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W BA 10 45 _V 1. 0 SEMINÁRIOS CLÍNICOS 2 Gabriela Fabbro Spadari São Paulo Platos Soluções Educacionais S.A 2022 SEMINÁRIOS CLÍNICOS 1ª edição 3 2022 Platos Soluções Educacionais S.A Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César CEP: 01418-002— São Paulo — SP Homepage: https://www.platosedu.com.br/ Head de Platos Soluções Educacionais S.A Silvia Rodrigues Cima Bizatto Conselho Acadêmico Alessandra Cristina Fahl Ana Carolina Gulelmo Staut Camila Braga de Oliveira Higa Camila Turchetti Bacan Gabiatti Giani Vendramel de Oliveira Gislaine Denisale Ferreira Henrique Salustiano Silva Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Coordenador Camila Turchetti Bacan Gabiatti Revisor Rogerio Adriano Bosso Editorial Beatriz Meloni Montefusco Carolina Yaly Márcia Regina Silva Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)_____________________________________________________________________________ Spadari, Gabriela Fabbro Seminários clínicos / Gabriela Fabbro Spadari. – São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022. 32 p. ISBN 978-65-5356-292-9 1. Seminários. 2. Clínicos. 3. Clínica. I. Título. 3. Técnicas de speaking, listening e writing. I. Título. CDD 610.7 _____________________________________________________________________________ Evelyn Moraes – CRB: 010289/O S732s © 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Platos Soluções Educacionais S.A. https://www.platosedu.com.br/ 4 SUMÁRIO Apresentação da disciplina __________________________________ 05 Estudos de casos clínicos - Depressão e Luto ________________ 06 Estudos de casos clínicos - Ansiedade ________________________ 20 Estudos de Casos Clínicos – Transtorno de Estresse Pós- Traumático (TEPT) ____________________________________________ 30 Estudos de Casos Clínicos – Infância e Adolescência _________ 40 SEMINÁRIOS CLÍNICOS 5 Apresentação da disciplina Nesta disciplina, você entrará em contato com diferentes construtos, que possibilitarão o entendimento de teorias e aplicações de estratégias no âmbito da psicologia clínica, da linha cognitivo comportamental. Para isso, será preciso percorrer algumas etapas, compostas, inicialmente, pelo estudo acerca das compreensões da depressão e do luto, que discutirá as distorções cognitivas, teorias e aplicabilidade da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) relacionadas ao tratamento desse transtorno. Posteriormente, será discutida a ansiedade, juntamente com suas crenças disfuncionais e Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). Seguindo para o tratamento desses transtornos, o debate se dará sobre o Transtorno de Estresses Pós-Traumático (TEPT) da Infância e Adolescência, no qual, inicialmente, serão vistos os principais conceitos de estresse, bem como as principais características e tratamento do TEPT. Em seguida, o foco será infância e adolescência, que tem como objetivo compreender os principais conceitos do Transtorno Afetivo Bipolar (TAB), bem como a interação entre TAB infantil e TCC, além das técnicas de tratamento e intervenção. Bons estudos! 6 Estudos de casos clínicos - Depressão e Luto Autoria: Gabriela Fabbro Spadari Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso Objetivos • Compreender acerca da teoria relacionada a depressão. • Conhecer as principais distorções cognitivas na depressão. • Entender a aplicabilidade da TCC, em casos de depressão. 7 1. Compreensões acerca da depressão Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que 4,4% da população mundial padece com depressão. Segundo a organização citada, no Brasil, esse índice é ainda maior: 5,8% (OMS, 2017). Para a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), a depressão é um transtorno que acomete pessoas no mundo todo, calculando que mais de 300 milhões de indivíduos acometidos por esse transtorno. Segundo a OMS (2017), afeta mais mulheres do que homens a prevalência varia conforme a idade, com pico em pessoas mais velhas, sendo: acima de 7,5% entre o sexo feminino na faixa etária de 55 a 74 anos e acima de 5,5% entre homens. Além disso, pode acometer adolescentes e crianças, porém, em um número menor. A OPAS (2020) diferencia o transtorno depressivo de respostas emocionais breves e oscilações de humor inerentes aos problemas do dia a dia, sendo que o transtorno tem uma duração de rebaixamento do humor e anedonia pré-determinada, dessa forma, se diferenciando das oscilações de humor comuns. A depressão pode se tornar um grave problema de saúde, principalmente, quando afeta o indivíduo por um período longo e com intensidade moderada ou grave (OPAS, 2020). Para Gonçalves et al. (2017) os transtornos depressivos (TD) têm se apresentado como um sério problema de saúde pública, uma vez que são altamente prevalentes, refletindo na saúde geral da população e gerando impactos psicossociais. De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais–DSM-5 (APA, 2014), existem diferentes tipos de processos depressivo, entre eles: o transtorno disruptivo da desregulação do humor, o transtorno depressivo maior, o transtorno depressivo persistente (distimia), o transtorno depressivo causado por substância/ 8 medicamento, ou causado por outra condição médica e o transtorno disfórico pré-menstrual. De acordo com o conjunto de transtornos, foco se dá ao transtorno depressivo maior (TDM), considerado como uma condição clássica em adultos. Para Knapp e Beck (2008), os pacientes com TDM tem a percepção de que são malsucedidos e sem capacidade, o que resulta em uma autoestima baixa. Em consequência disso, acreditam que as outras pessoas são mais capazes e possuem mais qualidades que eles, por isso, temem futuro, pois acreditam que serão infelizes. Greenberger e Padesky (2017) acharam outras características em pacientes diagnosticados com TDM, como diminuição da frequência de tarefas vista como prazerosas e, simultaneamente, elevação de comportamentos de fuga e esquiva de ambientes aversivos. O TDM é definido, pela APA (2014), por uma série de critérios, tais como: permanecer deprimido grande parte do tempo; falta total ou diminuída do prazer para realizar tarefas do cotidiano; sentimento de culpa exacerbada ou inutilidade; déficits nas habilidades de concentração e pensamento; cansaço ou falta de energia; insônia ou sonolência; agitação ou retardo psicomotor; perda ou ganho importante de peso; ideias frequentes de morte ou suicídio. Além disso, é necessário que esteja presente a falta de interesse nas atividades diárias e o humor deprimido por, pelo menos, duas semanas, acompanhado de pelo menos quatro dos outros sintomas citados acima (LEAHY, 2015). Além disso, o autor ressalta sobre a importância de, antes de diagnosticar um quadro, avaliar em quais contextos o paciente está inserido, além de assegurar se não existem outras condições médicas que podem acarretar sintomas depressivos. Os episódios depressivos podem ser caracterizados em três graus: leve, moderado ou grave, dependendo da intensidade dos sintomas (OPAS, 2020). No diagnóstico, deve-se levar em consideração se é um episódio único ou recorrente e se há sintomas psicóticos (APA, 2014). 9 Segundo a OPAS (2020), o sujeito com um episódio depressivo leve executará atividades sociais e trabalhos do cotidiano, com alguma dificuldade, porém, ao que se refere ao seu funcionamento global, não perceberá grandes prejuízos. Entretanto, em um episódio depressivo grave, provavelmente, o sujeito nessa condição não conseguirá executar tarefas simples ou sociais. Leahy (2015) corrobora, explicitando que a depressão levaa índices mais altos de absenteísmo no trabalho e diminui a capacidade e a produtividade do indivíduo. Além disso, o autor citado anteriormente afirma que cerca de 80% dos indivíduos deprimidos relatam prejuízos em atividades diárias, o que já havia sido pontuado por Rodrigues e Horta (2011), ao demonstrarem que pessoas depressivas apresentam mais dificuldades em executar tarefas referente à sua própria preservação, propiciando ideações suicidas, planos ou até mesmo tentar cometer suicídio. Para Powell et al. (2008), grande parte dos pacientes com depressão vivenciam a psicopatologia na forma crônica e recorrente. Os autores acreditam que o suicídio é um fator preocupante em relação a pacientes nessas condições. Braga e Dell’Aglio (2013) corroboram esses achados, alertando para sintomas depressivos, como, desânimo, falta de esperança, desmotivação e apatia pela vida, uma vez que acreditam que esses sintomas podem ocasionar em prováveis comportamentos suicidas. A OPAS concorda ao postular que em caso de agravamento da condição, a depressão pode levar ao suicídio, estimando que cerca de 800 mil vidas são perdidas por suicídio ao ano, se tornando a segunda principal causa de óbito entre indivíduos com idade entre 15 e 29 anos (OPAS, 2020). Leahy (2015) finaliza, apontando que em pacientes com depressão a possibilidade de cometer suicídio é 30% maior em relação as pessoas não doentes, indicando a importância do tratamento tanto na psicoterapia como medicamentoso. 10 1.1 Distorções cognitivas frequentes na depressão As distorções cognitivas foram compreendidas, por Beck (2014), como interpretações enviesada da realidade que ocasionam perturbações ao sujeito. Rodrigues e Horta (2011) explicaram as distorções como equívocos na forma de interpretar as situações, acarretando compreensões e pensamentos distorcidos da realidade. Beck (2007) acredita que estas distorções estão presentes em pacientes com transtorno psicológicos, uma vez que costumam interpretar equivocadamente ambientes neutros ou até mesmo favoráveis, se tornando, dessa forma, tendenciosos e com pensamentos negativos desse indivíduo. Partindo desse pressuposto, Cunha e Baptista (2019) observaram, em pacientes com TDM, a presença de distorções cognitivas e pensamentos negativos; o que também foi apontado por Knapp e Beck (2008), ao afirmarem que esses indivíduos costumam recorrer aos pensamentos negativos, criando um modo característico de raciocínio que resulta em interpretações negativas distorcidas sobre si, o mundo e o futuro, conhecida como a tríade cognitiva. Segundo Greenberger e Padesky (2017), a maioria das pessoas deprimidas têm pensamentos autocríticos, considerando essas cognições nocivas, pois favorece o rebaixamento da autoestima, autoconfiança e contribuem para problemas interpessoais, além de poder interferir na motivação do paciente para realizar atividades que irão produzir bem-estar. A cognição negativa sobre as experiências atuais é outra característica da depressão. Segundo os autores citados anteriormente, o paciente, frequentemente, não considera os eventos por seu valor real; ocorre também as lembranças sobre eventos negativos relacionados às experiências passadas do sujeito, que têm lembranças apenas dos aspectos negativos da vida de forma mais vívida do que dos eventos positivos ou neutros. Para Greenberger e Padesky (2017), o sujeito, quando está deprimido, 11 enxerga o futuro de uma forma extremamente negativa, nomeando essa previsão de que os eventos terminarão de modo negativo de desesperança, sendo que, em sua forma mais extrema, a desesperança pode estimular pensamentos suicidas. Segundo a APA (2014), o indivíduo com TDM costuma ruminar, ser autocrítico, ter pensamentos pessimistas, sentimentos de desvalia e aversão a si mesmo, o que acarreta uma baixa autoestima. Pensamentos autodepreciativos costumam estar presentes devido aos sentimentos de desvalia, sendo que esses pensamentos podem ter o foco em exterminar com a própria vida, por pensar não ser digno de ter a vida ou por não conseguir enfrentar a dor causada pela depressão. De acordo com o exposto acerca da importância das distorções cognitivas, a seguir, o Quadro 1 expõem distorções mais frequentes em pacientes que sofrem de depressão. Quadro 1 – Distorções cognitivas Tipo Conceito Inferência Arbitrária. Quando o indivíduo deprimido conclui algo (geralmente, autodepreciativo), sem possuir nenhuma evidência que comprove a veracidade. Abstração Seletiva. Quando um evento negativo ou neutro é realçado enquanto os positivos são totalmente ignorados pela pessoa, conceituando a vivência depreciativa baseada nesse evento negativo. Hipergeneralização. A partir de eventos negativos isolados, o indivíduo depressivo tende a dispor de uma conclusão geral negativa, expandindo esse pensamento para outras situações, seja no presente ou no futuro. Maximização ou minimização. Quando o paciente deprimido maximiza seus defeitos ou atitudes negativas e minimizam os aspectos positivos de sua conduta ou situação. Personalização. Apresenta uma tendência do indivíduo deprimido a assumir toda a culpa ou responsabilidade de um evento desagradável, ignorando que outras possibilidade e pessoas que também podem ser responsáveis pela situação. Pensamento tudo ou nada/ dicotómico. Quando o sujeito visualiza apenas duas possibilidades em determinada situação, sendo cada uma o extremo da outra, com uma tendência a focar no polo negativo. Fonte: adaptado de Beck et al. (1997). 12 Confirmando os aspectos pontuados no Quadro 1, Leahy (2015) também constatou que pacientes deprimidos apresentavam certa tendência a apresentar pensamentos com tendência a anular aspectos positivos, enfatizando, dessa forma, apenas os aspectos negativos. Rodrigues e Horta (2011) corroboram com o autor, visto que acreditam que os pacientes tendem a se comportar e crer que a vida ou os eventos estão sendo bem piores do que na realidade são. Medeiros e Sougey (2010) realizaram um estudo com pacientes adultos diagnosticado com TDM, com idade entre 18 e 65 anos, que teve como objetivo averiguar os principais pensamentos distorcidos presentes. Os resultados apontaram que os pensamentos foram: desesperança, hipocondria, ideias de insucesso, desejo de exterminar com a vida, pensamento de autocompaixão, ideias autodepreciativas, pensamentos de morte, pensamentos suicidas e, inclusive, pensamentos de culpa. Segundo os autores, a desesperança foi o pensamento mais predominante dentre os citados. Wright et al. (2008) concordam que, em pacientes com depressão, comumente os pensamentos ocorrem em tópicos de desesperança, baixa autoestima e insucesso. Aquino, Dará e Simeão (2016) complementam, pois acreditam que, além da desesperança, outro fator importante para compreender a depressão é a percepção de ausência do sentido na vida ou vazio existencial, sendo considerado, pelos autores, um fator essencial e discriminante a essa psicopatologia. Compreendendo a importância clínica dessa dimensão da sintomatologia depressiva, compreende-se sobre a importância do tratamento, sendo explicitado a seguir como a TCC intervém em contextos de TDM. 13 1.2 Aplicabilidade da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) em casos de depressão Considera-se que o tratamento de transtornos depressivos, na Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), leva em média de seis a doze sessões, entretanto, pode haver uma variação dessa média de tempo, conforme o grau de comprometimento, bem como o tipo do transtorno (POWELL et al., 2008). Corroborando com os autores, por meio de estudos, Lóos et al. (2018) desconstruíram a ideia de que para tratar a depressão seria necessário um tempo longo de psicoterapia, uma vez que este pode ser de curta duração, em razão de que acreditam que, mesmo em pouco tempo de terapia, é possível que sejam criados novos repertórios na cognição do paciente, assim como de esquemas mais ajustados.Para Beck (2014), a inércia do paciente com depressão corrobora com o humor depressivo, pois, na ausência de executar determinadas tarefas, esse sujeito não apresenta a chance de adquirir o sentimento de domínio e satisfação, o que acarreta em mais pensamentos negativos, que, por sua vez, acarreta em um aumento do desânimo e da letargia. Ainda, para a autora, no tratamento de pacientes depressivos, uma das metas principais é desenvolver o planejamento de atividades, visto que na depressão grande parte dos pacientes deixam de realizar atividades prazerosas e que contribuíram com a elevação do humor. Além disso, ressalta-se que os pacientes depressivos comumente apresentam a crença de que a forma como se sentem naquele momento é imutável. Neste caso, uma parte crucial do trabalho é auxiliá-los na retomada de atividades anteriormente consideradas importantes, reforçando-os por esse empenho, uma vez que essa prática tende a elevar o humor e o sentimento de autoeficácia, ajudando a visualizar que é possível tomar posse do domínio do seu humor (BECK, 2014). Considerando que uma das características principais do depressivo é a inatividade, Greenberger e Padesky (2017) acrescentam que a 14 ativação comportamental é um dos primeiros métodos a ser inseridos no tratamento para depressão, dessa forma, o terapeuta estimulará o paciente a aumentar a quantidade de tarefas a serem realizadas diariamente, sempre observando a qualidade das mesma, pois os autores acreditam que a melhora do humor pode ser obtida por meio de tarefas prazerosas, aumentando, dessa forma, a autoeficácia e estimulando o paciente a enfrentar os desafios diários que estão ligados ao que o paciente acredita e valoriza. Enquanto ao manejo clínico da TCC, em casos de depressão, Cizil e Beluco (2019) citam sobre a importância da psicoeducação, na qual é explicitado o funcionamento e aplicação do modelo cognitivo da TCC. Lóos et al. (2018) adicionam que a psicoeducação, tanto sobre a depressão quanto da abordagem, é indispensável para que o paciente compreenda claramente o processo psicopatológico pelo qual está vivenciando, como também dar ao paciente a oportunidade de ressignificação de crenças irracionais e cognições distorcidas. Em seguida, é essencial realizar uma demonstração ao paciente sobre as evidências dos pensamentos nos comportamentos e humor (CIZIL; BELUCO, 2019), dessa forma, para Beck e Alford (2011), o paciente é guiado a pensar de forma crítica, avaliando as evidências que comprovam ou não seus pensamentos distorcidos. Posteriormente, Fernandes, Falcone e Sardinha (2012), afirmam acerca da importância de desenvolver um treino de habilidades sociais (THS), pois acreditam que essa possa ser uma técnica importante no tratamento da depressão, uma vez que os sujeitos depressivos tendem a se sentir fragilizados e sem recursos para enfrentar os problemas, o que culmina em prováveis sentimentos de desvalor e desamparo. Dessa forma, a falta de habilidades sociais pode ser considerada como uma das causas ou consequências da depressão, pois, por não possuir recursos básicos de enfrentamento de conflitos, o sujeito tende a ser mais vulnerável a eventos estressores. Del Prette, Del Prette e Barreto 15 (1998) apontam, ainda, o déficit de assertividade e empatia. Nessa etapa do tratamento, cabe ao terapeuta um trabalho de modo mais diretivo, auxiliando o paciente a se tornar mais independente. Entre o leque de possibilidades de intervenções que compõem a abordagem estudada, Matos e Oliveira (2013) e Beck (2014), propõem, no Quadro 2, algumas técnicas importantes no trabalho na TCC aplicadas a pacientes deprimidos. Quadro 2 – Aplicabilidade da TCC na depressão Tipo Aplicação Objetivo Registro de pen- samentos disfun- cionais (RPD). Registrar pensamentos desadapta- tivos, de preferência, ainda na pre- sença do desconforto psicológico. Permite, ao terapeuta, compreender pensamentos automáticos, comporta- mentos e emoções. Cartões de enfrentamento. Lembretes que devem ficar em lugares acessíveis. Os cartões podem ser elaborados em sessão ou ficar como tarefa de casa. Auxilia o paciente a emitir respostas mais adaptativas a pensamentos auto- máticos e crenças disfuncionais. Prescrição gradu- al de tarefas, Realizar uma atividade que está gerando ansiedade, por etapas, realizando com o indivíduo uma descrição gráfica dos passos. Diminuir a ansiedade, descrevendo os passos de determinada tarefa, au- xiliando a tirar o foco do quanto está distante a resolução do problema, fo- cando no que está fazendo no aqui e agora para a resolução. Curtograma, Realizar uma lista de tarefas das quais apreciava e realizava, apreciava e não realizava, não apreciava e realizava e não apreciava e não realizava. Auxilia no autoconhecimento, como também leva a uma autorreflexão so- bre o quanto está priorizando as coi- sas que realmente gosta. Lista de vantages e desvantagens. Analisar as vantagens de tomar uma decisão e, do outro lado, as desvantagens, dando peso para cada item. Consiste em auxiliar o paciente a vi- sualizar qual é a melhor solução para o problema enfrentado. 16 Ativação comportamental. Realizar atividades que antes eram prazerosas e, devido ao transtorno, o sujeito não tem mais desejo de fazê-lo. Utiliza o comportamento para modifi- car cognições negativas sobre deter- minado evento ou atividade. Relaxamento. Psicoeduca o relaxamento muscular progressivo, o uso do imaginário e o controle da respiração. Auxilia na ativação do sistema nervoso parassimpático, o que causa uma sen- sação de relaxamento e bem-estar ao paciente. Biblioterapia. Realizar a leitura de material proposto. Auxilia o paciente adquirir compreen- são de seu problema e adquirir estra- tégias de enfrentamento do problema. Debates. Verificar a veracidade dos pensamentos e não aceitar como verdades absolutas sem antes questioná-los. Auxilia a verificar a irracionalidade dos pensamentos desadaptativos, substi- tuindo-os por pensamentos mais racionais. Fonte: adaptado de Beck (2014); Matos e Oliveira (2013). Sendo assim, Leahy (2019) acredita que as técnicas auxiliam no que concerne a ajudar o paciente a vencer os obstáculos e obter uma mudança no padrão de pensamento, porém, ressalta que apesar de algumas técnicas serem mais utilizadas pelos terapeutas, é necessário que o profissional entenda que distintos pacientes necessitam de distintas técnicas, ou seja, o que funciona perfeitamente para uma pessoa e/ou problema, pode não funcionar para outra, ressaltando a importância de adaptar o tratamento ao sujeito, não o sujeito ao tratamento. Em suma, o trabalho na TCC com pacientes depressivos é identificar as distorções existentes, desenvolver a conceitualização individualizada de cada caso, desenvolvendo, a partir desse trabalho, estratégias, juntamente com o paciente para resolução de problemas, incentivando o automonitoramento, o autoconhecimento e o questionamento dos pensamentos automáticos e crenças distorcidas disfuncionais, que devem ser modificadas. Isso promove, ao paciente, autonomia, 17 participando da elaboração de metas e realizando tarefas entre as sessões, estipuladas conforme o caso e sua evolução, dessa forma, gerando mais agilidade nos resultados e prevenindo recaídas (WRIGHT et al., 2018). Segalla e Bicca (2016) explicam que a prevenção de recaída também se constitui como uma ferramenta importantíssima com pacientes em contexto de processo de alta. Na TCC, são empregadas diversas tarefas e técnicas com o objetivo de manter as habilidades adquiridas durante e depois do processo terapêutico, o que contribui para manter o paciente treinado e os sintomas atenuados. Entretanto, para que o tratamento seja efetivo Cizil e Beluco (2019), recomendam que o sujeito que esteja sofrendo com depressão esteja ciente de sua parte de responsabilidade no processo e que se empenhe para que isso aconteça. Nessa mesma linha depensamento, os autores reforçam que a relação terapêutica é imprescindível para o total sucesso no tratamento. 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Compreensões acerca da ansiedade Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM V (APA, 2014), os transtornos de ansiedade se classificam em: transtorno de ansiedade de separação; mutismo seletivo; fobia específica; fobia social; transtorno de pânico; agorafobia; transtorno de ansiedade generalizada; transtorno de ansiedade por substância/ medicamento. De acordo com o relatório da Organização Mundial da Saúde OMS (WHO, 2017), entre a população brasileira, 9,3%, ou seja, mais de onze milhões de pessoas, sofrem de distúrbios relacionados a ansiedade. De acordo com Shinohara e Nardi (2001), para cada duas mulheres com ansiedade, apenas um homem sofre do transtorno. No Brasil, por meio de um estudo populacional foram encontrados os índices de prevalência de transtornos de ansiedade de 4,6% em crianças e 5,8% entre os adolescentes (FLEITLICH-BILYK; GOODMAN, 2004). A ansiedade é descrita como um conjunto de consequências comportamentais e fisiológicas, relacionadas às situações de luta ou fuga diante a situações de perigo (KNAPP; CAMINHA, 2003). De acordo com Porto et al. (2008), tais reações fisiológicas envolvem falta de ar, sudorese, tontura, taquicardia, tremores, entre outras. Entre as bases biológicas da ansiedade, estão áreas cerebrais como amígdala, córtex pré-frontal orbita e medial, tálamo, hipotálamo, hipocampo, entre outros. Demonstrando, assim, ser um processo não só comportamental, como também neurobiológico (PORTO et al., 2008). A partir do momento em que as reações neurofisiológicas e comportamentais são desproporcionais e exageradas diante de um estímulo, ou são diferentes do esperado diante de determinada situação, caracteriza-se um transtorno de ansiedade (DAVIS et al., 2014). 22 Ao analisar os pensamentos de pessoas com ansiedade, percebe-se que são muito intensos, frequentes e de consequências perturbadoras. Hirata (2019) aponta para as sete principais crenças irracionais, comumente encontradas entre os ansiosos, que constam no Quadro 1, a seguir. Quadro 1 – Principais crenças irracionais em quadros de ansiedade Crenças irracionais • É extremamente necessário ser amado e aprovado pelas pessoas que são importantes. • Para ter valor, é necessário ser competente e bem-sucedido em todos os as- pectos da vida. • É terrível e catastrófico quando as coisas não acontecem do jeito que gostaríamos muito que ocorresse. • Se algo pode ser perigoso ou assustador, devemos ficar terrivelmente preocu- pados e ficar ruminando sobre sua possível ocorrência. • É mais fácil evitar do que enfrentar certas dificuldades ou responsabilidades da vida. • Deve-se ficar extremamente preocupado com os problemas e as preocupações de outras pessoas. • Há, invariavelmente, uma solução certa, precisa e perfeita para os problemas humanos e é catastrófico se essa solução perfeita não é encontrada. Fonte: adaptado de Lipp (1999). Tais crenças estão diretamente relacionadas aos sintomas de ansiedade, já que seus temas estão ligados ao medo da rejeição, perfeccionismo, necessidade de controle, excesso de preocupação, evitação e intolerância às incertezas. São essas crenças que levam o sujeito a interpretar as situações de forma irracional, levando ao desenvolvimento do Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG). Segundo Weems et al., 23 (2000) o tema das preocupações entre crianças e adolescentes gira em torno de temas como: testes, furacões, agressão física, futuro, escola e problemas com crianças da mesma idade. Segundo o DSM-V (APA, 2014), um diagnóstico de TAG é confirmado quando o sujeito apresenta ansiedade e preocupações excessivas por mais de seis meses, somado a presença de pelo menos três dos seguintes sintomas: inquietação cansar-se com facilidade, dificuldade em se concentrar, irritabilidade, tensão muscular e perturbação no sono. Um diferencial dos diagnósticos em crianças e adolescentes é a exigência de apenas um sintoma somático. Tais sintomas levam ao prejuízo significativo no funcionamento social e ocupacional. No que tange as consequências, a ansiedade nos adultos leva a preocupações excessivas acompanhadas de sintomas físicos como hiperventilação e tensão muscular, além de sudorese, taquicardia, insônia, fadiga e dificuldade de relaxar. As preocupações são de temas diversos e de difícil controle (ZUARDI, 2017). Esses sintomas podem causar perdas na qualidade das relações pessoais e, até mesmo, gerar absenteísmo e afastamento do trabalho. 2. Transtorno de Ansiedade Generalizada e a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) O Transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é definido como um transtorno psiquiátrico crônico e persistente, que se caracteriza pela preocupação excessiva que, de acordo com o Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais – DSM V (APA, 2014), deve durar, pelo menos, seis meses e ser acompanhada de, pelo menos, três dos seguintes sintomas: inquietação, irritabilidade, fatigabilidade, perturbação do sono, tensão muscular e/ou dificuldade de concentração. 24 Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2017), a proporção da população mundial com desordens de ansiedade em 2015, foi estimada em 3,6%, sendo mais comuns entre as mulheres do que em homens (4,6% comparado à 2,6% a nível mundial). Mais especificamente com relação ao TAG, nos Estados Unidos, a prevalência estimada na população, de maneira geral, foi de 3,1%, de 2001 a 2003, e este fator aumenta para 5,7% quando considerado o período de vida do paciente, sendo também o risco entre as mulheres, o dobo com relação aos homens (KESSLER; WANG, 2008). No estado de São Paulo, no Brasil, uma pesquisa comunitária, realizada em 2002, mostrou que a prevalência de TAG na população geral é de 4,2% ao longo da vida, sendo mais prevalente entre as mulheres (ANDRADE; WALTERS; GENTIL; LAURENTI, 2002). Em relação a idade, considera-se que o aparecimento do TAG pode ser muito variável, apesar de alguns terem início na infância, a maioria se inicia em adultos jovens e até mesmo em idosos, que, frequentemente, apresentam condições crônicas de saúde física (CHOU, 2009). Embora muitos pensem que o TAG seja um dos transtornos mentais mais simples e de tratamento acessível, o que induz muitas pessoas a não procurarem tratamento adequado, está entre os transtornos mentais mais encontrados na prática clínica. O TAG é caracterizado pelo prejuízo em áreas como memória, funções executivas, funcionamento social e laboral dos indivíduos, entre outros. De acordo com Hoyer, Becker e Marggraf, (2002), e como sugerido pelos critérios do DSM-V (APA, 2014), os indivíduos com TAG possuem um significativo prejuízo em sua funcionalidade, apresentando um escore de funcionamento psicossocial mais baixo que indivíduos com outros transtornos ansiosos, assim como quando comparados com indivíduos sem transtornos mentais (HOYER; BECKER; MARGRAF, 2002). 25 Além disso, é de extrema importância salientar que 84% dos indivíduos que apresentam TAG, frequentemente, apresentam outras doenças comórbidas (médicas ou psiquiátricas (JUDD et al., 1998). Dessa forma, é importante salientar que os prejuízos à saúde de indivíduos com TAG não estão somente relacionados aos critérios diagnósticos existentes na maioria dos casos. Uma vez que, quando associado a outro transtorno psiquiátrico, a sobrecarga econômica e pessoal, assim como a severidade dos sintomas, apresenta aumento (NUTT; BALLENGER; SHEEHAN et al., 2002). Como reflexo do impacto do transtorno no funcionamento social e laboral do indivíduo, estudos mostram que indivíduos com TAG apresentam médias de falta ao trabalho no último mês de 4,6 dias segundo Weiller,Bisserbe, Maier e Lecrubier (1998), superiores às médias de indivíduos sem transtornos mentais. As opções de tratamento do TAG atuais compreendem o tratamento psicossocial e o tratamento farmacológico, ou uma combinação dessas duas modalidades. Independente da modalidade, alguns fatores no tratamento do TAG precisam ser considerados. O primeiro fator é a adoção e implementação de uma estratégia de tratamento a longo prazo, já que o TAG é uma condição crônica. Esta estratégia se refere a esforços para manter os ganhos do tratamento por períodos prolongados e para prevenir recidivas. O segundo fator é a necessidade de focar uma ampla gama de características do TAG, incluindo vários sintomas cognitivos e somáticos. Finalmente, tendo em vista a relação estreita entre o TAG e as desordens depressivas, os tratamentos para o TAG também precisam ser capazes de reduzir os sintomas da depressão, uma vez que ocorrem concomitantes com o TAG ou complica o seu curso (STARCEVIC, 2015). Considerando-se os três fatores discorridos, parece viável afirmar que o tratamento a longo prazo de pacientes acometidos com o TAG se beneficiaria com as terapias psicossociais, e a não utilização, quando possível, de terapia farmacológica reduziria os efeitos colaterais 26 associados. Corroborando com esta ideia estão os achados de estudos metanálise, indicando que os protocolos de terapia cognitiva (TC) e terapia cognitiva comportamental (TCC) são considerados mais efetivos no término de sintomas de pânico e ansiedade do que os tratamentos exclusivamente farmacológicos (GOULD; OTTO; POLLACK, 1995). Dessa forma, entre as inúmeras possibilidades de terapias psicossociais, destaca-se a TCC tipicamente conceituada como um tratamento de curto prazo, focado nas habilidades do paciente e que visa alterar as respostas emocionais mal adaptadas, alterando os pensamentos ou comportamentos, ou ambos (KACZKURKIN; FOA, 2015). Ao longo dos anos, um grande número de protocolos diversos foi criado para que a TCC pudesse ser aplicada a pacientes com transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), transtorno de ansiedade generalizada (TAG), transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), transtorno do pânico (TP), fobias específicas e transtorno de ansiedade social, bem como para aqueles com sintomas inespecíficos de ansiedade. Dentro da TCC, o tratamento pode ser realizado de formas diversas, de acordo com a necessidade do paciente (KACZKURKIN; FOA, 2015). A exposição e os métodos cognitivos representam as técnicas de TCC mais, frequentemente, implementadas e amplamente estudadas. O tratamento inicial da TCC é focado no aumento da consciência por parte do paciente de seus pensamentos automáticos, e um trabalho posterior terá como foco as crenças nucleares e subjacentes. O tratamento pode começar identificando e questionando pensamentos automáticos, o que pode ser feito por meio da orientação do terapeuta para que o paciente avalie tais pensamentos, principalmente, quando há uma excitação emocional durante a sessão (KNAPP; BECK, 2008). Especificamente para o tratamento do TAG, a TCC auxilia os pacientes a detectarem sinais desencadeantes de ansiedade e a aprender habilidades de enfrentamento, que visam os sintomas psíquicos e 27 somáticos da ansiedade (BORKOVEC; RUSCIO, 2001) e seus resultados parecem se manter relativamente satisfatórios a longo prazo (CUIJPERS et al., 2014). Referências ANDRADE, L.; WALTERS, E. E.; GENTIL, V. et al. Prevalence of ICD-10 mental disorders in a catchment area in the city of São Paulo, Brazil. Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology, n. 37(7), p. 316-325, [s. l.], 2002. Disponível em: https:// pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12111023/. Acesso em: 29 ago. 2022. ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. 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Conceitos acerca do estresse De acordo com os estudos de Lipp e Malagris (2001), o estresse é um conjunto de reações do organismo, com fatores psicológicos e físicos, que disparam quando o indivíduo se vê em uma situação em que há necessidade de se adaptar ou situação que gere medo, excitação, irritação, confusão e/ou extrema felicidade. Para Lazarus e Folkman (1984), não necessariamente será o evento, em si, que gerará o estresse, mas interpretação que o sujeito fará dela, assim sendo, a definição do que é estressante para uma pessoa, não necessariamente será estressante para outra, ou seja, as pessoas podem reagir de formas diferentes diante do mesmo estímulo. Lipp e Malagris (2011) afirmam que o estresse é um processo que visa reestabelecer o equilíbrio do organismo. Esse processo de restabelecer o equilíbrio dos organismos é dividido em quatro fases, que, segundo Lipp (2000), são: alerta, resistência, quase exaustão e exaustão, descritas a seguir, no Quadro 1. Quadro 1 – Fases com as principais características relacionadas ao estresse Fase Principais características Alerta. • Conjunto de processos naturais de respostas a estressores, geralmente, iguais para todas as pessoas, ou seja, um alarme natural. • Sintomas, como sudorese excessiva, taquicardia, respiração ofegante e picos de hipertensão (MALAGRIS, 2006; SELYE,1936). Resistência. • O organismo tenta reestabelecer a homeostase interna, dispendendo muita energia para que sobreviva e consiga eliminar ou se adaptar a situação (LIPP; MALAGRIS, 2001). • Sintomas o cansaço excessivo, problemas de memória e dúvidas sobre si mesmo. 32 Quase exaustão. • O organismo inicia um processo de desorganização emocional, tornan- do-se vulnerável biologicamente. • Processo de adoecimento ocorre. • Nesse estágio, o reestabelecimento da saúde já traz consigo mais se- quelas e desgastes, podendo aparecer doenças causadas pelo enfra- quecimento (LIPP; MALAGRIS, 2006). Exaustão. • Quando o organismo não consegue reestruturar seu equilíbrio e a ener- gia para essa adaptação se extingue. • O adoecimento grave pode ocorrer, e o reestabelecimento completo é quase impossível, essa é a última fase, a exaustão (LIPP; MALAGRIS, 2011). Fonte: elaborado pela autora. Vale salientar, conforme Lipp e Malagris (2001), que não necessariamente todos os indivíduos devam passar por todas as fases mencionadas acima, ou seja, no caso da pessoa se adaptar, ou até mesmo o gerador de estresse ser eliminado, automaticamente os sintomas ocasionados pelo estresse reduzem ou cessam. Em contrapartida, caso o estressor perpetue ou a adaptação do sujeito não ocorra, tende a avençar pelas fases de forma sequencial (LIPP, 2000). Os estressores podem ser externos e internos. Os externos são considerados aqueles que apresentam sua origem externamente, ou seja, nas outras pessoas ou no ambiente, como, por exemplo, na adolescência, responsabilidades excessivas, mudanças significativas ou frequentes, morte na família, certos métodos de ensino escolar não adaptados para a realidade dos alunos, conflitos emocionais, punições, pais e professores estressados, escolha profissional e vestibular; e, na fase adulta, com o casamento, perda do emprego, dificuldades financeiras, crise no trabalho, morte do cônjuge, entre outros (GONZAGA, 2011; LIPP, 2019). Com referência aos fatores internos, por sua vez, são aqueles relacionados com características próprias do indivíduo, sua história de 33 vida, seu modo de pensar, sentir e agir. Caracterizam-se na adolescência: ansiedade, timidez, autoestima, insegurança, medo de rejeição, medo do fracasso, desacordos entre expectativas e exigências de sucesso e o verdadeiro potencial (GONZAGA, 2011; LIPP, 2019). Para os autores, na fase adulta, percebe-se a ansiedade, depressão, comportamentos obsessivos compulsivos, raiva e crenças irracionais. A adolescência é a fase de maior vulnerabilidade ao estresse e isso ocorre devido a quantidade de fatores que influenciam essa fase, desde as mudanças hormonais, descoberta da sexualidade, as tecnologias e também as escolhas profissionais (LIPP; MALAGRIS; NOVAIS, 2007). Os sintomas apresentados podem ser: dificuldades de memória, alteração no apetite, cansaço constante, tensão muscular, dúvidas quanto a si próprio, insônia, irritabilidade excessiva, ansiedade ou angústia diárias, depressão, apatia, uso de substâncias ilícitas e/ou uso de álcool, a fim de sentir bem-estar (LIPP et al., 2007). O estresse na fase adulta pode ser notado por meio do aparecimento dos sintomas: respiração rápida, sudorese palmar, taquicardia, hiperacidez gástrica, cefaleia, dificuldade de relacionamento interpessoal, sensação de estar doente sem a presença de problemas físicos, desinteresse por qualquer atividade não relacionada ao motivo causador do estresse, irritabilidade, ansiedade, depressão e raiva (MALAGRIS; FIORITO; CARAÍBA, 2006). O diagnóstico do estresse pode ser feito por meio de vários instrumentos (testes psicológicos, de uso restrito do psicólogo), como o Manual do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos (LIPP, 2000). No caso dos adolescentes, existe a escada de Stress para Adolescentes (ESA), de Tricoli e Lipp (2000), e acerca das crianças temos a Escala de Stress Infantil (ESI), de Lipp e Lucarelli (1998). A terapêutica, no caso dos adultos, pode ser feita por meio do Treino do controle do estresse (LIPP, 1984), que afirma que os quatro pilares para 34 se controlar o stress são: reestruturação do pensamento, alimentação balanceada, exercícios físicos e relaxamento mental e físico. Segundo Lipp, Pereira e Sadir (2005), por meio do Treino do Controle do estresse (LIPP, 1984), o sujeitoaprende não só o que é estresse qualidade de vida, como também: a identificar seus sintomas e a intensidade dos mesmos; a diferenciar as fontes internas das fontes externas de estresse, afastando-se destas, quando for possível; modificando seu pensamento, para poder conseguir eliminar os estressores internos; lidar melhor com a ansiedade; técnicas para lidar com o estresse e aprende a utilizar a parte boa de si, visando maior produtividade. Nos adolescentes, a terapêutica conta com um componente a mais, os pais. Estes podem auxiliar, segundo Lipp et al. (2007), por meio de posturas que contenham compreensão: da fase de rebeldia; análise do passado: relembrar de como era quando tinha a idade do filho; disciplina: equilíbrio entre disciplina e liberdade, deixar que o adolescente participe na tomada de decisões importes; firmeza: mostrar-se seguro na tomada de decisões, só imponha regras que você e ele consigam cumprir; saber ouvir: converse com ele, dê a devida atenção e entenda a intensidade das situações e emoções que ele está vivenciando; incentivar: ajude seu filho a confiar nele mesmo, seja por meio do esporte, da música, da arte; enfatize o positivo: elogie as características positivas do seu filho. O estresse influencia o jovem que está em processo de escolha profissional e prestes a prestar o vestibular podendo, segundo Gonzaga (2011), implicar não só na postergação ou insegurança na escolha profissional, como também prejudica o processo da prova. Isso se dá, pois a soma dos estressores com as consequências do estresse acaba impactando direto no desempenho e no processo de aprendizado devido as características dos sintomas e consequências já mencionados. 35 2. Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) Historicamente, as consequências emocionais da exposição a traumas têm sido descritas há muitos anos na literatura. O conceito surgiu a partir dos estudos de veteranos e sobreviventes civis de guerra, com sua inclusão, em 1980, na terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-III). Com a evolução dos estudos, o conceito sofreu algumas alterações, que podem ser observadas no Quadro 2. Quadro 2 – Evolução do conceito de TEPT DSM-III (1980). Exposição a um evento catastrófico = pessoa traumatizada. DSM-IV (1994). Exposição a um evento catastrófico mais resposta emocional intensa (medo, desespero, ou horror) = pessoa traumatizada. DSM-5 (2014). Experiência traumática mais desenvolvimento de sintomas = pessoa traumatizada. Fonte: elaborado pela autora. Para Vazquez-Aquino (2019), o TEPT é considerado uma síndrome composta por três tipos de sintomas, segundo a APA (2014): 1) intrusões associadas ao fato traumático, como imagens recorrentes, sensação de se reviver o trauma na forma de flashbacks, pesadelos, pensamentos e reações fisiológicas ou psicológicas de intenso sofrimento; 2) evitação de estímulos associados ao trauma com embotamento afetivo; perda de interesse em atividades antes significativas, alterações negativas em cognição e no estado de humor; 3) alteração marcante na excitação e na reatividade com transtornos de sono, concentração, hipervigilância, irritabilidade, sobressalto exagerado. 36 Além disso, outras fontes podem estar correlacionadas, entre elas: exposições a eventos de cunho violento, como as guerras; ameaça ou ocorrência real de agressão física (exemplo: assalto) e violência sexual; sequestro, ataque terrorista, tortura, encarceramento como prisioneiro de guerra; desastres naturais ou perpetrados pelo homem; acidentes aéreos e/ou automobilísticos graves. No que tange às principais características do TEPT, três principais fatores devem ser considerados, que podem ser observados no Quadro 3 a seguir. Quadro 3 – Fatores correlacionados ao TEPT Revivência. Pensamentos invasivos e lembranças do trauma. Esquiva. Retraimento social e fuga de situações. Hiperreatividade e/ou hiperfunção do sistema nervoso autônomo. Fonte: elaborado pela autora. A partir do exposto no Quadro 3, considera-se a revivência dos sintomas a persistência de pensamentos, sensações e comportamentos relacionados ao evento traumático. Tais memórias são intrusivas, impossibilitando outros tipos de pensamentos, trazendo à tona sintomas de desgaste psicológico (exemplo: terror) ou reações fisiológicas anormais (exemplos: pulso acelerado, respiração rápida ou sudorese). Em relação aos sintomas de hipervigilância, ressalta- se a reação de sobressalto, reação de proteção exagerada a ruídos ou movimentos dos outros. E, não menos importante os sintomas de evitação/ entorpecimento compreendidos como anestesia emocional, ou seja, tendência a reprimir sentimentos de cunho positivo, bem como negativos. Comumente relacionado com evitação de pensamentos, sensações, atividades, pessoas e locais relacionados ao evento traumático original. 37 3. Prevenção e tratamento A intervenção psicológica deverá ser realizada, preferencialmente, de 24 até 72 horas após o evento, para que ocorra a dessensibilização do estresse agudo e profilaxia do stress pós-traumático. Experimentos mostraram que o relato de uma vivência traumática evoca emoções e respostas fisiológicas aversivas na hora, mas têm efeitos benéficos em longo prazo. Expressar emoções que foram guardadas durante muito tempo, constitui o encerramento de um trabalho ativo e desgastante de inibição, que estava prejudicando a saúde do sujeito. Quadro 4–Objetivos do tratamento Recuperar o senso pessoal de controle e estabilidade. A integração do desconhecido, do inaceitável, do inesperado e do incompreensível. Facilitar ao paciente ver o evento crítico como uma exceção. Comparação com o que poderia ter acontecido de ainda pior. Reintepretação do evento traumático, mudando de catastrófico para ruim. Redução da importância do mesmo no esquema maior da vida. Fonte: elaborado pela autora. Na psicoterapia, dentro da abordagem cognitivo comportamental, é possível ressignificar pensamentos e crenças irracionais, bem como as percepções relacionadas ao transtorno, desenvolver estratégias de lidar com tais situações com menos sofrimento, que se desencadeie menos processos de estresse ou acometimento dos indivíduos. Para isso, algumas técnicas são indicadas, que podem ser observadas abaixo no Quadro 5. 38 Quadro 5 – Principais técnicas Técnicas de exposição gradual. Trabalhar crenças e sentimentos negativos relacionados à culpa. Reestruturação dos conteúdos evocados por meio da psicoeducação e reestruturação cognitiva. Outro aspecto importante da recuperação de traumas é aprender com o que aconteceu, assim como ensinar ao indivíduo formas de se proteger. Intervenção junto à família, se necessário. Fonte: elaborado pela autora. Contudo, é clara a importância de um tratamento com foco na Terapia Cognitivo Comportamental (TCC), visando a redução de danos e melhora do quadro do paciente. Referências ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-5, 2014. Disponível em: http://www.niip.com.br/wp- content/uploads/2018/06/Manual-Diagnosico-e-Estatistico-de-Transtornos-Mentais- DSM-5-1-pdf.pdf. Acesso em: 29 ago. 2022. GONZAGA, L. R. V. Relação entre vocação, escolha profissional e nível de stress. Mestrado em Psicologia como profissão e ciência. Campinas: PUC Campinas, 2011. LAZARUS, R. S.; FOLKMAN, S. Stress. Appraisal and Coping. New York: Springer, 1984. LIPP, M. E. N. Terapia Racional-Emotiva Comportamental para o estresse. In: LIPP, M. E. 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Estudos de Psicologia, n. 23(4), p. 391- 398. Campinas, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/j/estpsi/a/ gKKZ5thXdvSrkB9kNWXKcFK/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 29 ago. 2022. SELYE, H. The syndrome produced by diverse noxious agents. Nature, n. 138, p. 32- 34, [s. l.], 1936. TRICOLI, V. C.; LIPP, M. E. N. A escala de stress para adolescentes (ESA). São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. VAZQUEZ-AQUINO, S. Tratamento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático com a técnica “memória-tempo-processamento”, uma metáfora de resgate em doze passos. In: LIPP, M.E. N.; LOPES, T. M.; SPADARI, G. F. (orgs). Terapia racional- emotiva comportamental na teoria e na prática clínica, p. 336-364. Novo Hamburgo: Sinopsys, 2019. https://www.scielo.br/j/estpsi/a/gKKZ5thXdvSrkB9kNWXKcFK/?format=pdf&lang=pt https://www.scielo.br/j/estpsi/a/gKKZ5thXdvSrkB9kNWXKcFK/?format=pdf&lang=pt 40 Estudos de Casos Clínicos – Infância e Adolescência Autoria: Gabriela Fabbro Spadari Leitura crítica: Rogério Adriano Bosso Objetivos • Compreender os principais conceitos sobre Transtorno Afetivo Bipolar (TAB). • Conhecer a interação em TAB infantil e terapia cognitivo comportamental (TCC). • Entender as principais formas de tratamento da depressão infantil, por meio da TCC. 41 1. Transtorno Afetivo Bipolar (TAB): etiologia e sintomas O Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) é caracterizado por oscilações importantes do humor entre a exaltação ou euforia e depressão, apresentando um curso recorrente e crônico, implicando em elevado grau de morbidade e incapacidade na vida do indivíduo (SANCHES; JORGE, 2004). O TAB é considerado como um dos transtornos mentais potencialmente graves e prevalentes. Tem como característica a ocorrência de episódios depressivos e episódios maníacos ou mistos, no TAB Tipo I, ou hipomaníacos, no Tipo II, sucedidos ou intercalados com períodos de remissão, tendo um curso prolongado, de início precoce (CLEMENTE, 2015). O diagnóstico de TAB, na infância, é bem controverso em torno dos sintomas apresentados por crianças e adolescentes (RODHE; TRAMONTINA, 2005). Segundo Braga, Kunzler e Hua (2008), o TAB na infância e adolescência, se apresenta clinicamente diferente do que na vida adulta, para outros, se apresenta clinicamente de forma semelhante aos adultos, com episódios claros de alteração do humor (mania ou depressão), com alteração do funcionamento basal (SANTOS; KRIEGER, 2014). O tratamento do TAB é realizado, principalmente, com medicamentos estabilizadores de humor (NETO, 2004), porém, há evidências sugerindo que a psicoterapia pode modificar o curso do transtorno bipolar, podendo melhorar o funcionamento social e ocupacional destes pacientes. A abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) tem sido muito estudada nos casos de TAB, com boas evidências sobre a eficácia no tratamento dos pacientes bipolares (KNAPP; ISOLAN, 2005). A TCC é uma abordagem teórica que foi desenvolvida a partir dos trabalhos de Albert Ellis, nos anos 1950 ,e por Aaron Beck, no início dos 42 anos 1960, tendo como pressuposto que não é a situação por si só que determina o que as pessoas sentem, mas o modo como interpretam uma situação (BECK, 1997). Sendo assim, objetiva reestruturar e ressignificar os pensamentos distorcidos, desenvolvendo soluçoes práticas, produzindo, assim, mudanças e melhora emocional (KNAPP; BECK, 2008). Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) O Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) atinge, aproximadamente, 30 milhões de pessoas no mundo todo, segundo as estimativas da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2008), podendo gerar um prejuízo na capacidade funcional para a vida do indivíduo, dependendo da duração e gravidade dos sintomas (FU-I, 2007). De acordo com o Código Internacional de Doenças- CID-10 (WHO, 1993), o TAB é caracterizado pela ocorrência de dois ou mais episódios graves de alterações do humor e do nível de atividade do indivíduo, podendo ser tanto para a elevação do humor e o aumento da energia e da atividade, considerado como hipomania ou mania, como para um rebaixamento do humor, com redução de energia e da atividade, ou seja, depressão (WHO, 1993). Este transtorno se diferencia em dois principais tipos: o Tipo I, onde deve ocorrer pelo menos uma fase de mania, que pode ter sido precedido ou seguido de episódios hipomaníacos ou depressivos maiores; o Tipo II, que é constituído por um ou mais episódios depressivos maiores e pelo menos um episódio hipomaníaco (BOSAIPO; BORGES; JURUENA, 2017, RENK, 2014). Além disso, considera-se que os episódios apresentam diferentes tempos de durações, ou seja, na fase maníaca, a duração mínima deverá ser de uma semana; na fase de hipomania, o período deverá ser de pelo menos quatro dias consecutivos; e no episódio depressivo maior, os sintomas devem estar presentes pelo período de duas semanas, representando uma mudança ao funcionamento anterior (SADOCK; 43 SADOCK, 2011). Os sintomas do TAB devem estar presentes na maior parte do dia, por quase todos os dias (APA, 2014). De acordo com o Manual Diagnóstico Estatístico de Transtorno Mentais– DSM-V (APA, 2014), no TAB Tipo I os sintomas dos episódios maníacos são marcados, principalmente, pela presença de humor anormal, elevado, expansivo ou irritável, por determinado período. Também ocorre um aumento persistente da energia, presente na maior parte do dia e redução da necessidade de sono, por pelo menos uma semana. Podem ocorrer mudanças rápidas e breves do humor, alternando entre euforia, disforia e irritabilidade, denotando como labilidade (CLEMENTE, 2015). Neste período, a pessoa pode iniciar vários projetos novos ao mesmo tempo, apresentar autoestima inflada, com variação da autoconfiança, sem críticas e acentuada grandiosidade, podendo apresentar delírios (APA, 2014). A fala pode ficar acelerada, não se atendo ao que é dito, com fuga de ideias e mudanças repentinas dos tópicos, devido ao pensamento mais acelerado (WAGNER, 2009). Ocorre distratibilidade e aumento da impulsividade, da fantasia e do comportamento sexual. Nesta fase, devido ao humor expansivo, aos pensamentos de grandiosidade e juízo crítico prejudicado podem levar a comportamentos imprudentes, como compras em excesso, direção perigosa, descontrole financeiro e promiscuidade sexual (RODRIGUES, 2017). Em contrapartida, a fase depressiva no TAB Tipo I, é marcada por humor deprimido e/ou diminuição/ perda de prazer e interesse nas atividades, sendo mais duradoura e incapacitante ao longo do tempo (DIAS et al., 2010). Pode apresentar perda ou ganho de peso, insônia ou hipersonia, agitação ou retardo psicomotor, fadiga ou perda de energia, baixa autoestima com sentimentos de inutilidade e culpa, diminuição da concentração e capacidade de pensar e pensamentos de morte (ALVAREZ, 2010). No Tipo II, os sintomas são semelhantes 44 ao Tipo I, sendo que a característica predominante é a impulsividade (APA, 2014). Contudo, segundo Santos e Krieger (2014), a intensidade e a duração da hipomania são mais brandos, com menos prejuízos funcionais, ou seja, o episodio não é grave a ponto de causar prejuizo acentuado no funcionamento social ou profissional ou para necessitar de hospitalização, não tendo caracteristicas psicoticas (APA, 2014). Todavia, ressalta-se que, em ambos os tipos de TAB, acarreta o risco de suicídio, estimado em pelo menos quinze vezes mais que a população geral(APA,2014). Incluem-se também no DSM-V, outros transtornos relacionados, que podem ser visualizados no Quadro 1, a seguir, com a forma resumida dos subtipos do Transtorno Bipolar (BOSAIPO; BORGES; JURUENA, 2017; APA, 2014). Quadro 1– Critérios diagnóicos Transtorno Critérios Bipolar tipo I. É necessária a ocorrência de pelo menos um episódio maníaco, que pode ter sido antecedido ou seguido de episódios hipomanía- cos ou depressivos. Bipolar tipo II. É necessária a ocorrência de um ou mais episódios depressivos maiores e, pelo menos, um episódio hipomaníaco atual ou anterior. Ciclotímico. É caracterizado por períodos com sintomas hipomaníacos, que não preenchem os critérios para um episódio hipomaníaco; e pe- ríodos com sintomas depressivos, que não satisfazem os critérios para um episódio depressivo maior. Os sintomas precisam ser per- sistentes, por pelo menos dois anos (um ano para crianças e ado- lescentes) e os intervalos dos sintomas não podem durar mais de dois meses. Bipolar e transtorno relacionado induzido por substância/ medi- camento. Apresenta as características de mania, hipomania ou depressão, entretanto, os sintomas se desenvolvem durante ou logo após a intoxicação por substância ou exposição a uma medicação; ou a substância/medicamento envolvido é capaz de produzir tais sinto- mas. É necessário haver confirmação da substância/ medicamen- to, por meio de evidências da história clínica, de exames físicos ou laboratoriais. 45 Bipolar e transtorno re- lacionado devido a ou- tra condição médica. Os sintomas de humor ocorrem como consequência fisiopatológi- ca direta de uma outra condição médica, sendo necessário haver evidências decorrentes da história clínica, de exames físicos ou laboratoriais. Outro transtorno bipo- lar e transtorno relacio- nado especificado. Este se aplica quando os sintomas característicos do transtorno bipolar e transtorno relacionado causam sofrimento clinicamen- te significativo, prejuízo nas áreas social, ocupacional ou outras áreas importantes do funcionamento, mas não preenchem comple- tamente os critérios para qualquer tipo de transtorno dessa classe, e o clínico escolhe comunicar a razão específica pela qual a mani- festação não preenche os critérios para qualquer transtorno bipolar ou relacionado. Bipolar e transtorno relacionado não espe- cificado Este se aplica quando os sintomas característicos do transtorno bipolar e transtorno relacionado, causam sofrimento clinicamen- te significativo, prejuízo nas áreas social, ocupacional ou outras áreas importantes do funcionamento predominam, mas não preen- chem completamente os critérios para qualquer tipo de transtorno dessa classe, e o clínico escolhe não comunicar a razão específica pela qual a manifestação não preenche os critérios para qualquer transtorno bipolar ou relacionado, pois não há informação suficien- te para fazer um diagnóstico mais específico. Fonte: adaptado de APA (2014); Bosaipo, Borges e; Juruena (2017). De acordo com Santos e Krieger (2014), o TAB de início precoce, se apresenta clinicamente de forma semelhante aos adultos, com episódios claros de alteração do humor (mania ou depressão), com alteração do funcionamento basal (SANTOS; KRIEGER, 2014). Sendo assim, veremos a respeito das principais características do TAB em crianças. Transtorno Afetivo Bipolar na infância Apesar de existirem incertezas referentes ao diagnóstico de TAB de início precoce, esse transtorno afeta tanto o desenvolvimento, como o crescimento emocional das crianças e adolescentes (RODHE; TRAMONTINA, 2005). Nessa faixa etária, o TAB pode se apresentar de 46 forma contínua, por meio de uma alternância de episódios maníacos e depressivos, conhecida como ciclagem rápida, onde a alteração do humor mais marcante é a irritabilidade, com poucos períodos de humor eutímico entre os episódios (WAGNER, 2009). Um dos desafios encontrados na identificação de transtornos psiquiátricos na infância, é decorrente da fase de desenvolvimento em que a criança se encontra, pois tendem a expressar seus problemas e desconfortos emocionais, por meio de comportamentos desadaptados e desviantes (BIRD; DUARTE, 2002). Outro desafio, que se encontra ao realizar um diagnóstico psiquiátrico na infância e adolescência, é a coincidência entre fenômenos próprios do desenvolvimento com sintomas de vários transtornos mentais. Considera-se também que a falta de um padrão de ajustamento pré- mórbido bem definido, que sirva como parâmetro de comparação para avaliar a alteração do funcionamento, leva a uma dificuldade a mais ao realizar o diagnóstico de TAB na infância (CLEMENTE, 2015). Apesar de haver sugestões de sintomas equivalentes ou substituto para essa fase, tanto no DSM-V (APA, 2014), como na CID-10 (WHO, 1993), estes parecem não ser suficientes em alguns casos para concluir o diagnóstico de TAB na infância/ adolescência (BRAGA; KUNZLER; HUA, 2008). Uma vez que, segundo Lee Fui (2004), existem grupos de crianças que apresentam todos os sintomas da classificação de TAB, tanto para o Tipo I como para o Tipo II, e um outro grupo que apresenta somente alguns sintomas, que não são considerados os principais, mas que também apresentam um severo comprometimento no funcionamento global (LEE FU-I, 2004). Nos episódios de mania, nesta faixa etária, podem ocorrer maior hiperatividade, excitação constante, irritabilidade e labilidade emocional, podendo apresentar também sintomas de euforia e grandiosidade, segundo Teles (2016) e Wagner (2009), verborragia e hipersexualidade, conforme Santos e Krieger (2014), e sintomas físicos, como dores 47 de cabeça, dores abdominais e cansaço (CLEMENTE, 2015). Podem apresentar também maior distratibilidade, com redução da atenção, comportamento agressivo intermitente ou sintomas mistos, ciclos rápidos, segundo Moreno (2005) ou ciclos ultrarrápidos, conforme Boarati, Cavalcanti e Fu-i, (2006), quando a alternância se dá em períodos de dias a semanas (CLEMENTE, 2015). Nestes ciclos, segundo Lee Fu-i (2004) e Rodhe e Tramontina (2005), pode acontecer alternância entre tristeza, irritabilidade ou euforia, com bruscas alterações diárias de humor. Também pode ocorrer sintomas depressivos mistos, conforme Moraes, Silva, e Andrade (2007), momentos de choro isolados, auto e hetero agressão, fala mais rápida que o de costume e diminuição da necessidade de sono, pontuado por Lee Fu-i, (2000) e Braga et al. (2008), podendo durar horas ou dias. Podem apresentar agitação, sono, apetite irregular, sintomas psicóticos e ideação suicida conforme Braga et al. (2008) e Sadock e Sadock (2011). Vale ressaltar que os episódios de mania na infância são raros (SANTOS; KRIEGER, 2014). Já na fase depressiva, podem apresentar retardo psicomotor alternando com agitação, presença de sintomas psicóticos, reações de (hipo)mania após uso de antidepressivo, hipersonia, hiperfagia ou irritabilidade (LEE FU-I, 2004; TELES, 2016). O TAB pode apresentar comorbidades com outros transtornos (BOARATI; CAVALCANTI; FU-I, 2006), como: transtornos de ansiedade, transtorno disruptivo, transtorno do controle de impulsos ou da conduta, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e transtorno por uso de substância (PETERSEN; WAINER, 2011; APA, 2014). Existe uma semelhança do quadro de hipomania com o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), podendo ocasionar confusão entre estes dois Transtornos (LEE FU I, 2000). O TAB, com início precoce, pode ocasionar grandes prejuízos ao desenvolvimento integral da criança (MORAES; SILVA; DE ANDRADE, 2007). Portanto, para evitar prejuízos futuros relacionados ao desenvolvimento infantil, o diagnóstico e tratamento precoces são importantes e 48 necessários para reduzir a cronicidade, morbidade, mortalidade relacionada a tal condição e ao sofrimento do paciente (LEE FU I, 2000; BRAGA, et al., 2008; WAGNER, 2009). Sendo assim, o foco se dá ao tratamento do TAB. O tratamento do
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