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1 
 
 
 
 
F P C T - FORMAÇÃODE PSICANALISTA CLÍNICO 
E TEORIA PSICANALÍTICA 
____________________________________________________________ 
 
 
 
MODULO 
Luto: Perdas e Rompimento de Vínculos 
 
 
 
Quando eu morrer, 
Não quero choro nem vela, 
Quero uma fita amarela 
Gravada com o nome dela (...) 
Noel Rosas 
 
 
 
Profa. Rejane Rodrigues de Campos1 
 
 
 
 
São José dos Campos 
2016 
 
1
 Psicanalista Didata. Pedagoga. Psicologia da Educação. Administração Escolar. Especialista em: 
Educação, Psicologia e Saúde Mental, Psicanálise e Supervisão, Transtornos da Infância e 
Adolescência: abordagem interdisciplinar. Membro das Associações Psicanalíticas: APVP; CAEI; APICE 
e EPPICO. 
 
2 
 
 
 
S U M Á R I O 
 
 
 Luto: perdas e rompimento de vínculos 3 
 
Introdução 3 
 
1. O homem: visão morte através dos tempos 5 
2. Morte e desenvolvimento humano 7 
3. O ser humano: a morte e o luto 9 
4. O processo, a dor da perda e luto patológico 14 
5. Teoria do Apego: laços afetivos, formação e rupturas 19 
6. Os vínculos e a afetividade 24 
7. A criança: relações com a morte e luto na infância 31 
8. Adolescência e juventude suas perdas e lutos 38 
9. A vida adulta: rompimentos, perdas e lutos 43 
10. Os pais diante da perda gestacional 50 
11. A perda de um filho e o luto dos pais 52 
12. O aborto provocado e o processo de luto 54 
13. O luto: processo de elaboração 56 
14. Relações amorosas: rupturas, elaborações e lutos 61 
15. Perdas ambíguas 66 
16. A velhice: o viver e o morrer 70 
17. Familia: relações objetais, vínculos e perdas 74 
18. Adoecimento e luto antecipatório 78 
19. Suicídio: angústia e autodestrutividade 81 
20. A psicanalise diante das perdas e do luto 87 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 91 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICA 92 
PROJEÇÕES DO MÓDULO 95 
 
 
 
3 
 
LUTO: PERDAS E ROMPIMENTO DE VÍNCULOS 
 
Morre lentamente 
Quem não viaja, 
Quem não lê, 
Quem não ouve música, 
Quem não encontra graça em si mesmo 
(...) Quem destrói seu amor próprio, 
Quem não se deixa ajudar. 
(...)Quem se transforma em escravo do hábito 
(...)Quem evita uma paixão e seu redemoinho de emoções 
(...)Quem não vira a mesa quando está infeliz 
(...)Quem não arrisca o certo pelo incerto 
Para ir atrás de um sonho, 
Quem não se permite, pelo menos uma vez na vida, 
Fugir dos conselhos sensatos... 
Viva hoje ! 
Arrisque hoje ! 
Faça hoje ! 
Não se deixe morrer lentamente ! 
Martha Medeiros 
 
 
INTRODUÇÃO 
 O que pode haver de interessante falar sobre a morte? 
 O “ser humano” é um ser “finito”, e este fato parece ser deixado de lado pela 
sociedade, marcada por um ritmo alucinante de vida. A sociedade moderna possui 
novos tabus e dentre eles está a morte. 
 O homem se angustia ante a possibilidade de morte iminente, quando diante de 
um outro que se foi. É nesse momento que ele sente a possibilidade de experienciar 
estar-no-mundo enlutado. Há necessidade de que alguém caminhe ao seu lado nesse 
tempo do pesar e tristeza pela perda, uma vez que necessita sentir-se apoiado, pois 
existir no mundo enlutado significa trilhar um caminho para sobreviver a ausência de um 
ente querido e amado, e, encontrar um novo sentido para a existência na inexistência. 
 Atualmente, o homem se depara com uma negação a cerca da morte, com uma 
tendência a não pensar sobre sua finitude e a das pessoas que o cercam. Hoje os pais 
falam sobre tudo com seus filhos, como drogas, violência, métodos contraceptivos, entre 
outros assuntos, porém não falam sobre transitoriedade e o limite da vida - a morte. A 
morte não vem de fora, ela se processa dentro da vida com a perda progressiva da força 
vital, com as perdas necessárias diante do viver. Morremos um pouco a cada dia, e este 
processo um dia chegará ao fim. 
 
4 
 
 A palavra “morte” causa ao ser humano um temor intenso, sendo difícil explicar 
tal pensar, a ponto de ser custoso, ou evitativo pronunciar esta palavra. O luto é um 
processo de reestruturação após a desestruturação que a morte circunda o ser humano. 
Esse processo serve para modificar os momentos vividos com a pessoa que faleceu em 
memórias suaves e agradáveis. O falecimento de uma pessoa significativa provoca o 
desaparecimento proveniente de um elo, um vínculo, entre uma pessoa e seu objeto. 
Isso conduz a um sofrimento em etapas comuns como: sentimentos de dor, de culpa, de 
tristeza, de fúria, e de falta de interesse pela vida, entre outros. O luto, 
consequentemente, seria uma resposta à perda, bem como, um processo de 
reconstrução e reorganização diante da morte. Esse processo exige uma provocação 
emocional e cognitiva com o qual o enlutado tem de lidar. 
 Encontramos no ser humano, um espectro imaginário, onde amor e ódio, 
solidariedade e inveja, doação e espoliação, humildade, orgulho e arrogância, 
criatividade de destrutividade, são por vezes antíteses, que convivem em todos de 
modos peculiares. No mundo real o indivíduo tem que conviver com esses aspectos, são 
humanos. Aparentemente o ser humano esta dividido em um lado bom e outro mau. A 
psicanálise descobriu que: a melhor forma de lutar contra a morte é fortalecendo o lado 
da vida, como também, evitar juízos de valor, e qualquer outra atitude que não seja fazer 
o indivíduo tomar consciência daquilo que lhe é inconsciente e que, recalcado, pode 
sabotar, impedir ou dificultar sua vida, sua criatividade, sua felicidade, e o que mais for a 
cada um. 
 As descobertas da psicanálise em relação à sobre determinação inconsciente na 
vida das pessoas abriu uma ferida narcísica na humanidade, que se viu sem o comando 
de seus atos e comportamentos e que leva muitas pessoas a não aceitarem essa área 
do conhecimento. A tomada de consciência da morte, da finitude do ser humano, 
constitui-se em outra ferida, ainda mais aterrorizante, pois em relação à morte nada é 
sabido. Vem a necessidade de criar “verdades” para esvaziar esse terror, verdades 
essas que podem ser da ordem e domínio da fé. Dessa forma, a Psicanálise tem um 
importante papel no acolhimento e escuta clínica do ser humano portador de um 
sofrimento intenso no processo de enfrentamento de perdas, morte e luto. Assim, ao 
lidar com a vida, também trabalha a morte e tudo o que dela decorre para o sujeito. 
Torna-se interessante falar não só da existência e vida, mas também da morte em todas 
as suas formas e representações, não apenas sobre o cessar da existência. 
 
 
5 
 
1. O homem: visão da morte através dos tempos 
 Todas as sociedades, desde as mais antigas até as atuais, criaram diversos 
sistemas fúnebres pelos quais podiam se entender com a morte em seus aspectos 
pessoais e sociais. KOVÁCS (1992) relata que desde o tempo dos homens das 
cavernas há inúmeros registros sobre a morte como perda, ruptura, desintegração, 
degeneração, mas, também, como fascínio, sedução, uma grande viagem, entrega, 
descanso ou alívio. 
 Um estudo de epitáfios gregos e latinos revela que a morte despertava uma 
ampla variedade de emoções e atitudes, apesar de geralmente ser encarada como um 
mal. Os europeus viam a morte com seus próprios olhos, mas também pelo princípio 
teológico. Nem todos aceitavam esta resposta. Os fariseus agarravam-se à crença na 
ressurreição dos mortos, e os romanos ocupavam-se com rituais para assegurar a 
imortalidade. A partir disto, no Novo Testamento foi proclamada a vitória sobre a morte, 
tendo a prova com a ressurreição de Crista, segundo Kastenbaum e Aisenberg (1983). 
A sociedade quando deparada com um intenso encontro com a morte, muda sua 
conduta diante da mesma. Trata da morte como um rito de passagem para a morada 
definitiva da alma, a derradeiraperegrinação do homem-viajante medieval. 
 Como o mundo dos vivos estava ligado ao dos mortos, afirma Aires (1989), a 
morte era encarada com tranquilidade e resignação, assim a morte foi domesticada nas 
consciências dos cavaleiros e clérigos, ela foi esperada e reconhecida, ou até mesmo 
desejada. A morte torna-se macabra com a angústia dos tempos da “Peste Negra” e da 
“Guerra dos Cem Anos”. Ao final da Idade Média, novas e negativas formas de 
compreensão da morte tomaram conta dos espíritos, surgem pinturas de parede e 
gravuras em madeira, exprimindo a profunda angústia. A visão teológica da morte 
passou a ser vista com pavor, não encontrando consolação na Igreja, estando na origem 
de muita aflição, tormento e terror. Nesse período a morte era considerada o castigo de 
Deus para o homem, sendo esta, a revelação de suas culpas e indignidade. 
 No Renascimento em virtude da redescoberta e revalorização das referências 
culturais da antiguidade clássica, que nortearam as mudanças na direção de um ideal 
humanista e naturalista, são descritas as transformações que ocorreram. A preocupação 
crescente com a morte, um terror físico e teológico achou expressão nas artes do século 
XIV, tornara-se um objeto de percepção e de pensamento. Ela inspirou poetas, músicos, 
artistas e homens comuns. Os artistas da época renascentista consideravam que os 
gregos e romanos possuíam uma visão completa e humana da natureza, incluindo 
 
6 
 
também o pensamento sobre a morte. Ocorreram mudanças evidentes na cultua, na 
sociedade, na economia, na politica e na religião, caracterizando a transição do 
feudalismo para o capitalismo. Suas principais características eram o racionalismo em 
oposição à fé; o antropocentrismo em oposição ao teocentrismo; e o individualismo em 
oposição ao coletivismo cristão. 
 A divulgação dos conhecimentos da Antiguidade Clássica foi uma das principais 
causas do desenvolvimento cultural. Diversos intelectuais e artistas bizantinos 
emigraram para a Itália, levando valiosos manuscritos de poetas e filósofos gregos. As 
qualidades mais valorizadas do homem passaram a ser a inteligência, o conhecimento e 
o dom artístico. Enquanto na Idade Média a vida do homem devia estar centrada em 
Deus, num teocentrismo, nos séculos XV e XVI o homem passa a ser o principal 
personagem, num antropocentrismo. A razão e a natureza passaram a ser valorizados 
com muita intensidade 
 Os trabalhos dos alquimistas estavam presentes nesse período, tendo os 
objetivos inter-relacionados: de alterar ou transformar materiais básicos em outros mais 
valiosos; de transformar uma matéria básica em espirito; e em suma, de libertar a alma. 
A alquimia verificada à luz do simbólico e não do cientifico, pode ser considerada como 
um dos estudos do inconsciente. Os alquimistas projetavam seus processos internos 
naquilo que estavam fazendo, e, à medida que realizavam suas operações, passavam 
por experiências profundas lado a lado com outras espirituais. Por volta do século XVIII, 
a crença de que ser enterrado próximo aos túmulos dos santos ou de suas relíquias, 
perto do altar dos sacramentos, ou sob as pedras da nave garantiam ao defunto uma 
intercessão especial dos santos e o direito assegurado de salvação, segundo Maranhão 
(1998). O aspecto do sagrado estava inserido no contexto da época, pois a proximidade 
dos lugares, objetos e indivíduos que representavam este aspecto, garantiam a salvação 
depois da morte. 
 Apesar de os homens temerem a morte, eles encontravam maneiras peculiares 
de se relacionarem com ela. Os sistemas fúnebres foram se modificando e sofisticando 
na medida em que ocorria o desenvolvimento sociocultural. Porém cada cultura 
desenvolveu seus métodos funéreos de modo característico. “Mitos e ritos sobre a morte 
são incontáveis; todas as culturas criam uma forma especial de imaginar e contar a 
própria versão, estruturando as características coletivas das diferentes civilizações”, 
afirma Callia (2005). Para o autor os rituais fúnebres se desdobram em outros ritos com 
significados, detalhes e funções específicas, trazendo as diversas possibilidades que a 
 
7 
 
morte evoca, dependendo das crenças, das condições ambientais, políticas e 
socioeconômicas de cada povo. E assevera ainda que “as transformações significativas” 
desde a última metade do século XX, quando o desenvolvimento técnico-científico se 
impôs na vida moderna, contribuíram para que a morte fosse algo a ser esquecido, e 
assim, a interrupção definitiva da vida passou a ser menos considerada. Cada vez mais 
os rituais estão perdendo força e se distanciando, apontando para uma banalização da 
morte, “já não se morre mais como antigamente; já não temos mais tempo para a morte 
ou para morrer”. 
 O materialismo e o racionalismo passaram a ser mais valiosos do que aquilo que 
é natural e espiritual. A morte inclusive. Assim, o homem se distanciou dos rituais 
fúnebres e a morte passou a ser algo vulgar. Morin (1997) afirma que “a espécie 
humana é a única para a qual a morte está presente durante a vida, a única que faz 
acompanhar a morte de ritos fúnebres, a única que crê na sobrevivência ou no 
renascimento dos mortos”. Entretanto, esse autor atenta para o fato de que ao mesmo 
tempo “que se pretenderá imortal, o homem designar-se-á a si próprio como mortal. 
Assim a mesma consciência nega e reconhece a morte, nega-a como aniquilamento, 
reconhece-a como acontecimento”. 
 
2. Morte e desenvolvimento humano 
 A morte e o luto são questões que fazem parte do cotidiano da vida e do viver 
de todo o ser humano sem exceção. É importante e necessário aprender a lidar com 
essa temática de forma a amenizar a dor causada pelas perdas. Muitos são os aspectos 
envolvidos na ausência e perda de um ente querido, pela morte, seja ela de diferentes 
formas: doença; de forma repentina; por acidentes; morte na visão sociocultural, 
separações e danos, entre outros. Esse tema sugere uma reflexão sobre aspectos e 
significados culturais da morte – de forma subjetiva - e a dor do luto vivenciada por 
todos, por meio da morte em si mesma ou de alguma perda afetiva, emocional. Portanto, 
na sua essência, o cotidiano daqueles que enfrentam a morte seja ela na realidade, seja 
no simbólico. 
 Na contemporaneidade, a sociedade ocidental compreende a morte como sendo 
um tema interditado, um tabu e sinônimo de fracasso profissional para quem trabalha na 
área da saúde. No mundo familiar a morte está ausente, segundo Costa & Lima (2005), 
pois esse momento foi transferido para os hospitais, assim como as crianças ficam 
impedidas pelos adultos de participarem dos cerimoniais de despedida daquele ente 
 
8 
 
querido que faleceu, que desapareceu. A morte praticamente tornou-se uma inimiga que 
precisa ser combatida e silenciada a qualquer custo. 
 A palavra “morte” possui muitos atributos associados, como: dor, ruptura, 
interrupção, desconhecimento, e tristeza, de acordo com França e Botomé (2005). É 
uma expressão que designa o fim absoluto de um ser humano, de um animal, de uma 
planta, de uma ideia, de uma crença. Em posição antagônica, coexiste a morte com a 
vida, o que não impede de ser angustiante, incluir medo e ao mesmo tempo, ser musa 
inspiradora de filósofos, poetas, artistas e psicólogos. As palavras não conseguem 
expressar o que é imaginado como terrificante e por isso mesmo, não deixar 
transparecer. Para indicar a morte é usual faze-lo por meio de eufemismos: o “fim”, a 
“passagem”, a “destruição”, o “passamento”, entre outras formas de manifestações, para 
expressar o inexpressável. Paralelo a isto, instaura-se o medo da morte, a repugnância 
ao cadáver e a instalação do olhar. Porém por tradição cultural ou familiar, e mesmo 
desde o infantil, por investigação pessoal cada um traz dentro de si “uma morte”, ou 
seja,a sua própria representação de morte. 
 Durante séculos, o homem conseguiu dominar o medo da morte e traduzi-lo em 
palavras. Desde os tempos do homem das cavernas, há registros sobre a morte como 
perda, ruptura, desintegração, ou degeneração, como também, sabe-se que havia um 
fascínio, uma sedução, uma entrega, uma grande viagem, descanso ou alívio, segundo 
Kovács (1992). A autora aponta para a questão do entrelaçamento entre vida e morte, 
durante todo o processo de desenvolvimento vital do indivíduo. Afirma que “engana-se 
quem acredita que a morte só é um problema no final da vida, e que só então deverá 
pensar nela. Podemos, é claro, tentar esquecer, ignorar ou mesmo ‘matar’ a morte”. 
 A busca pela imortalidade surgiu desde todos os tempos. O homem desafia e 
tenta vencer a morte. A morte do dragão ou do monstro presente nos mitos e lendas, 
simboliza a atitude do homem, mostrando que os heróis conseguem essa façanha, 
porém os mortais não. Desafiar, romper os limites é o grito de vida, é a identidade de um 
novo ser que rompe barreiras, extravasa limites, a fim de configurar os contornos da 
própria identidade. No momento em que não há lugar para a morte é que ela está mais 
presente. A sociedade permitia os ritos familiares, e a brevidade melancólica de um fim 
anunciado, era tratado com dignidade, sem fugas ou falsificações. 
 Os avanços na medicina trouxeram o aumento da expectativa de vida e também 
a crença de que sempre haverá recursos para postergar a morte. Com isso amplia a 
posição social que impede de falar sobre o tema, assim as pessoas não estão 
 
9 
 
preparadas para enfrentar a finitude dos entes queridos e tampouco a sua própria 
finitude. Há um viver e um ignorar sobre a existência da morte, e o agir humano constitui 
num continum, como se ela fosse algo improvável. Negar a morte é não querer entrar 
em contato com as experiências que nos causam sofrimento, permitindo, assim, 
segundo Kovács (2002), fantasiar a ilusão da imortalidade, dando a ideia de força e de 
controle sobre o medo da morte. 
 Dialogar sobre a morte é importante porque este tema possui uma magnitude de 
significados que, ao se desvelar, pode tornar sua aceitação mais fácil. É preciso 
desenvolver uma cultura de diálogo que permita ao ser humano entrar em contato com o 
processo da morte sua e do outro. Dizer para os familiares sobre o que deseja que seja 
feito no momento da própria morte e falar do que acredita que acontecerá depois da 
partida pode ser uma forma de auxiliar a desmistificar o “fantasma” chamado morte. 
Quando a morte chega, para muitas pessoas é o momento de tomada de consciência 
das coisas que ficaram inacabadas ou malfeitas, do que precisa ser feito para 
fechamento de algumas situações, ou de assuntos e que, muitas vezes, precisamos 
perdoar a si mesmos ou a alguém. 
 Uma das formas de não entrar em contado com as experiências dolorosas é 
negar a morte, de acordo com Kovács (2005). A grande dádiva da negação e da 
repressão é permitir que seja vivido um mundo de fantasia, onde nele há a ilusão da 
imortalidade. Os sonhos e projetos não seriam realizados se o medo da morte estivesse 
constantemente presente. No ser humano existe o desejo de se sentir único, criando 
obras e realizando projetos que não permitam o seu esquecimento, proporcionando a 
ilusão de que a morte e a decadência não ocorrerão. A fragilidade interna do ser 
humano, sua finitude e sua vulnerabilidade ficam escondidas por essa couraça de força. 
 
3. O ser humano: a morte e o luto 
 No espaço do corpo, coexistem a vida e a morte, desde o início, da concepção. 
Os opostos e os contrários falam da natureza: o inicio e o fim, os segundos e o nada. A 
ideia de morte e sua elaboração, impede as pessoas de lidarem com as perdas, estas 
naturais e que ocorrem inevitavelmente no curso da vida. A morte é inevitável, mas 
ainda existe muito tabu diante dela, interdição diante do fato cujo silêncio é utilizado 
como subterfugio para lidar com o acontecimento. A morte como limite, vivenciada 
como tal ajuda a crescer, mas também, é dor, perda da função, do afeto, das carnes, e, 
é tristeza, solidão, pobreza. A velhice constitui uma das representações mais fortes no 
 
10 
 
imaginário da cultura - uma velha enrugada, magra, ossuda, sem dentes, feia e mal 
cheirosa. Esta visão causa repulsa e terror. Do ponto de vista bioquímico a morte se 
configura como uma falta de regeneração, sendo difícil descobrir qual a sua causa e o 
seu processo. Existe a questão da mortalidade e da imortalidade, pois o ser humano é 
em parte mortal e em parte imortal, carregando dentro de si a raiz da imortalidade. 
 A morte clínica de uma pessoa é definida como um estado onde todos os sinais 
vitais estão suspensos, ainda que uma parte dos processos metabólicos continue a 
funcionar. O conceito de morte clínica surgiu a partir da possibilidade de substituição de 
todas as funções vitais por máquinas, o que pode prolongar a vida indefinida-mente. 
Quando se inicia a destruição das células e órgãos altamente especializados, 
posteriormente os menos especializados, ocorre a morte total. Do ponto de vista 
somático há uma definição, sem maiores problemas, para a constatação da morte, e 
posterior iniciação dos ritos funerais. Do ponto de vista psicológico existem inúmeras 
mortes, em suas mais variadas representações, até ao ponto de negação, agindo como 
se ela não existisse. Inúmeros são os questionamentos em relação a morte, como: 
sobre o que há após a morte; se há uma vida posterior; a vida acaba com a morte. 
 Experiências vividas por indivíduos que estiveram muito próximos da morte 
foram estudadas por alguns autores, numa tentativa de relatar o que seria a experiência 
de morrer, segundo Kovács (1992). O relato de pessoas que sofreram acidentes e 
estiveram muito próximas da morte, bem como casos de pessoas foram ressuscitadas 
após estarem clinicamente mortas, foi estudado por Moody (1975) que observou 
experiências extraordinárias dentre as quais destaca: sensação de serem expectadores, 
ao ouvirem pronunciamento sobre sua própria morte; sensação de paz e quietude, ou 
ruídos intensos; experiência de passarem por um túnel escuro; experiência do individuo 
que se vê acima de seu corpo, sendo que alguns relatam que tentam falar, mas ninguém 
ouve, querem voltar para seu corpo, mas não sabem como; encontro com um “Ser 
Iluminado”, identificado com uma figura divina, cuja imagem está relacionada com a 
história religiosa da pessoa; experiência limite, onde a pessoa sente que chegou ao fim, 
entre outros. Há relatos de que uma experiência como esta foi impactante e provocou 
mudanças na forma de encarar a morte. 
 A resposta mais comum diante da morte é o “medo de morrer”. Esse medo é 
universal e atinge a todos os seres humanos, independente de idade, sexo e nível 
socioeconômico, ou credo religioso. Nenhum ser humano está livre desse medo, e todos 
os medos que se relacionam ao medo de morrer, segundo Feifel e Nagy (apud 
 
11 
 
KOVÁCS, 1992). É difícil diferençar entre medo e ansiedade, pois a ansiedade 
comumente está associada a um sentimento difuso, sem causa aparentemente definida 
enquanto que o medo é geralmente está relacionado a uma causa mais especifica. No 
caso da morte, essa experiência é muito ampla e universal que pode ser pensada em 
ansiedade e medo de forma similar. No Japão, século XIII, Kenko declara que "as 
mudanças ocorridas do nascimento até a velhice, da doença até a morte são ainda mais 
rápidas. As quatro estações, têm uma sequência determinada. Assim, a hora da morte 
não espera a sua vez”. E segue dizendo que, “ela não vem necessariamente de frente, 
pode estar planejando o seu ataque por trás. Todo mundo sabe da morte, mas ela chega 
inesperadamente, quando as pessoas sentem que aindatêm tempo, que a morte não é 
iminente”. E na sequência, afirma o autor que “é como as planícies secas que se 
estendem mar adentro, para que a maré chegue, inundando o seu caminho até a praia" 
(Meltzer, apud KOVÁCS, 1992). 
 Duas concepções em relação à morte são consideraras de acordo com a 
pessoa, em função da sua ansiedade e percepção. Quanto à morte do outro, surge o 
medo do abandono, da retaliação e perda da relação, envolvendo a consciência da 
ausência e da separação. Um sentimento de impotência pelo fato de não poder fazer 
nada dificulta ver o seu sofrimento e desintegração. Quanto à própria morte surge a 
consciência da própria finitude, a fantasia de como será o fim e quando ocorrerá pela 
manifestação de um medo do sofrimento e da indignidade pessoal. Existe um pensar 
relacionado ao que vem após a morte, e o medo do julgamento, do castigo divino e da 
rejeição. O desconhecido sempre constitui uma ameaça, trazendo um medo da própria 
extinção, o medo de não ser, entretanto, em relação à morte do outro, a extinção evoca 
a vulnerabilidade pela sensação de abandono. 
 Dependendo da época de cada um e as circunstâncias do momento é o que 
parece mais temido, como por exemplo, o perigo iminente devido a situações externas 
de guerras, crimes, violência. Existem também as perturbações internas que ameaçam o 
sujeito, como por exemplo, os medos e fobias, ou mesmo a morte de alguém. Lidar com 
a morte de forma mais concreta e expressar o luto é muito variada. Pode ocorrer uma 
superação rápida como também ao extremo da obrigação de mostrar aos outros a dor, a 
tristeza e o desespero por um longo período de tempo. É difícil sobreviver à ausência de 
pessoas queridas, as quais tornam os indivíduos aptos a recomeçar a vida sem a 
presença daquele que se foi. O luto é compreendido como uma importante transição 
psicossocial, com impacto em todas as áreas da influência humana, de acordo com 
 
12 
 
Parkes (1998). Ele considera os diferentes caminhos da experiência de ter um vínculo 
rompido pela morte e as consequências dessa vivência em âmbito somático, social, 
emocional e cultural. Constitui em uma dor causada pela perda ou morte de alguém, ou 
por grande calamidade, e que provoca um pesar ou tristeza pelo ocorrido. 
 De acordo com a cultura, a cor preta é uma simbolização do luto, segundo 
Kovács (ob. cit.), pois no Ocidente, costumou-se usar o preto em um tempo que data do 
paganismo. O preto, em sua origem constitui uma maneira de expressar o medo, um 
horror aos mortos. Constitui a essência de um disfarce a fim de que o fantasma do morto 
não reconheça e não persiga os que ficaram vivos. Para essa autora, a cor preta 
conteve o simbolismo da noite e a ausência de cor para expressar o abandono e a 
tristeza. Essa cor também facilita a lembrança de que ocorreu uma perda, além de 
sugerir às pessoas que tenham atitudes especiais para com o enlutado, evitando falar de 
coisas que pudessem magoá-lo. 
 A palavra “Luto”, traduzida do alemão, “trauer”, significa “o afeto da dor como 
uma manifestação externa”. O luto no entender de Freud (1915) constitui na reação à 
perda de um ente querido ou à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um 
ente querido como: os pais, a liberdade ou o ideal. Para o autor, o luto, é um período de 
tempo necessário para a elaboração progressiva da perda do ser amado que fica 
introjetado sem maiores conflitos, e que a pessoa enlutada consegue desligar-se 
normalmente dele. O sofrimento no luto, além daqueles encontrados ordinariamente, 
pode envolver graves sofrimentos, porém não necessariamente se constitua um luto 
patológico. O luto compõe vários elementos de um processo mental através do qual o 
equilíbrio psíquico é restaurado após a perda de um objeto amoroso significante. 
Constitui-se em uma reação normal a qualquer perda de importância, não apenas em 
conexão com a morte real de uma pessoa amada. O luto vem geralmente acompanhado 
pela perda de interesse pelo mundo externo, cujo humor predominante é o do 
sofrimento, bem como, de uma preocupação com lembranças do objeto perdido e 
diminuição da capacidade de efetuar novos investimentos emocionais, de acordo com 
More & Fine (1992). Com o passar do tempo, o individuo se adapta à perda e renova 
sua capacidade de encontrar prazer em relacionamentos, porém outras vezes esse 
movimento não ocorre, a adaptação é relativa, o pesar e o luto permanecem pela vida. 
 A dor do luto é como todas as outras, um enigma persistente. Produz, na pessoa 
do enlutado, um estado psíquico resultante da perda desse alguém muito querido. Pode 
provocar angústia e dor, como também, um quadro geral de reação depressiva, que 
 
13 
 
para superar precisa do que Freud concebeu como o “trabalho de luto”. Essa tarefa 
compreende a realização de um esforço, afirma o autor, pois a libido investida no objeto 
perdido precisa ser desligada das lembranças, fantasias e esperanças que cercavam a 
ligação. Só depois disso, afirma Zimerman (2001), num tempo não excessivamente 
longo, o ego do sujeito volta a ser livre para levar uma vida normal. 
 A compreensão do caráter doloroso do luto é apontada por Bowlby (1998), como 
um conjunto de sentimentos por vezes antagônicos, tais como: um desejo de busca pela 
figura perdida, sentimento de culpa e alto grau de desorientação relacionado ao quadro 
da perda. Sentimentos ambivalentes são desencadeados por esse processo ressalta o 
autor, ao afirmar que “a perda de uma pessoa amada dá origem não só ao desejo 
intenso de reunião, mas também à raiva por sua partida” (BOWLBY). A sensação de 
injustiça frente ao abandono pode provocar a demonstração de raiva. A morte deixa a 
todos em desamparo, apartados daquele a quem amaram. 
 Fica então a questão: “O que é o luto?” Certamente é uma discussão que não se 
esgota, porém pode ser tentada uma resposta, assevera Nasio (1997). O luto é a reação 
à perda de um objeto de amor. “Como explicar que o luto seja tão penoso e doloroso?” 
Esse autor, afirma que “o luto é uma retirada do investimento afetivo da representação 
psíquica do objeto amado e perdido. O luto é um processo de desamor e se constitui 
num trabalho lento, detalhado e doloroso. Ele pode durar dias, semanas e até meses. 
Ou ainda toda uma vida...”. O processo de luto é vivenciado pelas pessoas de forma 
individual, o que torna inadequado estipular um prazo para o seu término; mas admite-se 
a existência de um padrão comum de tempo para a maioria dos casos, no qual o 
indivíduo, aos poucos, vai aprendendo a conviver com sua perda. 
 O luto tem como característica a perda de um elo significativo entre uma pessoa 
e seu objeto, e como tal, um fenômeno mental natural e constante durante o 
desenvolvimento humano, não se limitando apenas à morte, mas ao enfrentamento das 
sucessivas perdas reais e simbólicas durante o desenvolvimento humano. Deste modo, 
pode ser vivenciado por meio de perdas que perpassam pela dimensão física e psíquica, 
como os elos significativos com aspectos pessoais, profissionais, sociais e familiares do 
indivíduo. O simples ato de crescer, como no caso de uma criança que se torna 
adolescente, vem com uma dolorosa abdicação do corpo infantil e suas significações, 
igualmente, o declínio das funções orgânicas advindo com o envelhecimento. A 
capacidade de o indivíduo, desde a infância, se adaptar às novas realidades produzidas 
 
14 
 
diante das perdas servirá como modelo, compondo um repertório, reativado em 
experiências ulteriores. 
 Em outras formas de perdas que não pela morte real, os processos mentais de 
luto também ocorrem. O pesar e o luto podem igualmente resultar de perdas de 
representações abstratas de uma entidade significativa, como: liberdade do próprio país 
ou a crença de um ideal, entre outras. É possível que ocorram processosde perda a 
objetos inanimados altamente investidos, como o lar, um emprego, mudanças (casa, 
cidade, escola, amigos, saída de casa dos filhos, etc.) qualquer coisa que represente 
uma fonte importante de segurança ou de dedicação e investimento de libido, até 
mesmo o fim de uma análise. As reações em um luto patológico incluem a ausência 
defensiva do luto, bem como, as reações prolongadas de pesar que perpetuem a 
representação do objeto perdido através de “objetos vinculares”. 
 
4. O processo, a dor da perda e luto patológico 
 Freud (1915), em “Luto e Melancolia” explica que entende o luto como uma 
reação à perda, e não necessariamente uma perda de uma pessoa querida, mas como 
algo que tome as mesmas proporções. Portanto, tem a ideia clara de que é um 
fenômeno mental natural e constante durante o desenvolvimento humano. Para o autor, 
nada existe de inconsciente a respeito da perda, no luto. Interpreta que o enlutado sabe 
exatamente o que perdeu. O luto é um processo natural instalado para a elaboração da 
perda, que pode ser superado após algum tempo e, por mais que tenha um caráter 
patológico, não é considerada doença, sendo assim, interferências se tornam 
prejudiciais. 
 A natureza do objeto do luto é distinguida por Freud, quando reconhece o “luto 
normal” e o “luto patológico”, ou seja, o luto normal da melancolia. Desse modo, Freud 
diz: “Enquanto no luto normal a perda é consciente, no luto patológico a perda é 
inconsciente. O melancólico pode saber quem perdeu, mas não sabe o que perdeu na 
pessoa desaparecida”. Lacan, tratando do luto, fala como se se tratasse de uma única 
forma de luto, o “luto patológico”. Na diferenciação freudiana sobre o luto, observa-se 
que toda a problemática do “objeto a” (pequeno), esta contida na diferenciação que faz 
do luto. A questão do luto é enriquecida por Melanie Klein (1940) com seu importante 
trabalho “O luto e suas relações com os estados maníaco-depressivos”, onde a autora 
relaciona os objetos externos com os objetos internos. Ela considera a distância entre o 
“luto patológico” e o “luto normal” como uma distância de grau e não de estrutura. 
 
15 
 
Entretanto, não basta separar o luto normal do luto patológico, pois saber quem foi 
perdido não torna claro, como também, não se encontra infalivelmente essa parte 
inconsciente em todas as formas de luto. O luto patológico na teoria kleiniana, 
corresponde a uma não superação da posição depressiva do desenvolvimento. Isso é 
crucial para o estabelecimento forte de objetos bons no mundo interno, como também 
para se sentir seguro deste. Dessa forma, na questão patológica do luto há uma 
interminável ligação como o objeto perdido, uma indiferença pela perda, resultado de um 
abafamento de sentimentos. Nesse caso, se o ego recorre a uma retirada para os 
objetos internos bons pode causar uma psicose grave, ou se ele recorrer a uma fuga 
para os objetos externos bons pode desenvolver uma neurose. 
 Na consolidação da clínica são encontradas as questões do “luto normal” e “luto 
patológico”. A melancolia foi uma das primeiras doenças mentais sistematizadas e 
tratadas pela medicina. No luto normal, nem sempre se encontram as autoacusações do 
melancólico, pois é constatado que a queixas deste não se dirigem ao “objeto perdido”, 
mas “a si mesmo”. Freud, inspirado em questionamentos com Abraham, conclui que: 
“as críticas não são verdadeiras autocríticas. Essas críticas se referem ao objeto 
incorporado no eu”. Assim Freud propõe então a tese de que “o eu do melancólico 
incorpora o objeto perdido e se identifica com ele”. Este objeto está na base da noção 
lacaniana do “objeto a”. Essa tese da identificação com o “objeto perdido” é bastante 
geral e válida tanto para a melancolia como para o luto patológico ou para o luto normal. 
 Toda a libido do amante que investia o objeto quando ele estava vivo voltaria para 
o eu depois da morte do amado, portanto, ocorre uma retirada da libido pela 
identificação narcísica como o objeto. Esse é o movimento subjacente à apropriação 
narcísica do objeto amado e desaparecido. O objeto amado e perdido não se trata da 
pessoa do morto, mas da sua representação ou da sua imagem no inconsciente daquele 
que permanece vivo - o enlutado. São as representações mentais do enlutado, do 
amante, e não da pessoa amada, aquela que se foi e que recebia os investimentos 
afetivos. Estas representações são as “representações de coisas inconscientes” 
relativas ao objeto amado e desaparecido. O lugar da retirada da libido para o eu é a 
partir das “representações de coisas” do objeto amado e perdido. O “amado” quer dizer 
eleito por uma escolha narcísica. Então, segundo Nasio (1997), em outras palavras, “a 
libido se retirou das representações do objeto de amor, para reportar-se sobre uma parte 
muito precisa do eu”, que Freud chama de “prova da realidade para o exterior”. 
 
16 
 
 Nasio aponta que “o que se perde com a morte do ente querido é, primeiro, a 
imagem de mim mesmo que ele me permitia amar. O que perdi, antes de tudo, é o amor 
de mim mesmo, que o outro tornava possível. Isso significa que o que se perde é o eu 
ideal, ou mais exatamente o meu eu ideal ligado à pessoa que acaba de desaparecer”. 
Com a morte de um ser amado, perde-se um determinado eu ideal, próprio da relação 
de amor e de desejo. Aquele que partiu, não era o eu ideal do que ficou, mas o suporte 
real desse eu. Entretanto com sua morte, o outro levou o suporte do vivo que era a sua 
pessoa, isto é, o seu cheiro, a sua voz. O encanto de sua presença. O que é perdido ao 
perder alguém amado é a pulsão, o corpo pulsional, o objeto pulsional que dava 
consistência à imagem daquele que fica – o eu ideal - que ele dava a amar. Cabe 
lembrar aqui, a releitura da formula de Lacan: “fazemos o luto daqueles de quem fomos 
o objeto, isto é a falta”; também “fazemos o luto daqueles que, por sua vez, foram para 
nós o objeto, a falta, o suporte pulsional do nosso eu ideal”. 
 Com a morte do outro, o enlutado não perdeu a pulsão, pois continua vivo. Com 
certeza perdeu a “voz”, este objeto da pulsão, porém a pulsão se desloca e se transpõe. 
Ao escrever “Sobre a transposição das pulsões”, Freud afirma que existem 
deslocamentos dos objetos da pulsão. Nasio levanta a hipótese de que “a dor (...) um 
objeto da pulsão transitória, provisória, como se fosse necessário que o sujeito, sob o 
choque da morte do outro, não deixasse de exercer a sua atividade pulsional, e isso 
apesar das inibições próprias da fase do luto”. E segue o autor afirmando, em sua 
proposta da “dor do luto como objeto de pulsão”, que “entre a voz que parte e a que 
talvez virá, intercalo a dor”. 
 A elaboração do luto constitui numa lenta e minuciosa retomada de cada um dos 
detalhes do vínculo que ligava o sujeito ao objeto amado e agora perdido. Nesse 
trabalho do luto, cada lembrança do morto é tratada pelo eu, com: a focalização de cada 
lembrança e de cada imagem ligadas ao objeto perdido, o que produzirá um 
desinvestimento das mesmas; a libido destacada da imagem mental do outro, é 
transportada para uma grande parte do eu. Precisamente este movimento que produz a 
identificação é que produz com a imagem do objeto. Cabe lembrar que o procedimento 
de focalização de cada uma das representações inconscientes do – chamadas de 
“lembrança” ou “imagem” – consiste em um superinvestimento afetivo. Assim, a 
elaboração do luto ocorre nos parâmetros: superinvestimento, seguido de 
desinvestimento, e posteriormente transporte do afeto para a identificação – conjunto do 
eu. A dor, e há dor, é por causa do desligamento, da separação e da dissolução do 
 
17 
 
vínculo. A dor é gerada na operação do re-centramento e do superinvestimento do 
vinculo psíquico com o objeto; é a dor de apertar fortemente os laços com a 
representação do outroausente; dos investimentos que deixam a representação de 
objeto para difundir-se no eu como investimento narcísico. 
 Melanie Klein e outros autores consideram a dor como sendo efetivamente 
devida à perda propriamente dita. A dor é provocada por uma lesão do eu, concebido 
como um corpo que sofre porque a perda do amado lhe arrancou uma parte de si 
mesmo. A dor não é ligada imediatamente à perda, mas ao trabalho do luto, entendendo 
este como significando uma “reação à perda”. Aqui, se tratam de uma dor psíquica, 
distinta da dor física, ambas importantes, e não se deve ao destacamento, mas ao 
superinvestimento. Freud assim escreve: “A dor corporal”, que constitui uma excitação 
pulsional constante, “supõe um superinvestimento da representação psíquica do local 
lesado no corpo”, portanto não se trata da representação do objeto. E o autor acrescenta 
que “essa definição da dor não leva em conta uma dor como a do luto”. Quando há uma 
dor física, segundo Freud (1926), ocorre um alto grau de catexia narcísica da parte do 
corpo que sente a dor. Na dimensão psíquica diante de uma situação dolorosa, essa 
catexia esta concentrada no objeto do qual é sentida a falta, ou que está perdido por não 
poder ser apaziguado, essa catexia tende a aumentar com firmeza. A dor na dimensão 
mental produz a mesma condição econômica que é criada diante de uma dor física. A 
transição da dor física para a mental corresponde a uma mudança da catexia narcísica 
investida na parte danificada do corpo, para a catexia de objeto - perdido e do qual sente 
falta. A dor responde a uma alta concentração de libido na representação psíquica de 
um objeto que, na realidade foi perdido ou ferido. O superinvestimento afetivo de uma 
representação significa um maior apego no interior ao objeto que não está mais no 
exterior. 
 A dor do luto não é dor de separação, mas dor de ligação. Portanto, no 
entendimento de Nasio, “O que dói não é separar-se, mas apegar-se mais do que nunca 
ao objeto perdido”. A dor do luto não é somente aquela que é sentida quando o amado 
desaparece, é também um sofrimento do qual não existe a consciência. Tanto o 
sentimento inconsciente quanto a dor inconsciente resultam da percepção endopsíquica 
dos movimentos pulsionais. O luto concebido como um trabalho faz pensar que não se 
perde alguém quando ele morre, mas apenas esse alguém é perdido depois de um 
longo trabalho, para o declínio do mesmo num processo laborioso de diversos retornos 
do recalcado. 
 
18 
 
 O luto não começa com a morte, de acordo com Bromberg (1994), pois ele já 
esta sendo determinado a partir da qualidade das relações familiares existentes antes 
dela, pela condição natural dos vínculos estabelecidos e, também afetado por condições 
atuantes mais próximas à morte. O luto, mesmo quando considerado normal, não 
significa que não seja doloroso ou que não exija grande esforço de adaptação às novas 
condições de vida, e, dito normal por parte de cada um dos indivíduos afetados quanto 
do sistema familiar, que sofre também o impacto em seu funcionamento e em sua 
identidade. 
 No processo interno de luto a pessoa magoada inicialmente é incapaz de retirar 
do objeto perdido, o apego, embora o teste de realidade seja preservado e confirme que 
o objeto amado não mais existe. “O enlutado volta suas costas à realidade através da 
denegação e aferra-se à representação mental do objeto perdido”, afirma More & Fine 
(1992), e “a perda é transformada em perda do ego”. O equilíbrio psíquico é restaurado 
através dos estágios do processo do luto, a perda é gradualmente curada, e assim, 
restaurado o equilíbrio psíquico. O trabalho do luto inclui fases sucessivas e inter-
relacionadas com o sucesso de cada uma delas: a) compreensão, aceitação e 
enfrentamento da perda e de suas circunstâncias; b) a retirada dos apegos ao objeto 
perdido e das identificações com ele, o que vem a constituir um luto propriamente dito; c) 
a retomada da vida emocional em harmonia com o próprio nível de maturidade, o que 
envolve o estabelecimento de novos relacionamentos, portanto, reinvestimentos. 
 Fatores internos e externos afetam a capacidade que uma pessoa possa ter para 
completar o processo do luto, em qualquer idade; envolve o amadurecimento emocional, 
a capacidade de tolerar afetos penosos, autonomia da regulação da autoestima, grau de 
dependência no objeto perdido e as circunstancias da perda. Na infância, a elaboração 
do luto depende de fatores evolutivos que incluem o nível de constância objetal e do self, 
a capacidade de apreender os aspectos concretos da morte, a tolerância quanto aos 
afetos penosos e relacionamentos de apoio dos pais. 
 Apesar de todo o desenvolvimento do estudo sobre o luto e da melancolia, o 
processo de luto ainda permanece muito misterioso, segundo Abraham (1924). O que se 
observa é que este processo também envolve qualidades inconscientes, sem por isso 
desembocar numa melancolia. A experiência clínica, desde a época clássica freudiana 
até os dias atuais, mostra que a perda de uma pessoa amada pode fazer emergir outros 
tipos de perturbações psíquicas, ampliando os conhecidos destinos do luto, ou da 
melancolia. 
 
19 
 
5. Teoria do Apego: laços afetivos, formação e rupturas 
 A perda da pessoa amada com a qual são mantidos vínculos afetivos representa 
muita dor e ameaça. Quando alguém morre, de acordo com a “Teoria do Apego”, o 
individuo é remetido a sensações básicas experimentadas como quando ainda bebê em 
face do afastamento da mãe. Possivelmente no enlutado permanece uma ameaça sobre 
a própria sobrevivência. Surge o medo de não suportar essa ausência, de não 
sobreviver sem aquele que perdeu e uma vontade consciente ou não de ir com o morto. 
Esse sentimento pode constituir um desejo de “refazer a díade mãe e bebê”, 
reproduzindo a essa relação da base segura inicial e primeira na construção de todos os 
vínculos subsequentes. As questões do “apego” despertaram o interesse de John 
Bowlby, sobre o desenvolvimento da criança. 
 Em suas vivências e experiências profissionais, Bowlby trabalhou com crianças 
delinquentes e mal adaptadas. Posteriormente, com o advento da Segunda Guerra 
Mundial, a propagação dos conflitos, horrores e os eventos que dela decorreram: 
crianças eram separadas de seus familiares; o resgate de crianças judias evacuadas da 
Alemanha, Checoslováquia, Polônia e Cidade Livre de Danzig (19383 1939); crianças 
eram evacuadas de Londres para mantê-las protegidas dos ataques aéreos; grupos de 
berçários e grupos de crianças pequenas eram organizados, a fim de permitir que essas 
mães contribuíssem para o esforço da guerra, entre outras vivências, o que reforçou o 
interesse do autor, pelo desenvolvimento infantil. Os problemas decorrentes da 
“separação” das crianças eram de interesse de J. Bowlby desde o início de sua carreira. 
Sua atenção também se voltava para os trabalhos de Anna Freud e Dorothy Burligham 
sobre os “desabrigados de guerra” e de René Spitz sobre os “órfãos”. Após anos de 
atividades profissionais, ele havia acumulado um corpo de trabalho teórico e 
observacional para indicar a importância fundamental do apego desde o nascimento 
para o desenvolvimento humano. 
 Nascido em Londres, John Bowbly fez o curso de medicina e especializou-se 
em psiquiatria infantil. Aprofundou seus estudos clínicos sobre os “efeitos da separação 
mãe e filho” na Clínica Tavistock de Londres, onde foi seu diretor (1950). Realizou a 
formação de psicanálise no Instituto de Psicanálise de Londres. Dirigiu estudos e 
pesquisas sobre “crianças privados de lar ou crianças abandonadas”. Na Organização 
Mundial de Saúde foi nomeado Consultor em Saúde Mental. Viveu a experiência de 
internato desde os sete anos de idade, a qual, na fase adultaconsiderou uma época 
terrível de sua vida. Mais tarde teria dito que “eu não mandaria um cão para um internato 
 
20 
 
aos sete anos”. Devido a essa experiência em criança, ele mostrava sensibilidade com o 
sofrimento das crianças por toda a vida. 
 Partindo de fundamentos psicanalíticos, etológicos e cognitivos, para 
compreensão dos vínculos humanos, John Bowlby (1950) elaborou a “Teoria do Apego”. 
Através desses referenciais, ele busca entender a capacidade que as pessoas têm para 
estabelecer ligações afetivas, colocando a formação de vínculos como centrais para a 
espécie humana, bem como para a formação da personalidade. Essa proposição teórica 
se baseia na premissa de que os seres humanos, assim como os animais, apresentam 
uma inclinação natural para construir e manter vínculo com os outros que, ao longo do 
tempo, podem se tornar insubstituíveis. O autor procurou demonstrar e especificar quais 
experiências afetivas são essenciais para a criança desenvolver habilidades, a fim de 
lidar com os desafios que a vida coloca a cada ser humano. A teoria do apego tornou-se 
um importante modelo psicológico que, na atualidade, possibilita elucidar tanto o 
desenvolvimento normal quanto condições psicopatológicas. 
 A dimensão emocional presente nos vínculos de apego constitui, nesse contexto 
de transformações paulatinas, um componente fundamental de um quadro teórico e 
prático bem mais extenso e diversificado. Estudos sobre perda e separação são 
realizados e apoiados na formação e rompimento de vínculos. Isso tem provocado 
mudanças expressivas em relação à valorização da formação de vínculos. Um olhar 
diferenciado da medicina, em especial obstetrícia e pediatria, entre outras áreas da 
saúde, bem como na hospitalização, recai nas bases da teoria do apego. A psicologia foi 
o campo que mais recebeu contribuições e a psicanálise é o campo que mais faz 
abordagem associada à teoria do apego. 
 O interesse de Bowlby era descobrir os padrões reais de interação familiar 
envolvidos no desenvolvimento saudável como no patológico, focando em como as 
dificuldades de apego eram transmitidas de uma geração à próxima. O sistema de 
cuidados maternos se inicia no momento do parto, partindo do ponto de vista da 
etologia, através do contato recíproco entre mãe e bebê. Comportamentos são ativados 
entre ambos, ela com os comportamentos de cuidados em relação ao recém-nascido, e 
ele com comportamentos de procurar e manter-se perto da mãe, segundo Canavarro 
(1999). De acordo com Mary Ainsworth, “a maioria das mães já formou um modo de si 
próprias na relação com os seus bebês, mesmo antes de estes terem nascido, com base 
nas suas experiências com outros filhos ou crianças”. A autora prossegue afirmando que 
“mulheres que apresentam modelos consistentes de relação com os seus filhos, antes 
 
21 
 
deles nascerem, conseguem, posteriormente, estabelecer relação com eles, mesmo 
com circunstâncias difíceis” (AINSWORTH, apud CANAVARRO, 1999). 
 Apoiado nas ideias de Darwin, considerando os aspectos biológicos da espécie 
em relação à busca de proximidade do filhote com adulto, Bowlby (1997), assinala a 
importância do meio. Afirma que “em organismos vivos, estrutura e função só podem 
desenvolver-se num determinado meio ambiente e que, embora a hereditariedade seja 
poderosa, a forma exata que cada um adquire dependerá da natureza desse meio 
ambiente”. De acordo com o autor, um comportamento presente nas primeiras semanas 
de vida, possui a função de suscitar na mãe o comportamento maternal. Com esse 
estudo, Bowlby procurou identificar quais as condições internas e externas ao bebê, 
para possibilitar o sorriso, como também, as condições que o levam a finaliza-lo, 
incluindo sinais visuais e auditivos. 
 Os bebês nascem com uma predisposição a reações que respondem a sinais, 
segundo Golse (1992), estes “derivados ao mesmo tempo de informações advindas do 
organismo como a fome, e outras provenientes do meio ambiente como frio e calor”. A 
autora aponta outros tipos de reações que visam “garantir a proximidade com o 
individuo, em particular a mãe, que será preferida entre todos”. Para Golse a criança ao 
nascer estaria pronta para a sucção, dotada de reflexos de enraizamento e 
comportamentos de reflexos arcaicos que se organizam progressivamente em torno de 
uma figura materna. Entretanto Bowlby propõe que o “comportamento de apego” é 
resultado da necessidade inata de aquisição, com uma dupla função: - proteção: 
segurança trazida por um adulto capaz de defender o bebê vulnerável; - socialização: o 
apego se desloca da mãe para os mais próximos, nos cursos do ciclo da vida, depois 
aos estranhos, e após, a grupos cada vez maiores, tornando-se um fato muito 
importante na estruturação da personalidade da criança. 
 Bowlby em sua Teoria do Apego considerou que o apegamento é um 
mecanismo básico dos seres humano, cujo papel do “apego” envolve o conhecimento de 
que uma “figura de apego” está disponível e oferece resposta, proporcionando um 
sentimento de segurança, o qual é fortificador da relação. O relacionamento da criança 
com os pais, para o autor, é instaurado por um conjunto de sinais inatos do bebê, que 
demandam proximidade. Um verdadeiro vínculo afetivo se desenvolve com o passar do 
tempo, garantido pelas capacidades cognitivas e emocionais da criança, bem como, pela 
consistência dos cuidados, pela sensibilidade e pela responsabilidade dos cuidadores. 
Portanto, Bowlby (1989) propõe como um dos pressupostos básicos da sua teoria que 
 
22 
 
“as primeiras relações de apego, estabelecidas na infância, afetam o estilo de apego dos 
indivíduos ao longo de sua vida”. 
 O sentido básico do “apego”, de acordo com Bowlby (1984), é evidenciado 
quando o bebê procura e se agarra à pessoa que dele cuida, normalmente – a mãe. O 
desenvolvimento desse “apego” é descrito como um processo que segue em etapas: 1ª 
fase - pré-apego: ocorre desde o nascimento até doze semanas, onde o bebê se orienta 
por sua mãe, seguindo com os olhos; 2ª fase - formação do apego: um período que vai 
de doze semanas até os seis meses, momento em que o bebê se apega a uma ou mais 
pessoas do ambiente; 3ª fase – formação do apego: período que se estende dos seis 
aos vinte e quatro meses, onde a criança chora muito e demonstra sinais de perturbação 
quando se separa da figura de apego, a mãe; 4ª fase – período que ocorre entre os vinte 
e cinco meses ou mais, onde a figura materna é vista como independente, e se inicia um 
relacionamento mais complexo entre a mãe e a criança. 
 Durante todo o ciclo da vida, o “comportamento de apego” está presente de 
formas e intensidades variadas. Pode ter formas ativas, como procurar ou seguir o 
cuidador; formas aversivas como chorar; ou ainda aparecer sob a forma e sinais que 
alertam o cuidador para o interesse e interação da criança, como sorrir, verbalizar de 
modos diversos, estes observados em bebês, crianças, adolescentes, adultos e na 
velhice ao buscarem aproximação com outras pessoas. É o padrão desses 
comportamentos, e não a frequência, que revela algo a cerca da força ou qualidade do 
apego, segundo Ainsworth (1989). 
 A necessidade de figuras de apego que proporcionem uma base segura não se 
limita absolutamente às crianças, afirma Bowlby. Porém os padrões de apego 
desenvolvidos na infância, por meio dos modelos internos de funcionamento, tendem a 
se manter e reforçar nas interações com outros. Os indivíduos são propensos a se 
colocar em situações que reforçam os seus modelos precoces de funcionamento 
internos. Até os três anos de vida, a criança vive o padrão da interação com a mãe, e já 
com relevância. A intensidade diminui na medida em que os anos passam e os padrões 
e estabilizam, como resultantes de uma adaptação mútua dos indivíduos darelação, 
segundo Bowlby (1990). Eventos específicos podem modificar os padrões 
aparentemente estáveis, como acidentes, doenças ou nascimento de um filho. Se o 
ambiente familiar permanecer estável em uma dessas situações, os padrões de apego 
também permanecerão inalterados. Quando o ambiente se tornar instável, os padrões 
tendem a se modificar. 
 
23 
 
 A formação e manutenção dos padrões de Apego sofrem interferência de acordo 
com a maneira pela qual a mãe se relaciona com o filho e o grau de previsibilidade do 
ambiente, se estável ou não (separações contínuas, ausências ou intervalos de 
cuidados). O padrão das relações de vinculação e apego nos adultos ocorre de acordo 
com o padrão do Apego formado na infância, segundo Bowlby (1990), ocorrendo por 
meio de atuações nas diversas funções e papeis da vida adulta: na relação do casal, na 
relação parental, nas relações de trabalho, como também nas relações sociais. A 
maneira como a pessoa forma e mantém vínculos exerce forte influência no 
desenvolvimento da personalidade ao longo da vida. A forma como a personalidade se 
estrutura determina a maneira pela qual a pessoa responde a diversos eventos 
relacionados à separação, ou não disponibilidade de figuras com quem mantem vínculo 
afetivo, tais como rejeição, afastamento e perda. Portanto, a qualidade do padrão 
estabelecido e sua persistência é que determinarão a qualidade dos recursos 
disponíveis para o enfrentamento e elaboração de perdas ao longo da vida. 
 A Teoria do Apego oferece a base teórica para o estudo e a compreensão dos 
sentimentos e sintomas frequentemente encontrados na reação à perda, e processo do 
luto. De acordo com o padrão de apego desenvolvido pela pessoa, é que ela encontrará 
os recursos para enfrentamento nas situações de perda. O comportamento de apego é 
investido no outro com “valor de sobrevivência”, e visa manter proximidade com as 
pessoas cuidadoras, buscando como “base segura” para diminuir os riscos causados 
pelo abandono. Dessa forma é explicada a necessidade dos enlutados estarem 
reclusos, em ambientes protegidos e próximos a poucas pessoas, as quais lhe tragam 
apoio, e um mínimo de previsibilidade no ambiente. O luto dessa forma seria então uma 
resposta à separação, um refutar diante da perda. O curso normal de um luto segue uma 
sequência de fases: sentimento de descrença, negação, desamparo, para 
posteriormente surgir um grau maior de consciência da perda, acompanhado de 
sentimentos menos devastadores, e posterior momento de re-organização da vida, e, 
portanto, um concluir do trabalho do luto. 
 O luto deve ser abordado como um processo individual, familiar e social. Em 
caso de morte de um ente querido, o luto recai sobre todos os membros da família e 
coloca o enlutado no contexto familiar e social, com um papel diferente a ser 
desempenhado. A vinculação é o que, essencialmente, determina na pessoa, a 
possibilidade de rompimento dos vínculos. A crença de que todo o ser humano é 
essencialmente vincular e que organiza suas percepções e sentimentos buscando a 
 
24 
 
segurança na proximidade do outro como fator de sobrevivência é uma das teses da 
Teoria do Apego. Assim, supõe-se que o rompimento dos vínculos seja realmente uma 
situação, compreendida como de risco e que remete às sensações primitivas de medo e 
desamparo. 
 
6. Os vínculos e a afetividade 
 Ao longo de toda a sua obra, Freud procurou categorizar os afetos em sua 
essência, natureza e função. Ele não deixou uma teoria dos afetos, porém desde o 
“Projeto par uma psicologia científica” (1895), lançou luz sobre eles ao pondera respeito 
do que cunhou como “ação especifica”. Esta se refere à (afetiva) ajuda alheia na medida 
em que Freud afirma que “um individuo, experiente atenta para o estado (necessidade) 
da criança”. E segue o autor dizendo que “esta via passa a ter, assim uma função 
secundária, da mais alta importância de comunicação, e o desamparo inicial do ser 
humano é a fonte originaria de todos os motivos morais”. Esta ação é fundante do 
protótipo da ajuda sensório-psíquica da qual, todos necessitam desde o nascimento. E 
Freud (ob. cit.) postula ainda que “o ser humano é incapaz de por si só a ação 
específica, ele é auxiliado pelo Outro. A motivação deste só pode ser de impedir a morte 
que, na ausência de sua intervenção seria inevitável”. Portanto, impedir ou minorar o 
sofrimento do semelhante. 
 Essa afirmação freudiana contém a pedra fundamental da aquisição ou não, pelo 
bebê, da noção da qualidade afetiva do objeto e, consequentemente, do que é valioso 
para si mesmo, isto é, do que seja um valor, segundo Franca (2010). Afirma ainda a 
autora, perceber que, o “afeto seja ele positivo de amor, ou negativo de ódio, como o 
movimento psíquico que leva o individuo a afastar-se ou sensibilizar-se com o estado do 
semelhante”. Esse pressuposto freudiano introduz a crença em um naturalismo ético 
relativo ao significado do sensório-erótico-psíquico para a compreensão “do como se 
torna humano” e de seu posterior desenvolvimento. É nessa tríade que a noção “do 
valioso para si mesmo” encontrará sustento. 
 Freud considerava a possibilidade da existência e instalação da 
intersubjetividade desde os primórdios da vida pela via da interferência do “objeto 
externo”, impregnado de sua própria qualidade corpórea afetiva, ou seja, de perceber ou 
de ajudar o desamparo alheio, evitando sua morte. Todos os pensadores pós-freudianos 
mantiveram a concepção de que, para o desenvolvimento das emoções, sentimentos e 
razão, é necessária a vivência intersubjetiva, isto é a experiência interativa das 
 
25 
 
realidades interna-externas entre sujeito e objeto. Quanto mais essa troca for percebida 
à luz das qualidades afetivas do interno e/ou real, mais será eficaz para a formação 
afetiva do bebê. As falhas no intercâmbio afetivo primário levam o homem a não 
estabelecer vínculos estáveis, permanecendo escravo da organização da sua mente 
inicial regida pela concretude da leitura onipotente e radical dos fatos. 
 O individuo com incapacidade de simbolizar, somente pode lidar com seus 
vínculos de duas maneiras: passivamente, ficando a mercê dos desejos imediatos 
(pulsões); ativamente, de forma compulsiva e à mercê das pulsões, atraído pelo 
“fascínio do poder e do controle”, portanto alienado. Ultrapassando a situação ilusória 
de simbiose com o objeto também sentido como onipotente, seja ele interno ou real, e 
sofrer a dor dessa separação. Assim a organização narcísica e suas defesas são 
estruturadas, favoráveis ou não ao estabelecimento de vínculos genuínos. Freud fala da 
dor do nascimento, narcísica ou não, situando-a como básica para a formação da 
identidade e da identificação sexual. Utilizou-se do mito de Édipo e a correspondente dor 
da castração, que pode ser lida como a perda da onipotência infantil. 
 O bebê, ao nascer, estabelece ligações afetivas com o cuidador sensível e 
receptivo em interações sociais com ele. A mãe biológica é, normalmente, a principal 
figura de apego do recém-nascido, porém esse papel pode ser tomado por qualquer um 
que se comporte compativelmente, ou seja, de uma maneira “maternal” durante esse 
período. A qualidade do compromisso social é mais influente que a quantidade de tempo 
despendido. As reações imediatas a sinais de abordagem na interação social ativa com 
o recém-nascido, na “teoria do apego”, segundo Bowlby (1992) significa o envolvimento 
de um conjunto de comportamentos. Essa interação social com a criança não impede 
que o pai ou outras pessoas se tornem as principais figuras de apego da criança, basta 
que estes sejam provedores da maior parte de cuidados e interações com ela. Alguns 
bebês direcionam o comportamento de apego (proximidade) para mais de uma figura. 
Assim que é iniciado o processode discriminação entre os cuidadores, até o segundo 
ano de vida, cujas figuras são organizadas hierarquicamente, no topo está colocada a 
principal figura desse apego. O “apego” – na Teoria de Apego – significa um vinculo 
afetivo ou uma ligação entre um indivíduo e uma figura de apego, comumente um 
cuidador. Esses laços entre a criança e o cuidador se organizam e se baseiam nas 
necessidades de segurança e proteção da mesma, os quais fundamentais na infância. 
Esses vínculos podem ser recíprocos entre dois adultos, mas a teoria propõe que as 
crianças se apegam instintivamente a quem cuida delas, com a finalidade de sobreviver, 
 
26 
 
incluindo o desenvolvimento físico, social e emocional. Assim, a meta biológica é a 
sobrevivência e a meta psicológica é a segurança. 
 O vínculo é mantido com uma figura de apego acessível e disponível no conjunto 
do “sistema comportamental de apego”, cuja ativação desse sistema é feita por medo ou 
perigo. Este medo é antecipado pela “ansiedade” em ser descartado pela figura do 
apego. Quando esta figura não esta disponível ou não responde, ocorre a “angústia de 
separação”. No recém-nascido, a “separação física” pode causar ansiedade e raiva, 
seguidas de tristeza e desespero, segundo Bowlby (1992). Quando maiores as crianças 
(3 a 4 anos), a separação física não é mais uma ameaça aos vínculos destas com suas 
figuras de apego. A partir dessa fase, assim como nos adultos, a segurança é ameaçada 
a partir de uma ausência prolongada, interrupção na comunicação, indisponibilidade 
emocional ou sinais de rejeição e abandono. 
 Uma teoria dos afetos foi deixada por Freud (1952), onde afirma que o ser 
humano é incapaz de “de por si só ocasionar a ação específica, ele é auxiliado pelo 
Outro”. Segue dizendo que a “motivação deste só pode ser a de impedir a morte, que na 
ausência de sua intervenção, será inevitável”, e acrescente-se que para impedir ou 
minorar o sofrimento do semelhante. Eis a pedra fundamental da aquisição ou não, pelo 
bebê, da noção de qualidade afetiva do objeto, portanto, que seja um valor. O afeto seja 
ele positivo de amor ou negativo de ódio, se constitui num movimento psíquico que leva 
o individuo a afetar-se ou sensibilizar-se com o estado do semelhante. 
 Freud considerou a existência e instalação da intersubjetividade desse o início da 
vida pela via da interferência do “objeto externo”, impregnado de sua própria qualidade 
corpórea-afetiva, isto é, de perceber ou de ajudar o desamparo alheio, evitando sua 
morte. As concepções sobre o desenvolvimento das emoções, sentimentos e razão 
foram mantidas e ampliadas, como necessárias para a vivência da intersubjetividade, ou 
seja, interativas das realidades interna-externas entre o sujeito e o objeto. Quanto mais 
essa troca for percebida à luz das qualidades afetivas do objeto interno e/ou real, afirma 
Franca (2009), mais ela será eficaz para a formação afetiva e simbólica da mente do 
bebê. A psicanálise é uma “teoria da comunicação”. 
 O funcionamento psíquico, na concepção kleiniana, constitui a expressão dos 
processos dinâmicos continuamente em operação nas relações, de acordo com a noção 
de que todo o ser humano é habitado por um mundo interno composto por objetos 
(pessoas ou partes delas) e relações entre estes. O objeto em sua forma e conteúdo é 
um composto de elementos resultantes da experiência emocional vivida com essa 
 
27 
 
pessoa, ou partes dela. O “objeto interno” se origina a partir dessa experiência, da qual 
participam tanto as características próprias do objeto externo, ou seja, a pessoa ou parte 
dela com quem o sujeito se relaciona quanto os modos pelos quais ele o percebe. O 
“objeto externo”, segundo Klein, tem uma existência independente de quem o vê e 
também tem seu núcleo forte na ideia de quem ele é percebido, transformado, 
deformado pelas experiências emocionais vividas na relação com ele. 
 O amor ou o ódio com que o ego vê os outros são poderosos para fazer com que 
sejam percebidos de forma mais amorosa, mais compreensiva; mais tolerante; mais 
bela, ou então, mais odienta; mais malévola; ou mais feia. Esse modo do ego ver toda a 
sua afetividade, que também é a sua sexualidade, faz presença. Esta em como vê o seu 
corpo e o corpo do outro, assim como, fala e escuta tonalidades de voz, a proximidade 
ou a distância que estabelece, etc.. As figurações do ser humano, tal como percebido 
nesse conjunto de coisas de ser independente e ser para o eu – ser exterior e ser 
interior -, pode fazer ver só o que é amável e não enxergar defeitos, como no 
encantamento do apaixonar-se, assim como o dito, “o amor é cego”. A partir dessa 
concepção, o ser humano é o tempo todo, até mesmo antes do nascimento, um ser de 
relações: ele tem seu lugar, sua identidade e os sentidos de seus pensamentos e gestos 
dados pelas relações que estabelece com os outros seres humanos. No mundo externo, 
as relações com outras pessoas se dão continuamente, e no mundo interno acontecem 
na fantasia, na imaginação, no devaneio, na reflexão, no sonho. O mundo interno e o 
mundo externo são interpenetrados de tal modo que é muito difícil, se não impossível, 
separar um do outro. 
 O processo em que é colocado nos outros os próprios afetos, pensamento e 
modos de ser, e como são vistos a partir dos elementos que neles são introduzidos, 
fundidos em suas características próprias foram denominados de “identificação 
projetiva”, na concepção de Klein. Por outro lado, partes do sujeito são projetadas no 
outro que fica identificado com essas partes. Dessa maneira o sujeito se espalha no 
mundo: sem o saber, há um pouco dele em cada coisa que vê ou toca, e assim como 
todos nós. Há uma incorporação e uma introjeção de objetos do mundo carregados com 
o que neles são projetados, o que a autora chama de “identificação introjetiva”. Esses 
intercâmbios, em seus detalhes e vicissitudes, as projeções maciças, impedem de 
conhecer a realidade independente do objeto, a falta de colorido do mundo, quando o 
ego se retira dele, as dificuldades de introjetar os objetos e se enriquecer com eles. 
 
28 
 
 A partir das concepções kleinianas e do conceito de identificação projetiva, Bion 
atribui um significado e destaque especial a este mecanismo na comunicação pré-verbal 
primitiva, mecanismo precursor da atividade de pensar anterior à formação do aparelho 
de pensar os pensamentos. O autor fala de uma identificação projetiva que envolve 
elementos vividos como a “coisa em si mesmo”, ou seja, impressões sensoriais e 
experiências emocionais não transformadas e que não servem para pensar, sonhar ou 
exercer funções intelectuais. A capacidade de rêverie da mãe favorece o bebê em sua 
tolerância à frustração, caso contrário há uma intolerância a esta, e a criança evitará a 
angústia mediante fuga ou tentativa onipotente da realidade intolerável. Esse modelo de 
relação ao vínculo existente entre mãe e bebê, é descrito por Bion como o objeto no qual 
o bebê que chora de angústia por temer a morte, pela identificação projetiva, coloca na 
mãe o terror de morte. O vínculo configura uma estrutura dinâmica, acionada por 
movimentações psicológicas, expressando a um objeto interno e um objeto externo. 
 Bion, discípulo de Melanie Klein, a partir de suas observações de crianças e 
adultos em análise descreveu o mundo interno, a dinâmica intensa que constitui a vida 
intrapsíquica. Este autor privilegiou a observação do psiquismo na relação com outro 
psiquismo, utilizando o modelo da díade mãe-bebê. Desde o início do desenvolvimento, 
com o desempenho dos cuidados com o bebê diante das manifestações dele, corporais, 
não verbais, mas plenamente expressivas de vivências afetivas e de estados interno 
(fome, sono, frio, etc.) pode atribuir sentidos em relação ao que esta se passando. Isto 
faz com queseus afetos, seu pensamento e sua linguagem formem seu acervo de 
experiências e conhecimento – seu psiquismo. O modo como a mãe interpreta o que se 
passa com seu bebê, dependerá de seu estado emocional, sua história de vida, da 
cultura de que faz parte, do conhecimento que tem acesso. A partir desse universo 
simbólico que a constitui é que nomeará os estados emocionais do bebê, e ao fazê-lo, 
transforma-os. É na interação continua entre o bebê e a mãe, assim como com seus 
outros significativos, que ele poderá vir a reconhecer seus diferentes estados internos. 
Terá a possibilidade de nomeá-los e empatizar, identificar-se também com os outros, 
podendo vir a compreender e mencionar o que se passa com eles. O mundo passa a ser 
intersubjetivo. 
 Na relação mãe-bebê está a gênese de todas as relações humanas. O bebê 
desde o início da vida projeta vivências boas e ruins, de prazer e desprazer, nos objetos 
à sua volta, particularmente nas partes com que vai ganhando intimidade com o corpo 
da mãe, e os vê coloridos pelos afetos que neles projetou. Mas o bebê também é objeto 
 
29 
 
das projeções dos outros à sua volta, com os quais é identificado: as fantasias 
conscientes e inconscientes dos pais, irmãos, avós, as expectativas nele projetadas, 
participam na construção de quem é o bebê, em seus aspectos mais externos e mais 
internos. O trabalho psíquico do desenvolvimento de cada um envolve o trato com todas 
as projeções, dentro do espaço que o ego tem para se distanciar delas ou a elas aderir, 
obrigatoriamente. 
 Mário Quintana, poeticamente diz que “A vida são deveres, que nos trouxemos 
para fazer em casa”. Ao que parece, cada bebê nasce com uma agenda secreta, feita de 
textos não escritos das fantasias, expectativas e sonhos de seus familiares, ficando a 
questão para cada um, sobre o quanto está destinado a cumprir esses deveres, tal qual 
Édipo, que não escapou ao destino designado pelos deuses, a agenda secreta que lhe 
coube e que cumpriu sem saber. O pensamento psicanalítico inicial das “relações 
objetais” proposto por Melanie Klein influenciou no pensamento de Bowlby. Entretanto, 
ele discordou profundamente da crença predominante de que as reações dos recém-
nascidos se relacionam com sua “vida de fantasia interna” ao invés de relacionar com 
“eventos da vida real”. O autor ao escrever o artigo “Cuidado Infantil e o Crescimento do 
Amor” (1951) apresentou a hipótese de que “o recém-nascido e a criança devem 
experimentar um relacionamento continuo, intimo e cálido com sua mãe (ou substituta) 
em que ambos podem encontrar satisfação e prazer”, cuja falta pode acarretar 
significativas e irreversíveis consequências para a saúde mental. 
 Um vínculo é diferente de uma relação de objeto. Enquanto a relação de objeto 
indica fundamentalmente as relações intrapsíquicas que se fazem entre os objetos do 
mundo interno de uma pessoa, ou destes com o ego, o vínculo designa uma união com 
características duradouras. O vínculo alude a uma forma de ligação entre partes que 
estão unidas e in-separadas, embora permaneçam claramente delimitadas entre si. 
“Vínculo”, na concepção de Bion, é “uma estrutura relacional-emocional entre duas ou 
mais pessoas, ou entre duas ou mais partes separadas de uma mesma pessoa”. O autor 
estendeu essa conceituação a qualquer função ou órgão que, desde a condição de 
bebê, esteja encarregado de vincular objetos, sentimentos e ideias uns aos outros. 
 Algumas características são importantes na formação de vínculos, segundo 
Zimerman (2001), tais como: a formação de elos de ligação constantes e de natureza 
emocional, interpessoais ou intrapessoais, permanentemente presentes e interativos; 
são inatos, existem desde sempre como essenciais e inseparáveis do indivíduo; 
compõem a formação de uma estrutura, ou seja, compõe-se de vários elementos em 
 
30 
 
combinações variáveis, a mudança de um deles certamente influirá no conjunto; 
permitem vários significados, por isso mesmo, poli (vários) significados (semos);são 
transformáveis e entendidos por meio da inter-relação continente-conteúdo. 
 O comportamento do apego como um dos conceitos fundamentais da teoria 
proposta por Bowlby. Refere-se “a ações de uma pessoa para alcançar ou manter com 
outro indivíduo, claramente identificado e considerado como mais apto para lidar com o 
mundo”, afirma o autor, que atribui como principal função desse comportamento a 
biológica, a qual corresponde a uma necessidade de proteção e segurança. A criança 
constrói um modelo representacional interno de si mesma, dependendo de como foi 
cuidada, afirma J. Bowlby (1989). Esse modelo internalizado permite à criança mais 
tarde em sua vida, quando o sentimento é de segurança em relação aos cuidadores, 
acreditar em si própria, tornar-se independente e explorar sua liberdade. Portanto, cada 
indivíduo forma um “projeto” interno a partir das primeiras experiências coma as figuras 
de apego. Essas representações, que tem origem cedo no desenvolvimento, continuarão 
em uma lenta evolução, sob o domínio tênue das experiências relacionadas ao apego da 
infância. Essa imagem interna instaurada no início da vida constitui a base de todos os 
relacionamentos íntimos e futuros. Sua influência aparece desde as primeiras interações 
com outras pessoas, afora as figuras de apego, e se expressa nos padrões de apego e 
de vinculação que o individuo apresentará em suas interações interpessoais 
significativas. 
 A partir da teoria das relações objetais os referenciais psicanalíticos se 
organizaram em torno dos vínculos de “amor” e “ódio”. Na contemporaneidade a 
representação das funções e relações de objeto foi acrescida de uma terceira natureza 
de vínculo, proposta por Bion, o “vínculo do conhecimento”, diretamente ligada à 
aceitação ou não das verdades, particularmente das penosas, tanto as internas como as 
externas, e que dizem mais diretamente aos problemas da autoestima dos sujeitos. 
Ao lado destes vínculos: amor, ódio e conhecimento, um quarto vínculo é proposto por 
Zimerman (2001), o “vínculo do reconhecimento”, o qual designa a importância do 
sujeito voltar (re) a conhecer aquilo que preexiste dentro dele, e que segue oculto, de 
forma recalcada ou negada de alguma forma, ou ainda na forma de “pré-concepções” 
como propõe Bion (1994) em suas concepções. Este vínculo do reconhecimento é 
desdobrado pelo autor, em outras formas: - reconhecimento do outro: crescimento 
mental indispensável para que o sujeito possa desenvolver com as outras pessoas um 
vínculo no qual reconheça que o outro é autônomo, tem ideias, valores e condutas 
 
31 
 
diferentes das suas, ou seja, o reconhecimento das diferenças; - reconhecimento ao 
outro: desenvolvimento da capacidade de consideração e gratidão em relação ao outro; - 
ser reconhecido pelo outro: qualquer relação humana há necessidade de um tipo de um 
tipo de mutuo reconhecimento, este vital para a manutenção da autoestima e a 
construção de um definido sentimento de identidade. 
 
7. A criança: relações com a morte e luto na infância 
 O assunto relativo ao luto e à morte é silenciado por parte dos adultos. As 
pessoas não conseguem falar sobre essa condição na vida – a morte - e enfrentam 
situações como esta com medo e pavor. Os adultos, com essa percepção sobre a morte, 
subestimam a capacidade de entendimento e enfrentamento da criança nesse momento 
de perda, menosprezando seus sentimentos e impedindo-as de participar deste 
processo, o que pode ser um fator complicador para a elaboração de sua perda. A 
criança deve ser incluída no processo, pelos adultos, a começar pelo contar 
objetivamente a notícia do falecimento de um ente querido e até mesmo leva-la para se 
despedir da pessoa que partiu. 
 Os autores Hoffmann (1993) e Kubler-Ross (1991) apontam que “nasociedade 
atual, pratica-se um estilo de vida que evita a aproximação e o tema da morte, crendo 
erradamente que privar e proteger a criança dessa questão contribuirá para o seu 
conforto psíquico e proteção”. A discussão do papel dos pais no processo de elaboração 
do luto infantil é imprescindível, uma vez que não há como falar de luto infantil sem 
incluir a participação dos pais neste processo. Pois este, segundo Reis, “é um processo 
sofrido se não conseguirmos esclarecer isso com naturalidade e espontaneidade”. 
 O luto é o modo como o sujeito vai lidar diante da situação de perda de um objeto 
amado, como define Mazorra (2001), “o luto é um processo de reconstrução de 
reorganização diante da morte; desafio emocional e cognitivo com o qual o sujeito tem 
de lidar”. E o autor segue afirmando que “esse processo não implica o desligamento total 
do objeto perdido, tendo em vista que a ligação com o objeto interno permanece e é 
ressignificada durante o trabalho de luto. É esse trabalho de ressignificação, de 
transformação da relação com o objeto perdido que permite a elaboração do luto”. 
 A criança estando informada sobre os fatos e esclarecida sobre a perda e morte 
de uma pessoa querida, levando em conta seus nível cognitivo e capacidade de 
compreensão, passa pelas mesmas fases de luto que o adulto. O que ela necessita é 
estar a par dos acontecimentos. A continência e o apoio são extremamente importantes 
 
32 
 
para a criança. A ideia de que a criança precisa ser “protegida” da dor, constitui uma 
falsa noção. Esconder os fatos que são evidentes é uma das principais razões para que 
ela manifeste sintomas patológicos. Supor que o processo de luto na criança é rápido e 
que ela se esquecerá da pessoa perdida é um mito. Estudos realizados com bebês, 
com vínculos específicos formados, demonstram que a criança se desespera na 
ausência da mãe, ausência esta sentida como morte. As primeiras reações são de raiva 
e desespero, com um esforço para recuperar a mãe. A esperança pode diminuir, mas 
não o desejo, a criança vai se tornando apática, podendo cessar seu desenvolvimento, e 
muitas vezes, ocorre uma depressão anaclítica, conduzindo à morte. O abalo que pode 
ocorrer com a criança, num reencontro pode não se restabelecer o vinculo prontamente. 
 Piaget com a sua teoria psicogenética fornece fundamentos teóricos para a 
compreensão de conceitos ao longo do desenvolvimento cognitivo, além de ressaltar o 
papel do meio externo como fator fundamental na construção do conhecimento. Bruner 
(1990), por sua vez, ressalta o papel da psicologia popular, ou seja, o conhecimento 
popular sobre o desenvolvimento humano, na elaboração dos conceitos. Enquanto o 
“social” coloca à disposição da criança ferramentas (conteúdos) que auxiliam na tarefa 
de explicar o mundo, a “evolução cognitiva” leva à percepção da existência de outras 
pessoas e à colocação de si próprio como indivíduo entre os demais. Para Piaget (1967) 
o objetivo do desenvolvimento é a socialização do pensamento, sendo a interação com 
outras pessoas de importância fundamental na construção do conhecimento e 
constituindo-se numa de suas forças motivacionais. 
 O conceito de morte elaborado pelas crianças é estudado através de pesquisas, 
as quais relacionam o mesmo com o desenvolvimento cognitivo. As experiências 
individuais da criança, bem como a cultura, que coloca à sua disposição aspectos 
formais que representam os eventos da sociedade, segundo Bruner (1990), e, portanto, 
também o evento da morte, tem sido reconhecido como influência importante na 
elaboração desse conceito. O autor explica que cada cultura gera a sua própria 
psicologia popular, constituindo num instrumento que iniciaria as crianças na sua 
compreensão do seu mundo social. A cultura emerge do senso comum das pessoas ao 
explicar os acontecimentos do dia-a-dia, passando de uma geração para a outra. 
 A criança urbana, na percepção de Assunção (2005, apud SILVA, 2013), tem 
muito pouco contato com a morte natural, sendo que as cenas de que tem contato são 
aquelas que ela vê com maior frequência na televisão, e de uma morte brutal. Essas 
cenas impactam negativamente, criando uma repugnância por esse fenômeno natural, 
 
33 
 
ao contrário da criança do meio rural que lida muito melhor com a situação de perda. Na 
natureza há a clara percepção da interação entre vida e morte: o dia morre para nascer 
a noite; a flor morre para nascer o fruto; a lagarta morre para nascer a borboleta. É 
assim, as etapas da vida vão morrendo para dar lugar a outras que irão nascendo. As 
crianças por vivenciarem no seu cotidiano a morte de forma natural, quase não a temem. 
À vista disso, falar sobre a morte com as crianças de maneira natural e diante de 
oportunidades que possam surgir, é saudável e oportuno. 
 Quando alguém da familia, ou pessoa bem próxima morre, o importante é não 
privar a criança de participar dos ritos fúnebres, exceto quando a própria criança se 
recusa ou escolher não participar desse momento. O que deve ser feito, segundo 
Assunção, é conversar com ela e explicar o que ocorreu, sendo importante conduzir esta 
“fala” de maneira menos traumática possível, tornar o mais natural tanto para uma 
escolha de não participar, como de ir para a despedida. É importante e necessário dizer 
a verdade para as crianças, de forma que ela possa compreender. Irá ajuda-la a sentir-
se apoiada em seu sofrimento, reforçada na confiança nos adultos, que não a obrigam 
esconder seus sentimentos. Isso lhe assegura um equilíbrio frente às situações de perda 
durante sua vida adulta. É necessário e útil que a criança perceba que a perda afeta a 
todos e provoca dor para que possa expressar seus próprios sentimentos. É uma 
oportunidade para corrigir algumas distorções que o egocentrismo e o pensamento 
mágico possam trazer. A criança deve perceber que a vida continua, afirma Assunção 
(2005), como também, que não há necessidade de apagar o amor por aqueles que 
partiram, nem esquecer as alegrias com eles vivenciadas, isso não acrescentará mais 
dor ao seu sofrer. 
 Na abordagem sobre a morte, ao falar com as crianças é necessário ter 
sensibilidade para considerar os sentimentos das mesmas, como também considerar o 
nível de compreensão de cada uma. A criança, quando confrontada precocemente com 
a morte, em especial com a morte de um dos pais, ou de um irmão, sente uma dor 
imensa, e falar dessa morte, afirma Kovács (1992), pode aliviar a criança e facilitar a 
elaboração do luto, porém ela não viverá no mesmo mundo de antes. Aqueles que ficam 
não podem apagar essas marcas que a perda deixa na criança, mas não é necessário 
acrescentar outras igualmente dolorosas. A verdade ocultada perturba o processo de 
luto da criança, bem como sua relação com o adulto. A criança também quer negar a 
morte, mas quando os fatos contradizem o que lhe informam, fica completamente 
perturbada e frustrada, pois ela percebe e sabe que algo aconteceu. A primeira reação 
 
34 
 
diante da perda de uma pessoa amada é a negação, e se o adulto reforça essa atitude, 
fica muito difícil passar pelas outras fases de elaboração do luto. 
 Os mitos e as histórias infantis auxiliam a criança na compreensão sobre o 
mundo, pois através da fantasia ela tem maior facilidade de compreensão já que é 
incapaz de entender respostas realistas. As crianças dão vida a tudo, a todos os 
elementos do mundo, da natureza e própria vida. Nas histórias infantis há uma 
identificação da criança com os problemas ou situações dos personagens, o que é 
fundamental para seu desenvolvimento emocional, auxiliando na lida com a ansiedade 
que está vivenciando. Ela se concentra mais e aprende a respirar o outro através dos 
contos e histórias infantis. Na infância, o ego sadio tem a vivência de dominar o dragão, 
porém não consegue matá-lo. O dragão é o próprioinconsciente da criança. Nas 
histórias infantis o monstro é congelado, banido para um outro lugar muito distante, ou 
mesmo morto; mas depois reaparece, pois é indestrutível. O ego apenas apazigua um 
pouco o inconsciente, abre canais para sua energia, chega a limites com ele para 
garantir sua sobrevivência. A consciência vai se fortalecendo, estruturando-se mais, 
ampliando-se, mas não chega a dar conta da totalidade psíquica. 
 Assim como os adultos, os bebês e as crianças também sentem pesar diante de 
uma perda, afirma Bowlby, e passam por períodos de luto ao perderam alguém 
importante. Apesar da criança pequena não compreender o conceito de morte como 
algo irreversível, percebe a perda e sofre com isso, podendo, segundo Aberastury 
(1992), evidenciar seu sofrimento através dos brinquedos e desenhos, por exemplo, nos 
quais tem a possibilidade de expressar seus conflitos. A forma como a criança vive e 
representa internamente o luto, afirma Machado (2006), varia de acordo com a idade, a 
personalidade e o estágio de desenvolvimento cognitivo e psicossocial da mesma. 
Ressalta o autor, que os aspectos culturais e religiosos influenciam no processo de luto, 
bem como, a maneira como as pessoas próximas encaram a morte, o que influenciará 
diretamente no processo de percepção, pela criança, sobre do luto e da morte. Portanto, 
como propõe Bowlby (1990), “ao longo do desenvolvimento do pensamento e da forma 
de abordar o mundo, a criança vai alternado e aperfeiçoando sua concepção de morte”. 
 Para que o processo do luto possa ocorrer, afirma Raimbault (1979), é 
necessário a introjeção do objeto perdido, que ocorre na forma de lembranças, palavras 
e atos. O trabalho de des-identificação e des-investimento de energia possibilitará o 
investimento de energia em outro objeto. Quando ocorrem sentimentos de culpa por se 
sentir responsável pela morte do outro, a criança não consegue desinvestir como 
 
35 
 
resultado de seus impulsos destrutivos. Assim, poderá surgir o desejo ou a necessidade 
de se reunir com a pessoa perdida, como forma de reparar os seus erros, ou como 
necessidade de punição. Sintomas podem se manifestar, tais como: perturbações 
fisiológicas, dificuldades de alimentação e sono, retorno ao autoerotismo, distúrbios nos 
relacionamentos sociais. Algumas vezes a criança não consegue realizar a separação e 
deseja reunir-se com a pessoa perdida, sendo este fato a manifestação de micro 
suicídios, de acordo com a afirmação de Aberastury (1978), pois constituem pequenos 
atos autodestrutivos, tais como acidentes, quedas, machucados, que podem passar 
despercebidos. 
 Para as pessoas que perderam alguém, a perda é permanente, afirma Winnicott 
(2005). E, segue dizendo que, “a perda é permanente mesmo quando existe uma 
recuperação e quando ressurge um sentido da vivacidade da pessoa morta, o que nos 
permitiria dizer que o período de luto está terminado, exceto talvez nos aniversários, ou 
quando alguma coisa lembra a pessoa de que subitamente não existe mais 
oportunidade de compartilhar”. Parece fácil subestimar o efeito da perda nas crianças. 
Afirma o autor, que “as crianças são distrativas e a vida borbulha nelas, quer queiram 
quer não queiram. Mas a perda de um dos pais, de um amigo, ou de um animal de 
estimação ou de um brinquedo especial pode roubar todo o sentido da existência, de 
modo que aquilo que tomamos erroneamente como vida é o inimigo da criança, uma 
vivacidade que engana a todos menos à criança” (WINNICOTT, 2005). A vivacidade da 
criança tem um preço, e ela sabe disso. A tristeza e a desesperança subjacente a um 
tipo de perda, talvez a criança não tenha tempo de pagar, e acaba criando uma falsa 
personalidade, uma personalidade jocosa e vazia, infinitamente dispersiva. Então, 
aponta Winnicott que surge “a queixa de que a criança nunca se concentra em nada, ou 
passa de um relacionamento para outro” e com isso surge uma incapacidade de fazer 
amigos. 
 O importante é que os adultos com quem convive a criança, não contribuam 
para o estado desconfortável da mesma, pois estas coisas podem ser muito profundas e 
difíceis de curar. Deve ser permitido à criança viver tristeza e desesperanças reais, e 
mesmo ideias autodestrutivas que se relacionam à grave perda que ela sofreu. Quando 
se percebe a criança infeliz e retraída, o que pode ser feito é acolhê-la e sustentá-la com 
simpatia, permitir manifestar sua emoção, não empurra-la para um estado de falsa 
vivacidade e esquecimento sobre o que ocorreu. E assim descreve Winnicott, que “se 
ficarmos por perto esperando, geralmente seremos recompensados por mudanças reais 
 
36 
 
na criança, que indicam uma tendência natural de recuperar-se da perdoa e do 
sentimento de culpa que a criança tem mesmo quando, verdadeiramente, não contribui 
para o trágico acontecimento”. 
 Os pais geralmente ficam em dúvida se devem ou não levar seus filhos a velórios 
e enterros. A recomendação de especialista é de que a criança participe desse 
momento, tanto para se despedir quanto para não se sentir excluída na vivência desse 
momento da perda. Para Kovács “é importante explicar o que está acontecendo e ter um 
adulto junto o tempo todo”. Quando a criança for maior, os pais podem perguntar se elas 
querem ir e respeitar a escolha. Outra questão que gera dúvidas quanto a objetos e 
fotos da pessoa que faleceu. Deve ser respeitada a vontade da familia, onde precisam 
decidir o que é melhor para todos, mas não é necessário retirar de perto da criança, pois 
esse contato não é prejudicial e pode até ajudar no processo gradual de luto. 
 Um luto sempre é particular e único, cujas reações variam de acordo com o 
envolvimento afetivo que a criança tinha com a pessoa que morreu, o tipo de morte que 
ocorreu se esperada, como no caso de doença, ou súbita, como em acidente ou 
pessoas cardíacas, o acolhimento familiar e a faixa etária. A criança pequena reconhece 
a universalidade da morte, sendo capaz de distinguir a diferença entre os seres vivos 
que morrem e aqueles que não morrem. Num primeiro momento, a criança percebe o 
luto como ausência, como perda de um objeto amado. Uma criança recém-nascida já é 
capaz de sentir a diferença entre presença e ausência, segundo estudos realizados. Um 
bebê pode apresentar um choro forte e constante após uma perda. Segundo Mautoni, 
“Até os três anos, a criança pode sentir saudade e até demonstrar tristeza e desconforto 
emocional, porém nem sempre de forma clara. A partir dos três anos, ela se expressa 
mais e chora mais”. As crianças menores de cinco anos, devido ao animismo infantil, 
que consiste dar vida a seres inanimados, como o sol e os brinquedos, por exemplo, 
acaba impossibilitando a compreensão da morte, segundo Nagy (1948). Nesse período 
a criança entende a diferenciação entre os seres vivos e mortos basicamente pelo 
padrão de mobilidade: “o que ‘se move’ está vivo, o que ‘não se move’ está morto”. As 
crianças muito pequenas já tem contato e encontram exemplo de morte ao se 
depararem, com um passarinho morto, uma formiga, um besouro, etc. e, por estarem 
imóvel e não reagir lhes provoca curiosidade. Após os seis anos, há uma compreensão 
maior sobre a morte, mas a criança pensa que somente as pessoas idosas ficam 
doentes e morrem. A criança entre cinco e nove anos já entende a morte como 
“irreversível, mas não como inevitável”, segundo Franco. Acima de nove anos, a criança 
 
37 
 
já entende a morte como inevitável e universal, compreendendo, também, que ela 
mesma está suscetível à morte. A partir dos doze anos em diante é que ocorre o 
entendimento sobre o conceito de morte com mais complexidade. 
 Entretanto, Bowlby mostra que mesmo crianças pequenas não tem dificuldade 
de entender a morte como irreversível, apenas dependerá da forma como sues pais lhe 
falam sobre a morte. O autor aponta que “Se disserema uma criança de menos de 2 
anos que o besouro morto ou o pássaro morto não voltarão a viver, e que mais cedo ou 
mais tarde a morte acontece em todas as criaturas vivas, ela pode não acreditar a 
princípio, mas provavelmente aceitará a palavra dos pais” (BOWLBY). O luto está 
associado a uma quebra de vínculo, sentida como desamparo e aflição, segundo Bowlby 
(1992), podendo desencadear ansiedade de separação e pânico. Para esse autor, a 
forma da criança viver o luto sofre influência dos padrões de base de relação familiar 
anteriores e reestruturação do sistema familiar em consequência da perda. A vivência da 
perda é influenciada de forma, positiva ou negativa, pelo padrão de vinculação que até 
então havia caraterizado as relações originais familiares e pela força e vigor dessa 
mesma vinculação. De acordo com Bowlby, “uma inicial fase de protesto e tentativa de 
recuperar a figura de vinculação perdida é precedida de uma figura do desapego e 
depressão e, finalmente, uma desvinculação emocional da figura de apego”. Diante da 
morte, as reações emocionais e comportamentais da criança tem significado diferente da 
reação dos adultos. A forma como ela vive o luto e representa internamente a morte 
varia de acordo com a idade, a personalidade, o estádio de desenvolvimento cognitivo e 
psicossocial, a intensidade com que ela vive e a proximidade com esta crise, bem como, 
com aspectos mais gerais como a cultura onde esta inserida, refere Machado (2006) 
 A criança reagirá diante da morte, dependendo da maneira como os pais 
abordarão o tema com ela. Os pais e familiares não devem esconder nem limitar as 
informações sobre a morte para a criança, pois ela precisa entender que a morte faz 
parte do curso natural da vida. Toda criança deve ser habituada e preparada para este 
momento, a fim de ganhar competências necessárias à superação dos sentimentos da 
perda e do luto. A explicação da morte deve ser feita numa linguagem adequada ao 
nível cognitivo da criança, através de conceitos concretos e expressões reais. Deve ser 
dado espaço à criança para que expresse suas duvidas e questões, ajudando a 
esclarecer o que ela está pensando a respeito do assunto. Os pais, em sua maioria, 
numa tentativa de “proteger” a criança, utilizam metáforas para a explicação do fato 
ocorrido. Kubler-Ross (1991) diz que “É igualmente insensato, como aconteceu, dizer 
 
38 
 
que ‘Deus levou Joãozinho para o céu por amar as criancinhas’ a uma menina que 
perdeu o irmão. Esta menina ao se tornar mulher jamais superou sua mágoa contra 
Deus, mágoa que degenerou em depressão psicótica quando da perda do seu próprio 
filho, trinta anos mais tarde”. 
 A palavra “morte” deve ser colocada para a criança, e se o adulto também estiver 
sofrendo com a perda deve expor sua dor para os filhos e aproveitar para mostrar que é 
normal ficar triste. “Mamãe não virou estrelinha”, “papai não foi viajar”, e “vovó não está 
só dormindo”. Quando alguém morre, é preciso dizer a verdade para as crianças, de 
maneira simples e clara. “Além de confortar e acolher, é preciso explicar que a morte 
não tem volta e que todos vamos morrer um dia”, explica Kovács (1992). É a partir do 
diálogo que a criança começa a entender o que é a morte e como lidar com ela. “A 
literatura mostra que se a criança não for bem acolhida pode vir a ter problemas em 
seus lutos futuros, além de depressão e ansiedade”. A maioria dos pais pensa que a 
criança possui uma incapacidade mental para compreender a situação. O adulto muitas 
vezes não tem uma internalização bem concebida em relação ao conceito de morte e do 
processo de luto. Dessa maneira, ao deparar-se com a morte, recusa a si mesmo e 
consequentemente para a criança a aquisição de tal conceito, vindo a ser um 
complicador para a elaboração do processo de luto e um facilitador para possíveis 
prejuízos para o desenvolvimento da criança. 
 
8. Adolescência e juventude suas perdas e lutos 
 O ego da criança, com o nascimento, coloca em execução uma difícil tarefa de 
adaptar-se ao mundo externo e de elaborar o trauma do nascimento. A mãe é que 
oferece uma primeira versão desse mundo através de seus cuidados e alimentação para 
que possa viver, e o bebê irá construindo, desde o primeiro momento uma imagem do 
mundo e de si mesmo. Entretanto, ao defrontar-se com o mundo, o bebê já teve suas 
experiências intrauterinas que antecipam o que este irá lhe oferecer. A configuração e o 
preparo para a luta pela vida vai se organizando de acordo com o que a criança trouxe 
em seus genes, somado às experiências em relação à mãe, as condições em que foi 
concebido, aceito ou não, as condições em seu mundo no ventre da mãe. 
 O feto ao ser separado de sua mãe pelo nascimento precisa restabelecer o 
quanto antes, um intenso vínculo com ela, recuperando – ainda que parcialmente – o 
contato com seu corpo, permanecendo muitas horas junto a ela, sobre seu peito, para 
adequar-se lentamente, ou pouco a pouco, à separação. Esse contato imediato do bebê 
 
39 
 
junto ao corpo da mãe, após nascer, produzirá algo do calor que o unia junto a ela em 
seu ventre, e ambos podem recuperar um pouco da intima união que tinham através do 
cordão umbilical. O trauma do nascimento faz com que o bebê viva um estado de 
angústia, não só pelas pressões da natureza física inerentes ao parto, mas 
especialmente devido às modificações do novo ambiente exterior e que lhe impõe novas 
formas de alimentar-se, de respirar, entre outras. Essa é primeira separação que a 
criatura humana tem, a separação do corpo da mãe, afirma Rank (1924), e constitui, 
segundo Freud (1924) a representação da perda mais precoce de outras que se seguem 
e serão significativas da vida do ser humano. Este momento marca as angústias 
primitivas que incluem a “perda do amor da mãe”, o “estado de desamparo”, a 
“separação”, e a decorrência de traumas, precocemente impingido às crianças. Estes 
ficam impressos sob a forma de vazios, vivências de desamparo e de feridas abertas. 
 O surgimento da dentição faz com que o bebê, com o aparecimento dos 
primeiros dentinhos, abandone o vínculo oral com a mãe, vínculo esse que o ajudou a 
superar o trauma do nascimento. As necessidades e urgência de separar-se da mãe 
envolve a busca pelo interesse sobre as coisas do mundo externo. A criança precisa 
recorrer a objetos do mundo externo, ao unir os diferentes aspectos da mãe dentro de 
sua mente, em sua vida afetiva e o mundo externo real, para que possa conviver com as 
perdas decorrentes desse viver. Os esforços do ego são necessários para elaborar e 
aceitar essas perdas. Da elaboração desse luto inicial dependerá a normalidade do 
psiquismo no futuro, quando tiver de suportar novas perdas e aceitar novos objetos. 
 A eclosão dentária, afirma Aberastury, modifica a angústia de preda qualitativa e 
quantitativamente. O que estava na fantasia de destruição dos objetos, transforma-se – 
pela ação do juízo de realidade – pois o aparecimento dos dentes é prova de que possui 
um instrumento capaz de destruir. Os dentes forçam a criança a abandonar o seio e a 
buscar outros objetos de gratificação, bem como, conduzem a deslocamentos de zona 
erógena, permitindo compreender as angústias decorrentes. A primeira dentição – 
dentição de leite – cujo desenvolvimento vai até os cinco anos mais ou menos, indica 
claramente a união originaria com o seio e o declínio do complexo de Édipo. O 
aparecimento dos dentes permanentes coincide com a entrada no período de latência, 
período preparatório à da definição da sexualidade que se dará na puberdade. Por outo 
lado os terceiros dentes molares, cujo aparecimento varia de acordo com cada sujeito, 
determinam um período de maturação sexual e afetiva e não se desenvolvem antes da 
puberdade. 
 
40 
 
 O significado do dente e sua função inicial de provocar a ruptura com o seio 
permitevalorizar e compreender a atitude tão regressiva do adulto. Com o surgimento 
dos dentes percebe sua capacidade de destruição, enfrentando os efeitos reais de sua 
destrutividade, ao triturar alimentos, morder os brinquedos, o que simboliza destruir 
partes de si mesma e da mãe, o que aumenta suas angústias depressivas. O novo 
enfoque do tratamento odontológico, tomando o homem como unidade, torna 
compreensível o mundo de significações que condensa - o dente – pois reúne toda a 
história de desprendimento do vínculo inicial pós-natal com o mundo. Talvez seja 
compreensível a atitude regressiva do adulto, até mesmo o mais equilibrado, quando 
precisa enfrentar o tratamento odontológico. 
 O luto pelo seio exige da criança uma elaboração dolorosa, que se desenvolve, 
impondo um desprendimento. Segundo Melanie Klein, anunciando a posição depressiva, 
esse desprendimento, como um desapego, culmina com o desmame, em que uma das 
dores mais agudas é a perda do objeto externo, real – o seio. Ao declinar da 
organização oral, o bebê dispõe – como no momento de nascer – de impulsos orais, 
anais e genitais, que o levarão a uma organização genital, segundo Aberastury (1996). 
Após o desmame, segue-se a frustração genital, pois a criança deve postergar a 
realização de suas fantasias de união até chegar à maturidade sexual. 
 Os adolescentes são exigidos em seu desenvolvimento tanto pelas 
modificações corporais incontroláveis como pelos imperativos do mundo externo, e 
vividos como uma invasão. Como defesa, isso leva a reter muitas de suas conquistas 
infantis, mesmo que coexista o prazer e a ânsia de alcançar um movo status. Estas 
mudanças, nas quais perde a sua identidade de criança, implicam na busca de uma 
identidade que vai se construindo num plano consciente e inconsciente. O mundo 
interno construído com as imagens paternas será a ponte através da qual escolherá a 
nova identidade, tendo este mundo o mesmo papel do início do momento de nascer, e 
ter que se adaptar a ele com maior ou menor felicidade. Um mundo interno bom e boas 
imagos paternas ajudam a elaborar a crise da adolescência tanto como as condições 
externas conflitivas. 
 O adolescente tem a possibilidade cognitiva de perceber as características 
essenciais da morte, como a sua universalidade, sua irreversibilidade, podendo dar 
respostas lógicas e formais. Esse tema complexo é discutido, com levantamento de 
hipóteses, porém emocionalmente, muitas vezes se distancia da morte. A adolescência, 
uma fase de transição, é um período do desenvolvimento em que ocorrem grandes 
 
41 
 
transformações, algumas mais evidentes como as mudanças corporais que se iniciam 
na puberdade. As manifestações que ocorrem na adolescência, e, portanto, normais 
nesse período, segundo Aberastury e Knobel (1973), constituem intensas expressões de 
sentimentos, labilidade emocional e uma exagerada necessidade de autoafirmação, cuja 
tarefa principal é a aquisição da identidade. Constitui um período de grandes aquisições, 
desde um corpo altamente potente até a capacidade cognitiva que lhe permita 
conquistar a ciências, descobrir e inventar coisas novas. 
 A adolescência é um período em que o sujeito está com toda a libido voltada 
para a construção do mundo, segundo Jung, e assim, há pouco lugar para pensar na 
morte. Constitui um período de preparação para a vida útil na sociedade, os estudos 
para o desenvolvimento profissional, o desenvolvimento afetivo e emocional com a 
demanda de uma busca para a vivência amorosa, a busca de um companheiro, como 
também constitui um período de grandes empreendimentos. Nesse momento em que a 
energia vital está voltada para estes aspectos, não existe espaço para imaginar a própria 
morte. O adolescente personifica em parte o herói, aquele que é imortal, uma suposição 
de imortalidade que tem seu auge na adolescência, esta presente em todos os seres 
humanos. O individuo que tem medo da vida, não vive, e na adolescência esta situação 
é ainda mais forte, porque é causa de todo o investimento energético para a construção 
de sua identidade e realidade. 
 O adolescente caminha para o auge da vida, em todas as potencialidades 
corporais e psíquicas, e a morte está distante como possibilidade pessoal, porém é 
momento de alto risco para que ocorram mortes inesperadas. É na adolescência que 
ocorre o maior número de suicídios, cuja explicação possa estar no processo de 
aquisição da identidade, pois é um tempo em que o adolescente, testa e extrapola em 
muito os seus limites. O herói não conhece o medo nem a derrota, e se sente medo este 
é escondido, não admitido em público. O adolescente tem que se manter corajoso diante 
de todos, afirma Kovács (1992), sendo comum a busca de atividades que desenvolvem 
o limite físico, como as desportivas, muitos das quais trazem em si o perigo da morte. O 
grande prazer está efetivamente em desafia-la, principalmente em atividades como 
dirigir carros, motos ou outros meios de transportes, exercidas no limite de velocidade, 
vivenciando altíssimo risco, por isso mesmo resultando, na maioria dos casos, em morte. 
 O adolescente acredita que a morte só ocorre com o outro, mesmo que seja o 
amigo mais próximo, sempre fica a dúvida sobre a incompetência do outro, sobressaindo 
sua onipotência. Por outro lado, muitas vezes na busca da vida, em seu auge, surge a 
 
42 
 
necessidade de elementos facilitadores dessa vivência, sendo o mais comum o uso de 
drogas, iniciadas nesse período. O que é buscado é a vida com intensidade, com 
colorido mais acentuado, é o desafio da morte. Entretanto, na busca de uma vida mais 
intensa pode ocorrer a morte por exagerar na dose, por descuido, por acidente ou 
assassinato. É na adolescência que o paradoxo vida e morte se torna mais evidente. 
 O adolescente vai se modificando lentamente e nenhuma pressa favorece o 
trabalho do luto, pois a elaboração de luto exige tempo para ser uma verdadeira 
elaboração, e não ter características de uma negação maníaca. Esses lutos nessa fase 
do desenvolvimento - a adolescência -, com sua patologia, a conduta dos pais pode 
favorecer ou não estas negações. A perda que o adolescente deve aceitar ao fazer o 
luto pelo corpo é dupla: a de seu corpo de criança, quando os caracteres sexuais 
secundários o colocam ante a evidência de um novo status; e o aparecimento da 
menarca na menina e do sêmen no menino, que lhes impõe o testemunho da definição 
sexual e do papel que terão de assumir não só com o parceiro, mas na procriação. Isso 
exige o abandono da fantasia do duplo sexo, implícita em todo o ser humano, como 
consequência de sua bissexualidade básica. “A elaboração do luto conduz à aceitação 
do papel que a puberdade lhe destina. Durante o trabalho do luto surgem defesas cuja 
finalidade é negar a perda da infância”, afirma Aberastury (1992). 
 O aparecimento do sêmen e da menstruação costumam ser acompanhados de 
angústia e estados de despersonificação, de não aceitação que é no próprio corpo que 
se estão reproduzindo estas mudanças. A prova de realidade do crescimento do seu 
corpo poderia ser verbalizada assim: “não sou criança, perdi minha condição de criança; 
os meus pais não são os pais de uma criança, mas os pais de um adulto; eu tenho que 
comportar-me como um adulto, assim como o meu corpo” (ABRASTURY, 1992). O luto 
frente ao crescimento implica o ego e o mundo externo, bem como, os desníveis entre o 
crescimento do corpo e a aceitação psicológica desse fato. Isto parecem ser maiores do 
que quando o corpo muda rapidamente, incrementando a angústia paranoide de ser 
invadido. 
 O adolescente padece este longo processo. Entretanto, seus pais têm 
dificuldades para aceitar o crescimento dele, e em consequência do sentimento de 
rejeição que experimentam frente à genitalidade e à livre expansão da personalidade.Esta incompreensão e rejeição se encontram, muitas vezes, mascaradas sob a 
outorgação de uma excessiva liberdade que o adolescente vive como um abandono. 
Quando a conduta dos pais implica em incompreensão e grandes flutuações polares 
 
43 
 
entre dependência – independência, refúgio na fantasia -, dificulta-se o trabalho de luto, 
no qual são necessários permanentes anseios e provas de perda e recuperação. Nesse 
processo ocorrem: defesas, como desvalorização dos objetos para iludir os sentimentos 
de dor e perda; a busca de figuras substitutivas dos pais, rebeldia frente a estes, e 
submissão a outras figuras que substituam os pais. 
 O bom desenvolvimento e a aceitação da vida conduzem à aceitação da morte 
como um fenômeno dentro da evolução, levando a uma maior capacidade de amor, de 
gozo e de estabilidade das conquistas. Os sentimentos de perda são negados, não 
existe o cuidado pelo objeto e por si mesmo, o afeto esta negado e a capacidade de 
gozo diminuída. A elaboração do luto pelo corpo infantil e a perda pela fantasia conduz 
à identidade sexual adulta, à busca do parceiro e à criatividade. O fracasso na 
elaboração desses lutos, não conduzirá a verdadeira identidade e a ideologia que lhe 
permite conseguir este nível de adaptação criativa. 
 
9. A vida adulta: rompimentos, perdas e lutos 
 A consciência de transitoriedade humana arremete, necessariamente, à 
consciência da morte – a finitude. A presença iminente da própria morte envia à 
transcendência e à necessidade da compreensão da finalidade existencial humana. 
Portanto, a finitude se constitui daquele aspecto que dá o tom necessário para tornar a 
vida não “algo”, mas da oportunidade para “algo”, cabendo ao homem encontrar sentido 
em cada situação, sob qualquer condição, até mesmo nas mais lastimáveis. 
 Procurar entender a presença da morte na vida é entender a separação 
amorosa. O luto é a expressão de vínculos estabelecidos entra as pessoas; é um ritual 
de expressão de sentimentos profundos e íntimos; e constitui um momento necessário 
para processar a perda e a dor. O medo da morte, muito presente na cultura e no 
homem, esta associada ao temor da perda do investimento libidinal. Em diferentes fases 
da vida, e na vida adulta não menos, o temor da morte é constatado, o sujeito 
desinveste sua libido do mundo. A morte do desejo constitui a grande perda do ser 
humano. A morte não é conhecida pelo inconsciente humano de forma como é o medo 
da perda de desejo. 
 No processo de luto “a dor pode ser entendida, como a dor de ter, em certa 
medida, de ‘desamar’ outros objetos, de ter de abandonar uma posição libidinal e criar 
uma outra”, segundo Arrais & Viana (2011). Quando a realidade demonstra a superação 
do objeto amado, a libido precisa ser redirecionada para outros objetos. Constitui, 
 
44 
 
segundo Freud, num processo bastante doloroso que demanda tempo e energia catexial 
para encontrar seu desfecho, pois o processo de luto estende a existência do objeto 
perdido por certo tempo. A energia libidinal fica novamente livre quando esse processo 
se conclui, podendo ser reinvestida. Entretanto, o luto é um processo perpassado pela 
dor que é consequência da perda real do objeto de grande investimento libidinal. O luto 
é um afeto que resulta do desligamento ou desinvestimento de certa quantidade de 
energia, um quantum de afeto que antes era dirigida ao objeto perdido. Assim, 
independente da natureza do objeto perdido, tal quantidade de energia vai assumir uma 
expressão subjetiva de luto. 
 O luto é caracterizado como um afeto normal, em diferentes produções 
freudianas, ou como um estado afetivo. É apontado que ele esta presente na natureza 
humana, sendo previsível e superado com o passar do tempo. As dores e cicatrizes do 
processo de luto (normal) são curadas e superadas naturalmente com o tempo sem que 
sejam necessárias intervenções terapêuticas especificas. As perdas vividas desde a 
infância e adolescência, na avida adulta parecem evidenciar a condição de desamparo 
do homem e a morte do desejo pode vir a ser temida quando o sujeito vivencia 
sucessivamente o trabalho de luto. 
 Freud (1916) ao escrever o texto “Sobre a transitoriedade” diz que “a beleza da 
forma e da face humana desaparece para sempre no decorrer de nossas próprias 
vidas”. Sustenta que a transitoriedade das coisas aumente e potencializa o valor das 
mesmas para o homem. A compreensão da transitoriedade do belo pode levar a um 
processo de luto antecipatório, que é uma forma de defesa psíquica que compromete o 
desfrute proporcionado por um objeto. A “exigência de imortalidade” pode ser 
consequência da consciência da transitoriedade da vida, segundo Freud, e fruto do 
desejo. Não se refere à ordem da realidade e sim à ordem do desejo. Portanto, a noção 
de transitoriedade da vida, trata-se de uma concepção profundamente verdadeira e que 
exerce influência sobre o valor do objeto para o sujeito. 
 O luto é uma reação diante de algo desconhecido, pois não se sabe ao certo a 
morte. Oliveira & Lopes (2008) apontam que “o luto pode ser definido como um conjunto 
de reações diante de uma perda, portanto algo a não ser desprezado, e acompanhado, 
como parte da saúde emocional”. Constitui a reação do individuo diante de algo 
desconhecido, pois não sabe qual a origem e o destino do homem, de e para onde ele 
irá depois da morte. Sua angústia pode ser pelo desejo de conhecer o desconhecido que 
causa tanta dor no enlutado. Quanto maior o investimento afetivo da pessoa, maior é a 
 
45 
 
energia necessária para o desligamento e maior será a dificuldade para que possa se 
adaptar à perda. Embora a pessoa saiba que depois de uma perda, afirma Freud ao 
escrever ao amigo Ludwig, tentando consolar a dor do pai que perde seu filho, citado por 
Bowlby (2004), “o estado agudo de luto abrandará, sabemos também que 
continuaremos inconsoláveis e não encontraremos nunca um substituto. Não importa o 
que venha a preencher a lacuna e, mesmo que esta seja totalmente preenchida, ainda 
assim alguma coisa permanecerá. E na verdade, assim deve ser. É a única maneira de 
perpetuar aquele amor que não desejamos abandonar”. 
 Após uma perda significativa um estado de luto pode ser um conforto diante de 
tanta angústia e dor. Mesmo que pessoas próximas queiram suprir a falta daquele que 
se foi, nunca conseguirá substitui-lo, não poderá preencher o vazio que ficou na vida do 
enlutado, o qual não será preenchido totalmente, por mais que passe o tempo. O vazio 
amargo deixado pelo ente querido que se foi sempre permanecera, e aquele que foi e é 
amado, não voltará mais. O que se coloca para o ego é aprender a assimilar a falta. O 
enlutado sempre deseja que a relação construída entre ele e o morto ainda exista, como 
forma de abandonar o vínculo e afetos criados entre eles. Porém o processo de 
elaboração do luto pode transformar a falta, em uma presença assimilada, como nas 
palavras de Drummond de Andrade (1987), nestes versos: “Por muito tempo achei que a 
ausência é falta. / E lastimava ignorante, a falta. / Hoje não a lastimo. / Não há falta na 
ausência. / A ausência é um estar em mim. / E sinto-a, branca, tão pegada, 
aconchegada nos meus braços, / que rio e danço e invento exclamações alegres, / 
porque a ausência, essa ausência assimilada, / ninguém a rouba de mim”. 
 A notícia da morte de uma pessoa querida, assim como nos versos do poeta, 
desorganiza a subjetividade do indivíduo, pois se trata de um acontecimento muitas 
vezes inesperado, esvazia uma parte do ego diante da falta do outro. Esse sentido de 
esvaziamento de si, durante o processo de elaboração do luto, constituem sintomas 
como ansiedade e estados depressivos. O enlutado, por vezes, pode se sentir culpado e 
com raiva pela morte do ente querido, assim ressalta Moura(2006): “enlutados sente 
raiva do ‘causador’ de sua dor, que pode ser a morte propriamente dita, Deus, os 
médicos que atendiam o falecido, e até mesmo o próprio falecido”. 
 O objeto que é alvo da ira do supereu “foi incluído no eu mediante a 
identificação”, segundo Freud (1923). O “eu” não protesta contra essa ira, submetendo-
se aos castigos infligidos a ele, e o supereu imputa ao “eu” a culpa pela perda do objeto. 
Essa culpabilidade se transforma em autoacusações e com ela uma expectativa de 
 
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punição, sendo que o castigo pode ser o pior, porem nunca será absolvido. Assim, essa 
autoacusação vai se transformando em constantes ataques contra si mesmo, portanto, 
destacando-se a pulsão de morte. Na melancolia, a ação do supereu se volta 
hostilmente contra o eu e o que prepondera nele é a pulsão de morte, que tem como 
característica a compulsão à repetição – repetição de um estado anterior – à destruição, 
ao retorno ao inorgânico e à recusa de ligação com os objetos. O sentimento de culpa 
deriva de “uma tensão existente entre o ego e o ideal do ego” segundo Freud (ob. cit.), e 
afirma ainda que “todo o medo é medo de morte, sendo a morte, para o eu, o abandono 
da libido narcísica”. 
 Na melancolia, com a perda objetal, acontece um deixar-se abandonar como um 
objeto externo que se transforma em identificação narcísica. Na melancolia há uma 
cisão do eu com uma parte se identificando com o objeto perdido e suscitando o retorno 
do sentimento de ódio para com o objeto. O medo da morte se dá na melancolia entre o 
próprio eu que se abandona por se sentir perseguido e odiado pelo supereu. Uma face 
bondosa do supereu é proposta por Freud em seu texto sobre o Humor (1927), o que 
não acontece na melancolia que apresenta oura face: o sadismo. Dessa forma, a 
melancolia se apresenta como uma excessiva exigência do supereu, onde não há uma 
elaboração do eu frente aos conflitos incestuosos e do parricídio. 
 A pulsão de morte tem um caráter essencial de desligamento, de acordo com 
Green (1988), por meio de um trabalho silencioso e dissimilado, assumindo o que ele 
classifica como função desobjetalizante, cuja marca é o desinvestimento do objeto 
dirigindo-se gradativamente ao desinvestimento do eu. O objeto que traumatiza é a fonte 
de frustração. A pulsão é destrutiva, e de desligamento, nesse caso. A angústia fica 
evidente com a perda, se instala, e a regressão atinge um nível zero, que é igual a nada, 
não vida, morte. No final do percurso, como afirma Green, encontra-se a morte. E 
assinala que “há, portanto, uma articulação necessária a ser encontrada entre o 
narcisismo e a pulsão de morte da qual Freud não se ocupou e que ele mesmo nos 
deixou descobrir”. O estabelecimento do conceito de “narcisismo negativo” ou 
“narcisismo de morte” visa a não existência. Nesse cenário marcado pela ferida 
narcísica, aponta que o narcisismo negativo busca “a não satisfação do desejo objetal”. 
 O impacto da morte pode trazer outros aspectos que constituam problemas. A 
falta de um contexto para a expressão dos diversos sentimentos despertados pelo luto, 
pois a familia como um todo está enlutada, muitas vezes nega a realidade de ter perdido 
o objeto de amor. “A morte nos remete ao sentimento de impossibilidade de reverter a 
 
47 
 
perda”, de acordo com Moura (2006) que segue dizendo que “reaver o ente querido, nos 
coloca frente a nossa própria fragilidade e mortalidade e exige do enlutado experienciar 
uma dor quase insuportável. Talvez por tudo isso a morte seja ainda um tema tabu. 
Entretanto, negar a ação da morte torna mais difícil a experiência do luto para o familiar 
que perde o ente querido”. Após ter perdido alguém que é amado muito, se torna muito 
difícil recomeçar a vida. Experimentar a morte do outro coloca a pessoas à frente da 
própria mortalidade, pois todos são seres mortais, que passam por fases de vida na 
quais, em alguns momentos chegam, próximos da própria morte. O indivíduo está 
sempre à frente de algo que não conhece e devidamente não sabe se conseguira 
completar todas as fases nas quais pode estar sujeito a viver. 
 O luto para Parkes (op. cit.), “não é um conjunto de sintomas que tem início 
após uma perda e, depois, gradualmente se desvanece. Envolve uma sucessão de 
quadros clínicos que mesclam e se substituem”. Depois da morte de um ente querido, os 
sintomas desenvolvidos pelo indivíduo são apenas resultados de uma combinação de 
causas passadas, logo se somam com a estressante perda, que resulta no luto. 
Entretanto, o luto, ressalta o autor “não é um tipo comum de estresse na vida da maioria 
das pessoas”, e segue afirmando que “as perdas são comuns em nossas vidas (...). Mas 
o termo luto não é usado para a reação à perda de um guarda-chuva velho. Ele 
geralmente é reservado para a perda de uma pessoa, em especial, uma pessoa amada”. 
 O luto compreende fase e reações próprias, que além destas outras 
características se somam, descritas como sintomas que a pessoa pode apresentar, tais 
como: distúrbios do sono e do apetite; com comportamentos de distração, como quando 
a pessoas fica pensativa sobre o que ocorreu; isolamento social, pelo impacto da perda; 
sonhos com a pessoa falecida; procurar ou chamar pelo falecido; agitação e choro 
excessivo; transportar objetos que lembrem a pessoa perdida; guardar e carregar de 
objetos que pertenciam ao morto. Além dessas características, autores como Parkes 
(1998) relatam que muitos sintomas são discutidos, pois “muitas doenças físicas e 
mentais têm sido atribuídas à experiência de perda”. O autor afirma que, muitos 
enlutados procuram um médico alguns meses após uma perda de um ente querido, 
podendo alguns sintomas apontar “muito claramente a importância do luto como causa 
de doenças mentais”, pois alguns distúrbios mentais são advindos pelo estado de 
estresse provocado pelo período de luto. 
 As questões de adoecimento após uma perda dependerá como o enlutado reage 
a esse luto, ou seja, como o indivíduo que perde uma pessoa significativa lida com as 
 
48 
 
frustrações da perda. É importante, nesse processo, a maneira pela qual ele percebe o 
impacto da perda e como dá sentido a essa dor, certamente é penosa. Ou seja, como 
esse indivíduo ao perder uma pessoa significativa lida com as frustrações da perda. 
Melo (2004) afirma que “para além de ser um processo inevitável, todas as pessoas têm 
que o realizar a fim de se adaptarem à perda, o luto acaba por repercutir nos vários 
indivíduos que rodeiam o sobrevivente, mesmo aqueles que não conheciam a pessoa 
falecida e principalmente os membros da familia que passam por um mesmo processo, 
mas nunca de uma forma igual”. O luto se caracteriza para todos como uma maneira de 
trazer sofrimento e dor para o enlutado, e cada indivíduo pode vivenciar esse tipo de 
impacto de ter perdido algo ou alguém, de formas diferentes uns dos outros. O processo 
de perda segue o autor dizendo que “varia não só de pessoa para pessoa, como 
também existem diferenças consoante à faixa etária em que o individuo se encontra”. 
 O processo de luto por sua vez, afirma Mendlowicz (2000), “se realiza através do 
teste de realidade, que ao evidenciar reiteradamente que o objeto não mais existe, exige 
que a libido se desprenda do objeto perdido”. Quando se trata de morte de um ente 
querido, é evidente que a familia, num primeiro momento, tenha reações perturbadoras. 
Ela precisa se desapegar de alguém ou de algo que ama, e trata-se de um processo 
doloroso, sem data e tempo para passar a angústia criada pelo enlutamento. Por isso 
mesmo, em muitos casos, o individuo mesmo saudável precisa de ajuda, apoio e 
tratamento para que consiga superar a perda de um ente querido. 
 Na experiência humana, quando é experimentado o rompimentode um vínculo 
afetivo, o individuo fica suscetível a diversas expressões físicas e emocionais que fazem 
parte do processo do luto. Frente a uma situação de rompimento de vínculo, o luto é 
uma manifestação de estresse emocional considerada normal. As reações físicas, 
emocionais, comportamentais e sociais que possam surgir diante de um quadro de luto, 
são resultantes do tipo de vínculo construído. Segundo Parkes (1998), numa experiência 
de perda afetiva espera-se que a pessoa perdida seja interiorizada, passando integrar as 
representações mentais do enlutado. Entretanto, muitas vezes esse processo poderá ser 
mais penoso para o enlutado por lhe faltar base segura e estratégias defensivas 
apropriadas. O referido autor afirma que “é somente quando ele se prolonga muito e 
causa dano às funções da vida normal que pode ser considerado um processo 
patológico”. 
 As pessoas que formaram vínculos ansiosos e ambivalentes com os pais na 
infância estão mais propensas a formarem vínculos dependentes na vida adulta. Um 
 
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relacionamento dependente ou ambivalente com o parceiro pode ser fator de risco para 
o luto complicado, pois irá dificultar o enfrentamento da perda. Estes vínculos 
dependentes com a outra pessoa se deve, talvez, por necessidade de um amor que 
sempre desejou e nunca teve na infância. A compreensão de Parkes, é de que “quando 
tais relacionamentos são interrompidos pelo luto, não chegam a um fim, tornam-se o 
foco do desejo continuo do enlutado de cuidar e ser cuidado pela pessoa que morreu”. 
 O sistema de vinculação na idade adulta é estrutural e processualmente mais 
complexo que na infância. Pode ser ativado de três maneiras: ameaça real ao self; 
ameaça percebida à relação de proximidade coma figura de vinculação; ou outras 
ameaças que impulsionam a pessoa a procurar os cuidados da figura de vinculação. 
Adultos com vinculação insegura e ansiosa, com estilo de apego inseguro, ambivalente 
e evitativo, após o rompimento conjugal, apresentam mais risco, para um nível maior de 
desajustamento psicológico. Pode estar indicando que o comportamento de apego 
estará permanentemente ativado em busca de segurança e proteção, o que resulta num 
processo de luto mais complicado. 
 O rompimento de vínculos é ressaltado por Bromberg (1995), como algo que 
poderá influenciar na forma de expressão de sofrimento. Em algumas situações de 
separação amorosa, parece ser difícil se desfazer do que foi vivido com o outro – 
mesmo que sejam objetos que foram compartilhados, pois a experiência vivida é sentida 
pelo enlutado como uma perda de uma parte da própria vida sendo jogada fora. A 
pessoa enlutada parece ter dificuldade de buscar recursos utilizados habitualmente em 
situações difíceis. Recorre ao aprendizado de novos recursos mais adaptativos àquele 
tipo de perda. A situação de separação entre os parceiros amorosa, alerta Ducati (2013), 
pode apontar um risco para o luto complicado, devido ao não reconhecimento da 
separação como vivencia de luto, embora a relação seja reconhecida socialmente. 
 A mulher lida com a perda do ser amado, assemelhando-se a uma perda de si 
mesmo, o que impedirá a sustentação do sofrimento. Sentimentos de dor e de luto, bem 
como o medo e a ansiedade em não conseguir refazer os vínculos, acompanham o 
momento da separação. No processo de separação há uma “morte psíquica” importante, 
Nesse processo, varias são as perdas que precisam ser elaboradas, tais como a perda: 
da conjugalidade, dos ideais; da familia sonhada; dos bens materiais; da identidade, do 
status, entre ouros. O parceiro amoroso que não tiver validação para expressar sua dor 
da perda na separação estará sujeito a um sofrimento maior no processo de elaboração 
da perda, na qual se faz necessária para a reorganização. 
 
50 
 
10. Os pais diante da perda gestacional 
 A mulher passa por profundas transformações durante a gravidez. Deixará de 
ser a filha para tornar-se mãe, e isso implica em uma revivência da infância e da relação 
com sua mãe, segundo Slade & Cohen (apud Piccinini et all, 1996). Desde o inicio da 
gestação, a gestante cria uma relação imaginária com o feto, ao invés de visualizar o 
embrião, onde vislumbra um “corpo imaginado” desenvolvido, como as atribuições para 
a completude do ser humano, segundo Aulagnier (1990). Na mente materna, afirma 
Lebovici (1987), coexistem três bebês: o edípico, que é o bebê da fantasia, resultante da 
história edípica da mãe e de seus desejos infantis, o mais inconsciente de todos; o 
imaginário, que constitui o bebê construído durante a gestação, um somatório de sonhos 
e expectativas, produto do desejo de maternidade da mulher, englobando 
representações mais conscientes da mãe; e o bebê propriamente dito, que é aquele que 
os pais segurarão nos braços no dia do nascimento, é, portanto, o bebê real. Quando 
ocorre do nascimento de um filho com deficiência, isto significa para os pais a perda do 
bebê edípico e do bebê imaginário, acarretando a necessidade de elaborar o luto pelo 
bebê real que não corresponde ao bebê esperado, lindo e perfeito. 
 O filho desejado, imaginado, bem como as expectativas construídas no 
imaginário dos progenitores, é perdida com o estereótipo do bebê idealizado, 
instaurando uma ferida narcísica. O eu projetado pelos sonhos se desfaz para dar lugar 
a um ser que precisará ser ressignificado em um novo processo de gestação psíquica no 
qual os vínculos terão que ser refeitos. Esse filho real e agora existente, afirma Brazelton 
& Cramer (1992), precisará de uma nova identidade, na qual sejam respeitados seus 
limites, dando-lhe um novo lugar, com a construção de novas expectativas. 
 A perda gestacional na experiência do feminino, afeta o corpo da mulher com a 
eliminação das características da gravidez. A morte de um filho antes do nascimento 
geralmente representa uma grande perda para os pais, especialmente para a mãe, 
afirma Nazaré (2010), pois é ela que vivencia uma perda que afeta seu corpo, com a 
extensão da barriga, e a realização de procedimentos médicos. O psiquismo feminino 
entra numa processo de luto simbólico pelo filho pedido, asseguram Souza & Muza 
(2011), e os sonhos, esperanças, expectativas e planejamentos que o casal 
normalmente deposita no nascimento da criança são suspensos. Quando a perda ocorre 
nas primeiras semanas de gestação, o feto ainda não é um bebê, onde o crescimento da 
barriga é pouco visualizado, percebe-se que nem sempre o luto realizado pela mulher é 
socialmente aceito. A elaboração do luto simbólico desse momento, não é incentivada, 
 
51 
 
mas ao contrário, comumente as pessoas tentam silenciar e conter o sofrimento da 
mulher, desconsiderando o luto materno. Tentam minimizar deste momento, tentando 
convence-la de que “logo você vai ter outro”. Essas atitudes, segundo Assunção & Tocci 
(2003), minimizam o suporte social a ser oferecido à mulher que poderia ajuda-la em seu 
luto. 
 Sabe-se que a gravidez de maneira geral exige da mulher um processo de 
ajustamento, ao qual ela deve se adaptar. Estas adaptações correspondem tanto às 
mudanças físicas como modificações corporais, hormonais e metabólicas, quanto às 
mudanças psicológicas, tais como a aceitação da realidade da gravidez, mudança da 
imagem do corporal, a simbolização do bebê e o desenvolvimento do vínculo afetivo, 
dentre outros aspectos, na afirmação de Farias & VilWock (2010). Considerando esses 
fatores todos, a parada gestacional se torna um fenômeno complexo que afeta a mulher, 
pois envolve memórias do passado e expectativas para o futuro. A perda de um bebê 
durante a gestação causa reações diversas e muito sofridas. Neste período gestacional 
a mulher investe em um processo de construção de representações sobre o filho através 
da idealização do bebê e sua relação com ele, afirmaSouza & Muza (ob. cit.;). Toda 
essa construção representacional é interrompida e impedida de se concretizar, quando o 
óbito fetal é confirmado, resultando em uma dificuldade de aceitação, negação do fato e 
sofrimento para as mulheres e para a familia. 
 A contínua construção da identidade da mulher grávida, desenvolvida 
delicadamente durante o período de gravidez, sofre uma brusca interrupção. Assim, 
rompe-se a possibilidade do exercício da maternidade, surge o sentimento de fracasso, 
traz uma dor insuportável. A mulher pode sentir-se tal como depositaria de coisas muito 
temidas na vida das pessoas, tais como: a doença que limita as potencialidades 
humanas; a loucura que aliena a autonomia enquanto ser humano; a morte como evento 
irreversível de fechamento do ciclo vital. Surge o sentimento de culpa acompanhado da 
necessidade psicológica de entender as “causas” da perda do feto, ocorrem nesse 
momento, pois permanece no campo do desconhecido e do obscuro e fragiliza o mundo 
psíquico interno, bem como os manejos necessários das demandas do mundo externo, 
e as exigências do cotidiano. 
 O bebê, ainda no ventre materno, ou durante o parto, não tiver batimentos 
cardíacos é constatada sua morte. O bebê “natimorto” constitui uma perda dolorosa, pois 
a mulher fica na maternidade onde o clima festivo predomina, e a experiência para os 
pais é extremamente traumática, talvez multi-traumática. Muitas vezes os médicos 
 
52 
 
podem estar muito envolvidos e correndo para salvar o bebê sem tempo de informar os 
pais sobre o que está acontecendo. A mãe vivente e o filho morrente formam um 
continum biológico, afirma Quayle (1997), pois este é um momento muito doloroso, 
vivenciado em todos os sentidos com muita angústia pela perda da criança, somada à 
dor fisiológica do trabalho de parto. 
 Essa vivência complexa implica em uma forma única de elaboração do luto pela 
morte do bebê. A construção de vínculos afetivos fortes e de recordações de 
convivência mútua com essa criança fica impossibilitada, de acordo com Videla e Grieco 
(1993), visto que lembranças não podem ser evocadas posteriormente, e essa ausência 
de lembranças pode trazer a sensação de que a criança foi alguém que não existiu. A 
ausência da criança é profundamente sentida, como se fosse retirada parte do corpo. Os 
pais enlutados devem ser encorajados a olhar a mulher o bebê e tocá-lo se possível, 
segundo Maldonado (1982), apesar de ser uma experiência extremamente dolorosa, 
esse momento marcará a realidade da perda. Ideações hipocondríacas, somatizações 
como forma de angústia sentida pelo corpo, desejo de morrer entre outros sentimentos, 
segundo Defey (1992), podem mostrar que os pais enlutados imaginem-se doentes, 
tenham fantasias de suicídio ou sensação de estar enlouquecendo, com dificuldades de 
separação entre ser – ou ter sido – mãe e/ou pai e o bebê morto entre a doença e a 
saúde. 
 Muitas mulheres antecipam uma nova gestação como forma de elaboração do 
luto, bem como uma forma de corresponder à expectativa cultural de continuidade da 
linhagem familiar do marido. Na fantasia, muitas mulheres se sentem capazes de gerar 
filhos saudáveis e readquirir a sensação de também serem saudáveis física e 
emocionalmente. Elaborar a perda de um bebê natimorto é uma questão de saúde, mas 
também uma questão de adaptação sociocultural. 
 
11. A perda de um filho e o luto dos pais 
 As crenças a respeito da perda de um ente querido serão ativadas e 
processadas pelo entendimento que o indivíduo tem em relação à morte, ou seja, a 
reação dependerá do estilo de enfrentamento e dos padrões anteriormente aprendidos e 
internalizados, interferindo e refletindo, principalmente, na alteração emocional e 
comportamental, devido aos erros do pensamento, segundo Remor (1999). Na maior 
parte das crenças sobre a morte revela-se a aceitação do processo de morrer, porém o 
sofrimento, a angústia e a raiva, principalmente quando a morte é repentina ou por 
 
53 
 
acidente, as pessoas se apegam aos credos e princípios da religião. Estes trazem 
grande alívio e conforto, influenciando na maneira de pensar e aceitar a morte. Diante 
disso, os pais quando perde um filho, em especial uma mãe, sentimentos de fracasso, 
de incapacidade são percebidos por não conseguir prevenir a morte do filho. Diante do 
fato, surgem sentimentos de culpa, imensa ansiedade e apatia que ocorrem diante da 
perda. 
 A morte quando ocorre de maneira brusca e repentina, salienta Kovács (1992), 
tem uma potencialidade de paralização, desorganização, impotência, desesperança, 
desgraça e desamparo. As implicações frente à morte são inúmeras, na maioria das 
vezes afetam os pais de forma que os incapacitam na reorganização de suas vidas, 
tanto no contexto familiar como no social. Os sentimentos de vulnerabilidade e 
incapacidade diante das dificuldades intrínseca à perda dificultam a aceitação da 
mesma. Porém é importante que, mesmo diante dessa dor, principalmente se existem 
outros filhos, que haja um enfrentamento e uma fase de readaptação na tentativa de 
preencher o vazio que o filho morto deixou. É necessário prosseguir e fazer uma 
readaptação com os outros filhos que são importantes também na vida desses pais, 
assim como a perda do irmão foi significativa para ambos. 
 Em geral, as mães tem apego às lembranças e á memoria que elas carregam 
em relação ao filho, as quais são revividas intensamente, não importando o tempo que 
possa ter passado. Parece haver uma mumificação da memória materna, como um 
retornar do filho ao útero materno, para proteção e privacidade de sentimentos tão 
nobres e delicados. Entretanto, essa mesma mumificação parece que conduz as mães 
ao desespero e a uma situação insustentável, porém também significa a preservação 
viva de um vinculo saudável com o filho perdido. 
 Através da maternidade, a mãe incorpora a função de proteger, cuidar e garantir 
o bem-estar físico, emocional e social do filho. A perda de um filho representa para a ela 
o fracasso em sua função materna, o que faz com que se sinta roubada em sue papel de 
proteger e de ser necessária a algo ou alguém. Quando a morte de um filho vem por 
assassinato, os pais sentem-se responsáveis pelo que aconteceu, por falhar no dever de 
cuidar. O desejo de justiça se faz indispensável para eles. Quando ocorre a justiça e 
punição, parece que grande parte deste sentimento desaparece, principalmente porque 
podem verificar e dizer que os culpados foram punidos, pois a condenação constitui uma 
forma de diminuir a inevitável culpa que sentem pelo ocorrido. Independente de classe 
 
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social, tragédias ocorrem, bem como os sentimentos de perda e luto são comum a todo 
o ser humano, cada um passa de acordo com sua subjetividade e historia de vida. 
 Os pais, além de lidar com o luto, sofrem coma sensação de impotência para 
exercer seus papeis: a mãe de cuidar do filho, o que fez desde a gravidez; o pai, 
impossibilitado de prover algo que ajude a familia neste momento de dor. O luto 
antecipatório pode ser visto como um mecanismo protetor do familiar, entretanto o 
paciente também o vivencia. Ele envolve uma variação de sentimentos, como angústia, 
dor, separação, culpa, depressão, tristeza, raiva entre outros. O luto antecipatório, 
apesar do sofrimento, de alguma maneira prepara o paciente para o desligamento dos 
laços que tem em vida, segundo Souza (2006). 
 A compreensão das vivencias dos pais que perdem seus filhos de maneira 
natural, prematura, por doença, ou de forma violenta colabora para um olhar mais 
compreensivo diante da perda, possibilitando o enfrentamento da morte com dignidade e 
apoio. Muitas formas de intervenção são necessárias e possíveis, a fim de auxiliar e 
possibilitar a superação do luto eda dor da perda. A expressão dos sentimentos e um 
reinvestir em suas próprias vidas e desejos é importante para ultrapassar os momentos 
difíceis de uma perda. 
 
12. O aborto provocado e o processo de luto 
 No aborto, nem o nascimento e nem a morte convencional aconteceu. Algumas 
pesquisas apontam para a esterilidade de mulheres com esterilidade decorrente de 
aborto realizado na adolescência. A reação das pessoas é minimizar a perda e as 
consequências. A mulher que opta por realizar aborto poderá sofrer um trauma 
psicológico e não engravidar novamente. A mulher muitas vezes se torna des-
esperançosa e como que fadada a enfrentar uma gravidez indesejada, ou não esta em 
condições de ir adiante, passando por um processo solitário quando se deparam com 
essa situação. Muitas vezes sem contar com o apoio do parceiro e/ou da familia, 
recorrem a amigas que também vivenciam a mesma situação. A mulher que não deseja 
uma gravidez, só vê como saída a prática do aborto. Desde o momento em que a 
gravidez é confirmada até a tomada da decisão final de interrompê-la, a mulher passa 
por um período complicado, em que fica extremamente sensível. A falta de educação 
sexual e a paternidade “irresponsável”, bem como o desconhecimento sobre os métodos 
de evitar uma gravidez, tem sido apontados por alguns autores como decorrência do 
abortamento provocado. 
 
55 
 
 Ao abortar, mesmo que seja uma decisão da própria mulher, ela vivencia uma 
perda e, consequentemente um processo de luto. Independente de uma gravidez ser 
planejada ou não, essa perda tanto para a mulher como para a familia, vem 
acompanhada do sentimento de culpa. Muitas mulheres, mesmo com perda pela prática 
abortiva precisa de atenção, pois ela passa pela dor equivalente à causada por outras 
perdas pessoais. Muitos problemas são identificados nessa situação, e além das 
questões obstétricas há ainda as questões psíquicas. Entre outras questões cabe 
ressaltar a alteração da autoestima relacionada com os sentimentos de culpa pelo 
abortamento; o estresse causado pelo não cumprimento dos ritos religiosos fúnebres do 
casal, ou da mulher. 
 O processo de abortar leva a mulher a um dilema, pois uma decisão difícil e 
somente ela pode decidir. Quando uma mulher decide interromper a gravidez, ela 
encontra-se num conflito em virtude de suas crenças, principio e valores religiosos, os 
quais contribuem para o aparecimento do sentimento de culpa e surgimento da 
severidade do superego. Ao decidirem sozinhas, ou junto ao companheiro, ou mesmo 
dom a familia, as mulheres deixam suas questões para segundo plano, objetivando a 
resolução imediata de sua situação. Elas veem o aborto como única saída, o que serve 
para amenizar o sentimento de culpa e as próprias cobranças internas. A dor psíquica 
de uma perda será suavizada quando ela for falada, vivida, sentida, refletida e 
elaborada, mas nunca negada. 
 As mulheres que optam pelo processo de aborto, vivenciam uma situação que 
tem o estigma da sociedade. Elas vivenciam a própria perda e o luto, sozinhas, e muitas 
vezes tem necessidade de cuidados, se hospitalizam e as famílias não tomam 
conhecimento da situação. As mulheres que praticam o aborto se sentem fragilizadas, 
podendo estar desorganizadas, incoerentes, assustadas e paralisadas. Diante de uma 
mulher em processo de abortamento provocado, a postura deve ser a mesma que mercê 
uma pessoa enlutada, como: ter disponibilidade para escutar com atenção, pois ela esta 
sofrendo e não merece julgamento ou ser criticada; no é necessário concordar com o 
ponto de vista dela, mas acolhê-la; identificar o que se passa e o que diz; manter o 
silêncio que ela necessitar; fazer com que perceba que esta sendo respeitada, isso a 
ajudará muito nesse momento difícil. O importante é não mascarar ou fugir do luto 
porque esse comportamento favorecera o aparecimento de problemas futuros. A 
pessoa enlutada deve receber o reconhecimento social para a sua dor, caso contrário, 
 
56 
 
poderá temer que seus pensamentos e sentimentos, sejam anormais, o que nem 
sempre ocorre. 
 A mulher em situação de aborto, segundo Bromberg (2014), vivencia o “luto não 
autorizado” que se refere às perdas “que não podem ser abertamente apresentadas, 
socialmente validadas ou publicamente pranteadas”. Esse tipo de luto é dividido em: 
relacionamentos não reconhecidos – como, por exemplo, os vínculos extraconjugais, 
relacionamentos homossexuais, ex-cônjuge ou amantes, pais biológicos de crianças 
adotivas e médicos e enfermeiros que se vincularam ao doente; perdas não 
reconhecidas – como, por exemplo, mortes perinatais, abortos, devolução de crianças 
adotadas aos pais biológicos ou instituições, disponibilidade de filhos para adoção, 
morte de animal de estimação, perda social e psicológica sem morte (um dos parceiros 
com mal de Alzheimer); enlutado não aceito como tal – podendo citar crianças muito 
pequenas para estar de luto, ou adultos considerados muito velhos ou com alterações 
cerebrais, quando a morte ocorre num asilo, num hospital psiquiátrico ou em uma 
instituição para pessoas com dificuldades de aprendizagem (DOKA, 1989). 
 As pessoas incluídas na classificação do “luto não autorizado”, a manifestação 
desse luto poderá ser problemática, porque pode este pode ser intensificado por ter sio 
ignorado ou reprimido; a raiva e a culpa podem surgir e complicar o curso do processo 
de luto. O enlutado pode ser excluído dos rituais, mas ele fica em falta no aspecto social 
para poder vivenciar o processo do luto, segundo Parkes. O “luto não autorizado” nas 
“perdas não reconhecidas”, classificação em que o aborto provocado esta incluído, 
Bromberg refere que este terá influencia sobre a futura mãe, podendo a mulher não 
engravidar pelo trauma psicológico sofrido. 
 
13. O luto: processo de elaboração 
 O processo de luto ocorre quando da perda de alguém muito próximo. Desde o 
inicio dos tempos existe a morte, mas nem sempre teve representações nítidas na 
mente do ser humano, segundo Kastenbaum e Aisembesrg (1983). Portanto, há 
necessidade de morrer, pois ajudará a perpetuar a espécie que se nutre da morte de 
seus indivíduos para se preservar. O processo de luto é instalado para a elaboração de 
uma perda. Consiste no desligamento da libido a cada uma das lembranças e 
expectativas relacionadas ao objeto perdido, portanto, constitui um processo lento e 
penoso. Numa situação dolorosa, no objeto do qual é sentida a falta ou está perdido, 
ocorre uma catexia concentrada, por não pode ser aquietada – o objeto não existe mais 
 
57 
 
– tende a aumentar, com efeito, sendo assim hipercatexizada. O ego fica absorvido no 
processo de luto por meio dessa hipercatexia, a sua elaboração ocorre sob a influência 
do teste, fundamental para a constatação de que esse objeto não existe mais. Freud 
(1920) descreve o instinto de realidade através dos instintos de autopreservação do ego, 
o qual não abandona a obtenção de prazer, porém, um adiamento da satisfação, para 
obtenção de prazer no futuro. O princípio de prazer que está fortemente ligado aos 
instintos sexuais, em contrapartida, se tornam mais difíceis de domar, buscam um prazer 
imediato e desde o início pode ser visto como altamente perigoso e ineficaz para a 
autopreservação do ego. 
 O teste de realidade, portanto, atua para a preservação do ego, solicitando um 
adiamento da satisfação. A hipercatexia das lembranças vinculares ao objeto absorve o 
ego, deste modo, obtém uma satisfação imediata, na qual conserva e prolonga-se 
psiquicamente a existência do objeto perdido, nesse meio tempo, que segundo Freud 
(1915), esta oposição ocasiona um desvio da realidade e um apego ao objeto perdido. 
As lembranças e expectativas, cada uma delas isoladas por meio das quais a libido está 
vinculadaao objeto é evocada e hipercatexiizada, e o teste de realidade exige que toda 
a libido seja retirada de suas ligações com aquele objeto. Dessa forma o trabalho do 
luto é concluído quando a realidade prevalece e quando atingido certo grau de catexia, a 
libido é desligada e o ego se vê livre e desinibido outra vez. 
 A capacidade do indivíduo se relacionar com o mundo externo depende da sua 
capacidade de distinguir entre percepções internas e percepções externas. O teste de 
realidade é o meio pelo qual o indivíduo se defronta com cada lembrança do objeto 
amado e perdido. Dessa forma, envolve o ego numa persuasão narcísica, diante da 
questão de saber se seguirá o mesmo destino do objeto ou continuará vivo, assim é 
convencido pelo prazer de estar vivo a desligar do objeto. Essa persuasão narcísica não 
contém um triunfo acerca do luto, segundo Freud. Para ele o triunfo tem características 
de mania como uma grande euforia relacionada à economia da libido. Quando não há 
necessidade de fazer um grande esforço para alcançar uma condição, essa situação 
promove uma grande euforia, como por exemplo, ganhar dinheiro na loteria, o que não 
ocorre quando o individuo ganha no trabalho. A euforia não esta presente no trabalho 
realizado no luto e o ego se vê livre para investir sua libido em outro objeto. 
 Para Melanie Klein, o objeto de amor, assim como os objetos bons da infância, 
foi introjetado e instalado no mundo interno. Dessa maneira, quando se instala o luto 
adulto, o indivíduo tem a fantasia inconsciente de que com o objeto perdido todos os 
 
58 
 
seus objetos bons, inclusive seus pais bons internalizados, foram perdidos. Com isso há 
um predomínio dos objetos maus, reativando a posição depressiva e suas ansiedades 
derivadas: da culpa, dos sentimentos de preda provindos do desmame, do complexo de 
Édipo e outras fontes, além de alguns sentimentos de perseguição que também podem 
ser reativados. Dessa forma, quando ocorre a perda real, em sua fantasia, o indivíduo 
acredita que seu mundo interno foi destruído. Para essa autora, o processo de luto 
consiste na restauração do mundo interno, reintrojetando o objeto bom de maneira 
reestruturá-lo, assim como todos os objetos que acreditou ter perdido, recuperando 
aquilo que já havia obtido na infância. 
 Numa situação de perda um dos estados mais dolorosos está na constatação 
real deu ela existiu. Aperceber-se da perda consiste num trabalho de reste de realidade, 
fundamental para a compreensão e o caminho até a sua elaboração. Para Melanie 
Klein, o bebê fazia uso contínuo do teste de realidade a fim de testar seu mundo interno 
por intermédio de sua realidade externa, assim como a mãe má interna tinha como 
referência a mãe externa, a percepção de que a mãe era o objeto integral e ambivalente 
do qual continha boas e ruins. Isso trazia uma insegurança e, consequentemente, uma 
melhor tolerância aos objetos ruins. Assim, através do prolongado teste de realidade é 
que se explica de certa forma a necessidade de reativar elos com o mundo externo, 
revivendo assim constantemente a perda, o que constitui de forma ativa na dolorosa 
reconstrução do mundo interno que está em perigo de desmoronar na mente do 
indivíduo. Portanto, da mesma maneira que o bebê sofre para reestabelecer e 
reestruturar seu mundo interno na posição depressiva arcaica, o sujeito enlutado 
também o faz, segundo Bonfim (2013). A autora postula que dos sentimentos que estão 
ligados adulto, os mais perigosos são os de ódio contra a pessoa perdida. Esse ódio 
pode vir à tona por uma sensação de triunfo sobre o morto. 
 No desenvolvimento infantil kleiniano, o triunfo faz parte da posição maníaca. Os 
desejos de morte infantis contra os pais, irmãos e irãs se veem realizados quando uma 
pessoa querida morre. Esta sempre é um representante, até certo ponto, das figuras 
importantes do início da vida da criança, e atrai, portanto alguns dos sentimentos 
originalmente relacionados a elas. Essa morte, por mais que tenha sido arrasadora por 
outros motivos, não deixa de ser percebida também como uma vitória. Segundo Klein 
(1940), isso dá origem à sensação de triunfo, que gera mais culpa ainda, e atrapalha o 
processo de luto por interferir na crença do indivíduo em seus objetos bons. Quando o 
ódio é projetado na pessoa amada perdida, esta passa a ser um perseguidor, oque 
 
59 
 
dificulta o processo de idealização. Na tenra infância, quando a mãe boa idealizada 
trazia grande segurança para a criança contra a mãe má retaliadora, e contra os outros 
objetos maus, no luto, idealizar o objeto de amor contribui para manter ainda mais 
temporariamente um mundo interno inseguro por trazer lembranças da pessoa que 
morreu. 
 A aproximação com a realidade, bem como, essa relação continua com o mundo 
externo, é necessária para a elaboração do luto e tem como base o simbolismo. O corpo 
da mãe e o seu conteúdo, no auge do sadismo, se tornam fonte do interesse da criança, 
pois ela quer toma-lo para si e destruí-lo. Os ataques contra a mãe trazem na criança 
uma ansiedade persecutória, um medo de que esses ataquem voltem para si, e que no 
caso do luto adulto, a ansiedade pode ser persecutória, relativa ao triunfo. As 
ansiedades essas que movimentaram o bebê na procura de equiparação com seus 
objetos maus, e causam medo com objetos do mundo externo, buscam equipara-los e 
dota-los de simbolismo. Klein (1930) afirma que “chequei à conclusão de que o 
simbolismo é o fundamento de toda a sublimação e de todo talento, pois é através da 
igualdade simbólica que as coisas, as atividades e os interesses tornam o conteúdo de 
fantasias libidinais”. Assim, fica evidente que a sublimação pode ser relacionada ao 
trabalho de luto. 
 Da mesma forma que as ansiedades provindas do sadismo fazem com que o 
olhar do bebê seja desviado da mãe para o mundo externo, o enlutado desvia seus olhar 
do objeto de amor perdido para o mundo externo. Isso porque de certa maneira, a 
pessoa perdida é simbolicamente relacionada aos seus objetos bons internalizados, ou 
seja, seus pais amados. O luto adulto é a reativação da posição depressiva da criança, 
para Klein (1940), sendo que a diferença da perda de um objeto real e o desmame está 
no contexto. O bebê é tomado pelo sofrimento, ao perder o seio e toda a sua simbologia 
de bom e segurança que esse objeto carrega, mesmo estando a lado da mãe, 
justamente por estar no auge da luta contra o medo de perder tanto a mãe interna 
quanto a externa e a segurança ainda não foi bem estabelecida em seu mundo interno. 
Já no luto adulto, o cenário é diferente, pois ocorre a perda real de uma pessoa, 
entretanto, o fato de ter estabelecido uma mãe “boa” internamente ajuda na superação. 
Por essa razão, a presença de pessoas amigáveis corrobora e traz um maior conforto 
numa situação de luto. O trabalho de luto consiste na reintrojeção do objeto bom, 
portanto, introjetando novamente não somente a pessoa amada, mas também os 
pais amados que representam seus objetos bons internalizados. 
 
60 
 
 Na versão patológica do luto, há desdobramentos. O conceito de melancolia 
segundo Freud (1915), traz os mesmo sintomas do luto, exceto por uma perturbação na 
autoestima. O estado de auto depreciação exagerada do melancólico tem caráter mais 
inconsciente e ideal. O objeto não precisa necessariamente ter morrido, mas apenas ter 
sido perdido enquanto objeto de amor, como por exemplo um término de 
relacionamento. A auto desvalia expressa pelo melancólico acontece porque o ego se 
identifica com o objeto de amor perdido. A libido objetal vinculada a ele se volta para o 
ego do indivíduo. O superego julga essa libido como se fosse um objeto, o objeto de 
amor perdido. O enlutado, por essa razão, não sente vergonha ou demonstra se 
incomodar em expressar seu ódio e recriminações que,apesar de serem ditas de si 
mesmo, parecem se referir a outra pessoa, ao ser amado que agora esta de certa forma 
instalado dentro do seu próprio ego. 
 A melancolia é relacionada por Freud, à fase sádico-anal do desenvolvimento, 
que além, da ideia de incorporação, há também uma fantasia de destruição ao ato de 
mastigar e morder. O ego tem o ímpeto de sobrevivência, mas na melancolia, há um 
conflito expresso sintomaticamente como desvalia, causado pelo objeto amado 
incorporado, que traz um sentimento de abandono ao enlutado. Esse conflito do ego 
pode ser relacionado diretamente ao conflito da fase oral que traz como sintomas a 
inapetência, disfunções alimentares, vômitos, e algumas até com caráter suicida. O 
suicídio só poderia ser praticado para agressão de outro, ainda que outro que se 
encontra dentro do próprio ego. 
 Melanie Klein (1940) postula que o luto normal consiste na não superação da 
posição depressiva arcaica, prevalecendo defesas mais regressivas da posição 
esquizoparanóide, as quais são usadas pelo individuo melancólico. Uma relação 
agressiva de objeto se estabelece através de defesas mais primitivas que pode ser 
associada à relação de sadismo que ocorre entre o enlutado e seu objeto de amor na 
melancolia. Essa autodesvalia dirigida ao ego, de acordo com a identificação feita por 
Freud (1915), identificada como sendo dirigida, na verdade, a outro alguém do qual se 
encontra instalado no próprio ego: o objeto de mor perdido. O ódio expresso pelo objeto 
de amor perdido pode estar associado à relação de amor e ódio que é descrita por Klein 
(1937), e que estão presentes desde os primeiros anos de vida do bebê. Este ama sua 
mãe quando ela o alimenta, e a odeia quando ela se ausenta e não atende suas 
necessidades, o que traz sentimentos agressivos de ódio e desejos destrutivos em 
relação a ela que é sua fonte de gratificação. 
 
61 
 
 A teoria destes autores, Freud e Klein, se concentram no desenvolvimento 
psicossexual, ambos concordam que os desdobramentos da vida infantil e 
considerações acerca do Complexo de Édipo podem influenciar na personalidade do 
indivíduo. Entretanto, ao falar do luto, não há muitas diferenças. Cada um se expressa 
mediante a forma como introduziram suas teorias, porém o luto e as questões 
patológicas em relação ao luto, bem como, as vias de elaboração deste, são bastante 
parecidas, onde são encontradas mais relações do que divergências entre estes 
autores. A duas teorias entendem que o sujeito enlutado deve voltar ao estado em que 
se encontrava antes da perda, ou o mais próximo possível, seja com o ego para novos 
investimentos no mundo externo, seja com o mundo interno harmonioso e bem 
estabelecido de objetos bons. A perda de algum objeto amado traz, ainda que de forma 
momentânea, a fragmentação e a desestruturação do sujeito. O luto, portanto, é um 
processo de reconstrução e reorganização diante de uma perda, um desafio pois, com o 
qual o sujeito tem que lidar. Em contrapartida, na contemporaneidade, os rituais 
fúnebres, ou seja, o velório ocorre em local fora, longe da casa do morto e o enterro é 
providenciado o mais rápido possível, as demonstrações de pesar e as lágrimas são 
desencorajadas. 
 As expressões tais como: “homem não chora”, “seja forte”, “foi melhor assim”, 
são fatores de repressão dos próprios sentimentos, principalmente quando se trata de 
sentimentos expressos pelo sexo masculino. As mulheres enlutadas são encorajadas a 
“cuidar” daqueles que ficaram, sejam filhos, companheiros, irmãos, genitores, e assim, 
não podem “chorar” o morte, pois a vida continua e a mulher tem um “papel” 
fundamental na situação de bem-estar dos familiares vivos. 
 O processo do luto deve ser completado, através de algumas tarefas básicas, a 
fim de que, a pessoa enlutada possa seguir seu desenvolvimento de forma mais sadia. 
Essas tarefas, segundo Worden (1998), são: aceitar a realidade da perda; elaborar a dor 
da perda; ajustar-se a um ambiente onde a pessoa que faleceu esta faltando; 
reposicionar a pessoa que faleceu, em teremos emocionais, e continuar a vida. freud 
(1913) afirma que “o luto tem a tarefa física que precisa cumprir: a sua misso é deslocar 
os desejos e lembranças da pessoa que faleceu”. As etapas do luto precisam ser 
vivenciadas, como a criança passa por etapas para seu desenvolvimento saudável, a fim 
de que não ocorram traumas ou danos futuros. 
 
14. Relações amorosas: rupturas, elaborações e lutos 
 
62 
 
 As relações amorosas na vida adulta têm como modelo as experiências 
vivenciadas na infância. O individuo revive não só os amores e cuidados obtidos, mas 
também o sofrimento e o sentimento de desamparo. Os seres humanos consideram o 
amor como um dos caminhos a serem percorridos na busca pela felicidade, pois, é uma 
experiência na qual pode ser obtida a mais intensa experimentação referente a uma 
transbordante sensação de prazer. A tentativa de encontrar a felicidade através do amor 
é fracassada, uma vez que, justamente quando o individuo ama é que se acha mais 
indefeso contra o sofrimento, e além do mais, quando perde o objeto amado ou o seu 
amor, se sente desesperadamente infeliz. Quando o homem escolhe a vida do amor 
sexual, enfatiza Freud, ele se torna dependente de parte do mundo externo de uma 
maneira bastante perigosa, pois, a dependência do objeto amoroso escolhido, pode 
causar-lhe um sofrimento extremo caso perca o objeto. 
 A psicanálise se dedica à tarefa de ajudar a nascer a face do psiquismo e do 
simbólico nas relações objetais e intersubjetivas, debruça-se sobre o conhecimento da 
essência da mente e das operações que a constituem. Freud foi um teórico humanista. 
Deixou o legado sobre a vida e sobre a morte; sobre Eros que une e um instinto que 
desfaz conexões, levando o vivo a um estado sem vida – a morte; a multiplicidade do eu; 
apontou para as conquista de identidade, assim como mostrou o caminho das pedras 
para enfrentar a desvalia e suas respetivas defesas; mostrou os limites da razão quando 
ameaçada pelo desamparo, implacavelmente humano, afirma Franca (2009). 
 Falhas no intercambio afetivo primário levam o homem a não estabelecer 
vínculos estáveis. Permanece escravo da organização de sua mente inicial regida pela 
concretude e pela leitura radical e onipotente dos fatos. Assim, nessa fase não há lugar 
para o pensamento simbólico, apenas para o ilusório, limitando o contato do homem 
com a realidade interna como também com a realidade externa o que o impede de 
desenvolver instrumentos adequados para lidar com desejos, necessidades e 
prioridades de seus valores. A condição humana natural de potência se torna debilitada 
pela carência de reconhecer, principalmente de ser reconhecido pelo outro, ou parceiro. 
Na incapacidade de simbolizar, segundo Franca, o individuo somente pode lidar com 
seus vínculos de forma: passiva, ficando à mercê de seus desejos imediatos – as 
pulsões, das ilusões ou das falsas promessas e do controle dos mais espertos; ativa, 
esta compulsiva e à mercê das pulsões, atraído pelo “fascínio do poder e do controle” 
uma vez que os poderes oferecidos pela sua própria natureza - o da inteligência e o do 
 
63 
 
contato íntimo consigo e com o outro – lhes são impedidos pela parca conquista de 
desenvolvimento afetivo- emocional- intelectual. Torna-se alienado. 
 As escolhas amorosas na vida adulta constituem uma atualização da relação 
primária com as figuras parentais. Para Freud (1914), a busca pelo objeto de amor e 
representa uma tentativa do indivíduo recuperar seu narcisismo infantil perdido a fim de 
retornar à sensação ilusória de onipotência e completude vivenciada em sua relação 
primitiva com o cuidador. O autor aborda a questão da escolha amorosa na vida adulta 
através da escolha de um objeto,existindo duas possibilidades de escolha objetal: a 
escolha do tipo anaclítica ou de ligação, corresponde a um tipo de escolha relacionada 
aos amores paternos e/ou maternos imaginários, ou seja, relacionada com a mulher 
alimenta, ao homem que protege e a sequência de substitutos que ocupam o seu lugar; 
a escolha objetal do tipo narcísica prevalece um narcisismo intensificado, pois com o 
amadurecimento dos órgãos na puberdade, o narcisismo primário é intensificado. 
 Na vivência a dois, em especial no início do relacionamento amoroso, é comum 
que as qualidades do parceiro sejam amplificadas, havendo uma crença de que possa 
modificar as características indesejáveis. A paixão, segundo Rassial (2003), se organiza 
em articulação com a posição esquizoparanoide, considerando que de início tudo está 
no outro, e assim, espera-se que possa corrigir o “pequeno defeito” que houver, através 
do encontro amoroso. A partir de um outro momento, como que num segundo tempo, 
em decorrência do objeto bom e do objeto mau, em decorrência da posição depressiva, 
o sujeito deve renunciar à possibilidade de que o outro seja totalmente bom. Por isso 
mesmo, espera-se no começo, ficar com bom e curar magicamente o intolerável ou 
inaceitável. Ao perceber que os aspectos bons e maus são indissociáveis, ocorrem 
comumente momentos que oscilam entre regressão e a imposição e depressão; quer 
dizer, forçar o par ou o outro a cumprir o pacto e corresponder às fantasias idealizadas 
do inicio da relação. Os sujeitos procuram, diante de uma crise, nega-la e evitam fazer o 
confronto com possíveis desilusões. Alguns ideais que estiveram presentes na 
construção do laço conjugal foram atingidos, e, portanto, tornados vulneráveis. 
 O individuo, quando imerso num estado de apaixonamento, está tomado por um 
objeto que afirma não poder se privar. O individuo que é fisgado pela paixão, afirma Gori 
(2004), perde o controle de seus próprios pensamentos e atitudes, fazendo com que, 
aos seus próprios olhos e aos dos outros, pareça perder o controle de si mesmo. As 
causas desse drama são desconhecidas. Sofrem as consequências dessa tragédia 
psíquica ou tentam reduzir os seus danos e destruições. Esse sentimento de abandono 
 
64 
 
não é novo. A sensação terrível de desamparo vivenciada pelos apaixonados que se 
denominam apaixonados, é uma consequência de uma “paixão imaginaria” da qual o 
individuo não se recorda. O estado de desamparo do qual o apaixonados e encontra 
após a separação, deve ser considerado como originário, precedente da paixão 
amorosa, por isso, “a separação não resulta da paixão, ela a convoca” (GORI,2004). 
Assim a paixão na vida adulta nasce a partir de uma perda, diz respeito à perda do 
narcisismo infantil. Freud observa que “o estado de paixão amorosa, como o 
ressurgimento de um sentimento anteriormente vivido, que, contrariamente àquilo de 
que testemunha energicamente o interesse, evidentemente não é novo para ele” 
 O casal ao se separar, ambos os cônjuges são atingidos por diferentes emoções 
de intensidade diversas. Alguns sujeitos, afirma Lemaire (2005), buscam de forma 
desesperada, manter o modelo fusional presente nas etapas precoces da vida em cada 
relação amorosa que estabelecem e ficam incapacitados de fazer um trabalho do luto 
após o rompimento. Vivem a dor de uma ferida narcísica e colocam em questão sua 
capacidade de ser amado, duvidam de seu próprio valor. A perda das ilusões 
depositadas no casamento ou no parceiro, o ressentimento e o ódio provocam um 
desejo de aniquilar o outro. 
 Um casal ao se separar, por se sentirem traídos e humilhados, nutrem 
sentimentos de vingança, e podem alimentam nos filhos reações de repulsa e ódio 
contra o outro genitor. Em ações de divórcio ou separação é muito comum um genitor 
tentar criar obstáculos e tentar destruir os vínculos do(s) filho(s) em relação ao outro 
genitor, sem a existência de motivos reis que justifiquem para promover uma “alienação 
parental”. A angústia experimentada pela mulher, afirma Freud (1926), não esta referida 
à real perda do objeto, mas à perda do amor por parte do objeto. O medo de ser 
abandonada pelo parceiro e perder seu amor é enfatizado por Ligeiro e Barros (2008), 
ampliando essa afirmação freudiana, é uma invariável na vida psíquica feminina. 
Enquanto o homem está submetido à função fálica, asseveram as autoras, nela 
encontram apoio para atravessar os momentos de angústia, a mulher experimenta uma 
espécie de dissolução de si, perdendo as delimitações do seu ser. A mulher, diante de 
um não saber sobre sua própria feminilidade, tentará fazer suplência a essa falta por 
meio do amor, exclusivamente no desejo do homem. O amor, desta forma, 
principalmente a perda do amor, é sentido como uma devastação. Ao perder o amor do 
homem, ela se perde. 
 
65 
 
 A necessidade de amor e a total dependência em relação ao amado, segundo 
Zalcberg (2008) vão se impondo historicamente como constitutivos da identidade 
feminina. A saída através do “ter” não soluciona a questão do culto ao amor, na medida 
em que as conquistas fálicas da mulher na atualidade não superam a pendencia 
identificatória na ordem do “ser”. A mulher precisa ser amada. Sua feminilidade é 
definida através da parceria com um homem. Sua exigência se torna maior na medida 
em que abdica de sua própria vida em favor do amado. Para a mulher amar é um vício, 
portanto, amar demais é enlouquecedor, afirmam Santos e Sartori (2007), pois é uma 
vicissitude comum na via erótica feminina. Nesse “enlouquecimento”, exige do parceiro 
“provas de amor” que, por vezes, transcendem os limites. 
 A ruptura de uma relação apoiada na expectativa de evitar o desamparo provoca 
intensa emoção e uma tentativa de manter o controle sobre o outro, não reconhecido em 
sua alteridade. Uma agressividade arcaica é vista na irracionalidade vingativa sobre o 
outro. As contrariedades vividas na relação e após a separação são sentidas como 
feridas narcísicas, não apenas como diferenças e frustrações existentes em qualquer 
relação humana. O inimigo que desperta a fúria arcaica, segundo Kohut, é aquele que 
provoca falhas numa realidade narcisicamente percebida. “Constatar que o outro é 
independente e está conseguindo gerencias sua vida após a separação é 
experimentado como ofensivo por aqueles que têm intensas necessidades narcísicas e 
depositaram no casamento seus anseios fusionais”, afirma Levy (2011). 
 A ruptura de uma relação amorosa demanda um trabalho psíquico. As questões 
referentes à subjetividade de cada cônjuge precisam ser elaboradas para a travessia do 
processo de luto. A dificuldade em superar o ressentimento decorrente do termino de 
uma relação amorosa, principalmente numa relação fusional, confirma novamente a 
indiferenciação eu/outro e a perda vivida como uma perada de si mesmo. A projeção do 
ego ideal no outro, como uma tentativa de evitar a angústia de desamparo e recriar o 
estado de onipotência infantil provoca o aprisionamento do parceiro, que deixa de ser 
considerado em sua alteridade. A relação se mantem enquanto ambos correspondem ao 
que deles é esperado e é ameaçada quando a ilusão se rompe. A incapacidade de 
elaborar a ferida narcísica decorrente do fim da relação dificulta que cada parceiro 
assuma a sua parte de responsabilidade na história vinham escrevendo em conjunto. A 
culpabilização do outro faz com que possam viver a dor, cada um assumindo posições 
extremadas, presos a uma lógica binaria na qual só existe o bom e o mal, o inocente e o 
culpado, a vítima e o algoz. 
 
66 
 
15. Perdas ambíguas 
 A familia como um sistema dinâmico, na atualidade, ao longo do tempo convive 
com entradas e saídas de membros em diferentes idades. Esta condição na dinâmica 
familiar pode gerar uma situação de crise, compreendida, como movimentopara 
mudança e uma situação de perda. Essas entradas e saídas, normativas ou não 
normativas ocorrem: no casamento, no divórcio, nas separações, no nascimento e nas 
mortes, afirma Nascimento e Coelho (2006). 
 Para todas as pessoas, bem como todas as famílias, a perda é um fenômeno 
universal. Mesmo sendo indefinido ou vago, o luto pode se caracterizar como uma perda 
ambígua, quando seu processo de elaboração fica impedido pela ausência de uma 
constatação clara da perda. Os rituais sociais, de acordo com o grupo social, cultural e 
religioso, ajudam a familia no processo de elaboração do luto, na medida em que 
normatiza, aceita e acolhe as demonstrações de dor e pesar. Na perda há uma 
validação da participação em vida e importância no grupo em que viveu, daquele que 
ente querido que morreu. Essa valorização e acolhimento acontecem através dos rituais 
sociais, como o velório, o enterro e as celebrações religiosas. Esses rituais de 
celebração da morte reafirmam o apoio do grupo de pertencimento para a familia 
enlutada, como por exemplo, o caso das instituições religiosas. Entretanto, na perda 
ambígua, existe uma perda que não é oficialmente validada e ritualizada. 
 A expressão “perda ambígua” se circunscreve nas relações pessoais, segundo 
Boss (1998). A autora segue dizendo de que “os psiquiatras escrevem sobre a 
ambivalência e os sociólogos sobre a permeabilidade dos limites e a confusão dos 
papeis, mas nenhuma dessas expressões capta o sentido que atribuo à perda ambígua”. 
Em sua concepção, a autora segue em sua afirmativa de que a posição de ambiguidade 
frente à perda “pode derivar-se tanto da falta de informação sobre ela, como da 
percepção conflitiva da familia sobre que membros são considerados como presentes ou 
ausentes no círculo íntimo”. 
 Na perda ambígua há dois tipos básicos de perda segundo esta autora. No 
primeiro caso de perda ambígua, não existe a certeza da morte, mas a pessoa não esta 
presente e as circunstâncias de sua ausência direcionam para tal possibilidade. A 
pessoa esta ausente fisicamente, porém psicologicamente presente. São os casos de 
membros da familia que constitui uma perda ambígua, relacionados a membros: 
sequestrados, desaparecidos, desaparecidos de guerras, desaparecidos políticos, 
desaparecidos em catástrofes. Na perda ambígua de pessoas no segundo caso, ocorre 
 
67 
 
quando o individuo esta fisicamente presente, no entanto, psicologicamente ou 
emocionalmente fica ausente, assim como nos casos de: demência ao longo do 
desenvolvimento, coma, drogadicção, enfermidades crônicas, e transtornos alienantes. 
A pessoa esta viva e presente como membro da familia, porém não apresenta as 
características que fizeram se reconhecer como a pessoa que sempre foi, o mesmo 
ocorrendo com seu papel e função junto à familia. Muitas são as formas de se ausentar 
psicologicamente da familia, como por exemplo, a pessoa “workolics”, ou “uma pessoa 
que sofre traumatismo craniano grave e, após permanecer um tempo em como, 
desperta como uma pessoa diferente” (BOSS,1999). 
 No processo de perda ambígua, não há clareza na definição de quem está fora 
e de quem esta dentro do sistema familiar. A esse processo, Boss (1988) denominou de 
“ambiguidade de fronteiras”, pois ela gera sentimentos disfuncionais e estressantes, que 
impossibilitam a reorganização e o enfrentamento familiar diante dessa perda porque as 
fronteiras permanecem obscurecidas. A autora descreve que “a ambiguidade vivida 
pelos familiares é permeada de sentimentos conflituosos, como, por exemplo, temer a 
morte de um familiar enfermo e ao mesmo tempo desejar que essa situação tenha um 
fim” (BOSS, 2001, apud SLVA, 2013), 
 Problemas individuais e familiares são causados pela perda ambígua, os quais 
dificultam a elaboração da mesma. Constitui uma perda das mais estressantes, 
desorganiza a familia, alterando papeis e gerando nova estrutura de funcionamento em 
função da perda. Somente quando a perda é compreendida como irrecuperável que as 
emoções contraditórias provocadas acabam se conciliando. De acordo com Boss 
“perder” e ainda permanecer ligado a pais e filhos; terminar relacionamentos 
significativos, divórcios e novos casamentos – todos são eventos comuns nos quais as 
fronteiras familiares obscurecidas e, muitas vezes, permanecem assim durante as 
transições inevitáveis da vida. 
 A separação ou o divórcio dos cônjuges provoca uma confusão sobre a 
ausência e presença de cada um na vida do outro. No início da separação, 
principalmente, as fronteiras entre cada um dos ex-cônjuges, bem como as fronteiras 
familiares ainda não estão suficientemente claras. A relação do casal, no divórcio, é 
alterada e sofre a perda de seu significado pela dissolução do casamento, porém algo 
continua; cada parte do casal, embora o casamento tenha terminado, continua 
exercendo o papel de pai ou de mãe, ou de ex-esposo, ou de ex-esposa. O divórcio em 
si não é a questão analisada, mas a ambiguidade da perda não resolvida que com 
 
68 
 
frequência o acompanha. Pelas dificuldades associadas à ambiguidade, uma perda 
ocasionada pelo divórcio muitas vezes é mais difícil de resolver do que a viuvez. 
 O aprendizado da convivência com a ambiguidade decorrente do divórcio é 
necessário o desenvolvimento de novas habilidades. É importante compreender a 
percepção de quem faz parte e de quem não faz parte da família, se o cônjuge 
divorciado é ou não é assim percebido. Num segundo momento, a habilidade de 
abandonar uma definição absoluta e precisa de família. É importante e necessário 
aumentar a flexibilidade de sua composição nos períodos de transição, em que novos 
membros possa fazer parte eventual do sistema. As relações, antes caracterizadas pela 
coabitação, passam também a existir de outras formas, como a guarda e visitas aos 
filhos, novas relações amorosas dos cônjuges e do suporte fornecido pelos pais/avós. 
 O primeiro casamento deixa completamente de existir, afirma Boss (2001), 
quando há uma segunda união. Entretanto, não deixará de fazer parte da história de 
vida de uma pessoa, no sentido de que, mesmo que tenha sido uma experiência boa ou 
ruim, frequentemente algo mais que a lembrança permanece nas relações seguintes. 
Numa segunda relação, mesmo com o divórcio, o antigo companheiro ou companheira 
se encontra muitas vezes presente, principalmente quando há filhos dessa união. A 
perda ambígua pode causar efeitos dolorosos e dramáticos, mas algumas pessoas se 
utilizam dessa experiência para aprender a viver nas circunstâncias difíceis que passam 
pela vida. 
 Muitas vezes a perda ambígua é fundamentada em uma tragédia pessoal, porém 
não tem que ser necessariamente devastadora. Pode apresentar aspectos positivos, 
como a criatividade e o amadurecimento, o conhecimento e a aceitação das próprias 
limitações e fragilidades. As situações de incertezas possibilitam um desenvolvimento 
pessoal e familiar, podendo haver um aprendizado que conduza as pessoas com maior 
facilidade a assumirem riscos, ficar mais independentes, ter mais espontaneidade, 
experimentar uma estabilidade, como também contar mais com as trocas de 
experiências com outras pessoas. Pessoas há que, procurando equilibrar o que se 
perdeu com o reconhecimento da dor, buscam na fé as possibilidades oferecidas pela 
própria vida. O manejo individual e familiar em lidar com a perda ambígua, por certo, 
deve estar orientado por uma energia e capacidade de recuperação orientada pela 
questão de resiliência. 
 A resposta ante as questões de como seguir adiante perante uma perda 
ambígua, dependerá de cada um, entretanto a importância não está nas respostas à 
 
69 
 
pergunta, porém a situação de incerteza remete ao próprio sentido de estar no mundo. 
Essa questão pode ser ampliada para“a partir da incerteza da perda, lidar-se com o 
caráter do desamparo, que nos envolve, a todos, na medida em que estamos 
cotidianamente expostos a um mundo incerto tanto de possibilidade quanto de 
tragédias”, afirma Boss (2001). A partir dos estudos dessa, verifica-se que vários fatores 
influenciam o modo como um familia vive uma perda ambígua. É na familia de origem, 
quando esta tem as primeiras experiências sociais, onde se aprende as primeiras 
normas, os papeis e rituais, incluindo aqueles associados a perdas. Quanto à perda 
ambígua, Pauline ressalta outro ponto, afirmando que “perceber o mundo de forma 
lógica, como sendo um lugar bonito de justo, pode constituir-se num obstáculo para 
tolerar a perda ambígua. As pessoas que vêm o mundo dessa maneira, creem que 
recebemos o que merecemos, ou seja, se trabalharmos duro e somos corretos, teremos 
êxito para sermos felizes” (BOSS, 2001). 
 A “relação” com o ausente tem características distintas de outras relações. O 
rompimento pode não significar necessariamente uma atitude plena de distanciamento. 
A memória do morto presente, assim como a perda dará um outro teor ás relações que 
prosseguem e aos futuros laços com outras pessoas. O padrão relacional do enlutado, 
sem dúvida altera a experiência de morte do outro. A partir de uma perda clara o luto 
consiste em uma situação extrema e ambígua, na medida em que inaugura uma relação 
inédita entre dois mundos. As dificuldades associadas podem ser vistas quando vem 
somar-se ao luto na forma de ambiguidade. Quando a perda não se concretiza para o 
individuo e para a familia como ausência real de um corpo a ser levado, surge um 
imperativos ao processo de luto, já que os dados concretos impedem de ser dito um 
“adeus”. 
 No processo de luto, um trabalho de elaboração ao longo do tempo é esperado, 
isso até que o enlutado re-organize sua vida e a familia re-organize seu sistema, diante 
da perda ambígua. Nessa situação de perda o que ocorre é uma paralização ou um 
frenético comportamento improdutivo das pessoas e da família, que por vezes atua no 
luto e outras na esperança. Ainda não existe uma visão integrativa do luto e 
enlutamento. A noção de “perda ambígua” de Pauline Boss traz uma importante 
colaboração, na medida em que reúne uma visão sociológica e psicológica. O conceito 
de luto e de “apego”, na concepção de Bowlby (1990), relacionam certos patrões de luto, 
bem como, remetem a situações de risco e desamparo. 
 
 
70 
 
16. A velhice: o viver e o morrer 
 A velhice é uma fase da vida. Os idosos são indivíduos designados assim a 
partir de critérios socialmente construídos. Segundo Beauvoir (1976), a velhice, assim 
como a morte, costuma parecer uma realidade distante para o homem. Desta forma, a 
velhice e a morte ganham um caráter abstrato para o individuo por certo tempo, e “talvez 
seja (a velhice) dentre todas as realidades, aquela cuja noção puramente abstrata 
mantém durante maior lapso de tempo” (BAUVOIR, 1976). Muitas pessoas olham para 
a velhice com preconceito e discriminação. Pensam sobre o que fica bem, ou não fica 
bem fazer a partir de uma certa idade. Não é o que a pessoa possa ou não fazer, nem a 
partir de determinados comportamentos, mas o que não fica bem aos olhos de outros, é 
o desejo que a pessoas tem de participar de determinados tipos de atividades. 
 Os tipos de discriminação imposta ao velho constituem nas pequenas mortes 
deste, na medida em que ele é enterrado vivo, no sentido de recusar a ele a 
possibilidade de escolha e participação. O que é determinado pela cultura, é o que as 
pessoas acabam achando adequado ou inadequado, como o casamento entre pessoas 
mais velhas. O exemplo esta na condição de que um homem de sessenta anos pode 
casar com uma jovem de trinta anos, isso é adequado e aceitável, mas uma casar com 
sessenta anos casar com um jovem de trinta anos é inadequado, é inaceitável. Essa 
imposição é uma restrição na liberdade do ser humano, atravessado pela cultura. Esses 
preconceitos estão arraigados dentro de cada indivíduo, que acaba achando julgando 
certas coisas porque não fora ensinadas a olhar de outras formas. Se o velho tem uma 
tendência suicida, com tantas restrições e discriminações que possa sofrer, ele poderá 
fazer uma passagem ao ato – suicidar-se. 
 Quando se pensa sobre o envelhecimento, não há como não abordar as 
perdas vivenciadas nesse processo. A idade avançada traz consigo a aproximação da 
morte. A velhice que é vista por muitos como o começo de um fim, aos olhos da pessoa 
idosa se associa muito mais ao medo da dependência do que da morte. O sujeito que 
envelhece se torna naturalmente mais vulnerável e se depara com diversas situações de 
perda. Na velhice as perdas estão relacionadas à morte real de amigos e companheiros, 
ao corpo, ao fim das relações de trabalho, ao relacionamento social e familiar. A velhice 
expõe as pessoas a muitas perdas, tanto do ponto de vista físico quanto emocional e 
social. Estas perdas perpassam a dimensão do físico em sua concretude, como os 
universos profissional, social e familiar, vivenciadas de forma concomitante muitas 
vezes. O enfrentamento de sucessivas perdas reais e simbólicas, afirmam Carvalho & 
 
71 
 
Coelho (2006), onde a confrontação de uma perda pode acelerar e potencializar a 
vivência de outras perdas. A devoção religiosa ou a fé fortalece a aceitação da morte e 
constitui um recurso amenizador da solidão ou do sofrimento da perda. 
 Na velhice, o objeto perdido, no tocante às perdas orgânicas, pode ser 
configurado como as perdas: - relações orgânicas: a acuidade visual e auditiva, o vigor 
físico, a beleza da juventude, extremamente valorizada na cultura ocidental, a memória, 
a elasticidade e a potência sexual; - relações familiares: mudança de papel na familia, 
status na vida familiar, perda do par amoroso, perda de amigos; - relações de trabalho: 
o convívio com colegas de trabalho, a aposentadoria, a redução dos proventos pela 
aposentadoria. Essas perdas são experimentadas pelo sujeito que envelhece e tem 
plena consciência das mesmas, as quais desencadeiam o processo de luto nessa fase 
de desenvolvimento do homem. Portanto, dessa forma a morte esta intensamente 
presente nas transformações que o envelhecimento impõe ao homem. Essa presença se 
dá no real como também na esfera do simbólico, culminando com o processo de luto. 
 O luto por sua vez é o resultado de uma perda de objeto, como revela Freud 
(1914), ao afirmar que “o luto diz respeito à perda de um objeto de investimento 
pulsional ao dizer que não é necessariamente um ser humano”. Segue o autor dizendo 
que “a noção de luto como afeto se faz a partir de uma perspectiva descritiva em que se 
leva em consideração o impacto ou a ressonância emocional que a perda de alguém ou 
algo querido provocar na vida libidinal”. O luto pode ser entendido assim como o afeto 
que tem sua expressão provocada pelo impacto da perda de um objeto de investimento 
libidinal. Freud esclarece que “o luto é caracterizado por uma falta de animo dolorosa, 
perda de interesse pelo mundo externo, perda da capacidade de amar e limitação de 
atividades, havendo, portanto, uma inibição egóica” (FREUD, 1915). 
 As pessoas idosas com maiores dificuldades de elaboração da morte, segundo 
Zimerman (2000), são aquelas que não conseguiram estabelecer um bom 
relacionamento com as pessoas em vida, surgindo uma reflexão sobre a avaliação dos 
afetos e sua importância no vir a ser. Pesquisas apontam que morre bem quem viveu 
bem. A maioria das pessoas mais velhas é vista como muito diminuída em suas 
capacidades ou em seu potencial. Isso faz com que a pessoa velha se veja assim, 
incapacitada em todas as áreas de sua vida. Na contemporaneidade, existe uma 
camada da sociedade que estásaindo por ai, afirma Rosenberg (1992), com 
“movimentos pró-idosos, leis, sociedades de gerontologia, etc., para defender seus 
direitos, porque tem sido muito relegada”. 
 
72 
 
 Em o “Futuro de uma ilusão”, Freud (1927), assegura que a natureza impõe ao 
homem a despeito do esforço civilizatório pelos humanos, visando à esquiva e à fuga da 
fraqueza e do desamparo. A morte argumenta Freud, constitui uma questão obscura 
para o homem e que não pode ser remediada e vencida. Ela, provavelmente 
permanecerá um enigma irremediável para sempre. O fenômeno da morte demonstra, 
portanto, a grande e imponente força da natureza sobre os homens e expõe os limites 
da condição humana. Há os elementos, que parecem escarnecer de qualquer controle 
humano; a terra que treme, a água que inunda, as tempestades que arrastam tudo, as 
doenças com seus micro-organismos, e o penoso enigma da morte, contra o qual 
remédio algum foi encontrado e provavelmente nunca será. O homem para lidar e 
suportar a sua impotência diante da morte, com a ansiedade provocada por esse 
fenômeno, recorre, através de meios psíquicos, a explicações sobrenaturais. 
 O declínio das funções orgânicas advindo com o envelhecimento é negado e 
evitado com frequência pelos filhos por estar associado à finitude da vida. Os filhos 
muitas vezes, destaca Salvarezza (2005), se negam aceitar as limitações físicas 
consequentes do processo de envelhecimento de seus pais da mesma forma que 
tendem a negar o adoecimento dos mesmos. Características idealizadas de onipotência 
são investidas nos pais de acordo com os desejos e necessidades dos filhos, por isso a 
dificuldade em prever e aceitar o declínio físico dos mesmos. A constatação da velhice 
ou enfermidade dos pais pode levar os filhos a se sentirem tão indefesos como na 
infância, provocando a vivência de grande ansiedade. Os filhos, segundo o autor, 
resistem a constatar a velhice de seus pais, e quando algum acontecimento a evidencia, 
favorece o surgimento de muitas dificuldades e conflitos. O aparente adiamento da 
velhice pode parecer protelar o confronto com a morte que esta social e culturalmente 
atrelada à velhice desde a antiguidade. 
 A questão espiritual é uma dimensão humana como outra. É uma necessidade 
do ser humano reconhecer-se dentro do universo, encontrar uma explicação para a sua 
própria existência. Na velhice na maioria das pessoas acentua a sua religiosidade e 
mostram um apego às coisas do divino. Muitas pessoas se abandonam inteiramente 
dentro de circunstancias de desesperança, enquanto outras buscam encontrar dentro de 
si mesmas uma força, embora muitas vezes esquecidos pelo resto do mundo familiar e 
social, sem razão aparente para viver e conseguem se manter bem. Parece haver um 
retorna às “figuras de apego” e busca de um “amparo”, através do divino. Muitas 
pessoas, segundo Frankl (1992), acreditam em alguma coisa além de si-mesmas, 
 
73 
 
acreditam que a vida tem sentido, mesmo que ninguém olhe para elas ou percebam que 
estão vivas. 
 Na fase da terceira idade, que esta situada mais ou menos na época em que o 
adulto já cumpriu as tarefas básicas de desenvolvimento, tem uma posição social, de 
trabalho, de familia, cumpriu um período de carreira. Quando os filhos crescem e saem 
de casa, o casal chega perto da aposentadoria, ou se a mulher não trabalha a casa 
começa esvaziar, é a fase do envelhecimento, e há grandes mudanças no status 
econômico. Não há grandes perspectivas de mudança de vida nessa fase, 
supostamente o individuo fica mais livre para escolher. Entretanto, todos são capazes de 
mudar e aprender enquanto estiver vivo. 
 O difícil é o contato com a geração seguinte, os pais e os filhos, pois estes ao 
lidar com os pais mais velhos estão entrando em contato com seu próprio 
envelhecimento. O contato de pessoas jovens com pessoas de idade é melhor do que o 
contato com pessoas de meia-idade com os velhos. Por isso o contato dos avós com os 
netos é sempre melhor, pois os netos não são ameaçados pela velhice. Existe o 
estereotipo de que o velho é sábio e não tem mais desejos, que está pronto para a 
morte, ele aceita tudo muito bem. Este é um mito não confirmado, o velho pode mudar, o 
que ocorre é que ele fica isolado dos amigos, da familia, do social, e com pouca 
atividade no seu dia a dia. Sua vida é diferente do que já foi, a dinâmica mudou, ele ficou 
isolado. Muitas pessoas não se aproximam do velho, beijam e abraçam a todos e 
muitas vezes nem a mão estendem para o velho, não se aproximam fisicamente das 
pessoas idosas. 
 A história atual das pessoas na velhice é de muito pouco contato com o outro. 
As pessoas de idade estão vivendo e se sentindo muito mal, em sua grande maioria. 
Quanto mais a pessoa é capaz de viver a vida de uma maneira integra, mais as 
fantasias de morte, a sensação de sufoco, as fantasias de fica preso em alguma coisa, 
de perder a respiração, de entrar em pânico, estas sensações irão desaparecer. São 
pessoas que quanto mais forem se aproximando de si mesmas, tanto mais serão 
capazes de enfrentar o envelhecimento e a morte. Quando existe um potencial para 
viver bem, aprender, a reorganizar a vida nas diferentes fases, desde que nasce até que 
morrer, existe possibilidade de viver intensamente. Quando o individuo não obedece a 
esse potencial, quando esmaga dentro de si e permite que atrofie a ele mesmo, tem um 
sentimento de culpa em relação a ele mesmo e em relação à vida dentro de mesmo. 
 
74 
 
Esse sentimento de culpa se transforma em angústia, esta angústia é a angústia de 
morte. 
 
17. Familia: relações objetais, vínculos e perdas 
 Perceber mudanças nas relações humanas é vislumbrar a morte em seu curso 
histórico. A proximidade física no seu ambiente natural sugere uma proximidade física e 
afetiva no momento de acompanhamento da perda de um ente querido. Em épocas 
anteriores as pessoas morriam em casa. Hoje com o advento da industrialização, os 
avanços tecnológicos na medicina, a superespecialização, as mudanças e alterações 
sociais e culturais não há mais proximidade dom os entes queridos e todas as formas de 
permanecer com o corpo vivo são realizadas na intenção de manter as funções vitais a 
qualquer custo. Desde os primórdios a morte é temida, afiram Aires (1977), pois não 
sabemos como ela é de fato. Muitas tentativas de interpreta-la, mas nenhuma foi forte o 
suficiente para pensa-la como algo normal e sem sofrimento. 
 Freud (1929) em “O mal estar na civilização” diz que “uma das ameaças do 
sofrimento humano vem do nosso próprio corpo que está condenado à decadência e à 
dissolução, e que nem mesmo pode dispensar o sofrimento e a ansiedade como sinais 
de advertência”. Portanto, a morte entendida como o limite humano é experimentada a 
partir da angústia que é sentida diante da não significação que ela apresenta em cada 
indivíduo, pois o que se conhece dela é o que se apresenta no outro. Dai todas as 
tentativas de poder adiá-la. Muitas são as formas de tentar encobrir a morte, quer seja 
não falando sobre ela, quer produzindo ferramentas para tentar afasta-la. Mesmo diante 
de inúmeros instrumentos para impedi-la, a morte ainda desampara. Inúmeras 
tecnologias podem aumentar o tempo de vida, mas nenhuma impede a morte. 
 Hoje, o hospital reflete um lugar de cura, e paradoxalmente, um melhor lugar para 
morrer. Os avanços tecnológicos maximizam o tempo de vida, mesmo que o paciente 
sobreviva apenas por meio de aparelhos. Na maioria dos casos, a familia quer que a 
pessoa amada viva de qualquer modo, com quaisquer limitações, pois encarar a morte é 
mais doloroso. Quando o ente querido tem um período de internação, na unidade 
intensiva, requer uma separação por parte da familia, considerando que as visitas 
ocorrem em determinado horário.Diante do fato, há evidencias de certa 
desestabilização emocional dos familiares por estarem privados do cuidado e da 
atenção ao seu enfermo. O doente, potencial cadáver, como traz Oliveira (2002), passa 
 
75 
 
a ser escondido do mundo, passa a ser solidário e o silencio marca essas mortes, passa 
a querer ludibriá-la. 
 Há duas maneiras de reagir dolorosamente à perda do ser amado, considera 
Nasio (1997), ou quando estamos preparados para o seu fim, como os pacientes 
terminais, ou quando a perda vem de forma súbita e imprevisível. O sentimento doloroso 
advém da ruptura do laço social estabelecido com o objeto de amor. Quando o objeto 
falta, há o processo de luto, que é a “reação à perda de uma pessoa amada, ou à perda 
de abstrações colocadas em seu lugar”, afirma Freud (1917). A ruptura desse laço 
amoroso provoca uma desestabilização psíquica, causando uma tensão desprazerosa e 
afetando o princípio do prazer. Este se caracteriza por buscar uma constância, um 
equilíbrio quando é afetado (FREUD, 1920), o princípio de prazer busca uma descarga, 
portanto, “os primeiros recursos para conter esse desmoronamento, e que tardam a vir, 
são o grito e a palavra” (NASIO, 2007). Possibilitar um espaço para a expressão do 
sujeito é nada mais que possibilita-lo a se organizar psiquicamente. Quando da perda 
anunciada, o hospital é o melhor lugar onde o sofrimento está escancarado e o grito e o 
choro são manifestações constantes desse não saber sobre a vida. 
 Quando há um adoecer de uma pessoa, os membros do grupo familiar entram 
em crise. Instalada além do doente, assume dimensões diferenciadas de acordo com 
cada configuração familiar. Quando retirado um deles, como no caso do doente 
necessitar de cuidados na UTI, pois o tempo destinado a hospitalização é indeterminado 
enquanto que o tempo que os familiares dispõem para o ente querido é limitado. Como 
dizer ao pai ou à mãe que não pode ficar com seu filho durante o dia? como dizer a uma 
filha que não poderá ficar com o irmão? Como dizer ao doente que não poderá ficar de 
mãos com a mãe ou ao lado do pai durante um procedimento doloroso? O doente, 
assim como, os familiares se encontram fragilizados. Algo é estranho e ameaçador para 
a família, e por isso é necessário que possa expressar seus medos, dúvidas, anseios, e 
obter informações sobre o tratamento e as possibilidades do ente querido (em fase 
terminal) em relação às suas condições de saúde. Muitas vezes o relacionamento fica 
esmorecido, parece haver um esquecimento da familia que fica angustiada, 
provavelmente por não querer falar sobre a possível morte, provocado por um não saber 
real sobre o paciente e a possibilidade de morte. 
 Moretto (2006) define essa angústia como sendo aquilo do qual “não se tem 
significantes que simbolizem o buraco no real”. A falta de significantes caracteriza a 
dúvida que surge diante da não certeza da perda, como acrescenta Nasio (2007), “a 
 
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angústia nasce na incerteza de um perigo temido”, portanto, a angústia é aquilo que o 
sujeito não se dá conta, aquilo que não consegue expressar nem transformar em 
linguagem, pois lhe falta representações que possibilite significantizá-las. À medida que 
a morte se assemelha ao inominável, Mannoni (1995) afirma que “o sujeito fica sem 
palavras para abordar aquilo que o toca na provação que ele partilha com o enlutado”. 
Portanto, os familiares trazem suas angústias desencadeadas pela forma abruta do 
rompimento do laço amoroso familiar, bem como os conflitos psíquicos que nesse 
momento se encontravam latentes. 
 No caso da família que acompanha alguém doente, em especial um filho, o 
processo de luto dos pais, segundo Bowlby (1985), inicia-se quando o médico comunica 
o diagnóstico de doença terminal. Uma espécie de torpor é vivenciada por eles, 
alternada por explosões de ira direcionada aos profissionais de saúde e, principalmente, 
ao médico que transmitiu o diagnóstico. Os pais sentem-se confusos e por vezes 
referem-se à situação como se fosse um sonho ruim do qual irão despertar. Tendem a 
comportar-se de modo distante até que consigam assimilar a notícia, como se aquilo 
tudo dissesse respeito a uma outra familia que não a deles. Após o choque, surge a 
fase da descrença na exatidão do diagnostico e a tentativa de reversão do quadro. Uma 
busca de informações médicas é iniciada, geralmente com a finalidade de ouvir aquilo 
que gostariam, ou seja, que seu filho não está gravemente enfermo e não para saber 
mais sobre o quadro da doença, seu curso e prognóstico. 
 Mecanismos de defesas entram em funcionamento, como o de negação da 
doença, para então surgir o desejo de que a criança morra em breve a fim de minimizar 
seu sofrimento emocional e financeiro. Surge o sentimento de culpa pela surpresa desse 
desejo, o qual gera a mobilização do mecanismo de defesa da formação reativa. A 
angústia que se instala nos pais, pode ser dirigida à criança através de cuidados 
excessivos com o objetivo de compensá-la pelo sofrimento. Assim, os pais se tornam 
superprotetores com relação à criança doente, tentando preservá-la de tudo e de todos 
que possam vir causar-lhe algum mal. Este comportamento de superproteção pode se 
estender aos irmãos do paciente, pois quanto maior a necessidade compulsiva de 
proteger a criança, mais se pode depreender o esforço realizado a fim de se descartar e 
negar ideias relacionadas à morte. Entretanto em muitos casos os pais negligenciam a 
casa, o trabalho, os outros filhos, a familia, para concentrar todas as energias na criança 
adoecida. Muitos acreditam que se tivessem ficado mais atentos aos primeiros sinais da 
doença, a criança certamente escaparia da morte. No entanto, outros pais, ao 
 
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perceberem a raiva de seu filho por estar morrendo, sentem-se culpados e deslocam 
estes sentimentos para outras pessoas, como o cônjuge, os profissionais que tratam da 
criança entre outras pessoas. 
 Muitos conflitos conjugais decorrem da postura de cada um, das defesas que se 
arma em relação ao doente e às questões que decorrem na situação, mesmo como 
transmitir a notícia da doença para a criança. Passado o tempo, e as expectativas se 
desfazem, os pais passam a admitir a exatidão do diagnostico, iniciam um processo de 
luto antecipado, com um desengajamento emocional gradativo. Quando a criança vem a 
óbito, os pais geralmente já estão preparados e até mesmo aliviados. O luto antecipado 
da familia pode ocorrer, segundo Easson (apud Torres et al, 1999) antes mesmo de o 
diagnóstico ser transmitido. A comunicação não-verbal entre a criança e seus familiares 
por vezes acaba antevendo a notícia, pois o diagnóstico apenas fará com que o luto a 
torne mais aberto e evidente. Os pais podem sentir remorso e um profundo sentimento 
de amor pela criança, com a aproximação da morte. A negação nesse momento, 
raramente persiste e a culpa e o alivio permanecem entrelaçados após o falecimento. 
Quanto mais os pais participarem ativamente dos cuidados com a criança, sentirão 
menos culpa. O luto terá uma boa evolução dependendo da maneira como os pais se 
relacionam. Se possuírem a capacidade de confortar um ao outro, mantendo-se unidos e 
apoiarem-se mutuamente, o luto provavelmente será bem elaborado. Os conflitos que o 
casal possa ter poderá destruir a família. 
 As perturbações que possam ocorrer entre os irmãos de pacientes terminais 
resultam muito mais das modificações dos comportamentos dos pais em relação a eles, 
do que devido aos efeitos da doença e da morte propriamente. O distanciamento dos 
pais diante dos cuidados com o filho adoecido e as falsas explicações de que “Deus 
levou o irmão” podem resultar em raiva, medo e recusa do afastamento de casa. Os 
irmãos da criança doente experimentam sentimentos de culpa e responsabilidade, 
assegura Tores etal.(1990), provavelmente resultantes do desejo de morte ou de 
agressividade direcionado ao irmão doente. O rendimento escolar poderá cair, uma das 
prováveis consequências desde mecanismo. O sentimento de culpa também pode vir a 
gerar auto agressividade, fazendo com que as crianças passem a achar que merecem 
morrer. Surge a equivalência entre doença e morte, pois diante de qualquer sintoma, 
como tosse, cefaleia ou dor de barriga, a criança poderá entre em pânico por achar que 
vai morrer. 
 
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 As crianças menores de cinco anos, afirmam Lewi & Volkmar (1993), vivenciam a 
morte do irmão como um afastamento dos pais, consequentemente perda de afeto. A 
morte para elas pode ser percebida como abandono ou punição, podendo surgir a raiva 
decorrente do sentimento de abandono, uma vez que os pais estavam engajados com 
os cuidados do irmão que estava doente. As crianças entre cinco e dez anos se envolve 
com o irmão enfermo e podem se sentir impotentes diante da situação. Alguns 
vivenciam a culpa de sobrevivência, podendo surgir sérios sintomas e posteriores 
distorções da estrutura de caráter. O luto na criança se vincula de maneira mais forte 
ao luto dos pais de modo que, se estes não tiverem condições de elaboração, os filhos 
também não o conseguirão, pois além de lidar com a perda do irmão, elas precisam se 
haver com a perda de seus “pais de antigamente”. 
 
18. Adoecimento e luto antecipatório 
 A familia é um sistema, com papeis definidos, funções e relacionamentos 
insubstituíveis e que se move através dos tempos, segundo Kovács et al (2008). Os 
estágios pelos quais ela passa se caracterizam pelo processo de desenvolvimento do 
ser humano. A familia compreende todo o sistema emocional de três ou mais gerações, 
de acordo com Carte e McGoldrick (1995), com seus laços de consanguinidade, e que 
tenham relação estreita de proximidade. As famílias passam por um processo de luto 
antecipatório diante do adoecimento de um de seus integrantes, sendo percebida a 
pouca atenção que é oferecida a elas. É comum que se crie um paco de silêncio a 
respeito da perda de um ente querido dentro da familia, o que ocorre devido ao receio de 
falar sobre o assunto que pode causar dor ao outro. 
 Diante da morte de uma pessoa amada, o choque é a primeira resposta e será 
mais intenso se a morte for súbita ou inesperada, afirma Pincus (1989). Esse choque 
pode se expressas através do colapso físico, violentas explosões ou no entorpecimento, 
recusa e incapacidade de aceitar que o ente querido morreu. Quando um familiar 
adoece, o foco de atenção à saúde sempre está no paciente. Porém, a familia sofre com 
esse sujeito adoecido, sendo importante que receba um suporte enquanto acompanha o 
familiar doente, e na maioria das vezes com internação hospitalar. A fase do choque 
pode variar na sua duração e ser caraterizada pelo desespero, raiva, irritabilidade, 
amargura e isolamento. Segundo Oliveira e Lopes (2008), esses sentimentos podem 
aparecer através de atitudes emocionais, sendo difícil lidar com os mesmo e com as 
pessoas que compartilham o luto. Para Bowlby (1990) o torpor e aturdimento constituem 
 
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a primeira fase, e ocorre logo com a notícia da morte do ente querido, podendo ser 
interrompida por acessos de consternação e raiva intensa. O processo em que a pessoa 
percebe e torna real a perda é necessário, como também, respeitar essas reações que 
são naturais no processo do luto. 
 A pessoa que acompanha o familiar no hospital, muitas vezes em fase terminal 
é aquele que pode estar vivenciando com mais angústia e sofrimento esse período, logo 
é o que necessita de acolhimento em todo o processo. Muitas das intensas emoções 
humanas surgem durante a formação, manutenção, rompimento e renovação de 
vínculos emocionais, de acordo com Bowlby (1990), os vínculos afetivos e estados 
subjetivos de forte emoção correm juntos. A separação de entes queridos pode gerar 
ansiedade e consternação de profundo e prolongado pesar. Esses eventos podem 
abalar a saúde mental. Muitos problemas que as pessoas passam estão relacionados, 
em parte a uma separação ou perda recente ou em período anterior no decorrer da vida 
(BOWLBY, 1990). Para o autor, uma das consequências do rompimento repentino de 
vínculos, como o divórcio, morte e separação dos pais, principalmente na infância pode 
ter uma incidência de problemas psiquiátricos muito mais elevados em algumas pessoas 
do que em outras. 
 O individuo que está doente passa por muitas emoções e pensamentos, como 
medo do sofrimento, de saber como será sua vida e do que irá lhe acontecer, medo de 
sentir dor, medo da dependência, pois com avanço da doença pode ficar dependentes e 
não fazer as coisas que faziam sozinhos antes. É provável que surjam sentimentos de 
raiva e desanimo frente à situação, choque, negação, aceitação, entre outros, quando o 
paciente toma conhecimento que está em fase terminal da doença. No inicio não 
acreditam que pode ser verdade, é uma defesa temporária para ter aceitação parcial 
posteriormente. Todos os pacientes que entram nesse processo e tem esperança de 
que tudo não passe de um pesadelo, sentimento importante em todo o processo, pois 
melhoram o ânimo e se submetem a mais exames no intuito de que seja descoberto 
algo novo para o tratamento. 
 Moraes (2009) afirma que há a ideia de que o processo de morte é sempre 
acompanhado de dor e sofrimento insuportável, crença que faz com que, muitas vezes, 
os amigos e familiares se afastem do ente querido pelo temor do sofrimento e da 
sensação de impotência. Para o autor, quando os familiares ocultam os seus 
sentimentos, tentando fingir que nada esta acontecendo, o paciente sente maior 
 
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dificuldade em expressar suas dúvidas, medos, tristezas e anseios, eles ficam com 
medo de demonstrar o que sentem e magoar ou preocupar os familiares. 
 O luto antecipatório começa com o diagnóstico confirmado, promovendo angústia 
e a dor da separação. Os familiares podem ter reações diversas e vivenciar fases que 
com depressão, raiva, desorganização e reorganização. Constitui uma reação adaptativa 
que pode possibilitar a antecipação do desligamento afetivo entre o familiar e o paciente, 
facilitando o luto após a perda real, segundo Osório e Valle (2009). As experiências de 
preda, com o processo de luto antecipatório, de parentes com uma doença terminal, faz 
com que o familiar sofra pela falta de convivência com o ente querido, além de trazer a 
experiência de testemunhar a deterioração física do mesmo, segundo Domingos (2003). 
 A familia de origem e os familiares com os quais a pessoa convive, segundo 
Bowlby, podem facilitar ou dificultar a forma de expressar o pesar. Nas famílias em que 
o choro ou outra forma de manifestação de protesto pela separação são classificados 
como comportamentos infantis e a raiva, sentimento repreensível, é mais difícil de haver 
demonstrações de sofrimento e perda. A iminência da morte ou de uma doença grave 
rompe o equilíbrio de qualquer família. Com a ocorrência de doença terminal em um de 
seus membros, a familia cria um novo foco interno, devido ao individuo doente possuir 
um sintoma, uma perda de função, as exigências de mudanças, relacionadas a nova 
doença, nos papeis práticos e afetivo, bem como, o medo da perda através da morte, de 
acordo com Carter e Mcgoldrick (1995). As mudanças causadas pelas etapas do ciclo 
vital que regem o desenvolvimento podem desestabilizar a estrutura da familia e esta 
reagir de diversas formas. 
 O atendimento de qualidade articulando os avanços tecnológicos com 
acolhimento, melhoria de dos ambientes de cuidados e das condições de trabalho dos 
profissionais a pacientes terminais é o que se entende por humanização. A melhoria e 
qualidade de vida do paciente, independente dotempo de vida que lhe resta, é 
indispensável, apesar de ser um momento delicado para todos: paciente, familiares e 
profissionais da saúde que prestam o atendimento. Para os profissionais que atendem 
pacientes em fase terminal faz com que eles se lembrem de sua própria finitude e 
tenham que lidar com seus próprios conceitos e emoções em relação à morte, segundo 
Moraes (2009). Estes profissionais se protegem contra a dor e angústia de perda por 
morte, evitando enfrentar o assunto, apesar de saberem que devem encorajar e 
reconhecer o luto, suas ansiedades não resolvidas com a morte e com a perda. Isso faz 
com que se sintam desamparados diante do sofrimento, o que os coloca frente a 
 
81 
 
conflitos e frustrações da sua própria vida, e desenvolvem muitas vezes, mecanismos 
rígidos de defesa e o distanciamento do paciente e dos familiares. A interação da equipe 
de saúde com o paciente e seus familiares é fundamental para um cuidado efetivo, 
baseado no diálogo e a busca de significação da doença para cada pessoa. 
 As famílias diante do processo de luto antecipatório são pouco acompanhadas 
e muitas vezes se abandonam no silêncio a respeito da perda iminente, devido à 
intensão de causar menos dor ao outro – doente terminal. É necessário que os 
familiares encontrem um espaço para falar e extravasar as suas angústias e suas 
questões sobre a perda. Por certo, conseguirá lidar melhor com o fato real da perda, 
quando essa ocorrer. É preciso lidar com a privação de gratificações e com as perdas 
secundárias relacionadas aos papéis que este familiar desempenhava. Necessário se 
faz começar a desempenhar ou redistribuir esses papeis entre os que ficaram 
encontrando soluções para a nova realidade. Isso auxiliará a todos para que possam se 
adaptar à perda e construir um significado para a mesma, respeitando as diferenças de 
cada membro da familia. Outro segmento importante é a escola que deve se sensibilizar 
para as questões do luto das crianças e adolescente dessa familia. Os profissionais da 
área da educação devem estar preparados para lidar com as questões relacionadas á 
morte e ajudar nas formas de elaboração do luto das crianças e adolescentes que 
vivenciaram a perda de um ente querido na familia 
 
19. Suicídio: angústia e autodestrutividade 
 Na antiguidade greco-romana o suicídio era um ato clandestino, patológico, 
solitário e só seria avalizado com o consentimento da sociedade. Os suicidas não tinham 
o direito a uma sepultura regular. As mãos eram consideradas assassinas, por isso 
enterrada separadamente, essa separação destinava-se a evitar que cometessem 
outros atos proibidos. Os ritos funerários eram proibidos como forma de punição, isso 
para impedir um possível contágio dos cidadãos pelo suicida. O individuo deveria 
submeter ao Senado, em Roma, as suas razões para o desejo de morrer. Os escravos 
após a morte de seu dono eram incentivados a se suicidar, assim como as viúvas da 
Índia, eram estimuladas a se suicidar após a morte dos maridos. Na Idade Média o 
indivíduo e a sua vida pertenciam a Deus, por isso o sujeito era castigado quando 
tentava se apoderar da vida que não lhe pertencia. 
 Na época atual a maior causa de suicídios, no Ocidente, é a solidão, o 
sentimento de irrelevância social, segundo Kovács (1992). Houve o desmoronamento 
 
82 
 
dos pilares básicos da sociedade: familia, estado e religião. O suicídio ou o ato de se 
matar, entre os povos primitivos, esta ligado às normas do grupo. Quando há sérias 
infrações às regras sociais, pode haver um incentivo da comunidade como forma de 
neutralizar a culpa, reabilitando o indivíduo diante do grupo. A quebra de costumes e 
tradições nestas sociedades é considerada como delito grave. Um trabalho de 
investigação sociológica sobre o suicídio foi realizado ao final do século dezenove e é 
muito atual. Durkheim (1971) aponta que “o suicídio é um ato individual com 
características da sociedade que o produz. E um ato complexo, indefinido e com 
contornos vagos. Só uma aproximação grosseira pode falar sobre as suas intenções. De 
várias maneiras o individuo renuncia à sua existência. É um ato de alguém que não quer 
viver”. 
 Quando há uma individualização excessiva pode resultar um suicídio dito como 
que egoísta. O individuo se sente só, desesperado, sem razões para viver, e matar-se 
pode ser a única solução possível numa sociedade desagregada. Há um conhecimento 
de que a influência agravante de desorganização e desagregação são as crises 
econômicas. Às vezes, o individuo não tem consciência dos seus limites e do que 
necessita, precisando de um parâmetro social. Quando a sociedade falha neste aspecto, 
o homem se sente desorientado. A anomia pode se percebida também na vida familiar, 
verificando-se um aumento de taxas de suicídio após divórcios, por causa da incerteza, 
o que resulta num estado de perturbação. 
 A pessoa que comete suicídio pode estar fugindo do sofrimento, e “nem todo 
contato é saudável, nem toda fuga é doentia”, conforme as palavras de Perls (1975). O 
suicídio é um duelo entre o assassino e o assassinato que se encontram no ato da 
morte. No suicídio, o fato é que nunca se terão as explicações e respostas para a 
vastidão de incertezas que abrangem a dicotomia entre a escolha pela vida ou da morte. 
Na maioria dos casos, existe uma interação entre fatores psicológicos, psiquiátricos, 
econômicos, culturais, religiosos, assim como aspectos como: ambientais; hereditárias; 
e genéticas, segundo Patutti (2004). O suicídio é multifocal, não é possível ser 
compreendido somente por uma faceta, mas por uma interação entre os múltiplos 
fatores. É necessário apresentar a distinção entre causas desencadeantes, sempre 
múltiplas, provocadoras da passagem ao ato. 
 Quando a tentativa é frustrada, a expectativa é de que o individuo vá repetir o ato 
com novas tentativas. Qualquer mudança de direção na vida de um indivíduo, uma 
perda ou separação, ente outras, pode ser suficiente para tornar o processo intolerável, 
 
83 
 
confuso e ambíguo. A ambiguidade se instala pelo anseio de transformação, e ao 
mesmo tempo, pela paralização de mobilizar a energia para que as mudanças possam 
acontecer. Muitas vezes o sujeito que percebe sua vida sem sentido, apresenta uma 
visão monocromática e sua vida se torna automatizada na qual a fé se esvai. Alvarez 
(1999) pontua que “sem os freios da fé, o equilíbrio entre a vida e a morte pode se tornar 
perigosamente delicado”. 
 Para ocorrer o suicídio, afirma Menninger (1965), é necessário “a presença de 
três componentes: o desejo de matar, o desejo de ser morto e o desejo de morrer. 
Nenhum suicídio é consumado se além do desejo de matar, não estiverem presentes o 
desejo de morrer e o de ser morto”. Quando o desejo de morrer não está presente, pode 
ocorrer o paradoxo do individuo suplicar para que o salvem após um ataque suicida, 
muitas vezes brutal. O suicídio é antes de tudo um homicídio de si mesmo, onde a 
pessoa é o assassino e o assassinado. O caráter destrutivo é importante nesse aspecto. 
O instinto destrutivo pode estar presente na criança diante de um rival. Em todo o ato 
destrutivo pode existir uma erotização parcial, como um prazer neste ato - o sadismo. O 
mesmo pode ocorre nos atos autodestrutivos. Acontece quando o amor e o ódio são 
desligados dos objetos externos, voltando-se contra o próprio individuo, cujo desejo de 
matar se volta contra o próprio individuo, e, portanto, é tratado como um objeto. O 
melancólico pode descarregar contra si próprio os amargos ataques, as hostilidades 
antes ocultas em relação ao objeto amado. 
 Matar é uma forma de agressão, assim como ser morto é uma forma extrema de 
submissão. O ego precisa sofrer na dimensão de sua destrutividade dirigida para fora, 
assim se há ataque para fora, a mesma proporção precisaser dirigida num ataque para 
dentro. É necessário que haja sentimento de culpa, para haver necessidade de punição. 
Os desejos homicidas, mesmo que não efetuados e inconscientes, demandam punição. 
Num paralelo, Menninger (ob. cit.) demonstra os meios utilizados para os atos suicidas e 
sua possível relação com os componentes considerados por ele. Assim: elementos mais 
agressivos como o uso de instrumentos cortantes, penetrantes, ou tiro; os psicóticos 
podem encostar ou tocar um fogão, representando um desejo patológico de ser 
aquecido ou amado, de sentir calor humano, de se libertar de uma frieza ou um gelo 
interno; o afogamento pode representar o desejo de voltar ao bem-estar da existência 
intrauterina; ingerir substâncias venenosas estará relacionado a intensos desejos orais. 
É possível que me muitos destes métodos sejam encontrados elementos de punição, 
 
84 
 
aliados a fatores eróticos ligados ao prazer. Muitos têm um caráter exibicionista, um 
desejo de ser descoberto e mais uma vez punido. 
 As autorrecriminações na melancolia são recriminações a um objeto amado, 
afirma Freud, que foram deslocadas para o eu. A retirada dessas acusações do objeto 
amado, e o direcionamento para o eu constitui o pilar na reflexão psicanalítica acerca da 
melancolia e para a construção de considerações sobre o suicídio. Há uma identificação 
do eu com o objeto abandonado, e assim, “a sombra do objeto caiu sobre o eu, e este 
pode, dai por diante, ser julgado por um agente especial” (FREUD, 1917). Estabelece-se 
uma identificação do eu com o objeto que fora abandonado, a partir de então é julgado 
como se fosse o objeto perdido, cuja perda deste objeto culminou em uma perda do eu. 
Segundo o autor, se o amor pelo objeto se instalar na identificação narcisista, o ódio 
também se dirige a este objeto substitutivo, o eu, atacando-o de forma tirânica e sádica, 
buscando o sofrimento. A catexia, calcada narcisicamente, quando rompida com o 
objeto original, sofre uma dupla vicissitude: uma parte volta-se à identificação narcísica, 
enquanto a outra, devido a ambivalência, é encaminhada à etapa do sadismo. É esse 
sadismo que soluciona o enigma da tendência ao suicídio – fundada no 
encaminhamento do ódio pertencente à catexia objetal abandonada. 
 O eu só poderá se matar se puder tratar a si mesmo como um objeto, dirigindo 
contra si mesmo a hostilidade relacionada a um objeto. O eu apenas se destrói quando 
trata a si próprio como um objeto, a destrutividade é uma reação do eu para com objetos 
pertencentes ao mundo externo, isso observado na melancolia. Num primeiro momento 
o ódio era dirigido ao objeto pertencente ao mundo externo, somente após a ruptura da 
catexia deste objeto é que o ódio se volta para o eu. Na medida em que a conceituação 
freudiana não se dá por encerrada, a temática do suicídio é especulada e aprofundada. 
A tensão entre o eu e o supereu, afirma Freud (1923), aponta o sentimento de culpa 
consciente. Na melancolia, nessa tensão, o eu se submete e não se opõe ao castigo, 
admitindo sua culpa. A fúria do supereu, na melancolia, dirige-se ao objeto incluído no 
eu mediante identificação. O supereu assume para si o sadismo dirigido para o eu. 
 O suicida é um “atuante no sentido de acting-out, pois a pessoa tem contato, 
mas tem ‘awareness’ (consciência) de má qualidade. É um contato acting-out que leva a 
uma ação prematura. Dessa maneira, o indivíduo migra da sensação para a ação, sem 
passar pela percepção, pela mobilização da energia, pela ‘awareness’”, afirma Frazão 
(2013). O individuo que pensa em se matar tem uma percepção distorcida e fixa. A 
ambivalência de querer viver e morrer se configura, tornando a relação com o mundo e 
 
85 
 
com o outro, empobrecida e desvitalizada. Não existe uma definição e um significado 
consensual para o suicídio, mas sempre implica necessariamente em um desejo de 
morrer, bem como, uma noção clara de que o ato executado, e assim entendido, como 
ato de colocar fim à vida, resultar na morte. A violência autodirigida, que ocorre em atos 
de suicídio, se manifesta de duas formas: no comportamento suicida, através dos 
pensamentos, tentativas e pelo suicídio; nos atos violentos provocados contra a própria 
pessoa, como no caso das mutilações. O suicídio, bem como os pensamentos suicidas, 
além de serem influenciados pela personalidade individual e pelo contexto em que vive, 
o indivíduo pode ser agravado por transtornos psíquicos como: depressão, síndrome do 
pânico, psicose dentre outros, (OMS, 2000). 
 “O suicídio é um ato psicótico”, afirma Kalina e Kovadloff. A imposição social 
invade o sujeito, atinge a sua consciência e aniquila o ego que não consegue se 
defender, perde a critica. Porém, “mesmo que racionalmente se possam compreender 
os motivos do suicídio”, declaram os autores, “este sempre é um ato psicótico, pois 
envolve a perda de consciência”. Vários são os tipos de suicídio, como melancólico que 
é acompanhado de processos psicossomáticos. Surgem fantasias com uma intensa 
culpa persecutória. A morte é procurada como um castigo merecido, porque o desejo 
agressivo dirigido contra o objeto se volta contra o ego. O suicídio psicopático esta 
ligado a um superego cruel, mais comum na adolescência. Coexistem uma total 
onipotência e uma autodesvalorização que são incompatíveis, gerando confusão e 
atuação. Constitui a procura de uma morte acusadora. O suicida psicopata não se mata 
por sentir culpa, mas sim para que os outros sintam culpa. 
 Os suicídios podem ter motivações totalmente diversas, possuem uma relação 
com rupturas em diferentes períodos do desenvolvimento afetivo-emocional. As 
fantasias de onipotência e imortalidade convivem com um ego impotente e vazio no 
chamado suicídio maníaco, segundo Knobel. Precisa de um contato constante sem 
nenhuma satisfação libidinal, cuja fragmentação psíquica é o que se torna mais 
terrificante. No suicídio esquizofrênico, segundo autor, é percebida a presença de um 
ego marcado por regressões intensas, com carência de identificações primárias, 
fragmentação, confusão e indiscriminação. Estes elementos dissociados ficam à 
margem do ego, e por isso pode matar compulsivamente o suposto perseguidor, sem 
perceber que destrói o self, o próprio individuo. 
 O suicídio é uma trágica denúncia do individuo diante de uma crise coletiva. 
Quando ele se mata fracassa a proposta coletiva daquela sociedade. Entre os aspectos 
 
86 
 
de uma sociedade tóxica, afirma Kovács (ob. cit.), se encontram o armamento nuclear, a 
contaminação do planeta, a despersonificação e o elevado nível de agressividade, que 
as metrópoles produzem o rebaixamento do valor individual e da autoestima. Nas 
grandes cidades ocorre a solidão, a distância dos vizinhos, a falta de solidariedade, o 
desenraizamento e a quebra das tradições. A tecnologia não atende mais as 
necessidades básicas e pessoais do sujeito, e a morte surge como solução para o alívio 
da frustração. O suicídio é a derrota, o abandono da luta. Muitas pessoas morrem 
porque consideram que a vida não vale a pena ser vivida. 
 Quinnet (2010) aponta para alguns sinais a serem observados na direção de 
um possível suicídio, como: a presença de um plano; a falta de esperança; depressão, 
fúria, raiva, sentimento de vingança; participação em atividades de alto risco, 
aparentemente sem pensar nas consequências; sentimento de estar encurralado, não 
vislumbrando saída; aumento do uso do álcool ou drogas; afastamento dos amigos, da 
familia e da sociedade; ansiedade, agitação, dificuldades para dormir ou dormir o tempo 
inteiro; alterações súbitas de humor e falta de sentido para viver. Cabe destacar ainda 
as tentativas prévias de suicídio como afirma Jamison (2010), pois “ainda assim, uma 
tentativa continua sendo o único e melhor previsor do suicídio,e esses números são 
motivo de preocupação grave”. A combinação de tentativas prévias com a presença de 
algum transtorno mental grave podem aumentar os riscos de suicídio. Conhecer os 
fatores de risco abarca somente uma parte de todo o trabalho com o suicídio, é 
importante perceber que prevenção não significa previsão, pois como afirmado, o 
suicídio e multifatorial. 
 O suicídio pode ser interpretado como um gesto de desespero que mostra uma 
esperança e um desejo de que tudo poderia ser diferente. A projeção emerge quando a 
pessoa busca outra maneira de viver, talvez com menos sofrimento e coloque na 
fantasia de que sua vida seria diferente se morresse e, como afirma Fukumitsu (2011), 
“projeta na morte a possibilidade que não consegue em vida”. O suicídio representa um 
pedido interrompido de vida e não de morte. O sujeito investe sua energia em auto 
aniquilamento e a falha no processo de auto regulação se torna perceptível. 
 Os adolescentes podem cometer atos suicidas, frente ao fenômeno do bullyng. 
O suicídio assim como o bullyng não envolve apenas a vítima, mas também os sujeitos 
que testemunham, presenciam, e muitas vezes, por medo ou por não saberem reagir, se 
calam diante da violência, que no caso do suicídio é autodirigida, ou seja, contra si 
memo. Frente à realidade, o contexto familiar é um espaço indisponível para a garantia 
 
87 
 
da sobrevivência, afirma Gomes e Pereira (2005), da proteção integral dos filhos e 
demais membros, independentemente do arranjo familiar ou da forma como este vem se 
estruturando. A familia é que propicia os aportes afetivos e, sobretudo, materiais 
necessários ao desenvolvimento e bem estar dos seus componentes. São no âmbito 
familiar que inicialmente são absorvidos os valores éticos e morais, onde se aprofundam 
os laços de solidariedade. Os pais e demais familiares podem contribuir para diminuir os 
atos suicidas entre os adolescentes, desde que haja uma atenção maior ao 
comportamento dos mesmos. Além das mudanças corporais que ocorrem na puberdade 
e as mudanças psicológicas que levam às novas relações e à independência, a 
adolescência se caracteriza por um período de contradições, ambivalências e conflitos 
que só podem ser solucionados quando os adolescentes elaborarem o “luto pelo corpo 
de criança, pela identidade infantil e pela relação dos pais de infância”, (ÁVILA< 2005). 
 A adolescência, por ser um momento intenso de conflitos e mudanças, 
possibilita aos jovens recorrerem a comportamentos agressivos, impulsivos ou mesmo 
suicidas. É necessário ter clareza sobre os aspectos que podem ser patológicos nessa 
fase do desenvolvimento, estando muitas vezes relacionados com a intensidade, o grau 
e o desajuste com que aparecem as características próprias da adolescência, segundo 
Turecki (1999). O jovem que pensa, ameaça, tenta ou concretiza o suicídio está 
revelando, na verdade, um colapso em seus mecanismos adaptativos, segundo Borges 
e Werlag (2006), de modo que tal situação é percebida não somente na adolescência, 
mas como em qualquer idade, como tentativa de alívio de sua dor e seu sofrimento. 
 
20. A psicanalise diante das perdas e do luto 
 Na vida de cada um há uma sobre determinação que deriva de instâncias 
inconscientes. De repente a humanidade se viu sem comando de seus atos e 
comportamentos, o que provocou a abertura de “ferida narcísica” ainda não cicatrizada e 
que leva muitas pessoas a não aceitarem nesse conhecimento. A tomada de 
consciência da morte, da finitude do ser humano, por outro lado, provoca outra ferida 
narcísica ainda mais aterrorizante, segundo Kováscs (ob. cit.). A dinâmica do 
inconsciente é um entendimento da psicanálise, e através de seus conceitos explica a 
dinâmica do processo da perda, mas não explica a morte. O mais apavorante para o 
indivíduo, é o não saber, o que faz com que a capacidade de controle seja perdida, 
ficando a submissão a algo desconhecido, o que é desesperador. Para que esse terror 
se esvaia, vem a necessidade de criar “verdades” que podem estar sustentadas na fé. 
 
88 
 
 A Psicanálise traz uma das grandes contribuições para a compreensão do 
processo de luto. O “objeto morto” instala-se no ego do enlutado, funcionando como um 
objeto ao mesmo tempo protetor e perseguidor, como afirma Freud em seus estudos, 
em especial em seu artigo “Luto e melancolia” (ob. cit.). Isso ocorre devido à 
ambivalência, à dualidade de fantasias inconscientes, derivadas de aspectos reativos à 
vida e morte dos seres humanos. As fantasias inconscientes decorrentes da perda 
reativam fantasias anteriores, e o objeto introjetado passa a funcionar num padrão 
decorrente daquelas fantasias somadas à situação particular com o objeto perdido no 
passado, segundo a teoria kleiniana, não muito diferente da proposta freudiana que 
enfatiza as pulsões. 
. As fantasias inconscientes sobre o que seria a morte não são muito abrangentes: 
o reencontro com as pessoas queridas mortas, e não raro algumas crianças tentam se 
matar para encontrar no céu, o papai, a mamãe ou o vovô que morreu; a chance de 
morrer após a morte de alguém querido, é maior quando do luto patológico; encontro 
com figuras idealizadas, como Deus ou algo similar que seria o complemento da fantasia 
anterior; ida para um mundo paradisíaco, regulado pelo principio de prazer, onde não 
existe sofrimento; à volta ao útero materno, numa espécie de parto ao contrário, onde 
não existem desejos e necessidades. Esta fantasia, entre outras, provém da ideia da 
“mãe terra”, onde o morto será sepultado. 
 As fantasias não são apenas prazerosas, ao lado destas, existem as terroríficas, 
entre as quais aquelas relacionadas com o inferno, ou “locus”. Consiste em fantasias 
persecutórias que tem a ver com sentimentos de culpa e remorso. Na morte, as 
identificações com figuras diabólicas como um ser aterrorizante, que se apresenta com a 
face de caveira e um cajado, se interligam a pavores de aniquilamento, desintegração e 
dissolução. Soa fantasias que se confundem com a loucura, a psicose, e, por vezes, não 
podendo suporta-las pode levar ao suicídio. Esta cisão corresponde aos mecanismos de 
defesas da posição esquizoparanoides, no referencial teórico de Melanie Klein. A 
questão que fica é se, no inconsciente pode existir algum tipo de representação da 
morte? Entretanto, para Freud, por ser uma experiência nunca vivida, isso não existiria. 
Porém ele considerava como equivalentes os “terrores da castração”, da perda de amor, 
e do objeto. Por outro lado, para os kleinianos, o medo da morte já existiria e seria o 
equivalente ao “pavor de aniquilamento”, uma ansiedade extremamente primitiva, que 
teria a ver com o predomínio da pulsão de morte. 
 
89 
 
 No artigo “Além do princípio de prazer” (1920), Freud introduz o conceito de 
“pulsão de morte” (Tânatos), na dualidade com a “pulsão de vida” (Eros) que veio mudar 
o conjunto de concepções construídas até então, enriquecendo as percepções dos 
fenômenos humanos. O que o autor postula é que o individuo vive constantemente num 
estado de conflito entre Eros e Tânatos, pulsões de vida as quais levam crescimento, 
desenvolvimento, integração, reprodução, manutenção da vida; e pulsões de morte que 
fazem o movimento inverso, de desintegração, tentando levar o individuo para um 
estado inorgânico, para a morte. Estas pulsões estão fundidas, funcionando sempre 
juntas, complementando-se e opondo-se, num processo dialético. A agressividade 
normal, deriva da pulsão de morte, fertilizada pela pulsão de vida que protege o 
individuo dos agravos e faz com que ele possa lutar para conquistar mais espaço vital. 
Melanie Klein e seus seguidores levam estas conjecturas até às ultimas consequências, 
utilizando essas formulações teóricas de forma produtiva na clínica. 
 Quandoa pulsão de morte se encontra livre, predominantemente, surgem 
situações de sofrimento nas áreas somáticas, mental e social. No auge dessa 
predominância, pode levar o sujeito à morte emocional (na loucura) e à morte do corpo, 
através de somatizações graves ou atos suicidas, ou até mesmo mortes naturais 
precoces. Tânatos sempre triunfa com o tempo, por maior que seja a libido, que seria o 
resultado da pulsão. Na percepção inconsciente da impotência o sujeito se defende 
através da onipotência, podendo esse mecanismo dar a certeza de uma vida pós-morte. 
A certeza se essa vida existe ou não, decorre da necessidade de enfrentar a impotência 
do não saber. A vida e a morte constituem as faces de uma mesma e única moeda, ou 
seja, da pulsão, pois a morte faz parte da vida. Não há vida sem morte, nem morte sem 
vida, porque justamente ao confrontar com o horizonte da morte, finitude limitações é 
que o ser humano toma consciência da sua vida. 
 As pessoas geralmente se ocupam consciente ou inconscientemente de coisas 
que acabam se tornando complicadas. Pensam sobre o que deixou de fazer, naquelas 
que fez de maneira errada, as brigas inúteis, os estragos desgastantes sem qualquer 
objetivo, as fantasias persecutórias, os lapsos auto condenatórios, os sentimentos de 
culpa absurdos, os ataques invejosos e destrutivos contra si mesmo e contra os outros 
que acabam por se tornar crises corriqueiras quando tudo poderia correr bem. A cultura, 
os mitos e os ditos populares ensinam a tomar cuidado com o “olho gordo”, a inveja dos 
deuses, que são projeções de aspectos invejosos internos em seres sobrenaturais, em 
rivais reais ou imaginários. A teoria da inveja proposta por Klein, cuja antítese é a 
 
90 
 
gratidão, auxilia na compreensão destas características humanas. Estes conceitos 
podem ajudar a compreender um pouco mais sobre as guerras, os morticínios, os 
esquadrões da morte, das torturas, da indignidade, dos sacrifícios que as pessoas 
impõem a seus semelhantes, e a si mesmo, passando pela fome, miséria, 
desumanização, etc.. 
 O filicídio é um conceito extremamente rico, ajuda a compreender vários desses 
aspectos, incluindo o massacre de crianças e de “infantes”, que são a primeira linha de 
ataque em guerras e revoluções, pois são as principais vitimas devido a sua fragilidade 
diante de atitudes mortíferas dos adultos. Isso desde os agravos na gestação e 
nascimento, a destruição, a falta de condições dignas de vida, de escolaridade, de 
saúde, as explorações no campo de trabalho, o envolvimento com a criminalidade, as 
drogas, a violência, etc., onde sempre existem adultos responsáveis que se omitem ou 
estimulam estas práticas. A morte está sempre presente na vida do sujeito, das mais 
variadas maneiras. Porém, a morte física será a última das mortes. 
 O sujeito muitas vezes se defronta com situações que trazem tanto sofrimento, 
com possibilidade de serem patológicas, constituindo o que poderia ser chamado de 
“micro mortes da vida cotidiana”. Os conflitos se manifestam de infinitas maneiras 
oportunizando o culminar em uma psicose. Esta surge em decorrência de ataques 
destrutivos derivados da pulsão de morte. Impedem a capacidade de pensar e 
simbolizar, desagregando e desintegrando o ego. Quando os conflitos são muito 
primitivos, se manifestam no mundo externo - a realidade física, através de uma 
somatização psicótica, segundo alguns autores, levando à morte ou chegando ao 
suicídio, devido à capacidade de simbolizar – não pensa, atua. Os recursos mentais da 
humanidade, afirma Kovács (1999) cada vez mais “estão disponíveis, e a despeito de 
vitórias eventuais do aspecto da morte, a força de vida ressurge, teimosa”. Não há 
possibilidade de passividade diante de Tânatos, afirma a autora, “devemos estar sempre 
alertas, denunciando seus mecanismos, comumente sutis, de insinuarem-se tanto no 
nível individual como social”. Diante da doença, da desconfiguração do corpo, o 
psicanalista se oferece com a possibilidade de uma escuta que não separa o sujeito da 
sua doença ou do seu sofrimento, pois o corpo se submete ao campo da linguagem e, 
portanto, aos efeitos da palavra. Dar voz a esse corpo e escuta a esse sofrimento não e 
tarefa fácil, já que se revela nele mesmo a finitude e o desamparo. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
91 
 
 A realização do ser humano em sua vida faz com que a morte seja vivida como 
algo natural, sem os terrores daqueles para quem a vida foi um fardo. Portanto, essa 
realização será um dos escopos de todo o tipo de ação, de profissionais de saúde, e da 
sociedade como um todo, numa luta pela dignidade e oportunidade de cada pessoa 
alcançar a felicidade em vida. O trabalho da psicanálise, ao desvendar as fantasias 
inconscientes em relação à morte, auxilia a compreender o fenômeno da morte, pois se 
esta faz parte da vida deve ser incluída nela, porém não é o que ocorre. É importante 
lidar com a morte, a morte física e as mortes parciais, as pequenas mortes do dia a dia, 
de uma forma produtiva, fazendo com que a vida possa ser vivida criativamente e a 
morte ser aceita como um fato da vida. 
 Desde o nascimento ocorrem perdas e lutos, sofridas indistintamente pelas 
pessoas, não necessariamente ligadas à morte real, segundo a psicanálise. A criança 
vive o seu primeiro luto com o nascimento, a perda da vida intrauterina, da vida narcísica 
genuína, depois vem o desmame efetuado pela mãe. Posteriormente, surgem as 
ameaças de perdas, como “mamãe vai embora”, “você vai ficar de castigo”, e assim 
tantas outras. Há semelhança da ausência, da falta, com o final da vida. Ainda que o ser 
humano traga consigo a certeza de sua própria finitude, a morte não deixa de provocar 
um forte impacto na subjetividade daquele que se depara com uma perda significativa, 
demandando uma reorganização do ego por meio do processo de elaboração do luto. O 
fato do individuo, muitas vezes apresentar uma resistência para entrar em contato com a 
morte do outro e com a sua própria condição de ser mortal, deve-se ao medo de perder 
e não querer se desapegar daquele que já não existe mais. 
 As causas da perda tem grande significância para o processo de desapego e, 
portanto, para o processo de luto. Todo o individuo ao receber a notícia de morte de um 
ente querido, se sente desamparado, mesmo que haja o aconchego de outras pessoas, 
sobrevém a angústia, a culpa e psicologicamente pode ficar desorganizado. No caso da 
perda de um ídolo, ou pessoa de expressão ocorre a intensificação do luto pela mídia. 
De outro lado a dor da perda do ídolo ou da pessoa ilustre é refletida na vida de cada 
um. Quando morre o ídolo choramos nossas perdas, pequenas e grandes. São perdas 
relacionadas ao orgulho de ser da “terra mãe”, como também aos fracassos de cada um. 
A perda de um ente querido que estava com a mesma idade deste ídolo, ou tinha a 
mesma profissão, ou até mesmo a expressividade. O choro não representa somente o 
choro pela perda pessoa que era querida de seu púbico, muitos choram, e em especial 
as mulheres, pelo ídolo, mas também pelos maridos inoperantes, traidores; por irmãos 
 
92 
 
desatentos ou desligados, não fraternos; jovens choram por pais omissos, 
abandonantes, inoperantes. Cada um desagua seus lutos quando um de seus ídolos se 
vai, e isso inconscientemente. 
 A morte de um ser amado ocasiona rupturas difíceis e profundas de serem 
trabalhadas, porém cabe ao enlutado procurar ajuda profissional que o faça perceber a 
dor que carrega e ajustar-se no mundo frente aos acontecimentos buscando planos para 
continuar vivendo nele. É necessária muita paciência para a recuperação e superação 
da dor do luto. Trabalhar a dor é muito penoso, é algo que não é recomendado fazer 
sozinho. O suporte de um profissional da área “Psi”, dos familiares e amigos é 
importante, pois chorar sozinhopode trazer alívio instantâneo mais não chega ser eficaz. 
É importante reconhecer os significados das lágrimas, pois no decorrer do processo de 
luto acabam sofrendo modificações. As pessoas, de acordo com sua subjetividade, 
sentem de forma desigual o processo da dor, motivo pelo qual o enlutado poderá 
adaptar-se a diferentes reações e emoções frente à perda. 
 Quando dado o direito de expressão ao enlutado é que ele começa a ter clareza 
de sua realidade. O acompanhamento de um profissional que possa ter uma “escuta” 
qualificada, sem apressar o processo de luto, respeitando o tempo e a dor, trará uma 
compreensão do sofrer e sem julgamento. O desespero dará lugar à reconstrução e ao 
prosseguimento da vida e das atividades, tomada a realidade a cada minuto. Novos 
relacionamentos surgirão, porém não substituirão a pessoa perdida, pois superar não 
significa esquecer. Ser capaz de buscar vivenciar novas história é seguir em frente e 
firmar uma nova identidade, amenizando a dor, e assim, a oportunidade de ser feliz. 
 O trabalho do psicanalista não poderá ser realizado de forma onipotente ao lidar 
com Eros e Tânatos, sem a contribuição de todos os seres humanos, bem como em 
diferentes áreas. O trabalho da análise oportuniza conhecer e lidar com os objetos 
internos, e faz com que o sujeito entre na posição depressiva com mais frequência. 
Rever a própria vida, reconhecendo e aceitando seus limites, seus fracasso, e sua 
criatividade, fazem com que os indivíduos vivam de forma mais real e intensa a vida que 
lhes resta, e por fim, morrer em paz. Muitos são os relatos de mortes serenas. 
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