Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 30 http://www.periodicos.uff.br/ijosd CUIDADO EM SAÚDE BUCAL PARA PACIENTES QUE UTILIZAM ANTIR- REABSORTIVOS ÓSSEOS Oral health care for patients under antiresorptive therapy Access this article online Quick Response Code: Website: https://periodicos.uff.br/ijosd/article/view/57343 DOI: 10.22409/ijosd.v3i63.57343 Autor: Isabella Gomes Mantovani de Oliveira Mestre em Saúde Coletiva. Coordenadora de Saúde Bucal – Prefeitura Municipal de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. Vera Alice Bolzani-Berni Mestre em Clínica Odontológica. Apoiadora Institucional do Distrito Sanitário Leste – Prefeitura Municipal de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. Sílvia Maria Anselmo Doutora em Prótese Dental. Apoiadora Institucional do Distrito Sanitário Sudoeste – Prefeitura Municipal de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. Rívea Inês Ferreira-Santos Doutora em Imaginologia Odontológica, Professora Titular de Imaginologia da Universidade Paulista – UNIP/Campus Swift. Apoiadora Técnica do Distrito Sanitário Sudoeste – Prefeitura Municipal de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil. Instituição onde o trabalho foi realizado: Prefeitura Municipal de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil Endereço para correspondência: Rívea Inês Ferreira-Santos DISTRITO SANITÁRIO SUDOESTE. Avenida Ana Beatriz Bierrembach, 123 - Vila Mimosa, Campinas, São Paulo. CEP 13050-060. Tel. (19) 3268-6234/(19) 99842-8872. rivea.ines@campinas.sp.gov.br Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 31 http://www.periodicos.uff.br/ijosd RESUMO O cenário odontológico tem apresentado diversos casos de infecção odontogênica, inclusive com óbitos. Em linha com esses fatos, observa-se o aumento na prescrição de antirreabsortivos ósseos em Serviços de Saúde particulares e do SUS (Sistema Único de Saúde). Os bisfosfonatos injetáveis têm ação comprovadamente benéfica para o controle de metástases ósseas. Contudo, aponta-se a osteonecrose avascular no complexo bucomaxilofacial como um efeito adverso importante. Este tipo de alteração também foi reportado mediante o uso de antiangiogênicos e imunomoduladores. Esta revisão de literatura teve por objetivo delinear um protocolo que respalde a atuação dos Cirurgiões Dentistas Clínicos Gerais nas Unidades de Atenção Primária à Saúde do Município de Campinas-SP, diante da utilização frequente de antirreabsortivos ósseos e uma demanda reprimida por cuidados em Saúde Bucal que se apresenta com a retomada integral das atividades após o pico da pandemia de COVID-19. Com base no conhecimento científico sobre a osteonecrose associada a medicamentos, sugere-se que as equipes das Unidades de Atenção Primária à Saúde atuem de modo preventivo, proporcionando cuidado em Saúde Bucal preferencialmente antes do início do tratamento com antirreabsortivos. No entanto, para pacientes que já estão sob esta terapia e necessitam de intervenções odontológicas invasivas, recomenda-se uma abordagem multidisciplinar, entre Cirurgiões Dentistas da Atenção Primária e da Atenção Secundária, visando ao tratamento de possíveis complicações das intervenções invasivas de urgência. Ademais, pacientes sob uso de antirreabsortivos ósseos requerem monitoramento a longo prazo, para se evitar a necessidade de procedimentos odontológicos invasivos ou mesmo diagnosticar precocemente casos de osteonecrose. Palavras chave: Osteonecrose Associada a Bisfosfonatos, Saúde Bucal, Sistema Único de Saúde. ABSTRACT The dental scenario has shown many cases of odontogenic infection, including some that ended with death. Along with these facts, there has been an increasing prescription of antiresorptive drugs, both in private and Unified Health System (SUS) Health Services. Injectable bisphosphonates have well- established beneficial action for controlling osseous metastasis. Nevertheless, avascular osteonecrosis of the bucomaxillofacial complex has been pointed out as an important side effect. Such a condition has also been reported under treatment with antiangiogenic drugs and immunological checkpoints inhibitors. This literature review aimed at offering a protocol to support the clinical practice Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 32 http://www.periodicos.uff.br/ijosd of general dental practitioners in Primary Health Care Units from Campinas-SP Municipality, in face of frequent use of antiresorptive drugs and a repressed demand for oral health care, which takes place with thorough return of activities after COVID-19 pandemic peak. On the basis of scientific knowledge about medication-related osteonecrosis, it may be suggested that staffs in Primary Health Care Units adopt preventive measures, providing oral health care preferably before the beginning of antiresorptive therapy. However, for patients who are already under antiresorptive therapy and need invasive oral interventions, it is recommended a multidisciplinary approach, comprising Dentists from Primary and Secondary Health Care Units, trying to intercept possible complications of urgent invasive oral interventions. Besides, patients under use of antiresorptive medications require long-term follow-up, to avoid the need for invasive oral procedures or to make early diagnosis of osteonecrosis. Keywords: Bisphosphonate-Associated Osteonecrosis of the Jaw, Oral Health, Unified, Health System. INTRODUÇÃO Bisfosfonatos são fármacos que possuem afinidade pela hidroxiapatita em sítios de remodelação óssea ativa e impedem a reabsorção óssea mediada por osteoclastos (OTTO S et al., 2021), induzindo-os à apoptose (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016; RIBEIRO BALM et al., 2021). O seu mecanismo de ação estaria associado ao estímulo da atividade osteoblástica (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016), bem como aos efeitos antiosteoclástico e antiangiogênico (RIBEIRO BALM et al., 2021). Desse modo, são utilizados para tratamento de várias condições clínicas: osteoporose primária e secundária, metástases ósseas de neoplasias malignas, principalmente de mama e próstata, hipercalcemia, mieloma múltiplo, Doença de Paget, osteogênese imperfeita, tumor de células gigantes central e displasia fibrosa (RIBEIRO BALM et al., 2021; IZQUIERDO CM et al., 2011; BARIN LM et al., 2016; RUGGIERO SL et al., 2022). Conforme a estrutura química, são prescritos bisfosfonatos nitrogenados, por exemplo, alendronato, ibandronato, pamidronato, risedronato e zolendronato, e não nitrogenados, como etidronato, tiludronato e clodronato (FERREIRA JUNIOR CD et al., 2007). Por mecanismos distintos, ambas as formas geram morte celular, especificamente em osteoclastos. Entretanto, sugere-se que os compostos nitrogenados apresentariam metabolização dificultada e, por conseguinte, maior acúmulo nos ossos e ação mais prolongada (PASSERI LA et al., 2011). Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 33 http://www.periodicos.uff.br/ijosd Se por um lado, a prescrição de bisfosfonatos tem sido comprovadamente benéfica para o controle de metástases ósseas. Poroutro lado, há um efeito adverso importante que poderá ocorrer no complexo bucomaxilofacial: a osteonecrose (OTTO S et al., 2021). Convém ressaltar que este tipo de alteração também já foi reportado mediante o uso de outros medicamentos, antiangiogênicos e imunomoduladores, como o denosumabe e o romosozumabe, anticorpos monoclonais utilizados para tratamento de osteoporose (OTTO S et al., 2021; RIBEIRO BALM et al., 2021; RUGGIERO SL et al., 2022; SHIBAHARA T, 2019). O primeiro relato de osteonecrose dos maxilares associada ao uso de bisfosfonatos ocorreu em 2003 (OTTO S et al., 2021; IZQUIERDO CM et al., 2011; PASSERI LA et al., 2011; SHIBAHARA T, 2019). Contudo, em 2010, houve o diagnóstico da osteonecrose dos maxilares relacionada ao denosumabe (OTTO S et al., 2021; SHIBAHARA T, 2019). Em 2022, a definição desta patologia foi ratificada: persistência de área óssea exposta ou que pode ser sondada por fístula intra ou extrabucal no complexo bucomaxilofacial por mais que dois meses, em pacientes sob uso ou que utilizaram antirreabsortivos ósseos, como agente terapêutico único ou em combinação com imunomoduladores ou antiangiogênicos, sem histórico de radioterapia ou metástases nos ossos maxilares (RUGGIERO SL et al., 2022). Outras manifestações clínicas da osteonecrose associada a medicamentos compreendem os sinais típicos de infecção, a saber: dor, edema, rubor, coleção de exsudato e fístula; inclusive pode ocorrer parestesia do nervo alveolar inferior, como em osteomielites (OTTO S et al., 2021). Doença periodontal localizada pode ser uma forma precoce da osteonecrose dos maxilares relacionada a medicamentos (NICOLATOU-GALITIS et al., 2019). Convém esclarecer que a maxila e a mandíbula apresentam elevado suprimento sanguíneo e alta taxa de remodelação óssea relacionados às atividades constantes e presença de dentes, o que determina remodelação óssea frequente ao redor do ligamento periodontal (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016; SANTOS LCS et al., 2016). Por isso, concentrariam mais antirreabsortivos ósseos em sua estrutura (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016; SANTOS LCS et al., 2016). Dada a prescrição crescente dos antirreabsortivos ósseos e as possíveis repercussões no complexo bucomaxilofacial, este protocolo visa a respaldar a atuação dos Cirurgiões Dentistas da Atenção Primária à Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde do Município de Campinas-SP, para a prevenção e estratégias de manejo clínico da osteonecrose dos maxilares associada aos referidos medicamentos. Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 34 http://www.periodicos.uff.br/ijosd MÉTODO A montagem deste protocolo envolveu uma revisão de literatura com busca nas bases de dados PubMED, LILACS e Google Acadêmico, para a seleção de estudos que discorressem sobre dados epidemiológicos, mecanismo de ação dos medicamentos, fatores de risco associados à osteonecrose dos maxilares, prevenção deste efeito adverso e possíveis estratégias de manejo clínico. Dois position papers, o mais atual (RUGGIERO SL et al., 2022) e o penúltimo, de 2014 (RUGGIERO SL et al., 2014) foram comparados à guisa de se obter informações atualizadas. Dados epidemiológicos Há indícios clínicos de que a osteonecrose dos maxilares associada a antirreabsortivos ósseos seria duas vezes mais frequente na mandíbula do que na maxila (OTTO S et al., 2021; BARIN LM et al., 2016). Na mandíbula, principalmente em regiões posteriores por lingual, em que a mucosa é mais delgada e observam-se proeminências ósseas, como a linha milohióidea (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016). Contudo, pode acometer ambos os ossos simultaneamente (BARIN LM et al., 2016) ou apenas a maxila (NICOLATOU-GALITIS et al., 2019). Convém mencionar que as lesões por osteonecrose associada a medicamentos frequentemente se originam no processo alveolar, que seria propenso a infecções odontogênicas por necrose pulpar ou doenças periodontais (OTTO S et al., 2021; NICOLATOU-GALITIS et al., 2019). Mulheres na sétima década de vida seriam mais afetadas do que os homens (FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016). Fatores como o tipo de medicamento e a via de administração devem ser considerados. Os Quadros 1, 2 e 3 sintetizam informação de alguns medicamentos relacionados à osteonecrose dos maxilares (OTTO S et al., 2021; RIBEIRO BALM et al., 2021; IZQUIERDO CM et al., 2011; RUGGIERO SL et al., 2022; PASSERI LA et al., 2011; NICOLATOU-GALITIS et al., 2019). De acordo com Ruggiero et al. (2022), via de regra, o risco de desenvolvimento da osteonecrose associada a antirreabsortivos ósseos é maior em pessoas sob tratamento de câncer (menor do que 5%) do que em pacientes que tratam osteoporose (menor do que 0,05%). Estima-se que pacientes com câncer tratados por zoledronato estariam sob risco de duas a dez vezes maior do que o grupo que utilizou placebo (RUGGIERO SL et al., 2022). Similarmente, para denosumabe, o risco variaria de 0%-6,9% (RUGGIERO SL et al., 2022). No que tange à osteoporose, o risco para pacientes tratados com bisfosfonatos seria de 0,02% a 0,05% Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 35 http://www.periodicos.uff.br/ijosd (RUGGIERO SL et al., 2022). Para o denosumabe, a variação é maior, de 0,04% a 0,3% (RUGGIERO SL et al., 2022). Quadro 1 – Bisfosfonatos: princípios ativos, posologia e mecanismos de ação. Substância Exemplo denome comercial Indicação Dose Mecanismo de ação Potência em relação ao etidronato Etidronato Didronel® Doença de Paget 5mg/kg/dia -Oral Torna-se substrato na síntese de citotóxicos que provocam morte de osteoclastos - Tiludronato Skelid® Doença de Paget 400mg/dia -Oral Torna-se substrato na síntese de citotóxicos que provocam morte de osteoclastos 10X Clodronato Bonefós® Neoplasias 1.600mg/dia – Oral 1.500mg/dose única - Intravenoso Torna-se substrato na síntese de citotóxicos que provocam morte de osteoclastos 10X Pamidronato Aredia® Neoplasias 90mg/mês -Intravenoso Compromete o transporte vesicular intracelular e provoca morte de osteoclastos 100X Alendronato Fosamax® Osteoporose 70mg/semana – Oral ou 10mg/dia - Oral Compromete o transporte vesicular intracelular e provoca morte de osteoclastos 500X Ibandronato Bonviva® Osteoporose 150mg/mês - Oral 3mg/3 meses - Intravenoso Compromete o transporte vesicular intracelular e provoca morte de osteoclastos 1.000X Risedronato Actonel® Osteoporose 35mg/semana – Oral ou 5mg/dia - Oral Compromete o transporte vesicular intracelular e provoca morte de osteoclastos 2.000X Zoledronato Zometa® Neoplasias 5mg/ano -Intravenoso Compromete o transporte vesicular intracelular e provoca morte de osteoclastos 10.000X Quadro 2 – Anticorpos monoclonais humanos antirreabsortivos: princípios ativos, posologia e mecanismos de ação. Substância Exemplo denome comercial Indicação Dose Mecanismo de ação Denosumabe Prolia® Neoplasias ouOsteoporose 120mg/mês – Subcutâneo ou 60mg/6 meses – Subcutâneo Inibe RANK-L e atividade de osteoclastos, reduzindo a reabsorção óssea Romosozumabe Evenity® Osteoporose 210mg/mês -Subcutâneo Inibe a esclerostina, aumenta a formação óssea e reduz a reabsorção óssea Quadro 3 – Antiangiogênicos: princípios ativos, posologia e mecanismos de ação. Substância Exemplode nome comercial Indicação Dose Mecanismo de ação Sunitinibe Sutent® Neoplasias 50mg/dia -Oral Inibe fator de crescimento endotelial Bevacizumabe (Anticorpo Monoclonal Humano) Avastin® Neoplasias 100mg e 400mg - Intravenoso Neutraliza a atividade biológica do fator de crescimento do endotélio vascular humano (VEGF), impedindo a formação de vasos sanguíneos Características clínicas Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 36 http://www.periodicos.uff.br/ijosd De acordo com o position paper de 2022 (RUGGIERO SL et al., 2022), a osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos relaciona-se a diferentes fatores de risco e apresenta estágios clínicos a serem observados. O Quadro 4 evidencia fatores relativos à saúde geral e bucal do paciente, além daqueles relacionados aos medicamentos (OTTO S et al., 2021; FORTE ACCB, FRASCINO AVM, 2016; RUGGIERO SL et al., 2022; NICOLATOU- GALITIS et al., 2019; SOUSA JZ, 2016; AMAZONAS et al., 2021; KAWAHARA et al., 2021). Quadro 4 - Fatores de risco para osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos FATORES DE RISCO ASSOCIADOS AOS HÁBITOS E SAÚDE SISTÊMICA Terapia com corticosteróides; Estado de imunossupressão; Diabetes Mellitus; Anemia; Quimioterapia; Uso de tabaco; Alcoolismo; Obesidade; Idade avançada; Doenças autoimunes; Insuficiência renal; Doença cardiovascular; Fator genético: polimorfismo de nucleotídeo único (CYP2C8;SIRT1/HERC4). FATORES DE RISCO LOCAIS Higiene bucal insatisfatória; Radioterapia em cabeça e pescoço; Infecção bacteriana, viral ou fúngica na cavidade bucal; Presença de infecção ou outra patologia óssea; Doenças periodontais; Exostoses (toros) e proeminências (por exemplo, linha milohióidea); Xerostomia; Bruxismo/apertamento; Próteses mal adaptadas; Peri-implantite; Exodontia; Cirurgia para inserção de implantes; Cirurgia endodôntica; Cirurgia periodontal; Procedimentos ósseos regenerativos. FATORES DE RISCO ASSOCIADOS AOS MEDICAMENTOS Potência do bisfosfonato; Dose (para tratamento oncológico implica em maior risco); Via de administração (injetáveis relacionam-se a maior risco); Quanto maior a frequência de uso e duração da terapia, maior o risco. O tratamento com duração superior a três anos implica em elevado risco. Vários autores reportaram um estadiamento clínico da osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos (RUGGIERO SL et al., 2022; PASSERI LA et al., 2011; NICOLATOU-GALITIS et al., 2019; RUGGIERO SL et al., 2014; AMAZONAS et al., 2021; KAWAHARA et al., 2021;): Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 37 http://www.periodicos.uff.br/ijosd Estágio 0: pacientes sob risco, sem exposição óssea aparente. Podem apresentar sintomas e achados clínicos e radiográficos que são considerados não específicos. Indicam-se orientação ao paciente para melhora da higiene bucal, raspagem e alisamento radicular e controle da dor com analgésicos. Para casos selecionados, utilização de antibióticos de amplo espectro de ação. Na maioria dos casos, a manifestação clínica da osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos envolve exposição óssea, entretanto, ausência de osso exposto também já foi observada em quadros da referida patologia (NICOLATOU- GALITIS et al., 2019). Estágio 1: exposição de osso necrótico ou fístulas que proporcionam a sondagem óssea em pacientes assintomáticos. São indicados prescrição de bochechos com solução de gluconato de clorexidina a 0,12% três vezes/dia, acompanhamento clínico mensal e reavaliação juntamente com o médico que prescreveu a medicação, para continuidade ou suspensão do tratamento. Estágio 2: osso necrótico exposto ou fístula que propicia sondagem óssea, com evidência de infecção/inflamação. Além dos cuidados propostos no Estágio 1, associam-se uso de antibioticoterapia por via oral e realização de procedimentos cirúrgicos para a erradicação dos irritantes do tecido mole. Estágio 3: osso necrótico exposto além do processo alveolar, fratura patológica, fístula extrabucal, comunicação bucossinusal/buconasal, osteólise que se estende à borda inferior da mandíbula ou ao assoalho do seio maxilar. Embora seja indicada a tomografia computadorizada por feixe cônico, não há modalidade de diagnóstico por imagem que confira a extensão exata da osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos (OTTO S et al., 2021). Preconizam-se ressecção cirúrgica e reconstrução da região atingida. DISCUSSÃO Idealmente, o tratamento odontológico deveria preceder a terapia com antirreabsortivos ósseos. Os pacientes deveriam ter focos de infecção removidos, próteses mucossuportadas ajustadas e a higiene bucal satisfatoriamente orientada. Entretanto, apesar de se preconizar uma abordagem multidisciplinar nos casos de risco para osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos, em diversos Serviços de Saúde Secundários e Terciários, o Cirurgião Dentista Clínico Geral não está presente. Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 38 http://www.periodicos.uff.br/ijosd Com frequência, os pacientes oncológicos iniciam a terapia sem a adequação do meio bucal. Na Atenção Primária a Saúde, os Cirurgiões Dentistas devem estar preparados para ampliar a anamnese e, se necessário e urgente, realizar os procedimentos odontológicos para aliviar a dor e possíveis infecções que os pacientes sob risco eventualmente apresentem, mediante o seguimento contínuo destes casos e o respaldo de uma Equipe Multidisciplinar nos Serviços Secundários e Terciários de Saúde. Embora a literatura sinalize alguns fatores de risco, não há como prever quando ocorrerá a osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos. A meia vida dos bisfosfonatos é de aproximadamente 10 anos (RIBEIRO BALM et al., 2021; BARIN LM et al., 2016). Esses medicamentos permanecem incorporados ao tecido ósseo por muito tempo. A recomendação para suspensão do uso de antirreabsortivos ósseos três meses antes de procedimentos odontológicos invasivos, e retomada após completo reparo ósseo, não se relaciona à ausência de desenvolvimento de osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos para todos os pacientes (PASSERI LA et al., 2011; AMAZONAS et al., 2021). Em termos de interrupção do uso de antirreabsortivos, a literatura é controversa, pois alguns autores mencionam a interrupção por um período de quatro a seis meses (SANTOS LCS et al., 2016), enquanto que outros indicam períodos de seis a oito meses (FERREIRA JUNIOR CD et al., 2007). À guisa de nortear as ações do Cirurgião Dentista Clínico Geral da Atenção Primária à Saúde, faz-se relevante considerar as orientações do paper position de 2022 (RUGGIERO SL et al., 2022) e de NICOLATOU-GALITIS et al., 2019. Para pacientes sob risco de desenvolver a osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos, os objetivos principais seriam: Empreender esforços na prevenção da osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos; Priorizar cuidados preventivos e de suporte aos pacientes sob uso de antirreabsortivos ósseos,em terapia única ou combinada com medicamentos imunomoduladores ou antiangiogênicos; Em conjunto com Estomatologista ou Cirurgião Bucomaxilofacial, controlar a dor e a infecção secundária; Sob orientação ou em conjunto com Estomatologista ou Cirurgião Bucomaxilofacial, prevenir a ampliação de lesões preexistentes e o desenvolvimento de novas áreas de necrose óssea; Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 39 http://www.periodicos.uff.br/ijosd Evitar a realização de procedimentos invasivos, como exodontias. Mas, se forem necessárias e urgentes, avaliar cuidadosamente a intensidade do risco. Referenciar o paciente com elevado risco para desenvolver osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos à Atenção Secundária ou Terciária. A antibioticoterapia prévia e pós-operatória, bem como a utilização de antimicrobianos tópicos, poderão reduzir o risco de osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos. O Quadro 5 foi adaptado do position paper de 2022 (RUGGIERO SL et al., 2022) e sumariza possíveis condutas clínicas. Quadro 5 – Condutas clínicas a serem adotadas na Atenção Primária à Saúde. Fase do tratamento com antirreabsortivos ósseos Possíveis condutas Antes da terapia Orientação ao paciente sobre risco potencial e tratamento odontológico completo, com a total eliminação de focos de infecção. Durante a terapia Orientação ao paciente sobre risco potencial e também sobre a necessidade de manutenção da saúde bucal com procedimentos de intervenção não invasivos e preventivos; Anamnese extensa à procura de fatores de risco sistêmicos e comportamentais; Pesquisa de sintomas e sinais de lesões preexistentes, inclusive por meio de modalidades de imagem (radiografia panorâmica ou tomografia computadorizada por feixe cônico); Se possível, evitar cirurgias dentoalveolares; Considerar técnicas de manutenção de raízes residuais para evitar exodontias; Inserção de implantes está contraindicada. Como desfecho das condutas clínicas indicadas para o tratamento da osteonecrose dos maxilares associada a medicamentos, são citadas terapias coadjuvantes à cirurgia para remoção de sequestros ósseos e regiões de infecção óssea. A utilização de membranas de fibrina ricas em plaquetas e leucócitos (L-PRF) figura como produto autólogo a ser aplicado no osso após procedimentos cirúrgicos, por exemplo, debridamento, e sinaliza uma terapia coadjuvante promissora (RIBEIRO BALM et al., 2021). A terapia fotodinâmica, que emprega laser de baixa intensidade, demonstra efeitos antimicrobianos, com controle de infecção, reparo ósseo e cicatrização de mucosas, além do alívio da dor (OTTO S et al., 2021; RIBEIRO BALM et al., 2021; IZQUIERDO CM et al., 2011). A oxigenação hiperbárica foi citada como terapia coadjuvante, não obstante a escassez de estudos que suportem sua indicação (RIBEIRO BALM et al., 2021). CONCLUSÃO Depreende-se que a ocorrência de osteonecrose dos maxilares é relativamente rara. No entanto, por causa da dimensão clínica que pode atingir, os Cirurgiões Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 40 http://www.periodicos.uff.br/ijosd Dentistas devem manter-se atualizados quanto aos cuidados dos pacientes sob uso de antirreabsortivos ósseos. Na Atenção Primária à Saúde, os Cirurgiões Dentistas devem investigar a utilização dos referidos fármacos durante a anamnese. Em situações de urgência, será preciso realizar procedimentos odontológicos para aliviar a dor e tratar possíveis infecções que os pacientes sob risco eventualmente apresentem, mediante o seguimento contínuo destes casos. Enfatiza-se que a interação de uma Equipe Multidisciplinar, com Profissionais dos Serviços Secundários e Terciários de Saúde para respaldar o cuidado dos pacientes sob risco é imprescindível. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Otto S, Aljohani S, Fliefel R, Ecke S, Ristow O, Burian E et al. Infection as an important factor in medication-related osteonecrosis of the jaw (MRONJ). Medicina (Kaunas). 2021;57(5):463. DOI: 10.3390/medicina57050463 2. Forte ACCB, Frascino AVM. Interação dos bisfosfonatos na cirurgia odontológica. Atas Ciênc Saúde. 2016; 4(1): 12-22. 3. Ribeiro BALM, Oliveira DB, Silva MG, Saraiva WF, Rabelo Júnior PMS, Casanovas RC. Antirreabsortivos ósseos em pacientes odontológicos: noções de conduta para o cirurgião-dentista: uma revisão integrativa. Braz J Health Rev. 2021; 4(2): 8744-8762. DOI:10.34119/bjhrv4n2- 387 4. Izquierdo CM, Oliveira MG, Weber JBB. Terapêutica com bisfosfonatos: implicações no paciente odontológico – revisão de literatura. Rev Fac Odontol Passo Fundo. 2011; 16(3): 347-352. 5. Barin LM, Pillusky FM, Pasini MM, Danesi CC. Osteonecrose dos maxilares associada ao uso de bifosfonatos: uma revisão de literatura. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2016; 28(2): 126-134. 6. Ruggiero SL, Dodson TB, Aghaloo T, Carlson ER, Ward BB, Kademani D. American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons' Position Paper on Medication-Related Osteonecrosis of the Jaws-2022 Update. J Oral Maxillofac Surg. 2022;80(5):920-943. DOI: 10.1016/j.joms.2022.02.008 7. Ferreira Junior CD, Casado PL, Barboza ESP. Osteonecrose associada aos bifosfonatos na Odontologia. Periodontia. 2007; 17(4): 24-30. Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd COPYRIGHT © 2023 - INTERNATIONAL JOURNAL OF SCIENCE DENTISTRY | AVAILABLE ONLINE 41 http://www.periodicos.uff.br/ijosd 8. Passeri LA, Bértolo MB, Abuabara A. Osteonecrose dos maxilares associada ao uso de bisfosfonatos. Rev Bras Reumatol. 2011;51(4):401- 7. 9. Shibahara T. Antiresorptive agent-related osteonecrosis of the jaw (ARONJ): a twist of fate in the bone. Tohoku J Exp Med. 2019 Feb;247(2):75-86. doi: 10.1620/tjem.247.75 10.Nicolatou-Galitis O, Schiødt M, Mendes RA, Ripamonti C, Hope S, Drudge-Coates L et al. Medication-related osteonecrosis of the jaw: definition and best practice for prevention, diagnosis, and treatment. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol. 2019; 127(2): 117-135. doi: 10.1016/j.oooo.2018.09.008 11.Santos LCS, Pereira RP, Gusmão JMR, Almeida ODS. Influência do uso de bisfosfonatos em pacientes submetidos a implantes dentários: revisão da literatura. Rev Bahiana Odontol. 2016 Mar;7(1):22-30. DOI: 2238-2720revbahianaodonto.v7i1.706 12.Ruggiero SL, Dodson TB, Fantasia J, Goodday R, Aghaloo T, Mehrotra B et al. American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons position paper on medication-related osteonecrosis of the jaw--2014 update. J Oral Maxillofac Surg. 2014 Oct;72(10):1938-56. doi: 10.1016/j.joms.2014.04.031 13.Sousa JZ. O papel do cirurgião-dentista frente ao uso de bifosfonatos [Trabalho de Conclusão de Curso]. Londrina: Universidade Estadual de Londrina; 2016. 14. Amazonas EL, Sacht DC, Alves RS, Caires NCM. Atendimento odontológico a paciente em uso de bifosfonatos: relato de caso. Research, society and development. 2021; 10(9): e22810918103. DOI: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v10i9.181031 15.Kawahara M, Kuroshima S, Sawase T. Clinical considerations for medication-related osteonecrosis of the jaw: a comprehensive literature review. Int J Implant Dent. 2021;7(1): 47. doi: 10.1186/s40729-021- 00323-0 Ano XXX - Número 62 - Volume 3 - set/dez 2023 - Niterói (RJ) – Brasil Páginas de 30 até 41 Rua Mário Santos Braga, n. 30, Campus do Valonguinho, Centro Niterói – RJ CEP: 24020-140 http://www.periodicos.uff.br/ijosd
Compartilhar