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Uma Introdução à Bíblia - Vol

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Uma introdução à Bíblia
Período Grego 
E 
Vida de Jesus
V o l u m e 6
lido Bohn Gass (Org.) 
Digitalizado por: Jolosa
São Leopoldo/RS
2005
PiJLlUÍ
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editorial@paulus.com.br
Elaboração: Udo Bohn Gass
Revisão: Franciso Orofino, José Edmilson Schinelo, Monika
Ottermann e Sebastião Armando Gameleira Soares
Capa: Jair de O. Carlos
Editoração: Rafael Tarcísio Forneck
Reimpressões: 2011, 2012
ISBN: 978-85-7733-131-4
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http://www.cebi.org.br
mailto:editorial@paulus.com.br
Sumário
Parte I: Época da dom inação g rega ............................................. 7
Introdução.................................................................................................. 7
Império Grego de 332 a 301 a.C.......................................................... 9
Dominação dos Ptolomeus (301-198 a.C.)....................................... 18
Literatura de resistência na época dos Ptolomeus......................... 21
Ester: uma mulher exige que o poder cumpra a justiça........... 22
Eclesiastes: felicidade é usufruir do próprio trabalho.............. 29
Zacarias 9-14: esperança num rei justo e pobre.......................... 34
Tobias: Deus é fiel à fidelidade do justo........................................ 36
Dominação dos Selêucidas (198-142 a.C.)........................................ 41
Literatura na época dos Selêucidas..................................................... 45
Eclesiástico: defesa da identidade de um povo........................... 46
Revolta dos macabeus (167-142 a.C .)............................................ 51
Teologia apocalíptica........................................................................... 59
Daniel: a luta contra o imperialismo.............................................. 64
Judite: Deus age pela mão de uma mulher................................... 68
2 Macabeus: resistência contra a imposição do Helenismo..... 74
Independência sob os hasmoneus (142-63 a .C .)............................ 77
Últimos escritos do Primeiro Testamento........................................ 81
Livro de Ester — o texto grego.......................................................... 81
1 Macabeus: a luta pela libertação.................................................... 83
Baruc: arrependimento e conversão................................................ 86
Sabedoria: ser sábio é ser justo.......................................................... 88
Conclusão da Ia parte................................................................................ 92
Para orar e aprofundar............................................................................ 96
Sugestões de leitura.................................................................................. 96
Apresentação.............................................................................................. 6
Parte II: V ida e pregação de J e s u s ................................................ 97
Introdução................................................................................................... 97
1 Jesus de Nazaré...................................................................................... 99
1.1 A vida de Jesus de Nazaré........................................................... 99
1.2 A vida pública de Jesus ................................................................ 102
1.3 Testemunhos de historiadores................................................... 104
2 Três poderes na Palestina.................................................................... 105
2.1 O poder de Roma.......................................................................... 109
Poder político, militar e econômico........................................ 109
Roma e os cultos............................................................................ 115
Mudanças na vida do povo...................................................... . 116
Conseqüências na vida do povo................................................ 116
Jesus e os romanos........................................................................ 117
A proposta política de Jesus....................................................... 119
2.2 O poder dos Herodes................................................................... 121
2.3 O poder do sinédrio...................................................................... 124
Jesus e o sinédrio............................................................................ 125
O templo e o sinédrio................................................................... 126
Jerusalém e o tem plo.................................................................... 128
As festas de peregrinação............................................................ 128
Jesus e o templo.............................................................................. 131
A lei e o tem plo.............................................................................. 136
Jesus e a lei........................................................................................ 137
Jesus desmascara a opressão da religião................................. 139
3 Divisão política da Palestina.............................................................. 141
3.1 Idumeia, Judeia e Samaria............................................................ 143
3.2 Galileia e Pereia............................................................................... 144
Jesus e Herodes Antipas.............................................................. 145
3.3 Decápole........................................................................................... 145
3.4 Itureia, Bataneia e Traconítide................................................... 145
3.5 Abilene............................................................................................... 146
4 Galileia, Samaria e Judeia .................................................................... 146
4.1 Galileia................................................................................................ 146
Jesus e a Galileia............................................................................. 148
4
4.2 Samaria.............................................................................................. 148
Jesus e o povo samaritano........................................................... 149
4.3 Judeia .................................................................................................. 151
Jesus e a Judeia................................................................................ 154
5 A sociedade judaica............................................................................... 155
5.1 Saduceus............................................................................................ 155
Jesus e os saduceus........................................................................ 157
5.2 Herodianos....................................................................................... 157
Jesus e os herodianos.................................................................... 158
A proposta econômica de Jesu s................................................ 158
5.3 Fariseus.............................................................................................. 160
Jesus e os fariseus.......................................................................... 163
A sinagoga........................................................................................ 165
Jesus e a sinagoga..........................................................................165
5.4 Zelotas............................................................................................... 166
Jesus e os zelotas........................................................................... 168
5.5 Essênios............................................................................................. 169
Jesus e os apocalípticos............................................................... 169
5.6 Batistas............................................................................................... 171
Jesus e os batistas......................................................................... 173
Jesus e as expectativas messiânicas......................................... 174
5.7 Os mais pobres............................................................................... 176
Jesus e as mulheres....................................................................... 178
Jesus e os doentes......................................................................... 181
As curas e a fé ................................................................................. 183
Continuar a atividade curativa d e je su s ................................. 184
6 Paixão, morte e ressurreição.............................................................. 187
A prisão..................................................................................................... 188
O julgamento.......................................................................................... 188
A crucificação......................................................................................... 191
A ressurreição......................................................................................... 192
Conclusão da 2a parte ............................................................................. 194
Para orar e aprofundar............................................................................ 196
Sugestões de leitura.................................................................................. 196
5
Apresentação
Com este livro, Uma introdução à Bíblia chega ao volume 6, que 
está dividido em duas partes.
A primeira é uma introdução à história de Israel no período de 
dominação do Império Grego (332 a 142 a.C.) e dos reis hasmoneus 
(142 a 63 a.C.). Ao mesmo tempo, situa os últimos livros do Primeiro 
Testamento surgidos naquela época.
A segunda parte é dedicada a uma introdução à vida e pregação 
de Jesus de Nazaré no contexto do Judaísmo e do Império Romano, 
que impõe seu poderio na Palestina a partir de 63 a.C.
6
Parte I:
r
Epoca da dominação grega
Introdução
No volume anterior, estudamos a vida de Israel sob a dominação 
dos babilônios e dos persas. Vimos também a literatura bíblica que sur­
giu naquele período.
Na primeira parte deste volume, estudaremos a época de domina­
ção dos gregos (332-142 a.C.) e o período de independência desde 142 até 
63 a.C., ano em que os romanos passaram a dominar sobre a Palestina.
Num primeiro momento, depois de algumas informações sobre 
a conquista do Império Persa pelo macedônio Alexandre Magno, vere­
mos o domínio dos gregos sobre a Palestina a partir do Egito (301-198
a.C.). Eles são conhecidos por Ptolomeus. É a ocasião para olharmos 
mais de perto os livros bíblicos dessa época, isto é, Ester, Eclesiastes, Za­
carias 9-14 e Tobias.
Em seguida, abordaremos o domínio dos gregos sobre a Palesti­
na a partir da Síria, conhecidos por Selêucidas (198-142 a.C.). Veremos 
a imposição à força da cultura grega sobre os judeus, bem como a resis­
tência dos macabeus contra essa imposição. Analisaremos ainda as divi­
sões dos judeus em diferentes grupos no processo revolucionário, 
como os fariseus e os essênios. Desse período, são os seguintes livros: 
Eclesiástico, Daniel, Judite e 2 Macabeus.
Por fim, estudaremos a época de independência dos judeus desde 
142 a 63 a.C., período conhecido como dinastia dos hasmoneus. Sur­
gem os últimos Livros do Primeiro Testamento: U vro de Ester— o texto gre­
go, 1 Macabeus, Baruc e Sabedoria.
7
De saída, lembramos que sete dos onze livros que estudaremos 
nesta parte não se encontram nas traduções usadas pelas igrejas evangéli­
cas. São eles: Tobias, Eclesiástico, Judite, 1-2 Macabeus, Baruc e Sabedo­
ria. São os livros deuterocanônicos para os católicos romanos e apócrifos 
para os protestantes. Além disso, os livros de Ester e Daniel têm partes 
que só constam nas traduções católicas, como ainda veremos.
Império Grego de 332 a 301 a.C.
336-323 a.C.: o macedônio Alexandre Magno conquista a Ásia Menor 
e a Síria (333 a.C.), Tiro, Gaza e o Egito (332 a.C.), a Pér­
sia (331 a.C.) e chega até o vale do rio Indo (330-326 a.C.).
323 a.C.: Morte de Alexandre Magno. A partir dessa data até 301 a.C., 
há uma disputa entre os seus sucessores a respeito da divisão 
do império.
Uma conquista avassaladora
Ao norte da Grécia, Filipe II (359-336 a.C.) era rei da Macedô- 
nia, cuja capital era Pela. Sua formação era grega e tinha como projeto 
conquistar a Grécia a fim de ter mais acesso ao comércio marítimo. 
Explora as rivalidades entre as cidades gregas, como Atenas, Esparta, 
Corinto e Tebas, apresentando-se como alternativa para a solução dos 
seus conflitos.
Seu filho se chamava Alexandre. Dos 13 aos 16 anos, estudou 
com o filósofo Aristóteles. Quando seu pai foi assassinado (336 a.C.), ti­
nha 21 anos. Na ocasião, já era chefe do exército de seu pai. Controlou e 
unificou a Grécia. Alexandre Magno, como é conhecido, tinha uma am­
bição. Estava disposto a enfrentar o grande império dos persas, senho­
res absolutos de todo o Oriente Médio desde 539 a.C. De fato, em 
somente 12 anos, Alexandre conquistou todo o império que antes per­
tencia aos persas. E foi mais longe. Chegou até o atual Paquistão, con­
trolando inclusive o vale do Rio Indo.
Segundo o historiador judeu Flávio Josefo, ao conquistar a Pales­
tina, Alexandre tomou as seguintes medidas em relação aos judeus a pe­
dido do sumo sacerdote:
9
• podiam viver livremente segundo suas leis;
• estavam isentos de impostos a cada sete anos;
• também os judeus da diáspora podiam viver segundo suas pró­
prias leis.
Porém, aos poucos, essa situação privilegiada foi mudando. No 
princípio, lentamente e depois, de forma violenta, como veremos.
Além de alcançar suas ambições políticas, Alexandre também es­
tava interessado em difundir a cultura grega ou helénica. Mas, acima de 
tudo, a finalidade de suas conquistas era comercial (lM c 1,3a.4b).
Alexandre tinha planos para"A terra se calou diante dele. 
Ele se exaltou e seu coração 
se encheu de orgulho... 
multiplicando os males 
sobre toda a terra."
(cf. IM c 1,3)
estabelecer a capital de seu im­
pério na Babilônia, onde morreu 
de malária em 323 a.C., aos 33 
anos de idade. Não deixe de ler 
IMc 1,1-9!
Como não havia ninguém 
que tivesse condições de assumir o controle de todo o império, ele foi 
dividido entre os oficiais de seu exército. Seus sucessores disputavam 
entre si pelo controle das diferentes regiões. Essa disputa durou mais de 
20 anos. Nesse período, a Palestina serve de corredor de passagem para 
os exércitos dos generais gregos em luta, em pelo menos oito ocasiões. 
Isso representa desgraça para o povo, que sofre pilhagens, deportações 
e violências de toda ordem. Somente a partir de 301 a.C., alguns gene­
rais se impuseram, apropriando-se das maiores regiões do vasto impé­
rio, como você pode conferir no mapa abaixo. A partir de Alexandria 
no Egito, o general Ptolomeu governa também sobre a Líbia, a Fenícia e 
a Palestina.
Em 300 a.C., o general Seleuco funda a cidade de Antioquia da Sí­
ria para ser a capital de seu reino. Tinha também uma residência oficial 
na Babilônia.
Antes dos gregos, os impérios que controlavam as terras de Israel 
eram do Oriente. Os últimos foram os persas. Antes deles, os babilônios. 
Com a dominação dos gregos, não há somente uma troca de donos so­
bre Israel. Há outra mudança significativa. Os gregos impõem outro
10
modo devida, outra cultura, conhecida por Helenismo. A cultura helc- 
nica trouxe profundas mudanças para a vida dos judeus, como veremos.
A cultura helênica
A palavra “helênica” vem de “helen” que significa “grego”. A 
Grécia Antiga era chamada de Hélade (lMc 1,1), termo correspondente 
ao hebraico “Javã” (Is 66,19).
Ao falarmos de cultura helênica, estamos pensando no modo de 
vida que se difundiu no Oriente Médio a partir da dominação dos gre­
gos: seus valores e contravalores, sua economia e organização social, 
sua visão de mundo, das pessoas e das divindades, enfim sua cultura.
Destaquemos, agora, algumas das características da civilização grega.
1. Antes de mais nada, é preciso destacar que, diferentemente da 
posse coletiva da terra em Israel, a economia grega estava organizada a 
partir da propriedade particular e individual da terra. Grandes extensões 
de terra pertenciam a uma única pessoa. Em conseqüência, havia traba­
lho escravo. O sistema escravocrata definia a estrutura social grega.
2. Três eram as camadas sociais na estrutura escravocrata da Grécia:
• Os “livres” formavam a classe dominante. Só eles se conside­
ravam cidadãos. Seu ideal era viver tranquilamente, dedicando-se às ar­
tes, às atividades liberais, ao 
esporte e ao trabalho inte­
lectual. As suas mulheres ti­
nham funções importantes 
na administração dos lati­
fúndios de seus maridos.
No entanto, não tinham 
participação nos assuntos 
públicos. Os cidadãos gre­
gos se consideravam o povo mais civilizado. A introdução do escravis- 
mo na Palestina aumentou os contrastes sociais. A alta sociedade, a 
classe dirigente e os funcionários a serviço dos gregos se enriqueceram, 
desviando tributos e aceitando subornos.
"Os escravos devem ser escravos, 
porque não são homens.
E bom para o escravo ser escravo, 
porque, sem governante, 
não sabe se governar.
Sua única virtude 
é não faltar ao trabalho."
(Aristóteles)
11
12
• Os “libertos” eram antigos escravos que haviam obtido a 
liberdade.
• Os “escravos” eram em torno de dois terços da civilização gre­
ga. A eles e aos diaristas era reservado, segundo a opinião dos cidadãos, 
o trabalho inferior, isto é, o trabalho manual. Não tinham direito à pro­
priedade de terra. Ainda conforme os gregos livres, os libertos e os es­
cravos não eram considerados cidadãos com plenos direitos políticos. 
Por isso, não tinham o direito de participar da “democracia” da cidade 
grega. Havia escravos domésticos e outros que trabalhavam na produ­
ção, além de outros que trabalhavam em diversas atividades. Tanto os 
agricultores como os pequenos comerciantes se tornavam cada vez 
mais pobres. Muitos israelitas foram escravizados (IMc 3,41).
3. O Helenismo era uma cultura essencialmente urbana. Diferente­
mente da cultura rural palestinense, a cidade (pólis) era o foco de irradiação 
da cultura grega. Da palavra pólis vem a palavra “político”, isto é, cidadão, ou 
morador da cidade. Dela deriva também “política”, isto é, cidadania, que é a 
organização da cidade para o bem-estar de quem nela vive. O modelo padrão 
da cidade grega consistia na praça, nas avenidas com colunas, nos templos, 
no teatro e no ginásio de esportes. Além disso, nas cidades helênicas, que 
fundavam nas colônias conquistadas, havia destacamentos militares.
4. Através da dominação que exerciam sobre outros povos, os 
gregos difundiam seu modo de vida. Impunham sua cultura através de 
diferentes meios:
• Seu estilo de vida.
• A organização e a administração das cidades.
• A cobrança de impostos e taxas.
• O comércio e a moeda.
• Nova organização da agricultura.
• As escolas filosóficas e a literatura grega.
• A língua grega que se tornou a língua internacional do comércio.
• A religião com suas divindades e seus mitos.
• As artes, em especial a arquitetura e a escultura.
• Os esportes e as diversões em escolas, ginásios, teatros e praçis 
que construíam em cada cidade. O ginásio era o centro político
13
mais importante de reprodução do modo de vida grego. Nele 
estudavam os jovens varões. Ali se exaltavam as virtudes mili­
tares e as práticas esportivas, com vistas à preparação do corpo 
e da mente para a gu erra .
• As colônias militares, o exército, a estratégia militar e as armas.
5. Diferentemente do Judaísmo, que estava estruturado sobre a 
família patriarcal e a vida comunitária fortemente disciplinada pela lei, a 
cultura helênica estava mais centrada no indivíduo que buscava a afir­
mação de sua liberdade e a satisfação de seus sentidos.
6. Em oposição à religião judaica, que era monoteísta e tinha 
princípios éticos que exigiam práticas coerentes no comportamento co­
tidiano dos judeus, a religião dos gregos era politeísta e não tinha inter­
ferência direta na vida diária das pessoas helenizadas. Um aspecto 
central da religião e dos mitos gregos é que eram fatalistas. Sua mensa­
gem era no sentido de legitimar a situação existente, sem possibilidade 
de mudança. Para o judeu, a medida das coisas é Deus. Para o grego, é o 
próprio homem.
Quem não seguisse o modo de vida dos gregos era taxado de 
atrasado, fora de moda, retrógrado. De outro lado, era considerado mo­
derno aquele que assumia a cultura grega. Divulgando seus costumes, 
os gregos acabavam destruindo as tradições dos povos conquistados, 
garantindo, dessa forma, seu domínio.
Hoje em dia, a ideologia hegemônica ainda continua acusan­
do de atrasados e contrários ao progresso aqueles que lutam por um 
mundo de justiça, de oportunidades iguais para todas as pessoas. 
Também é assim acusado quem busca construir um Estado de par­
ticipação popular e de inversão de prioridades, de valorização da 
educação, da saúde, enfim, uma sociedade que coloca em primeiro 
lugar a vida das pessoas.
Por outro lado, a mesma ideologia considera moderno quem 
defende a cultura neoliberal, as privatizações, o Estado mínimo, o 
livre mercado, o direito irrestrito à propriedade para quem tem
14
poder econômico, enfim, um mundo que globaliza a miséria, en­
quanto coloca acima da vida os interesses econômicos, o absoluto 
domínio do livre mercado financeiro.
E importante termos presente que cada cultura traz consigo 
valores de vida e antivalores. Importa termos o discernimento para 
distinguir qual é o modo de vida, o projeto de sociedade que cada ideo­
logia defende, e qual deles se aproxima mais da vontade de Deus.
Por que o mundo inteiro se vê obrigado a aprender a língua 
inglesa? Por que há tantas músicas em inglês e tantas camisetas com 
letreiros na língua dos Estados Unidos? Por que há tanto espaço no 
noticiário para o que acontece ao norte do México?
A política agrícola dos gregos
A agricultura era de importância fundamental na organização 
econômica dos gregos. Sua função principal era sustentar as cidades e 
fornecer os produtos para incrementar o comércio.
Para garantir a produção, organizavam uma política agrícola que 
privilegiava a formação de latifúndios. Neles, havia emprego massivo 
de trabalho escravo. Em torno das cidades, as terras pertenciam ao rei. 
Em muitos casos, sua administração era feita diretamente por funcioná­
rios nomeados pelos gregos. Em outros, vastas extensões de terra eram 
presenteadas aos amigos do rei. As melhores terras da Palestina, como a 
costa do Mediterrâneo, o vale de Jezrael, o vale do Jordão e parte da 
Transjordânia, assim foram distribuídas.
Esse modo grego de organização da agricultura acabava com o 
tradicional sistema das aldeias na Palestina, fazendo com que elas per­
dessem sua autonomia política. Muitos camponeses perdiam suas ter­
ras, seus direitos, sua liberdade, passando a trabalhar como diaristas 
contratados pelos grandes proprietários.
Mais do que se preocupar com a sobrevivência das aldeias, 
dava-se prioridade à produção em vista do comércio nas cidades e para 
a exportação. A imposição do modo de vida dos gregos levou a popula­
ção a um empobrecimento crescente. Por isso, muitos judeus se viram 
obrigados a migrar para cidades gregas na diáspora.
15
Desde a época dos persas,já não era mais o clã, isto é, um agrupa­
mento de famílias aparentadas, a unidade básica da sociedade israelita 
tradicional. Cada vez mais, a família vai se tornando a unidade econômi­
ca fundamental, deixando o clã em segundo plano.
Palestina, um lugar estratégico em disputa
Em meio ao vasto império de Alexandre Magno, a Palestina não 
passava de um pequeno pedaço de terra. Embora estivesse perdida den­
tro do grande império, ela continuava ocupando um lugar estratégico 
entre o Egito e a Síria.
No início, porém, a situação do povo não mudou muito, uma vez 
que a imposição da cultura grega foi um processo progressivo. Os ju­
deus passaram da opressão persa para o domínio dos gregos, os novos 
senhores do mundo. Em meio às lutas entre os grandes, mais uma vez 
Israel trocou de dono.
Do período de disputas entre os generais de Alexandre (323-301 
a.C.), pouco sabemos a respeito da vida na Judeia. Porém, é provável 
que a vida da comunidade judaica continuava em torno de um governo 
formado por uma assembleia de anciãos.
Quando o general Ptolomeu 1(323-282 a.C.) se apoderou de Je ­
rusalém, deportou para o Egito muitos judeus. Provavelmente os tratou 
desse jeito porque devem ter apoiado o general Seleuco na disputa pelo 
controle sobre a Palestina. Zc 14,1-3 deve ser uma referência a esse 
exílio. Confira!
No Egito, os judeus fixaram-se de modo especial em Alexandria, 
capital da dinastia dos Ptolomeus, cidade fundada por Alexandre em 
332 a.C. Alexandria está localizada a oeste do delta do Rio Nilo, pró­
ximo ao Mar Mediterrâneo.
Uma mudança importante em relação à dominação persa
Na época dos persas, como vimos no volume anterior, constata­
mos que havia na Judeia especialmente duas forças sociais em forte 
tensionamento.
16
Por um lado, havia a comunidade judaica em torno da obser­
vância rigorosa da lei, comandada pelo 2o templo. Como tinha liberda­
de e até apoio do império para essa observância ortodoxa, ela não se 
opunha muito à opressão persa. Até fàzia críticas. Veja, por exemplo, 
q uejl 1,6-7; 2,20 e Ne 9,36-37 constatam a opressão do império do nor­
te. Porém, era ainda uma tímida resistência.
Por outro lado, os pobres da terra, mais que se oporem direta­
mente à opressão estrangeira, resistiram contra a exploração e a imposi­
ção do rigor da lei pelas elites locais, aliadas aos persas. Foi o caso dos 
livros de Rute,Jonas, Jó e Cânticos dos Cânticos. Porém, lutar contra as 
elites locais e sua ideologia era uma forma indireta de lutar também con­
tra o império, uma vez que elas estavam a serviço de sua dominação.
A partir da opressão dos gregos, muda a situação. De agora em 
diante, a cultura helênica vai entrando, primeiro aos poucos e depois à 
força, na vida de todo o povo.
Diante disso, a comunidade judaica fiel ao rigor da lei, seja em 
torno de Sião seja na diáspora, dividiu-se. Veremos adiante como a clas­
se dirigente apoiou a helenização da cultura judaica, enquanto grupos de 
resistência foram surgindo em meio aos judeus piedosos e fiéis obser- 
vantes da lei.
Nesse sentido, os movimentos de resistência contra a opressão e 
a literatura em defesa da identidade judaica têm fundamentalmente sua 
origem em duas tendências.
De um lado, temos a reação contra a helenização do Judaísmo, for­
çada ou não, vinda em defesa da fidelidade à tradição judaica, seja na Pales­
tina como na dispersão. Portanto, os autores que estão por trás da maioria 
dos livros bíblicos do período grego são grupos de judeus fiéis à lei, à tradi­
ção, à cultura da comunidade judaica. E o caso dos livros de Ester, Zacarias
12-14, Tobias, Eclesiástico, 2 Macabeus, Sabedoria e Baruc.
Já os pobres da terra devem ter apoiado a luta pela independência 
frente à dominação dos gregos, comandada pelos piedosos macabeus. 
Círculos de levitas do interior ligados aos macabeus são autores de Za­
carias 9-11,1 Macabeus, Daniel, Judite e da versão grega de Ester. Suas 
preocupações principais são a defesa da lei de Moisés e da aliança, bem 
como a libertação da opressão econômica e política dos gregos.
17
O Livro do Eclesiastes se diferencia das duas tendências anteriores. 
Como a segunda tendência, é crítica à cultura e à opressão gregas. Por ou­
tro lado, questiona a tradição sapiencial conservadora do Judaísmo.
Dominação dos Ptolomeus 
(301-198 a.C.)
Depois das lutas entre os generais de Alexandre Magno, a domi­
nação dos gregos sobre a Palestina pode ser dividida em dois grandes 
períodos. Num primeiro momento, isto é, de 301 a 198 a.C., a Palestina 
ficou sob o domínio da dinastia do general Ptolomeu a partir de Alexan­
dria no Egito. Depois de 198 a.C., porém, os Selêucidas, como ficaram 
conhecidos os sucessores do general Seleuco, conquistaram a Palestina 
dos Ptolomeus e passaram a dominar Israel desde a Antioquia da Síria, a 
capital de seu império.
Em torno de 350 a.C., edição hebraica do Livro de Ester.
301-198 a.C.: Durante um século, a Palestina ficou sob o domínio dos 
Ptolomeus.
301-282 a.C.: Ptolomeu I.
282-246 a.C.: Ptolomeu II. Durante seu reinado é feita a tradução da 
Bíblia hebraica para o grego, a Septuaginta. Por volta de 
250 a.C., edição de Zc 9-14 e do Livro de Eclesiastes. 
246-221 a.C.: Ptolomeu III.
221-204 a.C.: Ptolomeu IV.
204-180 a.C.: Ptolomeu V. Em torno de 200 a.C., Livro de Tobias.
A dinastia dos Ptolomeus é assim chamada porque o nome do 
primeiro rei dessa dinastia foi Ptolomeu. Como seu pai se chamava La­
gos, também é conhecida como a dinastia dos lágidas.
18
O século de domínio por parte dos Ptolomeus foi um período 
em que houve várias tentativas dos Selêucidas se apoderar da Palestina, 
promovendo sucessivos ataques.
Do ponto de vista econô­
mico, foi uma época de muita ex­
ploração. Os gregos estabelecidos 
no Egito organizaram um estado 
burocratizado e fortemente cen­
tralizado. Em todas as regiões 
onde dominavam, estabeleciam 
oficiais, tropas militares e encarre­
gados das finanças e do recolhi­
mento dos impostos. Estes eram 
permanentemente vigiados. Os Ptolomeus tinham medo de dar auto­
nomia às regiões que dominavam. E que temiam perder seu poder.
Cerca de um terço da produção era arrecadado em forma de tri­
buto. Os Ptolomeus arrendavam a famílias ricas o direito de recolher os 
impostos, dando-lhes liberdade no processo de arrecadação. Com isso, 
conseguiam lucros financeiros e maior influência política.
O auge do poder dos lágidas foi no reinado de Ptolomeu II 
(282-246 a.C.).
"Deus concede a uma pessoa 
riquezas, fazendas e honras, 
sem lhe faltar nada de tudo 
que possa desejar. Deus, 
porém, não lhe concede 
desfrutá-los, mas um 
estrangeiro os desfruta. 
Isso é passageiro e cruel 
sofrimento." (Ecl 6,2)
Os judeus da diáspora
Os judeus dispersos pelas cidades helenizadas viviam mergulha­
dos na cultura grega. Embora inicialmente pudessem, tal como os judeus 
da Palestina, viver livremente sua fé em YHWH, aos poucos, foram 
sendo influenciados pela cultura helênica. No entanto, eles não opu­
nham tanta resistência contra o Helenismo. Especialmente em Alexan­
dria, iniciaram um processo de inculturação, conservando porém a 
observância da lei e o culto na sinagoga. Foi lá, durante o reinado de 
Ptolomeu II, que traduziram a Bíblia hebraica para o grego, conhecida 
por Septuaginta ou Setenta. E foi lá também que, mais tarde, escreve­
ram o Livro da Sabedoria.
19
Os judeus da Palestina
Diante do Helenismo, os judeus da Palestina se dividiram. De um 
lado, a classe dirigente e, de outro, os setores mais pobres e fiéis à lei de 
Moisés.
A classe dirigente, composta pelos chefes dos sacerdotes e por seto­
res da aristocracia, a fim de garantir seus interesses econômicos, apoiou 
a introdução do modo de vida dos gregos no Judaísmo. Esses grupos 
eram os liberais da cidade. O sumo sacerdote dos judeus continuava 
desfrutando de pleno poder. Assim também as famílias ricas, como a 
dos Tobíadas, residentes na Transjordânia.
A respeito dessa família, nós já vimos na página 125 do volume 5. 
Confira! Em 2 Macabeus 3,11,temos uma nova referência a essa família. 
Dessa vez, fala-se de Hircano, filho de Tobias, que tinha muito dinheiro 
depositado no templo de Jerusalém, sinal de que o templo funcionava ao 
mesmo tempo como banco. Os Tobíadas eram, possivelmente, a família 
mais rica da província. O historiador Flávio Josefo nos informa que, na 
época dos Ptolomeus, os Tobíadas continuaram tendo muita influência 
na região e eram responsáveis pela coleta de impostos para os gregos. 
Isso nos revela que as principais famílias judaicas estavam plenamente in­
tegradas no mundo helênico. Mais tarde, quando os Selêucidas venceram 
os Ptolomeus, elas apoiaram o rei Antíoco III contra Ptolomeu V.
O sumo sacerdote passa a ser também o governador
A presença dos gregos trouxe outra mudança significativa. A par­
tir de agora não há mais um governador civil ao lado do sumo sacerdo­
te, como no período persá. O próprio sumo sacerdote passa a exercer 
também o poder civil. A administração não era mais feita por um gover­
nador, mas por um conselho de anciãos, composto de sacerdotes e leigos, 
presidido pelo sumo sacerdote (lM c 12,6; 2Mc 1,10; 11,27). Mais tarde, 
na época dos Macabeus, esse conselho seria chamado de Sinédrio.
Com isso, aumentou ainda mais o poder do sumo sacerdote. 
Além de desempenhar as'funções no templo, passou a exercer tarefas
20
políticas, como representante político da comunidade judaica. No en­
tanto, embora tivesse poder para administrar as questões internas do Ju ­
daísmo, ele tinha pouca autonomia administrativa.
A resistência contra os gregos e os judeus helenistas
Por outro lado, houve resistência do povo da terra contra a ex­
ploração econômica e política dos gregos. Para a comunidade judaica 
fiel à observância da lei e ao culto no templo de Jerusalém, o mais im­
portante de tudo era garantir a pureza de sua identidade, de sua tradição. 
Por isso, reagiu fortemente contra a helenização dos costumes judaicos.
Quando mais tarde os Selêucidas impuseram na marra a cultura 
grega, o povo resistiu bravamente ao processo de desintegração de sua 
identidade. E o que veremos adiante quando estudarmos a vigorosa re­
sistência que deu origem à luta dos macabeus.
E importante ainda lembrar que os lágidas não impuseram à for­
ça seu modo de vida, sua cultura. Porém, criaram as condições para que 
o Helenismo fosse mudando aos poucos a mentalidade e os costumes 
judaicos.
Literatura de resistência na época 
dos Ptolomeus
Agora, passemos ao estudo da literatura que surge durante a pas­
sagem do poder persa para o grego, bem como no decorrer do período 
dos Ptolomeus. Veremos os livros de Ester, do Eclesiastes, os capítulos 
9-14 de Zacarias e o Livro de Tobias.
21
Ester: uma mulher exige que o poder 
cumpra a justiça
concede-me a vida: eis o meu pedido!
E a vida do meu povo: eis o meu desejo!” (Est 7,3)
Data
Há duas versões do Livro de Ester. Uma em hebraico e outra 
mais recente em grego.
A versão hebraica foi editada em torno de 350 a.C., no final da 
época persa, poucos anos antes de os gregos destruírem a grande potên­
cia. As razões para essa datação do texto hebraico são fundamental­
mente duas:
• Nele há referências detalhadas a respeito da estrutura do 
Império Persa;
• E ainda não há menção ao domínio dos gregos e ao seu modo 
de vida.
A versão grega, por sua vez, foi editada entre 114 e 112 a.C., du­
rante o governo de João Hircano sobre a Judeia, de acordo com as in­
formações de 10,3a ou F ,l l .
Na Bíblia traduzida por Almeida, os acréscimos da versão grega 
estão ausentes.
Nas traduções católicas da Bíblia, as citações dos acréscimos 
gregos têm a seguinte forma:
Na “Bíblia dejerusalém ” da Paulus e em outras traduções, é ci­
tado o capítulo da tradução do original hebraico para o grego, no qual 
foi inserido o acréscimo, seguido das letras do alfabeto, que correspon­
dem aos versículos. Ex.: l , l a-li.
Na “Bíblia Sagrada” da Vozes, a letra alfabética corresponde ao 
capítulo, e os números, aos versículos. A citação anterior fica da se­
guinte forma: A ,1-10.
22
Convém que se diga duas coisas da versão grega. Primeiro, ela 
não é somente uma tradução do texto hebraico para o grego. Os tradu­
tores fazem adaptações à nova realidade em que se encontram em torno 
de 113 a.C. Segundo, são feitos acréscimos significativos, como vere­
mos adiante.
Nas traduções católicas, o texto grego está inserido na versão he­
braica e normalmente está em itálico. A Tradução Ecumênica da Bíblia 
traz cada versão separadamente. Primeiro, o texto traduzido do hebrai­
co. E, mais adiante, a tradução da versão grega, isto é, o texto hebraico 
traduzido para o grego mais os acréscimos.
Ester, uma novela bíblica
Embora o Livro de Ester revele que seu autor conhecia bem a 
geografia da cidade de Susa e do Império Persa, bem como tinha co­
nhecimento do funcionamento da máquina administrativa do palácio, o 
livro não é historiografia.
Se fosse descrição dos fatos, Mardoqueu teria mais de 100 anos, 
por ocasião dos fatos relatados. Mesmo que tivesse sido deportado ain­
da recém-nascido em 597 a.C. (2Rs 25,8-21; Est 2,5-6), ele teria 111 
anos no primeiro ano de reinado de Assuero (1,1). E Ester não ficaria 
muito atrás de seu primo. Com essa idade, como entender sua escolha 
para rainha e ainda com um “corpo bonito e de agradável aparência”
(2,7)? Além do mais, não há nenhum registro histórico de que houvesse 
rainhas persas de nome Vasti ou Ester.
De outro lado, também não é possível entender que os judeus te­
nham matado 75 mil homens (9,16), sem que isso esteja registrado em 
algum documento persa. Vimos no volume anterior que os persas sem­
pre tiveram uma política favorável aos judeus. Por isso, também é difícil 
entender que o rei persa tenha autorizado o extermínio do povo judeu.
Por tudo isso, podemos perceber que a narrativa é muito mais 
uma novela do que uma história real. Embora seja uma novela, o texto 
se refere à vida concreta dos judeus e quer ser uma injeção de ânimo 
para as comunidades espalhadas em todo o império. Quer ajudá-las a
23
serem fiéis à história de seu povo, não se deixando iludir pelo modo de 
vida do império. Quer devolver-lhes a esperança para continuarem fiéis 
aos seus costumes, apesar das dificuldades em meio a povos que, muitas 
vezes, as humilhavam.
Destinatários da versão hebraica
No Livro de Ester, Mardoqueu é símbolo dos descendentes dos 
deportados, dos judeus da diáspora, isto é, da dispersão (2,5-6). Estes, e 
de modo especial os descendentes dos judeus deportados que não vol­
taram para a Palestina no final do exílio babilônico, são os primeiros 
destinatários do Livro de Ester. São pequenas comunidades sem maior 
significado político em meio a uma potência imperial. Esses grupos não 
têm nenhuma chance de mudar a situação de dominação. A melhor saí­
da parece ser o conselho de Jeremias: “Procurai ao bem-estar da cidade 
para onde eu vos deportei.” (Jr 29,7).
Os judeus dispersos procuram se adaptar ao império e conviver 
com o sistema, tornando-se confiáveis e até colaboradores, porém, pro­
curando preservar sua identidade cultural, como grupos separados
(3,8). Relacionam-se com todos. Porém, casam somente entre si. Vivem 
dispersos. Mas cultivam um nacionalismo muito forte.
E interessante notar que chegaram a se conformar com sua con­
dição de escravos (7,4). Já não visam mais a transformação de uma socie­
dade injusta e opressora. Defendem o rei diante de um complô contra 
ele (2,22). Seu desejo parece chegar perto do poder (8,1-2; 10,1-3).
Numa situação em que concretizar a justiça proposta pela profe­
cia em Israel era algo fora do alcance, há uma mudança significativa na 
vida de fé dos judeus dispersos. Mais que “fazer a justiça”, buscam “ser 
justos”. E como se é justo? Observando a Lei de Deus expressa na 
Torá, especialmente a prática do sábado, da circuncisão, das obras de 
piedade, como o jejum, a oração e a esmola. Enquanto isso, o justo ju­
deu preserva sua identidade sem questionar as estruturas de opressão e 
esperapelo dia em que Deus viria libertá-lo.
24
Ester, a mulher que enfrentou o palácio
E importante destacar aqui que, assim como nos livros de Rute e 
Cantares, que já vimos, mais uma vez uma mulher é a protagonista na li­
bertação de seu povo. Assim também será no Livro de Judite e na histó­
ria de Susana em Dn 13. Como veremos, é preciso também juntar o 
Livro de Eclesiastes ao esforço de questionar a cultura patriarcal que 
ainda está presente com força no Livro do Eclesiástico.
Isso significa que as mulheres continuavam tendo um papel sig­
nificativo no resgate de sua dignidade e de sua participação nas lutas li­
bertárias de seu povo, em meio a um contexto fortemente patriarcal, 
como já vimos no volume anterior. Conspiram contra a ideologia ma­
chista do templo de Jerusalém.
Ester salva seu povo do extermínio. Judite o liberta dos opresso­
res e Susana resiste contra o legalismo do Judaísmo, desmascarando os 
juizes que a condenavam injustamente.
Além disso, são fiéis ao Deus do Exodo, a YHWH libertador dos 
pobres, a quem defendem. Lutam pela liberdade, por terra, pela vida, 
dispostas a morrer pela causa da justiça.
A festa dos Purim, das Sortes
Leia Ester 9,20-32!
Um dos principais objetivos do Livro de Ester é servir como fun­
damentação teológica para a festa judaica das Sortes. Quer explicar a 
origem da festa das Sortes. Nesse sentido, o conto sapiencial é uma etio- 
logia, isto é, busca a causa primeira que deu origem à festa. A festa dos 
Purim, também chamada de “dia de Mardoqueu” (2Mc 15,36), era uma 
festa bem popular, com banquetes, bebidas, música e uso de máscaras. 
Era um tipo de carnaval.
E provável que essa festa tenha origem entre os judeus da diáspo- 
ra na época dos persas ou até antes, na época dos babilônios. E que várias 
de suas características vêm das festas populares babilônias e persas, das 
quais certamente os judeus participavam. Porém, sem se deixar conta­
minar com a ideologia de opressão que era passada nessas festas, muito 
ligadas ao naturalismo e a magias. Ao mesmo tempo em que participa­
25
vam dessas festas, os judeus permaneciam fiéis ao conteúdo da Páscoa, 
sua festa que celebrava o Deus que liberta. Substituíam, portanto, o cul­
to a divindades manipuladas em favor de sistemas de opressão pela fé 
em YHWH. Na verdade, a história de Ester e de Mardoqueu é uma 
reedição da experiência libertadora do Êxodo dirigida às comunidades 
judaicas da dispersão.
Nesse sentido, os judeus da diáspora já faziam o que fariam mais 
tarde as nações africanas para preservar sua fé diante da imposição do 
catolicismo europeu. Negros e negras escravizados foram, por exem­
plo, obrigados a cultuar os santos católicos. Na verdade, porém, para os 
fiéis dos cultos africanos, as imagens representavam seus orixás. É o 
caso de Maria que simbolizava Iemanjá, orixá feminino, a mãe das 
águas, a rainha do mar.
Vejamos alguns elementos babilônios e persas que certamente 
influíram na festa judaica dos Purim e no Livro de Ester, fundamento 
teológico dessa festa.
• Os nomes dos atores centrais têm sua origem nas divindades 
Marduc, Deus solar, e Ishtar, Deusa astral. Mardoqueu e Ester derivam 
dos nomes dessas divindades babilônias.
• A prática de lançar as sortes através de seus sacerdotes era 
uma das ações de Marduc, na festa do ano novo.
• A data da festa dos Purim coincide com a festa persa para os 
mortos.
• A festa persa que celebrava as vitórias do rei Dario I (521-486 
a.C.) era o carnaval dos persas. Há semelhanças entre essa festa e a dos 
Purim.
E significativo perceber que festas de um povo estrangeiro sejam 
assumidas pelo Judaísmo, porém, despidas de seu conteúdo mítico e 
mágico e adaptadas à fé de Israel, à memória do Deus que liberta. É o 
mesmo processo feito com o mito do dilúvio.
Propomos que você leia agora a novela de Ester seguindo a pro­
posta de divisão da versão hebraica, como segue, incluindo os acrésci­
mos da versão grega.
26
Versão hebraica
A versão hebraica de Ester pode ser assim dividida:
• 1,1-2,18: A dominação de Assuero. Segundo o texto hebrai­
co, a história de Ester se passa na cidade de Susa, uma das capitais dos 
persas, durante o reinado de Assuero, isto é, do rei Xerxes I (486-464
a.C.). A rainha Vasti é destituída de seu cargo porque ousou desobede­
cer à ordem de seu marido (1,1-22). E importante ver neste seu gesto 
também uma forma de resistência à estrutura patriarcal. Mas dessa for­
ma, estava aberto o caminho para que Ester, uma órfa judia, pudesse 
tornar-se rainha em seu lugar (2,1-18). Essa primeira parte começa com 
três banquetes (1,3.5.9) e, no final, acontece mais um (2,18). São os ban­
quetes do sistema de opressão do império.
• 2,19-4,17: O conflito entre Amã e Mardoqueu. Depois de 
uma conspiração de dois eunucos contra o rei (2,19-23), surge um con­
flito entre o primeiro ministro Amã e Mardoqueu, primo e tutor de 
Ester (3,1-6). Amã consegue que o rei decrete perseguição não só a 
Mardoqueu, mas também a todo o povo judeu disperso pelo império 
(3,7-13). Mardoqueu e Ester se articulam para impedir o massacre de 
seu povo (4,1-17).
• 5,1-7,6: Os banquetes de Ester. Ester intervém corajosa­
mente junto ao rei em favor dos judeus, desmascarando o plano de Amã 
(5,1-7,6). Essa parte, que é o centro do livro, inicia com um banquete 
(5,1-5) e termina com outro (7,1-6). São os banquetes de Ester.
• 7,7-8,14: O destino de Amã e de Mardoqueu. O rei muda 
de posição e decreta a morte de Amã (7,7-10), bem como a liberdade do 
povo judeu em todas as cidades do império. Mardoqueu passa a ocupar 
o lugar de Amã e recebe autorização para aniquilar quem viesse a perse­
guir os judeus (8,1-14).
• 8,15-9,19: A festa da libertação. O povo judeu se alegra 
(8,15-17). Mardoqueu coloca seu poder de primeiro ministro a serviço 
da vida de seu povo, arrasando quem planejava destruir os judeus 
(9,1-19). Se a primeira parte do Livro de Ester (1,1-2,18) apresenta os 
banquetes dos poderosos e a terceira (5,1-7,6), os banquetes de Ester, 
esta parte apresenta os banquetes do povo que celebra a libertação 
(8,15-17; 9,17-19).
27
• 9,20-10,3: Apêndices. Por último, a versão hebraica do Livro 
de Ester apresenta, de um lado, a instituição da festa dos Purim, isto é, 
das “Sortes”, celebrada ainda hoje pelas comunidades judaicas 
(9,20-32). De outro lado, há elogios a Mardoqueu que governa a serviço 
da felicidade de seu povo (10,1-3). Na tradição judaica, o Livro de Ester 
é lido por ocasião da festa dos Purim.
Nas nossas traduções da Bíblia, a parte que corresponde à versão 
hebraica de Ester é feita diretamente do texto em hebraico.
Nos dias de hoje, como se manifesta em nossa realidade o 
poder dos donos do mundo, das suas estruturas de morte? E possí­
vel enfrentá-las? Através de que meios? Por que são acusados de 
terroristas ou inimigos da liberdade aqueles que não dobram o joe­
lho diante do império? Que tipo de ameaça representam? Por que 
existem atos terroristas? Será que não é resposta desesperada à 
opressão?
Que tipos de banquetes existem hoje? Todos têm acesso a
eles?
Quem fica excluído? Qual seu significado?
Como preservar os valores e a diversidade da cultura popu­
lar, diante da imposição de um pensamento único que favorece a 
poucos? Como manter as raízes culturais em meio a tantas migra­
ções a que o povo se vê obrigado?
De que modo Deus continua agindo na nossa história, pro­
movendo a vida e a libertação?
Como transformar as estruturas de poder em serviço ao
povo?
Ainda há quem governa para os amigos em primeiro lugar? 
Qual o papel da mulher na transformação do poder a serviço da 
justiça e da vida do povo?
28
Eclesiastes: felicidade é usufruir 
do próprio trabalho
‘E is que a felicidade da pessoa é comer e beber, 
desfrutando do fru to do seu trabalho. ” (Ecl 2,24)
Data e autoria
O Livro do Eclesiastes foi escrito em torno de 250 a.C., sob o 
auge da dominação dos Ptolomeus.
Ele também é conhecido como o Livro de Coélet, uma palavra 
que está na forma feminina. Em hebraico,isso significa “a pessoa que 
reúne, fala ou lê na assembleia”.
Coélet representa os sábios que questionam, que fazem refletir.
Sua filosofia, porém, é diferente da sabedoria dos filósofos gre­
gos. São, como dizemos hoje, intelectuais orgânicos que colocam seu 
saber a serviço do povo. Leia a conclusão do livro em 12,8-14 e repare 
especialmente os w . 9-10!
Coélet e a cultura helênica
Por um lado, Coélet questiona a sabedoria tradicional judaica e, 
por outro, critica o modo de vida dos gregos.
O Helenismo valorizava o corpo, o prazer, o individualismo, o 
acúmulo de riquezas, o poder e o conhecimento. Coélet avalia que em 
tudo isso não está o verdadeiro sentido da vida, a felicidade. Somente é 
possível usufruir desse modo de vida proposto pelas elites gregas, 
vivendo às custas da exploração do trabalho alheio. Por isso, afirma ca­
tegoricamente que tudo isso é fugaz, passageiro, transitório. Repete a 
palavra “fuga cidade/transitoriedade/relatividade/ilusão/vaidade” nada 
menos que 38 vezes. Somente em 1,2 ela aparece 5 vezes. Ecl 1,2 e 12,8 
formam a moldura do livro. Confira!
Veja, agora, como Coélet analisa os valores do modo de vida dos 
gregos e compare com os valores neoliberais de hoje:
29
• Poder do conhecimento, da sabedoria que tem resposta para 
tudo (1,12-18; 2,12-17).
• Prazer (2,1-3). Havia uma corrente filosófica na Grécia chama­
da epicurismo, que colocava o prazer como bem supremo.
• Poder econômico e político (2,4-11; 4,13-16; 5,9-15; 6,1-2).
• Trabalho competitivo e ganância de lucro para enriquecer 
(2,18-23; 4,4).
• Individualismo (4,7-12).
Eclesiastes é um livro da Bíblia que resiste contra a política de he- 
lenização. É uma voz contrária à opressão dos gregos. Para que traba­
lhar tanto, para que plantar e colher se é outro quem vai comer? Leia Ecl 
1,3; 3,9; 6,2!
É importante lembrar que Eclesiastes é o primeiro livro bíblico a 
criticar o feitiço do dinheiro, sua artificialidade e, ao mesmo tempo, sua 
falsidade. Ele não tem poder sobrenatural. Por isso, prestar-lhe culto é 
pura idolatria e não traz felicidade para quem faz dele seu ídolo.
Leia ainda 3,16; 4,1; 5,7-8; 8,4; 9,14-16; 10,16-20 e perceba a si­
tuação dos pobres diante do poder do rei e da estrutura estatal para con­
trolar o povo!
Coélet e a cultura tradicional judaica
Coélet questiona também a cultura tradicional judaica.
Um dos questionamentos se dirige àqueles que orientam sua vida 
pelo dogma da retribuição. Leia 2,26 e perceba como Coélet considera a 
doutrina da retribuição uma ilusão e frustração.
Há um longo texto em que continua questionando a sabedoria 
tradicional do Judaísmo, voltando mais vezes à doutrina da retribuição. 
Esse texto corresponde a 6,11-9,6. Confira!
Em vários casos, Coélet cita primeiro a posição tradicional para 
depois rebatê-la, dando sua opinião. Propomos que você leia alguns 
versículos que representam a visão tradicional, acompanhando, em se­
guida, os questionamentos levantados por Coélet, conforme segue:
30
Sabedoria tradicional Posição de Coélet
7,26: cultura patriarcal. 7,27-29: o machismo é constru­
ção cultural da humanidade. Não 
foi assim desde as origens (Gn 
1,26-27; 2,21-24).
8,1: parece ser uma referência ao 
funcionário do rei que, com sua 
sabedoria, poderia influir nas de­
cisões do seu soberano.
8,2-4: o conselheiro que assesso­
ra o rei, a quem jurou fidelidade, 
deve se submeter a seu soberano, 
que faz como bem lhe aprouver.
8,5: a obediência à lei sempre é 
premiada a seu tempo.
8,6-12a: Coélet não concorda 
com essa doutrina da retribuição.
8,12b-13: o temor de Deus tem 
como recompensa a felicidade.
8,14-9,6: mais uma vez, Coélet dis­
corda, uma vez que a realidade des­
mente o dogma da retribuição.
Coélet ainda questiona a prática tradicional da religião, centrada 
no oferecimento de sacrifícios no altar do templo e em observâncias le­
gais. Coélet insiste na escuta de Deus no silêncio em lugar de muitas pa­
lavras vãs. Insiste na coerência, pois isso é temer a Deus. Confira 
4,17-5,6!
O valor que gera felicidade
Se a felicidade não está na sabedoria, no prazer, na riqueza, no in­
dividualismo e no poder político, onde, então, podemos encontrá-la?
A resposta de Coélet está presente ao longo de todo o texto. Ao 
contrário da vida luxuosa, conseguida através do trabalho escravo ou da ex­
ploração de outros, Coélet defende um projeto diferente de relações na 
produção. A felicidade consiste em viver com simplicidade do fruto do seu 
próprio trabalho. Aí está a chave da felicidade. Sua proposta é para quem 
trabalha e não para quem vive do trabalho alheio. Trabalhar para que ou­
tros aproveitem o fruto do trabalho não gera felicidade (1,3; 2,18; 3,9).
31
Ao ler o Livro de Eclesiastes, convém que você preste atenção à 
quantidade de vezes em que aparecem as palavras “trabalho” (25x) e 
“trabalhador” (2x).
Não deixe de ler as citações que seguem e que são como que um 
refrão que perpassa todo o livro: 2,10.24; 3,13.22; 5,17-19; 8,15; 9,7-9!
Compare agora a proposta de Coélet com a do 3o Isaías em Is 65,17-25!
O caminho para alcançar a felicidade
Vejamos agora alguns caminhos propostos por Coélet para se 
chegar à verdadeira felicidade, em que se possa trabalhar tranquilamen­
te e usufruir do próprio trabalho.
1. Coélet propõe relativizar tudo aquilo que não dignifica a vida.
Os valores que questiona, você já leu nos itens acima sobre
“Coélet e a cultura helênica” bem como “Coélet e a cultura tradicional 
judaica”. Coélet relativiza tudo. Tudo é efêmero, passageiro. Somente 
Deus não passa. Só Ele explica o mistério da vida e é o único Senhor ab­
soluto da história (8,17). A vida é um dom que dele recebemos (2,24; 
3,13; 5,17-19; 7,29; 8,15; 9,7-9).
2. Outro caminho é o do temor de Deus. Veja como Coélet insis­
te no “temor”: 3,14; 5,6; 7,18; 8,12-13; 12,13!
Temer a Deus é reconhecer que só Ele é soberano. Se é assim, 
então todos somos criaturas suas. Portanto, não é a nenhuma pessoa 
que devemos temor, como exigiam os reis, mas somente a Deus. O te­
mor de Deus liberta da absolutização dos reis como representantes das 
divindades na terra. Cria uma nova consciência que resgata a dignidade, 
o direito à plena realização de todas as pessoas.
Por outro lado, temer a Deus quer dizer 
devotar-lhe respeito, fidelidade. E seguir seu ca­
minho de amor e de justiça. O temor a Deus é o 
critério fundamental da verdadeira religião.
3. Um terceiro caminho é o da solidarie­
dade para resistir (4,7-12) e para promover a partilha (11,1-2). Não dei­
xe de conferir as citações!
"A corda tripla 
não se arrebenta 
facilmente." 
(Ecl 4,12b)
32
4. Por fim, não podemos deixar de citar a sabedoria dos pobres 
como mais um caminho para se chegar à felicidade. Vimos que Coélet é 
crítico à sabedoria tradicional (1,16-18; 6,11-9,6; 12,12). Contudo, nos 
apresenta uma outra sabedoria, a sabedoria dos pobres (4,13; 9,15-16), a 
sabedoria que gera vida e que vale mais que o dinheiro (7,12), a sabedo­
ria com humildade (7,16-18), a sabedoria sem o poder das autoridades e 
das armas (7,19; 9,13-18).
O livro
Propomos a seguinte divisão para o Livro de Eclesiastes:
• 1,1: Título
• 1,2-11: Introdução
• 1,12-6,10: Fugacidade da vida
• 6,11-9,6: Revisão da sabedoria tradicional
• 9,7-12,8: Conselhos e sentenças diversos
• 12,9-14: Conclusão do redator.
Em nossos dias, em que valores as pessoas procuram sua fe­
licidade? O que a propaganda oferece como sentido da vida para a 
humanidade? Quais são as necessidades mínimas, contudo, sufi­
cientes para uma vida digna? Quais são as necessidades artificiais 
criadas pela mídia, mas que não geram felicidade? Como não dei­
xar se enganar por esse bombardeio da propaganda?
O que Coélet tem a dizer para o mundo neoliberal globalizado?
Para as minorias que vivem da exploração dos pobres? Quem 
são os que vivem do trabalho de outros? Como fica quem está sem 
emprego, porém, gostaria de trabalhar? Quando um trabalho se 
transforma em uma fadiga inútil e quando ele é um dom de Deus?
Oque vale mais: o conhecimento de alguém a serviço do 
projeto dos donos do mundo ou a sabedoria de um pobre a serviço 
da coletividade, da solidariedade? Que projeto nós apoiamos?
Como a religião pode ser um instrumento de estabilidade ou 
de transformação do sistema vigente? O que significa temer a 
Deus em nosso cotidiano?
33
Zacarias 9-14: esperança num rei 
justo e pobre
“Eis que o teu rei vem a ti. Ele é justo, 
vitorioso e pobre, montado sobre um jumento, 
sobre umjumentinho,filho da jumenta. ” (Zc 9,9)
Data
Já vimos, nas páginas 92 a 95 do volume 5, que Zacarias 1-8 é 
profecia que corresponde à atuação histórica do profeta Zacarias entre 
os anos 520 e 515 a.C., durante a construção do 2o templo.
Já Zacarias 9-14 são escritos de profetas anônimos que acrescen­
taram seus textos ao Livro do profeta Zacarias e que já existia.
Os capítulos 9-14 de Zacarias correspondem à época dos gregos.
Confira como 9,1-8 se refere às campanhas militares de Alexandre 
Magno. Portanto, as profecias do 2o Zacarias se encontram sob o impac­
to das conquistas de Alexandre e devem ser datadas entre 300 e 250 a.C.
Zc 9-14: duas partes bem distintas
A partir do gênero literário, podemos dividir Zc 9-14 em duas 
partes bem distintas.
A primeira é Zc 9-11. E um texto quase todo escrito em poesia.
Os autores devem ser levitas defensores dos pobres. São críticos 
ao imperialismo dos Ptolomeus. Sua mensagem central é a libertação do 
povo (9,1-11,3) e o julgamento dos maus pastores (11,4-17).
A segunda parte é Zc 12-14. E um texto quase todo escrito em 
prosa. A origem dessas profecias está ligada a Jerusalém. Há uma preo­
cupação com a restauração do culto no templo e das festas (14,16.20).
Seus autores estão ligados ao ritual do templo e aos sacerdotes.
Retomam a teologia cronista no sentido de que Israel é a união de 
todas as tribos ao redor de Davi, do culto no templo de Jerusalém. Seus 
destinatários são os moradores da Judeia, de Jerusalém da descendência 
de Davi. A eles é anunciado um novo futuro, enquanto se espera a ma­
nifestação da realeza de Deus.
34
Na visão dos autores de Zc 12-14, a libertação vem da Judeia 
(13), através da vinda do Dia de YHWH (14). Será o julgamento de sal­
vação no qual Deus vem para renovar a aliança, manifestando-se como 
o único rei universal (12,7; 14,9).
No entanto, seus autores parecem ser críticos aos sacerdotes do 
templo que se diziam os verdadeiros representantes da profecia. Nesse 
sentido, Zc 13,2-6 registra a crítica aos que haviam roubado a memória 
de resistência dos pobres, a memória de luta dos verdadeiros profetas. 
Você já leu, mas vale a pena conferir de novo!
São favoráveis também às comunidades do interior da Judeia, às aldeias 
do campo, em detrimento dejerusalém. Seus autores, portanto, embora in­
cluam os moradores de Sião no plano de salvação centrado em Jerusalém, 
colocam na frente deles aqueles que os piedosos cumpridores da lei tanto 
desprezavam como ignorantes e impuros. Não deixe de ler 12,7!
A esperança na vinda de um Messias
Um tema comum às duas partes é a esperança na vinda de um 
Messias. E que o povo vivia numa realidade de dura opressão sob os 
Ptolomeus, sem perspectivas, a curto prazo, de alcançar a libertação. 
Por isso, olha para o futuro e espera por um Messias pobre, bom pastor 
c da linhagem de Davi.
Na primeira parte (9-11), merece destaque a referência à vinda 
de um rei messiânico pobre, montando um jumentinho. Seu projeto é 
acabar com a força das armas e estabelecer uma era de paz em todo o 
planeta (9,9-10). E o messianismo que vai na linha dos antigos profetas. 
Leia também Mt 21,4-9 e perceba como a comunidade cristã viu a reali­
zação dessa profecia em Jesus de Nazaré!
Outra característica do Messias é que ele é apresentado como o 
bom pastor em oposição aos maus pastores. Leia 11,4-17! Compare 
esse texto com Ez 37,15-28!
Na segunda parte (12-14), a figura do Messias volta a ser ligada 
com a descendência de Davi (12,8). E o messianismo centrado em Jeru­
salém, onde o culto e o templo, vinculados à lei, são as mediações privi­
legiadas entre Deus e o povo.
35
Nessa segunda parte, a esperança na libertação está organizada 
em torno de três figuras-chave da história passada de Israel. São elas:
Davi, Elias e Josias. E um texto de esperança dirigido parajerusa 
lém, para a Judeia e para os descendentes de Davi (12,8).
Em Zc 12, a referência ao “traspassado” (12,10) é uma provável 
lembrança do assassinato do rei Josias da dinastia de Davi, em 609 a.C., 
para compreender o sentido do sofrimento pelo qual o povo estava 
agora passando sob o peso da opressão dos Ptolomeus. O sofrimento 
tinha um sentido purificador e transformador na vida do povo. Os pri­
meiros cristãos aplicaram essa passagem a Jesus ao 19,37; Ap 1,7).
Em Zc 13, o acento principal é a luta contra a idolatria. E o per­
sonagem principal da história de Israel que serviu de modelo na luta 
pela libertação dos ídolos é o profeta Elias (lR s 18-19). A libertação ple­
na para o povo somente será possível no momento em que forem ven­
cidos os falsos profetas junto com os ídolos que legitimam sistemas de 
opressão. Somente então o Deus libertador terá seu nome santificado.
Zc 14 celebra a manifestação da realeza de YHWH, que será o úni­
co rei do mundo (14,9). Serão vencidos todos que se opuserem a Jerusa­
lém, que habitará em segurança. Então todos os povos virão a Jerusalém 
para celebrar, no templo de YHWH, a festa das Tendas (14,16-21).
Tobias: Deus é fiel à fidelidade do justo
“Se você vê um pobre, não desvie o rosto, 
e Deus não afastará seu rosto de você. ” (Tb 4,7)
Data, destinatários e gênero literário
O Livro de Tobias foi redigido em grego e é um dos sete livros 
que não estão na Bíblia hebraica. Consequentemente, também não se 
encontra na Bíblia usada pelas igrejas protestantes.
Foi escrito em tomo de 200 a.C. Embora situe os acontecimen­
tos no século 8 a.C., de fato, o Livro de Tobias se refere aos judeus da
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diáspora durante o período dos gregos. O modo de vida da grande po­
tência era uma tentação para os judeus. Em vez de resistir, muitos prefe­
riram o caminho mais fácil, aderindo à cultura helênica, que sustentava 
ideologicamente o sistema de opressão do império.
Tal como o Livro de Ester, também seus destinatários são as co­
munidades judaicas dispersas pelas cidades do império. Os acontecimen­
tos narrados em Tobias igualmente são localizados fora da Palestina. 
Tobit, o pai de Tobias, é do Reino do Norte, da tribo de Neftali (1,1). E 
um sinal de que o livro se dirige para qualquer israelita na dispersão.
O Livro de Tobias não faz parte do gênero literário histórico, 
mas sapiencial. E uma espécie de novela, como o Livro de Ester.
Tema e objetivo do livro
Diante da perda da identidade cultural judaica em meio a um am­
biente hostil, o Livro de Tobias quer incentivar os judeus dispersos a 
manterem sua identidade original, seus costumes, sua cultura, suas leis, 
sua religião. Tobias quer estimular os judeus da diáspora a permanece­
rem fiéis à fé de Israel, mesmo que tivessem que falar o grego e viver a 
partir das categorias do modo de vida dos gregos, de sua visão do mun­
do. O Livro de Tobias nos apresenta uma família judaica como modelo 
de fidelidade na dispersão.
A novela de Tobias propõe uma vida totalmente de acordo com a 
vontade de Deus. Para o judeu, isso quer dizer uma vida conforme a lei, 
que expressa a vontade de Deus. Viver a lei, ser fiel a Deus é “ser justo”. 
A fidelidade a Deus traz a plena realização aos fiéis. Deus mesmo provi­
dencia tudo o que é preciso para alcançar o sentido da vida.
Deus oferece gratuitamente seus dons. Da mesma forma, Ele 
quer que as pessoas também ajam com gratuidade e não de forma inte- 
resseira. O nome de Tobias quer dizer “YHWH é bom”. Com isso, o 
autor da novela quer mostrar que Deus é fiel ao justo, àquele que cum­
pre sua vontade, sua lei. Nesse sentido, podemos perceber a presença 
do dogma da retribuição. Apesar de todas as provaçõespor que passa 
Tobit, pai de Tobias, ele é fiel a Deus que, por sua vez, o abençoa com
37
uma idade avançada, com a honra, com descendência e com prosperi­
dade (14,2-3).
Os autores do Livro de Tobias representam a visão nacionalista 
da comunidade judaica pós-exílica. São fiéis à rigorosa observância da 
lei (1,8). Representam, portanto, a tradição ortodoxa do Judaísmo 
pós-exílico na diáspora.
O livro
O Livro de Tobias tem quatro partes bem delimitadas.
1,3-3,17: Prólogo: são vários acontecimentos a respeito da 
vida de Tobit, pai de Tobias, e de sua família. Apesar de se encontrar no 
exílio em meio a um contexto multicultural, Tobit se manteve fiel à lei e 
às tradições dos judeus. Exalta as virtudes de Tobit (1,3-22), descreve 
sua cegueira e sua oração (2,1-3,6) e se refere às provações e à oração de 
Sara, futura esposa de Tobias (3,7-15).
• 4-9: Viagem de Tobias a Ecbátana para resgatar um di­
nheiro. Depois das orientações de Tobit a seu filho (4,lss), Tobias arru­
ma um acompanhante (5,lss) e captura um peixe durante a viagem (6,1-9). 
Já próximo a Ecbátana, o acompanhante Rafael ou Azarias propõe a To­
bias que se case com Sara (6,10-19). De fato, Tobias se apaixona por ela 
(7,lss), expulsa dela o demônio Asmodeu ao incinerar as vísceras do peixe 
(8,lss), resgata o dinheiro de seu pai e se casa com ela (9,lss).
• 10-13: A volta para casa. Tobias volta com Sara e Rafael para 
Nínive (10,lss) e se reencontra com o pai, curando sua cegueira com o 
óleo do peixe (ll,lss). Rafael, que protegera Tobias do peixe, curara Sara 
e Tobit, revela sua identidade de anjo e segue para junto de Deus 
(12,lss). Diante disso, Tobit entoa um hino de louvor (13,lss).
• 14: Epílogo: Por sua fidelidade a Deus, de acordo com a 
doutrina da retribuição, também Deus foi fiel a Tobit, permitindo que 
morresse com idade avançada, com honra, com descendência e com 
prosperidade. Antes de morrer, Tobit recomenda a seu filho que viva 
de acordo com a justiça, isto é, de acordo com a lei. Depois da morte 
dos pais, Tobias vai morar junto com seu sogro Ragüel em Ecbátana, 
onde morre.
38
O Helenismo e a crença em demônios
Sobre a influência da demonologia persa na crença israelita 
em demônios, você já leu no quadro sobre Satanás nas páginas 171a 
174 do volume 5.
Porém, como Asmodeu, o demônio persa, da ira e da violência, 
exerce um papel importante no Livro de Tobias (3,7-8; 6,8-19; 8,1-3), e 
como a expulsão de demônios terá um importante significado na práti­
ca libertadora dejesus, convém que voltemos a esse assunto.
A ideia de Platão (429-347 a.C.) a respeito dos demônios é a 
base da crença dos gregos nessas entidades. Entre os principais as­
pectos da crença em demônios no mundo grego, destacamos os 
seguintes:
• Tinham a ideia de que, entre o mundo das pessoas e o 
Olimpo, o monte das divindades, havia uma série de demônios, 
exercendo a função de guardiães dos templos.
• Acreditavam que o mundo estava também cheio de demônios.
• Achavam que os demônios eram o elemento unificador do 
universo.
• Imaginavam os demônios como seres intermediários entre 
as divindades e as pessoas.
• Tanto podiam ser bons como maus. Enquanto os bons 
serviam como guardas das pessoas, os malignos causavam pestes, 
guerras, desordens, etc.
• Pensavam que eram imortais como as divindades, de um 
lado, e, de outro, sujeitos a paixões como a humanidade.
• Sua habitação natural seria o ar.
• Julgavam que os demônios tinham influência sobre as pes­
soas, por isso elas precisavam recorrer à magia e à bruxaria para 
agradá-los ou neutralizar seus ataques.
• Por fim, criam que a alma de quem morria podia vir a ser 
um demônio.
Essas crenças dos gregos influenciaram também a concepção 
judaica a respeito dos demônios nos dois séculos que antecederam 
o movimento dejesus de Nazaré.
39
Especialmente a partir da época altamente conflitiva dos Selêu­
cidas, que veremos logo adiante, os judeus piedosos passaram a inter­
pretar, cada vez mais, a realidade como uma grande batalha cósmica.
De um lado, estava guerreando Deus com seus anjos, isto é, 
os judeus que lhe haviam ficado fiéis. De outro, guerreava Satanás 
com seus anjos, isto é, os exércitos dos Selêucidas e os judeus que 
aderiram ao Helenismo.
E importante destacar que, para os judeus piedosos, a figura 
de Satanás foi cada vez sendo mais personificada. Sua ação acontece 
nas pessoas inimigas dos fiéis judeus. Ainda mais que os governan­
tes gregos diziam que eram descendentes das divindades, da sua 
união com mulheres humanas. Não é difícil entender que os judeus 
fiéis também demonizassem as classes altas dos judeus, bem como 
os sumos sacerdotes, responsáveis pela intermediação entre Deus e 
o povo, quando estes promoveram a helenização do Judaísmo.
Não será por acaso que Jesus verá nos escribas, representantes 
da ideologia da sinagoga e do templo (cf. Mc 3,22-30), a ação dos de­
mônios que precisam ser “amarrados”, tal como o fez o anjo Rafael 
com Asmodeu no Livro de Tobias. Compare Tb 8,3 com Mc 3,27!
Leia agora Mc 5,1-20 e perceba que também não será por aca­
so que Jesus verá na dominação romana a ação demoníaca que pre­
cisa ser afogada no mar, tal como já acontecera com faraó e seus 
exércitos junto ao Mar dos Juncos (Ex 14,15-31).
E provável que na adesão de judeus ao modo de vida dos gre­
gos, esteja a origem do mito dos anjos decaídos como se pode ler no 
primeiro livro apócrifo de Enoque.
Para atualizar o Livro de Tobias para nossa realidade, pode­
ríamos fazer as mesmas perguntas que fizemos acima para o Livro 
de Ester.
Poderíamos ainda perguntar: que ensinamentos as orienta­
ções de Tobit para Tobias têm a nos dizer para a educação dos fi­
lhos, para a relação entre pais e filhos? Qual o papel da família na 
vida das pessoas? Como a família pode educar no sentido de trans­
mitir os valores da vida de geração em geração?
40
Dominação dos Selêucidas 
(198-142 a.C.)
“Destes reis brotou uma rai\ iníqua, 
Antíoco Epífanes, filho do rei Antíoco. ” (IMc 1,10)
223-187 a.C.: Antíoco III. Depois de muitas batalhas contra os Pto­
lomeus, o rei selêucida Antíoco III conquista a Pales­
tina em 198 a.C.
198-142 a.C.: A Palestina sob o domínio dos Selêucidas. Em torno 
de 180 a.C., edição do Livro do Eclesiástico.
196-175 a.C.: Sumo sacerdote Onias III, filho do sumo sacerdote Si­
mão II, que é elogiado em Eclo 50,1-21 por sua fideli­
dade à lei. Onias foi o último sumo sacerdote da 
linhagem de Sadoc que exerceu seu sacerdócio por su­
cessão hereditária.
188 a.C.: Paz de Apameia. Roma se impõe como a maior potência no 
Oriente Médio.
187-175 a.C.: Seleuco IV, filho de Antíoco III.
175-163 a.C.: Antíoco IV Epífanes, outro filho de Antíoco III.
174-172 a.C.: Sumo sacerdote Jasão, irmão de Onias III, corrompeu 
Antíoco IV para conseguir o cargo, prometendo au­
mentar a oferta de impostos e a helenização da comu­
nidade cultuai dejerusalém (2Mc 4,7-9).
172-163 a.C.: O sumo sacerdote Menelau também é favorável à he­
lenização do Judaísmo. Disputando o cargo de sumo 
sacerdote com Jasão, também comprou o cargo, cor­
rompendo os Selêucidas com uma soma ainda maior 
de dinheiro (2Mc 4,23-26). Mandou assassinar Onias 
III em 170 a.C. (Dn 9,25-26; 11,22; 2Mc 4,30-31).
169 a.C.: Antíoco IV Epífanes, ao voltar de uma campanha militar 
contra os Ptolomeus no Egito, saqueou o templo de 
Jerusalém com a cumplicidade do sumo sacerdote 
Menelau (IMc 1,16-28). Em 167 a.C., impõe a ferro e
41
fogo a cultura grega aos judeus. Transformajerusalém 
em pólis grega (lMc 1,29-35) e exige o oferecimento 
de sacrifícios a Zeus, divindade suprema do panteão 
grego, no templo de Jerusalém (lM c 1,54-59; 2Mc
6.1-2; Dn 11,31). É provável que tenha colocado no 
templo de YHWH a estátua de Zeus, a pedido dos sa­
cerdotes helenizantes (2Mc 6,2). Ordenou que fossem 
erigidos altares em todas as partes, exigindo dos judeus 
o culto a Zeus. Proíbe os costumes judaicos e a obser­
vância da lei.
167-142 a.C.: Revolta dos macabeus, iniciada pelo levita Matatias,contra a política de Antíoco IV; bem como contra a 
corrupção que havia em Jerusalém. Livros de Daniel, 
Judite e 2 Macabeus.
166-160 a.C.: Judas Macabeu, filho de Matatias, chefe dos judeus (lM c
3.1-9,22).
164 a.C.: Purificação do templo e restauração do culto.
163-162 a.C.: Antíoco V é rei. No entanto, Lísias exerce o poder.
163-160 a.C.: O levita Alcimo é sumo sacerdote no lugar de Menelau 
(lM c 7,5-25). Aliado dos gregos, era inimigo dos 
macabeus.
161-150 a.C.: Demétrio I, filho de Seleuco IV, assume como rei, de­
pois de mandar matar Antíoco V e Lísias.
160-143 a.C.: Jônatas, filho mais novo de Matatias, chefe dos judeus 
(lM c 9,23-12,53).
152 a.C.: Jônatas é nomeado sumo sacerdote (lM c 10,20s).
143-134 a.C.: Simão, outro filho de Matatias, sumo sacerdote e go­
vernador dos judeus (lM c 13-16).
142 a.C.: Fim da ocupação selêucida na Palestina.
O reinado do Selêucida Antíoco III (223-187 a.C.) foi o período 
em que os gregos chegaram ao auge de seu poder no Oriente Médio. Foi 
também o início de sua decadência. Antíoco III tentou avançar sobre a 
Europa. Porém, foi rechaçado pelos romanos. Estes impuseram-lhe 
uma paz humilhante e exigiram que entregasse parte de seu império.
42
Além de cobrar pesadas indenizações, os romanos tomaram seu filho 
como refém (IMc 8,6-7). Foi nessa época que Roma começou a se des­
tacar como uma nova potência que estava surgindo no horizonte. Dn
11,18 refere-se à derrota de Antíoco III para Roma.
Em 198 a.C., Antíoco III, depois de muitas batalhas com os Pto­
lomeus do Egito, foi vitorioso, tomando posse da Síria, da Fenícia e da 
Palestina. Eclo 10,8 faz referência a essas batalhas. Antíoco III conce­
deu regalias ao sumo sacerdote, bem como ao pessoal do templo. Logo 
passou a receber o apoio das famílias ricas, como a dos Tobíadas.
Antíoco III seguiu a mesma política dos Ptolomeus, não impon­
do à força o Helenismo. Permitiu que os judeus continuassem a seguir a 
sua própria lei. Mesmo assim, a cultura grega cada vez mais se fazia sen­
tir na Palestina. E nessa época, pelo ano 180 a.C., que foi escrito o Livro 
do Eclesiástico. Seu objetivo principal foi reavivar o modo de vida dos 
judeus diante da influência da cultura grega, como veremos adiante.
Quando Antíoco III foi morto, seu filho S eleu co lV (187-175 a.C.) 
o sucedeu. Para poder pagar as dívidas a Roma, tentou saquear o templo 
dejerusalém . 2Mc 3 e Dn 11,20 referem-se a esse episódio. Quando 
foi morto por seu ministro, seu irmão assumiu o trono.
A situação dos pobres se agravava por causa da ganância dos ri­
cos e do seu amor ao lucro. Confira a situação de pobreza na Palestina 
em Eclo 3,30-4,10; 5,1-8; 13,1-24 e 27,1!
Diferentemente de seu irmão,
Andoco IV Epífanes (175-163 a.C.) quis 
impor o Helenismo à força na Palestina.
O título que assumiu (Epífanes) já indi­
ca sua pretensão de ser a “manifestação 
de Deus”, de Zeus.
Sua nova política foi a imposição da cultura grega, sua religião e 
seus costumes sobre os judeus. Sua intenção era humilhar a comunida­
de judaica, proibindo a circuncisão, a observância do sábado e exigindo 
sacrifícios para divindades gregas. Chegou a construir em Jerusalém 
uma cidadela fortificada (IMc 1,33-35).
Dessa forma, Jerusalém ficou dividida. Por um lado, havia os ju­
deus favoráveis ao Helenismo, instalados na cidadela dentro da cidade
"Mandou-o também 
profanar o santuário 
de Jerusalém e dedicá-lo 
a Júpiter Olím pico." 
(2Mc 6,2)
43
santa, onde construíram um ginásio de esportes, bem como um templo 
consagrado a Júpiter ou Zeus. Eles tinham o apoio dos Selêucidas que 
tinham uma guarnição militar na fortaleza. Por outro lado, havia na Pa­
lestina os “hassideus” ou judeus “piedosos” que resistiam em defesa da 
tradição judaica, fechando-se cada vez mais dentro dos limites estabele­
cidos pela lei.
Além de sentir a opressão política e econômica, os judeus passa­
ram a sofrer também uma forte dominação cultural. Da mesma forma 
como, em séculos antes, reinava a dominação dos impérios, simboliza­
dos pela cidade de Babel, mais uma vez “toda a terra usava uma só lín­
gua e as mesmas palavras” (Gn 11,1). Certamente, a narrativa sobre a 
cidade de Babel em Gn 11,1-9 se tornou atual como nunca nesse novo 
contexto.
Diante da helenização da tradição de Israel, os judeus se dividem
Diante disso, o Judaísmo da Palestina se dividiu. Por um lado, es­
tava a classe dirigente. De outro, estavam os grupos de resistência, que 
veremos logo adiante.
A classe dirigente aceitou passivamente a influência do Helenismo. 
Até mesmo colaborava na sua implementação. Com a conivência do 
sumo sacerdote Jasão, que corrompeu o rei selêucida para obter o cargo 
(2Mc 4,7 -9), o Helenismo entrou inclusive em Jerusalém. Repare que Ja ­
são bem como Menelau, seu sucessor, têm nomes gregos. Com a nomea­
ção de Jasão para o sumo sacerdócio no lugar de Onias III, foi quebrada a 
sucessão hereditária dos sadoquitas no cargo de sumo sacerdote.
Os moradores de Jerusalém que aderiram ao Helenismo recebe­
ram inclusive o título de “cidadãos antioquenos”. Antes de continuar 
seu estudo neste volume, leia lM c 1,10-64!
Como você pôde perceber, até um ginásio para atletismo foi 
construído na cidadela dentro de Jerusalém (lM c 1,14-15; leia ainda 
2Mc 4,7-20!).
Pior que tudo isso, foi introduzir no próprio templo o culto a Zeus 
Olímpico, correspondente a Júpiter dos romanos, bem como proibir a ob­
servância do sábado, da circuncisão, etc. Não deixe de ler 2Mc 6,1-11!
44
Em Dn 11,31 e 12,11, a instalação do culto dejúp iter no templo d e je ­
rusalém é chamado de “abominação da desolação”. Confira!
Os saduceus
Os saduceus eram um grupo organizado, formado pela classe di­
rigente. Organizaram-se para defender seus interesses e privilégios. 
Eram da aristocracia sacerdotal, bem como dos setores leigos e ricos. 
Eram a elite ligada aos interesses econômicos do governo, do latifún­
dio, do templo e do grande comércio. Durante a dominação dos gregos, 
sua posição política era favorável à adoção da cultura helênica e à alian­
ça estratégica com os Selêucidas, que lhes garantia uma situação econô­
mica privilegiada.
Além de serem conservadores, viviam em torno do templo, con­
trolando o poder e o comércio. Os saduceus mantinham sua influência 
sobre o povo através das alianças com quem detinham o poder.
Eles não tinham mentalidade apocalíptica. Consequentemente, 
não esperavam por um Messias, nem acreditavam na ressurreição. So­
bre a teologia apocalíptica, trataremos adiante.
Mais tarde, apoiariam os reis hasmoneus abertos à helenização da 
cultura judaica, como ainda veremos. Alexandre Janeu (103-76 a.C.), 
por exemplo, apoiou-se neles, quando lutou contra os fariseus. Porém, 
Salomé Alexandra, sua esposa, que o sucedeu no trono (76-67 a.C.), ad­
mitiu novamente os fariseus no Sinédrio. A partir de então, começou 
um conflito entre os dois grupos no grande conselho, em que os sadu­
ceus continuaram sendo a maioria.
Literatura na época dos Selêucidas
O primeiro a reagir diante das provocações de Antíoco IV foi 
Matatias, levita (IMc 2,1; lC r 24,7) da aldeia de Modin situada a noroes­
te dejerusalém. Ali, matou o representante do rei, bem como um judeu 
que sacrificava às divindades gregas sobre o altar sob a ordem dos gre­
45
gos (lM c 2,24-25). Assim começou a luta contra os judeus que aderiram 
ao modo de vida helênica e contra a opressão dos Selêucidas.
Durante o exílio babilônico, o 2° Isaías havia iniciado uma aber­
tura de Israel para o mundo, como vimos no volume 5. Esdras e Neemias, 
ao contrário, impuseram um Judaísmo exclusivista. Contra eles reagi­
ram os livros de Rute e de Jonas. Os judeus de Alexandria retomaram o 
universalismo do 2° Isaías. Nesse sentido, o Helenismo foi um desa­
fio para Israel na retomada da sua missão de ser “luz para as nações” 
(Is 42,6; 49,6). Porém, os hassideus insistiram no Judaísmo legalista e 
preso a suas tradições. Em boa parte, a literatura bíblica nos dois últi­
mos séculos a.C. reflete, com diferentes ênfases

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