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FISIOPATOLOGIA DA SINDROME NEFROTICA E NEFRITICA POTEGENESE E FISIOPATOLOGIA Envolve mecanismos imunológicos e não imunológicos. Nos não imunológicos, constatou-se proteinúria e glomeruloesclerose após redução de massa renal. No modelo padronizado, tem-se redução 5/6 de massa renal. Com essas manobras, instalam-se mecanismos de hiperfunção compensatória na massa renal remanescente, visando à compensação da função renal global. Tais mecanismos são eficazes em curto prazo, porém, ao longo do tempo, seus efeitos benéficos se dissipam, instalando-se progressiva e inexorável perda da função renal. MECANISMO HEMODINÂMICO DE LESÃO Entre os determinantes da filtração por néfron, estão: fluxo plasmático glomerular, pressão no capilar glomerular, coeficiente de ultrafiltração do capilar glomerular e pressão oncótica sistêmica. Estudos mostram que o fator mais importante para a progressão da doença renal é o aumento da pressão no capilar glomerular. Na maioria dos modelos que assim evoluem, a hipertensão intraglomerular pode ser atribuída à diminuição da resistência na arteríola aferente glomerular, com manutenção da resistência em eferente acompanhada, na maioria dos casos, de aumento da pressão arterial sistêmica. Esse mecanismo é comprovado por manobras terapêuticas que reduzem a ação da angiotensina intrarrenal e que conseguem prolongar a função renal por um tempo mais longo. No entanto, outros sistemas vasoativos ainda pouco estudados devem ser lembrados na patogênese da doença renal, como prostaglandina, endotelina, óxido nítrico etc. Em resumo, a pressão no capilar glomerular parece ser fator dominante envolvido na sua lesão não imunológica. MECANISMOS CELULARES DE LESÃO Estudos comprovam que o aumento da pressão do capilar glomerular induz lesão esclerótica progressiva. Células mesangiais submetidas a estiramento proliferam e aumentam a produção de elementos da matriz, como colágeno, laminina e fibronectina. Por outro lado, o aumento da pressão do capilar glomerular desencadeia alterações do podócito que resultam cm sua disfunção, perda de vitalidade, apoptose e perda de adesão à membrana basal. Essas áreas de membrana desnuda vistas ao microscópio eletrônico tomam-se importantes sítios de passagem de proteínas, predispondo à lesão histológica caracterizada por dilatações aneurismáticas, sinéquias e esclerose que se somam às lesões iniciais que desencadearam a doença renal. A proteinúria, por si só, pode ser lesiva ao podócito, ao mesângio e à célula tubular proximal. A correlação de proteinúria com progressão de lesão é nítida na maioria das patologias glomerulares, a ponto de ser o mais forte marcador de sua progressão. MECANISMO DE LESÃO IMUNOLÓGICA Cerca de metade das glomerulopatias primárias têm em sua patogênese envolvimento imunológico, sendo chamadas de glomerulonefrites imunomediadas. Nesses casos, a deposição de autoanticorpos no tufo glomerular pode ser o mecanismo dominante, como na nefrite lúpica, porém em outros predominam os mecanismos celulares, inclusive com ausência de deposição de imunoglobulinas, como nas glomerulonefrites pauci-imunes. ANTICORPOS NEFRITOGÊNICOS Os mecanismos fundamentais envolvidos na deposição de anticorpos no glomérulo podem ser decorrentes de: - Deposição de complexos imunes circulantes previamente formados, como em doenças de imunocomplexos. - lmunocomplexos formados in situ no glomérulo por interação de anticorpos circulantes e antígenos externos ai plantados. - Deposição no glomérulo de autoanticorpos circulantes reativos a autoantígenos originados a partir de modificações estruturais do glomérulo normal. Pacientes com nefrite lúpica e glomérulo nefrite pós-estreptocócica mostram deposição de imunocomplexos em que a patogênese envolvida é a do anticorpo circulante reativo a um antígeno plantado no glomérulo. Em pacientes com nefropatia por IgA, o autoanticorpo está dirigido a antígenos expressos em células mesangiais. O local de deposição dos anticorpos dentro do glomérulo é determinante crítico da apresentação clinicopatológica da glomerulonefrite. Antígenos com carga negativa são repelidos pela membrana basal glomerular, que é carregada negativamente. Sua localização preferencial é nas regiões subendoteliais, onde desencadeiam resposta inflamatória aguda intensa com infiltração de leucócitos e plaquetas e liberação hematogênica de mediadores inflamatórios. Antígenos relativamente catiônicos tendem a permear a membrana basal glomerular e depositam-se nela ou em espaços subepiteliais. A resposta inflamatória então desencadeada é pouco intensa, com pequeno infiltrado celular, porém com grande alteração da permeabilidade glomerular e da proteinúria. RECRUTAMENTO DE CELULAS INFLAMATORIAS E MEDIADORES DE LESÃO CELULAR As propriedades biológicas das imunoglobulinas formadoras dos depósitos, interagindo com os antígenos, influenciam na gravidade da lesão, uma vez que algumas imunoglobulinas (p. ex., IgG) têm maior capacidade de fixar complemento que outras (lgA). A extensão da lesão tecidual depende, além da quantidade de imunocomplexos depositados, de fatores ligados ao consumo de complemento e fatores quimiotáticos. Uma vez depositado o imunocomplexo no rim, ocorre ativação das primeiras frações do complemento (C3a e C5b), com consequente quimiotaxia de células inflamatórias, como neutrófilos e monócitos. Linfócitos T também são encontrados no infiltrado inflamatório, contribuindo para a ativação de macrófagos. Citocinas são produzidas pelos macrófagos ativados, além de moléculas de adesão. Há ativação também de células residentes, como células mesangiais que produzem interleucinas e citocinas. Os macrófagos de células mesangiais também podem produzir proteases e oxidantes que promovem a morte celular. Fatores de coagulação ativados causam deposição de fibrina. As glomerulonefrites se apresentam inicialmente com infiltração do tufo glomerular por leucócitos, porém, em uma etapa posterior, apresentam proliferação de células residentes em resposta a fatores de crescimento liberados no local. As células do tufo glomerular com capacidade de proliferação são as endoteliais e as mesangiais. x A inflamação do glomérulo se expressa em diferentes graus de intensidade, correlacionados com o quadro clínico. Algumas doenças são mais expressas com processo inflamatório mesangial - glomerulonefrites proliferativas mesangiais, outras com inflamação predominantemente endotelial -, glomerulonefrite pós-estreptocócica e outras com crescentes. RESOLUÇÃO, RECUPERAÇÃO E PROGRESSÃO A resolução do processo inflamatório com recuperação funcional ocorre em processos inflamatórios agudos, como na glomerulonefrite aguda em criança. A recuperação implica parada na produção de complexos imunes, inibição do recrutamento de células inflamatórias, dissipação dos gradientes de mediadores inflamatórios, restauração da função normal de permeabilidade do endotélio, normalização do tônus vascular e do clearance das células inflamatórias já infiltradas, além das células residentes já proliferadas. Para isso, contribuem alguns fatores locais desencadeados durante a inflamação, como citocinas, particularmente o TGF-beta, que é uma citocina estimulante da produção de matriz extra· celular pelas células glomerulares e um potente estímulo para formação de esclerose. SINDROME NEFRÍTICA A síndrome nefrítica pode ser entendida como sendo o conjunto de sinais e sintomas que surgem quando um indivíduo tem os seus glomérulos renais envolvidos por um processo inflamatório agudo. Esta “inflamação” dos glomérulos pode ocorrer de forma idiopática, como doença primária dos rins, ou ser secundária a alguma doença sistêmica, como infecções e colagenoses. A síndrome nefrítica clássica, também denominada Glomerulonefrite Difusa Aguda (GNDA), tem como protótipo a Glomerulonefrite Pós-Estreptocócica (GNPE). Os aspectos clínicos da síndrome nefrítica independente da origem, o quadro básico é caracterizado por hematúria (estigma da síndrome), proteinúria subnefrótica (menor que 3,5 g em 24h),oligúria, edema e hipertensão arterial. A redução do débito urinário provoca retenção volêmica, justificando o edema generalizado e a hipertensão arterial. Por vezes, surge também azotemia (retenção de ureia e creatinina), quando há queda significativa na taxa de filtração glomerular (< 40% do normal). A hematúria tem origem nos glomérulos comprometidos, sendo o sinal mais característico e mais comum da síndrome nefrítica, devendo ser esperada na imensa maioria das vezes, na forma macro ou microscópica. A hematúria é detectada pelo exame do sedimento urinário. Este exame é conhecido por nomes diversos em diferentes regiões do Brasil, sendo também chamado de EAS (Elementos Anormais e Sedimentos), urina tipo I, urinálise, EQU (Exame Qualitativo de Urina) e sumário de urina. O mecanismo fisiopatogênico da GNPE envolve deposição de imunocomplexos nos glomérulos do paciente, o que ativa a cascata do complemento resultando em inflamação local. Existem quatro modos pelos quais os glomérulos podem ser “atacados” por imunocomplexos: (1) deposição de imunocomplexos circulantes, formados no sangue por anticorpos do paciente + antígenos estreptocócicos; (2) formação de imunocomplexos in situ, isto é, antígenos estreptocócicos circulantes são “aprisionados” pela membrana basal glomerular, com posterior ligação de anticorpos do paciente; (3) reação cruzada de anticorpos anti-estreptococo produzidos pelo paciente com constituintes normais do glomérulo (mimetismo molecular); (4) alterações moleculares em antígenos do glomérulo, tornando-os imunogênicos...De acordo com os estudos mais recentes, o principal mecanismo na maioria dos casos de GNPE parece ser a formação de imunocomplexos in situ, em consequência à deposição glomerular de antígenos estreptocócicos circulantes... Os principais diagnósticos diferenciais da GNPE são evidentemente as outras doençasque cursam com síndrome nefrítica e hipocomplementemia: 1- Outras glomerulonefrites pós-infecciosas (ex.: endocardite bacteriana subaguda), 2- Glomerulonefrite lúpica, 3- Glomerulonefrite Membranoproliferativa (GNMP), também chamada de GN mesangiocapilar. Todas estas condições podem ser facilmente excluídas por critérios clínicos e laboratoriais, com exceção de uma: a GNMP, que pode ocorrer após infecções estreptocócicas em crianças e ainda apresentar um padrão semelhante de ativação da via alternada do complemento. A GNMP deve ser suspeitada caso haja proteinúria na faixa nefrótica, ou caso a hipocomplementemia persista por mais de oito semanas (ambas indicações de biópsia na GNDA). É importante sempre termos em mente que as manifestações renais que ocorrem durante uma infecção, geralmente, representam a exacerbação de uma glomerulopatia crônica preexistente, como a doença de Berger ou nefropatia por IgA. Assim, é preciso diferenciar as doenças glomerulares pós-infecciosas específicas (como a GNPE) do papel inespecífico de muitas infecções (principalmente virais), que exacerbam condições renais crônicas, muitas vezes silentes. Tais exacerbações são geralmente caracterizadas por um aumento transitório (ou mesmo surgimento) de proteinúria e hematúria, no curso de uma infecção, sem que haja um período de incubação compatível. Outro dado essencial para a diferenciação com doença de Berger é que esta última NÃO CONSOME COMPLEMENTO!!! GLOMERULONEFRITE AGUDA INFECCIOSA NAO ESTREPTOCÓCICA Muitas doenças infecciosas, além da causada pelo estreptococo beta-hemolítico do grupo A, podem estar associadas à GNDA. Elas incluem os estados bacterêmicos, especialmente os prolongados, e várias patologias virais e parasitárias. Tais condições costumam ser facilmente diagnosticadas pela presença de manifestações extrarrenais típicas, ou mesmo por achados microbiológicos e sorológicos. Assim, devemos reter que existem várias “infecções” que podem ser responsáveis pelo desenvolvimento de glomerulite, para que, diante de um paciente com um quadro infeccioso (bacteriano, viral ou parasitário) associado à síndrome nefrítica, não fiquemos reticentes em afirmar o “porquê” da lesão renal. As condições infecciosas que podem cursar com GNDA estarão minuciosamente detalhadas no volume III. Destacamos, como as mais frequentemente envolvidas, a endocardite bacteriana subaguda, as infecções supurativas crônicas (abscessos viscerais, empiemas cavitários, osteomielite), o shunt VP (Ventricul peritoneal) infectado, pneumonia por micoplasma, a hepatite viral e a mononucleose infecciosa. As evidências indicam que os imunocomplexos circulantes têm um papel importante na patogenia da GNDA dessas condições, que costumam estar associadas a: (1) depressão persistente dos componentes do complemento (como C3 e C4), e (2) níveis elevados de fator reumatoide e crioglobulinas circulantes. Em alguns estudos, a nefrite relacionada às infecções supurativas crônicas não cursa com queda do complemento sérico. O controle adequado da infecção costuma resultar em melhora dos sinais de inflamação glomerular, embora eventualmente ocorra glomerulonefrite crônica ou mesmo rapidamente progressiva. GLOMERULONEFRITE AGUDA NÃO INFECCIOSA Existem várias doenças multissistêmicas, e até mesmo doenças primárias dos rins, que podem determinar um quadro de glomerulonefrite aguda, sem nenhuma participação (direta ou indireta) de agentes infecciosos. GLOMERULONEFRITE RAPIDAMENTE PROGRESSIVA Diz-se que há Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva (GNRP) quando um paciente que desenvolve síndrome nefrítica, independente da causa, evolui para falência renal de curso acelerado e fulminante, (com necessidade de diálise), de forma que, sem tratamento precoce, acaba caminhando inexoravelmente para o estado de “rim terminal” em semanas ou meses. Em outras palavras: a GNRP não tratada evolui em muito pouco tempo para esclerose de quase todos os glomérulos, além de fibrose tubulointersticial generalizada, um estado de plena falência irreversível dos rins, tornando necessária a diálise ou o transplante renal para que o paciente sobreviva irreversível dos rins, tornando necessária a diálise ou o transplante renal para que o paciente sobreviva. SINDROME NEFRÓTICA A síndrome nefrótica deve ser entendida como o conjunto de sinais, sintomas e achados laboratoriais que se desenvolvem quando, por alguma razão, ocorre aumento patologicamente exagerado da permeabilidade dos glomérulos às proteínas, levando à proteinúria maciça. Na verdade, define-se a proteinúria na “faixa nefrótica” como aquela superior a 3,5 g/1,73 m2/24h, o que equivale a > 3-3,5 g/24h no adulto e > 40-50 mg/kg/24h na criança. 1- Proteinúria- A anormalidade básica da síndrome nefrótica é a proteinúria. De modo arbitrário, considera-se como “faixa nefrótica” a taxa de excreção renal de proteínas superior a 3,5 g/1,73 m2/dia em adultos e 50 mg/kg/dia ou 40 mg/m2/h em crianças. É importante frisar que uma proteinúria superior a 2 g/dia fortalece o diagnóstico de glomerulopatia, já que nas doenças tubulointersticiais a proteinúria não costuma ultrapassar esta cifra. A proteinúria da síndrome nefrótica pode ser do tipo seletiva ou não seletiva, na dependência da doença de base. Para melhor entendimento dos processos que determinam perda urinária e proteínas, vamos lembrar os mecanismos de permeabilidade glomerular. 2- Hipoalbuminemia- A perda de proteínas em grande quantidade na urina geralmente provoca a queda de seus níveis plasmáticos. A albumina é a principal proteína do plasma, sendo a grande responsável pela pressão oncótica (ou coloidosmótica), que ajuda a manter o líquido no compartimento intravascular. Apesar da queda dos níveis de albumina estimular a síntese hepática desta proteína, esta não é suficiente para evitar que se desenvolva uma hipoalbuminemia acentuada, característica marcante da síndrome nefrótica. O aumento da ingesta de proteínas está associado a uma elevação dos níveis de proteinúria, com pouco ou nenhum reflexo nos níveis de albumina sérica, enquanto a redução da ingesta proteica está associada a uma redução dos níveis de proteinúria, sem interferir comos níveis de albumina sérica. 3- Edema- As trocas de líquido entre os capilares e o interstício funcionam de acordo com o equilíbrio de duas forças opostas: (1) a pressão hidrostática e (2) a pressão oncótica (coloidosmótica) – esta última determinada pela concentração de macromoléculas (proteínas) na luz do vaso. O edema se formará sempre que houver um aumento importante da pressão hidrostática (que “empurra” o líquido para fora do capilar) em relação à pressão oncótica (que “puxa” o líquido para dentro do capilar). HIPERLIPIDEMIA Na maioria das vezes, o paciente com síndrome nefrótica desenvolve hipercolesterolemia, com aumento da lipoproteína LDL, a mais aterogênica de todas. A hipertrigliceridemia é encontrada em menor escala, predominando nos pacientes com falência renal crônica. O mecanismo da hipercolesterolemia é o aumento da síntese hepática de lipoproteínas, estimulada pela queda da pressão oncótica induzida pela hipoalbuminemia. Ou seja, o mesmo estímulo que faz o fígado produzir mais albumina também o leva a sintetizar mais lipoproteína, especialmente a LDL. A hipertrigliceridemia é causada muito mais pela redução do catabolismo do VLDL (perda urinária da enzima lipoproteína-lipase, que degrada o VLDL). Por razões desconhecidas, pacientes com certas formas de síndrome nefrótica não desenvolvem hiperlipidemia, como em muitos casos de lúpus eritematoso e amiloidose. É fácil perceber que a hiperlipidemia nefrótica resulta no aumento da filtração glomerular de lipídios, provocando lipidúria. O sedimento urinário passa a conter corpos graxos ovalados (células epiteliais com gotículas de gordura) e cilindros graxos (formados por tais células aderidas à proteína de Tamm-Horsefall). DIAGNÓSTICOS SINDRÔMICOS SÍNDROME NEFRÍTICA As síndromes nefríticas agudas se manifestam classicamente com hipertensão, hematúria, cilindros hemáticos, piúria e proteinúria leve a moderada. O dano inflamatório extenso dos glomérulos causa uma queda da TFG e, por fim, produz sintomas urêmicos, com retenção de sal e água, resultando em edema e hipertensão. GLOMERULONEFRITE PRIMÁRIA DO GLOMÉRULO NEFROPATIA POR IGA A nefropatia de Berger apresenta incidência variável através do mundo, sendo a nefropatia mais comum na Ásia e Europa. Se essa diferença reflete apenas diferenças quanto à indicação de biópsia ou é real, não está ainda estabelecido. Ela ocorre em qualquer faixa etária, sendo incomum em pacientes com idade inferior a 10 anos e superior a 50 anos; a idade média gira em torno dos 20 a 30 anos. Existe predomínio do sexo masculino de aproximadamente 3:1. É incomum na raça negra. A apresentação clínica mais comum é a de surtos de hematúria macroscópica, ou microscópica associada a infecções inespecíficas de vias aéreas superiores ou ao exercício físico. Frequentemente o paciente apresenta quadro de mal estar generalizado, com dores musculares discretas, acompanhado de disúria. Mais raramente, pode apresentar síndrome nefrótica. Hipertensão arterial ocorre em torno de 10% dos casos. A função renal, quando avaliada pela creatinina plasmática, apresenta-se normal. Laboratorialmente observam-se hematúria, caracterizada por hemácias dismórficas e/ou cilindros hemáticos, e proteinúria em torno de 1 a 2 g nas 24 horas. Elevação da IgA plasmática ocorre em 50% dos casos. Biópsia de pele do antebraço revela que 25 a 50% dos pacientes apresentam deposição de IgA, C3 e fibrina nos capilares da derme. No seguimento observam-se surtos de hematúria macroscópica e nos períodos entre surtos é comum o paciente apresentar proteinúria discreta e hematúria microscópica. Insuficiência renal aguda transitória, associada a hematúria macroscópica, tem sido descrita raramente. O comprometimento da função renal nestes pacientes é muito variável. Na maior parte a função renal se mantém normal. Outros podem apresentar queda lenta e progressiva da filtração glomerular. Após 20 anos de seguimento observa-se que entre 20 e 30% dos casos desenvolvem insuficiência renal crônica. Pacientes com surtos de hematúria macroscópica costumam apresentar função renal estável, enquanto aqueles com síndrome nefrótica persistente, ou glomérulos esclerosados vistos à biópsia renal, evoluem mais frequentemente para insuficiência renal. Pacientes portadores de nefropatia por IgA apresentam aumento dos níveis séricos desta imunoglobulina, que poderia ser consequente quer do aumento de sua síntese por linfócitos presentes nas mucosas ou circulantes, quer pela diminuição de sua depuração hepática e/ou esplênica. Outra alteração frequentemente descrita é a presença de imunocomplexos circulantes. A hipótese mais aceita atualmente é a de que esta nefropatia é decorrente da deposição renal dos imunocomplexos circulantes. A demonstração de que animais imunizados por via oral, com diferentes antígenos, desenvolvem deposição mesangial de IgA, e a presença de antígenos dietéticos nos imunocomplexos circulantes, levanta a possibilidade de que os antígenos poderiam ser originários da dieta. Outras possíveis fontes de antígenos sugeridas têm sido as infecções virais, como por exemplo a infecção por citomegalovírus. GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA A GNMP Ás vezes também é denominada glomerulonefrite mesangiocapilar ou glomerulonefrite lobular. Trata-se de uma glomerulonefrite de mediação imune caracterizada pelo espessamento da MBG com alterações mesangioproliferativas; 70% dos pacientes exibem hipocomplementemia. A GNMP é rara em afro-americanos, e a doença idiopática se manifesta em geral na infância ou no início da vida adulta. A GNMP é subdividida patologicamente em doença tipo I, tipo II e tipo III. A GNMP tipo I costuma estar associada a infecções persistentes pela hepatite C, a doenças autoimunes como lúpus ou crioglobulinemia, ou a doenças neoplásicas (Quadro 338.4). O s tipos II e III da GNMP em geral são idiopáticos, exceto em pacientes com deficiência do fator H do complemento, na presença do fator nefrítico C3 e/ou da lipodistrofia parcial, que produzem doença tipo II, ou deficiência dos receptores do complemento na doença tipo III. Foi proposta uma reclassificação da GNMP em doença mediada por imunoglobulinas (impulsionada pela via clássica do complemento) e doença não mediada por imunoglobulinas (impulsionada pela via alternativa do complemento). A GNMP tipo I, que é a mais proliferativa dos três tipos, mostra proliferação mesangial com segmentação lobular na biópsia renal e interposição mesangial entre a membrana basal dos capilares e as células endoteliais, produzindo um duplo contorno algumas vezes denominado em trilhos de bonde (ver Fig. 62e.9). (Ver Esquema glomerular 3.) Os depósitos subendoteliais com baixos níveis séricos de C3 são típicos, apesar de 50% dos pacientes apresentarem níveis normais de C3 e depósitos intramesangiais ocasionais. Os baixos níveis séricos de C3 e um espessamento denso da MBG contendo fitas de depósitos densos e C3 caracterizam a GNMP tipo II, algumas vezes denominada doença de depósito denso. Classicamente, o tufo glomerular possui um aspecto lobular; os depósitos intramesangiais estão presentes apenas raras vezes, e os depósitos subendoteliais em geral estão ausentes. A proliferação na GNMP tipo III é menos comum do que nos outros dois tipos e, com frequência, é de natureza focal; a interposição mesangial é rara, e os depósitos subepiteliais podem ocorrer ao longo de segmentos alargados da MBG que parecem ter um aspecto laminado e rompido. A GNMP tipo I é secundária à deposição glomerular de imunocomplexos circulantes ou à sua formação in situ. Os tipos II e III de GNMP podem estar relacionados com “fatores nefríticos”, que são autoanticorpos que estabilizam a C3 convertase e permitem que ative o C3 sérico. A GNMP também pode resultar de anormalidades adquiridas ou genéticas na via alternativa do complemento. Os pacientes com GNMP se apresentam com proteinúria, hematúria e piúria (30%), sintomas sistêmicos de fadiga e mal-estar que são mais comuns em crianças com a doença tipo I; ou um quadro nefrítico agudo comGNRP e uma deterioração acelerada da função renal em até 25% dos casos. É comum a presença de baixos níveis séricos de C3 . Cerca de 50% dos pacientes com GNMP desenvolvem doença em estágio terminal 10 anos após fazer o diagnóstico, e 90% sofrem de insuficiência renal após 20 anos. Síndrome nefrótica, hipertensão e insuficiência renal permitem todas predizer um desfecho ruim. DOENÇA ANTIMEMBRANA BASAL GLOMERULAR Os pacientes que desenvolvem autoanticorpos dirigidos contra os antígenos da membrana basal desenvolvem com frequência uma glomerulonefrite denominada doença antimembrana basal glomerular (anti-MBG). Quando se apresentam com hemorragia pulmonar e glomerulonefrite, eles apresentam uma síndrome pulmão-rim denominada síndrome de Goodpasture. A síndrome de Goodpasture acomete indivíduos em qualquer idade, com dois picos distintos de prevalência, na segunda e na quinta décadas de vida. A oligúria é quase uma constante, com a insuficiência renal instalando-se em poucos dias, vindo 75% dos pacientes a necessitar de diálise. A anemia do tipo ferropriva é muito comum, provavelmente devida ao sangramento intra-alveolar. Pode haver queda de função renal. A hematúria microscópica, com dimorfismo eritrocitário, é a alteração mais frequente, podendo, raramente, ser a única manifestação da doença. A proteinúria é discreta, sendo incomuns a síndrome nefrótica e a hipertensão. GROMERULONEFRITE DIFUSA AGUDA GLOMERULONEFRITE DIFUSA AGUDA PÓS-ESTREPTOCÓCICA (GNPE) É a sequela tardia de infecção por estreptococo beta-hemolítico do grupo A (Streptococcus pyogenes) -tem-se uma cepa de Streptococcus que vai ser nefritogênica. As chamadas cepas “nefritogênicas” podem estar presentes numa piodermite estreptocócica, como impetigo crostoso ou erisipela (M-tipos 47, 49, 55, 57, 60), ou numa faringoamigdalite (M-tipos 1, 2, 4, 12, 18, 25). A cepa mais comumente envolvida na GNPE pós-impetigo é o M-tipo 49, e a mais relacionada à GNPE pósfaringoamigdalite passa a ser o M-tipo 12. O risco de GNDA após uma estreptococcia (“taxa de ataque”) oscila em torno de 15%, variando de 5% (cepas orofaríngeas) até 25% (M-tipo 49 cutâneo). É dita o protótipo da síndrome nefrítica porque apresenta bem as manifestações características vistas. A doença é mais comum após episódios de faringite, mas pode ocorrer após infecções estreptocóccicas em qualquer local. O período de incubação (infecção-nefrite), quando a via é a orofaringe, costuma ficar entre 7-21 dias (média: 10 dias), enquanto para a via cutânea fica entre 15-28 dias (média: 21 dias). Epidemiologia Pode ocorrer tanto na forma epidêmica quanto em casos esporádicos. É mais comum em crianças, sendo a causa mais frequente de GNDA na infância, mas casos graves em adultos já foram bem documentados. Ocorre geralmente na faixa etária de crianças entre 2 e 15 anos, sendo a incidência maior em meninos do que meninas (2:1). A doença vem diminuindo em países desenvolvidos possivelmente pela redução de infecções estreptocócicas nessas áreas, porém se mantém em regiões com baixos hábitos de higiene. Fisiopatologia O mecanismo fisiopatogênico da GNPE envolve deposição de imunocomplexos nos glomérulos do paciente, o que ativa a cascata do complemento resultando em inflamação local. Existem quatro modos pelos quais os glomérulos podem ser “atacados” por imunocomplexos: (1) Deposição de imunocomplexos circulantes, formados no sangue por anticorpos do paciente + antígenos estreptocócicos; (2) Formação de imunocomplexos in situ, isto é, antígenos estreptocócicos circulantes são “aprisionados” pela membrana basal glomerular, com posterior ligação de anticorpos do paciente; (3) Reação cruzada de anticorpos anti-estreptococo produzidos pelo paciente com constituintes normais do glomérulo (mimetismo molecular); (4) Alterações moleculares em antígenos do glomérulo, tornando-os imunogênicos. De acordo com os estudos mais recentes, o principal mecanismo na maioria dos casos de GNPE parece ser a formação de imunocomplexos in situ, em consequência à deposição glomerular de antígenos estreptocócicos circulantes. Foram propostos muitos antígenos candidatos ao longo dos anos; os candidatos de estreptococos nefritogênicos de interesse no momento são uma cisteína proteinase catiônica, conhecida como exotoxina pirogênica estreptocócica B (SPEB), que é gerada por proteólise de um precursor zimogênio (zSPEB), e o NAPIr, o receptor de plasmina associado à nefrite. Esses dois antígenos possuem afinidade bioquímica pela plasmina, ligam-se como complexos facilitados por essa relação, e ambos ativam a via alternativa do complemento. O antígeno nefritogênico, SPEB, foi demonstrado no interior das “corcovas” subepiteliais na biópsia. Manifestações · Hematúria micro ou macroscópica · Oligúria: pode estar presente em cerca de 50% dos pacientes, pode ter inclusive um leve aumento de escórias nitrogenadas no sangue- ureia e creatinina · Edema: é muito comum (cerca de 2/3 dos casos), e tende a ocorrer precocemente na evolução do quadro (na maioria das vezes o paciente já tem edema quando procura o médico). Inicialmente é periorbitário e matutino, mas pode se tornar grave e evoluir para anasarca (uma das primeiras manifestações da GNPE) · Hipertensão arterial: também é comum, ocorrendo em 50-90%, se for muito abrupta pode levar a uma complicação que é: · Encefalopatia hipertensiva que pode se manifestar na forma de uma crise convulsiva · Congestão volêmica sintomática, levando ao edema agudo de pulmão, é outra complicação temida da GNPE · Proteinúria subnefrótica Diagnóstico · Verificar se o paciente teve uma faringoamigdalite/piodermite recente, se não há essa história de infecção recente, pode-se começar a descartar a hipótese diagnóstica de GNPE · Surge após: · Faringoamigdalite- 1 a 3 semanas · Piodermite- 2 a 6 semanas · Tem que documentar a infecção · Faringoamidalite: ASLO (Anticorpo antiestreptolisina O) · Piodermite: ASLO nem sempre está aumentada, então usa outro marcador, o anti-DNAse B (Anticorpos Anti DNASE B) · Queda transitória de complemento (C3)- a deposição de imunocomplexos que ocorre, vai ativar a via de complemento, mais especificamente a via alternativa do complemento, então vai se ter um aumento da dosagem de C3 do complemento · É obrigatório, se não há queda de complemento, não se tem glomerulonefrite pós estreptocócica · Característica importante: a queda se normaliza em até 6-8 semanas · Urina I · Na maioria dos casos, mostra sinais de inflamação glomerular ativa, com hemácias dismórficas, presença de cilindros hemáticos, granulosos, hialinos e leucocitários, osmolaridade elevada e proteinúria positiva (raramente maciça). · Função Renal · Níveis séricos de ureia e creatinina podem estar elevados; · a função tubular costuma estar preservada; · hiponatremia, acidose metabólica e hipercalemia podem ocorrer quando a queda no ritmo de filtração glomerular for importante, causando insuficiência renal aguda. As culturas positivas para infecção estreptocócica estão presentes de forma inconsistente (10 a 70%), porém os títulos aumentados de ASO (30%), de anti-DNAase (70%) ou de anticorpos antihialuronidase (40%) podem ajudar a confirmar o diagnóstico. Como consequência, o diagnóstico de glomerulonefrite pós-estreptocócica apenas raramente demanda uma biópsia renal. Biópsia · Apenas em casos isolados, características não esperadas (ex: anúria/ insuficiência renal aguda, oligúria>1 semana, hipocomplementemia maior que 6-8 semana, proteinúria nefrótica e ainda >4 semanas, evidência clínica e laboratorial de doença sistêmica ). Quando é feita a biópsia, o que se encontra que vai levar a confirmar a GNPE: · Microscopia óptica: padrão proliferativo difuso · Microscopia eletrônica: depósitos sub-epiteliais (giba/humps/corcova) · Imunofluorescência: padrão granular e não linear GLOMERULONEFRITE AGUDA INFECCIOSA, NÃO PÓS-ESTREPTOCÓCICA Muitas doenças infecciosas, além da causada pelo estreptococo beta-hemolítico do grupo A, podem estar associadas à GNDA (Glomerulonefrite Difusa Aguda). Elas incluemos estados bacterêmicos, especialmente os prolongados, e várias patologias virais e parasitárias. Tais condições costumam ser facilmente diagnosticadas pela presença de manifestações extrarrenais típicas, ou mesmo por achados microbiológicos e sorológicos. Assim, devemos reter que existem várias “infecções” que podem ser responsáveis pelo desenvolvimento de glomerulite, para que, diante de um paciente com um quadro infeccioso (bacteriano, viral ou parasitário) associado , não fiquemos reticentes em afirmar o “porquê” da lesão renal. Destacamos, como as mais frequentemente envolvidas, a endocardite bacteriana subaguda, as infecções supurativas crônicas (abscessos viscerais, empiemas cavitários, osteomielite), o shunt VP (Ventriculoperitoneal) infectado, pneumonia por micoplasma, a hepatite viral e a mononucleose infecciosa. As evidências indicam que os imunocomplexos circulantes têm um papel importante na patogenia da GNDA dessas condições, que costumam estar associadas a: (1) depressão persistente dos componentes do complemento (como C3 e C4), e (2) níveis elevados de fator reumatoide e crioglobulinas circulantes. Em alguns estudos, a nefrite relacionada às infecções supurativas crônicas não cursa com queda do complemento sérico. O controle adequado da infecção costuma resultar em melhora dos sinais de inflamação glomerular, embora eventualmente ocorra glomerulonefrite crônica ou mesmo rapidamente progressiva. ENDOCARDITE BACTERIANA SUBAGUDA A glomerulonefrite associada à endocardite é uma complicação da endocardite bacteriana subaguda, particularmente nos pacientes que não são tratados por um período prolongado, que possuem hemoculturas negativas ou que sofrem de endocardite do lado direito. A glomerulonefrite é incomum na endocardite bacteriana aguda, pois leva 10 a 14 dias para elaborar uma lesão mediada por imunocomplexos, período no qual o paciente já terá sido tratado, muitas vezes com uma cirurgia emergencial. Macroscopicamente, na endocardite bacteriana subaguda os rins evidenciam hemorragias subcapsulares com um aspecto de “picada de pulga”, e a microscopia da biópsia renal revela proliferação focal ao redor de focos de necrose associados a abundantes depósitos imunes mesangiais, subendoteliais e subepiteliais de IgG, IgM e C3. Os pacientes que se apresentam com um quadro clínico de GNRP têm crescentes. Também podem estar presentes infartos embólicos ou abscessos sépticos. A patogênese tem como base a deposição imunocomplexa circulante no rim com ativação do complemento. Os pacientes se apresentam com hematúria macroscópica ou microscópica, piúria e proteinúria leve ou, menos comumente, GNRP com perda rápida da função renal. Pode-se observar a presença de anemia normocítica, velocidade de hemossedimentação elevada, hipocomplementemia, altos títulos do fator reumatoide, crioglobulinas tipo III, imunocomplexos circulantes e ANCA. Os níveis séricos de creatinina também podem estar elevados por ocasião do diagnóstico, porém com a terapia moderna haverá pouca progressão para insuficiência renal crônica. O tratamento primário consiste na erradicação da infecção com 4 a 6 semanas de antibióticos e, se isso for feito com eficiência, o prognóstico para a recuperação renal é bom. Algumas vezes, a vasculite associada ao ANCA acompanha a endocardite bacteriana subaguda (EBS) ou é confundida com ela, de modo que é necessário descartar a sua possível presença, visto que o tratamento é diferente. Como variantes da glomerulonefrite associada a infecção bacteriana persistente no sangue, podem ocorrer glomerulonefrite pós-infecciosa em pacientes com derivações (shunts) ventriculoatriais e ventriculoperitoneais, infecções pulmonares, intraabdominais, pélvicas ou cutâneas e próteses vasculares infectadas. Nos países desenvolvidos, uma proporção significativa de casos acomete adultos, em particular indivíduos imunocomprometidos, e o microrganismo predominante é Staphylococcus. A manifestação clínica dessas condições é variável e inclui proteinúria, hematúria microscópica, insuficiência renal aguda e hipertensão. Os níveis séricos do complemento estão baixos, e podem existir níveis elevados de proteínas C-reativas, fator reumatoide, fatores antinucleares e crioglobulinas. As lesões renais incluem a glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP), a glomerulonefrite proliferativa difusa (GNPD) e exsudativa ou a glomerulonefrite mesangioproliferativa, resultando ocasionalmente em GNRP. O tratamento concentra-se em erradicar a infecção, e os pacientes são tratados, em sua maioria, como se tivessem endocardite. O prognóstico é reservado. GLOMERULONEFRITE SECUNDÁRIA A DOENÇA SISTÊMICA Existem várias doenças multissistêmicas, e até mesmo doenças primárias dos rins, que podem determinar um quadro de glomerulonefrite aguda, sem nenhuma participação (direta ou indireta) de agentes infecciosos. As principais condições que se encaixam neste grupo são as da tabela ao lado. NEFRITE LÚPICA A nefrite lúpica é uma complicação comum e grave do lúpus eritematoso sistêmico (LES) e ainda mais grave em mulheres adolescentes afro-americanas. De 30 a 50% dos pacientes terão manifestações clínicas de doença renal por ocasião do diagnóstico, e 60% dos adultos e 80% das crianças desenvolvem anormalidades renais em algum momento durante a evolução de sua doença. A nefrite lúpica resulta do depósito de imunocomplexos circulantes, que ativam a cascata do complemento e resultam em lesão mediada pelo complemento, infiltração de leucócitos, ativação dos fatores prócoagulantes e liberação de várias citocinas. A formação de imunocomplexos in situ após a ligação glomerular dos antígenos nucleares, particularmente nucleossomos necróticos, também desempenha algum papel na lesão renal. A presença de anticorpos antifosfolipídeo também pode desencadear microangiopatia trombótica em uma minoria dos pacientes. As manifestações clínicas, a evolução da doença e o tratamento da nefrite lúpica estão intimamente relacionados com a patologia renal. O sinal clínico mais comum de doença renal é a proteinúria, porém pode se observar a presença de hematúria, hipertensão, graus variáveis de insuficiência renal e sedimento urinário ativo com cilindros hemáticos. Uma patologia renal significativa pode ser observada na biópsia até mesmo na ausência de anormalidades significativas no exame de urina, porém a maioria dos nefrologistas não solicita uma biópsia até que o exame de urina seja comprovadamente anormal. As manifestações extrarrenais do lúpus são importantes para se estabelecer um diagnóstico objetivo de lúpus sistêmico porque, apesar de as anormalidades sorológicas serem comuns na nefrite lúpica, elas não são diagnósticas. Os anticorpos anti-dsDNA que fixam o complemento se correlacionam melhor com a presença de doença renal. A hipocomplementemia é comum nos pacientes com nefrite lúpica aguda (70 a 90%), e um declínio nos níveis de complemento pode prenunciar uma exacerbação. Embora os biomarcadores urinários da nefrite lúpica estejam sendo identificados para ajudar a prever as exacerbações renais, a realização de biópsia renal é o único método confiável para identificar as variantes morfológicas da nefrite lúpica, sendo definida frente à biópsia renal de acordo com a classificação histológica proposta pela Organização Mundial da Saúde, sendo necessários, no mínimo, de 10 a 15 glomérulos para uma análise fidedigna do padrão de nefrite lúpica. · A nefrite de classe I descreve uma histologia glomerular normal por qualquer técnica ou uma microscopia óptica normal com depósitos mesangiais mínimos evidenciados pela imunoflorescência ou microcospia eletrônica. · A GN mesangial (classe II) é encontrada em aproximadamente 10 a 20% dos casos renais, sendo caracterizada por hematúria e proteinúria discretas (é raro exceder 1 a 1,5 g nas 24 horas) com função renal preservada e na ausência de hipertensão arterial. · A GN proliferativa focal (classe III) é encontrada em 10 a 20% dos casos e se caracteriza por sedimento nefrítco acompanhado de proteinúria, por vezesnefrótica (20 a 30%), com hematúria, cilindrúria, hipertensão e discreta perda de função renal. · A GN proliferativa difusa (classe IV), a mais grave das nefrites, corresponde a 40 a 60% dos casos e é caracterizada por uma combinação de sedimento nefrítico e nefrótico, com proteinúria e hematúria mais significativas. A hipertensão arterial está invariavelmente presente e a insuficiência renal é marcante. · A GN membranosa (classe V) é identificada por síndrome nefrótica e ocorre em 10 a 20% dos casos. A análise dos índices de atividade e cronicidade renais pode ser útil no delineamento da terapêutica dos pacientes. PÚRPURA DE HENOCH-SCHONLEN É considerada a forma sistêmica da nefropatia da lgA, caracterizada por uma vasculite de pequenos vasos com depósitos predominantemente de lgA. O quadro clínico se caracteriza pela presença de púrpura, sobretudo em membros inferiores, artrites, artralgias e dor abdominal, algumas vezes associada a sangramento retal. O envolvimento ocorre mais frequentemente em crianças mais velhas ou em quadros prolongados, com persistência da dor abdominal e da púrpura. A apresentação mais comum é de hematúria e proteinúria isoladas. A evolução da nefropatia por lgA é variável, com alguns pacientes evoluindo de forma estável em décadas e outros desenvolvendo síndrome nefrótica, hipertensão e insuficiência renal. Fatores preditivos de mau prognóstico são: mais idade ao se instalar, presença de hipertensão, proteinúria persistente >1g ou nefrótica, sexo masculino, creatinina sérica elevada no diagnóstico, lesões histológicas de proliferação severa e esclerose e/ou tubulointersticial e formação de crescentes (estruturas histológicas formadas por pelo menos duas camadas de células epiteliais glomerulares e fagócitos mononucleares que ocupam parcial ou totalmente o espaço de Bowman. Apresentam aspectos anatômicos semelhantes a uma lua na fase crescente ou podem ser circunferências). GLOMERULONEFRITE RAPIDAMENTE PROGRESSIVA É uma complicação da Glomerulonefrite Difusa Aguda ou Síndrome Nefrítica. Diz-se que há Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva (GNRP) quando um paciente que desenvolve síndrome nefrítica, independente da causa, evolui para falência renal de curso acelerado e fulminante, (com necessidade de diálise), de forma que, sem tratamento precoce, acaba caminhando inexoravelmente para o estado de “rim terminal” em semanas ou meses. Em outras palavras: a GNRP não tratada evolui em muito pouco tempo para esclerose de quase todos os glomérulos, além de fibrose tubulointersticial generalizada, um estado de plena falência irreversível dos rins, tornando necessária a diálise ou o transplante renal para que o paciente sobreviva. O quadro clínico da GNRP pode ser de início abrupto (como na GNDA) ou, mais comumente, de início subagudo, tomando em seguida um curso acelerado. A oligúria costuma ser marcante, por vezes evoluindo para anúria (um sinal de lesão glomerular gravíssima). Em muitos casos, os únicos sintomas do paciente são os da “síndrome urêmica” (insuficiência renal grave), identificados quando a taxa de filtração glomerular torna-se inferior a 20% do normal, com elevação da creatinina além de 5 mg/dl. Podemos citar como exemplos a encefalopatia, a pericardite e o sangramento urêmico – todos indicativos de diálise de urgência. Se um paciente com GNRP for submetido à biópsia renal na fase precoce, provavelmente se encontrará a formação dos chamados Crescentes em mais de 50% dos seus glomérulos renais. Mas o que são os Crescentes? Os crescentes são formações expansivas que se estabelecem no interior da cápsula de Bowman e rapidamente invadem o espaço das alças glomerulares, desestruturando toda a arquitetura do corpúsculo de Malpighi. Sabe-se hoje que eles são formados pela migração de monócitos (macrófagos) através de alças capilares intensamente lesadas para o interior da cápsula de Bowman – podemos considerar a lesão capilar glomerular o evento inicial deflagrador dos crescentes. A passagem concomitante de fibrinogênio para a cápsula de Bowman e sua conversão em fibrina propicia a sustentação e o crescimento de toda a estrutura. Posteriormente, ocorre a migração de fibroblastos do interstício periglomerular para o espaço capsular. No final, o crescente inflamatório ou celular se converte num crescente fibroso, com perda glomerular irreversível. DOENÇA NO ESPECTRO NEFRÓTICO DOENÇA NO ESPECTRO NEFRÓTICO EM DISTÚRBIOS RENAIS PRIMÁRIOS DOENÇA COM LESÃO MÍNIMA· Proteinúria em níveis de síndrome nefrótica. · Biópsia renal revela ausência de alterações à microscopia óptica. · À microscopia eletrônica, nota-se a característica fusão dos processos podálicos. A doença com lesão mínima é a causa mais comum de doença renal proteinúrica em crianças, causando cerca de 80% dos casos. Ela costuma entrar em remissão com um curso de corticosteroides. De fato, as crianças com síndrome nefrótica são tratadas empiricamente para doença de lesão mínima sem necessidade de diagnóstico por biópsia. A biópsia deve ser considerada em crianças com síndrome nefrótica com achados incomuns (como sinais de outras doenças sistêmicas), que sejam resistentes aos esteroides ou que tenham recidivas frequentes na suspensão da terapia com corticosteroides. A doença de lesão mínima é menos frequente em adultos, sendo responsável por 20- 25% dos casos de síndrome nefrótica primária nos indivíduos ≥ 40 anos de idade. A doença com lesão mínima geralmente é idiopática, mas também pode ocorrer após infecção do trato respiratório superior (especialmente em crianças), associada a tumores, como doença de Hodgkin, a fármacos (lítio) e a reações de hipersensibilidade (p. ex., AINEs e picada de abelha). Achados clínicos A. Sinais e sintomas Os pacientes com frequência manifestam as características da síndrome nefrótica plena. São mais suscetíveis a infecções, especialmente as causadas por gram-positivos, apresentam tendência a episódios tromboembólicos, desenvolvem hiperlipidemia intensa e evoluem com desnutrição proteica. A doença com lesão mínima raramente evolui para insuficiência renal aguda causada por alterações tubulares e edema intersticial. B. Achados histológicos Não há exames sorológicos úteis nem alterações glomerulares à microscopia óptica ou à imunofluorescência. À microscopia eletrônica, observa-se o característico apagamento dos processos podálicos. Em um subgrupo de pacientes é possível encontrar também proliferação das células mesangiais; esses pacientes apresentam mais hematúria e hipertensão arterial e respondem mal ao tratamento padrão com corticosteroides. NEFROPATIA MEMBRANOSA· Proteinúria em graus variáveis; pode ocorrer em síndrome nefrótica. · Se houver síndrome nefrótica, a nefropatia membranosa está associada a coagulopatias, como a trombose de veia renal. · Padrão tipo “espícula e platô” encontrado à biópsia renal a partir de depósitos subepiteliais. · Entre as possíveis causas nos casos secundários estão hepatite B e carcinomas. A nefropatia membranosa é a causa mais comum de síndrome nefrótica primária em adultos e, geralmente, se apresenta na quinta e sexta décadas de vida. Trata-se de uma doença imunomediada, caracterizada pela deposição de imunocomplexos na camada subepitelial das paredes dos capilares glomerulares. Na forma primária da doença, o antígeno parece ser um receptor da fosfolipase A2 (PLA2R) sobre os podócitos em 70 a 80% dos pacientes. A doença secundária está associada a carcinoma; infecções, como hepatite B e C, endocardite e sífilis; doenças autoimunes, como LES, doença mista do tecido conectivo e tireoidite; e determinados fármacos, como AINEs e captopril. O curso da doença é variável, com cerca de 50% dos pacientes progredindo para DRET em 3 a 10 anos. O desfecho ruim está associado a fibrose tubulointersticial concomitante, sexo masculino, creatinina sérica elevada, hipertensão e proteinúria maciça (≥ 10 g/dia). Achados clínicos A. Sinais e sintomas Os pacientes com nefropatia membranosa e síndrome nefrótica têm risco aumentado deestado hipercoagulável em comparação com a nefrose por outras etiologias; há especial predisposição para trombose de veia renal. Pode haver sinais e sintomas de infecção ou neoplasia subjacentes (em especial câncer de pulmão, estômago, mama e colo) nos casos de nefropatia membranosa secundária. B. Achados laboratoriais Achados laboratoriais característicos da síndrome nefrótica. No futuro, poderá estar disponível a avaliação sérica dos anticorpos antiPLA2R circulantes na avaliação da nefropatia membranosa idiopática. À microscopia óptica, nota-se espessamento da parede capilar sem alterações inflamatórias ou proliferação celular; quando corado com metenamina de prata, pode-se observar um padrão tipo “espícula e platô”, em razão das projeções da MBG entre os depósitos subepiteliais. A imunofluorescência revela a presença de IgG e C3 uniformemente ao longo das alças capilares. A microscopia eletrônica mostra o padrão irregular de depósitos densos ao longo da superfície subepitelial da membrana basal. GLOMERULOSCLEROSE SEGMENTAR E FOCAL Esta é uma lesão renal relativamente comum, resultante de dano aos podócitos por doença renal primária ou secundária a condições como consumo de heroína, obesidade mórbida, refluxo urinário crônico, pamidronato e infecção por HIV. A doença idiopática pode estar relacionada com anormalidades hereditárias em qualquer uma das diversas proteínas dos podócitos, polimorfismos no gene APOL1 em afrodescendentes ou com níveis aumentados de receptores solúveis para a uroquinase. Clinicamente, os pacientes apresentam proteinúria; 80% das crianças e 50% dos adultos têm síndrome nefrótica franca. A TFG está diminuída em 25-50% dos casos no momento do diagnóstico. Os pacientes com glomerulosclerose segmentar focal e síndrome nefrótica normalmente evoluem para Doença Renal em Estágio Terminal (DRET) no período de 6-8 anos. Não há exame sorológico útil. O diagnóstico requer biópsia renal. A microscopia óptica revela esclerose de porções (ou segmentos) de alguns, mas não de todos os glomérulos (daí a denominação doença focal, e não difusa). À imunofluorescência, observam-se IgM e C3 nas lesões escleróticas, embora se presuma que esses componentes imunes apareçam apenas por terem sido aprisionados nos glomérulos escleróticos e que não participem da patogênese da doença. A microscopia eletrônica revela a presença de fusão dos processos podálicos epiteliais, como ocorre na doença de lesão mínima. GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA A GNMP é um padrão relativamente raro de lesão glomerular que pode ser causada por várias etiologias conhecidas ou ser idiopática. Clinicamente, pode se apresentar em todo o espectro nefrítico, desde hematúria glomerular assintomática até síndrome nefrítica aguda com crises de hematúria macroscópica ou GNRP; também pode se apresentar como síndrome nefrótica. Há vários subtipos de GNMP. O tipo I é mais comum e pode ser idiopático (especialmente em crianças e adultos jovens) ou secundário a infecções crônicas (mais comumente HCV), a paraproteinemias ou doenças autoimunes subjacentes como lúpus. A patogênese é provavelmente uma antigenemia crônica que ativa a via clássica do complemento com deposição de imunocomplexos. A GNMP tipo II é causada por várias anormalidades herdadas ou adquiridas na via alternativa do complemento. Ambos os tipos resultam em redução do complemento C3 circulante; o tipo I também apresenta C4 baixo. A microscopia óptica em ambos os tipos mostra hipercelularidade mesangial, proliferação endocapilar e remodelamento de paredes capilares, resultando em duplo contorno da MBG (aspecto de “trilho de trem”). Os dois tipos diferem-se pela imunofluorescência e microscopia eletrônica. O tipo I também é conhecido como GNMP por imunocomplexos com base na coloração positiva para imunoglobulinas e C3 na imunofluorescência; o tipo II tem apenas depósito de C3 sem imunoglobulinas à coloração. A microscopia eletrônica do tipo II demonstra depósitos espessos e densos em forma de tiras ao longo da MBG; por isso, esse tipo também é conhecido como doença de depósitos densos. A GNMP tipo I tem depósitos subendoteliais e subepiteliais à microscopia eletrônica. DOENÇA NO ESPECTRO NEFRÓTICO CAUSADA POR DISTÚRBIOS SISTÊMICOS AMILOIDOSE A amiloidose é causada por deposição extracelular de proteína fibrosa anormalmente dobrada (amiloide). Há diversas proteínas diferentes com o potencial de formar fibrilas amiloides. A mais comum é a amiloide AL, causada por discrasia de plasmócitos, em que a proteína é uma Ig monoclonal de cadeias leves; ela também é conhecida como amiloidose primária. A amiloidose secundária é causada por uma doença inflamatória crônica, como artrite reumatoide, doença inflamatória intestinal ou infecção crônica. Nesses casos, há deposição do reagente sérico de fase aguda, amiloide A, causando a amiloidose AA. Proteinúria, TFG diminuída e síndrome nefrótica são sinais e sintomas de apresentação; evidências de envolvimento de outros órgãos não são incomuns nesses casos. A eletroforese de proteínas séricas e urinárias deve ser feita como teste de rastreamento; se for detectado pico monoclonal, deve-se quantificar as cadeias leves livres séricas. Os rins afetados por amiloidose podem estar aumentados de tamanho (≥ 10 cm). Patologicamente, os glomérulos estão repletos de depósitos amorfos corados pelo vermelho Congo e que apresentam birrefringência verde. NEFROPATIA DIABÉTICA · Evidências prévias de diabetes melito, geralmente ao longo de 10 anos. · Albuminúria (microscópica ou macroscópica) precedendo a redução na TFG. · Sinais de nefropatia diabética à biópsia renal, quando realizada. · É frequente encontrar lesão em outros órgãos-alvo, como retinopatia. A nefropatia diabética é a causa mais comum de DRET. Os pacientes com diabetes tipo 1 têm risco de 30-40% de evoluir com nefropatia após 20 anos, enquanto naqueles com diabetes tipo 2 o risco é de 15-20% após 20 anos. A probabilidade de evolução para DRET é muito maior nos indivíduos com diabetes tipo 1, em parte por haver menos comorbidades e mortes antes do desenvolvimento de DRET. Com a atual epidemia de diabetes tipo 2, projeta-se que as taxas de nefropatia do diabetes continuarão a crescer. Os pacientes sob maior risco são do sexo masculino, afrodescendentes ou índios nativos norte-americanos. Achados clínicos O primeiro estágio da nefropatia do diabetes é hiperfiltração, com aumento na TFG, seguida pelo desenvolvimento de microalbuminúria (30-300 mg/dia). À medida que a nefropatia evolui, observa-se (macro) albuminúria (≥ 300 mg/dia, ou o suficiente para ser detectada com fita reagente), e a TFG retorna ao valor normal e continua a decrescer. São recomendados exames de rastreamento anuais para detecção precoce de microalbuminúria em todos os pacientes diabéticos. Nos pacientes com tendência à nefropatia, como aqueles com história familiar positiva de nefropatia diabética, observa-se microalbuminúria em 10-15 anos após o surgimento do diabetes com evolução ao longo dos 3-7 anos seguintes para proteinúria franca. A lesão mais comum na nefropatia do diabetes é a glomerulosclerose difusa, mas a glomerulosclerose nodular (nódulos de Kimmelstiel-Wilson) é patognomônica. Os rins desses pacientes geralmente estão aumentados de tamanho, como resultado de hipertrofia e proliferação celular. A biópsia renal não é necessária na maioria dos pacientes, a menos que haja achados atípicos como início súbito de proteinúria, características nefríticas, proteinúria maciça (≥ 10 g/dia), cilindros leucocitários ou declínio rápido na TFG. Os pacientes diabéticos tendem a manifestar outras doenças renais. Entre essas estão necrose papilar, nefrite intersticial crônica e acidose tubular renal tipo 4 (hiporreninêmica hipoaldosteronêmica). Esses pacientes são mais suscetíveis a insuficiência renal aguda por diversas agressões, incluindo meio de contraste intravenoso e uso concomitante de bloqueadores da renina-angiotensina (p. ex., IECA) com AINEs. NEFROPATIA ASSOCIADA AO HIV A nefropatia associadaao HIV habitualmente se apresenta sob a forma de síndrome nefrótica e com redução na TFG em pacientes com infecção por esse vírus. Em sua maioria, os pacientes são negros, possivelmente em razão da associação reconhecida entre polimorfismos do gene APOL1 e risco aumentado de nefropatia por HIV. Com frequência, os pacientes apresentam contagem baixa de CD4 e têm Aids, mas a nefropatia também pode ser o quadro de apresentação da doença. Os pacientes com HIV apresentam risco de outras doenças renais não associadas ao HIV (p. ex., toxicidade pela terapia antirretroviral altamente ativa [HAART], doença vascular e diabetes); essas doenças tendem a não se apresentar com características nefróticas. A biópsia renal revela glomerulosclerose segmentar focal, padrão de injúria com colapso glomerular; grave lesão tubulointersticial também pode estar presente. A nefropatia associada ao HIV está se tornando menos comum com o rastreamento para HIV e as terapias antirretrovirais mais efetivas. Em estudos de pequeno porte não controlados concluiu-se que a HAART retardaria a evolução da doença. Tanto os IECA quanto os BRAs podem ser usados para controlar a pressão arterial e retardar a evolução da doença. LUPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO · LES é uma doença inflamatória autoimune, multissistêmica, que acomete especialmente mulheres jovens. · Dos onze critérios diagnósticos, pelo menos quatro são necessários para a confirmação da doença. · O “critério renal” é definido pela presença de pelo menos um dos seguintes achados: · proteinúria persistente > 500 mg/24h ou > 3+ no EAS, ou sedimento urinário contendo cilindros celulares (hemáticos, leucocitários, epiteliais ou granulosos). · A nefrite lúpica é uma complicação frequente no LES (> 70% em algum momento na evolução da doença). · O envolvimento renal nesta colagenose se dá principalmente nos glomérulos (“Glomerulopatia Lúpica”), local onde se depositam os imunocomplexos produzidos durante a atividade da doença. Contudo, outras estruturas renais também podem ser afetadas (vasos sanguíneos, túbulos e interstício). · O espectro clínico da nefrite lúpica varia de discretas alterações na sedimentoscopia até síndrome nefrótica, GN rapidamente progressiva e rins terminais. De todas as manifestações sistêmicas do LES, o comprometimento renal é sem dúvida aquela que mais influi na morbimortalidade da doença, merecendo, portanto, rastreamento criterioso. · Para diagnóstico de LES, além dos critérios clínicos – que o caso não mostrou, pediria alguns laboratoriais, dentre eles o Fator Antinuclear. · O FAN, medido por imunofluorescência, por ser muito sensível para LES (mais de 98% dos pacientes tem FAN +), pode ser usado como teste de triagem, considerando-se significativo um título > 1:80. · Entretanto, ele não tem especificidade – muitos pacientes com outras doenças também podem ter FAN positivo. É o caso da esclerose sistêmica (90%), da síndrome de Sjögren (70%) e da artrite reumatoide (35%). · Além do mais, cerca de 10% da população normal também pode ter baixos títulos de FAN! · VDRL – falso-positivo · O anticorpo anti-DNA nativo (anti-DNAds) e o anti-Sm são marcadores específicos de lúpus, e sua identificação faz parte dos critérios diagnósticos. GLOMERULOPATIAS EM DOENÇAS HEPÁTICAS Infecção por Vírus C · É recente na literatura o conhecimento da associação entre infecção por vírus C e o desenvolvimento de glomerulopatias. · Estudos epidemiológicos mostram que, enquanto em 1.244 doadores de sangue normais a sorologia para vírus C foi positiva em 1%, em 226 pacientes renais, não-dialíticos, foi de 7,9%. · Quando são considerados os grupos de riscos para infecção por vírus C (homossexuais, 4 a 8%, e consumidores de droga injetável, 60%), também serão estes os grupos com maior prevalência da doença glomerular. · Esta pode ocorrer mesmo sem doença hepática evidente, assim como algumas casuísticas têm mostrado: em pacientes com glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP) e vírus C positivo, apenas 20% apresentam manifestações clínicas de hepatite, mas 60 a 70% mostram transaminases elevadas. · As manifestações renais predominantes são de síndrome nefrótica com insuficiência renal leve a moderada. O achado histológico mais freqüente é de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo I, que se distingue da forma idiopática pela representatividade maior de imunoglobulinas – IgG, IgM e C3. · Outras formas menos freqüentes de nefropatia por vírus C são a glomerulonefrite membranosa e a glomerulonefrite proliferativa mesangial. A patogênese da lesão é explicada pela deposição renal de imunocomplexos contendo antígeno HCV-anticorpo anti-HCV e fator reumatóide, nos casos de crioglobulinemia. É possível, portanto, nesta última situação a detecção de HCV-RNA no crioprecipitado. Infecção por vírus B · A glomerulonefrite associada ao vírus da hepatite B é uma entidade bem reconhecida desde o seu relato inicial há mais de 20 anos. A maioria dos pacientes descritos são crianças, onde predomina o sexo masculino (4:1). · Em área endêmicas, 20 a 50% das crianças com síndrome nefrótica mostram sorologia positiva para vírus B. Esta positividade é ainda maior, ao redor de 85%, quando destacados os casos de glomerulonefrite membranosa (GNM) com comprovação histológica. · A glomerulonefrite membranoproliferativa é a lesão mais encontrada nos adultos com hepatite B crônica. Ao contrário da membranosa, os pacientes apresentam hepatite em atividade. A doença renal manifesta-se como síndrome nefrótica e micro-hematúria. A hipertensão arterial está presente em 45% dos casos; e insuficiência renal, em 20%. Há queda do complemento sérico. · A Poliarterite Nodosa clássica (PAN) pode se associar à infecção crônica pelo vírus B. Um em cada três pacientes com PAN clássica apresenta o antígeno de superfície da hepatite B (HBsAg) no soro. Acredita-se que imunocomplexos contendo este antígeno participem da injúria vascular desta vasculite necrosante sistêmica. Do ponto de vista da lesão renal, os pacientes com hepatite B que desenvolvem a PAN exibem um comprometimento dos vasos de médio calibre, facilmente identificável por angiografia. HIV/SIDA O paciente com SIDA complica com disfunção renal com certa frequência. Instabilidade hemodinâmica, nefrotoxicidade medicamentosa e a chamada “nefropatia pelo HIV” são as causas mais comuns. Exame – Teste para HIV. VASCULITES O envolvimento renal é extremamente comum nas diversas formas de vasculite. Vasculites se caracterizam pela presença de inflamação (e em alguns casos, necrose) na parede dos vasos sanguíneos Este processo – além de promover alterações inflamatórias sistêmicas (como febre, perda ponderal, fadiga, etc.) – também se acompanha de sinais e sintomas secundários à isquemia de órgãos específicos. No caso dos rins, as manifestações decorrem de: · Estenose arterial/arteriolar, provocando isquemia. · Trombose, causando necrose tecidual. · Fragilidade da parede vascular, levando à formação de aneurismas ou sua rotura (hemorragias teciduais). VASCULITES NECROSANTES A principal manifestação renal das vasculites sistêmicas necrosantes como grupo é a insuficiência renal aguda, que com frequência necessita de diálise e se acompanha de hipertensão arterial grave, esta última mediada por hiperativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Entidades que “preferem” pequenos vasos costumam comprometer diretamente os capilares glomerulares. Elas se apresentam com um quadro clinicolaboratorial semelhante ao das glomerulonefrites (no caso, Glomerulonefrites Rapidamente Progressivas – GNRP), destacando-se a presença de sedimento urinário “ativo” e combinações variadas de hematúria dismórfica, leucocitúria, cilindros hemáticos, leucocitários e proteinúria, usualmente na faixa subnefrótica. A causa dos achados é a inflamação e necrose glomerular, sendo a injúria mediada tanto por mecanismos autoimunes quanto por isquemia (decorrente do estreitamento arteriolar – glomerulite isquêmica). Exemplos de doenças neste grupo são a granulomatose deWegener, a poliangeíte microscópica e a síndrome de Churg-Strauss. Identificação de autoanticorpos contra antígenos localizados no citoplasma de neutrófilos (ANCA – Antibodies to Neutrophil Cytoplasmic Antigens) ENDOCARDITE INFECCIOSA · Clinicamente, os pacientes com endocardite que desenvolvem lesão glomerular seguem o padrão das síndromes nefríticas pós-infecciosas, revelando hematúria macro/microscópica e graus variados de edema e hipertensão arterial. · O exame de urina mostra hemácias dismórficas, cilindros hemáticos, leucocitúria e proteinúria subnefrótica. · As escórias nitrogenadas normalmente não se elevam muito no soro, a não ser nos raros casos de GN rapidamente progressiva ou quando há outros fatores de injúria renal (necrose tubular aguda, nefrite intersticial aguda). · Como regra, o paciente apresenta hipocomplementenemia (C3, C4 e CH50) e, muitas vezes, fator reumatoide positivo e crioglobulinas. Então, um paciente chega com hematúria, identificamos se é renal ou uretral – pela proteinúria. É renal. Agora analisamos se é glomerular ou tubuluintertiscial. É glomerular. Procurar a causa. Independente da causa, todo paciente com hematúria nefrológica deve fazer uma avaliação abrangente da função renal (clearance de creatinina, proteinúria quantitativa), e exames específicos de acordo com a suspeita clínica (ex.: IgA, complemento, FAN, anti-DNA, ANCA).O diagnóstico de certeza das doenças glomerulares é obtido através da biópsia renal. A biópsia costuma ser bastante esclarecedora, e sempre deve ser feita quando o diagnóstico não ficar claro através de outros métodos, ou quando seus resultados forem capazes de modificar o tratamento (ex.: dúvida quanto à classe de nefrite lúpica). Sempre que houver dúvida diagnóstica, nos casos de hematúria “nefrológica”, estará indicada a biópsia renal! INDICAÇÕES DE BIÓPSIA RENAL EM GLOMERULOPATIAS – da Soc. Bras. De Nefrologia Uma vez estabelecido o diagnóstico clínico-laboratorial de glomerulopatia, são indicações de realização de biópsia renal, desde que os rins apresentem dimensões normais (ou aumentadas) ao exame ultra-sonográfico e que sejam levadas em conta contra-indicações absolutas à sua realização: 1. Síndrome nefrótica em pacientes adultos; 2. Insuficiência renal de causa não-esclarecida; 3. Glomerulonefrite rapidamente progressiva; São situações em que não há consenso quanto à indicação de biópsia renal em todos os casos, porém cuja realização é defensável: 1. hematúria isolada de origem glomerular; 2. hematúria associada a proteinúria de pequena monta; 3. proteinúria isolada de pequena monta. Não se recomenda a realização de biópsia renal em casos de nefropatia diabética com apresentação e evolução típicas. Por fim, não se justifica biópsia renal em caso de glomerulopatia, quando os rins estão contraídos, pois dificilmente se chega ao diagnóstico da doença original nessas condições, havendo mais riscos que benefícios. Deve-se deixar claro que ao indicar biópsia renal em glomerulopatias, deve-se programar o envio de material para análise pelo menos pelas técnicas de microscopia óptica e de imunofluorescência. Salientando-se que, em caso de hematúria isolada, além dessas é essencial que se disponha também de microscopia eletrônica. Em qualquer situação, consideramos boa prática, sempre que possível, colher material adequado para a análise pelas três técnicas e lançar mão da microscopia eletrônica (ME) quando necessário para dirimir dúvidas eventuais. BIÓPSIA RENAL A biópsia renal constitui um instrumento fundamental para o diagnóstico e prognóstico de diver sa s pa tologia s ne frológi ca s e sistémicas. O benefício obtido com a realização de biópsia renal não é uniforme, sendo discutível o seu valor em diferentes situações clínicas. Esta não é uma técnica isenta de complicações, sendo contudo a taxa atual reduzida , dado o uso de dispositivos automáticos de propulsão para biópsia e ecografia em tempo real. Com as indicações atuais, o resultado da biópsia renal altera a conduta médica em cerca de 40% dos doentes. É uma técnica invasiva e, embora na maioria dos casos não haja complicações, há sempre um certo risco. Portanto, é essencial que as seguintes condições sejam atendidas para a realização de uma biópsia renal: 1. esgotar todos os procedimentos não invasivos para o diagnóstico de doenças renais, cujos sinais e sintomas sejam compatíveis com doenças parenquimatosas; 2. considere que as informações fornecidas pela biópsia fornecerão um diagnóstico de certeza; 3. garantir que um e s tudo por um patologista especialista, com microscopia óptica, imunofluorescência e eletrônica; 4. antecipar que esse diagnóstico influenciará o tratamento e o prognóstico. Em nenhum caso é aceito que a biópsia serve para completar um diagnóstico sem significado clínico ou como um objetivo de ensino para residentes ou outros médicos em período de treinamento. A biópsia renal é um compromisso ético e profissional em que o médico e o paciente devem concordar. SÍNDROME NEFRÓTICA A realização de biópsia renal no síndrome nefrótico do adulto influencia a escolha em 86% dos casos. Na ausência de uma doença sistêmica, os padrões histológicos mais frequentemente encontrados são o de nefropatia membranosa, glomerulosclerose focal e segmentar ou lesões mínimas. Ela orienta a terapêutica e pode revelar, por vezes, diagnósticos inesperados, que põem contem ausência e alterações sorológicas típicas. ALTERAÇÕES URINÁRIAS MINOR Existe um outro grupo de doentes em que se sabe hoje que, de uma forma geral, a biópsia renal não traz benefício. Trata-se de doentes que têm apenas proteinúria ligeira (1 a 2g/dia), mantida e isolada, isto é, sem agravamento nítido e não acompanhada de hematúria, HA, IR ou alterações do complemento. Nestes casos, o tipo de etiologia revelada pela biópsia não apresenta, geralmente, indicação terapêutica, ou seja, o resultado da biopsia não altera a atitude médica. Alguns destes doentes terão glomerulosclerose secundária, como resposta a lesão isquêmica (como na nefrosclerose) ou a perda de nefrons (como na nefropatia de refluxo). Outros doentes terão alterações compatíveis com glomerulosclerose focal primária ligeira ou nefropatia membranosa. Alguns nefrologistas realizam biópsia renal em doentes com proteinúria de 2-3g/dia, sendo consensual a sua realização se se registar elevação da proteinúria, da creatinina sérica ou da PA. Já a hematúria isolada coloca maiores dificuldades de diagnóstico e conduta, isso porque ela pode resultar de numerosas alterações no TU (que não rim), em que obviamente a biópsia renal não tem qualquer papel diagnóstico. Os achados histológicos mais f são nefropatia IgA, doença das Membranas Finas ou Nefrite hereditária. O prognóstico da maioria dos doentes portadores dessas doenças é benigno, havendo, no entanto, progressão para IR em alguns casos. A biópsia renal está apenas indicada nos casos em que há evidência de progressão de doença. Muitas vezes, a sua utilidade limita-se a estabelecer o diagnóstico e fornece informação prognóstica, uma vez que não existem atualmente terapêuticas específicas que afetem o prognóstico destas doenças. SÍNDROME NEFRÍTICA A Síndrome Nefrítica, caracterizado pela presença de hematúria, cilindros celulares, proteinúria, HA, edema e IR, pode ser causado por uma doença sistémica que não requer biópsia renal para estabelecer o diagnóstico. Exemplos incluem glomerulonefrite pós-infecciosa, crioglobulinémia mista ou doença por anticorpos anti-GBM, que pode ser confirmada laboratorialmente. Na maioria dos casos, no entanto, a biópsia renal é indispensável para o diagnóstico e orientação terapêutica, porque o diagnóstico etiológico pode ser equívoco se baseado apenas em dados clínico-laboratoriais. INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA A patologia mais frequentemente subjacente à IRA é a necrose tubular aguda. Esta revestese de aspectos clínicos e laboratoriais característicos que permitem inferir no seu diagnóstico, dispensando a biópsia renal na maior parte dos casos. No entanto,deve ter-se presente a possibilidade de a IRA se dever a outra situação, que exija a instituição de diferentes medidas terapêuticas, nomeadamente insuficiência renal pré-renal, obstrução do TU, vasculite, glomerulonefrite ou nefrite tubulointersticial. INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Na IRC , se os rins têm dimensões conservadas e sobretudo na presença de proteinúria significativa, a biópsia renal poderá ser útil. Frequentemente serão encontradas formas progressivas de doença renal e nos doentes idosos pode ser importante na identificação de amiloidose primária ou secundária, nefropatia das cadeias leves, ou mesmo rim de mieloma, quando não exista suspeita clínica prévia. É uniformemente aceito atualmente que a realização de biópsia de rins de dimensões reduzidas é difícil, arriscada e muitas vezes não fornece informação diagnóstica , encontrando-se na maior parte dos casos lesões cicatriciais irreversíveis e inespecíficas, pelo que não está indicada. DOENÇAS SISTÊMICAS COM ENVOLVIMENTO RENAL Na presença de doenças sistémicas, tais como a púrpura de Henoch-Schönlein, a presença de alterações urinárias não dita necessariamente a realização de biópsia renal. No entanto, nos casos de maior gravidade clínica, com IR e/ou proteinuria nefrótica, a biópsia renal permite a identificação de lesões crescênticas, justificando a instituição precoce de terapêutica agressiva. A necessidade de biópsia é variável na n. Alguns autores consideram que se pode dispensar a realização de biópsia renal na apresentação inicial, reservando-a para os doentes que que têm fatores de mau prognóstico (raça negra, HA, IR), ou em que existam dúvidas quanto ao diagnóstico de nefrite lúpica ou à duração da doença. Em geral, o resultado da biópsia renal não acrescenta muito ao plano terapêutico já estabelecido a partir dos dados da análise da urina e estudos de função renal. No entanto, tem um papel nas apresentações clínicas intermédias, tal como síndrome nefrótico sem hematuria, em que o diagnóstico pode ser de glomerulone frite proli ferativa focal ou glomerulopatia membranosa, que requerem diferentes abordagens terapêuticas. Também as vasculites são patologias sistémicas que envolvem com f o rim. Na suspeita de vasculite de grandes vasos (Poliarterite Nodosa), a arteriografia renal é suficiente para estabelecer o diagnóstico, sendo perigosa a realização de biópsia neste contexto pelo risco de hemorragia, no caso de se puncionar um aneurisma. Na vasculite de pequenos vasos é , geralmente, necessária a biópsia renal. Apesar de a presença de anticorpos anti-neutrófilo circulantes em doentes com insuficiência renal rapidamente progressiva ter um valor preditivo positivo de 95%, este dado não permite o início de terapêutica na ausência de confirmação histológica. TRANSPLANTE RENAL Nos primórdios da transplantação renal, havia um medo natural em realizar biópsia no rim transplantado, enquanto rim único, considerada então contra-indicação formal para biópsia. Nos últimos anos tem sido inestimável no diagnóstico diferencial da disfunção precoce do enxerto, após se ter excluído obstrução ou hipoperfusão. Os resultados histológicos mais f neste contexto são rejeição aguda, toxicidade da ciclosporina e raramente outras patologias renais, como recorrência da doença original. Apesar do desenvolvimento da técnica de biópsia aspirativa com agulha fina, que possui menor taxa de complicações, a sua eficácia no diagnóstico diferencial é menor do que o obtido com a biópsia convencional. A maioria das biópsias realizadas tardiamente têm o objetivo de esclarecer causas de IR de lenta instalação e/ou proteinúria. As principais possibilidades de diagnóstico, uma vez excluídas a estenose arterial e obstrução uretérica são: rejeição crónica, com lesões tubulointersticiais e arteriais de novo, recorrência da doença primária ou aparecimento de glomerulonefrite e novo, geralmente com padrão membranoso. Alguns centros preconizam a realização de biópsias a enxertos com função estável, no momento da transplantação e depois em intervalos de tempo regulares, as chamadas biópsias de protocolo. Se pretende detectar precocemente rejeição subclínica e nefropatia crónica do enxerto. O seu uso não é universalmente aceito, dado que não está provado o seu benefício em relação ao risco que acarreta para o doente. A biópsia do rim do doador (falecido) pode ser útil para determinar existência e extensão de lesões crónicas, para permitir compará-las com lesões que venham a surgir posteriormente, uma vez que estas podem instalar-se em meses. Atualmente, dada a escassez de órgãos para transplante, aceitam-se dadores “marginais” de cadáver. São considerados dadores marginais, aqueles que, pela idade avançada ou comorbidades presentes, nomeadamente do foro vascular, seriam maus candidatos para a doação. Nestes casos, a biópsia do rim do dador marginal pode ajudar a decidir se este deverá ou não ser aceito. INDICAÇÕES Uma vez estabelecido o diagnóstico clínico-laboratorial de glomerulopatia, são indicações de realização de biópsia renal, desde que os rins apresentem dimensões normais (ou aumentadas) ao exame ultrassonográfico e que sejam levadas em conta contra-indicações absolutas à sua realização: · Síndrome nefrótica em pacientes adultos; · Insuficiência renal de causa nãoesclarecida; · Glomerulonefrite rapidamente progressiva; São situações em que não há consenso quanto à indicação de biópsia renal em todos os casos, porém cuja realização é defensável: · hematúria isolada de origem glomerular; · hematúria associada a proteinúria de pequena monta; · proteinúria isolada de pequena monta. Não se recomenda a realização de biópsia renal em casos de nefropatia diabética com apresentação e evolução típicas. Por fim, não se justifica biópsia renal em caso de glomerulopatia, quando os rins estão contraídos, pois dificilmente se chega ao diagnóstico da doença original nessas condições, havendo mais riscos que benefícios. Deve-se deixar claro que ao indicar biópsia renal em glomerulopatias, deve-se programar o envio de material para análise pelo menos pelas técnicas de microscopiaóptica e de imunofluorescência. Salientando-se que, em caso de hematúria isolada, além dessas é essencial que se disponha também de microscopia eletrônica. Em qualquer situação, consideramos boa prática, sempre que possível, colher material adequado para a análise pelas três técnicas e lançar mão da microscopia eletrônica (ME) quando necessário para dirimir dúvidas eventuais. HEMATÚRIA ISOLADA Hematúria de origem glomerular que não é acompanhada por proteinúria, hipertensão ou diminuição da filtração glomerular também tem um excelente prognóstico. Quando uma biópsia foi feita, os seguintes achados foram encontrados: glomérulos normais, nefropatia por IgA, membrana basal fina ou doença de Alport. Nenhum deles, nesse contexto clínico, tem tratamento e, dado o prognóstico, não se justifica a realização de uma biópsia renal. Duas exceções podem ser feitas: 1. necessidade de aconselhamento genético; 2. estudo de doador vivo. Nestas situações, um estudo detalhado com um microscópio eletrônico é essencial. Obviamente, se uma biópsia renal for considerada, é essencial descartar hematúria de origem urológica, bem como hipercalciúria ou hipercuricosúria. PROTEINÚRIA ASSINTOMÁTICA E HEMATÚRIA A associação entre proteinúria e hematúria leva à nefropatia glomerular. As restrições para indicar a biópsia renal são as mesmas que quando estão isoladas. INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA A maioria é devida a causas que não necessitam de biópsia para o diagnóstico ou tratamento: sal e esgotamento da água, necrose tubular ou bloqueio de estradas. No entanto, cerca de 8% não têm nenhuma causa clara, e se eles têm características atípicas, como hematúria, proteinúria ou moldes são indicações para biópsia renal urgente para governar glomerulonefrite rapidamente progressiva , vasculite ou nefropatia tubulointersticial aguda. Essas doenças requerem tratamentos agressivos que devem ser justificados de acordo com osdados histológicos. OBSERVAÇÃO! De forma geral, o achado de sinais e sintomas sugestivos de doença glomerular requer, do ponto de vista diagnóstico, a realização de biópsia renal. Há algumas poucas situações, entretanto, nas quais a biópsia renal não é necessária. A síndrome nefrótica em crianças pode prescindir da realização inicial de biópsia renal, uma vez que a doença de lesões mínimas. é preponderante nesta faixa etária, permitindo o início de tratamento com corticoide mesmo sem a realização da biópsia. Na síndrome nefrítica aguda com características clínicas e laboratoriais muito sugestivas de glomerulonefrite pós-estreptocócica, particularmente se em situação de epidemia, a biópsia pode ser indicada apenas naqueles casos de evolução desfavorável. A biópsia renal também não costuma ser necessária em pacientes com quadro clínico sugestivo de nefropatia diabética, ou seja, naqueles com diabetes de longa data e com sinais de lesão em outros órgãos-alvo. A biópsia também não está rotineiramente indicada em pacientes assintomáticos com doença glomerular leve (p. ex., hematúria isolada), dado o prognóstico favorável desse tipo de lesão. Em todas as outras situações, a biópsia renal é imperativa. Vale notar que as doenças glomerulares apresentam, muitas vezes, curso insidioso, o que dificulta o diagnóstico precoce.