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AULA 8 - A QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO BRASIL

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1 
 
CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA 
DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 
 
 
CURSO: GEOGRAFIA DISCIPLINA: GEOGRAFIA URBANA DO BRASIL 
 
CONTEUDISTAS: MARCELO WERNER DA SILVA e MARCUS VINICIUS S. 
GOMES 
 
Aula 8 
A QUESTÃO DA HABITAÇÃO NO BRASIL 
 
META 
 
Nessa aula você poderá compreender a questão da habitação ou moradia no 
Brasil, discutindo-se as principais políticas habitacionais realizadas no país e 
suas principais características. Para isso é importante também entender a 
questão da pobreza urbana e como historicamente há a permanência dos tipos 
de moradia excludentes, como são os cortiços e favelas, exemplos de 
desigualdade ainda presentes nas cidades brasileiras. 
 
OBJETIVOS 
 
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: 
 
1. Compreender a pobreza urbana e a concepção dos dois circuitos da economia 
urbana; 
2 
 
2. Compreender, as formas urbanas “cortiço” e “favela” como manifestações 
históricas das desigualdades socioespaciais nas cidades brasileiras; destacando 
o Rio de Janeiro como exemplo; 
3. Compreender o histórico das políticas públicas brasileiras para a habitação 
social. 
 
INTRODUÇÃO 
 
É preciso iniciar destacando que a moradia é, ou ao menos deveria ser, um 
direito social de todas as pessoas. De acordo com a Constituição Federal de 
1988, um dos direitos sociais previstos no artigo 6º é o da moradia (BRASIL, 
1988). Esse mesmo direito consta na Declaração Universal dos Direitos do 
Homem, feita pela ONU (Organização das Nações Unidas). Portanto é um direito 
que diz respeito ao indivíduo. Já o direito à habitação, “incide sobre um bem 
imóvel como instrumentalização do direito à moradia” (SOUZA, 2012). 
 
Mas sempre a habitação na perspectiva de um “problema” social, da 
conscientização da existência de um déficit habitacional. Mas haveria um 
problema habitacional? Por que com toda a tecnologia disponível não é resolvido 
esse problema? O que fica claro é que a produção capitalista dá conta da 
demanda solvável (a que tem condições de pagar), mas não atende aos que não 
dispõe de recursos para pagar os altos custos envolvidos em sua construção. 
 
Portanto fica claro que a principal razão para que existam tantas moradias 
precárias nas cidades brasileiras e inclusive pessoas em situação de rua, é a 
questão econômica, pois a desigualdade social, conforme visto na aula passada, 
pressupõe a existência do fenômeno da pobreza urbana. 
 
Portanto vamos analisar o fenômeno da pobreza urbana e a formulação de Milton 
Santos chamada de “dois circuitos da econômica urbana”, que reflete a 
existência da própria pobreza urbana. 
 
3 
 
Depois, na questão da habitação propriamente dita, veremos como 
historicamente foi tratada a existência das favelas e cortiços e as políticas 
públicas voltadas à habitação que foram adotadas de meados do século XX até 
os dias atuais, sem resolver o problema habitacional, conforme veremos. 
 
 
1. Porque há tantos pobres nas cidades brasileiras? 
 
Milton Santos tem um livro apenas para discutir esse problema que parece 
insolúvel, o da pobreza urbana nos países subdesenvolvidos (SANTOS, 2009). 
Em um primeiro momento os cientistas sociais a explicaram pelo êxodo rural, 
que carreou grandes massas populacionais para as cidades, sobretudo nos 
países subdesenvolvidos e principalmente durante o século XX. 
 
Uma outra possível explicação seria a formação de populações marginalizadas, 
que não teriam ocupação por fazerem parte de um exército industrial de reserva, 
conceito criado por Marx. Já outros preferem chamar a atenção para a existência 
de uma superpopulação, ou seja, a existência de uma quantidade de pessoas 
“descartáveis” e que deveriam ser eliminadas ou responsabilizadas, social e 
economicamente, por sua inutilidade” (SANTOS, 2009, p. 36). 
 
Boxe Explicativo 
 
O exército industrial de reserva, conforme detalhado por Karl Marx, “...diz 
respeito à parcela da população trabalhadora que não está empregada pelo 
capital (seja ele industrial, comercial ou bancário) ou por instituições acessórias 
que o legitimam (como o Estado, as Forças Armadas, as ONGs, os sindicatos) 
e está disponível a ele para ser eventualmente empregada (em diferentes graus 
de disponibilidade) conforme a demanda do capital e de suas instituições 
acessórias por força de trabalho” (GRANATO NETO; GERMER, 2013, p. 163-
164). Também chamado de superpopulação relativa, sua existência faz com que 
o custo da mão-de-obra baixe, evitando o aumento de salários que ocorreria se 
todos tivessem empregos. 
 
4 
 
Final do boxe explicativo 
 
 
Das muitas explicações que foram levantadas, Milton Santos prefere partir do 
fenômeno da modernização da economia. Citando Paul Singer, professor do 
curso de economia da USP e autor de vários livros sobre economia, o autor fala 
que muitas vezes o emprego ocasiona o desemprego. Longe de ser apenas um 
jogo de palavras, isso significa que onde haviam três ou mais trabalhadores, 
surge um novo emprego, muitas vezes não acessível a esses antigos 
trabalhadores, devido à (falta de) qualificação. Porém o conceito de exército 
industrial de reserva parece obsoleto nas novas condições da modernização, 
principalmente nos países subdesenvolvidos. Isso porque ao lado de uma 
economia moderna surge outra, fazendo com que a cidade deixe de ser um todo 
maciço e funcione com dois subsistemas, um circuito inferior e o outro circuito 
superior da economia urbana (SANTOS, 2009, p. 43). 
 
O circuito superior da economia urbana origina-se da modernização tecnológica 
e seus elementos mais representativos são os monopólios. Como suas sedes 
geralmente estão em outros países ou outras regiões do pais o essencial de suas 
relações está fora da cidade/região (SANTOS, 2004). Trata-se de uma economia 
que demanda mais capital e que tem comunicações com uma economia 
globalizada. 
 
Já o circuito inferior da economia urbana engloba atividades de pequena 
dimensão, interessando principalmente às populações pobres. Encontra-se bem 
enraizado nas escalas local e regional, mantendo relações privilegiadas com a 
região. Compreende desde fabricações tradicionais, como artesanato, passando 
por transportes tradicionais e prestação de serviços (SANTOS, 2004). 
 
Na teoria dos dois circuitos da economia urbana é importante destacar que os 
dois subsistemas não são estanques. Eles dialogam e são mutuamente 
complementares. Há uma relação entre a renda das famílias e o tipo de consumo 
que realizam. As classes ricas consomem quase tudo do tipo moderno (consumo 
em shopping-centers, por exemplo, portanto do circuito superior da economia 
5 
 
urbana) e muito pouco do tipo não-moderno (circuito inferior da economia 
urbana). Já as classes médias aumentam um pouco a proporção de consumo do 
tipo não-moderno e diminui do consumo moderno. Já as classes pobres 
consomem sobretudo do tipo não-moderno (SANTOS, 2004, p. 42). 
 
É importante destacar que para Milton Santos o circuito inferior não se limita ao 
que tradicionalmente se chama de economia informal, apesar desta participar do 
circuito inferior. Peguemos, por exemplo, um shopping popular. Há diversos tipos 
de mercadorias a venda. Algumas são fabricadas em pequenas fabriquetas 
domésticas de fundo de quintal, muito comuns na fabricação de vestuário. Outras 
mercadorias são provenientes de fábricas de outros países, sobretudo da China 
e vendidas para a população de baixa renda, muitas vezes produtos “genéricos”, 
as vezes com pouca diferença dos produtos de “marca”. 
 
Portanto o conceito da existência dos dois circuitos da economia urbana ajuda-
nos a entender como os pobres sobrevivem em uma economia cada vez mais 
centrada no circuito superior da economia, mas que pela falta de renda dessas 
populações empobrecidas levam à permanência de um circuito inferior voltado 
ao consumo dessaspopulações. 
 
ATIVIDADE 1 (atende ao objetivo 1) 
 
Um shopping center e um shopping popular pertencem a que circuito da 
economia urbana? Justificar. 
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
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_______________________________________________________________
_______________________________________________________________ 
 
6 
 
Resposta comentada: 
 
A forma shopping center pertence ao circuito superior, com marcas famosas e 
franquias de marcas famosas, ainda que existam pequenas negócios na forma 
de quiosques, que podem ser atribuídos ao circuito inferior. Já em um shopping 
popular podem haver estabelecimentos do circuito superior, mas a maior parte, 
por uma questão de escala do empreendimento pertencem ao circuito inferior da 
economia urbana. 
 
Final da resposta comentada 
 
 
2. Cortiços no Rio de Janeiro: final do século XIX e início do XX 
 
A existência da pobreza urbana não é fenômeno recente. Para o entendimento 
da persistência do fenômeno da desigualdade socioespacial nas cidades 
brasileira, examinaremos como foram vistos, historicamente, os fenômenos da 
habitação precárias das metrópoles brasileiras, como foram os cortiços e as 
favelas, tomando como exemplo a então capital brasileira, o Rio de Janeiro. 
 
O Rio de Janeiro, no final do século XIX e início do século XX, era uma cidade 
que crescia conjuntamente com a construção de sua rede de transporte. Se, de 
um lado, a ferrovia proporcionava o surgimento dos primeiros loteamentos 
suburbanos, do outro tínhamos o bonde como vetor importante de formação de 
alguns bairros das atuais Zona Norte (especialmente a Tijuca) e Zona Sul da 
cidade carioca. Aliado a esse processo de expansão horizontal havia um gradual 
crescimento populacional, que se acentuou na última década do século 
oitocentista, notadamente pela grande chegada de imigrantes europeus e ex-
escravos oriundos da decadente zona cafeeira fluminense (ABREU, 2006). 
 
Enfim, o rápido crescimento populacional aliado ao desenvolvimento técnico do 
espaço urbano carioca foram processos importantes para entender uma 
dinâmica comum à produção capitalista das cidades: uma estruturação urbana 
segregada. 
7 
 
 
O que se quer dizer aqui é que a expansão horizontal da cidade também marcou 
uma estratificada distribuição de classes por diferentes partes do espaço urbano. 
Como bem nos mostra a história carioca, os bairros da Zona Sul que cresciam 
pela construção da rede de bondes passaram a ser ocupados pelas classes mais 
abastadas. Já aquelas classes que rumavam para os primeiros loteamentos 
suburbanos eram as mesmas que podiam, minimamente, pagar dia a dia o valor 
da passagem ferroviária, não se configurando assim no estrato mais 
pauperizado do Rio de Janeiro. 
 
Quem seriam então as classes que viriam a morar nas habitações coletivas da 
época? 
 
Alguns daqueles mesmos imigrantes europeus (italianos, espanhóis e 
portugueses) e especialmente os ex-escravos que vinham da decadente zona 
cafeeira fluminense. Para esses grupos, a prática da “viração” (trabalho informal 
e temporário) era a mais importante forma de obter sustento. Para tanto, a 
relação moradia-trabalho era vista quase como orgânica, não havendo a 
possibilidade de pensar no transporte como meio de articulação entre esses dois 
espaços (VAZ, 1985). 
 
Dessa maneira que se acentua a crise habitacional: quando as habitações 
disponíveis passam a ser ocupadas por mais habitantes; à medida, porém, que 
aumenta o número de moradores por prédio, reduzem-se suas condições de 
conforto e mesmo de habitabilidade. 
 
Neste contexto, então, se multiplicam as habitações coletivas e as moradias 
adaptadas, precárias e provisórias. O acúmulo de moradores sem uma 
correspondente ampliação da infraestrutura e dos serviços urbanos básicos, faz 
com que se tornem críticas as condições de higiene – tanto em termos restritos, 
casa a casa, quanto em termos mais amplos, em toda a cidade. Há ainda um 
agravante: dos prédios existentes, que poderiam servir para moradia, muitos 
passam a ser ocupados pelas novas atividades fabris e de serviços, reduzindo 
ainda mais a oferta de habitações (VAZ, 1985, p.49). Portanto, a população 
8 
 
trabalhadora mal alojada em habitações coletivas superlotadas e de aspecto 
insalubre, é a imagem mais conhecida da crise. 
 
E esse não foi um fenômeno só verificado no Brasil; em outras partes do mundo, 
como nas já grandes capitais europeias do começo do século XIX, a multidão 
aglomerada em habitações superlotadas sempre fora associada a duas 
ameaças potenciais: da propagação de epidemias e da convulsão social, uma 
vez que a concentração tendia a se tornar incontrolável. Para evitar estes 
desastres potenciais, uma atitude comum era eliminar as aglomerações de 
habitações insalubres, embora se reduzisse desta maneira, a disponibilidade de 
moradias. Apesar disso, e mesmo para atender às imposições da produção e 
circulação de mercadorias, iniciam-se as renovações urbanas. O processo de 
renovação quer sejam drásticos e rápidos, conduzidos pelo Estado, quer seja 
lento, intermitentes e de pequeno alcance, realizados pelas empresas de 
construção civil, contribuem para a destruição do parque imobiliário existente, 
justamente aquele que comporta as moradias cujo preço e localização são 
acessíveis aos trabalhadores. Estes processos vão contribuir para a reprodução 
da crise da moradia (VAZ, 1985, p.50). 
 
O instável e reduzido poder aquisitivo das classes trabalhadoras é o que torna 
estrutural a crise da habitação no modelo capitalista. Segundo Pechman (1985, 
p.35), há que se considerar ainda a própria característica do setor de construção 
de habitações, cujo desenvolvimento se depara com obstáculos específicos nas 
esferas da produção e da circulação – que impedem o atendimento da demanda 
sempre existente. 
 
Mas, afinal, o que eram os cortiços do século XIX? 
 
As habitações coletivas foram uma marca registrada na paisagem do Rio 
oitocentista, que seria fruto da crise habitacional que assolou a cidade nesse 
período. Com efeito, a necessidade de moradias para o crescente contingente 
populacional, a disponibilidade limitada de térreos e sobrados, e a possibilidade 
de obtenção de bons rendimentos por parte dos proprietários de prédios e 
9 
 
terrenos existentes, são alguns dos fatores que fizeram com que se difundissem 
tais habitações pelo tecido urbano carioca (SANTOS, 2012). 
 
Aliás, eram chamados de cortiços as moradias coletivas, permanentes, pobres 
e em condições discutíveis de salubridade. O uso do termo se generalizou, 
muitas vezes confundindo as suas principais formas arquitetônicas. 
 
O termo cortiço tem forte conteúdo ideológico e assume diferentes sentidos no 
tempo. Cronistas e técnicos da época, e o autor romancista Aluisio Azevedo, no 
grande clássico “O Cortiço”, utilizam indistintamente outros substantivos, como 
estalagem. 
 
 
Figura 8.1: MALTA, AUGUSTO. Superlotação e péssimas condições sanitárias em um cortiço. 
Estalagem com entrada pelo número 47. Visconde do Rio Branco, c. 1906 
Fonte: KOK, 2005, p. 30. 
 
Segundo Vaz (1985, p.76), o cortiço se identifica a partir do modelo arquitetônico 
da estalagem. Aparentemente, segundo a autora, seriam a mesma coisa; mas 
ao atentar a vários detalhes, verificamos as diferenças. O critério de 
diferenciação é bem simples; não passa de uma avaliação do observador sobre 
as condições gerais de moradia. Como aponta a autora, “aquele em que as 
condições forem inferiores,é o cortiço.” 
10 
 
 
 
Figura 8.2: MALTA, Augusto. Um cortiço visto por dentro. Barracão de madeira componente da 
estalagem existente nos fundos dos prédios nos 12 e 44 da rua do Senado, 27.3.1906. 
Fonte: KOK, 2005, p. 29. 
 
Pode-se dizer que as condições sociais dos moradores e as más condições de 
habitabilidade eram o elemento de diferenciação das habitações coletivas. 
 
Portanto, as habitações coletivas vão se distinguir dos demais térreos e sobrados 
por características decorrentes de sua produção, pois as primeiras são, 
geralmente, construções em série, que utilizam ao máximo a possibilidade de 
aproveitamento do espaço, empregando materiais de qualidade inferior aos 
tradicionais, dentre outros fatores que resultam a sua barateza, fragilidade e 
precariedade, suas reduzidas dimensões e a deficiência, a insuficiência ou 
mesmo a inexistência dos sistemas de água e esgoto. Deste modo, este espaço 
construído terá efeitos prejudiciais sobre as condições de vida da população 
moradora (VAZ, 1985, p.80). 
 
E quem produzia estes espaços? 
 
A forma predominante que assume a produção imobiliária empreendida pelo 
pequeno capital mercantil é a transformação dos antigos imóveis situados no 
11 
 
centro da cidade, anteriormente ocupados por grandes comerciantes, em “casas 
de cômodo” e a construção de moradias precárias em terrenos vagos também 
nesta área (RIBEIRO, 1997, p. 204-205). 
 
Para tanto, o “corticeiro” procura investir o mínimo possível e aproveitar ao 
máximo o terreno, o que explica a razão pela qual as moradias assumirão a 
forma de habitações coletivas e se caracterizarão pela precariedade e pela falta 
de higiene (BACKHEUSER apud RIBEIRO, 1997, p.205). 
 
São, portanto, os proprietários rentistas, pessoas pertencentes às classes 
dominantes, entre nobres, grandes comerciantes, profissionais liberais, e até 
entidades religiosas. Estes constroem habitações precárias com o mínimo de 
capital e máximo aproveitamento do terreno e que impõem aos inquilinos a 
compra de mercadorias em seu estabelecimento comercial, mercadorias estas 
que são compradas por preços mínimos e vendidas por preços máximos, com 
adulteração de sua qualidade, volume e peso. Para tanto, o “taberneiro” suborna, 
sonega e “explora barbaramente os seus empregados” (RIBEIRO, 1997, p. 207). 
 
Dentre alguns fatores que tornaram possível a produção rentista de moradia, o 
fluxo migratório ocorre em um momento da economia agroexportadora do 
Estado do Rio de Janeiro que não desemboca num processo de industrialização. 
Na cidade se concentrava uma população de tamanho considerável, em 
proporção bem superior às limitadas necessidades das empresas industriais e 
de serviços. Outro importante fator é que os “corticeiros” desfrutam de uma 
situação de monopólio muito favorável à produção rentista, já que pela 
precariedade dos transportes na cidade, esta população tem que 
obrigatoriamente morar próximo das fontes de emprego (RIBEIRO, 1997, p. 209-
211). 
 
O cortiço segue sendo destaque na questão habitacional até o final do século 
XIX, sobretudo pelas inúmeras críticas que recebia por seu aspecto insalubre, 
gerando uma série de discursos que pregavam a eliminação desse tipo de 
moradia, que para Abreu (1986, p.48), eram basicamente dois: 
 
12 
 
1º) O discurso de cunho higienista, frequentemente observado sob o motivo de 
apontarem o cortiço como epicentro mais comum dos mais variados tipos de 
epidemias. Este discurso pode ser visto nos inúmeros relatórios da época 
(ABREU, 1986, p.49). 
 
2º) O segundo discurso é aquele que apontava o cortiço como “foco em 
potencial de agitações populares”, por concentrar um grande número de 
trabalhadores em um único espaço. Este último discurso de perseguição às 
chamadas “classes perigosas” era visto, sobretudo, nas entrelinhas do discurso 
oficial. 
 
Porém essas mesmas habitações insalubres e acumuladoras das chamadas 
“classes perigosas” e que eram alvo das campanhas erradicadoras, também 
eram grande fonte de lucro dos seus respectivos donos. O seu combate poderia 
se tornar fatal em termos políticos, tamanhos eram as implicações e os 
interesses envolvidos. 
 
Ainda assim, mediante negociações e tensões políticas, além de certas 
mudanças legislativas, muitos cortiços foram eliminados nas últimas décadas do 
século XIX, especialmente nos anos 1890, quando o célebre “Cabeça de Porco” 
(um símbolo por ser o maior cortiço da cidade) foi demolido na gestão municipal 
de Barata Ribeiro (Figura 8.3). 
 
13 
 
 
Figura 8.3: Charge de fins do século XIX ilustrando a demolição do cortiço Cabeça de Porco, 
que acontecera na administração do então prefeito Barata Ribeiro 
 
A chamada “Reforma Passos”, que já abordamos na aula 2, resultou em uma 
sucessão de demolições que tinha sob justificativa a remodelação da cidade, 
continuando com a política de erradicação de cortiços do centro da cidade do 
Rio de Janeiro. 
 
Nomeado para o cargo de prefeito na gestão presidencial de Rodrigues Alves 
(1902-1906), Pereira Passos, comandou, no curto espaço de quatro anos um 
amplo programa de reforma urbana. Decretos, leis, regulamentos e outros 
aparatos legais baixados pelo Prefeito, proibiam quaisquer que fossem as obras 
de reformas nos cortiços, impedindo a realização de melhorias naqueles 
existentes. Havia, de fato, um controle sobre a forma de habitar (ABREU, 2006). 
 
14 
 
O processo de eliminação de cortiços se estendeu ao longo de todos os anos 
novecentos e do século XX. Porém mesmo assim ocorre de encontrarmos, na 
paisagem carioca e em muitas cidades do Brasil, a permanência de habitações 
coletivas precárias nas mesmas áreas encortiçadas de outros séculos, tal como 
nos mostra a figura 8.4. 
 
 
Figura 8.4 – Cortiço em São Paulo/SP. Fotografia tirada em 2005. 
Original em: https://www.flickr.com/photos/black_wall/559107857 (Foto: Guilherme 
Appolinário) 
 
Se permanecem os cortiços, como podemos entender essa outra forma de 
habitação precarizada que é a favela? Tal como o cortiço a favela tem de ser 
vista, simultaneamente, como solução habitacional e manifestação da 
desigualdade socioespacial nas paisagens das cidades brasileiras. O olhar de 
quem as vê como um “problema social” a ser extirpado da cidade foi, também, 
historicamente construído. É o que veremos a partir de agora, o processo de 
surgimento e expansão inicial das favelas, tomando, igualmente, a cidade do Rio 
de Janeiro como exemplo. 
15 
 
 
 
3. Favela: da gênese à expansão inicial no Rio de Janeiro 
 
Há 120 anos que a favela vem ocupando um lugar de destaque na pauta de 
debates sobre as cidades brasileiras. E isso não acontece de forma consensual. 
À favela são associadas várias imagens contrastantes (figura 8.5), que 
produzem-na como imagem principal de diversas metrópoles, especialmente a 
carioca. 
 
Figura 8.5 – Imagens contrastantes da favela: de paisagem associada ao medo (Paraisópolis, 
São Paulo /SP) a cartão postal (Vidigal, Rio de Janeiro /RJ). 
Original em: https://www.flickr.com/photos/alevieira/3250444893 (Foto: Alex Vieira) & 
http://migre.me/wnUD6 (Foto: Daniel Filipe) 
 
Apesar da relevância que os cortiços ainda tenhamos no paisagem urbana de 
muitas cidades, definitivamente não podemos esquecer: hoje a favela se 
constitui como forma de habitação popular mais difundida no território carioca e 
no Brasil. 
 
Veja só um exemplo: ainda no início dos anos 1990, existiam na cidade do Rio 
de Janeiro 545 favelas, que abrigavam cerca de 1.100.000 habitantes. Alguns 
dados mais recentes apontam para um crescente aumento da população 
vivendo em favelas nas cidades brasileiras, revelando a importância dessa 
16 
 
solução habitacional, que em 2017 já está completando cento e vinte e cinco 
anos de existência. 
 
Apesar de tão antiga, mantem-se a responsabilização da favela pelos problemas 
das cidades, assimcomo o desejo de sua eliminação. Ou seja, observamos a 
permanência de um discurso que indica que as favelas seguem sendo um 
grande obstáculo a ser superado pelas políticas públicas. 
 
Mauricio de Almeida Abreu (1994) aponta para o desconhecimento em relação 
a origem e ao processo de expansão inicial da favela. Segundo este autor, a 
origem do desconhecimento pode ser atribuída a dois fatores: de um lado, à 
dificuldade de obtenção de informações; de outro à grande difusão que tiveram 
dois importantes trabalhos divulgados nos anos sessenta1, e que sustentaram, 
equivocadamente, que só a partir de 1940 é que a favela teria passado a "chamar 
atenção", isto é, teria se tornado um elemento importante da estrutura urbana 
carioca. 
 
O erro acima pode ser explicado. Até 1930, a favela existe de fato, mas não 
juridicamente. Estava presente no tecido urbano, mas ausente das estatísticas 
e dos mapas da cidade; não sendo individualizada pelos recenseamentos. É 
considerada como uma solução habitacional provisória e ilegal, razão pela qual 
não faria sentido descrevê-la, estudá-la, mensurá-la. Para os poderes públicos, 
as favelas simplesmente não existiam (ABREU, 1994, p. 34). 
 
E quando surge a favela, afinal? 
 
Este primeiro momento data do final do século XIX, período de transição 
importante na história brasileira. Abolida a escravidão em 1888 e proclamada a 
república em 1889, o país vivia ao longo da última década do século, uma série 
 
1 Os trabalhos são: “Sagmacs (Sociedade de Análises Gráficas e Mecano¬gráficas Aplicadas aos 
Complexos Sociais), "Aspectos humanos da favela carioca". Suplemento especial do Estado de São 
Paulo, 13 e 15 de abril de 1960; Lucien Parisse. Favelas do Rio de Janeiro - evolução, sentido. Rio de 
Janeiro, CENPHA, 1969” (ABREU, 1994, p. 44). 
17 
 
de transformações econômicas, políticas e sociais, que embora traumáticas em 
muitos sentidos, viabilizarão a sua integração efetiva à nova ordem internacional 
surgida com o advento da segunda revolução industrial. 
 
Capital do país e principal ponto de articulação do território brasileiro com os 
centros nervosos do capitalismo mundial nessa época, o Rio será o palco 
privilegiado onde se materializarão as pressões que envolviam a República 
nascente, associando-as às tensões já existentes em uma cidade tão antiga. 
(ABREU, 1994). 
 
A favela pode ter a sua origem ligada a já falada crise habitacional e às crises 
políticas advindas com a irrupção da Republica. Dentre essas últimas, duas 
tiveram importância capital: a Revolta da Armada, ocorrida em 1893-1894, e a 
campanha militar de Canudos, que se prolongou de 1896-1897. Desde a Revolta 
da Armada que o Governo vinha enfrentando o problema do alojamento de 
soldados no Rio de Janeiro. Para resolver esta situação, ordens foram expedidas 
autorizando a ocupação do convento de Santo Antônio (localizado no morro do 
mesmo nome) por militares. Não tendo sido as acomodações suficientes, foi 
permitida a construção, numa das encostas desse mesmo morro, de diversos 
barracões de madeira (ABREU; VAZ, 1994) (CAMPOS, 2005). 
 
No que diz respeito à gênese da favela da Providência, também em 1893-1894, 
começaram a ser construídos barracões naquele morro. A autora Lílian Fessler 
Vaz (1985) afirma que, logo após a destruição do Cabeça de Porco, o grande 
cortiço que se localizava precisamente no sopé desse morro, um de seus 
proprietários, dono também de terrenos na encosta, autorizou a ocupação da 
mesma, cobrando dos antigos inquilinos o direito de ali construírem casebres. 
Desde então, estava ali instituído aquele que seria o elemento emblemático na 
paisagem carioca naquele período e que o jornal Correio da Manhã (1902) viria 
a identificar como: “uma vergonha para uma capital civilizada (...) perigoso sítio 
que a voz popular denominou morro da Favela”. 
 
 
 
18 
 
Boxe explicativo 
 
“Favela é um arbusto típico da caatinga nordestina e muito abundante no sertão 
de Canudos. Lá havia inclusive um morro com esse nome. Seja porque o morro 
da Providência se assemelhava ao morro existente em Canudos, seja porque os 
soldados ali encontraram (ou construíram) algo que lhes recordava Canudos, a 
verdade é que o morro da Providencia logo passou a ser conhecido na cidade 
como morro da Favela” (ABREU, 1994, p. 45). 
 
Final do boxe explicativo 
 
Foi realmente a partir do morro da Providência que o termo favela incorporou-se 
ao cotidiano da cidade. Aliás, as descrições acerca do morro da Favela foram 
sempre carregadas de significados negativos e alusões pejorativas. Comumente 
evidenciada em arquivos policiais, a socióloga Licia do Prado Valladares (2005) 
diz que o Morro da Favela não apenas concentra todas as atenções neste 
sentido, como suscita iniciativas por parte das autoridades, tais como a 
campanha de saneamento de 1907, sob a direção de Oswaldo Cruz. 
 
A partir da “Reforma Passos”, é que o déficit habitacional, que já era grande na 
cidade, aumentou ainda mais. Sob a ação conjunta da Prefeitura (que alargava 
ruas e abria novas avenidas) e do governo federal (que construía o porto do Rio 
de Janeiro e seus eixos viários complementares e movia intensa campanha de 
controle do mosquito transmissor da febre amarela, investindo com furor sobre 
as habitações coletivas), a cidade viu desaparecer, em curto espaço de tempo 
boa parcela de sua área urbana central (ABREU, 1994). 
 
A Reforma Passos além de uma nova fisionomia para a cidade do Rio de Janeiro. 
Ao lado de grandes avenidas e prédios suntuosos, também trouxe uma 
quantidade apreciável de barracos de madeira erguidos nas encostas dos 
morros da área central. 
 
Já nessa época elas apresentam não apenas a localização nas encostas dos 
morros da cidade, mas também a proximidade de importantes fontes de 
19 
 
emprego, tanto no centro como nos bairros residenciais. A partir da década de 
1920, a expansão das favelas tornar-se-ia multidirecional e incontrolável. 
 
Embora modesta do ponto de vista estatístico, essa expansão trouxe visibilidade 
à favela no campo do social e da caracterização do espaço da cidade (a 
representação dos “morros”). É, também, neste contexto que a denominação 
"favela" foi generalizada para os aglomerados de casebres que se tornaram cada 
vez mais visíveis nos morros cariocas (ABREU,1994). De fato, inicia-se aí a sua 
“problematização”, assumindo os contornos de um problema social, embora 
envolvida ainda com a perspectiva higienista. 
 
E foi assim durante todo o século XX. A todo o processo de expansão das favelas 
houve perseguição traduzidos nos mais diversos tipos de remoções. Mas o que 
explica a manutenção da favela na paisagem carioca e nas demais cidades do 
Brasil? 
 
A permanência e difusão da favela no cenário carioca deve ser entendida pela 
ausência de políticas habitacionais, de sua aceitação nos discursos oficiais, mas, 
sobretudo, como a materialização de uma verdadeira luta que os grupos mais 
pobres do Rio de Janeiro travaram no início do século pelo direito à cidade, uma 
luta que, na realidade, mantêm-se. 
 
Desde o seu surgimento à sua expansão pelo tecido urbano carioca a favela é 
alvo de múltiplos discursos, políticas, representações e significações que se 
contrapõem à sua presença nas paisagens urbanas brasileiras. 
 
Portanto, isso nos leva a entender que ao longo de parte significativa do século 
XX a favela será associada a um tipo de habitação temporária, o que de fato é 
visto inclusive no que se refere ao material utilizado para construção das 
moradias. A sua gradual aceitação se dá pela sua expansão e sucessivo 
adensamento, o que impossibilitava mais e mais a sua erradicação definitiva. 
Incremente a isso boas doses de resignação política e social e pressões de 
determinadas camadas da sociedade. 
 
20 
 
Figura 8.6 – Vista aérea da Rocinha(Rio de Janeiro / RJ), que se configura como a maior favela 
brasileira com cerca de 70.000 habitantes segundo o último censo do IBGE. 
Original em: https://www.flickr.com/photos/andreasnilsson1976/375995825 (Foto: Andreas 
Nilsson) 
 
ATIVIDADE 2 (Atende ao objetivo 2) 
 
Que paralelos podemos estabelecer entre as formas de moradia cortiço e favela? 
 
Resposta comentada 
 
Ambas são formas de moradia precárias, alternativas de sobrevivência da 
população de baixa renda. Os cortiços ainda existem, mas eram mais comuns 
no final do século XIX e início do século XX, pelo deslocamento das classes mais 
ricas do centro envelhecido, buscando novas alternativas habitacionais em 
bairros que iam se formando pelo incipiente capital imobiliário. Como eram casas 
grandes, os proprietários os alugavam para várias famílias, formando os cortiços. 
Já as favelas começaram no mesmo período também como alternativa para 
famílias de baixa renda, que no sistema de autoconstrução iam construindo 
moradias precárias, muitas vezes simples barracos. Tal sistema foi se ampliando 
21 
 
a ponto de hoje ser a principal alternativa para a população da baixa renda nas 
cidades grandes e médias do pais. 
 
Fim da Resposta comentada 
 
 
3. Histórico das políticas de habitação no Brasil 
 
Com a discussão anterior sobre os cortiços e favelas brasileiras e especialmente 
da cidade do Rio de Janeiro, mostramos quão antiga é a questão habitacional 
no país. É importante destacar que as políticas de habitação no pais entre o final 
do século XIX e início do século XX foram marcadas pela política higienista de 
intervenções nas maiores cidades do pais para a remoção de cortiços e favelas. 
“As iniciativas tomadas pelos governos da República Velha (1889-1930) no 
sentido de produzir habitação ou de regulamentar o mercado de locação 
residencial são praticamente nulas” (BONDUKI, 1994, p. 712), isto pela filiação 
ao “...liberalismo predominante, o Estado privilegiava a produção privada e 
recusava a intervenção direta no âmbito da construção de casas para os 
trabalhadores” (ibid). 
 
Nos anos 1930, com a chamada “Revolução de 30” e a ascensão ao poder de 
Getúlio Vargas, abre-se um novo período, em que se rompe com a política da 
“República Velha” e sua conciliação com as classes agroexportadoras. Há uma 
maior valorização da cidade e se inicia a industrialização do pais. Getúlio Vargas 
busca mediar a relação capital e trabalho, introduzindo diversas políticas 
voltadas à classe trabalhadora, dentro as quais estava uma política habitacional, 
que era visto como um grande problema, pois boa parte da renda dos 
trabalhadores era utilizada no pagamento de aluguéis. Aqui entra como grande 
iniciativa e polêmica implementação, a Lei do Inquilinato de 1942, que congela 
os alugueis, relativizando o direito de propriedade (BONDUKI, 1994). 
 
Entra em cena então o Estado e a centralização da atividade econômica do país 
nas atividades urbano-industriais leva à que sejam consideradas um novo tipo 
de ator social, as massas populares urbanas. “A intervenção do Estado na 
22 
 
questão habitacional teve o duplo sentido de ampliar a legitimidade do regime e 
viabilizar uma maior acumulação de capital no setor urbano através da redução 
do custo de reprodução da força de trabalho” (BONDUKI, 1994, p. 717). 
 
Apesar de certo consenso social de que a questão da habitação aos 
trabalhadores não poderia ser enfrentada através da iniciativa privada, sendo 
necessária a intervenção estatal, iniciativas como a lei do inquilinato geram 
escassez da produção de moradias para aluguel e aumento nos alugueis novos, 
levando a um resultado contrário ao pretendido (BONDUKI, 1994, p. 718-722). 
 
É neste contexto que são criados os Institutos de aposentadoria e pensões 
(IAPs), voltados para grupos específicos de trabalhadores (ver boxe). Esses 
institutos, controlavam imensos recursos, sem destinação imediata, pois eram 
para o futuro pagamento de aposentadoria e pensões. Esses recursos então 
foram destinados à construção de conjuntos habitacionais para as categorias 
profissionais de cada IAP (BONDUKI, 1994, p. 725). 
 
Outra iniciativa foi a criação da Fundação da Casa Popular, de 1946, durante o 
governo Dutra. Essa proposta tinha objetivos muito amplos, que acabaram 
contribuindo com seu fracasso (tinha como objetivos financiar, além de moradia, 
infra-estrutura, saneamento, indústria de material de construção, pesquisa 
habitacional e até mesmo a formação de pessoal técnico dos municípios) 
(BONDUKI, 1994, p. 718). 
 
Boxe Explicativo 
 
As Caixas de Aposentadoria e Pensões instituídas pela chamada Lei 
Elói Chaves, de janeiro de 1923, beneficiavam poucas categorias 
profissionais. Após a Revolução de 1930, o novo Ministério do Trabalho 
incorporou-as e passou a tomar providências para que essa garantia 
trabalhista fosse estendida a um número significativo de trabalhadores. 
Dessa forma, foi criado o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos 
Marítimos (IAPM) em junho de 1933, ao qual se seguiram o dos 
Comerciários (IAPC) em maio de 1934, o dos Bancários (IAPB) em 
julho de 1934, o dos Industriários (IAPI) em dezembro de 1936, e os 
de outras categorias profissionais nos anos seguintes. Em fevereiro de 
1938, foi criado o Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores 
do Estado (IPASE). A presidência desses institutos era exercida por 
pessoas livremente nomeadas pelo presidente da República. 
23 
 
Após 1945, os Institutos de Aposentadoria e Pensões expandiram suas 
áreas de atuação, que passaram a incluir serviços na área de 
alimentação, habitação e saúde. Essa ampliação de funções, porém, 
não foi acompanhada da necessária reformulação da sua gestão 
financeira, o que acarretou sérios problemas posteriormente. A falta de 
um planejamento central foi também responsável por graves 
disparidades na qualidade do atendimento oferecido às diversas 
categorias profissionais. 
Em novembro de 1966, todos institutos que atendiam aos 
trabalhadores do setor privado foram unificados no Instituto Nacional 
de Previdência Social (INPS) (CPDOC/FGV, 2017). 
 
Fim do Boxe Explicativo 
 
Na Tabela abaixo vemos a produção de casas e conjuntos construídos pela 
Fundação da Casa Popular e pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões no 
período de 1937 a 1964, ano em que é criado o Banco Nacional de Habitação 
(BNH), que ficará responsável pela questão habitacional estatal a partir de então. 
 
TABELA 8.1 - PRODUÇÃO HABITACIONAL PÚBLICA IAPS E FCP (1937/1964) 
 
Conjunto 
Habitacional 
Financiamento a 
Construção da casa 
própria 
Total 
Institutos Aposentarias e Pensões 47.789 76,236 124.025 
Fundação da Casa Popular 18.132 - 18.132 
Total (Governo Federal) 65.921 ' 76.236 142157 
Fonte: BONDUKI, 1995, p. 838 
 
Para analisar esses números deve-se considerar que no período anterior nada 
foi construído pelo poder público, sendo, portanto, expressiva a quantidade 
construída. Bonduki, 1995, p. 838-839 acrescenta outros dados: 
 
Uma análise da importância quantitativa da produção estatal deve 
considerar seu peso relativo no atendimento da população. No 
momento de maior intensidade da produção habitacional do período 
populista, em 1950, o país tinha uma população total de 44,9 milhões 
de habitantes; no entanto, destes apenas 16,2 milhões viviam na zona 
urbana e somente 8,7 milhões habitavam em cidades com mais de 50 
mil habitantes, localidades onde o problema habitacional era sentido 
com dramaticidade. Sendo de aproximadamente 6 o número médio de 
pessoas por família em 1950, concluiu-se que as unidades 
habitacionais construídas pelos IAPs e FCP beneficiaram uma 
população equivalente a 10% da população que vivia em 1950 nas 
cidades brasileiras com mais de 50 mil habitantes. O número não é, 
portanto, assim tão inexpressivo, considerando que boa parte de 
estoque existente era constituído de moradias precárias (cômodos de24 
 
cortiço e barracos de favela) e que o poder público também interviu 
ainda a nível municipal e estadual e financiou boa parte da promoção 
imobiliária privada para venda, destinada para a classe média, 
produção que não foi possível quantificar com precisão. 
 
Portanto uma produção significativa. Pequena em relação ao período do BNH, 
que se inicia a seguir, mas expressiva para aquele momento histórico. 
 
O Banco Nacional da Habitação (BNH) 
 
Após o golpe militar de 1964, muda a política chamada por alguns de “populista” 
e tenta-se implantar na questão habitacional a partir de uma ótica técnica, mas 
também tentando agradar as massas ressentidas com o rompimento 
institucional. Nas palavras de Roberto Campos, um dos artífices do plano de 
habitação do regime militar, “...o proprietário da casa própria pensa duas vezes 
antes de se meter em arruaças ou depredar propriedades alheias e torna-se um 
aliado da ordem” (AZEVEDO; ANDRADE, 2011, p. 39-41). 
 
Portanto com a Lei n.° 4.380, de 21 de agosto de 1964, é instituído o Plano 
Nacional de Habitação e criado o Banco Nacional da Habitação e o Serviço 
Federal de Habitação e Urbanismo, abrindo caminho para a nova política 
habitacional (AZEVEDO; ANDRADE, 2011, p. 39). “O BNH inicia suas operações 
ainda em 1964 com capital inicial de 1 milhão de cruzeiros (910 mil dólares, no 
câmbio da época) e receita proveniente de 1% da folha de pagamento dos 
salários de todos os empregados sujeitos ao regime da Consolidação das Leis 
do Trabalho (CLT)” (idem, p. 43). 
 
O modelo BNH representou uma inovação na política habitacional, por tratar-se 
de um banco, prever mecanismos de compensação monetária e articular o setor 
público como financiador principal e o setor privado, executor da política 
(AZEVEDO; ANDRADE, 2011, p. 43). Fazia parte do modelo a ênfase nos 
programas populares, por isso houve a previsão da constituição das companhias 
habitacionais (Cohab) como agentes promotores. “As Cohab, empresas mistas 
sob o controle acionário dos governos estaduais e/ou municipais, 
desempenham, na promoção pública de construção de moradias para os setores 
25 
 
de baixa renda, um papel análogo ao dos incorporadores imobiliários na 
produção de residências para as camadas de renda alta” (AZEVEDO, 1988, p. 
111). 
 
O modelo através das COHABs funcionou como dificuldades, devido à 
inadimplência dos mutuários causada pela política federal de arrocho salarial do 
salário mínimo, afetando, portanto, diretamente às camadas de renda mais 
baixa. Esse quadro começou a melhor a partir de 1975, em que também começa 
o processo de “abertura” política e em que o governo militar procurava 
legitimidade, o que também ocorreu no período inicial do regime militar (1964-
1969) (AZEVEDO, 1988). 
 
Na tabela abaixo podemos verificar os números do período da política 
habitacional comandada pelo Banco Nacional de Habitação (1964-1986). 
 
Tabela 8.2 - Número de financiamentos habitacionais concedidos pelo 
Sistema Financeiro da Habitação (SFH/BNH) - 1964-86 (julho) 
Mercado 
Popular 
Programas 
tradicionais (COHAB) 
1.235.409 27,7% 
Programas 
alternativos¹ 
264.397 5,9% 
Total de Unidades 1.499.806 33,6% 
Mercado 
Econômico 
Cooperativas e outros programas² 788.130 17,6% 
Mercado Médio SBPE³ 1.898.975 42,5% 
Outros programas4 280.418 6,3% 
Total de Unidades 2.179.393 48,8% 
TOTAL DO SFH 4.467.329 100% 
Fonte: Adaptado de Azevedo (1988, p. 117). 
26 
 
Notas: ¹ Programa de Erradicação da Sub-Habitação (Promorar); João-de-Barro (Programa de 
Autoconstrução); Financiamento para Construção, Ampliação e Melhoria da Habitação (Ficam); 
Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados (Profilurb); ² Instituto, Hipoteca, Emp. 
P/PRON., Programa Nacional para o Trabalhador Sindicalizado (Prosin); ³ Sistema Brasileiro de 
Poupança e Empréstimo (SBPE). Dados disponíveis até maio de 1986; 4 Recon 
(Refinanciamento ou Financiamento ao Consumidor de Materiais de Construção); Prodepo 
(Programa de Apoio ao Desenvolvimento de Polos Econômicos). 
 
Analisando a tabela podemos perceber que em seus 22 anos de existência o 
BNH financiou quase 4,5 milhões de unidades, número nada desprezível. Porém 
o atendimento aos setores populares não foi totalmente contemplado, 
representando apenas 33,5% do montante. A impossibilidade crônica dos 
setores populares de enfrentar o pagamento de mensalidades, levou o BNH a 
instituir alguns programas alternativos, baseados em autoconstrução. Porém 
esses programas atenderam 6% do mercado popular e 17,6% para os 
programas especiais (mercado econômico). Porém, quase metade das unidades 
financiadas (48,8%) forma destinadas aos setores de altos rendimentos 
(mercado médio) (AZEVEDO, 1988, p. 116). 
 
Como sempre a contradição que se estabelece é que para atender aos setores 
populares é necessário estabelecer subsídios e a necessidade de manter a 
rentabilidade leva os programas a privilegiar aos setores da demanda solvável, 
de maior poder aquisitivo. Bonduki (2008, p. 73), assim realiza o balanço do 
período, destacando seus méritos como verdadeira Política Nacional de 
Habitação: 
Malgrado as críticas ao BNH e ao sistema por ele preconizado, sua 
importância é indiscutível, pois este período (1964-86) foi o único em 
que o país teve, de fato, uma Política Nacional de Habitação. O 
Sistema Brasileiro de Habitação (SFH) se estrutura com vultosos 
recursos gerados pela criação, em 1967, do Fundo de Garantia por 
Tempo de Serviço (FGTS), alimentado pela poupança compulsória de 
todos os assalariados brasileiros, que veio se somar aos recursos da 
poupança voluntária, que formou o Sistema Brasileiro de Poupança e 
Empréstimo (SBPE). 
 
Foi uma resposta do governo militar à crise da moradia decorrente da acelerada 
urbanização no período e com isso também angariando apoios entre as massas 
populares urbanas (BONDUKI, 2008, p. 72-73). Porém este longe de atender às 
necessidades de habitação das cidades brasileiras: 
27 
 
 
Em consequência, ocorreu um intenso processo de urbanização 
informal e selvagem, onde a grande maioria da população, sem 
qualquer apoio governamental, não teve alternativa senão auto-
empreender, em etapas, a casa própria em assentamentos urbanos 
precários, como loteamentos clandestinos e irregulares, vilas, favelas, 
alagados etc., em geral distantes das áreas urbanizadas e mal servidos 
de infra-estrutura e equipamentos sociais (BONDUKI, 2008, p. 74) 
 
Aumentando as mazelas associadas à urbanização acelerada por que passou o 
Brasil e que nos acompanha até os dias de hoje. 
 
No final do regime militar (1985) inicia-se a chamada “Nova República”, cujo 
primeiro presidente foi José Sarney. O SFH estava em crise terminal, motivo que 
levou o governo, em 1986 à incorporá-lo à Caixa Econômica Federal, que passou 
a coordenar os financiamentos para a habitação a partir deste momento. 
 
O período pós-BNH (1986-2002) 
 
Esta alteração brusca ocasionou uma desarticulação das políticas habitacionais. 
No período até 1995, a política habitacional foi sendo responsabilidade de vários 
órgãos, sem resultados efetivos. A atuação na área habitacional dos governos 
Sarney e Collor, seguem um padrão em que a alocação de recursos passa a 
preferencialmente adotar critérios clientelistas e procurando privilegiar aliados do 
governo federal. Como exemplo podemos citar o Plano de Ação Imediata para a 
Habitação, criado em 1990, para apoiar programas de construção de unidades 
e a financiar lotes urbanizados a família com renda até 5 salários mínimos, 
através das COHABs, Prefeituras, Cooperativas, Entidades de Previdência, etc., 
o que mostra este viés clientelista (CARDOSO, 2008). 
 
Já o governo Itamar Franco, que assumiu com o impeachment de Fernando 
Collor, adotou, como prioridade, em 1994, a conclusão das obras iniciadas na 
gestão anterior. Para isso lançou os programas “Habitar Brasil” e “Morar 
28Município”, com recursos oriundos do Orçamento e do Imposto Provisório sobre 
Movimentações Financeiras (IPMF). Os montantes investidos, porém, ficaram 
aquém das necessidades, visto às restrições impostas pela implantação do 
Plano Real, de estabilização financeira (CARDOSO, 2008). 
 
Apenas no governo Fernando Henrique Cardoso, que se inicia em 1995, é que 
políticas habitacionais mais efetivas serão efetuadas. Há uma reestruturação do 
setor, com a extinção do Ministério do Bem Estar Social e a criação da Secretaria 
de Política Urbana – SEPURB, que passa a ficar responsável pela formulação e 
implementação da Política Nacional de Habitação. A Caixa Econômica Federal 
(CEF) passa a ser apenas o agente operador dos recursos do FGTS (Fundo de 
Garantia por Tempo de Serviço) e agente do SFH (Sistema Financeiro da 
Habitação). Porém a crise econômica, que afetava a captação do FGTS, aliado 
à contenção fiscal e ainda somado a regras rígidas para a concessão de 
financiamentos pela CEF levou a que as metas não fossem alcançadas 
(CARDOSO, 2008). 
 
O balanço do período, não é dos mais favoráveis. Entre a extinção do BNH 
(1986) e a criação do Ministério das Cidades (2003), como vimos as sucessivas 
reestruturações dificultaram o estabelecimento de uma política habitacional. 
Ademais as subvenções do governo militar para as prestações durante a crise 
de inadimplência no início dos anos 1980, diminuíram ainda mais a possibilidade 
de novos financiamentos. Sua subordinação à CEF e a regulamentação do 
crédito passando ao Conselho Monetário Nacional, fez com que as concessões 
ficassem ainda mais difíceis, pois se tornaram um instrumento de política 
monetária. Se o financiamento minguou, os problemas de moradia se tornaram 
dramáticos, causados pelo aumento populacional e pelo empobrecimento das 
décadas de 80 e 90 (BONDUKI, 2008, p. 75-76). 
 
O resultado pode ser observado no gráfico 8.1, que contempla as unidades 
habitacionais financiadas com recursos do FGTS e da SBPE no período de 1980 
29 
 
a 2002. De 1980 em diante o quadro é de diminuição expressiva, explicada pela 
crise do BNH e a crise econômica brasileira no período. O pico de financiamento 
no início dos anos 1990 no governo Collor, com liberação de valores acima das 
possibilidades do sistema, fizeram com que os financiamentos via FGTS fossem 
paralisados nos anos seguintes. A partir do governo FHC há uma retomada 
relativa, que também pode ser vista no gráfico. 
 
Gráfico 8.1 - Unidades financiadas SBPE-FGTS (1980-2002) 
Fonte: BONDUKI, 2008, p. 76) 
 
O programa Minha Casa, Minha Vida 
 
O equacionamento da questão habitacional brasileira é de difícil solução, pois 
por um lado o déficit habitacional é muito grande, sendo que maior parte dele 
está na faixa até 3 salários mínimos, que é a chamada demanda não-solvável, a 
que não tem condições de pagar. Por outro lado os diversos modelos 
habitacionais privilegiaram sempre a demanda solvável, portanto temos uma 
realidade de moradias vazias e pessoas sem condições de adquiri-las. Na tabela 
8.3 abaixo podemos ver esse quadro para o ano de 2000, quando se propôs o 
Projeto Moradia (ver verbete). De acordo com o Censo de 2000, são necessárias 
6,6 milhões de novas moradias no pais, sendo 5,4 milhões nas áreas urbanas. 
 
30 
 
Faixas de renda Déficit em milhões de unidades % 
até 3 SM 4.490 83,2% 
de 3 a 5 SM 450 8,4% 
de 5 a 10 SM 290 5,4% 
acima de 10 SM 110 2,0% 
Total 5.400 100,0% 
Tabela 8.3 - Distribuição do déficit quantitativo por faixa de renda. Zona urbana. Brasil 
2000 
Fonte: BONDUKI, 2008, p. 82. 
 
E por que falar do “Projeto Moradia”? Porque é importante ter claro que 
mudanças e projetos essenciais ao pais são feitos somente com muito estudo e 
consulta a especialistas e à sociedade civil. Basicamente o Projeto Moradia 
propôs a criação do Sistema Nacional de Habitação unindo a União, os Estados 
e os municípios sob a coordenação do Ministério das Cidades, cuja criação 
também foi proposição do projeto. O controle social seria realizado pelo 
Conselho Nacional das Cidades e órgãos semelhantes em Estados e municípios, 
com a missão de gerir fundos de habitação, concentrando fundos de habitação 
para subsidiar as habitações para a baixa renda. Propunha também que os 
planos habitacionais fosse articulados com os planos diretores. Parte importante 
do projeto era a política urbana e o desenvolvimento tecnológico, para propiciar 
o barateamento dos custos de produção habitacional. Também defendia a 
aprovação do Estatuto da Cidade, fato que ocorreu dois anos após (BONDUKI, 
2009, p. 9-10). 
 
Verbete 
Projeto Moradia 
Projeto desenvolvido no âmbito do Instituto Cidadania, do futuro presidente da 
República, Luís Inácio Lula da Silva, para pensar a questão habitacional do pais. 
As iniciativas habitacionais tomadas após a posse do Governo Lula (2003) 
vieram desse projeto, que contou com a coordenação geral de Clara Ant e 
coordenada por André de Souza, Ermínia Maricato, Evaniza Rodrigues, Iara 
Bernardi, Lúcio Kowarick, Nabil Bonduki e Pedro Paulo Martoni Branco e a 
gerência executiva de Tomás Moreira. 
Fim de verbete 
31 
 
 
Com a posse do governo Lula o Ministério da Cidades foi criado com quatro 
secretarias nacionais, para tratar de suas missões fundamentais: Habitação, 
Saneamento, Mobilidade Urbana e Programas Urbanos. Em outubro de 2003 foi 
realizada a 1ª Conferência Nacional das Cidades, em que foi proposta a criação 
do Conselho Nacional de Habitação, instalado em 2004. “As conferências 
possibilitaram o início da construção de uma verdadeira política nacional para as 
cidades, ou seja, uma política não-limitada à ação do governo federal, mas capaz 
de envolver o conjunto de instituições públicas e privadas, relacionadas com a 
questão urbana” (BONDUKI, 2008, p. 97), tendo a 2ª Conferencia Nacional das 
Cidades sido realizada em 2005. 
 
Apesar das dificuldades financeiras e a visão estritamente bancária da CEF, foi 
possível priorizar os financiamentos para a população de baixa renda, conforme 
pode ser visto no gráfico 8.2. 
 
 
Gráfico 8.2 - Atendimento habitacional por faixa de renda com recursos do FGTS (2002-
2007) 
Fonte: BONDUKI, 2009, p. 10. 
 
Por outro lado, o governo tratou também de incentivar os financiamentos para a 
classe média. Resolução do Banco Central obrigava aos bancos privados 
investirem os recursos da poupança em habitação. Em um quadro favorável da 
32 
 
economia, foi conseguido que os recursos do SBPE investidos em habitação 
passassem de 2,2 bilhões de reais em 2002, para 27 bilhões em 2008 
(BONDUKI, 2009, p. 12). 
A crise econômica de 2008 obrigou o governo a realizar uma política anticíclica, 
realizando investimentos para que houvesse a recuperação da atividade 
econômica, isso associado ao Plano Nacional de Habitação (PlanHab) que já 
vinha sendo projetado a algum tempo, mas que vinha sendo pensado como uma 
estratégia de longo prazo para enfrentar o déficit habitacional (BONDUKI, 2009). 
É nesse contexto que surge o programa “Minha Casa Minha Vida” (MCMV) em 
2009, com o objetivo de construir 1 milhão de residências. 
 
Os dados do programa são grandiosos. Em suas duas primeiras fases chegou a 
3,857 milhões de unidades entregues (até 2015) e planeja contratar mais 3 
milhões de unidades em sua terceira fase que iria até 2018. A atual crise 
econômica e política não permite avaliar se esses dados poderão ser cumpridos. 
Porém cumpre destacar o total de 139,6 bilhões de reais de financiamento dos 
bancos, principalmente da Caixa Econômica Federal e o investimento de 114,9 
bilhões em subsídios para famílias de baixa renda (BRASIL, 2015). 
 
Apesar desses números que o transformam em maior programa habitacional da 
história do pais, superando a produção do antigo BNH, as críticas são muitas, 
principalmente ao modelo de construção que mantém e reproduz o padrão de 
segregação socioespacial.Apesar de existir a possibilidade de financiamento a 
partir de entidades sociais fazendo unidades mais baratas e mais de acordo com 
os interesses dos futuros usuários, a grande parte dos financiamentos foi 
alocada a projetos de grandes construtoras, que por motivo de economia elegem 
lotes na periferia das cidades e mantém a forma condomínio, que também 
aumenta a alocação de moradores. Porém causa gastos extras, como a taxa de 
condomínio, gerando problemas de sustentabilidade de muitos desses 
empreendimentos, principalmente aqueles destinadas à baixa renda, como 
apontam LIVRO: “O Programa [MCMV] se apresenta, enfim, como solução única 
e pouco integrada aos desafios das cidades brasileiras para enfrentamento de 
33 
 
complexo “problema habitacional”, baseado numa produção padronizada e em 
larga escala, desarticulada das realidades locais, mal inserida e isolada da 
cidade, a partir de um modelo de propriedade privada condominial”. 
 
Ou seja, são os desafios colocados para superar uma visão quantitativista, de 
que o problema habitacional brasileiro será resolvido com a simples produção de 
residências, sem simultaneamente atacar também as desigualdades sociais e 
econômicas existentes no pais. 
 
ATIVIDADE FINAL (Atende aos objetivos 1, 2 e 3) 
 
As formas de habitação abordadas nesta aula referem-se, preferencialmente, à 
população não solvável. Vc. consegue responder o por que dessa ênfase e se 
diante do que foi estudado pode-se perceber um horizonte para a resolução do 
problema habitacional brasileiro. 
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Resposta comentada 
 
Porque a moradia para a população de baixa renda (demanda não solvável) é 
que se constitui enquanto um “problema” ou uma “questão” habitacional, pela 
precariedade das residências nas cidades brasileiras. Não há um horizonte de 
resolução, porque várias das políticas acabaram atendendo, ao final, à classe 
média, pela questão do financiamento atender à regras de mercado. O caminho 
34 
 
talvez seja o do programa MCMV, de subsidiar a população de baixa renda, 
porém eliminando a questão do modelo de segregação socioespacial que parece 
estar reproduzindo o programa. 
 
Fim da resposta comentada 
 
 
CONCLUSÃO 
 
Do visto nessa aula podemos concluir a persistência do problema habitacional 
no país, desde a incipiente urbanização, com os cortiços e posteriormente as 
favelas, que se mantém na paisagem urbana até hoje. Isso porque o pais sofreu 
um processo gigantesco de urbanização, que só fez aumentar a demanda por 
habitação nas cidades, aumentando sem parar o déficit habitacional. O exame 
das políticas públicas para a habitação no pais mostram a incapacidade de 
resolução do problema, pela desigualdade socioespacial que continua 
impedindo a resolução da questão habitacional apenas pelo viés da produção de 
moradias. Há que atacar, simultaneamente a questão da pobreza urbana, que 
só será feito com programas específicos de melhoria da educação e da renda 
das grandes massas de excluídos de nossas cidades. 
 
 
RESUMO 
Nessa aula, tratamos a questão da habitação, abordando, inicialmente, a 
questão da pobreza urbana, fator de exclusão e que leva a que grandes parcelas 
da população brasileira não tenham acesso a uma moradia digna. Para isso 
vimos historicamente como foram tratadas as primeiras moradias precárias das 
cidades brasileiras, como os cortiços e as favelas. Posteriormente foram vistas 
as políticas que se sucederam no pais que procuram tratar da questão 
habitacional, desde a experiência dos IAPs, do BNH até chegar ao Programa 
Minha Casa Minha Vida. 
 
35 
 
 
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