Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Administração Pública e a Contabilidade Pública Contabilidade Pública Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Gerente Editorial ALESSANDRA VANESSA FERREIRA DOS SANTOS Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autoria ELAINE CHRISTINE PESSOA DELGADO DAYANNA DOS SANTOS COSTA MACIEL AUTORIA Elaine Christine Pessoa Delgado Possui graduação em Administração pela Universidade Federal de Campina Grande (2007) e pós-graduação em Direito Administrativo pela Faculdade Campos Elíseos (2020). Com experiência técnico-profissional na área de gerência de empresas por mais de dez anos, Elaine também é professora conteudista na empresa Modular Criativo. Dayanna dos Santos Costa Maciel Mestre em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da UFPB (2019), área de concentração Administração e sociedade e Mestre em Recursos Naturais, pelo Programa de Pós- Graduação em Recursos Naturais da UFCG (2014), com ênfase na linha de pesquisa Sustentabilidade e Competitividade. Dayanna possui graduação em Administração pela Universidade Federal de Campina Grande (2010) e Atua como pesquisadora no Grupo de Estudos em Gestão da Inovação Tecnológica (GEGIT) – UFCG, cadastrado no diretório de grupos de pesquisa do CNPq – na linha de pesquisa Inovação e Desenvolvimento Regional l, com foco nos seguintes temas: administração geral, gestão da inovação, desenvolvimento regional. Atuou como pesquisadora do Grupo de Estratégia Empresarial e Meio Ambiente (GEEMA) – cadastrado no diretório de grupos de pesquisa do CNPq – na linha de pesquisa Estratégia Ambiental e Competitividade com ênfase em Modelos e Ferramentas de Gestão Ambiental com foco nos seguintes temas: administração geral e gestão ambiental. ICONOGRÁFICOS Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: OBJETIVO: para o início do desenvolvimento de uma nova competência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de apresentar um novo conceito; NOTA: quando necessárias observações ou complementações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamento do seu conhecimento; REFLITA: se houver a necessidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou discutido; ACESSE: se for preciso acessar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso fazer um resumo acumulativo das últimas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de autoaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando uma competência for concluída e questões forem explicadas; SUMÁRIO O que é Administração Pública ............................................................. 12 Quem é a Administração Pública? ...................................................................................... 12 Administração direta .................................................................................................. 16 Administração indireta .............................................................................................. 18 Princípios da Administração Pública ................................................................................. 21 Contabilidade Pública e sua história no Brasil ...............................23 A Contabilidade Pública .............................................................................................................23 História da Contabilidade Pública .......................................................................................27 Princípios, objeto, objetivo e aplicação da Contabilidade Pública .............................................................................................................34 Princípios da Contabilidade Pública ..................................................................................34 Objeto da Contabilidade Pública ........................................................................................ 38 Objetivo da Contabilidade Pública .................................................................................... 40 Campo de aplicação da Contabilidade Pública .......................................................42 Regime contábil e exercício financeiro da Administração Pública .............................................................................................................45 Regime contábil ...............................................................................................................................45 Regime de caixa .......................................................................................................... 49 Regime de competência ....................................................................................... 50 Exercício financeiro da Administração Pública ..........................................................52 9 UNIDADE 01 Contabilidade Pública 10 INTRODUÇÃO Você sabe o que é a Contabilidade Pública? E como ela surgiu? E o que vem a ser o regime contábil e qual é o regime contábil adotado no Brasil? A contabilidade aplicada ao setor público é obrigatória para toda a Administração Pública, ou seja, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, bem como em autarquias e Fundações Públicas, no Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo. Ela surgiu ainda no período da Monarquia e vem se moldando e se aperfeiçoando cada vez mais como forma de auxiliar o processo de registro dos atos e fatos contábeis. A Contabilidade Pública possui objetivos específicos e muito importantes, como a disponibilização de informações para a sociedade. Quando perguntamos sobre qual é o regime contábil adotado no Brasil, a resposta não é tão simples, isso porque ele irá depender do enfoque a ser abordado, pois ele se diferenciará conforme o enfoque for orçamentário ou patrimonial. Desse modo, muitos são os pontos a serem compreendidos nesta unidade e que farão com que você mergulhe nesse mundo fascinante, que é a Contabilidade Pública. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva, você vai mergulhar neste universo! Contabilidade Pública 11 OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o término desta etapa de estudos: 1. Definir os principais conceitos da Administração Pública, identificando seus atores do cenário profissional. 2. Identificar elementos do contexto histórico da Contabilidade Pública no Brasil. 3. Entender princípios, objeto, objetivo e campo de aplicação da Contabilidade Pública. 4. Compreender a dinâmica do regime contábil e o exercício financeiro da Administração Pública. Contabilidade Pública 12 O que é Administração Pública OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender o que é Administração Pública e quais são os seus principais atores. Isso será fundamental para que você compreenda a contabilidade aplicada ao setor público. E então? Motivado para desenvolver essa competência? Então vamos lá. Avante! Quem é a Administração Pública? No Brasil, temos uma organização Político-Administrativa formada por um Estado Federal que, de acordo com a Constituição Federal de 1988, em seu art. 18, é constituído pelos entes federativos, que são a União, os estados membros, o Distrito Federal e os municípios, cada um com sua autonomia. Mas quem é o Estado? DEFINIÇÃO: “O Estado é uma pessoa jurídica de direito público interno, formado pelos seus elementos, que são o povo, o território e o governo” (ASSUMPÇÃO, 2012, p. 10). O Estado é responsável por gerir os serviços públicos, com a finalidade de suprir as necessidades da sociedade. E isso é realizadopor meio da Administração Pública que, através dos seus administradores, deve conduzir programas governamentais definidos no plano de governo. O serviço público traduz-se no exercício de atividades e na disponibilização de bens para a coletividade, com o intuito de proporcionar um maior bemestar para a sociedade ou de desenvolvimento público Contabilidade Pública 13 (SILVA, 2015), como quando um município realiza a coleta de lixo, ou quando oferece serviços de saúde, transporte público etc. Figura 1 – Serviço público Fonte: Freepik Sobrinho (2021) explica que o Estado é a representação do poder, por isso no Brasil é adotada a teoria de tripartição de funções do Estado, na qual essas funções são divididas entre poderes adequadamente organizados. Também é preciso compreender que o poder do Estado é uno e indivisível, mas isso não quer dizer que ele não possa ser dividido entre os órgãos que fazem parte do Estado. A divisão dos poderes compõe o princípio orgânico voltado para garantir o domínio e o controle de todos os órgãos de poder estatal e, com isso, tem-se que a titularidade de diferentes funções do Estado será delegada a mais de um órgão, conferindo a cada órgão, predominantemente, uma função e, assim, evitando-se a concentração. As funções não deixam de ser do Estado, mas são desempenhadas pelos órgãos em nome do Estado. Contabilidade Pública 14 IMPORTANTE: O Estado possui poderes que são subdivididos em Legislativo, Judiciário e Executivo, e cada um desses poderes possui funções, chamadas de típicas, ou principais, e atípicas, que são exercidas dentro de cada um dos entes federativos, sendo exceção apenas a função judiciária nos municípios (SOBRINHO, 2021). Assim, segundo Assumpção (2012), temos que: • O Poder Legislativo é formado pelo Congresso Nacional (Senado Federal e Câmara dos Deputados) no âmbito federal, pelas Assembleias Legislativas no âmbito estadual e pelas Câmaras Municipais no âmbito municipal, no qual possui como função típica legislar. • O Poder Judiciário é composto pelos órgãos do Poder Judiciário, tanto na esfera federal quanto na esfera estadual, como o Supremo Tribunal Federal, os Tribunais de Justiça dos Estados, os Tribunais Regionais Federais, os Juízes do Trabalho etc., e possui como função típica a jurisdicional, ou seja, aplicar as leis. • O Poder Executivo é exercido dentro da sua esfera de competência pelo Presidente da República na esfera federal, pelo governador de estado na esfera estadual, e pelo prefeito na esfera municipal, e possui como função típica administrar a coisa pública. Figura 2 – Poderes Legislativo Senado Federal e Câmara dos Deputados Assembleias Legislativas Câmaras Municipais Judiciário Executivo Órgãos do Poder Judiciário Tribunais Superiores, Conselho Nacional de Justiça, Tribunais Regionais, Tribunais do Trabalho, Tribunais Militares, Tribunais Eleitorais, Tribunais de Justiça e Juízes Estaduais Presidência da República Governadoria Prefeitura Fonte: Elaborado pelo autor com base em Assumpção (2012). Contabilidade Pública 15 Todos esses poderes possuem outras funções que não são predominantes, e, dentre elas, temos que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário também possuem a função de administrar, mas, ao contrário do Poder Executivo que possui a função de administrar o bem público no âmbito federal, estadual e municipal, esses outros poderes devem administrar dentro da sua esfera de competência, isto é, eles exercem a função administrativa quando fazem contratação de pessoal, quando realizam licitações ou compras etc. VOCÊ SABIA? As ações da Administração Pública devem ser realizadas de acordo com a lei, por isso ela só pode fazer o que a lei determina. Além disso, todas as regras referentes à estrutura e ao funcionamento da Administração Pública estão previstas na Constituição Federal. E o que é Administração Pública, você sabe? Conforme Carvalho (2020): A expressão Administração Pública, em sentido formal, orgânico ou subjetivo, designa o conjunto de órgãos e agentes estatais no exercício da função administrativa, independentemente do poder a que pertençam – seja ao Executivo, Judiciário, Legislativo ou a qualquer outro organismo estatal. (CARVALHO, 2020, p. 35) No entanto, quando nos referimos à administração pública, escrito com letra minúscula, estamos mencionando as funções administrativas, ou seja, as atividades administrativas desempenhadas pelo Estado, complementa o autor. A Administração Pública possui quatro tarefas principais, de acordo com Sobrinho (2021), que são: • Poder de polícia – através da limitação ou do condicionamento dos direitos individuais em prol dos direitos coletivos. Contabilidade Pública 16 EXEMPLO A Administração Pública exerce o poder de polícia quando impõe um limite de velocidade em uma via pública para beneficiar os pedestres. • Prestação de serviços públicos – por meio da oferta de serviços públicos à população. EXEMPLO Fornecimento de água potável aos cidadãos. • Fomento – mediante incentivo à iniciativa privada para o exercício de atividades de interesse público em prol do crescimento e desenvolvimento do país. EXEMPLO Fornecimento de incentivos fiscais em atividades exercidas por particulares. • Intervenção – através da regulamentação da atividade econômica e da atuação direta no domínio econômico. EXEMPLO Atuação do Banco do Brasil no mercado, uma sociedade de economia mista na qual a União é detentora de maior parte do capital. A Administração Pública atua de forma direta, quando suas tarefas são exercidas pelos seus órgãos, como também pode atuar de forma indireta, quando o exercício é realizado através de entes descentralizados. Dessa forma, a Administração Pública, para Assumpção (2012, p. 10), “tem o intuito de prestar serviços, diretamente ou indiretamente, sendo responsável pelo seu planejamento, sua execução e controle para que se alcancem resultados satisfatórios para a população”. Vamos compreender melhor o que vem a ser a administração direta e indireta. Administração direta Falamos anteriormente que a organização administrativa da Federação é formada por União, estados membros, municípios e Distrito Contabilidade Pública 17 Federal. Esses entes atuam dentro das suas competências atribuídas no texto constitucional e possuem poderes autônomos, sujeitos a um poder político próprio e único. Figura 3 – Entes federados Entes federados União Distrito Federal MunicípiosEstados Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Desse modo, temos que: • A União atua na Administração Federal. • Os estados membros atuam na administração estadual. • Os municípios atuam na administração municipal. • O Distrito Federal acumula funções da administração municipal e estadual. A prestação dos serviços públicos pode ser realizada diretamente através da Administração Pública, ou também pode ser repassada para que seja realizada por particulares ou entidades especializadas criadas dentro da própria Administração Pública, em determinados casos (CARVALHO, 2020). Contabilidade Pública 18 Quando as atividades são exercidas pelos próprios entes federados, por meio dos seus órgãos, temos a administração direta. Nessas situações, ocorre a prestação centralizada do serviço, pois ele não é transferido para nenhuma outra entidade, complementa o autor. Desse modo, quando o município se responsabiliza pela realização de obras em uma rua, através da secretaria de obras, ela é realizada por meio da distribuição de competência no âmbito interno. IMPORTANTE: Órgãos são criados por meio da distribuição interna de competências dentro de uma mesma pessoa jurídica através da desconcentração, existindo, assim, hierarquia derivada do poder hierárquico existente entre a Administração Pública e os seus órgãos. Com isso, os órgãos não possuem personalidade jurídica, nem patrimônio próprio,como também, como regra, não possuem capacidade processual (CARVALHO, 2020). Os entes federados possuem personalidade jurídica de direito público, como também capacidade administrativa, política e legislativa, no entanto devem se sujeitar às limitações impostas aos entes públicos, como realizar o procedimento licitatório para as contratações. Administração indireta Na administração indireta, ocorre a descentralização, na qual surge uma nova pessoa jurídica com atribuições específicas para o desempenho de uma atividade. Assim, a execução dos serviços públicos e, em alguns casos, a titularidade deles são transferidas para outro ente diferente do Estado, existindo apenas o controle deste sobre o ente, por meio da supervisão ministerial. Desse modo, temos que, na administração direta, as atividades são exercidas pelos órgãos da própria Administração Pública, já na administração indireta as atividades são exercidas por outro ente distinto da Administração Pública. Contabilidade Pública 19 Figura 4 – Administração Pública Administração direta • execução dos serviços púbicos pelos órgãos da Administração Pública • desconcentração Administração indireta • execução dos serviços públicos por outro ente • descentralização Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Isso ocorre em prol de uma maior eficiência da atividade administrativa, na qual a execução de determinados serviços públicos é transferida a terceiros especializados, visto que a especialização pressupõe o alcance de resultados positivos (CARVALHO, 2020). Segundo Silva (2015), a administração indireta é: Atividade administrativa descentralizada exercida por entidades com personalidade jurídica de direito público ou privado, vinculadas a um órgão da Administração Direta, criadas ou autorizadas por lei específica, com a função de prestar serviço público ou de interesse público, para satisfação do Estado e das necessidades coletivas. (SILVA, 2015, p. 39) O Decreto-Lei n º 200/67, art. 4ª, II, dispõe que a administração indireta compreende as seguintes entidades: • Autarquias. • Empresas públicas. • Sociedades de economia mista. • Fundações públicas. Essas entidades possuem características específicas e importantes que as distinguem. Vejamos as principais. As autarquias são entidades criadas apenas por lei, com personalidade jurídica de direito público, com patrimônio e receitas próprias, para desempenhar atividades típicas de Estado (BRASIL, 1967). Contabilidade Pública 20 Nesse tipo de entidade, normalmente, são designados serviços que necessitem de uma maior especialização e, por conseguinte, organização apropriada, autonomia de gestão e pessoal técnico especializado, como no caso do INSS e do Banco Central (SILVA, 2015). IMPORTANTE: As empresas públicas são entidades de direito privado autorizadas por lei específica para exploração de atividade econômica ou prestação de serviços públicos, cujo capital é totalmente público. Elas submetem-se ao regime privado nas relações trabalhistas e tributárias (SOBRINHO, 2021). São exemplos de empresas públicas a Caixa Econômica Federal e os Correios. As Sociedades de Economia Mista são pessoas jurídicas de direito privado, autorizadas por lei específica, que desempenham atividade de natureza econômica e prestação de serviço, cujo capital é público e privado, sendo a maioria público, bem como o poder público participa da sua gestão e organização. A forma jurídica é de sociedade anônima, e as ações com direito a voto pertencem em maior parte ao poder público. Também está submetida ao regime privado das relações trabalhistas e tributárias. São exemplos de sociedades de economia mista o Banco do Brasil e a Petrobras (SOBRINHO, 2021). Por fim, temos as fundações públicas, que podem ser pessoa jurídica de direito público ou privado. Quando forem públicas, serão criadas por lei, mas, quando forem privadas, serão autorizadas por lei. São entidades sem fins lucrativos e criadas para desempenhar atividades que não sejam exclusivas do poder público (SOBRINHO, 2021). Silva (2015) explica que as fundações possuem objetivos de interesse coletivo, geralmente de educação, ensino, pesquisa e assistência social, e têm o amparo e controle constantes da Administração Pública, como no caso da Fundação Oswaldo Cruz. Contabilidade Pública 21 Princípios da Administração Pública A Constituição Federal no capítulo VII traz as disposições gerais acerca da Administração Pública, dentre elas a exigência de obediência a princípios, que são norteadores para as atividades exercidas no âmbito público: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (BRASIL, 1988, online). Assim, são princípios expressamente contidos no texto constitucional, devendo ser obrigatoriamente observados pela Administração Pública. Vamos compreender o que vem a ser cada um deles: No princípio da legalidade, as atuações do administrador público devem estar sujeitas à lei, só podendo agir quando a lei permitir. Para ficar mais fácil de compreender, é só pensar que você, como particular, pode agir de qualquer forma, contanto que não esteja em desacordo com a lei. Já o poder público só deve agir quando a lei permitir. Não se trata de agir por vontade, mas sim quando autorizado por lei. A impessoalidade pressupõe um tratamento igualitário entre as pessoas, não havendo favorecimentos, exceto aqueles previstos em lei. Como também o administrador público não deve atuar visando interesse pessoal ou de terceiros, ele deve agir sempre em nome da Administração Pública. IMPORTANTE: A moralidade está relacionada com aspectos, como boa- fé, ética, honestidade, devendo estar sempre presentes na Administração Pública, podendo o agente público responder por improbidade administrativa quando agir com desonestidade. Contabilidade Pública 22 A publicidade refere-se à transparência dos atos e à divulgação oficial das informações de cunho obrigatório, como determina a Constituição Federal em seu art. 37: § 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos (BRASIL, 1988, online). Temos também o princípio da eficiência, no qual os serviços públicos devem ser disponibilizados de forma eficiente, com qualidade, presteza, economicidade, rendimento etc. Portanto diversos são os dispositivos que devem ser seguidos pela Administração Pública no exercício da sua função e voltados para o bemestar da população. RESUMINDO: E então? Gostou do que lhe mostramos? Aprendeu mesmo tudinho? Agora, só para termos certeza de que você realmente entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir tudo o que vimos. Você deve ter aprendido que a Administração Pública é voltada para oferecer bens e serviços para a população, visando o bem- estar e desenvolvimento do país, e que esses serviços podem ser oferecidos de forma direta, através dos seus órgãos, como também de forma indireta, por meio de entidades criadas ou autorizadas especificamente para isso. Quando o próprio Estado oferece esses serviços, estamos diante da desconcentração, mas, quando ela passa para terceiros particulares, ocorre a descentralização. Você também viu que a administração indireta pode ser ofertada por alguns entes, como as autarquias, sociedades de economia mista, fundações e empresas públicas, cada uma com suas características próprias que as distinguem. Por fim, você conheceu os princípios a serem observados obrigatoriamente pela Administração Pública, que são a legalidade, impessoalidade,eficiência, moralidade e publicidade. Contabilidade Pública 23 Contabilidade Pública e sua história no Brasil OBJETIVO: Neste capítulo, você compreenderá o que vem a ser a Contabilidade Pública e como ela é importante para a Administração Pública e para toda a sociedade, como também entenderá como ela se originou no Brasil e os principais aspectos relacionados com a sua história, incluindo as leis que marcaram todo o processo histórico. Vamos juntos? A Contabilidade Pública A Contabilidade Pública segue as orientações determinadas na Lei nº 4.320/1964, que estabelece normas gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços de toda a Administração Pública do país. O Direito Financeiro faz parte da matéria jurídica da atividade financeira do Estado, abrangendo receitas, despesas, orçamento e crédito público, assim ordena a atividade financeira do Estado. Dessa forma, todos esses elementos disciplinados pelo Direito Financeiro são indispensáveis para a realização da Contabilidade Pública. No entanto, antes de compreendermos o que é a Contabilidade Pública, vamos identificar o que vem a ser a contabilidade. DEFINIÇÃO: A contabilidade, para Araújo e Arruda (2020, p. 18), pode ser compreendida como o “sistema de informações capaz de captar, registrar, reunir, divulgar e interpretar os fenômenos avaliáveis monetariamente que afetam as situações patrimoniais, financeiras e econômicas de qualquer ente”. Contabilidade Pública 24 Dessa forma, podemos inferir que a Contabilidade Pública é o sistema de informações orientado para selecionar, registrar, resumir, interpretar e divulgar os fatos que ocorrem nos órgãos e nas entidades públicas. A Contabilidade Pública é o campo da ciência contábil direcionado para registrar, controlar e demonstrar os atos e fatos que atingem o patrimônio da Administração Pública, bem como das autarquias e das fundações (ARAÚJO; ARRUDA, 2020). Bezerra Filho (2021) explica que, durante a geração de informações, a Contabilidade Pública faz uso de princípios e normas contábeis voltados para o controle patrimonial das entidades do setor público. Além disso, o Casp controla os fatos referentes ao orçamento público, aos custos e à verificação de possíveis atos que venham a afetar o patrimônio futuro, bem como outros controles financeiros, legais e gerenciais, indispensáveis para o bom desempenho da gestão pública, para a transparência e monitoramento da população. Figura 5 – Contabilidade Pública e controle do orçamento público Fonte: Freepik. Assim, o Casp registra todos os fatos contábeis como também os atos potenciais realizados pelo administrador, os quais podem modificar o patrimônio sob o ponto de vista qualitativo ou quantitativo (SILVA, 2015). Contabilidade Pública 25 Isso porque a informação financeira no setor público tem como objetivo contribuir para a avaliação da condição financeira pública e colaborar para o processo de accountability, pois é dever da Administração Pública oferecer serviços públicos de qualidade, possuindo uma boa situação financeira, como também prestar contas à sociedade sobre as ações efetuadas (LIMA; MUNIZ, 2016). VOCÊ SABIA? A Federação Internacional de Contadores (IFAC, 2001) dispõe sobre accountability no qual afirma que é o processo pelo qual os entes do setor público e as pessoas inseridas neles são responsáveis por decisões e ações, compreendendo a maneira como são conduzidos os recursos públicos, além de todos os elementos referentes ao desempenho e aos resultados. Para Bezerra Filho (2021), a principal função dos entes públicos é prestar serviços à população, assim o seu desempenho pode ser parcialmente verificado através da análise da situação patrimonial, da execução do orçamento e dos fluxos de caixa. Os dados disponibilizados devem auxiliar a tomada de decisões, a prestação de contas e responsabilização, como também possibilitar avaliações do tipo: • Se foram oferecidos serviços à população de modo eficiente e eficaz. • A quantidade de recursos disponíveis para gastos futuros e quais são as restrições e condições para que esses recursos possam ser utilizados. • A extensão das alterações da carga tributária dos contribuintes em períodos futuros utilizados para pagar serviços correntes. • A prestação de serviços pelos entes foi aperfeiçoada ou piorada em comparação com exercícios anteriores. Contabilidade Pública 26 Portanto, se o poder público tem o dever de suprir as necessidades da sociedade em relação a bens e serviços públicos, para que possa ser realizada uma avaliação dessa prestação de serviços, não basta apenas verificar os resultados financeiros e orçamentários, mas também o contexto dos resultados da prestação de serviços à população, ou seja, a sua efetividade, complementa o autor. Nessa perspectiva, a contabilidade aplicada ao setor público apresenta-se como um grande instrumento de planejamento e controle da Administração Pública. Com bem evidencia a Lei 4.320/64: Art. 85. Os serviços de contabilidade serão organizados de forma a permitirem o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados econômicos e financeiros. [...] Art. 89. A contabilidade evidenciará os fatos ligados à administração orçamentária, financeira patrimonial e industrial. (BRASIL, 1964) IMPORTANTE: Araújo e Arruda (2020) entendem a Contabilidade Pública como um excelente instrumento de planejamento, controle e de prestação de contas da Administração Pública. Além disso, ela proporciona o equilíbrio das finanças do país, fazendo uso do orçamento como um relevante instrumento para alcançar esse objetivo. Dessa forma, não tem como negar a importância que a Contabilidade Pública exerce não apenas para as finanças e para o patrimônio da Administração Pública, como também para toda a sociedade que se beneficia das suas informações. Contabilidade Pública 27 História da Contabilidade Pública A contabilidade aplicada ao setor público possui uma história que se inicia há muito tempo. No Brasil, pode-se dizer que tudo começou com a chegada da Família Real portuguesa, quando Dom João VI institui o Erário Régio e o Conselho da Fazenda, trazendo orientações para a administração real e definindo normas reguladoras da escrituração da contabilidade desse Erário (ARAUJO; ARRUDA, 2020). Figura 6 – Família Real Fonte: Pixabay Nessa época, já existia a preocupação em fazer uso de mecanismos de registro e controle do patrimônio público e que até hoje são funções básicas da contabilidade aplicada ao setor público. No entanto ainda prevalecia o modelo patrimonialista, no qual não havia distinção entre os bens do rei e os do Estado, o que só veio a mudar na segunda metade do século XIX, devido ao aumento da democracia e do desenvolvimento capitalista. Contabilidade Pública 28 Um importante dispositivo que tratava da contabilidade estava contido na Constituição de 1824, que foi outorgada dois anos após a Declaração de Independência do Brasil, e que demonstra essa preocupação com as receitas e despesas públicas, no qual: Art. 170. A Receita, e despesa da Fazenda Nacional, será encarregada a um Tribunal, debaixo de nome de ‘Tesouro Nacional” aonde em diversas Estações, devidamente estabelecidas por Lei, se regulará a sua administração, arrecadação e contabilidade, em reciproca correspondência com as Tesourarias, e Autoridades das Províncias do Império (BRASIL, 1824, online). Além disso, estavam incluídos na Constituição os princípios da Administração Pública. Em 1831, época da regência, ocorreram algumas outras modificações feitas pelo Imperador que também configuraram como avanço para a Contabilidade Pública. O sistema contábil foi reformuladopor uma lei em que o Contador Geral era a autoridade responsável para definir as normas referentes à execução contábil a serem obedecidas por todos os setores, como forma de unificar o sistema contábil. Essa lei ainda tratava de: • Organizar o Tesouro Nacional e as Tesourarias das Províncias. • Obrigar o emprego do método das partidas dobradas. • Determinar a contratação do servidor da fazenda apenas através de concurso público. REFLITA: No ano de 1922, foi criado o Código de Contabilidade Pública, trazendo uma reorganização da contabilidade e do orçamento público, que trazia diversas disposições significativas, como a classificação das receitas e despesas e a responsabilidade dos atos relacionados com a escrituração das repartições públicas direcionada à Diretoria Central de Contabilidade (FELIX, 2013). Contabilidade Pública 29 O Código de Contabilidade era regulamentado pelo Decreto nº 15.783/22, o qual definia o método das partidas dobradas como obrigatório para a escrituração dos fatos relacionados com o patrimônio público e com a realização dos orçamentos (ARAUJO; ARRUDA, 2020). Figura 7 – Partidas dobradas Crédito Débito Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Depois disso, essas normas passaram por modificações, como também foram criados outros normativos, como forma de aperfeiçoar os procedimentos contábeis. No entanto um grande marco para a Contabilidade Pública foi a publicação da Lei nº 4.320, de 1964, trazendo normas de Direito Financeiro para a regulação dos orçamentos e balanços dos entes da federação. Essa lei ainda está em vigor até os dias atuais, buscando garantir o equilíbrio das finanças públicas do país. ACESSE: Para ter acesso à Lei nº 4.320/64 e verificar todos os dispositivos desse normativo, acesse aqui Em 1986, foi criada a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) com a finalidade de “promover a integração e a modernização dos sistemas de programação financeira, de contabilidade e de execução orçamentária dos Órgãos e Entidades Públicas do Governo Federal” (FELIX, 2013, p. 14). Logo em seguida, foi criado Sistema Integrado de Administração Financeira, a ser utilizado por toda administração direta e indireta, buscando aperfeiçoar ainda mais a Contabilidade do setor público. Contabilidade Pública http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.html 30 Conforme Felix (2013), os objetivos do SIAFI são: • Disponibilizar instrumentos apropriados para o controle da execução financeira, contábil e orçamentária. • Proporcionar confiabilidade e tempestividade em relação às informações gerenciais da Contabilidade Pública. • Promover a integração das informações na esfera do governo federal. • Disponibilizar uma maior transparência dos gastos públicos. A Constituição de 1988 trouxe modificações em relação ao controle interno, dispondo a recomendação desse controle em todos os poderes, bem como determinou a competência do controle externo ao Poder Legislativo com apoio do Tribunal de Contas. Outro fato importante na história da Contabilidade Pública é a sanção da Lei nº 101 de 2000, conhecida como Lei da Responsabilidade Fiscal (LRF), no qual em seu art. 1º determina: Art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. § 1º A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. (BRASIL, 2000) Essa lei possui como finalidade, dentre outras, definir instrumentos de transparência da gestão fiscal para toda a Administração Pública. Para Araújo e Arruda (2020), a LRF possui quatro pilares básicos: Contabilidade Pública 31 • Dar ênfase à necessidade do planejamento governamental, determinando novos temas para a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e para a Lei Orçamentária Anual (LOA). • Conseguir o equilíbrio fiscal com o incremento da arrecadação. • Controlar o endividamento público. • Garantir a transparência da gestão fiscal. Figura 8 – Pilares da Lei de Responsabilidade Fiscal LRF Ênfase ao planejamento governamental Transparência da gestão fiscal Equilíbrio fiscal Controlar o endividamento público Fonte: Elaborado pelo autor com base na Lei nº 101/2000. Outros normativos muito relevantes quando falamos da história da Contabilidade Pública são as normas brasileiras de contabilidade, através de resoluções editadas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), sendo que algumas delas são direcionadas para a contabilidade aplicada ao setor público. Essas normas foram publicadas no ano de 2008, mas, em 2016, elas foram revogadas, no entanto, ainda assim, estabelecem um marco com a compatibilização da Contabilidade Pública do Brasil aos padrões internacionais. Contabilidade Pública 32 IMPORTANTE: Essas normas foram revogadas devido ao processo de convergência direcionada para a unicidade conceitual, fundamental para que não existam divergências no entendimento doutrinário e teórico, que poderiam fazer com que os aspectos formais das Normas Brasileiras de Contabilidade ficassem comprometidas (ARAUJO; ARRUDA, 2020). Assim, o Brasil orienta-se pelas Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, como bem explica Felix (2013): O setor público segue as IPSAS (Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público), e que são editadas pelo IFAC (Federação Internacional de Contadores), que é uma organização mundial, que o Brasil faz parte, e que tem o objetivo de colaborar com o desenvolvimento da economia internacional, além de ser responsável pela edição das IPSAS. (FELIX, 2013, p. 16) De acordo com as IPSAS, também é elaborado anualmente um manual com regras e procedimentos a serem obedecidos pelo poder público referentes a procedimentos contábeis, chamado de Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MCASP), devendo ser seguido por todos os entes da federação. O MCASP traz requisitos obrigatórios referentes ao reconhecimento, à mensuração e evidenciação das transações e dos eventos das demonstrações contábeis. Em caso de divergências com outras normas, devem ser seguidas as normas presentes no manual e, de forma subsidiária, outras normas (MCASP, 2021). Contabilidade Pública 33 SAIBA MAIS: Aprofunde-se na história da Contabilidade Pública lendo o artigo “Impactos Contábeis Gerados a Partir da Implantação do Erário Régio no Brasil”. Nele, o autor faz um panorama de como era contabilidade do setor público em Portugal e como ele influenciou a sua inserção no Brasil, mostrando como era antes da implantação do Erário Régio e como ficou depois. Disponível aqui. RESUMINDO: Vimos que a Contabilidade Pública está relacionada com os fatos patrimoniais, financeiros e econômicos dos órgãos e das entidades públicas, inclusive das autarquias e das fundações públicas, registrando todos os fatos contábeis e potenciais realizados pelo administrador público. Vimos também que a história da Contabilidade Pública é marcada por diversos fatos relevantes, tendo início no período da Monarquia com a instituição do Erário Régio e o Conselho da Fazenda. Além disso, você pode compreender que a Constituição Federal de 1824 também trouxe modificações significativas para as finanças públicas e que, em 1922, foi criado o Código de Contabilidade. Em seguida, você conheceu a Lei nº 4.320/64, lei esta que ainda está e vigor e que traz normas de Direito Financeiro como forma de regular o orçamento e os balanços do poderpúblico. Além disso, viu que a Lei de Responsabilidade Fiscal é muito importante, pois traz instrumentos de transparência da gestão fiscal a serem seguidos pelos entes federados. Por fim, entendeu a relevância das Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, que são seguidas pelo Brasil e o Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público editado anualmente. Contabilidade Pública https://www.ufrgs.br/congressocont/https://scorm.onilearning.com.br/item-trilha.php?Componente=a6e17bcc986e2ac42e73b7825dd92a2a&sessao=ouq42biklmno5afljgunqgg21l&aberto=true/IIIContUFRGS/IIIContUFRGS/paper/download/89/57 34 Princípios, objeto, objetivo e aplicação da Contabilidade Pública OBJETIVO: Neste capítulo, iremos conhecer os princípios voltados para a Contabilidade Pública, suas principais características, o objeto da Contabilidade Pública, os seus objetivos, como também o campo de aplicação que serão primordiais para ampliar a compreensão sobre a Casp. Princípios da Contabilidade Pública Os princípios da contabilidade formam em sua essência a estrutura conceitual em que se baseia a contabilidade, para que assim seus resultados consigam cumprir com a sua função principal, que é oferecer informações úteis para a tomada de decisão e apresentar o resultado da gestão pública para a sociedade. De acordo com Carvalho (2020), os princípios devem ser observados como normas gerais impostas que servem como orientação para a atuação das pessoas, no qual são estabelecidos valores a serem seguidas as condutas por eles praticadas. Desse modo, o administrador público, ou qualquer pessoa que gerencie, controle, ou arrecade bens ou serviços públicos, deve levar em consideração os princípios contábeis relacionados com o poder público. Contabilidade Pública 35 IMPORTANTE: Os princípios fundamentais definidos para a contabilidade também são aplicáveis à contabilidade aplicada ao setor público com determinadas adequações. No entanto a resolução que trazia esses princípios foi revogada, o que não faz com que esses princípios sejam extintos. As revogações das resoluções pelo CFC são tratadas como necessárias para que não venham a comprometer aspectos formais das Normas Brasileiras de Contabilidade. Sendo assim, o estudo dos princípios da contabilidade ainda se apresentam como muito importantes para a área (ARAUJO; ARRUDA, 2020). Ante o exposto, os princípios contábeis são o da entidade, da continuidade, da oportunidade, do registro pelo valor original, da competência e da prudência. Vejamos as principais características desses princípios. Figura 9 – Princípios da Contabilidade Pública Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Contabilidade Pública 36 O princípio da entidade está relacionado com a necessidade de separar o patrimônio da entidade com o do particular, independentemente de a quem pertença. Quando direcionamos para o setor público, o fundamento para se constatar a entidade contábil passa a ser a necessidade de demonstrar a situação das pessoas que devem prestar contas sobre a gestão de qualquer entidade que possua orçamento próprio e gerencie recursos públicos (SILVA, 2015). O princípio da continuidade leva em consideração o futuro das entidades, visto que elas possuem uma vida útil com prazo indeterminado, principalmente quando falamos dos entes da federação, como a União, os estados, municípios e o Distrito Federal. Figura 10 – Princípio da continuidade Princípio da continuidade Futuro Entidades com prazo indeterminado Fonte: Elaborado pelo autor (2022). O princípio da oportunidade trata-se da forma como devem ser apresentados e apreciados os elementos patrimoniais para que possam gerar informações completas e nos prazos adequados. Assim, a Lei nº 4.320/64 determina a forma de organização das informações contábeis, para que essas possam evidenciar os componentes patrimoniais, como também possibilitem o acompanhamento da execução orçamentária. Esse princípio é muito relevante, visto que a Administração Pública deve disponibilizar para a sociedade de maneira íntegra e tempestiva todas as informações que possibilite a prestação de contas pela população. O princípio do registro pelo valor original refere-se à maneira como devem ser registrados os elementos do patrimônio, pois o registro deve ser realizado pelos valores monetários à data da transação e em moeda nacional, possibilitando, assim, a uniformização quantitativa dos registros e das mutações do patrimônio (SILVA, 2015). A Lei nº 4.320/64, em seu art. 106 corrobora a aplicação desse princípio quando determina: Contabilidade Pública 37 Art. 106. A avaliação dos elementos patrimoniais obedecerá às normas seguintes: I - os débitos e créditos, bem como os títulos de renda, pelo seu valor nominal, feita a conversão, quando em moeda estrangeira, à taxa de câmbio vigente na data do balanço; II - os bens móveis e imóveis, pelo valor de aquisição ou pelo custo de produção ou de construção; III - os bens de almoxarifado, pelo preço médio ponderado das compras. § 1° Os valores em espécie, assim como os débitos e créditos, quando em moeda estrangeira, deverão figurar ao lado das correspondentes importâncias em moeda nacional. (BRASIL, 1964, online) Assim, como regra, as avaliações são realizadas de acordo com os valores de entrada e, depois de incluídos no patrimônio, não podem mais ter seus valores modificados. O princípio da competência determina que o reconhecimento dos efeitos dos eventos seja com os períodos a que se referirem, não sendo levado em conta recebimento ou pagamento. No entanto, quando tratamos de Contabilidade Pública, devemos levar em consideração o que dispõe a Lei nº 4.320/64, em seu art. 35, no qual: “pertencerão ao exercício financeiro às receitas nele arrecadadas e as despesas nele legalmente empenhadas”. Também deve ser observado o que estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal, no art. 50, em que a despesa e o reconhecimento de compromisso serão registrados de acordo com o regime de competência, isto é, na ocorrência do fato gerador (SILVA, 2015). Já o princípio da prudência abrange a prudência junto aos julgamentos das estimativas. Na Administração Pública, sua aplicação deve ser verificada em relação a não ocorrência de excesso de estimação de ativos e receitas, bem como a diminuição de passivos e despesas, fazendo assim com que exista uma maior confiabilidade o processo de aferição e demonstração dos elementos patrimoniais, complementa o autor. Contabilidade Pública 38 Objeto da Contabilidade Pública A contabilidade possui como objeto o patrimônio, assim, quando voltamos nosso estudo para a contabilidade da Administração Pública, passamos a ter um objeto mais restrito, que é o patrimônio público. Conforme Sobrinho (2021), o objeto da Contabilidade Pública é o patrimônio público, através do registro dos atos e fatos administrativos e contábeis. Araújo e Arruda (2020) complementam afirmando que a gestão do patrimônio como objeto da Casp é em relação aos aspectos contábil, orçamentário, patrimonial, financeiro e de resultado. Figura 11 – Objeto da contabilidade aplicada ao setor público Objeto da Casp Patrimônio público Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Mas o que vem a ser atos e fatos? Atos são hipóteses em que o patrimônio não sofre modificação no primeiro instante, mas que pode sofrer em um momento futuro. Eles são registrados no sistema de controle, como a previsão de receita e a fixação de despesa (SOBRINHO, 2021). Os fatos modificam o patrimônio e podem ser permutativos, no qual elementos do ativo ou do passivo são permutados; modificativos, quando as alterações no patrimônio líquido modificam de forma aumentativa ou diminutiva; ou, ainda, compostos, quando são permutativos e modificativos ao mesmo tempo, explica o autor. E o que vem a ser patrimônio público? O conceito de patrimôniopúblico foi descrito pela Resolução CFC nº 1.129/2008. Patrimônio Público é o conjunto de direitos e bens, tangíveis ou intangíveis, onerados ou não, adquiridos, formados, produzidos, recebidos, mantidos ou utilizados pelas entidades do setor público, que seja portador ou represente um fluxo de benefícios, presente ou futuro, inerente à prestação de serviços públicos ou à exploração Contabilidade Pública 39 econômica por entidades do setor público e suas obrigações (BRASIL, 2008, online). No entanto existem algumas particulares importantes a se compreender em relação ao patrimônio público que, de fato, devem ser consideradas como objeto da Casp. E para isso é preciso saber quais são os bens públicos. Os bens públicos podem ser de uso comum, de uso especial e de uso dominical, conforme o Código Civil. Vejamos o que vem a ser cada um deles: • Os de uso comum são aqueles direcionados para uso coletivo, ou seja, que qualquer indivíduo possa aproveitar, como as praias e as ruas. • Os bens de uso especial são os bens utilizados pela Administração Pública para realizar as prestações de serviços, ou seja, são as repartições públicas, como as escolas públicas. • Os bens dominicais são aqueles que não possuem destinação específica ou que não estão sendo utilizados no momento, como no caso dos imóveis públicos desativados (SOBRINHO, 2021). Figura 12 – Bens de uso comum Fonte: Pixabay. Contabilidade Pública 40 Perceba que os bens de uso comum são bens não patrimoniais, por isso são indisponíveis por natureza. Assim, como regra, eles não fazem parte do objeto da Contabilidade Pública. No entanto, o Conselho Federal de Contabilidade dispõe que: Os bens de uso comum que absorveram ou absorvem recursos públicos, ou aqueles eventualmente recebidos em doação, devem ser incluídos no ativo não circulante da entidade responsável pela sua administração ou controle, estejam, ou não, afetos a sua atividade operacional (CFC, 2008, online). Assim, deverão ser registrados na contabilidade todos os bens de uso especial e os dominicais, como também os de uso comum que se enquadrarem na exceção imposta pela resolução, ou seja, aqueles que consumiram ou consomem recursos públicos, como também aqueles que forem auferidos em doação. EXEMPLO Uma empresa X decidiu doar um terreno para o município para a construção de um hospital. Depois da doação, esse terreno deverá ser registrado como bem no patrimônio do município. Uma forma mais fácil de você compreender quais são esses bens que não se incluem é pensar naqueles em que o poder público não precisou colocar nenhum tipo de recursos na sua construção, pois são bens naturais, como os lagos. Objetivo da Contabilidade Pública Segundo Silva (2015, p. 22) o objetivo da contabilidade aplicada ao setor público é: fornecer informações atualizadas e exatas à Administração para subsidiar as tomadas de decisões e aos Órgãos de Controle Interno e Externo, para o cumprimento das normas legais, bem como às instituições governamentais e particulares informações estatísticas e outras de interesse dessas instituições. (SILVA, 2015, p22) Contabilidade Pública 41 Assim, a produção de informações úteis sobre os entes públicos por meio dos instrumentos contábeis, como as demonstrações e os balanços, irá auxiliar o processo de tomada de decisões, como também a prestação de contas diante do controle externo e o controle social realizado pela sociedade. Figura 13 – Objetivos da Contabilidade Pública Objetivos Instrumentos para o controle social Tomada de decisão Prestação de contas Fonte: Elaborado pelo autor (2020). Como citamos anteriormente, a contabilidade é um importante instrumento de transparência pública, o qual possibilita a prestação de contas para a sociedade e a devida responsabilização dos representantes (accountability). SAIBA MAIS: Aprofunde-se mais nesse tema lendo o artigo “A Contabilidade Pública como instrumento de controle social”. Ele traz diversos pontos interessantes sobre esse objetivo da contabilidade aplicada ao setor público e a importância de se ter acesso às informações das instituições públicas para que seja realizado esse controle. Disponível aqui. Contabilidade Pública https://repae-online.com.br/https://scorm.onilearning.com.br/item-trilha.php?Componente=a6e17bcc986e2ac42e73b7825dd92a2a&sessao=ouq42biklmno5afljgunqgg21l&aberto=true/REPAE/article/download/208/pdf/596 42 Araújo e Arruda (2020) entendem que a contabilidade aplicada ao setor público tem como objetivo selecionar, estudar, registrar, interpretar, controlar, resumir, orientar e demonstrar os fatos que atingem o patrimônio público. Campo de aplicação da Contabilidade Pública A contabilidade aplicada ao setor público, também conhecida como Casp, conforme Piscitelli e Timbó (2012, p. 7): Constitui uma das subdivisões da contabilidade aplicada a diferentes tipos de atividades, de entidades. Seu campo de atuação é, assim, o das pessoas jurídicas de Direito Público Interno – União, estados, Distrito Federal e municípios e suas autarquias –, bem como o de algumas de suas entidades vinculadas – fundações públicas e empresas públicas, estas pelo menos quando utilizam recursos à conta do Orçamento Público. (PISCITELLI; TIMBÓ, 2012, p.7) Assim, a sua área de ação abrange a administração direta nas três esferas de governo, ou seja, na esfera federal, estadual e municipal, e nos três Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, além do Ministério Público e dos Tribunais de Contas, como também as autarquias, as fundações públicas e as empresas dependentes. DEFINIÇÃO: As empresas dependentes, conforme Silva (2015, p. 24) “são aquelas que recebem do ente controlador recursos financeiros para pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária”. Contabilidade Pública 43 Assim, é considerado como gestor de recursos públicos qualquer indivíduo que guarde, arrecade, coordene ou faça uso de bens ou valores públicos, por isso deve prestar contas deles, respondendo pelo patrimônio que está sob sua responsabilidade (SOBRINHO, 2021). Figura 14 – Campo de aplicação da Contabilidade Pública Campo de aplicação Administração direta Autarquias, fundações Empresas estatais dependentes Fonte: Elaborado pelo autor (2022). Além disso, Araújo e Arruda (2020) citam que também estão incluídas no campo de aplicação: • As entidades que precisem registrar as operações orçamentárias, em comum acordo. • As entidades que atuem no sentido de cumprimento de programas, projetos e ações de fins ideais. • Os serviços sociais. • Os conselhos profissionais. • Entidades sem fins lucrativos subordinadas a julgamento das contas pelo controle externo. Outras entidades também podem adotar os conceitos da Contabilidade Pública de maneira opcional ou por exigência de seus órgãos reguladores, como no caso das empresas estatais independentes. Contabilidade Pública 44 RESUMINDO: Além disso, você pode compreender que a Contabilidade Pública possui como objetivo fornecer informações úteis para a tomada de decisões, como também é um instrumento importante de transparência, de prestação de contas e de responsabilização. Além disso, viu quais são os entes que fazem parte do campo de aplicação da Contabilidade Pública e que são todos os entes federados nas três esferas de governo e nos três poderes, até mesmo as empresas estatais dependentes, autarquias e a fundação, como também outras entidades, como os serviços sociais e as entidades de classe. Contabilidade Pública 45 Regime contábil e exercício financeiro da Administração Pública OBJETIVO: Neste capítulo, iremos compreender a dinâmica do regime contábil e o exercício financeiro da Administração Pública, entendendo as características pertinentesde cada um desses regimes, para que assim possam ser diferenciados, visto que são fundamentais para a compreensão da contabilidade aplicada ao setor público. Regime contábil O campo de atuação da Contabilidade Pública é praticado por meio da escrituração realizada pelos entes federados, para que assim possam compreender e demonstrar as variações que acontecem na estrutura patrimonial e financeira da entidade, devido às decisões efetuadas pela Administração Pública, bem como em relação às variáveis externas que não dependem do controle e poder de decisão dos entes. DEFINIÇÃO: A escrituração é uma técnica contábil que corresponde ao registro dos atos e fatos que acontecem na entidade, ou seja, os acontecimentos que alteram ou venham a alterar a situação patrimonial da entidade.. Também é oportuno levar em consideração o que explica Kohama (2016): Deve-se observar que a ‘contabilidade, evidenciará os fatos ligados à administração orçamentária, financeira, patrimonial e industrial’, por isso, além do registro dos fatos ligados à execução orçamentária, deve-se cuidar, também, dos registros dos fatos ligados à execução financeira e patrimonial, de maneira que os fatos modificativos sejam levados à conta de resultado e que elas permitam o Contabilidade Pública 46 conhecimento da composição patrimonial e dos resultados econômicos e financeiros. (KOHAMA, 2016, p. 44) Para atender aos objetivos inerentes da Contabilidade Pública, esta possui uma estrutura diferenciada em relação aos outros campos da contabilidade, isso por causa da obrigatoriedade de escrituração dos atos de gestão orçamentária e à adoção das leis e dos normativos para a realização das transações da Administração Pública. Desse modo, a estrutura da contabilidade aplicada ao setor público, segundo Lima e Muniz (2016), abrange algumas particularidades, como: • Sistemas próprios de contabilidade para registro e controle das operações. • Instrumentos de controle por fundos especiais. • Bases de escrituração distintas para recolhimento dos fluxos financeiros e econômicos. • Relação do orçamento com o patrimônio. As transações financeiras realizadas pelos entes públicos, ou seja, o registro das despesas e receitas deve ser efetuado através de métodos, chamados de regime contábil. Para Kohama (2016, p. 43), “regime contábil define-se como um sistema de escrituração contábil”. Existem três tipos de regimes contábeis que fazem esse registro, que são o regime de caixa, o regime de competência e o misto. Figura 15 – Regime contábil Regime contábil Sistema de escrituração contábil Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016). Conforme Bezerra Filho (2021), a Contabilidade Pública adota o regime contábil misto, formado pelo regime de competência para a despesa e de caixa para a receita. Contabilidade Pública 47 Já Kohama (2016) explica que, quando se trata de regime contábil do Brasil, deve ser levado em conta o enfoque orçamentário e o enfoque patrimonial. Assim, quando houver qualquer tipo de questionamento sobre qual é o regime contábil adotado no Brasil, primeiramente deve- se observar se é em relação ao regime orçamentário ou ao regime patrimonial. IMPORTANTE: Bezerra Filho (2021) também compartilha da mesma opinião, relatando que, de acordo com a análise dos princípios e dos pressupostos da ciência contábil, é possível perceber que a contabilidade aplicada ao setor público segue os princípios da contabilidade. Assim, é adotado o princípio da competência na sua totalidade, isto é, nas receitas e nas despesas, sob o enfoque patrimonial. E as disposições contidas no art. 35 da Lei nº 4.320/64 estão relacionados com o enfoque orçamentário, e não patrimonial. Como dispõe a Lei nº 4.320/64: “Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro: I - as receitas nêle arrecadadas; II - as despesas nêle legalmente empenhadas”. Entretanto, também devemos observar o que Lei de Responsabilidade Fiscal aborda sobre o regime contábil: Art. 50. Além de obedecer às demais normas de contabilidade pública, a escrituração das contas públicas observará as seguintes: [...] II - a despesa e a assunção de compromisso serão registradas segundo o regime de competência, apurando- se, em caráter complementar, o resultado dos fluxos financeiros pelo regime de caixa. (BRASIL, 2000) O enfoque orçamentário também é conhecido como regime financeiro e busca controlar o orçamento através da escrituração dos fluxos financeiros de receitas e despesas orçamentárias (LIMA; MUNIZ, 2016). Contabilidade Pública 48 Para que não fique perdido, precisamos compreender o que vem a ser receita. “Receita, pelo enfoque orçamentário, são todos os ingressos de recursos para cobertura das despesas orçamentárias, tendo como objetivo evitar que a execução das despesas orçamentárias ultrapasse a arrecadação efetiva.” (HADDAD; MOTA, 2010, p. 67) Portanto, as entradas de recursos que servem para realizar pagamentos com despesas são consideradas receitas, como o pagamento de IPTU. Diante do enfoque orçamentário, pode-se dizer que o regime contábil é misto, devido à escrituração da receita orçamentária ser feita pelo regime de caixa, e o da despesa orçamentária pelo regime de competência (KOHAMA, 2016). Nos registros orçamentários, a receita é escriturada pela arrecadação (caixa) e a despesa orçamentária através do empenho (competência orçamentária), obedecendo aos princípios orçamentários constitucionais e àqueles incluídos na Lei nº 4.320/64. Já quando se trata do regime patrimonial, a receita e a despesa orçamentária não fazem parte do regime contábil misto, porque são escrituradas pelo regime de competência (KOHAMA, 2016). Figura 16 – Regime contábil Enfoque orçamentário Misto Receita regime de caixa e despesa regime de competência Regime de competência Receitas e despesas pelo mesmo regime, o de competência Enfoque patrimonial Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016). Os registros de controle e variações patrimoniais devem obedecer aos princípios contábeis, por isso as receitas e as despesas são contabilizadas como receitas patrimoniais e despesas patrimoniais. Vejamos um exemplo para compreendermos na prática como pode ocorrer a escrituração. Contabilidade Pública 49 EXEMPLO Maria possui um terreno na cidade de Santos, por isso precisa pagar o IPTU, que possui como data de vencimento 20 de abril de 2020. No entanto Maria passou por diversos problemas financeiros e não conseguiu honrar com esse compromisso junto à prefeitura na data de vencimento, só vindo a realizar o pagamento no dia 20 de janeiro de 2021. Desse modo, mesmo a data de vencimento sendo no ano de 2020, o pagamento só foi efetuado no ano de 2021, o que faz com que a prefeitura de Santos contabilize essa receita como sendo do ano 2021. Mas o que é regime de caixa e regime de competência, você sabe? Regime de caixa O regime de caixa é o regime contábil no qual são levadas em consideração como receitas e despesas do exercício todas as transações, sejam recebidas ou pagas, durante o exercício financeiro, mesmo que sejam débitos ou créditos relacionados com outros exercícios (SILVA, 2015). Figura 17 – Regime de caixa Regime de caixa Receitas arrecadadas e despesas pagas do período Fonte: Elaborado pelo autor com base em Kohama (2016). Dessa forma, podemos dizer que o regime de caixa é aquele que envolve, puramente, todos os recebimentos e pagamentos realizados no período, até mesmo aqueles que fazem parte de períodos contábeis anteriores (KOHAMA, 2016). Nesse regime, é dispensada a apuração do resíduos ativos (créditos) e de restos a pagar (débitos). Isso porque, depois de terminado o exercício financeiro atual, são transferidas para o orçamento do exercício seguinte as receitas e despesas não efetuadas (SILVA, 2015). Assim, as receitas que ainda serão arrecadadas,mesmo que já tiverem sido lançadas, e as despesas empenhadas e as liquidadas que Contabilidade Pública 50 não foram pagas, devem ser repassadas para o exercício financeiro posterior para que faça parte dele, sem deixar resíduos passivos ou ativos (KOHAMA, 2016). IMPORTANTE: Mais à frente nos nossos estudos, iremos compreender a fundo o que são despesas empenhadas, despesas liquidadas e despesas pagas. No entanto, para que você entenda como funciona o regime de caixa, basta você saber que as despesas podem passar por três estágios. Quando ele é empenhado, ocorre a criação da obrigação pendente de pagamento, demonstrando que existe aquela despesa a ser paga, já quando ela é liquidada é porque foi verificado o direito de o credor receber o devido pagamento, mas essa despesa só é paga realmente no estágio do pagamento, que é quando ocorre o desembolso efetivo do valor ao credor. Para Lima e Muniz (2016), esse regime é ineficiente em relação ao reconhecimento das transações econômicas da Administração Pública, devido à mensuração restrita do resultado econômico, pois não alcança de maneira integral as variações sofridas pelo patrimônio. Regime de competência No regime de competência, “as receitas e despesas são apropriadas como do exercício em razão da data do respectivo fato gerador (cria a obrigação), e não da época em que ocorre a arrecadação ou o pagamento”. (SILVA, 2015, p. 25) Assim, os tributos lançados e não arrecadados e as despesas empenhadas e não pagas no período serão escrituradas no resultado do exercício, como se tivessem sido realizadas totalmente no ano de referência, complementa o autor. Aqui, as receitas e despesas são pertencentes ao exercício que lhe deu origem, e não no momento do seu pagamento ou recebimento, mesmo que já empenhadas. E, se encerrada a vigência do orçamento, Contabilidade Pública 51 essas receitas e despesas passam para o exercício posterior, para que sejam pagas ou arrecadadas, mas não deixam de fazer parte do orçamento de origem. Figura 18 – Regime de competência Regime de competência Todas as receitas e despesas pertencem ao exercício de origem Fonte: Elaborado pelo autor com base em Silva (2015). Logo a receita lançada e não arrecadada no período é de fato receita desse período, passando a fazer parte de resíduos cobrados em exercícios seguintes na conta receita a arrecadar, bem como a despesa legalmente empenhada e não paga no período passa a ser despesa desse período, fazendo parte de resíduos passivos, que serão pagos em exercícios seguintes, como restos a pagar (KOHAMA, 2016). IMPORTANTE: No regime de competência, deve-se realizar a apuração no final do exercício das operações que devem ser contabilizadas, como resíduos ativos e restos a pagar (SILVA, 2015). Esse regime é adotado no registro de receitas e despesas que estão mutuamente relacionadas, como em uma relação de causa e efeito, sendo normalmente empregados pelos fundos proprietários, visto que esses executam, sobremaneira, transações de ordem econômica ligadas a atividades empresariais (LIMA; MUNIZ, 2016). Contabilidade Pública 52 SAIBA MAIS: Aprofunde-se nesse tema lendo o artigo “O regime de competência no setor público brasileiro: uma pesquisa empírica sobre a utilidade da informação contábil”. Nesse artigo, os autores examinam os benefícios trazidos pelo regime baseado na competência para a tomada de decisões e para a gestão das entidades públicas. Disponível aqui. Exercício financeiro da Administração Pública Exercício financeiro é o intervalo de tempo em que acontecem as operações financeiras e contábeis da Administração Pública. Kohama (2016, p. 43) define o exercício financeiro como “o período de tempo durante o qual se exercem todas as atividades administrativas e financeiras relativas à execução do orçamento”. Segundo a Lei nº 4.320/64, art. 34, o exercício financeiro da contabilidade aplicada ao setor público coincidirá com o ano civil. Figura 19 – Exercício financeiro Exercício financeiro Coincide com o ano civil Fonte: Elaborado pelo autor com base na Lei nº 4.320/64. Assim, ele corresponderá ao período de 12 meses em que o orçamento será executado, iniciando-se em 1º de janeiro e terminando em 31 de dezembro. Esse período é importante para diversos instrumentos orçamentários e fiscais, pois envolve todas as atividades relacionadas Contabilidade Pública https://www.scielo.br/j/rcf/a/rh4pZ6t7ywhN4zVyzSsxP3R/?lang=pt 53 com a execução da Lei Orçamentária Anual (LOA), como em relação à validade de créditos adicionais e para a definição dos restos a pagar e das despesas de exercícios anteriores. Durante esse período também ocorrem transações independentes da execução orçamentária, tais como: consumo de materiais, atualização de créditos e débitos, inscrição de restos a pagar e de dívida ativa etc. Nesse período, a Contabilidade Pública registra o montante da previsão da receita e da fixação da despesa, bem como faz a escrituração da arrecadação da receita, da emissão de empenhos, da liquidação e pagamento da despesa e de uma série de outros atos e fatos administrativos, tais como assinatura de contratos, movimentação de almoxarifado etc. (HADDAD; MOTA, 2010, p. 67) Além disso, as receitas e despesas devem pertencer ao exercício financeiro dos registros contábeis (art. 35, Lei nº 4.320/64). Por isso esse lapso temporal deve ser seguido no momento dos registros e das demonstrações dos atos e fatos relacionados com o patrimônio público de todos os entes da federação. RESUMINDO: Compreendeu, ainda, que o regime contábil pode ser regime de caixa, regime de competência e regime misto e que, no Brasil, o regime a ser utilizado irá depender do enfoque, pois, quando for pelo enfoque orçamentário, ele será misto, sendo o regime de caixa para a receita orçamentária e o regime de competência para a despesa orçamentária. No entanto, quando o enfoque for patrimonial, ele será sempre pelo regime de competência. Além disso, você conheceu os conceitos de cada um dos regimes, bem como o que diz a legislação sobre o regime contábil. Por fim, entendeu que o exercício financeiro da administração pública coincide com o ano civil e que esse período é onde ocorrem diversas transações financeiras e orçamentárias relacionadas com a Lei Orçamentária Anual. Dessa forma, foram muitos pontos importantes para o seu estudo da contabilidade aplicada ao setor público que fizeram parte desse estudo e que serão fundamentais para os próximos conhecimentos. Contabilidade Pública 54 REFERÊNCIAS ARAÚJO, I. da P. S.; ARRUDA, D. G. Contabilidade pública: da teoria à prática. São Paulo: Saraiva, 2020. ASSUMPÇÃO, M. J. Contabilidade pública. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2012. BEZERRA FILHO, J. E. Contabilidade aplicada ao setor público: abordagem objetiva e didática. São Paulo: Atlas, 2021. BRASIL. [Constituição (1824)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [1824]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ constituicao24.htm. Acesso em: 13 mar. 2022. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [1988]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 26 out. 2021. BRASIL. Decreto-Lei n º 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 25 fev. 1967. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm. Acesso em: 13 mar. 2022. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm.Acesso em: 8 jan. 2022. BRASIL. Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 mar. 2002. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm. Acesso em: 13 mar. 2022. Contabilidade Pública 55 BRASIL. Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 4 maio 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/lcp/lcp101.htm. Acesso em: 13 mar. 2022. BRASIL. Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público. MCASP. 2021. Disponível em: https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/ f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:41943. Acesso em: 13 mar. 2022. CFC. Resolução Conselho Federal De Contabilidade - CFC Nº 1.129 de 21 de novembro de 2008. Disponível em: https://www1.cfc.org. br/sisweb/SRE/docs/RES_1129.pdf. Acesso em: 13 mar. 2022 CFC. Resolução Conselho Federal De Contabilidade - CFC Nº 1.137, de 25 de novembro de 2008. Disponível em: https://www1.cfc.org. br/sisweb/SRE/docs/RES_1137.pdf. Acesso em: 13 mar. 2022. CARVALHO, M. Manual de direito administrativo. Salvador: JusPODIVM, 2020. HADDAD, R. C.; MOTA, F. G. L. Contabilidade pública. Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração / UFSC. Brasília : CAPES UAB, 2010. Disponível em: https://forumturbo.org/wp-content/uploads/ wpforo/attachments/16228/1057-Livro-Contabilidade-Governamental. pdf. Acesso em: 13 mar. 2022. INTERNATIONAL FEDERATION OF ACCOUNTANTS (IFAC). Governance in the Public Sector: a governing body perspective. New York: IFAC, 2001. Disponível em: https://www.ifac.org/system/files/ publications/files/study-13-governance-in-th.pdf. Acesso em: 13 mar. 2022. KOHAMA, H. Contabilidade pública: teoria e prática, 15. ed. São Paulo: Atlas, 2016. LIMA, S. C. de; MUNIZ, J. A. Contabilidade pública. São Paulo: ATLAS, 2016. Contabilidade Pública 56 PISCITELLI, R. B; TIMBÓ, M. Z. F. Contabilidade pública: uma abordagem da administração financeira pública. 12. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A, 2012. SILVA, J. A. F. da. Contabilidade pública. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método: 2015. SOBRINHO, M. F. Orçamento e custos na administração pública. São Paulo: Editora Senac, 2021. SOUZA, R. G. de; et. al. O regime de competência no setor público brasileiro: uma pesquisa empírica sobre a utilidade da informação contábil. Artigos. Rev. contab. finanç. 24 (63), dez 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rcf/a/rh4pZ6t7ywhN4zVyzSsxP3R/?lang=pt. Acesso em: 13 mar. 2022. Contabilidade Pública _Hlk98747775 _Hlk98747828 _Hlk98748315 O que é Administração Pública Quem é a Administração Pública? Administração direta Administração indireta Princípios da Administração Pública Contabilidade Pública e sua história no Brasil A Contabilidade Pública História da Contabilidade Pública Princípios, objeto, objetivo e aplicação da Contabilidade Pública Princípios da Contabilidade Pública Objeto da Contabilidade Pública Objetivo da Contabilidade Pública Campo de aplicação da Contabilidade Pública Regime contábil e exercício financeiro da Administração Pública Regime contábil Regime de caixa Regime de competência Exercício financeiro da Administração Pública
Compartilhar