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RELIGIÕES AFRICANAS E AMERÍNDIAS - Joachim Andrade

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RELIGIÕES AFRICANAS E 
AMERÍNDIAS 
AULA 1 
 
Prof. Joachim Andrade 
CONVERSA INICIAL 
UMA APROXIMAÇÃO AO CONTINENTE AFRICANO: ASPECTOS 
RELEVANTES DA FORMAÇÃO DA CULTURA E IDENTIDADE 
O continente africano é fascinante por diversos motivos. Possui uma 
geografia exuberante com imensa diversidade de desertos, terras férteis, florestas, 
inúmeros rios, belas montanhas e vasta região litorânea. É lugar de animais 
selvagens de todo tipo. Além disso, é culturalmente exuberante e palco de uma 
história de milênios com numerosos povos e civilizações. Situado no ponto 
estratégico, também é berço da humanidade. A respeito dele, Sarde Neto (2019, 
p. 9) assinala: 
Desconhecer sua história é ignorar as trajetórias de nossos antepassados; é, sobretudo, colocar um 
“véu” sobre nossas origens. De lá, vieram os vários povos que colaboraram para a formação do povo 
brasileiro e que, junto com os indígenas, são os principais responsáveis pelo molde étnico-cultural que 
constitui as identidades brasílicas. 
Nesta aula, nossa tarefa é explorar a importância do estudo da africanidade 
e mostrar as formas as quais que esse povo construiu sua visão e religiosidade, 
que influenciou posteriormente a matriz religiosa brasileira. Ao tratarmos dos 
principais aspectos físicos e humanos da África, isto é, de seus territórios e suas 
histórias, culturas e diversidades, iremos apontar certos aspectos da religiosidade 
e visão do mundo que esse povo construiu e de que forma essa visão influencia 
a vivência cotidiana. Abrangemos, ainda, temas de suma importância, como a 
escravidão, o direito dos povos e as religiões de matriz africana, a fim de compilar 
subsídios para melhor compreensão da realidade atual brasileira. 
TEMA 1 – MAPEAMENTO GERAL DO CONTINENTE 
AFRICANO 
A África é um continente antigo. Existem evidências mais antigas sobre os 
hominídeos e o homo sapiens do planeta. O continente é considerado o berço da 
humanidade e das civilizações e possui os primeiros indícios da origem do ser 
humano. Construiu sua história e desenvolveu sua civilização de maneira peculiar, 
talvez mais distinta das outras civilizações. Conforme assinala Saraiva (2015, p. 
17): 
Os estudos arqueológicos e paleontológicos de Ifê, Nok e do vale do Rift confirmaram a primazia 
africana na gênese da humanidade. O estudo das clássicas práticas agrícolas e da domesticação de 
animais, entre outros processos espetaculares de redefinição do Egito antigo como parte de uma 
civilização de origem africana, foram fundamentais para o desenvolvimento da confiança 
historiográfica que sedimenta hoje certo sentido de futuro. 
Existem diversas versões sobre a origem do nome do continente. Com base 
em pesquisas, Sarde Neto (2019) busca encontrar as fontes. Consultando diversos 
autores, aponta: 
O nome África, de acordo com Castro (1981), vem de Afrigha ou Afrikigah, termos usados pelos 
romanos em referência à região de Túnis. Segundo Hugon (2017), a origem da palavra África é o termo 
Ifrîqiya, derivado do nome berbere Ifri, que significa “rochas”, ou de Afris, termo que designa a 
população habitante do norte da Tunísia. Cocamaro (2005), por sua vez, afirma que o nome deriva de 
Avringa ou Afri, denominação de uma tribo berbere descendente dos antigos númidas que habitavam 
a região da Numídia, entre o país de Cartago e a atual Mauritânia. (Sarde Neto, 2019, p. 17) 
A questão da origem se torna mais evidente depois das conquistas romanas 
de Cartago, norte da África. Para os romanos, a região de Cartago era considerada 
como espuma, ou aquela região que se encontra do outro lado do Mar 
Mediterrâneo. Devido às composições nas regiões litorâneas com a imensa 
presença do deserto, as águas formavam muita espuma, assim para os romanos 
era conhecida como “a terra que ficava do outro lado da espuma do mar”. As 
nomenclaturas África Negra e, depois, África Subsaariana foram sucessivamente 
utilizadas para designar os 49 estados ao sul do Saara dos 54 reconhecidos pelas 
Nações Unidas (Sarde Neto, 2019, p. 17). 
O continente africano apresenta uma diversidade de mais de 800 etnias e 
línguas espalhadas por 54 países e aproximados 30,3 milhões de km2 (Simielli, 
2013). Os climas e ambientes naturais são muito diversos, com desertos, savanas, 
florestas e vegetações mediterrâneas. O relevo é composto de planícies, vales, 
planaltos e montanhas. 
Para compreender de modo simples, no contexto da geografia esse 
continente pode ser dividido em diversos mundos específicos. A parte norte da 
África abrange os países que possuem cultura árabe, e seu povo parece ter 
migrado do Oriente Médio; alguns antropólogos afirmam que está entre aquelas 
dez tribos perdidas de Israel. Os países que se encontram na parte central do 
continente, predominantemente os do sul do Deserto de Saara e subsaarianos, 
carregam predominantemente a cultura nômade. A região sul do continente é 
agrícola, ainda que tenha uma parte do Deserto de Kalahari e de Namíbia. 
Em termos de clima, o continente pode ser dividido em seis zonas climáticas: 
mediterrânea, saheliana, tropical seca, tropical úmida, equatorial e desértica 
(Unep, 2008). Essa distribuição mostra a dinâmica da economia do continente, 
tanto em relação aos recursos hídricos quanto à vida animal e vegetal, com 
influência direta sobre as populações humanas. As populações desenvolvem suas 
atividades como nômades, pequenos agricultores e pastores, apresentando as 
dinâmicas de suas relações. 
Na zona mediterrânea, localizada nos extremos norte e sul do continente, os 
verões são quentes e secos, e os invernos são suaves e úmidos. Na saheliana, 
existem variações nas estações, as chuvas são baixas e, portanto, se caracterizam 
pela criação de ovelhas, gado e pequenos agricultores. 
A zona tropical úmida apresenta um elevado volume de chuvas e menor 
duração da estação de seca. Na zona tropical seca, ao norte e ao sul da zona 
tropical úmida, encontram-se áreas de clima tropical marcadas por estações secas 
relativamente longas, em que a chuva e a temperatura são mais sazonais. Na zona 
equatorial, a precipitação está presente durante todo o ano, e o período seco, 
quando ocorre, é extremamente breve. Por fim, na zona desértica há ocorrência 
de pouca chuva e as temperaturas diurnas podem ser extremamente altas (Unep, 
2008). 
1.1 MAPEANDO OS POVOS E CULTURAS 
Existe certo preconceito em relação aos povos negros da África. Antes da 
colonização, eram chamados de povo primitivo, grosseiro, sem a mínima cultura 
etc. Mesmo sem falar das antigas culturas do Egito, da Núbia e da Etiópia, os 
povos africanos evoluíram. Do final do século XII até o final do século XVI, a África 
Negra passou por um grande crescimento econômico, político e cultural. Isso 
pode ser visto com algumas construções mais antigas tanto no Zimbabwe quanto 
em outras regiões. Como afirma Hans Kung (2004, p. 43): 
A cidade do Grande Zimbabwe, por exemplo, com suas gigantescas construções graníticas: ao sul do 
Saara não existem nenhum monumento cultural maior e mais impressionante do que essa antiga 
capital. Em nosso século ela haveria de dar nome ao país inteiro. dzimba dza mabwe: casa de pedra. 
Ou dizimba waye: casas veneráveis. 
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – 
Unesco (2019) declarou 2011 como o Ano Internacional dos Afrodescendentes, 
um reconhecimento histórico da África como centro de civilização e 
conhecimento, como constituinte das culturas do mundo. O continente africano 
está em todas as partes, nos rostos das pessoas, nas vestimentas, na arte, na 
música e no sangue das gentes. 
Os povos africanos foram divididos pelas guerras, pela diáspora e pela 
escravidão. Na Conferência de Berlim, realizada entre 15 de novembro de 1884 e 
26 de fevereiro de 1885, os países europeus chegaram ao acordo pelos seus 
interesses coloniais sobre as imensuráveis riquezas da África. Os países 
colonizadostinham belezas naturais que foram exploradas pelas formas mais 
diversas. 
Com a abolição da escravidão, a África se tornou então objeto da história e 
de estudo das culturas e civilizações. Antropólogos e missionários começaram a 
se envolver em estudos e análises sobre as tribos e os clãs. Com esse enfoque, os 
povos africanos passaram a não ser mais vistos como primitivos, atrasados e, 
portanto, colonizados, mas sim como interlocutor, igual. Isso abriu possibilidades 
aos estudos sobre eles na base de epistemologias. 
A África é muito mais do que seca, fome, combates, campos de minas, 
conflito e narcotráfico. Recai sobre a humanidade a responsabilidade histórica, 
por exemplo, em relação à escravidão, o maior crime da história, que fragilizou e 
rompeu várias culturas e envolveu assassinatos, sequestros e torturas. O 
colonialismo e sua lógica de exploração deixaram feridas que ainda sangram. É 
preciso compreender também a imensidão do Saara, com seus aproximados 9 
milhões de km2 frequentados por camelos convertidos em caravanas pelos 
mercadores e que com grande destreza deslizaram pelas rotas do deserto 
durante milhares de anos. 
Não se pode compreender a África Subsaariana sem antes entender esse 
enorme bloco geográfico que é o Deserto do Saara, berço de grande quantidade 
de civilizações, lugar por onde o islamismo entrou no continente. Foram os 
cameleiros nas rotas do Saara que transportaram inúmeras riquezas e as culturas 
das grandes civilizações. Existem cidades mais antigas tanto em Mali como em 
Marrocos, mais antigas ainda, onde se desenvolveu a civilização árabe com a 
introdução do islamismo, que conservam seus famosos registros históricos e 
outros aspectos peculiares de cultura em grandes bibliotecas. 
Portanto, percebemos que a cultura africana é denominada pelos 
historiadores e antropólogos como plural. Isso se deve ao fato de que a 
diversidade caminha para uma diferença gigante até mesmo no próprio 
continente. Geralmente as pessoas se referem à África como país, esquecendo 
que, de fato, é um continente que possui mais de 50 países espalhados pela vasta 
extensão de geografias, culturas e religiosidades diferentes. 
Nesse continente foram elaboradas as estruturas das sociedades como uma 
unidade para atender às necessidades cotidianas. Surgiram idiomas, religiões, 
regimes políticos e o exercício de atividades econômicas, isto é, uma vasta ação 
cultural constante que determinou o povo africano com uma cultura rica e 
milenar. Nessa região surgiram diversos clãs, reinos e civilizações, com seus 
modos específicos de elaborar as relações. Esses reinos e civilizações que faziam 
parte de uma mesma unidade histórico-cultural foram repartidos e recortados 
pelos impérios europeus para seus interesses. 
Divididos arbitrariamente, deram origem a novos países traçados não pelo 
conteúdo cultural, étnico e ancestral, mas pelos interesses dos europeus que, na 
Conferência de Berlim, conforme citamos, repartiram a África de acordo com os 
interesses exploratórios de cada império. Essas repartições criaram limites 
artificiais, rompendo os povos ancestrais que, apesar da imensa diversidade, 
foram colocados em um mesmo Estado, no modelo econômico e político da 
Europa. São povos que, para além das divisões coloniais, contam com grande 
riqueza humana e de onde vieram os primeiros grandes pensadores. 
TEMA 2 – CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE 
CONFORME REGIÕES 
Existem muitos livros e artigos escritos por autores estrangeiros e nativos 
africanos sobre a religião, cultura e identidade africana. Há também os livros 
específicos, elaborado por antropólogos, que versam sobre as religiões. Tratando 
a identidade religiosa africana, precisamos entender que existem muitas 
identidades e a grande maioria se encontra nas religiões nativas, entretanto, 
quase todas possuem uma cosmovisão religiosa idêntica, somente alguns 
elementos menores se diferem em virtude de sua elaboração nos contextos 
geográficos específicos. Quando houve a entrada da tradição islâmica e do 
cristianismo, elas tiveram que passar por uma purificação, e era necessário 
adaptar suas cosmovisões para se adequar a essas tradições ou mesmo 
abandoná-las. 
Assim, encontramos as informações sobre a identidade cultural e religiosa 
do povo africano conforme as regiões distintas. Ao contrário do que se pensa, na 
África antes da chegada dos europeus não somente existiam povos organizados 
em tribos, mas também uma complexa organização social e familiar. Sem 
mencionar o Egito, havia diversos reinos e impérios bastante desenvolvidos em 
vários aspectos, como tecnológicos, econômicos, educacionais, culturais e 
religiosos. Podemos identificar alguns deles, conforme a região: no Sudão 
Ocidental, os reinos de Mali e Gao; no Sudão Central, os estados Hausa e Kanem-
Bornu; no Golfo de Guiné, os reinos Ioruba e Benin; na África central, o reino do 
Congo; na costa oriental da África, várias cidades-estado; e, mais tarde, no 
Zimbabwe, o reino Monomotapa, que haveria de acolher a população do Grande 
Zimbabwe (Bezerra, 2015). 
 Esses reinos tinham as próprias religiões. Assim, quando o comércio de 
escravos foi travado entre portugueses no Brasil e chefes africanos, diversas 
religiões africanas foram introduzidas em terras brasileiras e ganharam a 
identidade afro-brasileira no decorrer dos séculos. 
Na África Ocidental se encontra a religião africana que predominou no Brasil, 
a dos iorubas. É uma religião iniciática que possui, no centro cosmológico, 
o Orum, que é o céu como princípio organizado, o lugar da habitação do Deus 
Supremo, do Olorum e das divindades, os orixás. Além disso, possui também 
nesse centro cosmológico o Ayê, o mundo habitado pelos seres humanos e 
outras criaturas, proveniente da intervenção do Orum. O povo ioruba conhece o 
Olorum como o Ser Supremo e pelo seu papel na criação, porém, ainda assim, 
ele não é cultuado. 
Na morte, as componentes do ser humano retornam aos orixás que as 
redistribuem por meio dos recém-nascidos. Há, porém, componentes imortais, 
pois os espíritos podem voltar para a terra e tomar posse de certos centros ou 
instituições. 
A África Oriental comporta 100 milhões de habitantes pertencentes aos 
quatro grandes grupos linguísticos de toda a África, mas a maioria das pessoas 
fala línguas bantos. As características comuns das religiões dos povos bantos são 
o caráter de deus Olodum, o criador, assim como a das divindades ativas são dos 
heróis e dos ancestrais, consultados em seus santuários por médiuns em estado 
de transe. Os espíritos dos mortos também podem possuir os médiuns e recebem 
oferendas periódicas. Todos os povos da África Oriental conhecem a iniciação 
pubertária, e a maioria dos povos bantos pratica a circuncisão e a clitoridectomia 
ou a labiectomia. 
Na África Central, vivem cerca de 10 milhões de bantos, e os pigmeus da 
floresta tropical formam três grupos principais. Um deles são os mbutis, que 
acreditam que deus é o habitat, a mata. Não possuem sacerdote, não praticam 
adivinhação e têm ritos de passagem para os rapazes e moças. 
Na África do Sul, também emigraram vários grupos bantos. Na mitologia 
karanga, a realeza sagrada realizava o equilíbrio dos contrários, o calor e a 
umidade, simbolizados pelas princesas de vagina úmida e as de vagina seca. As 
primeiras deviam copular com a grande serpente aquática, às vezes chamada 
de serpente Arco-Íris, que é um ser sobrenatural presente entre muitos povos da 
África Ocidental e Meridional. As princesas de vagina seca eram as vestais que 
alimentavam o fogo ritual. Em tempos de seca, sacrificava-se uma princesa de 
vagina úmida para obter-se chuva. 
Hoje, o continente africano abriga numerosos povos que falam mais de 800 
línguas (das quais 730 estão classificadas). As fronteiras religiosas não 
acompanham o contorno das fronteiras linguísticas. Observamos que o 
continente africano apresentaum conjunto de cultura, identidade e religiosidade 
que é inseparável. Para compreender um dos elementos desse trio, é necessário 
consultar o outro. Ao longo do processo da colonização teve início a dimensão 
da separação, e no campo da religiosidade podemos notar na atualidade 
basicamente “três religiões” que dominam a África moderna: as autóctones, o 
cristianismo e o islamismo (Bezerra, 2015). 
TEMA 3 – DIVINDADES DA CULTURA AFRICANA 
Os deuses africanos são muitos, por vezes carregam nomes diferentes 
conforme os povos e culturas. Alguns são mais conhecidos e já fazem parte do 
vocabulário cotidiano dos brasileiros. Mas essas divindades possuem diversas 
funções práticas tratando da vida cotidiana. 
Boa parte desses deuses são cultuados por adeptos das religiões afro-
brasileiras, principalmente pelo Candomblé, que nasceu na Bahia no século XIX, 
com a base nas divindades das tradições religiosas africanas trazidas por negros 
escravizados, em especial os de origem iorubá, grupo étnico-linguístico da África 
Ocidental. O Deus supremo carrega diversos nomes − Olorum, Olodumaré, 
Zambi e Ododua, conforme o povo, culturas e regiões −, dando origem aos orixás, 
que são divindades menores. Estudos que apontam que existiam em torno de 
400 orixás, tendo a maioria deles caído no esquecimento. 
Nossa intenção é introduzir e buscar as fontes originais do surgimento 
dessas divindades, tratando as funções no contexto cotidiano do povo. É 
impossível apresentar todas as divindades, existe uma mistura entre os orixás 
superiores e mediadores, como também com os espíritos dos antepassados. 
Sempre houve uma íntima relação entre essas três entidades. 
3.1 DIVINDADE SUPREMA: OLORUM 
Olorum significa literalmente Dono do Céu (Orum). É também chamado 
de Olodumaré, embora nas religiões afro-brasileiras o Deus Supremo seja mais 
conhecido por Olorum. Essa é a divindade suprema que criou tudo e a todos, 
criador dos orixás que não são deuses, e sim forças de sua divindade que auxiliam 
na organização das coisas e pessoas em seus destinos. Olorum vem de 
Olodumaré, palavra de origem iorubá que quer dizer Senhor supremo do destino. 
Ele é o princípio de tudo, é Deus, e como grande pai é responsável pela divisão 
entre o mundo sobrenatural, Orum, e o mundo dos homens, Ayê. 
Existem opiniões diversas sobre Olorum e, embora reconhecido e louvado 
como o Ser Supremo, não há um culto específico ou um lugar específico para Ele. 
É interessante notar que delega todos os poderes aos orixás que Ele mesmo criou. 
O mundo Orum pertence aos seres superiores que regem, cuidam dos seres 
humanos e animais que se encontram no mundo inferior Ayê. Criado pela cultura 
iorubá, Olodumaré é completamente diferente de todos os conceitos existentes 
na teologia de outras tradições, portanto. Os teólogos africanistas interpretaram 
a visão da Divindade Suprema a partir da cultura nativa africana. Assim, 
as tentativas de adaptação dos conceitos teológicos ou filosóficos de outras 
culturas não acompanham a concepção dos iorubás. O que é importante saber é 
que Olodumaré é o gerador de todos os poderes, principalmente o grande e 
divino poder da criação e organização do mundo, popularmente chamado de Axé. 
Axé (ou força vital) pode ser traduzida como aquilo que deve ser realizado. 
Essa força é contida e transmitida por meio de elementos materiais e de certas 
substâncias, mantendo e renovando neles sua capacidade de realização. Nas 
manifestações religiosas, o sangue (que pode ser de origem animal, vegetal ou 
mineral) é oferecido a Ele em primeiro lugar. O coração, o fígado, os pulmões e 
os órgãos genitais são partes do corpo consideradas plenas de axé. As raízes das 
árvores, as folhas, o leito dos rios, as pedras também possuem axé. Receber o axé 
significa incorporar os elementos simbólicos que representam os princípios vitais 
de tudo o que existe no mundo visível (Ayê) e no mundo invisível (Orum num 
processo de expansão permanente. 
3.2 OS ORIXÁS 
Conforme afirmamos, os orixás são auxiliares de Olorum, que se identificam 
com as forças da natureza ou ancestrais divinizados. Esses espíritos ou orixás são 
apresentados por parábolas que os personalizam como heróis, guerreiros e reis, 
masculinos e femininos, com uma lógica e ética próprias, mantendo uma relação 
íntima com a comunidade na qual realizam suas manifestações. Apresentaremos 
alguns deles para compreender as funções que foram determinadas a eles. 
• Oxalá − o Grande Orixá, é um deus muito importante no panteão iorubá, 
pois é o criador da humanidade. É também chamado de Obatalá, que 
significa Rei do Pano Branco. Além da cor branca, representa a pureza e o 
princípio de tudo. 
• Ossaim − carrega também outro nome, Ossanha; é o orixá das folhas e 
cuidador da morte. Ele é conhecido por sua capacidade de revigorar ou 
afastar a morte por meio do uso de ervas medicinais. 
• Ogum − é o orixá da guerra, das lutas, geralmente representado com uma 
espada na mão. É o deus da metalurgia, por ter recebido do grande pai 
Olodumaré a incumbência de governar o ferro e todas as coisas que se 
pode fazer a partir dele. Por isso, os filhos de Ogum são ligados ao ferro. 
• Oxóssi − é o orixá da caça, por isso foi desenvolvido entre os caçadores 
vinculado à floresta e aos animais. De modo geral, ele está ligado à 
provisão de alimentos e à fartura. 
• Exu − é o orixá considerado como mensageiro, às vezes vinculado ao mal 
ou aquele que traz o mal para as pessoas; todavia, nos mitos iorubás, não 
existe nenhuma relação dele com o mal. A equivocada associação entre 
Exu e o diabo é bastante antiga e remonta ao primeiro contato dos 
missionários cristãos com os povos iorubás. Na tradição africana, Exu é 
bem diferente. É o transportador, comunicador ou mensageiro entre a 
Terra, Ayê, e Orum, o outro mundo, a morada dos deuses. Além disso, é o 
guardião das portas das casas e o dono das encruzilhadas. 
• Oxumarê − é o orixá do arco-íris, responsável para transportar a água ao 
palácio de Xangô, uma divindade que se encontra no céu. 
• Xangô − parece ter as raízes na cultura nigeriana e do Benin. Era o rei de 
um império Oió, governou com muita sabedoria e tranquilidade. Para 
preservar a lembrança, foi divinizado ao longo dos anos e considerado 
como orixá do trovão, mantendo o domínio sobre as chuvas. Além disso, 
visto como orixá da justiça, já que como rei era o magistrado responsável 
pela aplicação das leis no mundo dos homens. 
• Oxum − é o orixá dos rios e das fontes. É a deusa do Rio Oxum, que fica 
no sudoeste da Nigéria, na África. É uma divindade feminina, a deusa das 
águas doces, além de ser a divindade da beleza e do amor. 
• Iansã − é orixá dos ventos, tempestades e raios; considerada também 
como responsável por guiar os mortos em sua viagem ao mundo superior 
(Orum). Por isso, ela responde pela cerimônia fúnebre, na qual se fazem 
oferendas festivas à pessoa que acabou de falecer. Originalmente, Iansã é 
a deusa do principal rio da África Ocidental, o Níger, que nasce na Guiné 
e chega ao oceano cruzando o território da Nigéria. 
• Iemanjá − originalmente, é a divindade de um afluente do Rio Ogum, que 
nasce no Estado de Oyo, na Nigéria. Mais tarde, transformou-se no orixá 
desse próprio rio, sendo objeto de culto de todos os iorubás, 
posteriormente tornando-se a divindade das águas salgadas, rainha do 
mar e protetora dos pescadores. 
• Obá − é a divindade do rio que leva seu nome, principal afluente do Rio 
Oxum, na Nigéria. Representa o amor e a fidelidade conjugal (Hipercultura, 
[S.d.]). 
TEMA 4 – RELIGIOSIDADE AFRICANA 
Apesar de a cultura africana ter sido, em maioria, contada e perpassada por 
europeus, muito dela ainda permanece como na antiguidade. Com muitos povos 
ainda vivendo como em um “passado”, a cultura se mantém viva. Os povos 
africanos têm uma cultura variável quanto à sua organização política. Eles podem 
ser nômades etambém vagar ou fixar em determinado território para elaborar os 
próprios negócios comerciais ou agrícolas. Em algumas regiões, existem 
pequenas tribos que têm um chefe escolhido pela crença ou pelo povo devido às 
suas capacidades e conhecimentos. Assim, encontramos os governos 
monárquicos ou democráticos para ter uma administração melhor. 
No interior dessa visão encontra-se a religiosidade, que é muito difícil 
determinar por ter variadas culturas. Cada povo, grupo ou tribo têm suas origens 
explicadas em mitologias e crenças. No que diz respeito a ela, há vários tipos de 
cultos presentes no continente, e os principais atualmente são o islamismo 
(predominantemente no extremo norte devido à influência dos árabes) e o 
cristianismo (devido à colonização europeia em diversas regiões). 
Quando se trata a religiosidade africana, pretendemos lidar com as religiões 
mais tradicionais e populares da África. As tradições religiosas africanas possuem 
a crença no Ser Superior que criou o mundo e a vida. É uma forma de monoteísmo, 
sendo que há a existência de um único Deus Supremo. Essa divindade não é 
admoestada pelas pessoas nem invocada, mas mora no céu e não se relaciona 
diferentemente com os seres humanos. A relação, o contato do divino com o 
humano se fará por intermédio de certas entidades mediadoras chamadas 
de orixás. Portanto, os humanos esperam de Olorum e dos orixás a proteção e o 
auxílio. 
4.1 DESENVOLVIMENTO DA RELIGIOSIDADE 
A religiosidade das tradições africanas é desenvolvida em certo espaço 
sagrado, chamado de terreiro, o centro das práticas religiosas construído 
segundo um padrão determinado tradicionalmente. Há preocupação de uso 
correto da ecologia local, de garantir a preservação de um espaço verde próximo 
ao terreiro. Também é lugar de formação dos futuros líderes religiosos. 
No campo dos rituais, a crença só pode ser entendida por meio da 
participação na experiência religiosa, mediante os símbolos. O culto religioso é 
realizado de ritos e oferendas. Em seus rituais, há cantos, danças ao som de 
instrumentos que produzem transes, e as vibrações sonoras e rítmicas constituem 
a base do processo ritualístico. 
A dimensão religiosa está na relação entre os seres humanos e seres 
superiores. A felicidade e qualidade de vida depende das relações estabelecidas 
entre esses dois mundos. Qualquer ofensa feita para a natureza, orixás, 
antepassados ou seres humanos não fica sem retorno. Tudo está em tudo, pois 
se encontra conectado, a religiosidade se funde com a cultura e política. Portanto, 
vida, trabalho, religião, amor ou afeto são formas de prestar culto a Deus. Nesse 
ponto, surge a obrigação da comunhão para que o grupo sobreviva espiritual e 
materialmente. 
As três atitudes muito caras ao povo negro são a partilha, a solidariedade e 
o respeito. A crença na ancestralidade é a resposta para a perpetuação da vida 
depois da morte. A realidade é uma totalidade sem uma divisão clara entre as 
duas dimensões: o mundo da matéria e mundo do espírito. Tudo está presente 
nessa realidade única, os mortos não estão mortos, eles vivem e se manifestam 
por meio dos novos que nascem para a vida. 
Assim, observamos no campo da religiosidade três aspectos essenciais da 
tradição africana: oralidade, simbolismo e diálogo. A oralidade abrange o sistema 
comunicativo que prevê a identificação, a expressão e a conservação da bagagem 
étnica e cultural; o símbolo é algo fundamental para a expressão da crença; e no 
diálogo os membros da comunidade têm a seu dispor o conhecimento dos mitos 
e das alegorias na biblioteca da oralidade, que são as pessoas sensíveis ou 
sacerdotes comumente chamados de pai de santo. 
TEMA 5 – VISÃO DO MUNDO DA CULTURA 
AFRICANA 
A visão do mundo da África antiga é fornecida pelas tradições orais e 
transmitida também na forma oral. A cultura africana compreende mitos, lendas, 
canções, contos, danças, provérbios, adivinhações e ritos para explicar, vivenciar 
e perpetuar suas crenças e tradições. Muitas vezes as culturas aproveitam para 
explicar a condição humana e também a criação do mundo, e há situações em 
que é muito difícil separar as explicações mitológicas com cosmogonias e 
teogonias. 
Na cosmogonia africana, tudo no Universo está interligado, como teia de 
aranha. O ser humano se reconhece como parte integrante do Universo e 
estabelece uma relação profunda com a Natureza mediante os ritos e rituais 
específicos. Assim, a dimensão religiosa se encontra no interior da visão 
cosmogônica do universo que podemos identificar em diversos relatos religiosos 
e mitológicos. 
Por exemplo, uma das narrativas orais da cultura africana explica a criação 
do mundo em seguinte forma: Olorum era uma massa infinita de ar. Um dia, como 
por encanto, lentamente, começou a respirar, e uma parte dessa massa de ar se 
transformou em água, dando origem à divindade Orixalá. O ar e a água 
continuavam a se mover, como uma dança, e eles mesmos foram se misturando, 
e uma parte deles, juntos e misturados, deu origem à lama. Dessa lama surgiu 
uma bolha avermelhada. Olorum maravilhou-se com essa bolha, soprou sobre 
ela o seu hálito Emi e deu-lhe vida. Essa forma, em permanente expansão e 
movimento, foi a primeira dotada de existência individual. Era um rochedo 
avermelhado de lateria, Exu. Assim a existência de todas as coisas é inaugurada 
pelo sopro do hálito Emi ou ar divino Ofurufú, produzindo a vida nos planos 
visíveis e invisíveis. 
NA PRÁTICA 
Assista ao espetáculo de dança "Cosmogonia africana − A visão de mundo 
do povo iorubá", que traz a narrativa iorubá da criação do mundo. Disponível 
em: <https://www.youtube.com/watch?v=EU8A5bNANMk>. 
Em seguida, elabore um pequeno texto comparativo com outras visões 
apresentadas pelas tradições religiosas. 
FINALIZANDO 
Nesta aula, buscamos nos aproximar do continente africano. A África é o 
continente muito antigo, onde surgiu e desenvolveu a vida humana. Mostramos 
como a sociedade africana foi formada, o modo de viver desse povo e a 
construção de sua identidade ao longo dos milênios. Mas a ênfase foi a de 
apresentar a construção do universo religioso, com suas divindades menores que 
deram ponto de partida na construção da religiosidade africana. 
Por fim, apresentamos o universo religioso que deu a origem a uma visão 
peculiar africana em que tudo se encontra conectado: seres humanos, divindades 
e também aqueles seres que ainda não nasceram. 
REFERÊNCIAS 
https://www.youtube.com/watch?v=EU8A5bNANMk
BEZERRA, K. História geral das religiões. Observatório Transdisciplinar das 
Religiões no Recife. 2015. Disponível 
em: <https://fdocumentos.tips/document/historia-geral-das-religioes-karina-
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<https://www.youtube.com/watch?v=EU8A5bNANMk>. Acesso em: 16 ago. 
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