77 – Primeira identificação por microscopia eletrônica 
de partículas de HAV em amostras de fezes
Fonte: Feinstone et al. (1973, p. 1027).
Antes da disponibilidade de técnicas de sequenciamento, a presença ou ausência de um envelope 
lipídico serviu como um atributo básico para a classificação de vírus animais. Embora muitos virologistas 
tenham uma noção arraigada de que os vírus ou são envelopados ou não o são, os estudos atuais em 
dois vírus de RNA não relacionados, o vírus da hepatite A (HAV) e o vírus da hepatite E (HEV), desafiam 
esse antigo princípio.
As proteínas expressas na superfície do envelope facilitam a fusão das membranas celulares e 
virais após as interações iniciais com o receptor, resultando na liberação do conteúdo do vírion para o 
interior da célula. Um envelope também pode impedir que antígenos internos sejam reconhecidos por 
anticorpos neutralizantes. Por outro lado, ter um envelope lipídico claramente limita a capacidade de 
um vírus sobreviver em condições ambientais adversas, incluindo desidratação ou exposição a solventes 
orgânicos e detergentes.
Assim, a transmissão de vírus envelopados normalmente é resultado de contato próximo entre 
hospedeiros infectados e não infectados, e frequentemente requer inalação de aerossóis ou troca de 
secreções. Os vírus não envelopados têm uma clara vantagem em termos de sua capacidade de se 
147
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
espalhar pelo ambiente. Surtos de hepatite A e hepatite E transmitidos por alimentos e água fornecem 
bons exemplos disso e mostram como os capsídeos nus (sem envelope) podem proteger um genoma 
de RNA eficientemente.
Estudos recentes sugerem que o HAV e o HEV se beneficiam do melhor desses dois mundos. Ambos 
os vírus são hepatotrópicos e causam hepatite aguda transmitida entericamente em seres humanos. 
Ambos são vírus de RNA, mas têm arquiteturas de genoma muito diferentes e são classificados em 
diferentes famílias de vírus. Tanto o HAV quanto o HEV são eliminados nas fezes de indivíduos infectados 
como vírions estáveis, sem envelope. No entanto, o HAV circula no sangue durante a infecção 
aguda em uma forma envolta por membrana, protegida da ação direta de anticorpos neutralizantes 
e ainda com infectividade equivalente à das partículas virais nuas. De forma equivalente, o mesmo 
ocorre para o HEV.
Essas formas envoltas por membrana do HAV e do HEV diferem dos vírus envelopados clássicos 
pois a bicamada lipídica circundante parece ser desprovida de proteínas codificadas pelos vírus. Isso 
permite que o vírus circulede forma disfarçada, como uma vesícula exocítica do próprio hospedeiro, 
facilitando sua disseminação pelo organismo. No entanto, isso levanta questões sobre como ocorre a 
entrada do vírus em células na ausência de proteínas virais dispostas na bicamada lipídica. Em função 
dessa ausência, esses vírions envoltos por membrana são considerados quase envelopados.
 Lembrete
A forma do HAV encontrada nas fezes de pacientes infectados, bem 
como em água e alimentos contaminados, é a forma não envelopada. 
A forma revestida por membrana (chamada de quase envelopada) é 
encontrada apenas na corrente sanguínea do paciente infectado.
A estrutura geral dos capsídeos de picornavírus é bem caracterizada. O capsídeo consiste em um 
arranjo icosaédrico densamente empacotado de 60 protômeros, cada um consistindo de 4 polipeptídeos 
(VP1, VP2, VP3 e VP4). VP4 está localizado na face interna do capsídeo. Cinco cópias de VP1 se associam 
ao redor de um mesmo eixo e três cópias de VP2 e VP3 se alternam em torno de VP1. É a superfície externa 
do capsídeo viral que medeia as interações com receptores na superfície de células do hospedeiro.
Assim, diante da ingestão de partículas virais não envelopadas de HAV – as formas resistentes 
presentes em água ou alimentos contaminados -, os vírions atravessam mucosas do trato gastrointestinal 
(como orofaringe ou enterócitos), caem na circulação e alcançam o fígado. Em contato com hepatócitos, 
as interações entre o capsídeo viral e receptores celulares são críticas para promover a endocitose, a 
dissociação do capsídeo e a entrega segura do RNA viral através das membranas endossomais em direção 
ao citoplasma. O receptor de fosfotidilserina TIM1 (imunoglobulina de células T e mucina de domínio 1, 
também conhecido como HAVCR1, receptor celular 1 para o vírus da hepatite A) foi identificado como 
um receptor para HAV há mais de 20 anos, antes da descoberta de vírions HAV quase envelopados.
148
Unidade II
Desde então, foi demonstrado que o TIM1 facilita a ligação da forma quase envelopada de HAV, 
mas não de vírions HAV nus à superfície da célula, presumivelmente por meio da ligação de resíduos de 
fosfatidilserina exibidos na superfície da membrana de HAV quase envelopados. No entanto, o TIM1 não 
é essencial para a fixação ou entrada de HAV nus ou HAV quase envelopados. Até agora, um receptor 
essencial ainda não foi identificado para quaisquer das formas de HAV.
Figura 78 – Estrutura geral de picornavírus
Disponível em: https://bit.ly/37efycv. Acesso em: 5 fev. 2021.
Tanto a entrada de HAV nus quanto de HAV quase envelopados ocorre principalmente por meio de 
endocitose dependente de clatrina e dinamina. As rotas de tráfego endocítico para esses diferentes tipos 
de vírions são bastante semelhantes, mas eles são segregados diferencialmente dentro do endossomo 
tardio e liberam seus genomas de RNA em diferentes compartimentos endocíticos. Apenas o HAV quase 
envelopado continua seu tráfego para atingir o lisossomo, onde ocorre a degradação do quase envelope 
e o desnudamento do genoma. Em contraste, o HAV nu se desnuda em endossomos tardios logo após a 
internalização, resultando na tradução relativamente rápida de seu RNA genômico.
149
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Integrina β1
Integrina β1
Endossomo 
inicial
Endossomo 
tardio
Rab7a
Rab5A
ALIX
LAL
NPC1
Lisossomo
TIM1
Meio 
extracelular
Receptor para 
HAV?
Figura 79 – Modelo de invasão celular por HAV nus ou HAV quase envelopados. O capsídeo do HAV 
é excepcionalmente estável e o modo como ele desnuda ainda permanece um mistério. A natureza 
desse receptor putativo permanece desconhecida, mas os dados recentes sugerem que é provável que 
esteja presente no endossomo tardio. Receptor para HAV?: receptor ainda desconhecido para HAV PS: 
fosfatidilserina; TIM1: imunoglobulina de células T e mucina de domínio 1; Rab5A: proteína presente 
no endossomo inicial; Rab7a: proteína presente no endossomo tardio. NPC1: proteína transportadora 
de colesterol da doença de Niemann-Pick tipo C1 (marcador lisossomal); LAL: lipase ácida lisossomal 
(marcador lisossomal). ALIX: ALG-2-interacting protein X, proteína importante do tráfego endossomal
Fonte: Rivera-Serrano et al. (2019, p. 12).
Uma vez no citoplasma da célula, o genoma de RNA do HAV, contendo aproximadamente 7,5 kb, é 
traduzido. O RNA viral é poliadenilado, composto por uma única janela aberta de leitura que codifica 
uma poliproteína. O RNA genômico viral tem uma proteína viral (VPg) em sua extremidade 5’ em vez 
150
Unidade II
de um cap metilado. Uma longa região 5’ não traduzida contém um local de entrada para o ribossomo. 
O RNA do vírion serve tanto como o genoma quanto como o RNA mensageiro viral. A poliproteína 
sintetizada é processada por proteases em várias proteínas precursoras e maduras, dando origem às 
proteínas estruturais (do capsídeo) e não estruturais do vírus (replicase, VPg e uma série de proteínas 
que modificam a célula hospedeira, levando, em última análise, à lise celular).
VP2 VP3 VP1 2B 2C 3A 3Cpro 3Dpol AAAA...
VPg
VP4
5’ 3’
Figura 80 – Organização do genoma do HAV. O genoma de RNA fita simples polaridade positiva de 
7,5 kb do HAV codifica uma grande poliproteína, que é clivada em 10 proteínas maduras. Em rosa, 
destaque para os genes que codificam para as proteínas estruturais (do capsídeo); em branco, genes 
que codificam para as proteínas não estruturais
Fonte: Feng et al. (2014, p. 543).
O HAV quase envelopado é o único tipo de partícula de HAV encontrado no soro e plasma de 
seres humanos e chimpanzés infectados, mas não é encontrado em extratos fecais, que contêm apenas 
vírions nus sem envelope. Por que será que isso acontece?
Os hepatócitos são células altamente polarizadas, dispostas em placas, com sua membrana 
basolateral voltada para o espaço de Disse, que é separado do espaço intravascular por células endoteliais 
sinusoidais fenestradas. Uma membrana apical muito menor, representando menos de 15% da superfície 
do hepatócito, está voltada para pequenos canais biliares que se conectam com os canais de Hering e, 
daí, para dutos biliares maiores que direcionam o fluxo de bile para o intestino delgado.
A bile é secretada pelos hepatócitos através da membrana apical (canalicular). Essa membrana é 
altamente especializada e metabolicamente muito ativa. A membrana canalicular contém vários 
transportadores de sais biliares, bem como atividades de flippase e floppase que ajudam a manter sua 
integridade em face de altas concentrações de sais biliares em seu lado luminal.
Como apenas os vírions HAV quase envelopados são encontrados no soro ou plasma, pode-se 
presumir que a maioria senão todos os vírus liberados através da membrana basolateral dos hepatócitos 
no espaço perisinusoidal possuem um envelope. Em contraste, apenas o vírus sem envelope é liberado 
através da membrana canalicular apical para a bile ou, alternativamente, o envelope é removido das 
partículas de HAV quase envelopadas logo após sua liberação no canalículo biliar.
Por essa razão, apenas as formas não envelopadas são encontradas nas fezes, pois alcançam o 
intestino pela via biliar. O que está claro é que a liberação através de ambas as membranas do hepatócito 
ocorre antes de qualquer evidência química ou histológica de lesão hepatocelular.
151
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
ESCRT
Citoplasma
eHAV
eHAV
B)
A)
Membrana 
plasmática
Corpos multiversiculares
Figura 81 – Produção de partículas HAV quase envelopadas. Após a formação de partículas virais 
maduras no citoplasma, estas são cooptadas em vesículas (A) ou diretamente externalizadas pela 
membrana plasmática (B). eHAV: HAV quase envelopado; ESCRT: complexo de endereçamento 
endossomal necessário para transporte
Fonte: Feng et al. (2014, p. 543).
Se as formas circulantes de HAV são quase envelopadas – o que blindaria as proteínas do capsídeo 
do contato direto com imunoglobulinas neutralizantes – como ocorre a neutralização de partículas 
virais em indivíduospreviamente imunizados? Se os anticorpos também forem captados por endocitose 
e estiverem presentes no lisossomo, eles se ligarão ao capsídeo e neutralizarão o vírus após a degradação 
da membrana do HAV quase envelopado. Se receptores de imunoglobulina desempenham um papel 
nesse processo, isso ainda permanece incerto.
152
Unidade II
Endocitose
Citoplasma
plasmática
Membrana
Anticorpos anti-HAV
TIM1 eHAV
Espaço extracelular
Infecção
Neutralização
Membrana do eHAV é 
degradada no lisossomo
Figura 82 – Modelo proposto para a neutralização da forma quase envelopada do HAV. Se os anticorpos 
também forem captados por endocitose e estiverem presentes no lisossomo, eles se ligarão ao capsídeo 
e neutralizarão o vírus após a degradação da membrana do HAV quase envelopado (eHAV)
Fonte: Feng et al. (2014, p. 543).
5.3 Aspectos epidemiológicos
O vírus da hepatite A (HAV) é a causa de aproximadamente metade de todos os casos notificados 
de hepatite viral nos Estados Unidos, embora a prevalência de infecções por HAV nesse país tenha 
diminuído 92% desde a introdução de uma vacina em 1995. Em 2009, estimou-se que mais de 21 mil 
casos de hepatite A ocorreram nos Estados Unidos, e 1,4 milhão de casos ocorreram em todo o mundo.
153
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Alta: prevalência maior que 8%
Intermediária: entre 2-7%
Baixa: menor que 2%
Figura 83 – Distribuição geográfica da prevalência da hepatite A (anticorpo anti-HAV) em 2005
Disponível em: https://bit.ly/2XUkzpn. Acesso em: 27 set. 2021.
Embora o número médio de infecções anuais pelo vírus da hepatite A relatado ao CDC, nos EUA, 
nos últimos anos tenha diminuído substancialmente em comparação com 2000, flutuações ocorreram nos 
últimos 20 anos devido a grandes surtos. Após uma longa tendência de queda, o primeiro aumento 
entre 2012 e 2013 foi devido a um grande surto multiestadual associado a romãs importadas da Turquia.
Entre 2015 e 2016, os casos notificados aumentaram novamente, devido a dois surtos de hepatite A, 
cada um deles relacionado a alimentos importados. Aumentos substanciais nos casos incidentes de 
hepatite A ocorreram em 2017 e 2018 (3.366 e 12.474 casos notificados, respectivamente) devido a 
surtos em andamento relatados ao CDC entre usuários de drogas e pessoas em situação de rua, bem 
como surtos entre homens homossexuais.
Estimativas atualizadas da incidência global são complicadas, em função da baixa taxa de notificação 
em muitos países. Os perfis de prevalência sorológica variam geograficamente. Na maioria das regiões 
de baixa renda, incluindo a África Subsaariana e partes do Sul da Ásia, a prevalência de anticorpos 
anti-HAV na população pode exceder 90% aos 10 anos de idade.
Nessas áreas, a exposição ao HAV geralmente ocorre antes dos 5 anos de idade, quando a maioria 
das infecções pelo HAV são assintomáticas. Como resultado, existem poucos adolescentes e adultos 
suscetíveis e poucas doenças sintomáticas. Ao mesmo tempo, em quase todos os países de baixa renda 
existe agora uma classe média urbana de pessoas que não foram infectadas pelo HAV quando crianças 
e que correm alto risco de infecção sintomática de hepatite A mais tarde na vida.
Em regiões de alta renda (Europa Ocidental, Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Estados Unidos, 
Japão, República da Coréia e Cingapura), a prevalência de anticorpos anti-HAV é muito baixa (<50% são 
imunes aos 30 anos). Nessas regiões, a alta proporção de indivíduos suscetíveis entre adultos poderia 
teoricamente permitir a transmissão, mas quase não há circulação do vírus e o risco de contrair a 
infecção pelo HAV é baixo.
154
Unidade II
No entanto, além de surtos decorrentes de alimentos contaminados, infecções por hepatite A 
podem ocorrer em indivíduos ou em grupos com alto risco particular de infecção, como viajantes não 
imunizados para áreas de endêmicas, praticantes de relação sexual desprotegida (contato boca-ânus), 
usuários de drogas injetáveis e, ocasionalmente, em subpopulações específicas (por exemplo, certas 
comunidades religiosas ou batalhões). Em raras ocasiões, principalmente antes da introdução da 
triagem de doadores e de procedimentos de inativação viral apropriados, a hepatite A foi associada à 
transfusão de sangue e hemoderivados.
No Brasil, no período de 2003 a 2008, o coeficiente de incidência de hepatite A era superior ao das 
hepatites C e B; entretanto, após esse período, nota-se uma importante tendência de queda, atingindo 
1,0/100 mil habitantes em 2018. Além disso, a tendência da taxa da hepatite A no período de 2003 a 
2005 pode ser atribuída ao incremento da vigilância epidemiológica, que passou a ser individualizada 
para esse agravo a partir de 2003.
2003
0
4
8
12
2
6
10
14
16
2005 2007 2009 2011
Ano de notificação
Ta
xa
 d
e 
in
ci
dê
nc
ia
/d
et
ec
çã
o 
(x
10
0 
m
il 
ha
b.
)
2013 2015 20172004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018
Hepatite B
Hepatite A
Hepatite D
Hepatite C
Figura 84 – Coeficiente de incidência/detecção de hepatites virais segundo agente etiológico e ano de 
notificação, Brasil, de 2003 a 2018
Fonte: Brasil (2019, p. 91).
5.4 Aspectos fisiopatológicos e manifestações clínicas
Após entrar em contato com o vírus, o indivíduo pode desenvolver hepatite aguda oligo/assintomática 
ou sintomática. Esse quadro agudo pode ocorrer na infecção por qualquer um dos vírus causadores 
de hepatite e possui seus aspectos clínicos e virológicos limitados aos primeiros seis meses. Apesar de não 
haver forma crônica da doença, há a possibilidade de formas prolongadas e recorrentes, com manutenção 
das aminotransferases em níveis elevados, por vários meses. A forma fulminante é rara, porém o 
prognóstico é ruim e pode demandar transplante hepático.
155
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Diante de um quadro de hepatite aguda é possível três fases. (1) Período prodrômico ou pré‑ictérico – 
ocorre após o período de incubação do agente etiológico e anteriormente ao aparecimento da 
icterícia. Os sintomas são inespecíficos: anorexia, náuseas, vômitos, diarreia ou, raramente, constipação, 
febre baixa, cefaleia, mal-estar, astenia e fadiga, aversão ao paladar e/ou olfato, mialgia, fotofobia, 
desconforto no hipocôndrio direito, urticária, artralgia ou artrite e exantema papular ou maculopapular. 
(2) Fase ictérica – com o aparecimento da icterícia, em geral, há diminuição dos sintomas prodrômicos. 
Observa-se hepatomegalia dolorosa, com ocasional esplenomegalia. (3) Fase de convalescença – 
segue-se ao desaparecimento da icterícia. A recuperação completa ocorre após algumas semanas, mas 
a fraqueza e o cansaço podem persistir por vários meses.
A eliminação fecal do vírus atinge seu pico pouco antes do início da lesão hepatocelular, momento 
em que o indivíduo é mais infeccioso. Isso é acompanhado por uma viremia estendida que é 
aproximadamente paralela à eliminação do vírus nas fezes, mas em uma magnitude inferior. Segue-se 
lesão hepática, frequentemente com elevação acentuada de ALT (alanina aminotransferase, antiga TGP, 
transaminase glutâmica pirúvica). O antígeno viral pode ser detectado no citoplasma dos hepatócitos, 
bem como nos centros germinativos do baço, linfonodos e ao longo da membrana basal glomerular. O 
antígeno viral normalmente continua a ser eliminado por duas a três semanas após a primeira elevação 
das enzimas hepáticas.
2
2
ALT
Viremia
Semanas
Lo
g 1
0 H
AV
HAV fecal
IgM 
anti-HAV
IgG 
anti-HAV
4
6
8
10
4 6 8 10 12 14
Figura 85 – História natural de infecção por HAV. A infecção por HAV é tipicamente aguda, com sinais 
e sintomas que ocorrem de três a cinco semanas após a exposição. A sequência dos eventos inclui 
 viremia (amarelo), liberação de HAV nas fezes (azul), aumento de alanina aminotransferase (ALT) sérica 
(linha vermelha), aparecimento de anticorpos IgM e IgG (linhas azuis). Os títulos de anticorpos IgM 
tipicamente declinam com o passar do tempo, mas podem ser detectados em pacientes até 
seis a 12 meses após a infecção
Fonte: Martine Lemon (2006, p. 168).
156
Unidade II
Figura 86 – Fotomicrografia de seção hepática de um paciente com hepatite A aguda. É possível verificar 
inflamação periportal com infiltrado linfocítico (campo superior direito), desarranjo lobular (campo 
inferior esquerdo). Também é evidente a balonização de hepatócitos (com vacuolização citoplasmática)
Fonte: Martin e Lemon (2006, p. 165).
A lesão hepática ocorre como resultado da resposta imune do hospedeiro ao HAV. A replicação viral 
ocorre no citoplasma dos hepatócitos; o dano hepatocelular e a destruição de hepatócitos infectados 
são mediados por linfócitos T CD8+ específicos para HAV e células natural killer. O interferon-gama 
parece ter um papel central na promoção da depuração de hepatócitos infectados, estimulando o 
recrutamento de fagócitos para o local da infecção. Uma resposta excessiva do hospedeiro está associada 
à hepatite grave.
Na hepatite A, um padrão de lesão periportal é característico. Em virtude disso, frequentemente 
verifica-se colestase, que pode ser o resultado da destruição de dutos biliares nas margens do trato 
portal. Na falta de informações clínicas e sorológicas, a abundância de plasmócitos na hepatite A pode 
gerar confusão com hepatite autoimune.
A insuficiência hepática fulminante refere-se ao desenvolvimento de lesão hepática aguda 
grave com encefalopatia e função sintética prejudicada. Ocorre em menos de 1% do total de 
casos, mais comumente em indivíduos com mais de 50 anos de idade e em indivíduos com outras 
doenças hepáticas, como hepatite B ou C. Esses pacientes podem precisar de transplante de fígado.
5.5 Diagnóstico laboratorial
O diagnóstico de infecção aguda por HAV deve ser suspeitado em pacientes com início abrupto 
de sintomas prodrômicos (náusea, anorexia, febre, mal-estar ou dor abdominal) e icterícia ou níveis 
elevados de aminotransferase sérica, particularmente no contexto de fatores de risco conhecidos para 
transmissão da hepatite A.
157
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
 Lembrete
O vírus da hepatite A é geralmente transmitido por via fecal-oral, 
seja por contato pessoa a pessoa ou consumo de água ou alimentos 
contaminados. No contato pessoa a pessoa destacam-se: transmissão 
dentro das famílias; transmissão sexual (contato anal-oral); transmissão em 
creches; transmissão entre militares. No contato com água ou alimentos 
contaminados destacam-se: consumo de frutos do mar, vegetais ou outros 
alimentos crus ou mal cozidos; consumo de alimentos contaminados por 
manipuladores infectados. O compartilhamento de agulhas expostas a 
sangue contaminado também é uma via de transmissão.
Indivíduos sintomáticos mostram elevação acentuada nos níveis de transaminases séricas, bilirrubina 
total e direta e fosfatase alcalina. Com qualquer tipo de hepatite viral, o nível de alanina aminotransferase 
(ALT) é normalmente mais alto do que o nível de aspartato aminotransferase (AST), de 25 a 100 vezes 
os valores normais. As elevações nos níveis de transaminases ocorrem antes da elevação da bilirrubina, 
mas podem coincidir com o início da doença clínica.
Durante a fase prodrômica e virêmica, a detecção direta do agente pode se dar por RT-PCR. Entretanto, 
em função do ainda alto custo de exames moleculares, o diagnóstico geralmente é estabelecido pela 
detecção de anticorpos IgM anti-HAV séricos. Os anticorpos IgM são detectáveis no momento do 
início dos sintomas, atingem o pico durante a fase aguda ou de convalescença inicial e permanecem 
detectáveis por aproximadamente três a seis meses, declinando progressivamente (rever Figura 85).
A detecção de anticorpos IgM séricos na ausência de sintomas clínicos pode refletir infecção anterior 
por HAV com persistência prolongada de IgM, um resultado falso-positivo ou infecção assintomática 
(que é mais comum em crianças com menos de 6 anos de idade do que em crianças mais velhas 
ou adultos).
Os anticorpos séricos IgG aparecem no início da fase de convalescença da doença, permanecem 
detectáveis por décadas e estão associados à imunidade protetora vitalícia. A detecção de anti-HAV IgG 
na ausência de anti-HAV IgM reflete infecção anterior ou vacinação em vez de infecção aguda.
Os estudos de imagem geralmente não são indicados para o diagnóstico de infecção pelo HAV. A 
ultrassonografia às vezes pode ser apropriada para descartar diagnósticos alternativos (como obstrução 
biliar); colangiografia ou biópsia hepática geralmente não são indicadas.
5.6 Tratamento
Não existe tratamento específico para as formas agudas de hepatite, exceto para hepatite C e 
hepatite B aguda grave. Para as demais hepatites, se necessário, apenas tratamento sintomático para 
náuseas, vômitos e prurido. Como norma geral, recomenda-se repouso relativo até a normalização das 
aminotransferases. A única restrição dietética está relacionada à ingestão de álcool.
158
Unidade II
5.7 Imunização
A exposição ao patógeno ou à vacina promove imunidade duradoura e protetiva ao HAV. Conquistas 
na melhoria dos meios de profilaxia ativa contra o HAV foram lideradas principalmente por duas equipes 
de fabricantes farmacêuticos, a saber, o pioneiro mundial no desenvolvimento de vacinas Maurice 
Hilleman (e seus colaboradores da MSD) e Francis Andre (e seus colaboradores da GlaxoSmithKline – GSK; 
originalmente SmithKline Beecham). A vacina da GSK (HAVRIX, vacina de vírus inativado) e a vacina da 
MSD (VAQTA, vacina de vírus inativado) foram licenciadas em meados da década de 1990 nos Estados 
Unidos e em todo o mundo. Atualmente, outras vacinas adicionais estão disponíveis.
A memória imunológica contra o HAV, após a injeção da vacina, persiste por anos e, conforme 
demonstrado para as vacinas inativadas com formaldeído, dura pelo menos 22 anos sem a necessidade 
de uma dose de reforço.
Inicialmente, a imunização era oferecida apenas a grupos considerados de alto risco de contração 
do HAV ou para crianças que residiam em regiões endêmicas do HAV. Mais tarde, as campanhas de 
imunização em massa em bebês tiveram um impacto impressionante na queda da incidência de infecção 
pelo HAV, não apenas em crianças, mas também em adultos na Europa, Ásia e Estados Unidos. Em 
fevereiro de 2020, a vacinação contra o HAV foi introduzida por 40 países em todo o mundo, seja 
em programas de vacinação infantil de rotina ou em grupos de risco específicos.
Em resumo, enquanto a infecção pelo HAV aflige humanos há milhares de anos, os avanços recentes 
nas ferramentas diagnósticas, o desenvolvimento de vacinas eficazes e a melhoria das condições 
socioeconômicas estão contribuindo para o controle da hepatite A em todo o mundo. Esperamos um dia 
replicar esses sucessos com influenza e outras doenças virais potencialmente mortais, como síndrome 
respiratória aguda grave, Ebola e especialmente com COVID-19, que atualmente é uma pandemia e cuja 
ameaça aparenta não ter sido totalmente compreendida.
6 DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS – GONORREIA
6.1 Breve histórico
A gonorreia é uma doença humana antiga. Você sabia que há referências aos seus sintomas no 
Antigo Testamento da Bíblia? (Vide Levítico 15: 1-3). Os hebreus foram poéticos em seus registros, 
sugerindo cautela no contato com a “mulher imoral e leviana” (Provérbios 7:5). Por quase 700 anos, a 
doença foi conhecida como the clap, uma provável referência ao antigo bairro Le Clapiers de Paris, onde 
as prostitutas ficavam alojadas. Os franceses, sempre explícitos, chamavam-na de chaude pisse – que 
significa “mijo quente” – já no século XII. Para os antigos chineses, a gonorreia era a doença “diferente 
de todas as outras”. Para os gregos, era strangouria, ou bloqueio urinário. A gonorréia, (do grego gonos, 
semente, e rheein, fluir/fluxo) é uma das doenças mais antigas e conhecidas da humanidade.
No espectro sombrio das doenças venéreas (de Vênus, a deusa do amor), a gonorreia tem a reputação 
de não ser tão ruim. Além disso, o quadro é obscurecido por três suposições comuns: muitos homens 
infectados sentem um leve desconforto que melhora espontaneamente;antibióticos estão disponíveis 
159
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
quando necessário; e a maioria das mulheres infectadas não apresenta sintomas. Todas são verdadeiras, 
mas existem reflexões importantes a serem feitas.
A bactéria que causa essa doença, Neisseria gonorrhoeae (batizada em homenagem a Albert 
Neisser, o bacteriologista alemão que a descobriu em 1879), está perfeitamente adaptada a certos 
tecidos humanos e maneiras de encontrar novos suprimentos, daí sua relação parasitária primordial. 
Os bebês podem contraí-la nos olhos durante o parto de mães infectadas, e isso costumava ser uma 
causa importante de cegueira em recém-nascidos. A aplicação rotineira de solução de nitrato de prata 
nos olhos de todas as crianças ao nascer superou amplamente essa tragédia. Crianças pré-púberes com 
gonorreia quase certamente foram abusadas sexualmente.
Figura 87 – Propaganda para uso de penicilina para tratamento da gonorreia, EUA, 1940. Em livre 
tradução, o anúncio estampado em uma lata de lixo diz: “penicilina cura gonorreia em 4 horas, 
procure seu médico hoje”
Disponível em: Biddle (2002).
Até 1937, quando as sulfas foram consideradas eficazes no combate a N. gonorrhoeae, não havia 
cura. A penicilina logo entrou no rol de medicamentos disponíveis. Infelizmente, a praga adaptou-se 
muito rapidamente e adquiriu mecanismos de resistência a antibióticos. As sulfas foram usadas tão 
livremente durante a Segunda Guerra Mundial que bactérias resistentes surgiram em todos os lugares.
Em 1976, após a proliferação de doenças venéreas que acompanhou o advento da pílula 
anticoncepcional e a revolução sexual, cepas resistentes à penicilina (conhecidas como PPNG, para 
Neisseria gonorrhoeae produtora de penicilinase) começaram a aparecer nos Estados Unidos, 
importadas em grande parte das Filipinas por militares. Logo surgiram bactérias que também eram 
resistentes à tetraciclina, espectinomicina e fluoroquinolonas. Outros fármacos ainda podem combater 
N. gonorrhoeae, mas a tendência é óbvia. Não existe imunidade natural, nem vacina.
160
Unidade II
Em 2007, cerca de 356 mil casos foram relatados nos Estados Unidos – principalmente entre homens 
e mulheres jovens afro-americanos – a uma taxa que tem se mantido estável por cerca de uma década, 
mas esse número é provavelmente apenas uma fração da incidência anual.
6.2 Agente etiológico
A gonorreia, uma infecção sexualmente transmissível (IST), continua sendo um grande problema de 
saúde pública em todo o mundo. O agente etiológico da doença, a bactéria Neisseria gonorrhoeae (o 
gonococo), geralmente causa infecções da mucosa do trato urogenital, infectando predominantemente 
epitélios colunares e de transição, embora também possa se ligar ao epitélio escamoso estratificado da 
ectocérvice. Essas infecções por N. gonorrhoeae resultam mais frequentemente em uretrite em homens 
e cervicite em mulheres, embora também seja observada uretrite em mulheres.
A Neisseria típica é um diplococo Gram-negativo, imóvel, com aproximadamente 0,8 μm de diâmetro 
(veja nas figuras a seguir). Os cocos isolados são reniformes (formato de rim). Quando os microrganismos 
ocorrem aos pares, os lados adjacentes são planos ou côncavos.
Figura 88 – Coloração de Gram em secreção uretral. Os núcleos de várias células polimorfonucleares 
são vistos (setas maiores), bem como diplococos Gram-negativos (Neisseria gonorrhoeae) no interior 
de um desses leucócitos (seta menor)
Fonte: Brooks et al. (2013, p. 268).
161
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Membrana 
plasmática
Membrana 
plasmática
Membrana 
externa
Membrana 
externa
Peptidoglicano
Peptidoglicano
Envelope celular
Pilus
Pilus
Figura 89 – Esquematização de Neisseria gonorrhoeae (destaque para a presença de pili e envelope celular com três 
camadas: a membrana citoplasmática interna, a camada de peptidoglicanos e a membrana externa)
Fonte: Brooks et al. (2013, p. 268).
Os gonococos geralmente produzem colônias menores do que outras Neisseria, além de oxidar apenas 
a glicose e diferir antigenicamente de outras espécies do mesmo gênero. Essas bactérias requerem 
arginina, hipoxantina e uracila (auxotipo Arg-, Hyx- e Ura-) e tendem a crescer mais lentamente na 
cultura primária. Os gonococos isolados de amostras clínicas ou mantidos por repicagem seletiva formam 
pequenas colônias típicas de bactérias dotadas de pili. No repique não seletivo, aparecem também 
colônias maiores contendo gonococos sem pili. Variantes opacas e transparentes de ambos os tipos 
de colônias, pequenas e grandes, também ocorrem; as colônias opacas estão associadas à presença de 
uma proteína exposta na superfície (Opa).
 Observação
A auxotipagem subdivide os gonococos de acordo com sua capacidade 
de crescer em meio ágar quimicamente definido, que contém ou não 
certos compostos.
Aparentemente, apenas as bactérias dotadas de pili parecem virulentas. A expressão da proteína 
Opa varia de acordo com o tipo de infecção. Os gonococos que formam colônias opacas são isolados de 
homens com uretrite sintomática e de culturas de amostra do colo uterino de mulheres na metade do ciclo 
menstrual. Os gonococos que formam colônias transparentes são frequentemente isolados de homens com 
infecção uretral assintomática, mulheres durante a menstruação e de formas invasivas de gonorreia, 
como salpingite e infecção disseminada. A variação antigênica de proteínas de superfície durante a 
infecção permite ao microrganismo burlar a resposta imunológica do paciente.
162
Unidade II
Colônias P+ Colônias P-
Figura 90 – Colônias de N. gonorrhoeae dotadas ou não de pili. A expressão de pilina pode sofrer 
variação de fase e reflete na variação morfológica da colônia. As células dotadas de pili (P+) formam 
colônias que tendem a ser menores, mais altas e mais escuras (semelhantes a uma gota de goma), 
enquanto as células desprovidas de pili (P–) formam colônias que têm uma aparência mais plana, 
mais semelhante a uma bolacha
Fonte: Spence et al. (2008).
N. gonorrhoeae é antigenicamente heterogênea e tem a capacidade de modificar suas estruturas 
de superfície in vitro – e presumivelmente in vivo, para evitar as defesas do hospedeiro. As estruturas de 
superfície são especificadas a seguir.
Os pili são apêndices piliformes que se estendem por vários micrômetros a partir da superfície 
bacteriana e são constituídos de proteínas em forma de estaca denominadas pilinas. Os pili aumentam 
a fixação do microrganismo às células do hospedeiro e a resistência à fagocitose. A extremidade 
aminoterminal da molécula de pilina contém uma elevada porcentagem de aminoácidos hidrofóbicos 
e é relativamente conservada. A porção intermediária da molécula também é conservada e serve 
como ponto de fixação das bactérias às células do hospedeiro. A sequência de aminoácidos próxima 
à extremidade carboxiterminal é altamente variável; esta porção da molécula é potencialmente 
imunogênica. As pilinas de quase todas as cepas de N. gonorrhoeae são antigenicamente diferentes, e 
uma única cepa pode produzir muitas formas antigenicamente distintas de pilinas.
163
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
 Lembrete
Tradicionalmente, empregam-se termos latinos para designação de 
algumas estruturas, sendo pilus, para uso no singular e pili, para plural.
 Observação
A proteína pilina possui uma região conservada na extremidade aminoterminal 
e uma região altamente variável na extremidade carboxiterminal, o que 
contribui para evasão das defesas do hospedeiro e infecções múltiplas em 
indivíduos sexualmente promíscuos.
A proteína Por (porina) estende-se através da membrana celular dos gonococos. Ocorre em trímeros, 
formando poros na superfície, através dos quais alguns nutrientes entram na célula. As proteínas Por 
podem evitar a fusão do fagossomo-lisossomo, impactando na sobrevida de gonococos intracelulares. 
Além disso, a resistência variável dos gonococos ao poder bactericida do soro humano normal depende 
de como a proteína Por liga-se seletivamente aos componentes do complementoC3b e C4b. Cada 
cepa de gonococo expressa apenas um dos dois tipos de Por (PorA ou PorB), mas a proteína Por de cepas 
distintas é antigenicamente diferente. A tipagem sorológica de Por mediante reações de aglutinação 
com anticorpos monoclonais distinguiu 18 sorovariantes de PorA e 28 sorovariantes de PorB.
As proteínas Opa (de opacidade) funcionam na adesão de gonococos dentro das colônias e na 
fixação dos microrganismos às células do hospedeiro, particularmente células que expressam receptores 
celulares, tais como compostos relacionados com a heparina e CD66 ou antígenos carcinoembrionários 
relacionados com moléculas de adesão celular. Uma porção da proteína Opa localiza-se na membrana 
externa do gonococo, enquanto o restante fica exposto sobre a superfície. Uma cepa de gonococo pode 
expressar nenhum, um, dois ou, em certas ocasiões, três tipos de Opa, embora cada cepa tenha 11 ou 12 
genes para diferentes Opas.
A proteína Rmp é antigenicamente conservada em todos os gonococos. Trata-se de uma proteína 
passível de modificação por redução (reduction-modificable protein, Rmp), que modifica sua massa 
molecular aparente quando se encontra em estado reduzido. Rmp associa-se à Por na formação de 
poros na superfície celular.
Diferentemente dos bastonetes Gram-negativos entéricos, o lipopolissacarídeo (LPS) gonocócico 
não apresenta cadeias laterais de antígeno O longas, sendo denominado lipo-oligossacarídeo (LOS). Os 
gonococos podem expressar mais de uma cadeia de LOS antigenicamente diferente ao mesmo tempo. 
A toxicidade observada em infecções gonocócicas deve-se, em grande parte, aos efeitos endotóxicos 
de LOS. Em uma forma de mimetismo molecular, os gonococos produzem moléculas de LOS que se 
assemelham, do ponto de vista estrutural, aos glicoesfingolipídeos das membranas celulares humanas.
164
Unidade II
O LOS dos gonococos e o glicoesfingolipídeo humano da mesma classe estrutural reagem ao mesmo 
anticorpo monoclonal, indicando mimetismo molecular. A presença, sobre a superfície dos gonococos, 
das mesmas estruturas superficiais observadas nas células humanas ajuda esses microrganismos a 
escaparem do reconhecimento imunológico. Além disso, o gonococo utiliza-se da interação entre este 
ligante e um receptor da célula humana normal para invadir as células epiteliais uretrais nos homens 
e/ou aderir à superfície do esperma. Logo, esse mimetismo molecular lhe é de grande utilidade.
A galactose terminal de glicoesfingolipídeos humanos é frequentemente conjugada com ácido siálico, 
também chamado de ácido N-acetilneuramínico (NANA). Os gonococos não produzem ácido siálico, mas 
sintetizam uma sialiltransferase que funciona para adquirir o NANA do nucleotídeo-açúcar humano, 
citidina 5’-monofosfo-N-acetilneuramínico (CMP-NANA) e colocá-lo na galactose terminal de um LOS 
aceptor gonocócico. Esta sialilação afeta a patogênese da infecção gonocócica, tornando os gonococos 
resistentes à destruição pelo sistema de anticorpos-complemento humano, e interfere na ligação do 
gonococo aos receptores sobre as células fagocíticas.
Figura 91 – Estrutura do lipo-oligossacarídeo do gonococo (LOS). A presença de uma lacto-N-neotetraose.e 
uma galactosamina terminal assemelha-se à série de gangliosídeos glicoesfingolipídeos humanos
Fonte: Brooks et al. (2013, p. 288).
Os gonococos desenvolveram mecanismos que frequentemente permitem a mudança de uma forma 
antigênica (pilina, Opa ou LOS) para outra forma antigênica da mesma molécula. Essa mudança ocorre 
em um de cada 102,5 a 103 gonococos, o que representa uma taxa extremamente rápida de mudança 
para bactérias. Por serem antígenos de superfície expostos nos gonococos, a pilina, a Opa e o LOS 
são importantes na resposta imunológica à infecção. A rápida mudança das moléculas de uma forma 
antigênica para outra ajuda os gonococos a escaparem do sistema imunológico do hospedeiro.
165
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Os gonococos contêm vários plasmídeos. Dois destes (com massa molecular de 3,4 MDa e 4,7 MDA) 
contêm genes que codificam a produção de betalactamase tipo TEM-1 (penicilinase), a qual resulta em 
resistência do microrganismo à penicilina. Esses plasmídeos são transmissíveis por conjugação entre 
os gonococos. O desenvolvimento de resistência de alto nível à tetraciclina nos gonococos deve-se à 
inserção, no plasmídeo conjugativo, de um gene de estreptococo tetM, cujo produto confere resistência 
à tetraciclina.
6.3 Aspectos epidemiológicos
Embora a compreensão da epidemiologia localizada da gonorreia seja crítica para adequada aplicação 
de esforços locais, a compreensão da epidemiologia global pode apoiar o desenvolvimento de políticas 
e estratégias nacionais e internacionais de prevenção e controle. Segundo a Organização Mundial da 
Saúde, a cada dia há mais de 1 milhão de novos casos de infecções sexualmente transmissíveis curáveis 
entre pessoas de 15 a 49 anos. Isso equivale a mais de 376 milhões de novos casos anuais de quatro 
infecções – clamídia, gonorreia, tricomoníase e sífilis.
Como nem sempre essas doenças são notificadas em todos os países, é complicado obter um 
número atualizado e exato de casos. Estima-se que aproximadamente 87 milhões de novas infecções 
gonocócicas ocorreram entre pessoas com idades entre 15-49 anos em 2016. Esse número é maior do 
que as estimativas realizadas em 2012 (75 milhões de novos casos/ano). As taxas de gonorreia estão 
aumentando em muitos países.
A incidência de gonorreia é desproporcionalmente maior entre homossexuais e bissexuais jovens, 
sobretudo entre homens que fazem sexo (desprotegido) com outros homens. Minorias raciais/étnicas, 
populações indígenas e profissionais do sexo parecem também computar entre aqueles cuja incidência 
de infecções gonocócicas é maior. As viagens internacionais podem facilitar a propagação da gonorreia 
através das fronteiras, incluindo a disseminação de cepas resistentes.
N. gonorrhoeae infecta a mucosa do trato urogenital, reto, faringe e conjuntiva e é facilmente 
transmitida entre indivíduos no ato sexual desprotegido. A probabilidade estimada de transmissão em 
ato heterossexual desprotegido é de aproximadamente 50% do pênis para vagina (transmissão de um 
parceiro contaminado para uma parceira não contaminada), já a transmissão da vagina para o pênis 
(parceira contaminada para parceiro não contaminado) é próxima a 20% por coito. As probabilidades 
de transmissão no sexo oral (63% da uretra para a faringe e 9% da faringe para a uretra) e no sexo anal 
(84% da uretra para o reto e 2% do reto para a uretra), ambos sem preservativos, foram estimadas a 
partir de modelos matemáticos.
A taxa de infecção pode ser reduzida pelas seguintes medidas: evitar relações sexuais com vários 
parceiros; rápida erradicação dos gonococos dos indivíduos infectados mediante diagnóstico e 
tratamento precoces, e detecção dos casos e contatos por meio de educação e rastreamento precoces 
das populações de alto risco. A profilaxia mecânica (uso de preservativos) proporciona proteção 
parcial. A quimioprofilaxia tem valor limitado em virtude do aumento da resistência dos gonococos 
aos antibióticos.
166
Unidade II
 Observação
Qualquer prática sexual desprotegida pode transmitir a gonorreia – seja 
o contato oral, vaginal ou anal.
Nos Estados Unidos, a incidência aumentou uniformemente desde 1955 até o final da década de 
1970, quando ficou entre 400 e 500 casos por 100 mil indivíduos da população. Entre 1975 e 1997, 
houve um declínio de 74% na taxa de infecções gonocócicas relacionadas. Depois disso, as taxas ficaram 
nesses níveis por até 10 anos, caindo entre 2006 a 2009 e subindo 2,8% novamente entre 2009 e 2010. 
No Brasil, o cenário epidemiológico da infecção acompanha os altos índices mundiais. Estima-se que 
a prevalência da gonorreia na população de 15 a 49 anos seja de aproximadamente 1,4% – e que a 
incidência na população em geral esteja em torno de 498.848 novos casos por ano.
O Brasil não possui um programa nacional de vigilância gonocócica.Nos últimos 25 anos, três tentativas 
de implantação de redes de laboratórios com foco na resistência a N. gonorrhoeae foram realizadas 
pelo Ministério da Saúde. A primeira ocorreu em 1996, a convite da Organização Pan-Americana 
da Saúde (Opas)/OMS. A segunda, iniciada em 2007, foi denominada Projeto Sengono, e envolveu 
sete laboratórios e grupos de pesquisa já estabelecidos. Ambas as tentativas falharam, uma vez 
que nenhum relatório dos resultados obtidos foi publicado. Em 2013, foi iniciada uma nova edição 
do Projeto Sengono. O projeto forneceu resultados preliminares publicados como uma nota de 
comunicação em 2016.
6.4 Aspectos fisiopatológicos e manifestações clínicas
Os gonococos atacam as mucosas do trato geniturinário, dos olhos, do reto e da garganta, causando 
supuração aguda que pode levar a invasão tecidual. Este processo é seguido de inflamação crônica 
e fibrose. Em homens, geralmente ocorre uretrite, com pus espesso e esbranquiçado, amarelado ou 
esverdeado (em 1-2 dias após a infecção, na maioria dos casos clínicos), além de micção dolorosa. 
O processo pode estender-se ao epidídimo. Com o desaparecimento da supuração na infecção sem 
tratamento, ocorre fibrose, resultando, às vezes, em estenoses uretrais.
Em casos de resolução espontânea, se nenhum tratamento for administrado enquanto os pacientes 
apresentarem sintomas é possível que o paciente se torne um portador assintomático. A infecção uretral 
em homens também pode ser assintomática. Estudos de infecções sexualmente transmissíveis baseados 
em achados clínicos sugerem que a maioria dos homens infectados é sintomática (> 90%) e, em 
função do desconforto, eles procuram auxílio médico. Em contraste, estudos de base populacional 
sugerem que até 60% dos homens podem ser assintomáticos ou ter sintomas muito leves (o que, 
portanto, não lhes motiva a procurar auxílio médico).
Em mulheres, a infecção primária é observada no endocérvice e estende-se à uretra e à vagina, 
resultando em corrimento mucopurulento. Em seguida, pode progredir para as tubas uterinas, causando 
salpingite, fibrose e obliteração das tubas. Ocorre infertilidade em 20% das mulheres com salpingite 
167
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
gonocócica. A cervicite ou proctite gonocócica crônica é frequentemente assintomática. A maioria das 
mulheres com gonorreia é assintomática.
Mesmo quando a paciente possuir sintomas, muitas vezes são leves e inespecíficos, de tal forma que 
podem ser confundidos com outras infecções que acometem a bexiga ou a vagina. Indivíduos assintomáticos 
infectados constituem um reservatório definitivo de N. gonorrhoeae, e um fator importante na atual 
pandemia de gonorreia é a falha dos médicos em identificar e tratar pacientes assintomáticos.
Figura 92 – Secreção uretral decorrente da gonorreia (notar o 
aspecto espesso da secreção purulenta)
Fonte: Levinson (2014, p. 1347).
A bacteriemia gonocócica resulta em lesões cutâneas (particularmente pápulas hemorrágicas e 
pústulas) nas mãos, antebraços, pés e pernas, bem como em tenossinovite e artrite supurativa, geralmente 
nos joelhos, tornozelos e punhos. A endocardite gonocócica é uma infecção incomum, porém grave. 
Às vezes, os gonococos causam meningite e infecções oculares em adultos. Esses casos apresentam 
manifestações semelhantes às causadas por meningococos.
A oftalmia neonatal gonocócica, uma infecção dos olhos do lactente, é contraída durante a passagem 
pelo canal do parto infectado. A conjuntivite inicial progride rapidamente e, se não for tratada, resulta 
em cegueira. Para evitar a oftalmia neonatal gonocócica, a instilação de tetraciclina, eritromicina ou 
nitrato de prata no saco conjuntival do lactente é obrigatória nos EUA. Os gonococos que causam 
infecção localizada são frequentemente sorossensíveis (mortos por anticorpos e complemento).
168
Unidade II
6.5 Diagnóstico laboratorial
Que material biológico deverá ser obtido para o diagnóstico laboratorial de gonorreia? Devem ser 
obtidas amostras de pus e secreções da uretra, do colo, do reto, da conjuntiva, da garganta ou do líquido 
sinovial para cultura e esfregaço.
Os esfregaços de exsudato uretral ou endocervical, corados pelo método de Gram, revelam 
inúmeros diplococos no interior dos leucócitos. Esse achado possibilita o estabelecimento do 
diagnóstico presuntivo. Os esfregaços corados do exsudato uretral de homens apresentam 
sensibilidade de cerca de 90% e especificidade de 99%. Os esfregaços corados de exsudatos 
endocervicais exibem sensibilidade de cerca de 50% e especificidade de aproximadamente 95% 
quando examinados por um microscopista experiente.
Outros testes diagnósticos de exsudato uretral de homens não são necessários quando a coloração 
é positiva, mas testes de amplificação de ácidos nucleicos ou culturas devem ser feitos com amostras 
obtidas de mulheres. Os esfregaços corados de exsudatos conjuntivais também podem ser diagnósticos, 
porém os de amostras de garganta ou do reto geralmente não são úteis.
 Lembrete
Na mulher, mesmo as sintomáticas, o valor diagnóstico da bacterioscopia 
de esfregaço de exsudatos endocervicais não é tão útil, pois há espécies 
comensais nas mucosas.
Imediatamente após a coleta, o pus ou muco deve ser semeado em meio seletivo enriquecido 
(comumente emprega-se o meio Thayer‑Martin – Figura 93), com incubação em atmosfera que 
contenha 5% de CO2 a 37ºC. Para evitar o crescimento excessivo de contaminantes, o meio seletivo 
deve conter antimicrobianos (por exemplo, vancomicina, 3 µg/ml; colistina, 7,5 µg/ml; anfotericina B, 
1 µg/ml; trimetoprima, 3 µg/ml).
Se não for possível a incubação imediata, a amostra deve ser colocada em um sistema de transporte 
de cultura contendo CO2. Os microrganismos podem ser identificados pelo seu aspecto no esfregaço 
corado pelo método de Gram, pela positividade da oxidase e por coaglutinação, imunofluorescência ou 
outros testes laboratoriais, 48 horas após a cultura.
As espécies de bactérias no repique podem ser determinadas por meio de reações de oxidação de 
carboidratos específicos (principalmente glicose (+), maltose (-) e sacarose (-), ver Tabela 1). A espectrometria 
de massa pela técnica de ionização por dessorção a laser assistida por matriz seguida de análise por 
tempo de voo (MALDI-TOF) apresenta um potencial de identificação (no mesmo dia) dos isolados 
de culturas. Os gonococos isolados de locais anatômicos diferentes do trato genital ou de crianças 
devem ser identificados quanto à espécie pela realização de dois testes confirmatórios diferentes, 
devido às implicações legais e sociais das culturas positivas.
169
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Meio ágar chocolate Meio Thayer-Martin
Amostra de origem retal
Figura 93 – Cultura de N. gonorrhoeae em meio sólido. A placa da esquerda continha meio ágar chocolate (não 
seletivo), enquanto a da direita continha meio Thayer-Martin (seletivo). Ambas as placas foram semeadas com 
secreção retal obtida a partir de paciente com suspeita de N. gonorrhoeae. Observe como o meio não seletivo 
permitiu a proliferação de vários tipos de bactérias, enquanto o meio seletivo, em função dos antibióticos 
adicionados, permitiu que apenas a bactéria N. gonorrhoeae prosperasse
Disponível em: https://bit.ly/3EY9dS4. Acesso em: 27 set. 2021.
Diversos testes de amplificação de ácidos nucleicos estão disponíveis para detecção direta de N. 
gonorrhoeae em amostras do trato genitourinário e esses são os testes preferidos para estas fontes. 
Em geral, há excelente sensibilidade e especificidade em populações sintomáticas de alta prevalência. 
Entre as vantagens estão melhor detecção, resultados mais rápidos e a possibilidade de usar a urina 
como fonte de amostra. As desvantagens incluem a fraca especificidade de alguns ensaios devido à 
reatividade cruzada com espécies de Neisseria não gonocócicas.
O soro e o fluido genital contêm anticorpos IgG e IgA contra os pili gonocócicos, as proteínas da 
membrana externa e o LOS. Em indivíduos infectados pode-se detectara presença de anticorpos por 
meio de immunoblotting, radioimunoensaio e ELISA. Contudo, esses testes não são úteis como auxiliares 
diagnósticos, sobretudo diante da heterogeneidade antigênica dos gonococos e do tempo necessário 
para a produção de anticorpos na presença da infecção aguda.
170
Unidade II
Tabela 1 – Reações bioquímicas de Neisseria e Moraxella catarrhalis
Ácido formado a partir de
Espécie Crescimento em meio seletivo* Glicose Maltose Lactose
Sacarose ou 
frutose DNAse
Neisseria gonorrhoeae + + - - - -
Neisseria meningitidis + + + - - -
Neisseria lactâmica + + + + - -
Neisseria sicca - + + - + -
Neisseria subflava - + + - ± -
Neisseria mucosa - + + - ± -
Neisseria flavescens - - - - - -
Neisseria cinerea ± - - - - -
Neisseria polysaccharea ± + + - - -
Neisseria elongata - -/pouco - - - -
Moraxella catarrhalis - - - - - +
* Meios seletivos: Thayer-Martin, Martin-Lewis ou meio de New York City (NYC).
Fonte: Brooks et al. (2013, p. 286).
A hemocultura é necessária na doença sistêmica; entretanto, o uso de um sistema de cultura especial 
é útil, visto que os gonococos podem ser suscetíveis ao sulfonato de polianetol presente nos meios de 
hemocultura-padrões.
Os gonococos podem ser cultivados a partir de amostras de sangue ou líquido articular de apenas 
30% dos pacientes com artrite gonocócica. A deficiência de complemento frequentemente é observada 
em pacientes com bacteriemia gonocócica. Pacientes com bacteriemia, especialmente se for recorrente, 
devem ser testados quanto à atividade hemolítica total do complemento.
6.6 Tratamento
Desde o desenvolvimento e uso disseminado da penicilina, a resistência dos gonococos a esse 
antibiótico vem aumentando de modo gradual, devido à seleção de mutantes resistentes. A resistência 
à tetraciclina também é comum. Foi observada, ainda, resistência à espectinomicina, bem como às 
fluoroquinolonas. A administração de dose única de fluoroquinolonas foi recomendada para o tratamento 
das infecções gonocócicas de 1993 a 2006. Desde 2006, as taxas de resistência a quinolonas entre os 
gonococos isolados ultrapassaram 5% em homens que têm relações sexuais com outros homens, e 
também em homens heterossexuais.
Devido aos problemas relacionados com a resistência da N. gonorrhoea aos antimicrobiandos, 
recomenda-se que pacientes com infecções genitais ou retais sem complicações sejam tratados com dose 
única de ceftriaxona (250 mg) intramuscular, ou 400 mg de cefixima oral em dose única. Recomenda-se 
uma terapia adicional com 1 g de azitromicina por via oral em dose única, ou 100 mg de doxiciclina duas 
vezes ao dia por sete dias para a possível presença de infecção concomitante por Chlamydia.
171
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
20012000
0
25
50
Po
rc
en
ta
ge
m
 d
e 
iso
la
do
s r
es
ist
en
te
s
75
10
0
2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Ano
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Tetraciclina
Ciprofloxacina
Penicilina
Azitromicina
Cefixima
Spectinomicina
Ceftriaxona
 Terapia de linha de frente: 
ciprofloxacina
Terapia de linha de frente: 
cefixima
 Terapia de linha de frente: 
ceftriaxona + azitromicina
Figura 94 – Percentual de gonococos isolados resistentes a antimicrobianos no Reino Unido. As linhas 
verticais tracejadas mostram as datas de alteração das diretrizes de tratamento. Em 2015, o meio de 
cultura usado para determinar os valores de concentração inibitória mínima mudou no Reino Unido, 
logo os resultados após essa data não são comparáveis aos anos anteriores, particularmente para 
azitromicina e tetraciclina
Disponível em: https://bit.ly/3mgjhil. Acesso em: 3 ago. 2021.
A oftalmia neonatal gonocócica pode ser evitada pela aplicação local de pomada oftálmica de 
eritromicina a 0,5% ou de tetraciclina a 1% na conjuntiva dos lactentes. Embora a instilação de solução 
de nitrato de prata também seja eficaz e constitua o método clássico de prevenção de oftalmia neonatal, 
é difícil conservar o nitrato de prata, que também provoca irritação conjuntival; seu uso foi substituído 
em grande parte por pomada de eritromicina ou de tetraciclina.
6.7 Imunização
Indivíduos que já foram tratados para gonorreia podem ser infectados repetidamente sem o 
desenvolvimento de memória imunológica. Um estudo experimental de infecção gonocócica em homens 
mostrou que um contato inicial com o patógeno não fornece proteção contra infecções repetidas 
decorrentes da exposição à mesma cepa, dentro de 21 dias após a infecção inicial. N. gonorrhoeae é 
capaz de evadir a resposta adaptativa do sistema imunológico humano por vários mecanismos, tais 
como alteração de fase e variação antigênica dos pili expostos à superfície, proteínas Opa e LOS.
As estruturas de carboidratos do LOS também desempenham um papel na evasão imunológica, 
imitando as moléculas do hospedeiro. Muitos LOS de N. gonorrhoeae mostram reatividade cruzada 
com anticorpos que reconhecem glicoesfingolipídios humanos, particularmente em eritrócitos, mimetizando 
antígenos de superfície humanos e contribuindo para a dificuldade de desenvolvimento de vacinas. 
Enquanto N. gonorrhoeae estimula uma resposta imune inata intensa e suprime a resposta imune 
adaptativa, infecções repetidas ocorrem com frequência nos indivíduos da população de alto risco.
172
Unidade II
O desenvolvimento de uma vacina eficaz é limitado pela identificação de um antígeno protetor 
adequado. Um estudo publicado recentemente na Nova Zelândia, em que adultos jovens foram 
inoculados com uma vacina meningocócica do grupo B, mostrou taxas reduzidas de gonorreia nessa 
população. Essa é a primeira vez que uma vacina mostra taxas reduzidas de gonorreia, e estudos de 
acompanhamento são necessários para determinar se a vacina confere proteção verdadeira.
7 DOENÇAS INFECTOCONTAGIOSAS – TUBERCULOSE
7.1 Breve histórico
A tuberculose (TB) é uma das doenças mais antigas entre as conhecidas por afetar os seres humanos. 
Apesar dos avanços em seu controle, ela permanece como um problema de saúde pública mundial, sendo 
uma das 10 principais causas de morte por doença infecciosa causada por agente único, superando o 
HIV/AIDS. Nos últimos dois séculos, ela matou cerca de 1 bilhão de pessoas, mas nunca com a força 
óbvia da convulsão social que caracteriza outras grandes epidemias, como a varíola ou o cólera.
Evidências de “tísica”, como Hipócrates a chamou, ou “consumo” foram encontradas em esqueletos 
neolíticos (de 4500 a.C.), na Alemanha, e foram descritas em diversos textos antigos (exceto aqueles 
das Américas), incluindo o Código de Hamurabi (de cerca de 2000 a.C.). Os historiadores acreditam que 
a doença evoluiu no Oriente Médio há cerca de 8 mil anos e passou para os seres humanos a partir do 
gado. Pode ter alcançado as Américas por meio da migração da Ásia pelo Mar de Bering. Restos mortais 
de uma mulher que morreu há mil anos no Peru mostram cicatrizes pulmonares típicas.
Por centenas de anos na Inglaterra, a escrófula – agora conhecida como uma linfandenite cervical 
dos linfonodos associada à tuberculose – foi chamada de “o mal do rei” e foi tratada pelo “toque 
real” divino do próprio monarca até o século XVIII. Mas a tuberculose (a palavra “tubérculo” significa 
uma pequena protuberância, nódulo ou crescimento) não se tornou um grande problema até que a 
Revolução Industrial criou as condições urbanas miseráveis de que precisa para se espalhar.
Já no final do século XVII, a tuberculose estava matando um em cada cinco londrinos, de acordo com 
o filósofo John Locke. A doença devastou os nativos americanos com intensidade após a chegada dos 
europeus e a mudança forçada do estilo nômade para vida em reservas. Em 1900, a tuberculose matava 
200 em cada 100 mil norte-americanos (principalmente nas cidades), mas, ao passo que as medidas de 
saúde pública melhoraram, a taxa caiu para 60 por 100 mil em 1940, nas vésperas da antibioticoterapia.
O bacilo da tuberculose é de crescimento lento e foi identificado em 1882 pelo grande bacteriologista 
alemão Robert Koch, quetambém descobriu os organismos responsáveis pelo antraz e cólera. Em função 
de suas descobertas, Koch foi venerado na América, Europa e Japão (onde um santuário foi construído 
em sua homenagem), porém até mesmo ilustres cientistas apresentam insucessos, e Koch sofreu uma 
queda profissional quando mais tarde anunciou uma vacina contra tuberculose (perigosa e ineficaz). 
No entanto, sua “tuberculina” formou a base para o teste cutâneo simples de hoje – em si um grande 
desenvolvimento. Esse teste, associado às radiografias do tórax, tornaram-se as principais ferramentas 
para rastrear a doença.
173
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Figura 95 – Pôster sobre campanha contra tuberculose na Primeira Guerra Mundial, Paris, 1918. Em 
livre tradução, a sentença diz “Devemos derrotar a tuberculose como o mais prejudicial dos répteis”
Disponível em: https://bit.ly/2Wh4PMx. Acesso em: 27 set. 2021.
Até o descobrimento da estreptomicina (década de 1940), a maioria dos pacientes era simplesmente 
orientada a descansar onde o ar fosse limpo, geralmente na área rural. Galeno, o lendário médico grego 
de Roma (130-200 d.C.), enviou seus ricos pacientes tuberculosos para as praias de Castellamare di 
Stabia, em frente à Ilha de Capri. Thomas Mann escreveu sobre um dos ilustres sanatórios alemães em 
A Montanha Mágica.
As vítimas de TB poderiam constituir um panteão das artes eruditas (Keats, Shelley, Chekhov, Chopin, 
Emily Brontë, Lawrence, Orwell, Stevenson, Whitman), contribuindo assim para o romance do gênio 
criativo e do sofrimento. “A decadência e a doença costumam ser belas, como a lágrima perolada da 
concha e o brilho agitado do consumo”, escreveu Thoreau em 1852. Essa noção foi resumida pela 
personagem Violetta Valéry na ópera de Verdi de 1853, La Traviata, baseada no romance A Dama das 
Camélias de Alexandre Dumas.
Mas, mais do que nunca, a tuberculose é sobretudo uma doença dos pobres habitantes de centros 
urbanos que não têm acesso a regimes de medicamentos eficazes. M. tuberculosis é um oportunista 
supremo, à espera de qualquer falha no sistema imunológico para dar uma chance de ataque. A desnutrição 
costuma ser um fator que lhe abre portas, junto com as infecções crônicas por outros organismos.
174
Unidade II
Na década de 1980, o número de novos casos nos Estados Unidos aumentou constantemente 
para cerca de 26.000 por ano, devido à falência dos serviços de tratamento, aumento do número de 
imigrantes infectados, cepas multirresistentes e surgimento da AIDS.
7.2 Agente etiológico
As micobactérias são bactérias aeróbicas em forma de bastonete que não formam esporos. Você 
saberia dizer por que são chamadas de bacilos “álcool-ácido resistentes” (BAAR)? Apesar de não 
serem facilmente coradas, resistem à descoloração por ácido ou álcool e, por esse motivo, assim são 
denominadas. A tuberculose pode ser causada por qualquer uma das sete espécies que integram 
o complexo Mycobacterium tuberculosis: M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum, M. canetti, 
M. microti, M. pinnipedi e M. caprae. Entretanto, do ponto de vista sanitário, a espécie mais 
importante é a M. tuberculosis.
Nos tecidos, os bacilos da tuberculose consistem em bastonetes retos e finos, medindo cerca de 
0,4 x 3 µm. Em meios artificiais, são observadas formas cocoides e filamentosas, com morfologia 
variável de uma espécie para outra. As micobactérias não podem ser classificadas como microrganismos 
Gram-positivos ou Gram-negativos. Coradas com corantes básicos, não podem ser descoradas por álcool 
independentemente do tratamento com iodo.
A velocidade de crescimento é muito mais lenta do que a da maioria das bactérias. O tempo de 
duplicação dos bacilos da tuberculose é de cerca de 18 horas. Além disso, micobactérias tendem a ser mais 
resistentes a agentes químicos do que as outras bactérias, devido à natureza hidrofóbica da superfície 
celular e a seu crescimento em agregados. Corantes (como verde de malaquita) ou antimicrobianos 
(como penicilina) podem ser incorporados aos meios de cultura sem inibir o crescimento dos bacilos 
da tuberculose. Esses bacilos são resistentes ao ressecamento e sobrevivem por longos períodos em 
escarro seco.
As paredes celulares das micobactérias são capazes de induzir hipersensibilidade tardia, bem como 
alguma resistência à infecção. Essas bactérias são ricas em lipídeos, que incluem ácidos micólicos (ácidos 
graxos de cadeia longa de C78 a C90), ceras e fosfatídeos. Na célula, os lipídeos são ligados, em grande 
parte, a proteínas e polissacarídeos. O dipeptídeo muramil (do peptidoglicano) complexado com ácidos 
micólicos pode causar a formação de granuloma, enquanto os fosfolipídeos induzem necrose caseosa. 
Os lipídeos são, até certo ponto, responsáveis pela álcool-ácido resistência, que depende da integridade 
da parede celular.
As cepas virulentas dos bacilos da tuberculose formam “cordões serpentiformes” microscópicos, nos 
quais os bacilos álcool-ácido resistentes dispõem-se em cadeias paralelas. Cada tipo de micobactéria 
contém várias proteínas que induzem a reação tuberculínica. Além disso, podem induzir a formação de 
uma variedade de anticorpos.
175
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
7.3 Aspectos epidemiológicos
Estima-se que cerca de um quarto da população mundial esteja infectada com M. tuberculosis. 
Segundo os levantamentos mais recentes da Organização da Saúde, cerca de 10,0 milhões (variação, 
8,9-11,0 milhões) de pessoas adoeceram com TB em 2019, um número que tem diminuído muito 
lentamente nos últimos anos. Houve uma estimativa de 1,2 milhão (variação de 1,1–1,3 milhões) de 
mortes por TB entre pessoas HIV-negativas em 2019 (comparativamente, a estimativa em 2000 era de 
1,7 milhão) e um adicional de 208 mil mortes (variação de 177.000–242.000) entre pessoas infectadas 
por HIV (em comparação, 678 mil em 2000).
A TB pode afetar qualquer pessoa em qualquer lugar, mas a doença se desenvolve principalmente 
em adultos. Há mais casos entre homens do que entre mulheres: homens (com idade ≥ 15 anos) 
representaram 56% das pessoas que desenvolveram TB em 2019; as mulheres representavam 32% 
e as crianças (<15 anos), 12%. A tuberculose é uma doença fortemente associada à pobreza e 
às dificuldades econômicas. Vulnerabilidade, marginalização, estigmatização e discriminação são 
frequentemente enfrentadas pelas pessoas afetadas pela doença. Trinta países com alta carga de 
tuberculose respondem por quase 90% dos adoecimentos a cada ano; desses países, Índia, Indonésia, 
China, Filipinas, Paquistão, Nigéria, Bangladesh e África do Sul correspondem àqueles com as maiores 
taxas de novas infecções em 2019.
TB é curável e evitável. Cerca de 85% das pessoas que desenvolvem tuberculose podem ser tratadas 
com sucesso, empregando-se um regime de medicamentos por seis meses, que ainda traz o benefício 
adicional de reduzir a transmissão progressiva da infecção. Desde 2000, o tratamento da TB evitou 
mais de 60 milhões de mortes, embora o acesso ainda esteja aquém da cobertura universal de saúde. O 
número de pessoas que desenvolvem infecções e doenças (e, portanto, o número de mortes) também 
pode ser reduzido por meio de ações multissetoriais para abordar os determinantes da TB, como pobreza, 
subnutrição, infecção por HIV, tabagismo e diabetes.
Em 2003, com a criação da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), a TB se tornou uma prioridade, 
compondo a agenda das políticas públicas de saúde do Brasil. A partir de então, diversos marcos na 
linha do tempo reforçaram sua importância nessa agenda, como a publicação do Plano Estratégico 
para o controle da tuberculose no Brasil de 2007 a 2015; a inclusão de indicadores da TB no Pacto pela 
Vida; e, mais recentemente, a publicação do Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de 
Saúde Pública.
Além disso, a partir de 2003, o Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) passou a ter 
orçamento próprio e específico, evidenciando a priorização para o controle da doença. Embora, de 2009 
a 2018, tenha sido observadauma queda média anual de 1,0%, coeficiente de incidência de tuberculose 
no Brasil aumentou nos anos de 2017 e 2018, em relação aos anos de 2015 e 2016. Na estratificação 
por UF, evidencia-se uma importante heterogeneidade no país, com maiores coeficientes de incidência 
acima de 51 casos/100 mil habitantes nos estados do Rio de Janeiro, Amazonas, Pará, Roraima e Acre.
176
Unidade II
50
40
44,4 43,4 41,941,9
38,838,8 38,138,1 39,039,0 38,338,3 37,537,5 38,238,2 37,037,0 35,435,4 34,534,5 34,134,1 33,933,9 35,335,3
36,236,2
30
In
ci
dê
nc
ia
/1
00
 m
il 
ha
bi
ta
nt
es
Ano de diagnóstico
20
10
0
20
03
20
05
20
07
20
09 20
11
20
13
20
15
20
17
20
04
20
06
20
08
20
10
20
12
20
14
20
16
20
18
45
35
25
15
5
Figura 96 – Coeficiente de incidência de tuberculose (por 100 mil habitantes), Brasil, de 2003 a 2018
Fonte: Brasil (2019, p. 88).
10-30
31-50
51-75
Casos por 100 mil hab.
Figura 97 – Coeficiente de incidência de tuberculose (por 100 mil habitantes), UF, 2019
Fonte: Brasil (2020, p. 12).
177
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
7.4 Aspectos fisiopatológicos e manifestações clínicas
Mycobacterium tuberculosis dissemina-se quando as pessoas com tuberculose expelem bactérias 
para o ar, por exemplo, tossindo. Mas essa bactéria afeta apenas os tecidos pulmonares? A doença afeta 
tipicamente os pulmões (TB pulmonar), mas também pode afetar outros locais (TB extrapulmonar).
A suscetibilidade à infecção é praticamente universal. No entanto, a maioria dos infectados resiste ao 
adoecimento após a infecção e desenvolve imunidade parcial à doença. Os bacilos ficam encapsulados, 
em estado latente, em pequenos focos quiescentes, que não progridem, nem provocam o adoecimento. 
Esta é a infecção latente da tuberculose (ILTB), que se expressa, na maioria das vezes, pela positividade 
da prova tuberculínica ou teste IGRA (interferon gama release array).
Cerca de 5% dos infectados não conseguem impedir a multiplicação inicial do bacilo e adoecem na 
sequência da primeira infecção. Outros 5%, apesar de bloquearem a infecção nessa fase, adoecem 
posteriormente (tuberculose pós-primária ou secundária), por reativação dos bacilos (reativação 
endógena) ou por exposição à nova fonte de infecção (reinfecção exógena).
A probabilidade de o portador da ILTB desenvolver a tuberculose ativa depende de múltiplos fatores, 
relacionados ao bacilo (virulência e patogenia) e ao ambiente (proximidade e tempo de permanência 
no mesmo ambiente da fonte infectante). A competência imunológica do próprio hospedeiro tem sua 
importância nesse processo. Há maior risco de adoecimento em portadores de doenças imunossupressoras, 
especialmente infectados pelo HIV, ou pessoas recebendo tratamentos imunodepressores ou 
imunossupressores, menores de 2 anos de idade ou maiores de 60 anos e/ou desnutridos.
Existem dois tipos de lesões principais decorrentes da infecção por TB: (1) do tipo exsudativo e 
(2) do tipo produtivo.
As lesões do tipo exsudativo consistem em uma reação inflamatória aguda com líquido de edema, 
leucócitos polimorfonucleares e, posteriormente, monócitos ao redor dos bacilos da tuberculose. Esse 
tipo de lesão é observado particularmente no tecido pulmonar, em que se assemelha ao da pneumonia 
bacteriana. Pode cicatrizar por resolução, de modo que todo o exsudato venha a ser absorvido, o que 
pode ocasionar necrose maciça do tecido; ou evoluir para um segundo tipo (produtivo) de lesão. Durante 
a fase exsudativa, o teste tuberculínico torna-se positivo.
As lesões do tipo produtivo são granulomas crônicos e, quando totalmente desenvolvidas, apresentam 
três zonas: (1) uma área central de células gigantes multinucleares contendo bacilos da tuberculose; 
(2) uma zona média de células epitelioides pálidas, com frequência dispostas de modo radial; e (3) uma 
zona periférica de fibroblastos, linfócitos e monócitos. Posteriormente, verifica-se a formação de tecido 
fibroso periférico, e a área central sofre uma necrose caseosa. Tal lesão é denominada tubérculo. Um 
tubérculo caseoso pode sofrer ruptura em um brônquio, esvaziar seu conteúdo e formar uma cavidade 
que, subsequentemente, pode cicatrizar por fibrose ou calcificação.
178
Unidade II
Os bacilos da TB propagam-se no hospedeiro por extensão direta, via canais linfáticos e corrente 
sanguínea, e via brônquios e trato gastrointestinal. Na primeira infecção, os bacilos propagam-se sempre 
do local inicial pelos vasos linfáticos para os linfonodos regionais. Podem propagar-se ainda mais e 
alcançar a corrente sanguínea, que os distribui para todos os órgãos (distribuição miliar). A corrente 
sanguínea também pode ser invadida pela erosão de uma veia por um tubérculo caseoso ou linfonodo. 
Se a lesão caseosa liberar seu conteúdo em um brônquio, o material será aspirado e distribuído para 
outras partes dos pulmões ou deglutido e levado para o estômago e intestino.
Uma vez instaladas no tecido, as micobactérias residem principalmente no interior dos monócitos, 
das células reticuloendoteliais e das células gigantes. A localização intracelular constitui uma das 
características que dificultam a terapia farmacológica e favorecem a persistência dos microrganismos.
Como o bacilo da tuberculose pode afetar qualquer órgão, suas manifestações clínicas são 
inúmeras. Fadiga, fraqueza, perda de peso, febre e tremores noturnos podem ser sinais de tuberculose. 
O comprometimento pulmonar, que causa tosse crônica e hemoptise, em geral está associado a lesões 
muito avançadas. Meningite ou comprometimento do trato urinário podem ocorrer na ausência de 
outros sinais de tuberculose.
A disseminação pela corrente sanguínea resulta em tuberculose miliar, com lesões em muitos órgãos 
e taxa elevada de mortalidade. A forma pulmonar, além de ser a mais frequente (87% dos casos novos 
de tuberculose em 2015), é também a mais relevante para a saúde pública, especialmente a positiva à 
baciloscopia, pois é a principal responsável pela manutenção da cadeia de transmissão da doença.
7.5 Diagnóstico laboratorial
Os verdadeiros bacilos da tuberculose caracterizam-se pela sua álcool-ácido resistência – isto é, o 
álcool etílico a 95%, contendo 3% de ácido clorídrico, descora rapidamente todas as bactérias, exceto 
as micobactérias. A álcool-ácido resistência depende da integridade do envelope lipídico. A técnica de 
Ziehl‑Neelsen de coloração é empregada para identificação das bactérias álcool-ácido resistentes.
Nos esfregaços de escarro ou em cortes de tecido, as micobactérias podem ainda ser demonstradas 
pela sua fluorescência amarelo-alaranjada após coloração com fluorocromos, como auramina e 
rodamina. A facilidade com que os BAAR podem ser visualizados com fluorocromos faz dessas colorações 
as preferidas para amostras clínicas.
179
BIOMEDICINA INTERDISCIPLINAR
Figura 98 – Mycobacterium tuberculosis (setas) em uma amostra de escarro processada e corada pela 
técnica de Ziehl-Neelson. M. tuberculosis está em vermelho contra um fundo azul-claro
Fonte: Brooks (2013, p. 315).
Figura 99 – Mycobacterium tuberculosis coradas com Auramina O. Dois bacilos da tuberculose são 
visíveis após a coloração da amostra de escarro
Fonte: Brooks (2013, p. 315).
Como podemos cultivar os bacilos da tuberculose in vitro? Os meios para a cultura primária das 
micobactérias devem incluir um não seletivo e um seletivo. Os meios seletivos contêm antibióticos 
para evitar o crescimento excessivo de bactérias e fungos contaminantes. Existem três formulações 
gerais que podem ser utilizadas para os meios seletivos quanto para os não seletivos: (1) meios de ágar 
semissintéticos, (2) meios espessados com ovo e (3) meios de cultura em caldo.
180
Unidade II
Os meios de ágar semissintéticos (como Middlebrook 7H10 e 7H11) contêm sais específicos, vitaminas, 
cofatores, ácido oleico, albumina, catalase e glicerol; o meio 7H11 também contém hidrolisado de 
caseína. A albumina neutraliza os efeitos tóxicos e inibitórios dos ácidos graxos na amostra ou no 
meio.

Continue navegando