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A psoríase é uma doença cutânea poligênica imunomediada. Diversos fatores ambientais desencadeantes, como trauma, infecções e medicamentos, podem provocar a doença em indivíduos predispostos. A lesão característica é uma placa eritematosa claramente demarcada, com escamas micáceas. A distribuição das placas pode ser localizada ou espalhada. No âmbito histológico, são observados hiperqueratose, paraqueratose, acantose da epiderme, vasos dilatados e tortuosos, e infiltrado inflamatório composto principalmente por linfócitos. A psoríase é uma doença sistêmica; 20% a 30% dos pacientes com psoríase têm ou desenvolverão artrite psoriática. Além disso, os pacientes com psoríase moderada a grave, estão sob maior risco relativo de ter síndrome metabólica e doença cardiovascular ateroesclerótica. Os pacientes com psoríase também sofrem um impacto significativo na qualidade de vida; nas pesquisas, os pacientes sentem que os tratamentos atuais, apesar de muitas vezes eficientes, não apresentam uma solução satisfatória em longo prazo. Epidemiologia Na maioria das avaliações é dito que a prevalência da psoríase é de 2% da população mundial. No entanto, nos Estados Unidos e no Canadá foi relatada a prevalência de 4,6% e 4,7%, respectivamente. Tais números contrastam com a frequência em africanos, afro-americanos, lapo-noruegueses a asiáticos, entre 0,4% e 0,7%. Brandrup e Green relataram que 2/3 dos indivíduos afetados sofriam de psoríase branda, enquanto um terço apresentava o tipo mais grave. Em um grande grupo de pacientes com psoríase (n = 1.728), 79% apresentavam alterações nas unhas. Foi descoberto que a artrite psoriática afeta 5-30% dos pacientes com psoríase cutânea em séries distintas. A psoríase pode surgir pela primeira vez em qualquer idade, da infância à octogésima década de vida. Foram relatados dois picos na idade de início: o primeiro, dos 20 aos 30 anos de idade, e o segundo, dos 50 aos 60 anos de idade. Em aproximadamente 75% dos pacientes o início ocorre antes dos 40 anos de idade, e em 35-50% ocorre antes dos 20 anos de idade. Apesar de a idade de início ser menor nas mulheres do que nos homens, o histórico é semelhante: crônica com remissões intermitentes. Em um estudo epidemiológico, 39% dos pacientes afirmaram ter experimentado remissões de 1-54 anos. Foi descoberto que na Europa o índice geral de prevalência da psoríase juvenil é ∼0,7%, com aumento de 0,37-0,55% dos 0-9 anos de idade, e 1,01-1,37% dos 10-19 anos de idade. A psoríase em placas é a forma mais frequente da doença nas crianças, seguida pela psoríase gutata. Etiologia Fatores Genéticos Dependendo da série, um histórico familiar positivo foi relatado por 35% a 90% dos pacientes com psoríase. Segundo um estudo com um levantamento amplo realizado na Alemanha, se os dois pais tivessem psoríase, o risco dos filhos desenvolverem psoríase era 41%, mas se apenas um dos pais fosse afetado, o risco era 14%; o risco era 6% se apenas um irmão tivesse psoríase. A análise de índices de concordância entre gêmeos monozigóticos e dizigóticos é outro método de avaliação da influência dos fatores genéticos sobre uma doença. Farber e Nall revisaram os dados publicados de estudos de psoríase com pares de gêmeos e relataram que há um risco duas a três vezes maior de psoríase em gêmeos monozigóticos em comparação com gêmeos dizigóticos, o que significa que os fatores genéticos são importantes. A distribuição das lesões, a gravidade e a idade de início foram similares nos pares de gêmeos monozigóticos, mas diferiram nos pares de gêmeos dizigóticos. Essa observação sugere que os fatores genéticos também desempenham um papel no curso clínico da psoríase. Estudos HLA Os antígenos de histocompatibilidade (HLA) são antígenos de superfície nas células humanas, e a região cromossomática correspondente é denominada complexo principal de histocompatibilidade (MHC). Situa-se no braço mais curto (p) do cromossomo 6. A psoríase está associada ao HLA-Cw6; a presença de HLA-Cw6 confere um risco relativo de 13 para o desenvolvimento de psoríase na população branca, e 25 para a japonesa. HLA-Cw6 está fortemente ligado à idade de início da psoríase. Em uma das séries, o HLA-Cw6 foi expresso em 90% dos pacientes com psoríase com início precoce, e apenas em 7% da população de controle. É possível que um antígeno MCH específico, classe II (DRB1*0701/2), também esteja relacionado à psoríase de início precoce; os alelos HLA associados à psoríase geralmente estavam em um haplótipo estendido: Cw6-B57-DRB1 *0701- DQA1 *0201-DBQ1 *030314. Foi descoberto que os indivíduos com esse haplótipo apresentam risco 26 vezes maior de desenvolvimento de psoríase de início precoce. Por isso, alguns clínicos designaram pacientes com psoríase de início precoce, histórico Dermatologia: psoríase Igor Mecenas familiar positivo para psoríase e expressão de HLA- Cw6 como portadores de psoríase tipo I, e aqueles com início tardio da doença, sem histórico familiar e falta de expressão de HLA-Cw6 como portadores de psoríase tipo II. Outros alelos podem estar associados a diversas variantes de psoríase e a doenças relacionadas. O alelo HLA-B27, por exemplo, é um marcador da psoríase associada à sacroileíte e à artrite reativa. Associação genômica ampla As análises clássicas de ligação genômica ampla identificaram ao menos nove regiões suscetíveis à psoríase (PSORS1-9) em diversos locais nos cromossomos. A região genética mais importante é, sem dúvida, a PSORS1 (no cromossomo 6p), que, segundo estimativas, é responsável por até 50% do risco de psoríase. O PSORS1 contém genes como HLA-C (com o alelo para risco HLACw6) e corneodesmosina (CDSN). Dado o elevado desequilíbrio de ligação em PSORS1 (isto é: os genes dessa região são herdados em bloco), é difícil determinar quais genes de PSORS1 contribuem para a patogênese da psoríase. Recentemente, graças aos estudos de ampla associação genômica (GWAS), o pilar genético da psoríase é melhor entendido. No GWAS, centenas de milhares de polimorfismos de nucleotídeo único (SNP) em todo o genoma humano são examinados em milhares de pacientes. Os genes que foram associados à psoríase por meio desse e de outros métodos estão resumidos na Tabela: Várias conclusões sobre os fatores genéticos da psoríase podem ser traçadas com base em GWAS recente. Primeiro, a maioria dos genes envolvidos tem funções imunorrelacionadas, o que ressalta a importância dos sistemas imunológicos inato e adaptativo na patogênese da psoríase; por outro lado, relativamente poucos genes que codificam proteínas específicas para a pele foram associados à psoríase. Segundo, até o momento, foram identificadas surpreendentemente poucas interações entre as variantes genéticas (exceto HLA-Cw6 e ERAP-1). Terceiro, genes associados codificam proteínas com funções particularmente imunológicas e caminhos de sinalização, especialmente os que envolvem fator de necrose tumoral, NF-kB, interferons (IFN) e interleucinas (IL)-23/Th17. Por último, o gene ERAP1 codifica uma aminopeptidase que participa do processamento do antígeno MHC de classe I e está associada ao risco de psoríase apenas em indivíduos portadores do alelo de risco HLA-Cw6, o que fornece evidências quanto à função de um antígeno MHC-restrito e sua apresentação através de HLA-C na patogênese da psoríase. Estudos genômicos funcionais A tecnologia de microarranjo foi usada para obter um panorama abrangente dos genes expressados na pele psoriática. Foi descoberto que mais de 1.300 genes eram expressos de forma diferenciada quando comparados à pele humana normal. Esse grupo de genes incluía marcadores conhecidos de psoríase na pele, mas também continha muitos genes que não sabidamente tinham expressão na pele. Essas análises confirmaram o conhecido envolvimento, em escala genômica, das células T (DCs), fornecendo evidências da ativação de células T crônicase persistência na epiderme psoriática. A comparação baseada em microarranjo entre transcriptoma de pele lesionada de pacientes com psoríase e dermatite atópica revelou diferenças não apenas na expressão dos genes com função imune, mas também nos genes expressados por queratinócitos. Por exemplo, proteínas antimicrobianas derivadas da pele foram expressas em níveis elevados na pele psoriática, porém em níveis baixos na pele acometida por dermatite atópica. Patogênese Como afeta primariamente a epiderme interfolicular, durante muito tempo a psoríase foi considerada uma doença epidérmica, na qual a imperfeição bioquímica ou celular encontrava-se no queratinócito. Assim, antes dos anos 1980, muitos mediadores biomecânicos, enzimas e vias envolvidas na função epidérmica foram apontados como sendo anômalos na psoríase. Apesar de anomalias imunológicas associadas terem sido relatadas no final dos anos 1970, uma importante mudança de paradigma ocorreu quando se descobriu que agentes supressores da célula T, como ciclosporina, acarretavam melhora significativa na psoríase. Nas duas últimas décadas, a psoríase tem sido considerada uma doença induzida pelas células T. Quanto à função dos subconjuntos de linfócitos e citocinas envolvidos na quimiotaxia, a orientação e a ativação das células inflamatórias têm sido muito pesquisadas, o que vem colaborando com o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas. Apesar de a psoríase ser vista como doença autoimune, até o momento nenhum autoantígeno verdadeiro foi definitivamente identificado. Imunopatogênese A associação de psoríase a alelos MHC específicos, tais como HLA-Cw6, e (nos indivíduos portadores desses alelos) variantes do gene ERAP1 que codifica uma aminopeptidase que participa do processamento de antígenos, sugere fortemente uma função patogênica das células T e células apresentadoras de antígenos. A presença de subconjuntos específicos de células T na epiderme e na derme da pele lesionada está bem documentada. Ademais, foi descoberto que vários compostos que afetam a função da célula T (p. ex., direcionado ao receptor IL-2, CD2, CD11a e CD4) acarretam melhora clínica da psoríase. Outro argumento de apoio ao envolvimento do sistema imunológico adaptativo é o desaparecimento ou desenvolvimento de psoríase após o transplante de células-tronco hematopoiéticas. Além disso, a análise de células T lesionadas mostrou oligoclonalidade, indicando potencial expansão antígeno-específica de subpopulações de células T, possivelmente desencadeada por antígenos virais ou micróbios exógenos ou autoantígenos em reação cruzada (p. ex ., queratina). A ocorrência de fatores desencadeantes ambientais em indivíduos com predisposição genética, portadores de alelos de susceptibilidade de genes associados à psoríase acarreta o desenvolvimento da doença. 1. Queratinócitos estressados podem liberar DNA e RNA próprio que formam complexos com catelicidina LL37, que, então, induz a produção de IFN-α por células dendríticas plasmocitoides (pDCs; recrutados na pele via quemerina liberada por fibroblasto), ativando assim as DCs dérmicas (dDCs). IL-1β, IL-6 e TNF-α derivados de queratinócitos também contribuem para a ativação de dDCs. 2. As dDCs ativadas migram para os linfonodos de drenagem cutânea apresentando-se como um até então desconhecido antígeno para as células T naive e (pela secreção de diversos tipos de citocinas pelas DCs) promovendo sua diferenciação em células Th1, Th17 e Th22. • Th1: Expressam antígeno linfocitário cutâneo (CLA), receptor 3 de quimiocina CXC (CXCR3) e receptor 4 de quimiocina CC (CCR4); • Th17: expressam CLA, CCR4 e CCR6; • Th22: expressam CCR4 e CCR10. 3. As células Th1, Th17 e Th22 migram pelos vasos sanguíneos e linfáticos para a derme psoriática, atraídos por citocinas CCL20, CXCL9- 11 e CCL17 derivadas de queratinócitos; isso leva à formação da placa psoriática. • Células Th1 liberam IFN-γ e IFN-α, que amplificam a cascata inflamatória atuando nos queratinócitos e dDCs. • Células Th17 secretam IL-17A e IL-17F (e também IFN-γ e IL-22), que estimulam a proliferação de queratinócitos e a liberação de β-defensina 1/2, S100A7/8/9 e das quimiocinas CXCL1, CXCL3, CXCL5 e CXCL8 recrutadoras de neutrófilos. • Células Th22 secretam IL-22, que induz à liberação adicional de quimiocinas recrutadoras de células T derivadas de queratinócitos. 4. Os neutrófilos infiltram o estrato córneo e produzem espécies reativas de oxigênio (ROS) e α-defensina com atividade antimicrobiana, assim como CXCL8, IL-6 e CCL20. Além disso, DCs inflamatórias (iDCs) produzem IL-23, radicais de óxido nítrico (NO) e TNF-α, enquanto as células NK liberam TNF-α e IFN-γ. 5. Os queratinócitos também liberam fator de crescimento endotelial (VEGF), fator de crescimento de fibroblastos básicos (bFGF) e angiopoietina (Ang), promovendo assim a neoangiogênese. 6. A quimiocina CCL19 derivada de macrófago promove o agrupamento das células Th que expressam o receptor CCR7 de quimiocina com DC na proximidade dos vasos sanguíneos, com ativação adicional de célula T. Na junção dermoepidérmica, células T citotóxicas CD8+ de memória (Tc1) expressando antígeno 1 muito tardio (VLA-1) unem-se ao colágeno IV permitindo a entrada na epiderme e contribuindo com a patogênese da doença pela liberação das citocinas Th1 e Th17. 7. O cross-talk entre queratinócitos produz TNF-α, IL-1β e TGF-β e fibroblastos, que por sua vez liberam fator de crescimento de queratinócitos (KGF), fator de crescimento epidérmico (EGF) e TGF-β, e, possivelmente, células Th22 que liberam FGFs, contribuindo para a reorganização do tecido e deposição da matriz extracelular (p. ex., colágeno, proteoglicanos). Fatores Desencadeantes Externos O fenômeno de Koebner, ou seja, o desencadeamento por injúria à pele, é observado em aproximadamente 25% dos pacientes com psoríase. Um paciente específico pode ser “negativo para Koebner” em dado momento e mais tarde tornar-se “positivo”. O fenômeno de Koebner sugere que a psoríase é uma doença sistêmica que pode ser desencadeada no âmbito local, na pele. Lesões psoriáticas também podem ser induzidas por outras formas de injúria cutânea, como queimaduras solares, erupções morbiliformes por fármacos, exantema viral. O tempo decorrido entre o trauma e o aparecimento de lesões cutâneas costuma ser de 2 a 6 semanas. Sistêmicos Infecções Infecções, particularmente as bacterianas, podem desencadear ou agravar a psoríase. Infecções que a provocam foram observadas em até 45% dos pacientes com psoríase. Infecções estreptocócicas, principalmente faringite, são as agressoras mais comuns. Os estreptococos também podem ser isolados em outros locais, como em abcessos dentários, celulite perianal, impetigo. HIV A infecção por HIV também agrava a psoríase. Fatores endócrinos Foi relatado que a hipocalcemia é um fator desencadeante da psoríase pustular generalizada. Apesar de análogos ativos da vitamina D3 melhorarem a psoríase, não foi demonstrado que níveis anômalos de vitamina D3 induzem a psoríase. A gravidez pode alterar a atividade da doença; 50% das pacientes de uma série relataram melhora. Porém, mulheres grávidas podem desenvolver psoríase pustular, também denominada impetigo ou impetigo herpetiforme, algumas vezes em associação com hipocalcemia. Estresse psicogênico O estresse psicogênico é um fator desencadeante sistêmico bem definido na psoríase. Está associado às apresentações iniciais da doença e também a flares de psoríase preexistente. Em um estudo prospectivo, padrões cognitivos e comportamentais de preocupação e coceira estavam relacionados de modo independente ao aumento da gravidade da doença e do prurido 4 semanas depois. Fármacos Diversos fármacos foram incriminados como indutores de psoríase, especialmente lítio, IFN, β-bloqueadores e antimaláricos. A redução rápida de corticosteroidessistêmicos pode acarretar psoríase pustular, além de flares de placas psoriáticas. Consumo de álcool, fumo e obesidade Obesidade, consumo elevado de álcool e fumo estão associados à psoríase. Em uma análise, o fumo pareceu ter um papel no início da psoríase, enquanto a obesidade pareceu ser uma consequência da psoríase; no entanto, outros estudos sugeriram que é comum o ganho de peso preceder o desenvolvimento da psoríase. Em alguns estudos foi descoberto que a prevalência da psoríase em uma população de indivíduos que pararam de fumar ou que perderam peso reverteu, eventualmente, aos níveis anteriores. Quadro Clínico Do ponto de vista clínico, a psoríase pode apresentar- se com uma ampla gama de manifestações cutâneas. Em dado momento, variantes diversas podem coexistir em um indivíduo específico, mas todas as lesões cutâneas compartilham os mesmos traços característicos: eritema, espessamento e escamas. Apesar de o tamanho da lesão poder variar de pápulas diminutas a pápulas com mais de 20 cm de diâmetro, o contorno da lesão é, em geral, circular, oval ou policíclico (indica que a lesão decorre de várias unidades menores). A configuração das lesões psoriáticas decorrentes do fenômeno de Koebner reflete a etiologia do trauma. Além da demarcação peculiar característica, as lesões psoriáticas são, algumas vezes, rodeadas por um anel esbranquiçado, denominado anel de Woronoff. Os achados clássicos de eritema, espessamento e escamas refletem as descobertas histológicas de capilares dilatados alongados próximos à superfície da pele, acantose epidérmica mais infiltrados celulares, e queratinização anômala, respectivamente. Se as escamas superficiais esbranquiçadas e prateadas são removidas por curetagem (método de raspagem) é observada uma coerência característica, como se o indivíduo tivesse raspado em cera (signe de la tache de bougie). Subsequentemente é observada uma membrana superficial que também se desprenderá como um todo. Quando esta é removida observa-se uma superfície úmida, com sangramento diminuto característico. Tal achado, denominado sinal de Auspitz, é o reflexo clínico de vasos alongados nas papilas dérmicas da epiderme suprapapilar. Durante a exacerbação, as lesões psoriáticas costumam coçar. Pápulas diminutas ao redor de placas psoriáticas existentes indicam que o paciente está em uma fase instável da doença. Além disso, as lesões psoriáticas em expansão caracterizam-se por borda ativa com eritema mais intenso. As lesões inflamadas podem ser um pouco mais brandas. Geralmente a involução de uma lesão começa no centro, resultando em lesões psoriáticas anulares. Psoríase Crônica com Placas Na psoríase crônica em placas há uma distribuição relativamente simétrica de placas escamosas, eritematosas, bem definidas. O grau de comprometimento da área corporal pode variar, de limitado a amplo. Couro cabeludo, cotovelos, joelhos e área pré-sacral são os locais mais propensos, tal como mãos e pés. A genitália é acometida em 45% dos pacientes. As placas podem persistir de meses a anos nos mesmos locais. Apesar de ser uma doença crônica, há períodos de remissão completa; foram relatadas remissões de 5 anos em aproximadamente 15% dos pacientes. Como o percentual da superfície corporal acometida não reflete a gravidade das lesões individuais quanto a eritema, enrijecimento e descamação, foi formulado o Índice de Gravidade da Área Afetada pela Psoríase (PASI). Esse é um escore único calculado com base na superfície corporal acometida (usando um escore de sete pontos para o comprometimento de cada uma de quatro áreas anatômicas: cabeça, extremidades superiores, tronco e extremidades inferiores) e em escores de eritema, enrijecimento e descamação (cada um usando um escore de cinco pontos, de 0 a 4). O PASI é um cálculo trabalhoso; é mais aplicado em ensaios clínicos do que no tratamento de rotina de pacientes com psoríase. Também foi proposto um escore para as unhas, conhecido como Índice de Gravidade da Psoríase Ungueal (NAPSI), mas não é amplamente usado. Psoríase Gutata A psoríase gutata é observada mais frequentemente em crianças e adolescentes, sendo frequentemente precedida de infecção no trato respiratório superior. Em mais da metade dos pacientes encontra-se título de estreptozima, anti-DNase B ou antiestreptolisina elevados, indicando uma infecção estreptocócica recente. Psoríase Eritrodérmica Esta variante da psoríase caracteriza-se por eritema generalizado e descamação; começa de forma gradual ou aguda. Apesar de haver muitas causas de eritroderma, o substrato para o diagnóstico de eritroderma psoriático inclui placas prévias em locais clássicos, mudanças características nas unhas, sendo a face poupada. Variantes Pustulares Psoríase Pustular Generalizada Na psoríase pustular generalizada, a infiltração de neutrófilos domina a imagem histológica, enquanto eritema e aparência de pústulas estéreis dominam a imagem clínica. É uma manifestação incomum de psoríase, e os fatores desencadeantes incluem gravidez, diminuição rápida de corticosteroides (ou de outros tratamentos sistêmicos), hipocalcemia, infecções e, quando o padrão é localizado, irritantes tópicos. Recentemente, mutações bialélicas no gene que codifica o antagonista do receptor IL-36 (aumentando a produção de IL-8 e amplificação da resposta a IL-1β) foram identificadas em um subconjunto de pacientes com psoríase pustular generalizada. A psoríase pustular generalizada durante a gravidez também é denominada impetigo herpetiforme. Podem ser observados quatro padrões distintos de psoríase pustular generalizada: • Padrão von Zumbusch: Erupção generalizada de início abrupto, com eritema e pustulação. Nesta fase, a pele fica dolorida, o paciente tem febre e sente-se doente. Após alguns dias, as pústulas costumam desaparecer e observa-se descamação extensa. Algumas vezes, placas crônicas de psoríase (se houver) podem desaparecer. No relato original de caso, elaborado por von Zumbusch (1910), nove episódios de pustulação ocorreram em um período de 10 anos. • Padrão anular: A erupção caracteriza-se por lesões anulares, e há eritema e descamação, com pustulação na borda. As lesões aumentam com expansão centrífuga em um período de horas a dias, enquanto a cura ocorre de forma central. • Tipo exantematoso: Trata-se de uma erupção aguda com pústulas pequenas que aparecem abruptamente e desaparecem em alguns dias. Geralmente ocorre após uma infecção ou pode ocorrer em decorrência da administração de medicamentos específicos, como lítio. Não costuma haver sintomas sistêmicos. Há sobreposição entre esta forma de psoríase pustular e erupções pustulares provocadas por fármacos, também denominadas pustulose exantemática aguda generalizada (PEGA). • Padrão “localizado”: Algumas vezes as pústulas aparecem dentro ou na borda de placas psoriáticas existentes. Isso pode ser observado na fase instável da psoríase crônica de placas e após a aplicação de irritantes, como alcatrão. Pustulose das palmas e solas A pustulose das palmas e solas caracteriza-se por pústulas “estéreis” nas superfícies palmoplantares, mescladas a máculas amarelo- amarronzadas; também podem ser observadas placas eritematosas descamativas. Poucos pacientes apresentam psoríase crônica de placas em outros locais. Ao contrário da história natural da psoríase pustular generalizada, as pústulas permanecem localizadas nas superfícies palmoplantares e a doença é crônica. Infecção focal e estresse foram relatados como fatores desencadeantes, e o fumo pode agravar a doença. A pustulose das palmas e solas é uma das entidades mais comumente associadas a lesões inflamatórias estéreis de ossos, que recebem diversos nomes: osteomielite multifocal recorrente crônica, artro-osteíte pustulótica e síndrome SAPHO (sinovite, acne, pustulose, hiperostose e osteíte). Várias dermatoses neutrofílicas estãoassociadas a SAPHO. Acrodermatite contínua de Hallopeau Esta é uma manifestação rara de psoríase. Clinicamente são observadas pústulas nas porções distais dos dedos das mãos e às vezes dos pés. Em geral, a pustulação é seguida de descamação e formação de crostas. As pústulas também podem se formar no leito ungueal (abaixo da placa ungueal), e pode haver descamação da placa ungueal. Pode ocorrer transição para outras formas de psoríase; a acrodermatite contínua pode ser acompanhada por annulus migrans na língua. Locais Específicos Psoríase do Couro Cabeludo O couro cabeludo é um dos locais mais comuns de ocorrência da psoríase. A menos que haja confluência completa, as lesões individuais são discretas em comparação com as áreas bem definidas de comprometimento na dermatite seborreica. No entanto, algumas vezes não é possível diferenciar dermatite seborreica e psoríase, e as duas doenças podem coexistir. A lesão da psoríase costuma avançar para a periferia da face, áreas retroauriculares e parte superior do pescoço. Às vezes as escamas têm aparência de asbesto e podem estar ligadas, com alguma distância, a fios do couro cabeludo (pitiríase amiantácea). Apesar de a pitiríase amiantácea também ser observada na dermatite seborreica, dermatite atópica de infecção secundária e tinea capitis, a psoríase é a causa mais comum. Eventualmente pode desenvolver-se alopecia nas áreas comprometidas. Ademais, os pacientes com dermatomiosite que compromete o couro cabeludo podem apresentar lesões que se parecem com psoríase. Psoríase Flexural As lesões flexurais caracterizam-se por placas finas, brilhantes, com demarcação clara, de coloração rosa a vermelha. Há muito menos escamas do que na psoríase crônica em placas. Muitas vezes é observada uma fissura central. Os locais mais comumente acometidos são: axilas, prega inguinal, sulco interglúteo, região inframamária e dobra retroauricular. Quando os únicos locais comprometidos são as áreas flexurais, às vezes é usado o termo psoríase “inversa”. Infecções bacteriana, cândida ou dermatofítica localizada podem desencadear a psoríase flexural. Mucosa oral Lesões eritematosas anulares migratórias com escamas brancas hidratadas (annulus migrans) foram observadas em pacientes com acrodermatite contínua de Hallopeau e psoríase pustular generalizada. O local mais comum é a língua, e a aparência clínica (e histológica) é similar à da língua geográfica. Psoríase ungueal Foi relatado o comprometimento da unha em 10% - 80% dos pacientes psoriáticos, dependendo da série. Em geral, as unhas dos dedos das mãos são mais afetadas do que as dos pés. Os pacientes com comprometimento ungueal parecem apresentar maior incidência de artrite psoriática. A psoríase afeta a matriz ungueal, o leito ungueal e o hiponíquio. Pequenos focos de paraqueratose na porção proximal da matriz ungueal acarretam orifícios nas unhas. Leuconiquia e perda da transparência (achados menos comuns) devem-se ao comprometimento da porção medial da matriz. Quando toda a matriz é acometida, observa-se uma unha esbranquiçada, farelenta, com pouca aderência. As alterações psoriáticas do leito ungueal acarretam o fenômeno “mancha de óleo” ou “gota de óleo”, que reflete exocitose dos leucócitos abaixo da placa ungueal. Hemorragias por lascas são o resultado do aumento da fragilidade capilar; hiperqueratose subungueal e onicólise distal devem-se à paraqueratose do leito ungueal distal. A remoção vigorosa do debris subungueal distal pode ser um fator exacerbador. Artrite Psoriática A artrite psoriática ocorre em 5-30% dos pacientes com psoríase cutânea; algumas pesquisas clínicas sugerem que estudos clássicos da artrite psoriática podem ter subestimado a sua prevalência. Na minoria dos pacientes (10% -15%), os sintomas de artrite psoriática aparecem antes do comprometimento da pele. Atualmente não há testes sorológicos específicos para determinar o diagnóstico de artrite psoriática, mas uma característica inconfundível é a alteração erosiva radiográfica que pode ocorrer anos depois do aparecimento da inflamação periarticular. A artrite psoriática é mais prevalente entre os pacientes com psoríase relativamente grave. Os fatores de risco para um curso mais grave da artrite incluem: início em tenra idade, sexo feminino, envolvimento poliarticular, predisposição genética e sinais radiográficos da doença desde cedo. Classificação de Moll: • Oligoartrite mono e assimétrica: A apresentação mais comum da artrite psoriática é a inflamação das articulações interfalangeanas – tanto distal (AID) quanto prox imal (AIP) das mãos e dos pés. O envolvimento das articulações AIP ou de AID e AIP do mesmo dedo pode acarretar o clássico dedo “em salsicha”. Em comparação com a artrite reumatoide, a articulação metacarpofalangeana (MCP) é um local incomum para a artrite psoriática. Essa forma pode ser acompanhada de inflamação das articulações mais longas. • Artrite das articulações interfalangeanas distais: O envolvimento exclusivo das articulações AID é uma apresentação clássica, porém incomum, da artrite psoriática. Esta variante pode ocorrer junto com o comprometimento da unha contígua. Em alguns pacientes, essas articulações ficam fixas em uma posição flexionada. • Apresentação similar à da artrite reumatoide: As manifestações clínicas consistem em poliartrite sintomática que compromete articulações de tamanho médio, particularmente AIP, MCP, punho, tornozelo e cotovelo. Em geral, os pacientes são soronegativos, mas alguns são positivos para fator reumatoide; é difícil diferenciá-la da artrite reumatoide. Discute-se a possibilidade de sobreposição das duas doenças nos pacientes soropositivos. • Artrite mutilante: Felizmente esta é a variante menos comum da artrite psoriática. Os pacientes apresentam grave inflamação articular de progressão rápida que leva à destruição de articulações e deformidade permanente. Os dedos ficam menores, mais largos e macios à apalpação em virtude da osteólise e de um fenômeno telescópico. Em geral, essa variante pode ser distinguida da artrite mutilante que pode acompanhar a reticulo-histiocitose multicêntrica. • Espondilite e sacroileíte: A espondilite lembra a observada na espondilite anquilosante, com artrite axial, além de comprometimento dos joelhos e articulações sacroilíacas; em muitos pacientes as articulações periféricas também são acometidas. Em geral, os indivíduos são positivos para HLA- B27, podendo apresentar doença inflamatória intestinal e/ou uveíte. Nos pacientes com artrite psoriática pode haver comprometimento dos tendões justa-articulares e dos locais de sua inserção no osso (entesite), além de edema nos dedos das mãos (dactilite). Há relato de entesite e dactilite em ∼20% e 15-30%, respectivamente, dos pacientes com artrite psoriática “provável” ou definida. O diagnóstico precoce da artrite psoriática é importante porque, frequentemente, a progressão da doença acarreta perda de função. Diagnóstico O diagnóstico de placa psoriática crônica pode ser feito pelo exame físico na vasta maioria dos pacientes. Uma biópsia de pele pode ajudar em casos desafiadores, mas não é normalmente necessária. Não existem testes laboratoriais que confirmem o diagnóstico e a testagem genética não é usada para o diagnóstico de psoríase. Um exame completo da pele que inclui o exame do couro cabeludo, unhas e pele anogenital deve ser oferecido a pacientes com suspeita de placa psoriática crônica. Achados de suporte incluem placas inflamadas, bem demarcadas, crônicas, em escala grosseira, particularmente quando envolvem couro cabeludo, orelhas, cotovelos, joelhos e cicatriz umbilical. O reconhecimento da doença ungueal característica ou psoríase inversa na linha interglútea ou em outros locais pode dar suporte ao diagnóstico de psoríase em casos difíceis. Perguntas sobre o histórico familiare exposição a medicações que podem induzir ou exacerbar a psoríase ajudam o diagnóstico. Patologia Lesões Papuloescamosas Lesão inicial Na lesão inicial, ou seja, uma pápula do tamanho de uma cabeça de alfinete, as características histopatológicas ainda não são diagnósticas. Observa- se um infiltrado perivascular superficial de linfócitos e macrófagos na derme, além de edema papilar e dilatação dos capilares. Nas lesões gutatas eruptivas agudas a desgranulação de mastócitos é uma característica constante. Ocorre acantose epidérmica branda sem paraqueratose, e os queratinócitos parecem edemaciados. Macrófagos (detectados por coloração de CD68) e linfócitos surgem de modo focal na epiderme, e pode ser observada alguma espongiose da epiderme nesses locais. Evidências substanciais indicam que neutrófilos não são detectados nesta fase precoce. Lesão ativa Uma lesão gutata completamente desenvolvida na orla de uma placa psoriática em expansão é denominada “lesão ativa”. Os achados histopatológicos de uma lesão ativa são diagnósticos de psoríase. Na derme, os capilares aumentam em número e tamanho, e têm aparência tortuosa. Observa-se edema marcado, especialmente no topo das papilas. Há infiltrado perivascular misto com linfócitos, macrófagos e neutrófilos; há linfócitos e neutrófilos que migraram para a epiderme. A epiderme é acantótica com acúmulo focal de neutrófilos e linfócitos. Nesses locais a epiderme pode ser esponjosa. Sobre tais focos há ausência de camada granular e o estrato córneo ainda contém núcleos achatados (paraqueratose). O acúmulo de neutrófilos dentro de uma pústula espongiótica é denominado “pústula espongiforme de Kogoj”, e o acúmulo de neutrófilos remanescentes no estrato córneo, rodeados por paraqueratose, é denominado “microabscesso de Munro”. Esses dois achados são patognomônicos para psoríase e PEGA. Lesão estável Na derme, os capilares são alongados e tortuosos, estendendo-se para cima e para dentro de papilas dérmicas claviformes; apenas uma pequena placa suprapapilar de células epidérmicas cobre a ponta dessas papilas dérmicas. Essa micromorfologia explica o fenômeno de Auspitz. É observado um modesto infiltrado perivascular que consiste primariamente em linfócitos e macrófagos. A lesão psoriática é heterogênea, com áreas ativas (pontos quentes) e áreas crônicas inespecíficas (pontos frios). É nesse momento que a hiperproliferação da epiderme alcança o seu padrão característico. Os cones epiteliais são alongados e têm aparência retangular. Alguns cones epiteliais aglutinam-se na base. A camada dura apresenta focos paraqueratósicos com ausência de estrato granuloso. Em algumas lesões podem ser observadas micropústulas de Kogoj e microabscessos de Munro. Psoríase pustular A característica predominante da psoríase pustular é o acúmulo de neutrófilos. Muitos neutrófilos se acumulam entre fitas eosinofílicas de queratinócitos. No estrato córneo são observados grandes acúmulos de neutrófilos rodeados por paraqueratose. Em decorrência disso, na psoríase pustular, são observadas enormes pústulas espongiformes de Kogoj e microabscessos de Munro, que são marcas histológicas da psoríase “ativa”. Diversos Na artrite reativa (anteriormente denominada doença de Reiter), os achados histológicos cutâneos são semelhantes aos descritos para a psoríase. Pústulas espongiformes podem ser observadas nas lesões palmoplantares. Na doença de Sneddon-Wilkinson, as pústulas subcorneanas são o achado característico. Tratamento O tratamento do paciente psoriático precisa focalizar não apenas a pele, mas também as comorbidades existentes e as que possam se desenvolver. Um regime de tratamento adequado para um paciente específico é selecionado a partir da medicação sistêmica e tópica disponível, além de fototerapia. Em estudos clínicos costumam ser avaliados agentes únicos, mas na prática a maioria dos pacientes precisa de tratamento combinado. Até o momento, nenhum tratamento demonstrou curar a doença, por isso é aconselhada orientação psicológica ao paciente e à família sobre a evolução da doença e as estratégias de tratamento. O tratamento da psoríase precisa ser individualizado, levar em consideração o grau da psoríase e seus efeitos na qualidade de vida do paciente, os benefícios prováveis e os efeitos colaterais em potencial de tratamentos específicos. A natureza crônica da psoríase requer uma abordagem de longo prazo que evite “curas” de curto prazo que podem resultar em um estágio mais reativo da doença. Tratamento Tópico Análogos da vitamina D3 Na epiderme hiperproliferativa, a vitamina D3 inibe a proliferação epidérmica e induz à diferenciação normal pelo aumento da formação de envelope cornificado e ativação da transglutaminase; ela também inibe diversas funções neutrofílicas. Devido à eficácia terapêutica e toxicidade limitada, calcipotriene (calcipotriol) e outros análogos de vitamina D3 tornaram-se o tratamento de primeira linha para a psoríase. Foi demonstrado que a monoterapia com calcipotriene acarreta redução de ∼60% do PASI após 8 semanas de tratamento, mas, em geral, o uso prático nos pacientes com psoríase envolve tratamento combinado com corticosteroides tópicos. Observou-se que a combinação de calcipotriene e dipropionato de betametazona (fórmula em unguento) proporciona redução de ∼70% do PASI e ∼70% de melhora/doença mínima nos pacientes com psoríase no couro cabeludo (fórmula em gel). Corticosteroides Desde que começaram a ser usados, no início dos anos 1950, os corticosteroides tópicos tornaram-se o principal tratamento da psoríase. Em geral são a primeira linha de tratamento na psoríase branda a moderada e em locais como flexuras e genitália, onde outros tratamentos tópicos podem provocar irritação. Os corticosteroides são fabricados em vários veículos, de unguento, creme e loção, a gel, espuma e xampu; em geral as formulações em unguento são as mais eficazes. Com o passar dos anos, as propriedades anti-inflamatórias dos corticosteroides tópicos foram aprimoradas com o aumento de sua lipofilicidade, mascarando os grupos hidrofílicos hidroxi-16 ou 17 ou com a introdução de acetonidos, valeratos ou proprionatos. A aplicação com oclusão plástica ou hipocoloidal também aumenta significativamente a penetração. Foi demonstrado que a aplicação uma vez ao dia é tão eficaz quanto a aplicação duas vezes ao dia, e que remissões de longo prazo podem ser mantidas com aplicações em dias alternados. Ao menos 80% dos pacientes tratados com corticosteroides tópicos de alta potência experimentam liberação. De fato, a melhora máxima costuma ser alcançada em 2 semanas. Com o tratamento de manutenção, que consiste em 12 semanas de aplicações intermitentes de unguento de dipropionato de betametazona (restrito aos fins de semana), 74% dos pacientes continuaram em remissão, em comparação com 21% dos pacientes que receberam unguento placebo. Infelizmente não há dados disponíveis sobre a eficácia do tratamento prolongado por mais de 3 meses. Como taquifilaxia e/ou rebote podem ocorrer muito depressa, ou seja, em poucos dias ou algumas semanas, regimes de tratamento intermitente (ou seja, uma vez a cada 2 ou 3 dias, ou nos fins de semana) são recomendados para tratamentos mais prolongados. O tratamento tópico combinado pode aproveitar a vantagem do efeito rápido dos corticosteroides assim como os benefícios prolongados dos análogos tópicos de vitamina D3, antralina ou retinoides. Antralina A antralina (ditranol, cignolina, 1,8-di-hidróxi-9-antrona) está disponível desde 1916; ainda é usada no tratamento da psoríase, apesar de ter sido mais usada no passado. Ela apresenta efeitos epidérmicos marcantes, inclusive efeito anti-hiperproliferativo. A antralina também inibe a proliferação do linfócito T induzido por mitógenos e a quimiotaxia neutrofílica. Na Europa e em outras regiões fora dos EstadosUnidos, é mais frequentemente usada em centros de tratamento-dia e em pacientes hospitalizados. Na experiência dos autores, a liberação total da psoríase em ao menos 80% dos pacientes ocorre em 3-5 semanas de tratamento naqueles pacientes internados ou em tratamento-dia. Retinoide tópico Apesar do ácido all-trans-retinoico e do ácido 3-cis- retinoico serem eficazes no tratamento da acne, não são eficazes no tratamento da psoríase. Porém, tazaroteno tópico, um retinoide acetileno que liga de forma seletiva o receptor de ácido retinoico (RAR)-β e RAR-γ, pode ser usado para tratar psoríase. Foi demonstrado que tazaroteno diminui a proliferação epidérmica e inibe e diferenciação associada à psoríase (p. ex., expressão de transglutaminase e expressão de queratina 16). É fabricado em formulações em creme e em gel, devendo ser aplicado uma ou duas vezes ao dia. Dada a sua eficácia modesta em monoterapia, geralmente é prescrito como tratamento de segunda linha. A irritação cutânea pode limitar o uso de tazaroteno; prurido, queimação, irritação e eritema foram observados em até 23%, 18%, 9% e 8% dos pacientes, respectivamente. Por isso, o tratamento combinado com corticosteroides tópicos é útil. A maior área que pode ser tratada com tazaroteno é 10-20% da superfície corporal, e há dados de segurança disponíveis para até 1 ano de tratamento. A eficácia e a segurança do tezaroteno em monoterapia foram pesquisadas em vários estudos. Após 6 semanas de tratamento foi observada melhora de ao menos 50% (em comparação com a linha de base) em 45% dos pacientes que usaram tezaroteno 0,05% em gel, duas vezes ao dia, em comparação com 13% dos pacientes que usaram placebo em gel. Tratamentos tópicos adicionais Quando as placas de psoríase apresentam escamas espessas, precisam ser reduzidas para aumentar a penetração da medicação tópica e da luz ultravioleta (UV). As opções incluem banho em água salgada, ácido salicílico tópico e retinoides orais. O ácido salicílico 5-10% apresenta efeito ceratolítico substancial e, no caso de psoríase do couro cabeludo, o ácido salicílico pode ser formulado em óleo ou unguento. A aplicação de ácido salicílico em áreas localizadas pode ser feita diariamente; porém, em áreas mais amplas, é preferível a aplicação duas a três vezes por semana para evitar intoxicação sistêmica, principalmente em crianças ou em pacientes com função renal reduzida. O alcatrão de hulha apresenta uma gama de ações anti-inflamatórias, sendo eficaz como antipruriginoso. Apesar de o alcatrão de hulha cru ser o alcatrão mais eficiente disponível para o tratamento da psoríase, também é usado um produto destilado, o liquor carbonis detergens (LCD). Dado o seu potencial mutagênico, o alcatrão é contraindicado a mulheres grávidas e lactantes. No entanto, as diretrizes para o uso de produtos com alcatrão podem diferir conforme o país. Os inibidores de calcineurina são usados no tratamento de psoríase flexural e facial. Estudos randomizados, controlados por placebo, demonstraram segurança e eficácia para esta indicação. Foto(quimio)terapia e Medicação Sistêmica Várias organizações dermatológicas elaboraram diretrizes baseadas em evidências para o tratamento de psoríase com foto(quimio)terapia e com medicamentos clássicos. Foto(quimio)terapia A foto(quimio)terapia é o pilar no tratamento de psoríase moderada a grave. A fototerapia com ultravioleta B (UVB) de espectro estreito e amplo e a foto(quimio)terapia com ultravioleta A (UVA) após a ingestão ou aplicação tópica de psoraleno são opções clássicas de tratamento. Na década de 1970 foi comprovado que a monoterapia em doses eritematogênicas de UVB banda larga é uma abordagem eficaz; posteriormente foi desenvolvida a UVB banda estreita (311-313 nm), que é a melhor radiação disponível atualmente. O excimer laser em 308 nm pode ser usado no tratamento de um número limitado de placas em pacientes com doença localizada. Metotrexato Em 1971, ametopterina (metotrexato; MTX) foi aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos como tratamento para psoríase. O efeito de MTX nos linfócitos circulantes e cutâneos é uma explicação provável para sua atividade antipsoriática. O MTX é um tratamento sistêmico de primeira linha para psoríase, altamente eficaz na doença grave e em todas as variantes clínicas da psoríase. Na psoríase crônica em placas, observa-se melhora inicial entre 1 e 7 semanas, e a melhora máxima é esperada entre 8-12 semanas de tratamento. MTX é administrado semanalmente, em geral em dose oral única (mas eventualmente intramuscular ou subcutânea) e menos frequentemente a cada 12 horas em três doses semanais; a dosagem máxima costuma ser de 25 mg. Efeitos colaterais em potencial restringem o uso na doença moderada a grave resistente a tratamento tópico e foto(quimio)terapia e/ou em situações nas quais há contraindicação. O uso de suplementação de ácido fólico durante a administração de MTX é controverso devido à preocupação de o ácido fólico poder diminuir a eficácia do MTX. As diretrizes para o uso de MTX variam conforme o país e o estado da doença. Ciclosporina Ciclosporina é um undecapeptídeo cíclico que foi isolado no fungo Tolypocladium inflatum por Gams, em 1970. Com base em grandes estudos controlados, verificou-se que a ciclosporina é um tratamento muito eficiente nas manifestações graves de psoríase. Como inibidor de calcineurina, impede que a ativação do linfócito T seja traduzida na liberação de citocinas efetoras, como IL-2. A ciclosporina pode ser usada com segurança, desde que as diretrizes sejam seguidas na íntegra. Dados os seus efeitos nefrotóxicos (p. ex., redução do índice de filtração glomerular, atrofia tubular) a ciclosporina deve ser administrada em cursos de vários meses (p. ex., no máximo 1 ano, apesar de a duração ainda ser uma questão em discussão) e alternada com outros tratamentos. Uma alternativa é um cronograma intermitente usando vários cursos curtos com algumas semanas de duração. A ciclosporina pode acarretar melhora muito rápida da psoríase, mas isso precisa ser equilibrado com a exigência de um tratamento adequado de substituição em virtude da necessidade de interromper o tratamento com ciclosporina. Um aspecto importante é a avaliação da função renal, e o clearance de creatinina deve ser estimado com o uso da fórmula de Cockroj-Gault. Nos pacientes idosos e nos pacientes com histórico de hipertensão, há maior risco de comprometimento renal e hipertensão. Foi relatado que nos pacientes psoriáticos o tratamento com ciclosporina aumenta a frequência de CCEs, principalmente naqueles previamente tratados com PUVA. O mecanismo subjacente não é mutagênese, mas a diminuição da imunovigilância cutânea. Deve-se observar que os pacientes psoriáticos que foram expostos a elevadas doses cumulativas de radiação UV correm o risco de desenvolvimento de malignidade cutânea. Apesar de a ciclosporina ser um agente imunossupressor não há relato de aumento de infecções graves em pacientes tratados apenas com ciclosporina. Outros efeitos colaterais incluem: desconforto gastrointestinal, hipertricose, parestesia, hiperplasia gengival, cefaleia, vertigem, cãibras musculares e tremor. Os efeitos colaterais metabólicos incluem: hipercalemia, hipomagnesemia, hiperuricemia (devido à diminuição do clearance de ácido úrico) e elevação de colesterol e de triglicerídeos. A eficácia da ciclosporina foi demonstrada em todas as variantes de psoríase (incluindo psoríase ungueal), porém menos para artropatia psoriática. Observa-se melhora em algumas semanas. Em geral, pode-se alcançar redução de 60% -70% do PASI em 4 semanas de tratamento. Durante o tratamento de longo prazo não há sinais de taquifilaxia. Retinoides sistêmicos A acitretina é um tratamento eficiente para psoríase e também para distúrbios de queratinização e lúpus cutâneo. Um problemaimportante com os retinoides sistêmicos é sua teratogenicidade, o que torna a contracepção obrigatória em mulheres em idade fértil durante o tratamento e (dependendo da meia-vida do fármaco) no período de 2 meses a 3 anos após a descontinuação do tratamento. Nos pacientes com psoríase crônica de placas, a dose inicial é 0,5 mg/kg/dia, que pode ser aumentada em função da resposta clínica e dos efeitos colaterais. Na psoríase eritrodérmica a dose inicial é 0,25 mg/kg/dia, e na psoríase pustular a dose deve ser maximizada, ou seja: doses até 1 mg/kg/dia. Nos pacientes com psoríase crônica de placas, a meta é queilite branda (notada apenas pelo paciente), enquanto nos pacientes com psoríase pustular, a meta é uma dose que cause queilite clinicamente aparente, porém tolerável. Na psoríase crônica de placas, a eficácia da acitretina em monoterapia é limitada, sendo que aproximadamente 70% dos pacientes alcançam resposta moderada ou melhor. Em um estudo, 23% dos pacientes tratados com 50 mg/dia de acitretina, durante 8 semanas, obtiveram ≥75% de melhoria no PASI. O tratamento em combinação com foto(quimio)terapia e/ou análogos de vitamina D3 resulta na melhora substancial da resposta clínica. A eficácia terapêutica máxima é alcançada após 2-3 meses. Foi observado que a acitretina é um tratamento de manutenção eficaz. Em monoterapia, a acitretina é muito eficaz na psoríase eritrodérmica pustular. Sua eficácia na psoríase ungueal e na artrite psoriática é apenas modesta. Moduladores imunológicos-alvo No ano 2000 foram introduzidos os tratamentos biológicos no tratamento da artrite psoriática e da psoríase moderada a grave. Seus dois alvos principais são células T e citocinas, incluindo TNF-α e IL-12/23. Apesar de ter sido descoberto que briakinumab (um anticorpo monoclonal humano contra a subunidade p40 da IL-12 e IL-23) apresenta maior eficácia do que metotrexato em pacientes com psoríase em placas moderada a grave, as solicitações de aprovação pela FDA e pela European Medicine Agency (EMEA) foram retiradas por questões de segurança (inclusive possível maior risco de eventos adversos cardiovasculares). Cabe notar que foram desenvolvidas diretrizes, inclusive a European S3- Guidelines, para o tratamento de pacientes psoriáticos com inibidores de TNF-α (adalimumabe, etanercepte e infliximabe) e usterkinumab. Os tratamentos biológicos são indicados a pacientes com psoríase grave e/ou artrite psoriática. Várias diretrizes restringem o seu uso a “pacientes muito necessitados” para os quais todos os outros tratamentos existentes são contraindicados ou acarretaram melhora insuficiente, enquanto alguns pesquisadores divulgaram o parecer de que os tratamentos biológicos devem ser uma opção para os pacientes que não tiveram resposta adequada a um tratamento sistêmico clássico; a última recomendação precisa ser contraposta ao custo elevado da medicação. [UptoDate] Os agentes biológicos disponíveis para psoríase têm excelente eficácia de curto e longo prazo e tolerabilidade favorável. Exemplos incluem etanercept, infliximabe, adalimumabe, ustequinumabe, secuquinumabe, ixequizumabe, brodalumabe, guselcumabe, tildrakizumabe, risanquizumabe e certolizumabe pegol. Itolizumabe é um agente indiano que não está disponível nos EUA. * Os imunobioógicos grifados são citados no Consenso Brasileiro de Psoríase 2020. Outros tratamentos sistêmicos Foi relatado que outros tratamentos sistêmicos são benéficos na gestão da psoríase. Em geral são usados com frequência menor do que os medicamentos previamente descritos e há diferenças regionais quanto ao uso. Referências: BOLOGNIA – Dermatologia 3. Ed. UpToDate