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autor FRANCISCO DE ASSIS FLORÊNCIO 1ª edição SESES rio de janeiro 2018 LATIM Sumário Prefácio 7 1. Pronúncia do Latim, sintaxe dos casos e primeira declinação 9 Alfabeto 11 Vogais 13 Ditongos 13 Acento 13 Sintaxe dos casos 14 Primeira declinação 17 2. Segunda declinação, adjetivos de primeira classe e verbos: conjugações, presente e pretérito perfeito do indicativo 27 Segunda declinação 29 Gênero neutro 32 Adjetivos de primeira classe 34 Verbo 36 Presente do indicativo e pretérito perfeito do indicativo 38 Verbo ser 40 3. 3ª declinação, adjetivos de 2a classe, pretérito imperfeito, futuro imperfeito e mais-que-perfeito do indicativo 47 Terceira declinação 49 Temas sonânticos 49 Temas consonânticos 49 Declinação dos temas sonânticos 50 Declinação dos neutros sonânticos 52 Palavras de temas consonânticos 54 Palavras sigmáticas de temas consonânticos 56 Adjetivos de 2ª classe 59 Declinação dos adjetivos uniformes 60 Declinação dos adjetivos biformes 60 Declinação dos adjetivos triformes 61 Verbo 62 Pretérito imperfeito do indicativo 62 Futuro imperfeito do indicativo 64 Mais-que-perfeito do indicativo 65 4. 4ª e 5ª declinação e verbos: imperativo, demais tempos do perfectum e do infectum e voz passiva 71 Quarta declinação 73 Palavras femininas 73 Palavras masculinas 73 Palavras neutras 74 Quinta declinação 75 Imperativo 76 Presente do subjuntivo 77 Outros tempos 78 Verbo esse 81 Voz passiva 82 5. Verbos depoentes e as demais classes gramaticais: pronomes, advérbios, preposições, conjunções, numerais e interjeições 91 Verbos depoentes 93 Pronomes 94 Pronomes pessoais 94 Pronomes possessivos 95 Pronomes reflexivos 95 Pronomes demonstrativos 96 Pronomes relativos 98 Pronomes interrogativos 99 Advérbios 100 Preposições 101 Preposições que regem ablativo 101 Preposições que regem acusativo 101 Conjunções 102 Coordenativas 102 Subordinativas 103 Numerais 104 Cardinais 104 Ordinais 105 Interjeições 105 7 Prefácio Prezados(as) alunos(as), Este trabalho busca ensinar a língua latina não só para aqueles que se interessam pelos clássicos, mas também pelos que intentam se aprofundar nos estudos do latim bíblico e eclesiástico, englobando, principalmente, alunos do curso de Letras e Teologia. Para tanto, o aluno, desde o primeiro capítulo, entrará em contato com frases e textos tanto de origem clássica, quanto de origem bíblica. Nos cinco capítulos que constituem esta obra, o estudante se deparará com o tradicional, por exemplo, tabelas de declinações e conjugações e também perceberá, por meio de imagens e recursos visuais, que as novas formas de apresentar e ensinar o latim não foram deixadas de lado. Visando oferecer ao leitor de língua portuguesa uma abordagem tão com- pleta quanto possível da estrutura da língua latina, não nos baseamos apenas nos modelos já consagrados pelas gramáticas latinas, mas também nas novas formas de ensino de idiomas. Para isso, recorremos a imagens, cores, setas etc., ou seja, a recursos que outrora não estavam disponíveis à confecção de obras semelhantes. Para explanar a matéria, apresentamos primeiramente a teoria, que, além de ser colocada de forma expositiva, também é apresentada por meio de tabelas e quadros explicativos. Após a parte teórica, são apresentados exemplos extraídos de autores clássicos e da Bíblia, que, por virem acompanhados da tradução, irão ajudar a esclarecer e a fixar, de forma prática, o que foi ensinado. Cada capítulo, além do que já foi exposto, contém, ainda, atividades, gabarito e bibliografia. As atividades têm dois objetivos: 1) levar o discente a rever o que foi estudado naquele capítulo e 2) observar se o conteúdo teórico foi verdadeiramente assimilado. Preocupamo-nos em trabalhar, aqui, não somente frases, mas princi- palmente textos, a fim de que a compreensão do aluno vá além do funcionamento sintático e morfológico do latim, levando-o, assim, a entender os mecanismos de coesão e coerência dessa língua. O gabarito visa levar o discente a se autoavaliar, fazendo-o, dependendo do resultado, voltar ou não ao conteúdo aprendido. Por fim, vem a bibliografia, que é de grande importância, pois não é apenas um ins- trumento a que o estudante pode recorrer para dirimir suas dúvidas, mas é, prin- cipalmente, o caminho por meio do qual ele terá a chance de ir além do conteúdo ministrado neste livro, tendo oportunidade de alçar voos mais altos nos estudos da língua ciceroniana. Bons estudos! Pronúncia do Latim, sintaxe dos casos e primeira declinação 1 capítulo 1 • 10 Pronúncia do Latim, sintaxe dos casos e primeira declinação Neste capítulo, você estudará o alfabeto e a pronúncia do latim, sua origem, seu legado e as alterações pelas quais passaram, quer no de correr da história da língua, quer num período pontual, como veio a ocorrer durante o Renascimento. Será abordada ainda, fazendo uma analogia com a sintaxe portuguesa, a sintaxe latina, bem como os mecanismos responsáveis pelo seu funcionamento. Por último, será apresentada a primeira declinação latina, sua morfologia e a declinação dos casos. Quanto ao alfabeto, será feita uma breve introdução ao desenvolvimento da escrita latina e serão apresentadas as três pronúncias hoje existentes: a) reconstituída ou restaurada; b) tradicional e c) eclesiástica. No que diz respeito à sintaxe, você perceberá que enquanto a língua portuguesa privilegia uma ordem mais fixa na colocação das palavras a fim de classificá-las sintaticamente, o latim tem uma ordem mais livre e emprega, por isso, desinências para marcar a função sintática desempenhada por determinada palavra na oração. Por fim, será abordada a primeira declinação latina. Ela nos legou os substantivos terminados pela vogal -a, cuja morfologia se mostra presente em nossa língua não apenas pela presença da vogal temática -a, mas também pelo fato de que quase todas as palavras deste tema são femininas. OBJETIVOS • Conhecer o alfabeto latino. • Aprender as três pronúncias do latim. • Relembrar as funções sintáticas básicas da língua portuguesa. • Definir o conceito de caso. • Entender a relação existente entre caso e função sintática. • Introduzir e aprofundar o estudo da primeira declinação capítulo 1 • 11 Alfabeto O alfabeto latino, até mais ou menos o século III, era escrito em letras capitais, como se pode perceber nas inscrições esculpidas em pedras, metais e lápides. A partir do século IV, aparece um novo tipo de letra, a uncial, que vai até o século VIII, quando, enfim, dá lugar à letra cursiva. Além das letras conhecidas pelo povo romano, o contato com a cultura grega levou ao acréscimo de algumas letras e, consequentemente, ao aumento do léxico latino graças à presença de palavras iniciadas por essas consoantes gregas. Veremos, ainda, que o alfabeto latino não fazia distinção entre o u e v, pois na escrita capital existia apenas a letra V. Na verdade, ela funcionava de duas maneiras: ora como uma consoante, ora como uma vogal. Assim, na palavra VVA, o primeiro V funciona como uma vogal e o segundo, como uma semivogal, daí o nosso uva. O mesmo ocorria com i e j. Nas inscrições capitais só encontramos I, mas como ela também funcionava às vezes como semivogal, veio a se transformar, no Renascimento, no nosso já conhecido J. A pronúncia do latim é bem parecida com a portuguesa e, hoje, encontramos três tipos: a reconstituída (pronúncia clássica), a tradicional (à portuguesa) e a eclesiástica (da Igreja). Por ser bastante próxima à nossa língua, há poucas diferenças quanto aos fonemas consonantais da língua latina, como, por exemplo, a letra C, cujo fonema é sempre /K/, na pronúncia reconstituída; /S/, na tradicional e /tch/, na eclesiástica. No que se refere às vogais, são as mesmas do português, diferindo, porém, quanto à pronúncia. Enquanto na nossa língua a sílaba ora é tônica, ora é átona; no latim, o que prevalece é a quantidade, ou seja, ora a vogalé pronunciada de forma mais longa, ora é pronunciada de forma mais breve. Há, na língua de Cícero,quatro ditongos e eles são sempre longos. Quanto ao acento, não há palavras oxítonas no latim. O alfabeto latino é composto de 20 letras, são elas: A, B, C, D, E, F, G, H, I, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, V, X. Além dessas, o latim tem as letras K, Y e Z tomadas de empréstimo ao grego, geralmente para empregá-las nas palavras de origem grega. Há, hoje em dia, três pronúncias para as palavras latinas: 1. Pronúncia reconstituída ou restaurada. É aquela que procura reconstituir a pronúncia do Período Clássico – 81 a.C. e 14 d.C. capítulo 1 • 12 2. Pronúncia tradicional. Caracteriza-se por ser adaptada ao sistema fonológico do país onde o latim é falado. Em nosso caso, a língua portuguesa. 3. Pronúncia eclesiástica. Como a própria denominação indica, é empregada pela Igreja em missas e seminários e também pelos italianos. Apresentamos um quadro comparativo das três pronúncias: LETRAS/ GRUPOS EXEMPLOS PRON. TRAD. PRON. REC. PRON. ECLES. C Cicero Síssero Kíkero Tchítchero G Gens Jens Guens Djens GN Agnus Agnus Agnus Anhuss H Honos Onos Honos (h-aspirado) Onos S intervocálico Casa Caza Cassa Cassa TI Imprudentia Imprudenssia Imprudentia Imprudentsia X Maximus Massimus Maksimus Maksimus As demais consoantes são pronunciadas tal qual o português, com exceção de: a) L – tem dois valores: em final de sílaba ou de palavra era velar, como o nosso L; quando geminado, ou em início de sílaba ou de palavra, principalmente antes das vogais e e i, tinha o ponto de articulação na parte anterior da boca, tocando com a ponta da língua os incisivos superiores, tendendo a palatalizar-se, como em português: animal (animal) e villa(vil-la). b) M – tem dois valores distintos: quando está no início de sílaba ou de palavra, é semelhante ao m inicial português; quando no final de palavra, é debilmente pronunciado: anima (anima) e sum (sume). c) Q – aparecia apenas no grupo qu (qui, quae), como ocorre, em português, com as palavras “quando” e “quarto”. d) R – letra que era pronunciada como o r italiano, lembrando o rosnar de um cão: Roma. e) T – pronuncia-se como o t do nordestino, do espanhol e nunca palatal: Tibris. capítulo 1 • 13 Um destaque especial merecem as consoantes v e j. Elas não existiam em latim, mas sim o V, que até hoje substitui o Unas inscrições e documentos escritos com maiúsculas. No século XVI, o filólogo Pierre de la Ramée introduziu no alfabeto latino o j e o v. Os latinos, em vez destas consoantes, escreviam i e u, que, por serem semivogais em palavras como uita e iuuenis, vieram a ganhar forma de consoante no século XVI, vita e juvenis. Vogais As vogais são as mesmas do português e seu traço distintivo é a quantidade1, ou seja, elas podem ser longas ou breves. Quando uma vogal é longa, há sobre ela o sinal –; quando é breve, o sinal ˇ: amāmus, pŭer. O sinal que alonga a vogal é chamado de mácron e o que a torna breve, bráquia ou braquia, pois o seu desenho tem origem na forma do cotovelo, quando dobrado. Além de alongar ou abreviar uma vogal, estes sinais podem ainda abrir ou fechar as vogais e e o: ĕt (ét) e mē (mê). Ditongos2 São quatro: a) Ae – lê-se como ai: cǣdo (Kaido) b) Oe – lê-se como oi: pœna (poina) c) Au – como em português: aureus d) Ui – como em português: huic Acento Quanto ao acento, veja o que diz o célebre latinista Ernesto Faria: Compreende-se por acento a ação de fazer ressaltar, em uma palavra, determinada sílaba, denominada tônica, em relação às demais, chamadas átonas. Isso pode ser con- seguido de duas maneiras: 1º) pronunciando-se a sílaba acentuada com maior força, isto é, com mais intensidade; 2º) pronunciando-se a sílaba acentuada numa nota mais alta, isto é, com maior altura. (FARIAS, 1995) 1 Há línguas nas quais a quantidade desempenha um importante papel para distinguir vocábulos e formas gramaticais, como em inglês, como podemos perceber com as palavras bitch (bǐch) e beach (bīch). 2 Vale lembrar que na passagem do latim para o português houve um fenômeno linguístico conhecido por monotongação, ou seja, a passagem de um ditongo a um monotongo: Aelephantus>elefante; poena> pena; no caso do ditongo au, ele continuou como ditongo, mas mudou ora para ou, ora para oi: causa > cousa, coisa; aurum>ouro, oiro. capítulo 1 • 14 Nas palavras do mestre, encontra-se a distinção entre a pronúncia da língua portuguesa, que tem sílabas fortes (tônicas) e fracas (átonas), e a língua latina, com sílabas longas e breves. Em latim, diferentemente do português, que tem palavras oxítonas, o acento nunca recai na última sílaba. Quando a palavra apresenta duas sílabas, o acento recairá sempre na penúltima sílaba: • Mēnsa • Cǣsar Palavras com mais de duas sílabas recebem acento na penúltima sílaba, se ela for longa; se a penúltima for breve, o acento recai na antepenúltima: • Regīna • Epīstŭla • Discǐpŭla. © S U D O W O O D O | S H U TT E R S TO C K .C O M © S U N FL O W E R R | S H U TT E R S TO C K .C O M © O LG A 1 8 1 8 | S H U TT E R S TO C K .C O M Sintaxe dos casos Antes de apresentarmos um quadro comparativo entre o latim e o português, faz-se necessário explicar o que vem a ser “caso”. Oriundo do latim casus (que significa “queda”), o caso servia à gramática latina para designar a forma tomada por uma palavra declinável para indicar precisamente a sua função sintática na frase, pois, para que se passasse de um caso a outro, era necessária a queda da desinência final da palavra. Esta desinência não só marcava o caso a que a palavra pertencia, mas também o número. Um bom exemplo para explicar essa diferença é o sujeito. Em português, ele, geralmente, é colocado antes do verbo e a concordância verbal é o mecanismo empregado para sua identificação; em latim, além da con- cordância verbal entre sujeito e verbo, há, ainda, uma desinência número-casual que o identificará como sujeito da oração e cuja denominação, em latim, será nominativo. capítulo 1 • 15 Deste modo, se temos, em português, a frase: “A professora elogia a aluna”, sa- bemos que “A professora” é o sujeito pela posição que ela ocupa na frase. Em latim, como a ordem das palavras é mais livre, reconheceremos o sujeito não pela sua po- sição, mas sim pela desinência que marcará o número e o caso, a saber, nominativo singular, podendo, por isso, o nominativo estar em qualquer lugar da frase: • Magistra laudat discipulam. • Laudat discipulam magistra. • Discipulam magistra laudat. Além do nominativo, há mais cinco casos em latim e cada um deles equivale a uma função sintática portuguesa. Vejamos um quadro comparativo entre o latim e o português: LATIM PORTUGUÊS Nominativo Sujeito e predicativo do sujeito Genitivo* Adjunto adnominal e complemento nominal (em português, aparecerá a preposição de** ) Vocativo Vocativo Acusativo Objeto direto e, quando precedido de preposição, adjunto adverbial Ablativo*** Adjunto adverbial e agente da passiva Dativo Objeto indireto e complemento nominal (em português, aparecerá a preposição a [para]) * Morfologicamente, o genitivo corresponde a uma locução adjetiva, como no exemplo: “Abraço fraterno” (adjetivo) – “Abraço de irmão” (locução adjetiva). ** A primeira ideia transmitida pelo genitivo é a de posse, ideia essa reforçada pela presença da preposição “de” na tradução para o português. Vale lembrar que a gramática da língua inglesa durante muito tempo chamou o “possessive case” de “genitive case”, em razão de ele trazer consigo a ideia de posse. *** Morfologicamente, o ablativo não é um advérbio e sim uma locução adverbial: “Amorosamente” (advérbio) – “Com amor” (locução adverbial). Em termos práticos, assim se dá a relação caso-função sintática: 1. Sujeito e predicativo do sujeito = nominativo a) A menina é magra. b) Puella macra est. capítulo 1 • 16 2. Adjunto adnominal e complemento nominal(com de) = genitivo a) A filha da rainha é magra. b) Filia reginae macra est. c) A rainha está desejosa de glória. d) Regina cupida gloriae est. 3. Vocativo = vocativo a) Eis que tu és bela, amada minha! b) Ecce tu pulchra es, amica mea!3 4. Objeto direto e adjunto adverbial = acusativo a) Não guardei a minha vinha. b) Vineam meam non custodivi4. c) A aluna vai à escola. d) Discipula ad schollam it. 5. Adjunto adverbial e agente da passiva = ablativo a) A menina vem da escola b) Puella ex schollā venit. c) A carta é lida pela menina. d) Epistula a puellā legitur. 6. Objeto indireto e complemento nominal = dativo a) A rainha deu uma boneca à filha. b) Regina pupam filiae dedit. c) A serva é fiel à rainha. d) Serva fidelis reginae est. O estudo etimológico dos nomes dos casos é de grande valia para que se entenda a função sintática desempenhada por cada um deles: 1. Nominativo – Oriundo do verbo nomināre, “nomear”, este caso serve para nomear uma palavra ou designar a ideia que ela transmite. 3 Cantares de Salomão 1:14. 4 Ibidem, 1:5. capítulo 1 • 17 2. Genitivo – Advindo do verbo gignĕre, “gerar”, este caso significa, lite- ralmente, “que gera”, “que cria”; significado este que reforça o fato de que quase todos os casos são oriundos de seu radical. 3. Vocativo – É o caso do chamamento e sua origem vem do verbo vocāre, “chamar”, “invocar”. 4. Acusativo – Este caso é assim denominado por um erro de entendi- mento dos gramáticos latinos na hora de traduzi-lo do grego aitiatich, como podemos perceber nas palavras de Bassols: Las dificuldades que ofrece la correcta interpretación etimológica de la palabra acusativo son el resultado de un error de inteligencia de los gramáticos latinos. (BASSOLS, 1945) O erro ocorreu pelo fato de os gramáticos latinos terem ligado a etimologia deste caso ao verbo aitiasjai“acusar”, quando, na verdade, ele estava ligado ao substantivo verbal aitiaton“o efeito, o resultado produzido por uma causa”. 5. Ablativo – segundo Bassols, o caso ablativo “significa etimologicamente caso de la seraración;...” 5Ao desmembrarmos os morfemas, encontraremos o prefixo ab, que dá ideia de “afastamento”, como “abstenção”, em português, e latum, “levado”, “movido”. 6. Dativo6 – oriundo do verbo dāre, este caso é usado para designar a pessoa a quem se atribui ou se dá alguma coisa. Primeira declinação Assim como no português, o latim também dividia os nomes de acordo com a vogal temática (VT). Na língua portuguesa, as vogais temáticas nominais são -a, -o e -e, oriundas das declinações latinas. Ao levarmos em conta a ordem das vogais temáticas portuguesas, descobriremos, de imediato, a VT da primeira declinação: -a. O nome declinação vem do verbo declināre, “declinar”, “derivar”, “flexionar”, e é usado pela gramática latina para dividir os nomes segundo a VT. Ainda dentro de cada declinação, os nomes são declinados, passando, assim, de um caso a outro. Observe agora o quadro da primeira declinação: 5 Ibidem, p. 347. 6 Não se deve esquecer de que no Judiciário existe a figura do advogado dativo, ou seja, aquele que é “dado”, nomeado por um juiz para defender um réu, quando este não tem condições de contratar um defensor capítulo 1 • 18 CASO SINGULAR PLURAL Nominativo Īnsulă insulae Genitivo Īnsulae Insulārum Vocativo Īnsulă Insulae Acusativo Īnsulam Insulas Ablativo Īnsulā Insulis Dativo Īnsulae Insulis Antes de comentarmos o quadro anterior, vale ressaltar que, no dicionário, um substantivo, em qualquer declinação, assim se apresenta: īnsulă, ae, em que o primeiro caso é o nominativo singular e o segundo, o genitivo singular7 . Voltando ao quadro, vale lembrar que a longa ͞ sobre o i indica que esta palavra deve ser pronunciada como uma palavra proparoxítona. A breveˇ sobre a vogal do nominativo e a longa͞ sobre a vogal do ablativo servem para diferenciar os respectivos casos. O vocativo, com raras exceções, será sempre igual ao nominativo, tanto no singular quanto no plural. O acusativo é o caso lexicogênico da língua portuguesa, ou seja, foi ele que deu origem às palavras da nossa língua. Veja: LATIM PORTUGUÊS Pīrātam pirata + Ø Pīrātas Piratas Ao se fazer a comparação entre as duas línguas, fica claro que a língua por- tuguesa é oriunda deste caso. Quanto ao singular, a desinência número-casual 7 No que diz respeito ao número, o latim, assim como o português, tem palavras que só existem no plural. Português: pêsames, núpcias, exéquias, óculos; em latim: nuptiae, exequiae (exéquias), Athenae. (Atenas). Quando isso ocorre, no dicionário aparecerá o nominativo plural e o genitivo plural: nuptiae, nuptiārum. capítulo 1 • 19 do acusativo (-m) caiu em português, ficando a nossa língua sem marca para o singular (morfema zero); quanto ao plural, vemos que a desinência marcadora do acusativo plural passou para o português, razão pela qual, a nossa desinência de número plural é -s. Quando se observa as desinências número-casuais, percebe-se que a desinên- cia -ae aparece em dois casos no singular (genitivo e dativo) e em dois casos no plural (nominativo e vocativo). Isso não deve ser motivo de preocupação, uma vez que o contexto frasal se encarregará de indicar em que caso determinada palavra se encontra. Notemos a diferença: a) Magistrae docent – As professoras ensinam. b) Docete, magistrae – Ensinai, professoras. Percebe-se, no segundo exemplo, que, embora se tenha usado a mesma desinência, o verbo no imperativo e a vírgula deixam bem claro que a palavra está no vocativo. Veja como se deve traduzir cada um dos casos: CASO SINGULAR PLURAL Nominativo Īnsulă – a (uma) ilha Insulae – as (umas) ilhas Genitivo Īnsulae – de (a,uma) ilha Insulārum – de (as,umas) ilhas Vocativo Īnsulă – Ó ilha! Insulae – Ó ilhas! Acusativo Īnsulam – a (uma) ilha Insulas – as (umas) ilhas Ablativo Īnsulā–de, em, por, com (a, uma) ilha Insulis – de, em, por, com (as, umas) ilhas Dativo Īnsulae – a, para (a, uma) ilha Insulis – a, para (as, umas) ilhas Como o latim não tem artigos, o emprego do artigo definido, indefinido ou a omissão deles fica na dependência do contexto frasal, como nos exemplos: • Casa de chocolate • Casa do chocolate capítulo 1 • 20 A ausência do artigo, no primeiro exemplo, leva o leitor a entender que se trata de uma casa feita de chocolate; já a sua presença no segundo exemplo, leva-o a deduzir que é um lugar onde se vende chocolate ou derivados. a) Morfologia e gênero Quanto à classifi cação dos morfemas, a parte da palavra que vem antes da VT é chamada de base ou radical (R); logo depois do radical, aparece a VT (-a) e, após ela, as desinências número-casuais (DNC). Em alguns casos, ora não aparece a VT, ora não aparece a DNC. Exemplificando: • R + VT + DNC a) Insul + a + s b) Insul + a + rum c) Insul + Ø + is d) Insul + ā + Ø Como a VT da primeira declinação é -a, a grande maioria das palavras des- ta declinação é feminina, mas, assim como em português, há também palavras masculinas. Estas palavras, geralmente, designam profi ssões que só eram exercidas por homens: a) Pirata, ae; b) Nauta, ae; © PA N D A V EC TO R | S H U TT E R S TO C K .C O M © G O O D _S TO C K | S H U TT E R S TO C K .C O M c) Auriga, ae; d) Poeta, ae; © M S S A | S H U TT E R S TO C K .C O M © P O R A N N A V IO LE T | S H U TT E R S TO C K .C O M capítulo 1 • 21 e) Athleta, ae; f ) Scriba, ae; © K IT TY V EC TO R | S H U TT E R S TO C K .C O M © IN G O TR | S H U TT E R S TO C K .C O M g) Agricola, ae. © E D E L | S H U TT E R S TO C K .C O M b) Regras de tradução • Deve-se procurar primeiro o verbo*; • Em seguida, o sujeito8, que estará no nominativo e concordará com o verbo em pessoa e número. • Se o verbo for de ligação (ser, estar etc.), além do sujeito, aparecerá o pre- dicativo do sujeito. • Se o verbo for intransitivo, aparecerá o nominativo e, às vezes,um adjunto adverbial, que ora estará no ablativo, ora no acusativo, quando preposicionado. • Se o verbo for transitivo direto (TD), além do sujeito, o verbo pedirá objeto direto (acusativo). • Se o verbo for transitivo indireto (pede preposição), o seu complemento será um objeto indireto (dativo). • Se o verbo for bitransitivo, ele pedirá dois complementos: objeto direto (acusativo) e objeto indireto (dativo). * No latim clássico, geralmente o verbo aparece no final da oração. 8 Vale lembrar que o sujeito também pode ser desinencial. Assim sendo, a presença do nominativo não será obrigatória: como nestes exemplos: Nós cantamos (sujeito = nós) – cantamos (sujeito desinencial). capítulo 1 • 22 c) Tabela de verbos Para facilitar a tradução, apresentaremos a conjugação, no presente do indica- tivo, de dois verbos que consideramos fundamentais para quem está começando os estudos de língua latina: “ser” (esse9) e “amar” (amāre). ĒSSE AMĀRE Sum*– sou Amo*– amo Es*– és Amas*– amas Est*– é Amat*– ama Sumus*– somos Amāmus*– amamos Estis*– sois Amātis*– amais Sunt*– são Amant*– amam *Quanto às desinências número-pessoais do latim, o que há de igual, parecido e dife- rente do português? 9 O verbo esse também pode ser traduzido por “estar”, “haver” ou qualquer outro verbo de ligação. ATIVIDADES 04. Traduza as seguintes frases: a) Diana*dea est. b) Cleopătra*regina est. c) Minērva dea sapiēntiae est; d) Athleta ad*palǣstram it. e) Discipŭlae in*scholā sunt. f) Discipula magīstram amat; g) Discipulae cum*magistrā ambulant; h) Discipula rosam magistrae dat; i) Discipulae rosas magistris dant; j) Servae, ubi regina est? * Para se facilitar a pronúncia, serão colocados o mácron e a braquia nas palavras de três sílabas. Isso ocorrerá, porém, na primeira aparição de uma palavra e não na sua repetição. capítulo 1 • 23 VOCABULÁRIO Diana, ae: Diana (deusa da lua, da caça) Dea, ae: deusa Est: 3a pessoa do singular Cleopătra, ae: Cleópatra (rainha do Egito) Regina, ae: rainha Minērva, ae: Minerva (deusa) Sapiēntia, ae: sabedoria Athleta, ae: atleta Palǣstra, ae: campo de treinamento; palestra Ad (prep.): para, em direção a In: (Prep.): em (a, o) {Que caso ela está regendo?} Discipŭla, ae: aluna Schola, ae: escola Sunt: 3ª pessoa do plural* do verbo “ser” ou “estar”; Magīstra, ae: professora; Amat: *” Ambulant: *do verbo “passear”, “caminhar” Cum (prep.): com, na companhia de; Rosa, ae rosa Dat: * Dant: *do verbo “dar” Serva, ae: serva Ubi: onde 01. Verta para o português o texto sobre Diana e identifique o caso das palavras destacadas: Diana* Diana filia Latonae** est. Latona valde suam filiam amat. Diana dea lunae et silvarum est et sagittas portat. Dea lunae valde silvas amat. In silvis vivit et ibi feras necat. Com base no texto,responda, em latim, às seguintes perguntas a) Quem é a filha de Latona? b) Quem Latona ama? c) Diana é a deusa de que? d) O que ela ama? e) Onde ela vive? f) O que ela mata? *O nome grego de Diana é Ártemis. ** Em grego ela corresponde à deusa Leto. VOCABULÁRIO Diana, ae: Diana Filia,ae: filha Latona, ae: Latona (deusa) Valde (advérbio): muito Sua (pronome): sua Luna, ae: lua Silva, ae: bosque, floresta Sagitta, ae: flechas Portat: 3ª pessoa do singular dos verbos “carregar”, “levar” In (prep.): em (a, o) Vivit: do verbo “viver” Et: e (conjunção aditiva) Ibi (advérbio): aí, nesse lugar Fera, ae: fera, animal selvagem Necat: do verbo “matar” capítulo 1 • 24 02. Verta para o latim: a) A formiga é pequena. b) A baleia é grande. c) A filha do agricultor dá comida às galinhas. d) A vida dos piratas é perigosa. e) As servas obedecem à rainha. f) O agricultor trabalha na terra. g) O escriba escreve uma carta. h) O atleta corre no campo de treinamento. VOCABULÁRIO Formīca, ae: formiga Parva (adjetivo): pequena Est: vide primeiro exercício Balǣna, ae: baleia Magna (adj.):grande Filia,ae: filha Agrīcola,ae: agricultor Dat: vide primeiro exercício Esca, ae: comida Gallīna, ae: galinha Vita, ae: vida Pirata, ae: pirata Periculosa (adj.): perigosa Serva, ae: serva Obtēmperant : Vide primeiro exercício Regīna, ae: rainha Agricola, ae: agricultor In (prep.): em (a, o); {pede ablativo} Terra, ae: terra Scriba, ae: escriba Scribit: Vide primeiro exercício Epistula, ae: carta Athleta, ae: atleta Currit: Vide primeiro exercício In (prep.): em (a, o). {pede ablativo} Palestra, ae: campo de treinamento 03. Encontre, a partir das palavras portuguesas derivadas do latim, a palavra latina nelas presente e dê sua tradução: a) Defenestrar b) Aquário c) Lunático d) Ranário e) Terráqueo f) Vital g) Herbário h) Alado i) Culinária Aquário – Aqui encontramos a palavra aqua, cuja tradução é “água”. capítulo 1 • 25 RESUMO Você, com certeza, deve ter percebido o quanto significativo foi para a sociedade ocidental a evolução do alfabeto latino. O seu legado direto na paleografia se dá primeiramente pelo uso que fazemos até hoje das letras maiúsculas, oriundas, como se sabe, das letras capitais. No que diz respeito às letras cursivas, elas são, na verdade, uma continuação das letras unciais minúsculas. O acento latino, predominantemente musical, traz para nós, falantes do português, certa dificuldade, como ocorre, por exemplo, na distinção entre o nominativo, cuja vogal é breve (ă) e ablativo, cuja vogal é longa (ā). Como a nossa língua trabalha com sílabas átonas e tônicas, temos a tendência de transformar em oxítona uma palavra terminada por uma longa. A sintaxe dos casos também é algo novo para os que estão acostumados com a ordem de colocação de palavras. Estamos tão presos à ordem que temos dificuldades em encontrar o sujeito do Hino Nacional: “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o brado retumbante...”. Nesse exemplo, embora o verbo concorde com o núcleo do sujeito “mar- gens”, a dificuldade consiste no fato de o verbo estar anteposto ao sujeito. Em latim, essa difi- culdade diminui em razão de a desinência do nominativo ter de concordar em número e pes- soa com o verbo, conforme os exemplos: Discipulă magistram amat; Discipulae magistram amant. Quanto aos outros casos, viu-se, na tabela, que cada caso corresponde a, pelo me- nos, uma função sintática e que o caso que passou direto para a nossa língua, inclusive na nomenclatura, foi o vocativo. As declinações latinas são divididas segundo a vogal temática e nos legaram as nossas vogais temáticas nominais. A vogal temática da primeira declinação é -a. Assim como no por- tuguês, a maioria das palavras desta declinação são femininas, mas há também palavras mas- culinas, principalmente aquelas profissões só exercidas por homens como “poeta” e “scriba”. Quanto à morfologia, deve-se dividir uma palavra, em latim, da seguinte maneira: R (in- sul) + VT (a) + DNC (s). O radical estará sempre presente; a vogal temática pode, às vezes, não aparecer (Ø), como em insulis; a desinência número-casual pode também estar ausente (Ø), como em insulā. É sempre bom lembrar que o aluno não deve se desesperar em decorar os casos. Ele deve lembrar que o dicionário já nos dá dois casos, o nominativo singular e o genitivo singular: filiă, ae. O acusativo é o caso lexicogênico da língua portuguesa, razão pela qual o nosso plural tem como marca de número o -s(poetas) e o nosso singular não é mar- cado como resultado da queda do -m (poetam) do acusativo singular. Por fim, fez-se uma breve introdução ao estudo dos verbos, com ênfase nas desinên- cias número-pessoais. Os verbos apresentados foram o ēsse e o amāre. Quanto à primeira pessoa do singular, viu-se que a desinência número-pessoal o continuou em português e a desinência -m caiu; a segunda pessoa continuou a ser marcada em português pela desinên- capítulo 1 • 26 cia -s. No que se refere à terceira pessoa, percebe-se que a desinência -t caiu em português, mas podemos encontrá-la, por exemplo, em it, no inglês, e est, no francês; a desinência da primeirapessoa do plural latina passou para o português, alternando apenas a vogal: -mus >-mos; na segunda pessoa, o t intervocálico caiu em português, ficando apenas o -is; na terceira pessoa, além da queda do t, o n passou a m, indo assim ao encontro da ortogra- fia portuguesa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIA SACRA IUXTA VULGATAM CLEMENTINAM. Nova editio logicis partitioni busaliisque subsidi isornata a Alberto Colunga, O. P. et LAURENTIO TURRADO. Madrid: Biblioteca de autores cristianos, 1999. Bíblia sagrada. Versão atualizada. 2. ed. Tradução João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega. v. I. 2 ed. Petrópolis: Editora VozesLtda, 1986. CLIMENT, M. Bassols de. Sintaxis Histórica de la Lengua Latina. Tomo I. Barcelona: Consejo Superior de Investigationes Científicas, 1945. FARIA, Ernesto. Gramática da Língua Latina. 2. ed. (revista e aumentada). Brasília: MEC/FAE/DF, 1995. LEITÃO, Luiz Ricardo; FILHO, João Ramos e FREITAS, Rosângela. Gramática Crítica: o culto e o coloquial no português brasileiro. 3. ed. (revista e ampliada). Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1998. LEITE, J. F. Marques e JORDÃO, A. J. Novaes. Dicionário Latino Vernáculo. 3. ed. (refundida e melhorada). Rio de Janeiro: Editora LUX Ltda, 1958. TORRINHA, Francisco. Dicionário Latino-Português. 2. ed. Porto: Gráficos Reunidos Ltda, 1942. Segunda declinação, adjetivos de primeira classe e verbos: conjugações, presente e pretérito perfeito do indicativo 2 capítulo 2 • 28 Segunda declinação, adjetivos de primeira classe e verbos: conjugações, presente e pretérito perfeito do indicativo Este capítulo abordará, primeiramente, a segunda declinação latina. Como foi visto na primeira declinação, as vogais temáticas (VTs) nominais portuguesas são oriundas das VTs latinas. Assim, se a VT da primeira declinação latina deu origem aos temas em -a, em português, a segunda declinação deu origem aos temas em -o.Você verá também que, no dicionário, a distinção entre elas se fará por meio do genitivo singular. No que diz respeito ao gênero, na segunda declinação aparecerá um gênero não presente na primeira: o neutro. O estudo dos adjetivos de primeira classe também será bastante relevante para que se venha a entender o legado da língua latina para a nossa língua. Em latim, assim como em português, o adjetivo concordará com o substantivo em número e indicará seu gênero. A grande diferença entre as duas línguas é que, na primeira, além da concordância em gênero e número, o adjetivo também concordará com o substantivo em caso. Por último, você estudará os verbos. Neste capítulo, serão abordadas as quatro conjugações verbais, bem como os tempos primitivos dos verbos, com ênfase no presente do indicativo e no pretérito perfeito do indicativo. OBJETIVOS • Apresentar a segunda declinação. • Relembrar a primeira declinação, cotejando-a com a segunda. • Aprofundar o estudo da segunda declinação. • Introduzir os adjetivos de 1a classe. • Entender a relação existente entre os adjetivos e os substantivos de 1a e 2a declinações. • Introduzir o estudo dos verbos, com ênfase nas conjugações e nos tempos primitivos: presente do indicativo e pretérito perfeito do indicativo. capítulo 2 • 29 Segunda declinação A segunda declinação abrange formas cuja vogal temática é -o, podendo apresentar uma variação para -u. O nominativo, quanto à forma, pode apresentar- se de quatro maneiras: dominus (senhor), ager (campo), vir (homem, varão) e bellum (guerra). As três primeiras palavras são masculinas e apenas a primeira apresenta desinência número-casual que irá marcar o nominativo: -us. As outras duas não são marcadas quanto à desinência e, por isso, no nominativo aparece apenas o radical. O quarto substantivo tem uma desinência (-um) que, além de indicar nominativo singular, indica também o gênero em que a palavra se encontra, a saber, gênero neutro. Quanto à apresentação de uma palavra desta declinação, no dicionário, a ordem é a mesma da primeira declinação e assim será em todas as declinações: nominativo singular, genitivo singular. Vale destacar que o genitivo é o caso responsável por indicar a que declinação uma palavra pertence. Assim sendo, a sua desinência, na primeira declinação é -ae, e, na segunda, -i. Eis como os substantivos de primeira e segunda declinação se apresentam no dicionário: domina,ae; dominus, i; ager, agri; vir, i; bellum, i. Em relação ao gênero, como a vogal temática é -o, a maioria das palavras são masculinas. Há, porém, assim como no português, palavras femininas e, no caso do latim, palavras neutras. As de gênero feminino são aquelas que nomeiam árvores frutíferas (malus, i = macieira; pirus, i = pereira), países (Aegyptus, i) e outras como humus, i (terra) e colus, i (roca). No que diz respeito ao terceiro gênero, como já dissemos, ele é identificado, de imediato, pela desinência -um no nominativo:malum, i; pirum ,i; templum, i, stadium, i. Vale destacar aqui a oposição existente entre a árvore frutífera e seu fruto: malus, i X malum, i, em que a árvore – por produzir, por gerar – é de gênero feminino, enquanto o que ela gera é de gênero neutro. Existem ainda algumas palavras que, embora sejam de gênero neutro, não apresentam o nominativo em -um, mas em -us: pelagus, i (mar); virus, i (peçonha); e vulgus, i (povo). capítulo 2 • 30 Veja a tabela dos nomes terminados em -us: CASO SINGULAR PLURAL Nominativo lupus lupi Genitivo lupi lupōrum Vocativo lupĕ lupi Acusativo lupum lupōs Ablativo lupō lupis Dativo lupō lupis Vê-se, destacado em negrito, a vogal temática da segunda declinação. Ao compararmos esta declinação com a primeira, fica fácil identificar pelo menos quatro casos, cuja principal diferença é a mudança da vogal temática. Veja: CASO 1ª DECLINAÇÃO 2ª DECLINAÇÃO Genitivo plural lupārum lupōrum Acusativo plural lupas lupos Ablativo singular lupā lupō Percebe-se, então, que a desinência do genitivo plural continua a mesma -rum, alternando apenas a VT; o mesmo se pode dizer das desinências do acusativo plural e ablativo singular. O nominativo singular e o genitivo singular estarão sempre presentes no dicionário e, aqui, no vocabulário. O vocativo, com exceção das palavras terminadas em -us e em -ius (filius, i),que fazem o vocativo singular em -e (vide tabela) e -i, respectivamente, será sempre igual ao nominativo em todas as declinações. Quanto aos outros casos, o acusativo singular apresenta o -u como alomorfe da VT -o e a desinência número-casual -m; o nominativo plural tem o -i como desinência, a qual permanece até hoje, na língua italiana, como marcadora de plural masculino; o dativo singular tem a mesma desinência do ablativo, -ō, e a mesma no plural -is. Vale lembrar que esta também é a desinência marcadora dos dois casos na primeira declinação, razão pela qual, para que não se tenha dúvida de que uma palavra é feminina ou masculina, recorre-se à desinência -ābus, como nos exemplos a seguir: capítulo 2 • 31 PRIMEIRA DECLINAÇÃO (DATIVO/ABLATIVO) SEGUNDA DECLINAÇÃO (DATIVO/ABLATIVO) Deābus Deis Filiābus Filiis Algumas frases com palavras da segunda declinação: a) Habitabit lupus cum agnō et pardus cum haedo accubabit...10 Tradução: Morará o lobo com o cordeiro e o leopardo se deitará com o cabrito... (Isaías 11:6) b) Ecce tu pulcher es, dilecte mi…11 Tradução: Eis que tu és belo, ó amado meu... (Cantares 1:16) c) Similis est dilectus meus capreae et hinnulō cervorum.12 Tradução: O meu amado é semelhante ao gamo e ao filhote dos cervos. (Cantares 2:9) Veja mais uma tabela da segunda declinação: CASO SINGULAR PLURAL Nominativo magister magistri Genitivo magistri magistrōrum Vocativo magister magistri Acusativo magistrum magistrōs Ablativo magistrō magistris Dativo magistrō magistris O substantivo anterior não termina em -us, logo, o próprio radical da palavra já se constitui no nominativo. No que se refereao genitivo (magistri), vê-se cla- ramente que o radical é diferente do radical do nominativo (magister × magistr). Quando isso ocorre, todos os outros casos, com exceção do vocativo singular, seguirão o radical do genitivo. 10 Em que casos se encontram as palavras lupus e agnō? 11 Idem para a palavra dilecte. 12 Capreae e e hinnulō são complementos do adjetivo similis. Em que caso estão? capítulo 2 • 32 Exemplos: a) Tu es magister Israel...13 Tu és mestre em Israel... (João 3:10) b) Non est discipulus super magistrum nec servus super dominum suum.14 Não é o discípulo mais do queo seu mestre, nem o servo mais do queo seu senhor. (Mateus 10:24) c) Et dixit puero suo: ...15 E disse ao seu moço: ... (Juízes19:13) Gênero neutro Por ser estranho a nós falantes do português e por apresentar algumas particula- ridades, este gênero merece uma atenção especial. Não se pode esquecer de que até hoje o gênero neutro está presente nas línguas modernas, em especial, no alemão, no qual encontramos três artigos: um masculino (der), um feminino (die) e um neutro (das). Como não há artigos em latim, o gênero neutro se mostra presente em subs- tantivos, adjetivos e pronomes. Na história das línguas, este gênero surgiu a partir da ideia de mundo que o falante tinha: seres animados e seres inanimados. Na ótica do falante, se uma coisa era viva, movia-se, crescia e se reproduzia, ela pertencia ou ao gênero feminino ou ao masculino; se, pelo contrário, ela não realizasse nenhuma dessas funções, era de gênero neutro. O exemplo mais signi- ficativo está na árvore e no seu fruto. Como aquela cumpre todos os papéis de um ser animado e ainda gera, ela é de gênero feminino; como este fica inerte e na expectativa de que o lancem à terra, é de gênero neutro. Essa ideia, com o tempo, perdeu-se e o falante passou a misturar os gêneros. Segundo o professor Arruda16 , dois fatores contribuíram para que isso ocorresse: a) algumas palavras do gênero neutro tinham a mesma terminação de pa- lavras masculinas e femininas: “lupus” (masculina), “malus” (feminina) e “virus” (neutra); 13 Israel é uma palavra indeclinável. Em que caso se encontra a palavra magister? 14 Magistrum e Dominum estão no ... 15 Se puero, na tradução para o português, aparece regido pela preposição a, ele se encontra no ... 16 ARRUDA, Francisco Edmar Cialdine. Questão de gênero... Revista Conhecimento Prático LÍNGUA PORTUGUESA. Edição 39. São Paulo: Oceano Indústria Gráfica Ltda. capítulo 2 • 33 b) ao terminarem pela desinência -a, as palavras neutras no plural (nomi- nativo, vocativo e acusativo) eram confundidas com as palavras de gêne- ro feminino. CASO SINGULAR PLURAL Nominativo templum templă Genitivo templi templōrum Vocativo templum templă Acusativo templum templă Ablativo templō templis Dativo templō templis Ao se observar a tabela anterior, percebe-se logo que o gênero neutro difere dos nomes masculinos e femininos em seis casos: nominativo, vocativo e acusativo singular e nominativo, vocativo e acusativo plural. Exemplo: a) In principiō17 erat Verbum et Verbum apud Deum et Deus erat Verbum18. No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. (João 1:1) b) Sicut lilium inter spinas, sic amica mea inter filias19. Qual o lírio entre os pinhos, tal a minha amada entre as filhas. (Cantares 2:2) c) Sicut malus inter ligna silvarum, sic dilectus meus inter filios20. Qual a macieira entre as árvores dos bosques, tal o meu amado entre os filhos. (Cantares 2:3) 17 O caso em que principiō se encontra é ..., pois ele está precedido da preposição in. 18 Sabendo que a palavra Verbum está no nominativo singular, identifique o seu gênero. 19 Qual a palavra de gênero neutro neste versículo? 20 A preposição inter rege acusativo. Assim sendo, podemos deduzir que a palavra ligna, quanto ao número, está no ..., pois é de gênero ... capítulo 2 • 34 Adjetivos de primeira classe Parvus Medius © E R IC IS S E LE E | S H U TT E R S TO C K .C O M © P O R P H O TO M A S TE R | S H U TT E R S TO C K .C O M Magnus © P O R O S E TR IK | S H U TT E R S TO C K .C O M Em latim, o -a é sempre VT, assim como o -o: lun-a, naut-a, lup-u-s, mal-u-s. Observe que luna é feminino e nauta é masculino; lupus é masculino e malus, feminino. O -u é alomorfe, isto é, variante da VT -o. A indicação do gênero, portanto, é feita por meio do adjetivo de forma fixa. No dicionário, assim se apresentará o adjetivo: altus, -a, -um, em que a desinência -us marcará o gênero masculino; a desinência -a, o feminino e a desinência -um, o neutro. Veja que, nos exemplos a seguir, o gênero do substantivo é determinado pelo adjetivo que o acompanha: a) Luna rotunda – feminino b) Nauta gloriosus – masculino c) Lupus malus – masculino d) Pirus alta – feminino e) Templum Magnum – neutro capítulo 2 • 35 Os adjetivos de primeira classe são assim denominados pelo fato de seguirem a declinação dos substantivos da primeira e segunda declinação. Desse modo, se tomarmos como exemplo o adjetivo magnus, -a, -um, perceberemos que o gênero masculino e o neutro, magnus e magnum, são declinados como um substantivo da segunda declinação; já a forma magna, por ser de gênero feminino, é declinada como um substantivo da primeira declinação. Às vezes, a desinência do masculino (-us) não aparece no dicionário, mas as de- sinências do feminino e neutro não se modificam: macer (Ø)21, macra, macrum22. A seguir, o quadro declinável dos adjetivos de primeira classe. CASOS MASC. SING. FEM. SING. NEUTRO SING. MASC. PL. FEM. PL. NEUTRO PL. Nominativo bonus bona bonum boni bonae bona Genitivo boni bonae boni bonorum bonarum bonorum Vocativo* bonĕ bona bonum boni bonae bona Acusativo bonum bonam bonum bonos bonas bona Ablativo bonō bonā bonō bonis bonis bonis Dativo bonō bonae bonō bonis bonis bonis • Adjetivos como macer e niger diferem apenas de bonus no nominativo e vocativo singular masculino. Exemplos clássicos e bíblicos de concordância entre adjetivos e substantivos: a) ... et visent longas Capitolia23 pompas. ... e o Capitólio estiver assistindo às longas pompas.(Ovíd., Met., 1, 561). b) ... ex Acheronte suo silvis peperisse sub atris; ... ter nascido nos sombrios bosques de seu Aqueronte; ... (Ovíd., Met., 5, 541). 21 Morfema zero. 22 Magro (a), daí o superlativo absoluto sintético: macérrimo. 23 Em latim, Capitolia está no plural (gênero neutro), por ser um plural poético, exigido pela métrica. Por questões de métrica, o sintagma regido pela preposição sub se encontra distanciado: silvis ... sub atris. Que caso ela rege? capítulo 2 • 36 c) Columnas eiusfecitargenteas, reclinatorium aureum, ... Fez-lhe as colunas argênteas (de prata), o estrado áureo (de ouro)... (Cantares 3:10) d) Cede coram virō stultō24, quia nescies labia prudentiae. Afasta-te da presença do homem insensato, pois nele não acharás palavras de ciência. (Provérbios 14:7) Verbo fui sum ero A estrutura verbal latina passou para a língua portuguesa. Esta estrutura é formada com o radical (no qual se concentra o sentido do verbo), vogal temática (agrupa o verbo em conjugações), desinência modo-temporal (indica o modo e o tempo) e a desinência número-pessoal (indica o número e a pessoa). A junção do radical mais vogal temática é denominada de tema. Sendo os verbos agrupados de acordo com a vogal temática tanto em português quanto em latim, percebe-se que a nossa língua herdou as três vogais temáticas latinas, passando a ter, por isso, três conjugações verbais: a primeira, vogal temática-a, amar; a segunda, vogal temática -e, comer e a terceira, vogal temática (VT) -i, dormir. Em latim, os verbos são agrupados em quatro conjugações: primeira, VT -ā, amāre; a segunda, VT -ē, vidēre; a terceira não tem VT (Ø), e sim vogal de ligação (ĕ), legĕre, e a quarta VT -ī, audīre. 24 Aqui, como não há preocupação com a métrica, a preposiçãoe o sintagma que ela rege se encontram juntos: coram virō stultō. © JA N O S L E V E N TE | S H U TT E R S TO C K .C O M capítulo 2 • 37 Veja agora o quadro comparativo entre a estrutura verbal portuguesa e a es- trutura verbal latina: TEMA RADICAL VOGAL TEMÁTICA DESINÊNCIA DE INFINITIVO Português Am A R Latim Am Ā Re Português V E R Latim Vid Ē Re Português L E R Latim Leg ĕ* Re Português Ouv I R Latim Aud Ī Re *Como já dissemos, este ĕ não é VT, mas sim vogal de ligação. Passamos a ter apenas três conjugações em português porque, com a perda da quantidade das vogais do latim clássico, houve uma confusão entre os temas das conjugações, resultando no desaparecimento de uma conjugação. Ao manusear o dicionário, você não terá dificuldades em identificar à qual conjugação verbal o verbo pertence, bem como seus tempos primitivos, ou seja, aqueles que formarão os demais tempos, também chamados de derivados. O primeiro tempo que você identificará, no dicionário, será o presente do indicativo. Dele se originam os demais tempos do infectum (ação não foi feita, não concluída). Ao se falar de infectum, está se falando, na verdade, não em tempo verbal, mas em aspecto verbal, ou seja, todos os demais tempos, cuja ação é incompleta, são oriundos do radical do presente do indicativo: pretérito imperfeito, imperativo etc. Também no dicionário será encontrado o pretérito perfeito, que, como o nome indica, dará origem aos tempos verbais que formarão o perfectum (ação feita, concluída), como, por exemplo, o mais-que-perfeito do indicativo, o futuro perfeito etc. capítulo 2 • 38 Assim o aluno encontrará e identificará o paradigma (modelo) de um verbo no dicionário: – 1a conjugação: amo, -as, -āre, -avi, -atum A primeira forma verbal a aparecer, amo, não é estranha aos falantes da língua portuguesa. Am é o radical ou a base; -o é a desinência número-pessoal da primei- ra pessoa do singular do presente do indicativo; a segunda forma, amas, também está no presente, como sabemos, e -s é a desinência número-pessoal; amāre é in- finitivo, cujos morfemas assim se apresentam: am = radical; -ā = VT e –re desi- nência de infinitivo; a terceira forma, amavi, embora nos pareça estranha, legou para a língua portuguesa a desinência número-pessoal -i, como vemos na primeira pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo: amei, comi, dormi; por fim, aparece o supino, que, em português, se traduz por uma locução verbal: para amar, para comer, para dormir. Quando se procura, no dicionário, um verbo de segunda conjugação, percebe- se que a diferença primordial entre ele e um de primeira (amāre e vidēre) é a VT, como se pode ver: video25, -es, -ēre, vidi, visum26. Quando se encontra um verbo da terceira conjugação, percebe-se que entre ele e um verbo da segunda, há duas diferenças fundamentais: a 2a pessoa do singular do presente do indicativo e o infinitivo. Observe: 2ª video vides vidēre vidi visum 3ª lego legis legĕre legi lectum A quarta conjugação também é fácil de ser identificada no dicionário. Basta apenas você procurar o infinitivo e encontrar a vogal temática -ī: audio, audis, audīre, audivi, auditum27. Presente do indicativo e pretérito perfeito do indicativo Como no paradigma se encontram as duas primeiras pessoas do presente do indicativo, amo, -as, pode-se, a partir delas, construir todo o presente: 25 Esta forma verbal passou para as línguas modernas como um substantivo: o vídeo. 26 O radical do supino, em muitos exemplos, passa direto para a língua portuguesa: visual, visão, visionário etc. 27 Vale destacar que, no dicionário, o paradigma verbal geralmente aparece sem o radical, a partir da segunda pessoa: audio, -is, -ire, -ivi, -itum. capítulo 2 • 39 Amo Amas Amat Amamus Amatis Amant O mesmo pode ser feito com as demais conjugações: PRESENTE DO INDICATIVO 2ª CONJUGAÇÃO 3ª CONJUGAÇÃO 4ª CONJUGAÇÃO video lego audio vides legis audis videt legit audit videmus legimus audimus videtis legitis auditis vidente legunt audiunt Já o pretérito perfeito é construído a partir da primeira pessoa do singular, que também está no paradigma: amavi, vidi, legi, audivi: PRETÉRITO PERFEITO DO INDICATIVO 1ª CONJUGAÇÃO 2ª CONJUGAÇÃO 3ª CONJUGAÇÃO 4ª CONJUGAÇÃO amavi* vidi legi audivi amavīsti vidīsti legīsti audivīsti amavit vidit legit audivit amavǐmus vidǐmus legǐmus audivǐmus amavīstis vidīstis legīstis audivīstis amavērunt** vidērunt’ legērunt audivērunt *Perceba que, para formar as outras pessoas do pretérito, basta repetir o radical da primeira pessoa do singular e acrescentar as desinências número-pessoais. **Na 3º pessoa do plural ocorre a alternância vocálica: a passagem da vogal -i para -e. Além da forma apresentada, ainda há, para a 3a pessoa, a forma ēre: amavēre, vidēre, legēre, audivēre. capítulo 2 • 40 Exemplos com o presente e o pretérito perfeito: a) Aquae multae non potuērunt extinguere caritatem… As muitas águas não puderam extinguir (este) amor… (Cantares de Salomão 8:7) b) In principiō creavit Deus caelum et terram. No princípio criou Deus o céu e a terra. (Gênesis, 1:1) c) Deum maxime Mercurium colunt. Adoram principalmente o deus Mercúrio. (Cés., B. Gal., 6, 17) d) ... Et crura sine nodis articulisque habent, ... ... e (os alces) têm as pernas sem articulações e sem junturas, ...(Cés., B. Gal., 7, 27) Verbo ser Um destaque especial merece o verbo esse, que pode ser traduzido por qual- quer verbo de ligação e também pelos verbos “haver” e “existir”. Em latim, assim como em português, ele é um verbo irregular e assim aparece no dicionário: sum, es, esse, fui. Como já se sabe, as duas primeiras pessoas estão no presente do in- dicativo; a terceira forma, como já é do nosso conhecimento, é o infinitivo. Ela é uma antiga forma de infinitivo que permaneceu nesse verbo, mas que, na maioria dos verbos, passou a -re. Por fim, encontra-se a primeira pessoa do pretérito per- feito, que passou direto para a língua portuguesa. TABULA PRAESENTIS INDICATIVI TABULA PRAETERITI PERFECTI INDICATIVI Sum Fui Es Fuīsti Est Fuit Sumus Fuǐmus Estis Fuīstis Sunt Fuērunt capítulo 2 • 41 Exemplo: a) Ego Lar sum familiaris ex hac familia... Eu sou o Lar familiar desta família... (Plaut., Aul., Prólogo, verso 2) b) Apud helvetios longe nobilissimus fuit et ditissimus Orgetorix. Entre os helvécios, Orgetorige foi, de longe, o mais nobre e o mais rico. (Cés., B. Gal., 1, 2, 1) c) Pulchrae sunt genae tuae... Belas são as tuas faces... (Cantares 1:10) d) Ecce tu puchra es, amica mea,... Eis que tu és bela, amada minha,… (Cantares 1:15) ATIVIDADES 01. Traduza as seguintes frases. a) Mercŭrǐus filius dei deōrum et deae Maiae est. b) Apōllo pulcher deus est et multa offǐcǐa habet. c) Aesculāpius deus medicīnae est. d) Tullus Hostīlius bella reparāvit et Albānos vicit. (Eut.,Brev. Hist. Rom., 1, 4) e) Et vocavit Deus firmamēntum caelum. (Gênesis 1:8) f) Et posuit Deus stellas in firmamēntō caeli. (Gênesis 1:17) g) Creāvit Deus māscŭlum et fēmǐnam. (Gênesis 1:27) h) Beatus vir qui non abiit in consilio impiōrum et in via peccatōrum… (Salmo 1:1) VOCABULARIUM Mercurius, i: Mercúrio Filius, i: filho Deus, i: deus Et: e (conjunção aditiva) Dea, ae: deusa Maia, ae: Maia Sum, es, esse, fui, --: ser, estar Apollo: Apolo Pulcher, -chra, -chrum: belo Multus, -a, -um: muito Officium, ii: ofício, função capítulo 2 • 42 VOCABULARIUM Habeo, -es, -ēre, habui, -itum: ter, possuir Aesculapius, ii: Esculápio Medicina, ae: medicina Tullus, i – Hostilius, i: Tulo Hostílio (terceiro rei de Roma) Bellum, i: guerra Reparo, -as, -āre, -avit, -atum: reparar, trazer de volta, restabelecer Albani, -ōrum: albanos (exemplo de pluralia tantum, ou seja, palavras que só existem no plural); Vinco, -is, ĕre, vici, victum: vencer Voco, -as, -āre, -avi, -atum: chamar; firmamentum, i: firmamento Caelum, i: céu Pono, -is, -ĕre, posui, posǐtum: por, colocar Stella, ae: estrela in(prep.): em (no, na) Creo, -as,-āre, -avit, -atum: criar Masculus, i: macho Femina, ae: fêmea Beatus, -a, -um: feliz; bem-aventurado Vir, i: homem, varão Qui: que, o qual (pronome relativo) Non: não Abeo, -is, -īre, abii, -itum: deter-se, permanecer; consilium, ii: conselho Impius, i: ímpio Via,ae: caminho Peccatorum: pecador (é uma palavra da 3ª declinação e está no gen, pl.= dos pecadores) 02. A que conjugação pertence os seguintes verbos? a) Habeo, -es, -ēre, habui, -itum b) Reparo, -as, -āre, -avit, -atum c) Abeo, -is, -īre, abii, -itum d) Pono, -is, -ĕre, posui, posǐtum 03. Com a ajuda dos paradigmas verbais do exercício 1, passe as formas verbais seguintes para o presente do indicativo a) Posuit b) Vici c) Vocavǐmus d) Creavīsti e) Fui f) Habuīstis capítulo 2 • 43 04. Traduza o texto e responda às questões a e b. Deinde regnum PriscusTarquǐnǐus accēpit. Hic nŭmĕrum senatōrum duplicāvit, circum Romae aedificāvit, ludos Romānos28 institŭit, qui ad nostram memǒrǐam permanent. Vicit idem etiam Sabīnos et non parum agrōrum sublātum isdem urbis Romae territōrio iunxit29, primūsquĕ30 triūmphans urbem intrāvit. Muros fecit et cloācas, Capitōlium inchoāvit. Tricēsi- mo octāvo impĕrǐi anno per Anci filios occīsus est, regis eius, cui ipse succēssĕrat. EUTRÓPIO, Breviarium Historiae Roamanae, liber I VOCABULARIUM Deīnde: depois, em seguida Regnum, i: reino Priscus, i : Prisco Tarquinius, i: Tarquínio (Tarquínio Prisco, 5o rei de Roma) Accipio, -is,-ĕre, -epi, -eptum: receber, tomar Hic: este (ele) {Pronome demonstrativo} Numĕrus, i: número Senatus: senado (Palavra da 4a de- clinação. Está no genitivo plural = dos senadores) Duplico, -as, -āre, ´-avi, -atum: duplicar Circus, i: circo Roma, ae: Roma Aedifico, -as, -āre, ´-avi, -atum: construir, edificar Ludus, i: jogo Romanus, -a, -um (adj.): romano (a) Instituo, -is, ,-ĕre, -ui, -utum: instituir, estabelecer Qui (pronome relativo): que (os quais) Ad (prep.): a, até Noster, nostra, nostrum (pron.): nosso (a) Memoria, ae: memória Permaneo, -es, -ēre, -mansi, -mansum: permanecer Vinco, -is, ĕre, vici, victum: vencer Idem: o mesmo Etiam: também Sabini, -orum: sabinos (exemplo de plura- lia tantum, ou seja, palavras que só existem no plural) Et: e (conjunção aditiva) Non parumagrorum (ager, agri) subla- tumisdem: “... tomado não pouco (muito) dos campos deles ...” Iungo, -is, -ĕre, iunxi, iunctum: anexar, juntar Urbis: cidade (Palavra da 3a declinação. Está no gen sing. = da cidade) Territorium, ii: território Primus que triumphan surbemintravit: “... e foi o primeiro a entrar (que entrou), triunfante na cidade {de Roma} Murus, i: muro Facio, -is, -ĕre, feci, factum: fazer Cloaca, ae: cloaca (esgoto) Capitolium, i: Capitólio (Templo de Júpiter) Inchoo, -as, āre, -avi, -atum: dar início à construção Tricesimo octavo imperiianno per An- cifilio soccisus est, regiseius, cui ipse successerat.: “No trigésimo ano de seu governo, foi morto pelos filhos de Anco, seu rei (o rei anterior), a quem ele mesmo (Prisco) sucedera.” 28 Perceba a concordância entre o adjetivo e o substantivo (ludos romanos) e, mais adiante, a concordância entre o pronome “nostram” (que também funciona como um adjetivo) e seu substantivo “memoriam”. 29 Aqui, estamos dando preferência ao i consonantal, mas em muitos textos e dicionários você encontrará a letra j 30 Conjunção aditiva correspondente a et. Será sempre pospositiva e incorporada ao 2o elemento dos termos ligados. capítulo 2 • 44 a) Qual o único verbo do texto que se encontra no presente do indicativo? b) Quanto aos nomes, identifique o caso e a declinação: • Regnum • Ludos • Memǒrǐam • Agrōrum • Territōrio • Cloacās 05. Faça a concordância entre o adjetivo e o substantivo: a) Capitoliă magn __ b) Cloacā parv__ c) Memoriā rum nostr___ d) Circus maxim___ e) Murō alt__ RESUMO Ao tomar conhecimento da 2ª declinação, você teve a oportunidade de relembrar um pouco da morfologia portuguesa, bem como fazer a comparação entre a 1ª e a 2ª declina- ções. Notou que, no que se refere ao português, a 2ª declinação nos legou os substantivos terminados pela VT -o, cuja maioria é de gênero masculino. Ainda quanto ao gênero, vale ressaltar que o latim possui o gênero neutro, que, na passagem para o português, ora passa para o gênero masculino, templo (templum), ora para o feminino, bactéria (bacterium). Na comparação das declinações, percebe-se que a principal diferença entre elas é a VT: -a, para a primeira, e -o, para a segunda. Assim sendo, fica fácil guardar as desinências de muitos casos, sendo necessário apenas mudar a vogal temática. Veja: a) genitivo plural: ārum – ōrum; b) ablativo singular: ā – ō; c) acusativo plural: as –os. No dicionário, a diferenciação entre as duas declinações se dá pela desinência do genitivo: -ae, para a 1ª e -i, para a 2ª. Quanto aos adjetivos, foram estudados aqueles que são chamados de 1a classe e, como já se sabe, são declinados, se femininos, como palavras da 1ª declinação; se masculinos e neutros, como palavras da 2ª. Você viu também que, quanto à ordem no dicionário, eles aparecerão sempre assim: -us, -a, -um. Sendo o -us a desinência marcadora do gênero masculino; -a, do gênero feminino e -um, do gênero neutro. Vale ressaltar que, muitas vezes, capítulo 2 • 45 a desinência -us não aparece, mas como a ordem não se altera, sabe-se que a primeira forma a aparecer é masculina. No que se refere à passagem para o português, não se pode esquecer de que os nossos adjetivos terminados pelas vogais temáticas -a e -o são oriundos dos adjetivos de primeira classe. Por fim, viu-se, no estudo dos verbos, que as conjugações latinas deixaram sua marca no português e, por isso, são bem fáceis de serem entendidas e guardadas na memória. A 1a nos legou à VT -a; a 2a a VT -e; e a 4a nos legou a VT -i, presente na nossa 3a conjugação. Este último caso ocorreu porque, como se sabe, o latim tem quatro conjugações, enquanto o português, três, uma vez que os verbos da 3a conjugação latina, que não tinha VT, migraram ora para a 2ª, ora para a 4a, restando, no fim, três conjugações. Neste capítulo você estudou também o paradigma verbal, ou seja, o modelo, a forma como o verbo se apresenta no dicionário. Pôde perceber que nele se encontram os tempos primitivos dos verbos: as duas primeiras pessoas do presente do indicativo, o infinitivo, a primeira pessoa do pretérito perfeito e o supino, no qual nos aprofundaremos em outros capí- tulos. Por fim, trabalhou-se, nas quatro conjugações, a conjugação do presente do indicativo e do pretérito perfeito, sendo incluído também o verbo esse. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARRUDA, Francisco Edmar Cialdine. Questão de gênero. Revista Conhecimento Prático LÍNGUA PORTUGUESA. Ed. 39. São Paulo: Oceano Indústria Gráfica Ltda, 2012. BIBLIA SACRA IUXTA VULGATAM CLEMENTINAM. Nova editio logicis partition ibusaliisque subsidiis ornata a Alberto Colunga, O. P. et LAURENTIO TURRADO. Madrid: Biblioteca de autores cristianos, 1999. Bíblia sagrada. Versão atualizada. 2. ed. Tradução João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. C. IULIUS CAESAR. Commentario ruml ibri de bello gallico. Disponível em: <www.thelatinlibrary. com>. Acesso em: maio 2018. EUTROPIUS. Breviarium Historia Romanae. Disponível em:<www.thelatinlibrary.com>. Acesso em: maio 2018. FARIA, Ernesto. Gramática da Língua Latina. 2. ed. (revista e aumentada). Brasília: MEC/FAE/DF, 1995. LEITÃO, Luiz Ricardo; FILHO, João Ramos e FREITAS, Rosângela. Gramática Crítica: o culto e o coloquial no português brasileiro. 3. ed. (revista e ampliada). Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1998. capítulo 2 • 46 LEITE, J. F. Marques e JORDÃO, A. J. Novaes. Dicionário Latino Vernáculo. 3. ed. (refundida e melhorada). Rio de Janeiro: Editora LUX Ltda, 1958. P. OVIDIVS NASO. Metamorphoses. Disponível em: <www.thelatinlibrary.com>. Acesso em: maio 2018. T. MACCVS PLAVTVS. Avlvlaria. Disponível em: <www.thelatinlibrary.com>.Acesso em: maio 2018. TORRINHA, Francisco. Dicionário Latino-Português. 2. ed. Porto: Gráficos Reunidos Ltda, 1942. 3ª declinação, adjetivos de 2a classe, pretérito imperfeito, futuro imperfeito e mais-que- perfeito do indicativo 3 capítulo 3 • 48 3ª declinação, adjetivos de 2a classe, pretérito imperfeito, futuro imperfeito e mais-que- perfeito do indicativo Neste capítulo, relembraremos as duas primeiras declinações e entraremos na terceira. Esta declinação deu em português os nomes terminados pela vogal temática -e. Assim, ao estudá-la, perceberemos que, embora a vogal temática original desta declinação seja -i, foi o seu alomorfe (-e) que prevaleceu. Veremos, ainda, que ela é a maior e a mais importante das declinações latinas, sendo, por isso, a que exigirá, por parte do aluno, um grau maior de dedicação e atenção. Você terá a oportunidade de estudar também, neste capítulo, os adjetivos de 2ª classe. Eles são assim chamados por representarem uma classe de adjetivos cuja vogal temática é -e, diferenciando-se, assim, dos adjetivos de 1ª classe, cuja vogais temáticas são -a e -o. Enquanto estes são declinados como os substantivos de 1ª e 2ª declinação, aqueles são declinados como nomes de 3ª declinação. Por fim, você estudará os verbos. Neste capítulo, relembraremos o paradigma verbal e seus tempos primitivos e abordaremos três novos tempos: pretérito imperfeito do indicativo, futuro imperfeito do indicativo e pretérito mais-que- perfeito do indicativo. OBJETIVOS • Apresentar a terceira declinação. • Relembrar a primeira declinação e a segunda, cotejando-as com a terceira. • Aprofundar o estudo da terceira declinação. • Introduzir os adjetivos de 2a classe. • Levar o aluno a entender a relação existente entre os adjetivos de segunda classe e a terceira declinação. • Relembrar o que foi estudado sobre os verbos no capítulo 2. • Apresentar dois tempos do infectum: pretérito imperfeito do indicativo e futuro imperfeito do indicativo. • Apresentar um tempo do perfectum: mais-que-perfeito do indicativo. capítulo 3 • 49 Terceira declinação Ao iniciarmos a terceira declinação, devemos ter em mente a noção de tema em latim e em português. Em latim, aqui em especial se referindo à terceira declinação, a noção de tema é subtrativa, ou seja, para que se encontre o tema desta declinação, deve-se subtrair a desinência número-casual do genitivo plural: civi – um = civi. Em português, esta noção é normalmente somativa: dente + e, ment + e. Em palavras do tipo pastores, cônsules, chega-se ao tema subtraindo a desinência de número: -s: pastore, cônsule. É o que se chama de singular teórico. (MATTOSO CÂMARA, 2011) Assim, quanto ao tema, a terceira declinação é dividida em palavras de temas sonânticos, apresentam a vogal temática -i, e consonânticos, terminam em consoantes: s, l, r, n,p, b, t, d, c, g. Temas sonânticos Tomemos como exemplo as palavras navis, is (navio), hostis, is (inimigo), em que o -i é a vogal temática; o que vem antes dele éa base ou o radicale o -s é a desinência número-casual, que, aqui, tanto marca o nominativo singular, quanto o genitivo singular. Temas consonânticos a) Consonânticos assigmáticos São aqueles quenão recebem a desinência -s (da letra grega, Σ sigma), no nominativo singular: consul, -is, labor, -is (trabalho), leo, -onis (o tema é a própria palavra no nominativo, sendo a desinência número-casual = Ø). b) Consonânticos sigmáticos São aqueles que apresentam a desinência -s no nominativo singular: princeps, -cipis; lex (cuja evolução assim se deu: legs > lecs > lex), legis; urbs, -is. O genitivo plural é o caso mais apropriado para se fazer a distinção entre os temas sonânticos e consonânticos. Nos temas sonânticos, ele termina em-i-um (com exceção de algumas palavras, tais como canis, -is e iuvenis, -is, que fazem o genitivo plural em canum e iuvenum). capítulo 3 • 50 Nos consonânticos, ele se apresentará em –um (com exceção dos substantivos monossilábicos terminados em duas consoantes: urbs, -is, gens, gentis (raça), dens, dentis, que fazem o genitivo plural em urbium, gentium e dentium). Declinação dos temas sonânticos Os substantivos pertencentes a este tema são masculinos e femininos que fazem o nominativo-vocativo singular em -is e, às vezes, em -es; e ainda por substantivos neutros que fazem o nominativo-vocativo-acusativo singular em -e, -al e -ar, como podemos ver nos quadros a seguir: Canis, -is CASO SINGULAR PLURAL Nominativo canis canēs Genitivo canis canǐum Vocativo canis canēs Acusativo canĕm canēs Ablativo canĕ canǐbus Dativo canī canǐbus Exemplo: a) Qui immolat bovem, interficit virum; qui sacrificat ovem, excere- brat canem31 ;... Quem imola um boi, mata um homem; quem sacrifica uma ovelha, quebra um cão; ... (Isaías 66:3) b) Corium depressum in fluviō viderunt canes32. Os cães viram um couro afundado (no fundo de um) num rio. (Fedro, Fábula: Canes famelici) 31 “Canem” está no mesmo caso de “bovem”, “ovem” e virum (2a declinação). Que caso é esse? 32 Há cinco casos que terminam com a desinência -es; mas como “canes” é o sujeito e o verbo está na 3a pessoa do plural, este vocábulo está no ... capítulo 3 • 51 Vulpes, -is CASO SINGULAR PLURAL Nominativo vulpes vulpēs Genitivo vulpis vulpǐum Vocativo vulpes vulpēs Acusativo vulpĕm vulpēs Ablativo vulpĕ vulpǐbus Dativo vulpī vulpǐbus Exemplo: a) Vulpes33 foveas habent, et volucres caeli nidos, ... As raposas têm covis e as aves do céu (têm) ninhos,...” (Lucas 9:58) b) Personam tragicam forte vulpes viderat; Uma raposa, por acaso, tinha visto uma máscara trágica;...(Fedro, Fábula: Vulpes ad personam tragicam). Antes de os neutros sonânticos serem apresentados, veja o quadro comparati- vo entre as duas primeiras declinações e a terceira. CASOS 1ª DECLINAÇÃO 2ª DECLINAÇÃO 3ª DECLINAÇÃO Genitivo sing/pl. -ǣ/ārum -ī/-ōrum -is/-ǐum ou –um Acusativo sin/pl -am/-as -um/-os -em/-es Ablativo sin/pl -ā/-is -ō/is -ĕ/ǐbus Primeiramente, ao consultar o dicionário, o aluno deve ter em mente que é por meio do genitivo que ele identificará a que declinação uma palavra pertence. Conforme se vê na tabela anterior, se o genitivo termina em -ae, a palavra pertence à 1ª declinação; se em -i, à 2ª, e, se em -is, à 3ª: filia, ae; filius, i e pater, patris. Quanto ao genitivo plural, percebe-se que em todas as declinações até agora vistas, ele termina sempre pela desinência -um, cuja “desinência antiga é -om” (FREIRE, 1987). O -r- que aparece na 1a declinação é uma consoante de ligação, que evita o 33 A desinência-es está presente tanto na letra a, quanto na letra b. Com a ajuda do contexto, identifique cada um dos casos. capítulo 3 • 52 encontro vocálico da vogal temática-acom a vogal da desinência u(m) e que veio, por analogia, a influenciar a 2ª declinação: romanom > romanorum. O acusativo, que, como já vimos, é o caso lexicogênico da língua portuguesa, terá sempre, em todas as declinações, a mesma desinência número-casual, com exceção das palavras neutras no plural. Se ele estiver no singular, VT + M; se estiver no plural, VT + S. No caso da 3ª declinação, deve-se tomar cuidado para que não se confunda a VT -i e seu alomorfe -e. Vale ressaltar quetanto o acusativo singular, -im, quanto o acusativo plural, -is, são mais antigos do que as formas apresentadas na tabela. Dois fatores contribuíram para essa mudança: 1. por analogia, o -em dos temas consonânticos se estendeu também aos temas sonânticos; 2. o fato de -em ser o representante fonético de -im muito contribuiu para que aquela desinência suplantasse esta; o que veio a contribuir também para que -is do acusativo plural se tornasse -es. Há, porém, alguns substantivos, principalmente ligados à linguagem técnica, que continuaram a empregar as desinências primitivas: Tiberim (rio Tibre), febrim, navim e, no caso do plural, as duas formas passaram a conviver em algumas palavras, como ocorre com a palavra urbs: urbise urbes. Quanto ao ablativo singular, já é de seu conhecimento de que ele termina sempre pela VT da declinação a que ele pertence: -ā (1ª) e -ō (2ª). O mesmo ocorre na 3ª declinação, com exceção de que a VT não é longa, e sim breve: -ĕ. Ainda na terceira declinação, deve-se ressaltar que o ablativo nos temas em -i era primitivamente em -id. Com a queda do d, o ablativo em -i permaneceu em quase todos os nomes neutros, como veremos na declinação dos neutros sonânticos. A preferência clássica pela desinência -ĕ se deu por conta da influência do acusativo em -em. No que concerne ao seu plural, percebe-se que sua desinência é sempre igual ao dativo plural. Isso, contudo, não deve causar maiores preocupações ao aluno, uma vez que tanto a presença de preposições (regendo ablativo), quanto o contexto frasal se encarregarão de dirimir a dúvida. Declinação dos neutros sonânticos Os neutros terminados em -al(i), -ar(i) perderam, no nominativo singular, a vogal temática -i-. Exemplos: animal, -is, tribunal, -is, cervical, is (travesseiro); capítulo 3 • 53 exemplar, -is, (modelo), calcar, -is (espora); já os neutros terminados em -e sofre- ram alomorfia, ou seja, o -i passa a -e. Exemplos: mare, -is, altare, -is. Cervical, -is CASO SINGULAR PLURAL Nominativo cervical* cervicaliă* Genitivo cervicalis cervicalǐum Vocativo cervical* cervicaliă* Acusativo cervical* cervicaliă* Ablativo cervicali cervicalǐbus Dativo cervicali cervicalǐbus *Como já visto na 2ª declinação, as palavras neutras têm a mesma desinência nos seguintes casos no singular: nominativo, vocativo e acusativo; o mesmo acontece no plural, cuja desinência número-casual é -ă. Exemplo: a) Et erat ipse in puppi supra cervical dormiens; E ele estava na popa dormindo sobre um travesseiro;... (Marcos 4:38) b) Tingue caput Cosmi folio, cervical olebit: Perdidit unguentum cum coma, pluma tenet. Banha tua cabeça com o unguento de Cosmo e teu travesseiro ficará com o cheiro dele. Quando teu cabelo tiver perdido a fragrância, as plumas a reterão. (Marcial 14, 146) Altarĕ, is CASO SINGULAR PLURAL Nominativo altarĕ altariă Genitivo altaris altarǐum Vocativo altarĕ altariă Acusativo altarĕ altariă Ablativo altarī altarǐbus Dativo altarī altarǐbus capítulo 3 • 54 Exemplos: a) Aedificavit autem Noe altare34 Domino E edificou Noé um altar ao Senhor; ... (Gênesis 8:20) b) En quattuor aras35: Ecce duas tibi, Daphni; duas altaria36 Phoebo. “Eis aí quatro altares: dois para ti, Dafne; dois altares para Febo.” (Verg., Écloga, 5, 65). Palavras de temas consonânticos Aqui trabalharemos as palavras assigmáticas terminadas em -s (flos, floris), -l (consul, -is), -r (scriptor, -ris), -n (nomen, -inis). Embora haja diferença quanto ao gênero, pois, como já é de seu conhecimento, o gênero neutro apresenta suas peculiaridades, o que mais chamará sua atenção aqui é a distinção entre o radical do nominativo e o do genitivo. Sempre que isso ocorre, como já vimos na 2a declinação na palavra magister, -tri, todos os casos seguirão o radical do genitivo, com exceção do vocativo singular, que seguirá o radical do nominativo. Preste atenção nas tabelas a seguir: 1. Palavra masculina37 Mus, muris CASO SINGULAR PLURAL Nominativo mus mures Genitivo muris murum Vocativo mus mures Acusativo murem mures Ablativo murĕ murǐbus Dativo murī murǐbus 34 Em que caso está Altare? 35 Ara e altare são frequentemente usados sem nenhuma distinção. O primeiro era mais baixo do que o segundo (oriundo de altus), sendo este erigido em honra aos deuses superiores, enquanto aquele, em honra a deuses inferiores, semideuses e heróis, como no exemplo anterior. 36 Identifique o caso e o gênero de altaria. 37 A mesma tabela também servirá para palavras femininas como, por exemplo, arbor, -ǒris. capítulo 3 • 55 Exemplo: a) ... quae habebat mures aureos et similitudines tumorum. ...a qual tinha os ratos de ouro e as imagens dos tumores. (1 Samuel 6:11) b) Cum uicti mures mustelarum exercitu (...) fugerent et artos circum trepidarent cauos,... Como os ratos, vencidos pelo exército das doninhas (...) fugissem e andassem apressadamente em volta dos estreitos buracos, ...” (Fedro, Fábula: Pugna Murium et Mustelarum). 2. Palavra neutra: Nomen, -ǐnis CASO SINGULAR PLURAL Nominativo nomen nomǐnă Genitivo nomǐnis nomǐnum Vocativo nomen nomǐnă Acusativo nomen nomǐnă Ablativo nomǐnĕ nomǐnǐbus Dativo nomǐnī nomǐnǐbus a) ... et saepe in tumulis sine corporĕ nomină* legi. …et, frequentemente, li, nos túmulos sem corpo, os nomes. (Ovíd., Met., 11, 429) b) ... aedificavit quoque ibi altare Domino et invocavit nomen* Domini. ... edificou também ali um altar ao Senhor e invocou o nome do Senhor. (Gênesis 12,8) *Identifique em que casos se encontram as duas palavras destacadas. capítulo 3 • 56 Palavras sigmáticas de temas consonânticos Aqui você entenderá o funcionamento das palavras supracitadas não apenas quanto à morfologia do latim clássico, mas também quanto às mudanças ocorri- das na língua latina no decorrer de sua história. Assim, ao se dizer que uma pala- vra é sigmática, o que se diz, na verdade, é que o tema de seu nominativo termina em -s. Para que isso ocorresse, algumas mudanças morfológicas foram necessárias. a) Os temas terminados em oclusiva bilabial surda (p) e oclusiva bilabial sonora (b) recebem a desinência –s no nominativo e vocativo: plebs, -is, inops, -is (falto de, necessitado). b) No caso do nominativo-vocativo terminados em -x, deve-se entender que os temas destas palavras terminam nas oclusivas velares c e g, as quais sofreram as seguintes mudanças: legs > lecs > lex, ocorrendo, assim, o ensurdecimento da oclusiva g; no caso do tema em c, não houve nenhuma alteração no tema, só na grafia: ducs passou a ser grafado como dux. Outros semelhantes: pax, -cis, radix, -icis; c) As oclusivas linguodentais (t e d) foram assimiladas pela sibilante surda da desinência. Vejamos como se deu a assimilação da linguodental surda (t): *milet-s > miles-s > miles; já a oclusiva sonora (d), além de ser assimilada, sofreu também ensurdecimento:*ped-s > *pet-s > *pe-s > pes. Outros exemplos: dens, dentis, lapis, -idis (pedra). d) Alguns temas terminados em -s apresentam ora alternância de quantidade (longa/breve): pubēs, -ĕris, Cerēs, -ĕris; ora alternância vocálica: opus, opĕris (obra), vetus, vetĕris. Quadros desinenciais de algumas palavras sigmáticas: Plebs, plebis CASO SINGULAR PLURAL Nominativo plebs plebes Genitivo plebis plebum Vocativo plebs plebes capítulo 3 • 57 Plebs, plebis CASO SINGULAR PLURAL Acusativo plebem plebes Ablativo plebĕ plebǐbus Dativo plebī plebǐbus Exemplo: a) Venit ergo Moyses et narravit* plebi omnia verba Domini atque iudicia Veio, pois, Moisés e narrou ao povo todas as palavras e juízos do Senhor. (Êxodo 24:3) b) *Plebs colit hanc, quia qui posuit de *plebe fuisse fertur, ... O povo a (deusa Fortuna) adora, porque é dito ter sido do povo aquele que estabeleceu (seu culto),...(Ovíd., Fautos, 6, 781-782). Rex, regis CASO SINGULAR PLURAL Nominativo rex reges Genitivo regis regum Vocativo rex reges Acusativo regem reges Ablativo regĕ regǐbus Dativo regī regǐbus Exemplos: a) ... Quintam partem regi dabitis;... ... Dareis a quinta parte ao rei... (Gênesis 47:24) b) Iamque neci similis resoluto corpore regem/et cum rege suo custodes somnus habebat,... E agora, um sono semelhante à morte segura o rei, que estava com o corpo re- laxado, e os guardas (que estavam) com o seu rei,...(Ovíd., Metamorfoses, 7, 339) capítulo 3 • 58 Pes, pedis CASO SINGULAR PLURAL Nominativo pes pedes Genitivo pedis pedum Vocativo pes pedes Acusativo pedem pedes Ablativo pedĕ pedǐbus Dativo pedī pedǐbus a) ... ac post quam laverunt pedes suos, recepit eos in convivium. ... e depois que lavaram seus pés, recebeu-os para a refeição.(Juízes19:21). b) Nec vagus in laxa pes tibi pelle natet; ... Que o teu pé não nade, desengonçado, em uma pele larga;...” (Ovíd.,
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