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PEZtODO ÇKEÇO £ r \ r 4 JSSUÒm k « ■ _ _ I»a M » iâáS f(fe jV W ' ̂ í t ■ Uma introdução à Bíblia Período Grego E Vida de Jesus V o l u m e 6 lido Bohn Gass (Org.) Digitalizado por: Jolosa São Leopoldo/RS 2005 PiJLlUÍ © Centro de Estudos Bíblicos - 2005 Rua João Batista de Freitas, 558 B. Scharlau - Caixa Postal 1051 93121-970 São Leopoldo/RS Fone: (51) 3568-2560 Fax: (51) 3568-1113 vendas@cebi.org.br www.cebi.org.br © PAULUS - 2005 Rua Francisco Cruz, 229 04117-091 São Paulo/SP Fone: (11) 5084-3066 Fax: (11) 5579-3627 www. :paulus.com.br editorial@paulus.com.br Elaboração: Udo Bohn Gass Revisão: Franciso Orofino, José Edmilson Schinelo, Monika Ottermann e Sebastião Armando Gameleira Soares Capa: Jair de O. Carlos Editoração: Rafael Tarcísio Forneck Reimpressões: 2011, 2012 ISBN: 978-85-7733-131-4 mailto:vendas@cebi.org.br http://www.cebi.org.br mailto:editorial@paulus.com.br Sumário Parte I: Época da dom inação g rega ............................................. 7 Introdução.................................................................................................. 7 Império Grego de 332 a 301 a.C.......................................................... 9 Dominação dos Ptolomeus (301-198 a.C.)....................................... 18 Literatura de resistência na época dos Ptolomeus......................... 21 Ester: uma mulher exige que o poder cumpra a justiça........... 22 Eclesiastes: felicidade é usufruir do próprio trabalho.............. 29 Zacarias 9-14: esperança num rei justo e pobre.......................... 34 Tobias: Deus é fiel à fidelidade do justo........................................ 36 Dominação dos Selêucidas (198-142 a.C.)........................................ 41 Literatura na época dos Selêucidas..................................................... 45 Eclesiástico: defesa da identidade de um povo........................... 46 Revolta dos macabeus (167-142 a.C .)............................................ 51 Teologia apocalíptica........................................................................... 59 Daniel: a luta contra o imperialismo.............................................. 64 Judite: Deus age pela mão de uma mulher................................... 68 2 Macabeus: resistência contra a imposição do Helenismo..... 74 Independência sob os hasmoneus (142-63 a .C .)............................ 77 Últimos escritos do Primeiro Testamento........................................ 81 Livro de Ester — o texto grego.......................................................... 81 1 Macabeus: a luta pela libertação.................................................... 83 Baruc: arrependimento e conversão................................................ 86 Sabedoria: ser sábio é ser justo.......................................................... 88 Conclusão da Ia parte................................................................................ 92 Para orar e aprofundar............................................................................ 96 Sugestões de leitura.................................................................................. 96 Apresentação.............................................................................................. 6 Parte II: V ida e pregação de J e s u s ................................................ 97 Introdução................................................................................................... 97 1 Jesus de Nazaré...................................................................................... 99 1.1 A vida de Jesus de Nazaré........................................................... 99 1.2 A vida pública de Jesus ................................................................ 102 1.3 Testemunhos de historiadores................................................... 104 2 Três poderes na Palestina.................................................................... 105 2.1 O poder de Roma.......................................................................... 109 Poder político, militar e econômico........................................ 109 Roma e os cultos............................................................................ 115 Mudanças na vida do povo...................................................... . 116 Conseqüências na vida do povo................................................ 116 Jesus e os romanos........................................................................ 117 A proposta política de Jesus....................................................... 119 2.2 O poder dos Herodes................................................................... 121 2.3 O poder do sinédrio...................................................................... 124 Jesus e o sinédrio............................................................................ 125 O templo e o sinédrio................................................................... 126 Jerusalém e o tem plo.................................................................... 128 As festas de peregrinação............................................................ 128 Jesus e o templo.............................................................................. 131 A lei e o tem plo.............................................................................. 136 Jesus e a lei........................................................................................ 137 Jesus desmascara a opressão da religião................................. 139 3 Divisão política da Palestina.............................................................. 141 3.1 Idumeia, Judeia e Samaria............................................................ 143 3.2 Galileia e Pereia............................................................................... 144 Jesus e Herodes Antipas.............................................................. 145 3.3 Decápole........................................................................................... 145 3.4 Itureia, Bataneia e Traconítide................................................... 145 3.5 Abilene............................................................................................... 146 4 Galileia, Samaria e Judeia .................................................................... 146 4.1 Galileia................................................................................................ 146 Jesus e a Galileia............................................................................. 148 4 4.2 Samaria.............................................................................................. 148 Jesus e o povo samaritano........................................................... 149 4.3 Judeia .................................................................................................. 151 Jesus e a Judeia................................................................................ 154 5 A sociedade judaica............................................................................... 155 5.1 Saduceus............................................................................................ 155 Jesus e os saduceus........................................................................ 157 5.2 Herodianos....................................................................................... 157 Jesus e os herodianos.................................................................... 158 A proposta econômica de Jesu s................................................ 158 5.3 Fariseus.............................................................................................. 160 Jesus e os fariseus.......................................................................... 163 A sinagoga........................................................................................ 165 Jesus e a sinagoga..........................................................................165 5.4 Zelotas............................................................................................... 166 Jesus e os zelotas........................................................................... 168 5.5 Essênios............................................................................................. 169 Jesus e os apocalípticos............................................................... 169 5.6 Batistas............................................................................................... 171 Jesus e os batistas......................................................................... 173 Jesus e as expectativas messiânicas......................................... 174 5.7 Os mais pobres............................................................................... 176 Jesus e as mulheres....................................................................... 178 Jesus e os doentes......................................................................... 181 As curas e a fé ................................................................................. 183 Continuar a atividade curativa d e je su s ................................. 184 6 Paixão, morte e ressurreição.............................................................. 187 A prisão..................................................................................................... 188 O julgamento.......................................................................................... 188 A crucificação......................................................................................... 191 A ressurreição......................................................................................... 192 Conclusão da 2a parte ............................................................................. 194 Para orar e aprofundar............................................................................ 196 Sugestões de leitura.................................................................................. 196 5 Apresentação Com este livro, Uma introdução à Bíblia chega ao volume 6, que está dividido em duas partes. A primeira é uma introdução à história de Israel no período de dominação do Império Grego (332 a 142 a.C.) e dos reis hasmoneus (142 a 63 a.C.). Ao mesmo tempo, situa os últimos livros do Primeiro Testamento surgidos naquela época. A segunda parte é dedicada a uma introdução à vida e pregação de Jesus de Nazaré no contexto do Judaísmo e do Império Romano, que impõe seu poderio na Palestina a partir de 63 a.C. 6 Parte I: r Epoca da dominação grega Introdução No volume anterior, estudamos a vida de Israel sob a dominação dos babilônios e dos persas. Vimos também a literatura bíblica que sur giu naquele período. Na primeira parte deste volume, estudaremos a época de domina ção dos gregos (332-142 a.C.) e o período de independência desde 142 até 63 a.C., ano em que os romanos passaram a dominar sobre a Palestina. Num primeiro momento, depois de algumas informações sobre a conquista do Império Persa pelo macedônio Alexandre Magno, vere mos o domínio dos gregos sobre a Palestina a partir do Egito (301-198 a.C.). Eles são conhecidos por Ptolomeus. É a ocasião para olharmos mais de perto os livros bíblicos dessa época, isto é, Ester, Eclesiastes, Za carias 9-14 e Tobias. Em seguida, abordaremos o domínio dos gregos sobre a Palesti na a partir da Síria, conhecidos por Selêucidas (198-142 a.C.). Veremos a imposição à força da cultura grega sobre os judeus, bem como a resis tência dos macabeus contra essa imposição. Analisaremos ainda as divi sões dos judeus em diferentes grupos no processo revolucionário, como os fariseus e os essênios. Desse período, são os seguintes livros: Eclesiástico, Daniel, Judite e 2 Macabeus. Por fim, estudaremos a época de independência dos judeus desde 142 a 63 a.C., período conhecido como dinastia dos hasmoneus. Sur gem os últimos Livros do Primeiro Testamento: U vro de Ester— o texto gre go, 1 Macabeus, Baruc e Sabedoria. 7 De saída, lembramos que sete dos onze livros que estudaremos nesta parte não se encontram nas traduções usadas pelas igrejas evangéli cas. São eles: Tobias, Eclesiástico, Judite, 1-2 Macabeus, Baruc e Sabedo ria. São os livros deuterocanônicos para os católicos romanos e apócrifos para os protestantes. Além disso, os livros de Ester e Daniel têm partes que só constam nas traduções católicas, como ainda veremos. Império Grego de 332 a 301 a.C. 336-323 a.C.: o macedônio Alexandre Magno conquista a Ásia Menor e a Síria (333 a.C.), Tiro, Gaza e o Egito (332 a.C.), a Pér sia (331 a.C.) e chega até o vale do rio Indo (330-326 a.C.). 323 a.C.: Morte de Alexandre Magno. A partir dessa data até 301 a.C., há uma disputa entre os seus sucessores a respeito da divisão do império. Uma conquista avassaladora Ao norte da Grécia, Filipe II (359-336 a.C.) era rei da Macedô- nia, cuja capital era Pela. Sua formação era grega e tinha como projeto conquistar a Grécia a fim de ter mais acesso ao comércio marítimo. Explora as rivalidades entre as cidades gregas, como Atenas, Esparta, Corinto e Tebas, apresentando-se como alternativa para a solução dos seus conflitos. Seu filho se chamava Alexandre. Dos 13 aos 16 anos, estudou com o filósofo Aristóteles. Quando seu pai foi assassinado (336 a.C.), ti nha 21 anos. Na ocasião, já era chefe do exército de seu pai. Controlou e unificou a Grécia. Alexandre Magno, como é conhecido, tinha uma am bição. Estava disposto a enfrentar o grande império dos persas, senho res absolutos de todo o Oriente Médio desde 539 a.C. De fato, em somente 12 anos, Alexandre conquistou todo o império que antes per tencia aos persas. E foi mais longe. Chegou até o atual Paquistão, con trolando inclusive o vale do Rio Indo. Segundo o historiador judeu Flávio Josefo, ao conquistar a Pales tina, Alexandre tomou as seguintes medidas em relação aos judeus a pe dido do sumo sacerdote: 9 • podiam viver livremente segundo suas leis; • estavam isentos de impostos a cada sete anos; • também os judeus da diáspora podiam viver segundo suas pró prias leis. Porém, aos poucos, essa situação privilegiada foi mudando. No princípio, lentamente e depois, de forma violenta, como veremos. Além de alcançar suas ambições políticas, Alexandre também es tava interessado em difundir a cultura grega ou helénica. Mas, acima de tudo, a finalidade de suas conquistas era comercial (lM c 1,3a.4b). Alexandre tinha planos para"A terra se calou diante dele. Ele se exaltou e seu coração se encheu de orgulho... multiplicando os males sobre toda a terra." (cf. IM c 1,3) estabelecer a capital de seu im pério na Babilônia, onde morreu de malária em 323 a.C., aos 33 anos de idade. Não deixe de ler IMc 1,1-9! Como não havia ninguém que tivesse condições de assumir o controle de todo o império, ele foi dividido entre os oficiais de seu exército. Seus sucessores disputavam entre si pelo controle das diferentes regiões. Essa disputa durou mais de 20 anos. Nesse período, a Palestina serve de corredor de passagem para os exércitos dos generais gregos em luta, em pelo menos oito ocasiões. Isso representa desgraça para o povo, que sofre pilhagens, deportações e violências de toda ordem. Somente a partir de 301 a.C., alguns gene rais se impuseram, apropriando-se das maiores regiões do vasto impé rio, como você pode conferir no mapa abaixo. A partir de Alexandria no Egito, o general Ptolomeu governa também sobre a Líbia, a Fenícia e a Palestina. Em 300 a.C., o general Seleuco funda a cidade de Antioquia da Sí ria para ser a capital de seu reino. Tinha também uma residência oficial na Babilônia. Antes dos gregos, os impérios que controlavam as terras de Israel eram do Oriente. Os últimos foram os persas. Antes deles, os babilônios. Com a dominação dos gregos, não há somente uma troca de donos so bre Israel. Há outra mudança significativa. Os gregos impõem outro 10 modo devida, outra cultura, conhecida por Helenismo. A cultura helc- nica trouxe profundas mudanças para a vida dos judeus, como veremos. A cultura helênica A palavra “helênica” vem de “helen” que significa “grego”. A Grécia Antiga era chamada de Hélade (lMc 1,1), termo correspondente ao hebraico “Javã” (Is 66,19). Ao falarmos de cultura helênica, estamos pensando no modo de vida que se difundiu no Oriente Médio a partir da dominação dos gre gos: seus valores e contravalores, sua economia e organização social, sua visão de mundo, das pessoas e das divindades, enfim sua cultura. Destaquemos, agora, algumas das características da civilização grega. 1. Antes de mais nada, é preciso destacar que, diferentemente da posse coletiva da terra em Israel, a economia grega estava organizada a partir da propriedade particular e individual da terra. Grandes extensões de terra pertenciam a uma única pessoa. Em conseqüência, havia traba lho escravo. O sistema escravocrata definia a estrutura social grega. 2. Três eram as camadas sociais na estrutura escravocrata da Grécia: • Os “livres” formavam a classe dominante. Só eles se conside ravam cidadãos. Seu ideal era viver tranquilamente, dedicando-se às ar tes, às atividades liberais, ao esporte e ao trabalho inte lectual. As suas mulheres ti nham funções importantes na administração dos lati fúndios de seus maridos. No entanto, não tinham participação nos assuntos públicos. Os cidadãos gre gos se consideravam o povo mais civilizado. A introdução do escravis- mo na Palestina aumentou os contrastes sociais. A alta sociedade, a classe dirigente e os funcionários a serviço dos gregos se enriqueceram, desviando tributos e aceitando subornos. "Os escravos devem ser escravos, porque não são homens. E bom para o escravo ser escravo, porque, sem governante, não sabe se governar. Sua única virtude é não faltar ao trabalho." (Aristóteles) 11 12 • Os “libertos” eram antigos escravos que haviam obtido a liberdade. • Os “escravos” eram em torno de dois terços da civilização gre ga. A eles e aos diaristas era reservado, segundo a opinião dos cidadãos, o trabalho inferior, isto é, o trabalho manual. Não tinham direito à pro priedade de terra. Ainda conforme os gregos livres, os libertos e os es cravos não eram considerados cidadãos com plenos direitos políticos. Por isso, não tinham o direito de participar da “democracia” da cidade grega. Havia escravos domésticos e outros que trabalhavam na produ ção, além de outros que trabalhavam em diversas atividades. Tanto os agricultores como os pequenos comerciantes se tornavam cada vez mais pobres. Muitos israelitas foram escravizados (IMc 3,41). 3. O Helenismo era uma cultura essencialmente urbana. Diferente mente da cultura rural palestinense, a cidade (pólis) era o foco de irradiação da cultura grega. Da palavra pólis vem a palavra “político”, isto é, cidadão, ou morador da cidade. Dela deriva também “política”, isto é, cidadania, que é a organização da cidade para o bem-estar de quem nela vive. O modelo padrão da cidade grega consistia na praça, nas avenidas com colunas, nos templos, no teatro e no ginásio de esportes. Além disso, nas cidades helênicas, que fundavam nas colônias conquistadas, havia destacamentos militares. 4. Através da dominação que exerciam sobre outros povos, os gregos difundiam seu modo de vida. Impunham sua cultura através de diferentes meios: • Seu estilo de vida. • A organização e a administração das cidades. • A cobrança de impostos e taxas. • O comércio e a moeda. • Nova organização da agricultura. • As escolas filosóficas e a literatura grega. • A língua grega que se tornou a língua internacional do comércio. • A religião com suas divindades e seus mitos. • As artes, em especial a arquitetura e a escultura. • Os esportes e as diversões em escolas, ginásios, teatros e praçis que construíam em cada cidade. O ginásio era o centro político 13 mais importante de reprodução do modo de vida grego. Nele estudavam os jovens varões. Ali se exaltavam as virtudes mili tares e as práticas esportivas, com vistas à preparação do corpo e da mente para a gu erra . • As colônias militares, o exército, a estratégia militar e as armas. 5. Diferentemente do Judaísmo, que estava estruturado sobre a família patriarcal e a vida comunitária fortemente disciplinada pela lei, a cultura helênica estava mais centrada no indivíduo que buscava a afir mação de sua liberdade e a satisfação de seus sentidos. 6. Em oposição à religião judaica, que era monoteísta e tinha princípios éticos que exigiam práticas coerentes no comportamento co tidiano dos judeus, a religião dos gregos era politeísta e não tinha inter ferência direta na vida diária das pessoas helenizadas. Um aspecto central da religião e dos mitos gregos é que eram fatalistas. Sua mensa gem era no sentido de legitimar a situação existente, sem possibilidade de mudança. Para o judeu, a medida das coisas é Deus. Para o grego, é o próprio homem. Quem não seguisse o modo de vida dos gregos era taxado de atrasado, fora de moda, retrógrado. De outro lado, era considerado mo derno aquele que assumia a cultura grega. Divulgando seus costumes, os gregos acabavam destruindo as tradições dos povos conquistados, garantindo, dessa forma, seu domínio. Hoje em dia, a ideologia hegemônica ainda continua acusan do de atrasados e contrários ao progresso aqueles que lutam por um mundo de justiça, de oportunidades iguais para todas as pessoas. Também é assim acusado quem busca construir um Estado de par ticipação popular e de inversão de prioridades, de valorização da educação, da saúde, enfim, uma sociedade que coloca em primeiro lugar a vida das pessoas. Por outro lado, a mesma ideologia considera moderno quem defende a cultura neoliberal, as privatizações, o Estado mínimo, o livre mercado, o direito irrestrito à propriedade para quem tem 14 poder econômico, enfim, um mundo que globaliza a miséria, en quanto coloca acima da vida os interesses econômicos, o absoluto domínio do livre mercado financeiro. E importante termos presente que cada cultura traz consigo valores de vida e antivalores. Importa termos o discernimento para distinguir qual é o modo de vida, o projeto de sociedade que cada ideo logia defende, e qual deles se aproxima mais da vontade de Deus. Por que o mundo inteiro se vê obrigado a aprender a língua inglesa? Por que há tantas músicas em inglês e tantas camisetas com letreiros na língua dos Estados Unidos? Por que há tanto espaço no noticiário para o que acontece ao norte do México? A política agrícola dos gregos A agricultura era de importância fundamental na organização econômica dos gregos. Sua função principal era sustentar as cidades e fornecer os produtos para incrementar o comércio. Para garantir a produção, organizavam uma política agrícola que privilegiava a formação de latifúndios. Neles, havia emprego massivo de trabalho escravo. Em torno das cidades, as terras pertenciam ao rei. Em muitos casos, sua administração era feita diretamente por funcioná rios nomeados pelos gregos. Em outros, vastas extensões de terra eram presenteadas aos amigos do rei. As melhores terras da Palestina, como a costa do Mediterrâneo, o vale de Jezrael, o vale do Jordão e parte da Transjordânia, assim foram distribuídas. Esse modo grego de organização da agricultura acabava com o tradicional sistema das aldeias na Palestina, fazendo com que elas per dessem sua autonomia política. Muitos camponeses perdiam suas ter ras, seus direitos, sua liberdade, passando a trabalhar como diaristas contratados pelos grandes proprietários. Mais do que se preocupar com a sobrevivência das aldeias, dava-se prioridade à produção em vista do comércio nas cidades e para a exportação. A imposição do modo de vida dos gregos levou a popula ção a um empobrecimento crescente. Por isso, muitos judeus se viram obrigados a migrar para cidades gregas na diáspora. 15 Desde a época dos persas,já não era mais o clã, isto é, um agrupa mento de famílias aparentadas, a unidade básica da sociedade israelita tradicional. Cada vez mais, a família vai se tornando a unidade econômi ca fundamental, deixando o clã em segundo plano. Palestina, um lugar estratégico em disputa Em meio ao vasto império de Alexandre Magno, a Palestina não passava de um pequeno pedaço de terra. Embora estivesse perdida den tro do grande império, ela continuava ocupando um lugar estratégico entre o Egito e a Síria. No início, porém, a situação do povo não mudou muito, uma vez que a imposição da cultura grega foi um processo progressivo. Os ju deus passaram da opressão persa para o domínio dos gregos, os novos senhores do mundo. Em meio às lutas entre os grandes, mais uma vez Israel trocou de dono. Do período de disputas entre os generais de Alexandre (323-301 a.C.), pouco sabemos a respeito da vida na Judeia. Porém, é provável que a vida da comunidade judaica continuava em torno de um governo formado por uma assembleia de anciãos. Quando o general Ptolomeu 1(323-282 a.C.) se apoderou de Je rusalém, deportou para o Egito muitos judeus. Provavelmente os tratou desse jeito porque devem ter apoiado o general Seleuco na disputa pelo controle sobre a Palestina. Zc 14,1-3 deve ser uma referência a esse exílio. Confira! No Egito, os judeus fixaram-se de modo especial em Alexandria, capital da dinastia dos Ptolomeus, cidade fundada por Alexandre em 332 a.C. Alexandria está localizada a oeste do delta do Rio Nilo, pró ximo ao Mar Mediterrâneo. Uma mudança importante em relação à dominação persa Na época dos persas, como vimos no volume anterior, constata mos que havia na Judeia especialmente duas forças sociais em forte tensionamento. 16 Por um lado, havia a comunidade judaica em torno da obser vância rigorosa da lei, comandada pelo 2o templo. Como tinha liberda de e até apoio do império para essa observância ortodoxa, ela não se opunha muito à opressão persa. Até fàzia críticas. Veja, por exemplo, q uejl 1,6-7; 2,20 e Ne 9,36-37 constatam a opressão do império do nor te. Porém, era ainda uma tímida resistência. Por outro lado, os pobres da terra, mais que se oporem direta mente à opressão estrangeira, resistiram contra a exploração e a imposi ção do rigor da lei pelas elites locais, aliadas aos persas. Foi o caso dos livros de Rute,Jonas, Jó e Cânticos dos Cânticos. Porém, lutar contra as elites locais e sua ideologia era uma forma indireta de lutar também con tra o império, uma vez que elas estavam a serviço de sua dominação. A partir da opressão dos gregos, muda a situação. De agora em diante, a cultura helênica vai entrando, primeiro aos poucos e depois à força, na vida de todo o povo. Diante disso, a comunidade judaica fiel ao rigor da lei, seja em torno de Sião seja na diáspora, dividiu-se. Veremos adiante como a clas se dirigente apoiou a helenização da cultura judaica, enquanto grupos de resistência foram surgindo em meio aos judeus piedosos e fiéis obser- vantes da lei. Nesse sentido, os movimentos de resistência contra a opressão e a literatura em defesa da identidade judaica têm fundamentalmente sua origem em duas tendências. De um lado, temos a reação contra a helenização do Judaísmo, for çada ou não, vinda em defesa da fidelidade à tradição judaica, seja na Pales tina como na dispersão. Portanto, os autores que estão por trás da maioria dos livros bíblicos do período grego são grupos de judeus fiéis à lei, à tradi ção, à cultura da comunidade judaica. E o caso dos livros de Ester, Zacarias 12-14, Tobias, Eclesiástico, 2 Macabeus, Sabedoria e Baruc. Já os pobres da terra devem ter apoiado a luta pela independência frente à dominação dos gregos, comandada pelos piedosos macabeus. Círculos de levitas do interior ligados aos macabeus são autores de Za carias 9-11,1 Macabeus, Daniel, Judite e da versão grega de Ester. Suas preocupações principais são a defesa da lei de Moisés e da aliança, bem como a libertação da opressão econômica e política dos gregos. 17 O Livro do Eclesiastes se diferencia das duas tendências anteriores. Como a segunda tendência, é crítica à cultura e à opressão gregas. Por ou tro lado, questiona a tradição sapiencial conservadora do Judaísmo. Dominação dos Ptolomeus (301-198 a.C.) Depois das lutas entre os generais de Alexandre Magno, a domi nação dos gregos sobre a Palestina pode ser dividida em dois grandes períodos. Num primeiro momento, isto é, de 301 a 198 a.C., a Palestina ficou sob o domínio da dinastia do general Ptolomeu a partir de Alexan dria no Egito. Depois de 198 a.C., porém, os Selêucidas, como ficaram conhecidos os sucessores do general Seleuco, conquistaram a Palestina dos Ptolomeus e passaram a dominar Israel desde a Antioquia da Síria, a capital de seu império. Em torno de 350 a.C., edição hebraica do Livro de Ester. 301-198 a.C.: Durante um século, a Palestina ficou sob o domínio dos Ptolomeus. 301-282 a.C.: Ptolomeu I. 282-246 a.C.: Ptolomeu II. Durante seu reinado é feita a tradução da Bíblia hebraica para o grego, a Septuaginta. Por volta de 250 a.C., edição de Zc 9-14 e do Livro de Eclesiastes. 246-221 a.C.: Ptolomeu III. 221-204 a.C.: Ptolomeu IV. 204-180 a.C.: Ptolomeu V. Em torno de 200 a.C., Livro de Tobias. A dinastia dos Ptolomeus é assim chamada porque o nome do primeiro rei dessa dinastia foi Ptolomeu. Como seu pai se chamava La gos, também é conhecida como a dinastia dos lágidas. 18 O século de domínio por parte dos Ptolomeus foi um período em que houve várias tentativas dos Selêucidas se apoderar da Palestina, promovendo sucessivos ataques. Do ponto de vista econô mico, foi uma época de muita ex ploração. Os gregos estabelecidos no Egito organizaram um estado burocratizado e fortemente cen tralizado. Em todas as regiões onde dominavam, estabeleciam oficiais, tropas militares e encarre gados das finanças e do recolhi mento dos impostos. Estes eram permanentemente vigiados. Os Ptolomeus tinham medo de dar auto nomia às regiões que dominavam. E que temiam perder seu poder. Cerca de um terço da produção era arrecadado em forma de tri buto. Os Ptolomeus arrendavam a famílias ricas o direito de recolher os impostos, dando-lhes liberdade no processo de arrecadação. Com isso, conseguiam lucros financeiros e maior influência política. O auge do poder dos lágidas foi no reinado de Ptolomeu II (282-246 a.C.). "Deus concede a uma pessoa riquezas, fazendas e honras, sem lhe faltar nada de tudo que possa desejar. Deus, porém, não lhe concede desfrutá-los, mas um estrangeiro os desfruta. Isso é passageiro e cruel sofrimento." (Ecl 6,2) Os judeus da diáspora Os judeus dispersos pelas cidades helenizadas viviam mergulha dos na cultura grega. Embora inicialmente pudessem, tal como os judeus da Palestina, viver livremente sua fé em YHWH, aos poucos, foram sendo influenciados pela cultura helênica. No entanto, eles não opu nham tanta resistência contra o Helenismo. Especialmente em Alexan dria, iniciaram um processo de inculturação, conservando porém a observância da lei e o culto na sinagoga. Foi lá, durante o reinado de Ptolomeu II, que traduziram a Bíblia hebraica para o grego, conhecida por Septuaginta ou Setenta. E foi lá também que, mais tarde, escreve ram o Livro da Sabedoria. 19 Os judeus da Palestina Diante do Helenismo, os judeus da Palestina se dividiram. De um lado, a classe dirigente e, de outro, os setores mais pobres e fiéis à lei de Moisés. A classe dirigente, composta pelos chefes dos sacerdotes e por seto res da aristocracia, a fim de garantir seus interesses econômicos, apoiou a introdução do modo de vida dos gregos no Judaísmo. Esses grupos eram os liberais da cidade. O sumo sacerdote dos judeus continuava desfrutando de pleno poder. Assim também as famílias ricas, como a dos Tobíadas, residentes na Transjordânia. A respeito dessa família, nós já vimos na página 125 do volume 5. Confira! Em 2 Macabeus 3,11,temos uma nova referência a essa família. Dessa vez, fala-se de Hircano, filho de Tobias, que tinha muito dinheiro depositado no templo de Jerusalém, sinal de que o templo funcionava ao mesmo tempo como banco. Os Tobíadas eram, possivelmente, a família mais rica da província. O historiador Flávio Josefo nos informa que, na época dos Ptolomeus, os Tobíadas continuaram tendo muita influência na região e eram responsáveis pela coleta de impostos para os gregos. Isso nos revela que as principais famílias judaicas estavam plenamente in tegradas no mundo helênico. Mais tarde, quando os Selêucidas venceram os Ptolomeus, elas apoiaram o rei Antíoco III contra Ptolomeu V. O sumo sacerdote passa a ser também o governador A presença dos gregos trouxe outra mudança significativa. A par tir de agora não há mais um governador civil ao lado do sumo sacerdo te, como no período persá. O próprio sumo sacerdote passa a exercer também o poder civil. A administração não era mais feita por um gover nador, mas por um conselho de anciãos, composto de sacerdotes e leigos, presidido pelo sumo sacerdote (lM c 12,6; 2Mc 1,10; 11,27). Mais tarde, na época dos Macabeus, esse conselho seria chamado de Sinédrio. Com isso, aumentou ainda mais o poder do sumo sacerdote. Além de desempenhar as'funções no templo, passou a exercer tarefas 20 políticas, como representante político da comunidade judaica. No en tanto, embora tivesse poder para administrar as questões internas do Ju daísmo, ele tinha pouca autonomia administrativa. A resistência contra os gregos e os judeus helenistas Por outro lado, houve resistência do povo da terra contra a ex ploração econômica e política dos gregos. Para a comunidade judaica fiel à observância da lei e ao culto no templo de Jerusalém, o mais im portante de tudo era garantir a pureza de sua identidade, de sua tradição. Por isso, reagiu fortemente contra a helenização dos costumes judaicos. Quando mais tarde os Selêucidas impuseram na marra a cultura grega, o povo resistiu bravamente ao processo de desintegração de sua identidade. E o que veremos adiante quando estudarmos a vigorosa re sistência que deu origem à luta dos macabeus. E importante ainda lembrar que os lágidas não impuseram à for ça seu modo de vida, sua cultura. Porém, criaram as condições para que o Helenismo fosse mudando aos poucos a mentalidade e os costumes judaicos. Literatura de resistência na época dos Ptolomeus Agora, passemos ao estudo da literatura que surge durante a pas sagem do poder persa para o grego, bem como no decorrer do período dos Ptolomeus. Veremos os livros de Ester, do Eclesiastes, os capítulos 9-14 de Zacarias e o Livro de Tobias. 21 Ester: uma mulher exige que o poder cumpra a justiça concede-me a vida: eis o meu pedido! E a vida do meu povo: eis o meu desejo!” (Est 7,3) Data Há duas versões do Livro de Ester. Uma em hebraico e outra mais recente em grego. A versão hebraica foi editada em torno de 350 a.C., no final da época persa, poucos anos antes de os gregos destruírem a grande potên cia. As razões para essa datação do texto hebraico são fundamental mente duas: • Nele há referências detalhadas a respeito da estrutura do Império Persa; • E ainda não há menção ao domínio dos gregos e ao seu modo de vida. A versão grega, por sua vez, foi editada entre 114 e 112 a.C., du rante o governo de João Hircano sobre a Judeia, de acordo com as in formações de 10,3a ou F ,l l . Na Bíblia traduzida por Almeida, os acréscimos da versão grega estão ausentes. Nas traduções católicas da Bíblia, as citações dos acréscimos gregos têm a seguinte forma: Na “Bíblia dejerusalém ” da Paulus e em outras traduções, é ci tado o capítulo da tradução do original hebraico para o grego, no qual foi inserido o acréscimo, seguido das letras do alfabeto, que correspon dem aos versículos. Ex.: l , l a-li. Na “Bíblia Sagrada” da Vozes, a letra alfabética corresponde ao capítulo, e os números, aos versículos. A citação anterior fica da se guinte forma: A ,1-10. 22 Convém que se diga duas coisas da versão grega. Primeiro, ela não é somente uma tradução do texto hebraico para o grego. Os tradu tores fazem adaptações à nova realidade em que se encontram em torno de 113 a.C. Segundo, são feitos acréscimos significativos, como vere mos adiante. Nas traduções católicas, o texto grego está inserido na versão he braica e normalmente está em itálico. A Tradução Ecumênica da Bíblia traz cada versão separadamente. Primeiro, o texto traduzido do hebrai co. E, mais adiante, a tradução da versão grega, isto é, o texto hebraico traduzido para o grego mais os acréscimos. Ester, uma novela bíblica Embora o Livro de Ester revele que seu autor conhecia bem a geografia da cidade de Susa e do Império Persa, bem como tinha co nhecimento do funcionamento da máquina administrativa do palácio, o livro não é historiografia. Se fosse descrição dos fatos, Mardoqueu teria mais de 100 anos, por ocasião dos fatos relatados. Mesmo que tivesse sido deportado ain da recém-nascido em 597 a.C. (2Rs 25,8-21; Est 2,5-6), ele teria 111 anos no primeiro ano de reinado de Assuero (1,1). E Ester não ficaria muito atrás de seu primo. Com essa idade, como entender sua escolha para rainha e ainda com um “corpo bonito e de agradável aparência” (2,7)? Além do mais, não há nenhum registro histórico de que houvesse rainhas persas de nome Vasti ou Ester. De outro lado, também não é possível entender que os judeus te nham matado 75 mil homens (9,16), sem que isso esteja registrado em algum documento persa. Vimos no volume anterior que os persas sem pre tiveram uma política favorável aos judeus. Por isso, também é difícil entender que o rei persa tenha autorizado o extermínio do povo judeu. Por tudo isso, podemos perceber que a narrativa é muito mais uma novela do que uma história real. Embora seja uma novela, o texto se refere à vida concreta dos judeus e quer ser uma injeção de ânimo para as comunidades espalhadas em todo o império. Quer ajudá-las a 23 serem fiéis à história de seu povo, não se deixando iludir pelo modo de vida do império. Quer devolver-lhes a esperança para continuarem fiéis aos seus costumes, apesar das dificuldades em meio a povos que, muitas vezes, as humilhavam. Destinatários da versão hebraica No Livro de Ester, Mardoqueu é símbolo dos descendentes dos deportados, dos judeus da diáspora, isto é, da dispersão (2,5-6). Estes, e de modo especial os descendentes dos judeus deportados que não vol taram para a Palestina no final do exílio babilônico, são os primeiros destinatários do Livro de Ester. São pequenas comunidades sem maior significado político em meio a uma potência imperial. Esses grupos não têm nenhuma chance de mudar a situação de dominação. A melhor saí da parece ser o conselho de Jeremias: “Procurai ao bem-estar da cidade para onde eu vos deportei.” (Jr 29,7). Os judeus dispersos procuram se adaptar ao império e conviver com o sistema, tornando-se confiáveis e até colaboradores, porém, pro curando preservar sua identidade cultural, como grupos separados (3,8). Relacionam-se com todos. Porém, casam somente entre si. Vivem dispersos. Mas cultivam um nacionalismo muito forte. E interessante notar que chegaram a se conformar com sua con dição de escravos (7,4). Já não visam mais a transformação de uma socie dade injusta e opressora. Defendem o rei diante de um complô contra ele (2,22). Seu desejo parece chegar perto do poder (8,1-2; 10,1-3). Numa situação em que concretizar a justiça proposta pela profe cia em Israel era algo fora do alcance, há uma mudança significativa na vida de fé dos judeus dispersos. Mais que “fazer a justiça”, buscam “ser justos”. E como se é justo? Observando a Lei de Deus expressa na Torá, especialmente a prática do sábado, da circuncisão, das obras de piedade, como o jejum, a oração e a esmola. Enquanto isso, o justo ju deu preserva sua identidade sem questionar as estruturas de opressão e esperapelo dia em que Deus viria libertá-lo. 24 Ester, a mulher que enfrentou o palácio E importante destacar aqui que, assim como nos livros de Rute e Cantares, que já vimos, mais uma vez uma mulher é a protagonista na li bertação de seu povo. Assim também será no Livro de Judite e na histó ria de Susana em Dn 13. Como veremos, é preciso também juntar o Livro de Eclesiastes ao esforço de questionar a cultura patriarcal que ainda está presente com força no Livro do Eclesiástico. Isso significa que as mulheres continuavam tendo um papel sig nificativo no resgate de sua dignidade e de sua participação nas lutas li bertárias de seu povo, em meio a um contexto fortemente patriarcal, como já vimos no volume anterior. Conspiram contra a ideologia ma chista do templo de Jerusalém. Ester salva seu povo do extermínio. Judite o liberta dos opresso res e Susana resiste contra o legalismo do Judaísmo, desmascarando os juizes que a condenavam injustamente. Além disso, são fiéis ao Deus do Exodo, a YHWH libertador dos pobres, a quem defendem. Lutam pela liberdade, por terra, pela vida, dispostas a morrer pela causa da justiça. A festa dos Purim, das Sortes Leia Ester 9,20-32! Um dos principais objetivos do Livro de Ester é servir como fun damentação teológica para a festa judaica das Sortes. Quer explicar a origem da festa das Sortes. Nesse sentido, o conto sapiencial é uma etio- logia, isto é, busca a causa primeira que deu origem à festa. A festa dos Purim, também chamada de “dia de Mardoqueu” (2Mc 15,36), era uma festa bem popular, com banquetes, bebidas, música e uso de máscaras. Era um tipo de carnaval. E provável que essa festa tenha origem entre os judeus da diáspo- ra na época dos persas ou até antes, na época dos babilônios. E que várias de suas características vêm das festas populares babilônias e persas, das quais certamente os judeus participavam. Porém, sem se deixar conta minar com a ideologia de opressão que era passada nessas festas, muito ligadas ao naturalismo e a magias. Ao mesmo tempo em que participa 25 vam dessas festas, os judeus permaneciam fiéis ao conteúdo da Páscoa, sua festa que celebrava o Deus que liberta. Substituíam, portanto, o cul to a divindades manipuladas em favor de sistemas de opressão pela fé em YHWH. Na verdade, a história de Ester e de Mardoqueu é uma reedição da experiência libertadora do Êxodo dirigida às comunidades judaicas da dispersão. Nesse sentido, os judeus da diáspora já faziam o que fariam mais tarde as nações africanas para preservar sua fé diante da imposição do catolicismo europeu. Negros e negras escravizados foram, por exem plo, obrigados a cultuar os santos católicos. Na verdade, porém, para os fiéis dos cultos africanos, as imagens representavam seus orixás. É o caso de Maria que simbolizava Iemanjá, orixá feminino, a mãe das águas, a rainha do mar. Vejamos alguns elementos babilônios e persas que certamente influíram na festa judaica dos Purim e no Livro de Ester, fundamento teológico dessa festa. • Os nomes dos atores centrais têm sua origem nas divindades Marduc, Deus solar, e Ishtar, Deusa astral. Mardoqueu e Ester derivam dos nomes dessas divindades babilônias. • A prática de lançar as sortes através de seus sacerdotes era uma das ações de Marduc, na festa do ano novo. • A data da festa dos Purim coincide com a festa persa para os mortos. • A festa persa que celebrava as vitórias do rei Dario I (521-486 a.C.) era o carnaval dos persas. Há semelhanças entre essa festa e a dos Purim. E significativo perceber que festas de um povo estrangeiro sejam assumidas pelo Judaísmo, porém, despidas de seu conteúdo mítico e mágico e adaptadas à fé de Israel, à memória do Deus que liberta. É o mesmo processo feito com o mito do dilúvio. Propomos que você leia agora a novela de Ester seguindo a pro posta de divisão da versão hebraica, como segue, incluindo os acrésci mos da versão grega. 26 Versão hebraica A versão hebraica de Ester pode ser assim dividida: • 1,1-2,18: A dominação de Assuero. Segundo o texto hebrai co, a história de Ester se passa na cidade de Susa, uma das capitais dos persas, durante o reinado de Assuero, isto é, do rei Xerxes I (486-464 a.C.). A rainha Vasti é destituída de seu cargo porque ousou desobede cer à ordem de seu marido (1,1-22). E importante ver neste seu gesto também uma forma de resistência à estrutura patriarcal. Mas dessa for ma, estava aberto o caminho para que Ester, uma órfa judia, pudesse tornar-se rainha em seu lugar (2,1-18). Essa primeira parte começa com três banquetes (1,3.5.9) e, no final, acontece mais um (2,18). São os ban quetes do sistema de opressão do império. • 2,19-4,17: O conflito entre Amã e Mardoqueu. Depois de uma conspiração de dois eunucos contra o rei (2,19-23), surge um con flito entre o primeiro ministro Amã e Mardoqueu, primo e tutor de Ester (3,1-6). Amã consegue que o rei decrete perseguição não só a Mardoqueu, mas também a todo o povo judeu disperso pelo império (3,7-13). Mardoqueu e Ester se articulam para impedir o massacre de seu povo (4,1-17). • 5,1-7,6: Os banquetes de Ester. Ester intervém corajosa mente junto ao rei em favor dos judeus, desmascarando o plano de Amã (5,1-7,6). Essa parte, que é o centro do livro, inicia com um banquete (5,1-5) e termina com outro (7,1-6). São os banquetes de Ester. • 7,7-8,14: O destino de Amã e de Mardoqueu. O rei muda de posição e decreta a morte de Amã (7,7-10), bem como a liberdade do povo judeu em todas as cidades do império. Mardoqueu passa a ocupar o lugar de Amã e recebe autorização para aniquilar quem viesse a perse guir os judeus (8,1-14). • 8,15-9,19: A festa da libertação. O povo judeu se alegra (8,15-17). Mardoqueu coloca seu poder de primeiro ministro a serviço da vida de seu povo, arrasando quem planejava destruir os judeus (9,1-19). Se a primeira parte do Livro de Ester (1,1-2,18) apresenta os banquetes dos poderosos e a terceira (5,1-7,6), os banquetes de Ester, esta parte apresenta os banquetes do povo que celebra a libertação (8,15-17; 9,17-19). 27 • 9,20-10,3: Apêndices. Por último, a versão hebraica do Livro de Ester apresenta, de um lado, a instituição da festa dos Purim, isto é, das “Sortes”, celebrada ainda hoje pelas comunidades judaicas (9,20-32). De outro lado, há elogios a Mardoqueu que governa a serviço da felicidade de seu povo (10,1-3). Na tradição judaica, o Livro de Ester é lido por ocasião da festa dos Purim. Nas nossas traduções da Bíblia, a parte que corresponde à versão hebraica de Ester é feita diretamente do texto em hebraico. Nos dias de hoje, como se manifesta em nossa realidade o poder dos donos do mundo, das suas estruturas de morte? E possí vel enfrentá-las? Através de que meios? Por que são acusados de terroristas ou inimigos da liberdade aqueles que não dobram o joe lho diante do império? Que tipo de ameaça representam? Por que existem atos terroristas? Será que não é resposta desesperada à opressão? Que tipos de banquetes existem hoje? Todos têm acesso a eles? Quem fica excluído? Qual seu significado? Como preservar os valores e a diversidade da cultura popu lar, diante da imposição de um pensamento único que favorece a poucos? Como manter as raízes culturais em meio a tantas migra ções a que o povo se vê obrigado? De que modo Deus continua agindo na nossa história, pro movendo a vida e a libertação? Como transformar as estruturas de poder em serviço ao povo? Ainda há quem governa para os amigos em primeiro lugar? Qual o papel da mulher na transformação do poder a serviço da justiça e da vida do povo? 28 Eclesiastes: felicidade é usufruir do próprio trabalho ‘E is que a felicidade da pessoa é comer e beber, desfrutando do fru to do seu trabalho. ” (Ecl 2,24) Data e autoria O Livro do Eclesiastes foi escrito em torno de 250 a.C., sob o auge da dominação dos Ptolomeus. Ele também é conhecido como o Livro de Coélet, uma palavra que está na forma feminina. Em hebraico,isso significa “a pessoa que reúne, fala ou lê na assembleia”. Coélet representa os sábios que questionam, que fazem refletir. Sua filosofia, porém, é diferente da sabedoria dos filósofos gre gos. São, como dizemos hoje, intelectuais orgânicos que colocam seu saber a serviço do povo. Leia a conclusão do livro em 12,8-14 e repare especialmente os w . 9-10! Coélet e a cultura helênica Por um lado, Coélet questiona a sabedoria tradicional judaica e, por outro, critica o modo de vida dos gregos. O Helenismo valorizava o corpo, o prazer, o individualismo, o acúmulo de riquezas, o poder e o conhecimento. Coélet avalia que em tudo isso não está o verdadeiro sentido da vida, a felicidade. Somente é possível usufruir desse modo de vida proposto pelas elites gregas, vivendo às custas da exploração do trabalho alheio. Por isso, afirma ca tegoricamente que tudo isso é fugaz, passageiro, transitório. Repete a palavra “fuga cidade/transitoriedade/relatividade/ilusão/vaidade” nada menos que 38 vezes. Somente em 1,2 ela aparece 5 vezes. Ecl 1,2 e 12,8 formam a moldura do livro. Confira! Veja, agora, como Coélet analisa os valores do modo de vida dos gregos e compare com os valores neoliberais de hoje: 29 • Poder do conhecimento, da sabedoria que tem resposta para tudo (1,12-18; 2,12-17). • Prazer (2,1-3). Havia uma corrente filosófica na Grécia chama da epicurismo, que colocava o prazer como bem supremo. • Poder econômico e político (2,4-11; 4,13-16; 5,9-15; 6,1-2). • Trabalho competitivo e ganância de lucro para enriquecer (2,18-23; 4,4). • Individualismo (4,7-12). Eclesiastes é um livro da Bíblia que resiste contra a política de he- lenização. É uma voz contrária à opressão dos gregos. Para que traba lhar tanto, para que plantar e colher se é outro quem vai comer? Leia Ecl 1,3; 3,9; 6,2! É importante lembrar que Eclesiastes é o primeiro livro bíblico a criticar o feitiço do dinheiro, sua artificialidade e, ao mesmo tempo, sua falsidade. Ele não tem poder sobrenatural. Por isso, prestar-lhe culto é pura idolatria e não traz felicidade para quem faz dele seu ídolo. Leia ainda 3,16; 4,1; 5,7-8; 8,4; 9,14-16; 10,16-20 e perceba a si tuação dos pobres diante do poder do rei e da estrutura estatal para con trolar o povo! Coélet e a cultura tradicional judaica Coélet questiona também a cultura tradicional judaica. Um dos questionamentos se dirige àqueles que orientam sua vida pelo dogma da retribuição. Leia 2,26 e perceba como Coélet considera a doutrina da retribuição uma ilusão e frustração. Há um longo texto em que continua questionando a sabedoria tradicional do Judaísmo, voltando mais vezes à doutrina da retribuição. Esse texto corresponde a 6,11-9,6. Confira! Em vários casos, Coélet cita primeiro a posição tradicional para depois rebatê-la, dando sua opinião. Propomos que você leia alguns versículos que representam a visão tradicional, acompanhando, em se guida, os questionamentos levantados por Coélet, conforme segue: 30 Sabedoria tradicional Posição de Coélet 7,26: cultura patriarcal. 7,27-29: o machismo é constru ção cultural da humanidade. Não foi assim desde as origens (Gn 1,26-27; 2,21-24). 8,1: parece ser uma referência ao funcionário do rei que, com sua sabedoria, poderia influir nas de cisões do seu soberano. 8,2-4: o conselheiro que assesso ra o rei, a quem jurou fidelidade, deve se submeter a seu soberano, que faz como bem lhe aprouver. 8,5: a obediência à lei sempre é premiada a seu tempo. 8,6-12a: Coélet não concorda com essa doutrina da retribuição. 8,12b-13: o temor de Deus tem como recompensa a felicidade. 8,14-9,6: mais uma vez, Coélet dis corda, uma vez que a realidade des mente o dogma da retribuição. Coélet ainda questiona a prática tradicional da religião, centrada no oferecimento de sacrifícios no altar do templo e em observâncias le gais. Coélet insiste na escuta de Deus no silêncio em lugar de muitas pa lavras vãs. Insiste na coerência, pois isso é temer a Deus. Confira 4,17-5,6! O valor que gera felicidade Se a felicidade não está na sabedoria, no prazer, na riqueza, no in dividualismo e no poder político, onde, então, podemos encontrá-la? A resposta de Coélet está presente ao longo de todo o texto. Ao contrário da vida luxuosa, conseguida através do trabalho escravo ou da ex ploração de outros, Coélet defende um projeto diferente de relações na produção. A felicidade consiste em viver com simplicidade do fruto do seu próprio trabalho. Aí está a chave da felicidade. Sua proposta é para quem trabalha e não para quem vive do trabalho alheio. Trabalhar para que ou tros aproveitem o fruto do trabalho não gera felicidade (1,3; 2,18; 3,9). 31 Ao ler o Livro de Eclesiastes, convém que você preste atenção à quantidade de vezes em que aparecem as palavras “trabalho” (25x) e “trabalhador” (2x). Não deixe de ler as citações que seguem e que são como que um refrão que perpassa todo o livro: 2,10.24; 3,13.22; 5,17-19; 8,15; 9,7-9! Compare agora a proposta de Coélet com a do 3o Isaías em Is 65,17-25! O caminho para alcançar a felicidade Vejamos agora alguns caminhos propostos por Coélet para se chegar à verdadeira felicidade, em que se possa trabalhar tranquilamen te e usufruir do próprio trabalho. 1. Coélet propõe relativizar tudo aquilo que não dignifica a vida. Os valores que questiona, você já leu nos itens acima sobre “Coélet e a cultura helênica” bem como “Coélet e a cultura tradicional judaica”. Coélet relativiza tudo. Tudo é efêmero, passageiro. Somente Deus não passa. Só Ele explica o mistério da vida e é o único Senhor ab soluto da história (8,17). A vida é um dom que dele recebemos (2,24; 3,13; 5,17-19; 7,29; 8,15; 9,7-9). 2. Outro caminho é o do temor de Deus. Veja como Coélet insis te no “temor”: 3,14; 5,6; 7,18; 8,12-13; 12,13! Temer a Deus é reconhecer que só Ele é soberano. Se é assim, então todos somos criaturas suas. Portanto, não é a nenhuma pessoa que devemos temor, como exigiam os reis, mas somente a Deus. O te mor de Deus liberta da absolutização dos reis como representantes das divindades na terra. Cria uma nova consciência que resgata a dignidade, o direito à plena realização de todas as pessoas. Por outro lado, temer a Deus quer dizer devotar-lhe respeito, fidelidade. E seguir seu ca minho de amor e de justiça. O temor a Deus é o critério fundamental da verdadeira religião. 3. Um terceiro caminho é o da solidarie dade para resistir (4,7-12) e para promover a partilha (11,1-2). Não dei xe de conferir as citações! "A corda tripla não se arrebenta facilmente." (Ecl 4,12b) 32 4. Por fim, não podemos deixar de citar a sabedoria dos pobres como mais um caminho para se chegar à felicidade. Vimos que Coélet é crítico à sabedoria tradicional (1,16-18; 6,11-9,6; 12,12). Contudo, nos apresenta uma outra sabedoria, a sabedoria dos pobres (4,13; 9,15-16), a sabedoria que gera vida e que vale mais que o dinheiro (7,12), a sabedo ria com humildade (7,16-18), a sabedoria sem o poder das autoridades e das armas (7,19; 9,13-18). O livro Propomos a seguinte divisão para o Livro de Eclesiastes: • 1,1: Título • 1,2-11: Introdução • 1,12-6,10: Fugacidade da vida • 6,11-9,6: Revisão da sabedoria tradicional • 9,7-12,8: Conselhos e sentenças diversos • 12,9-14: Conclusão do redator. Em nossos dias, em que valores as pessoas procuram sua fe licidade? O que a propaganda oferece como sentido da vida para a humanidade? Quais são as necessidades mínimas, contudo, sufi cientes para uma vida digna? Quais são as necessidades artificiais criadas pela mídia, mas que não geram felicidade? Como não dei xar se enganar por esse bombardeio da propaganda? O que Coélet tem a dizer para o mundo neoliberal globalizado? Para as minorias que vivem da exploração dos pobres? Quem são os que vivem do trabalho de outros? Como fica quem está sem emprego, porém, gostaria de trabalhar? Quando um trabalho se transforma em uma fadiga inútil e quando ele é um dom de Deus? Oque vale mais: o conhecimento de alguém a serviço do projeto dos donos do mundo ou a sabedoria de um pobre a serviço da coletividade, da solidariedade? Que projeto nós apoiamos? Como a religião pode ser um instrumento de estabilidade ou de transformação do sistema vigente? O que significa temer a Deus em nosso cotidiano? 33 Zacarias 9-14: esperança num rei justo e pobre “Eis que o teu rei vem a ti. Ele é justo, vitorioso e pobre, montado sobre um jumento, sobre umjumentinho,filho da jumenta. ” (Zc 9,9) Data Já vimos, nas páginas 92 a 95 do volume 5, que Zacarias 1-8 é profecia que corresponde à atuação histórica do profeta Zacarias entre os anos 520 e 515 a.C., durante a construção do 2o templo. Já Zacarias 9-14 são escritos de profetas anônimos que acrescen taram seus textos ao Livro do profeta Zacarias e que já existia. Os capítulos 9-14 de Zacarias correspondem à época dos gregos. Confira como 9,1-8 se refere às campanhas militares de Alexandre Magno. Portanto, as profecias do 2o Zacarias se encontram sob o impac to das conquistas de Alexandre e devem ser datadas entre 300 e 250 a.C. Zc 9-14: duas partes bem distintas A partir do gênero literário, podemos dividir Zc 9-14 em duas partes bem distintas. A primeira é Zc 9-11. E um texto quase todo escrito em poesia. Os autores devem ser levitas defensores dos pobres. São críticos ao imperialismo dos Ptolomeus. Sua mensagem central é a libertação do povo (9,1-11,3) e o julgamento dos maus pastores (11,4-17). A segunda parte é Zc 12-14. E um texto quase todo escrito em prosa. A origem dessas profecias está ligada a Jerusalém. Há uma preo cupação com a restauração do culto no templo e das festas (14,16.20). Seus autores estão ligados ao ritual do templo e aos sacerdotes. Retomam a teologia cronista no sentido de que Israel é a união de todas as tribos ao redor de Davi, do culto no templo de Jerusalém. Seus destinatários são os moradores da Judeia, de Jerusalém da descendência de Davi. A eles é anunciado um novo futuro, enquanto se espera a ma nifestação da realeza de Deus. 34 Na visão dos autores de Zc 12-14, a libertação vem da Judeia (13), através da vinda do Dia de YHWH (14). Será o julgamento de sal vação no qual Deus vem para renovar a aliança, manifestando-se como o único rei universal (12,7; 14,9). No entanto, seus autores parecem ser críticos aos sacerdotes do templo que se diziam os verdadeiros representantes da profecia. Nesse sentido, Zc 13,2-6 registra a crítica aos que haviam roubado a memória de resistência dos pobres, a memória de luta dos verdadeiros profetas. Você já leu, mas vale a pena conferir de novo! São favoráveis também às comunidades do interior da Judeia, às aldeias do campo, em detrimento dejerusalém. Seus autores, portanto, embora in cluam os moradores de Sião no plano de salvação centrado em Jerusalém, colocam na frente deles aqueles que os piedosos cumpridores da lei tanto desprezavam como ignorantes e impuros. Não deixe de ler 12,7! A esperança na vinda de um Messias Um tema comum às duas partes é a esperança na vinda de um Messias. E que o povo vivia numa realidade de dura opressão sob os Ptolomeus, sem perspectivas, a curto prazo, de alcançar a libertação. Por isso, olha para o futuro e espera por um Messias pobre, bom pastor c da linhagem de Davi. Na primeira parte (9-11), merece destaque a referência à vinda de um rei messiânico pobre, montando um jumentinho. Seu projeto é acabar com a força das armas e estabelecer uma era de paz em todo o planeta (9,9-10). E o messianismo que vai na linha dos antigos profetas. Leia também Mt 21,4-9 e perceba como a comunidade cristã viu a reali zação dessa profecia em Jesus de Nazaré! Outra característica do Messias é que ele é apresentado como o bom pastor em oposição aos maus pastores. Leia 11,4-17! Compare esse texto com Ez 37,15-28! Na segunda parte (12-14), a figura do Messias volta a ser ligada com a descendência de Davi (12,8). E o messianismo centrado em Jeru salém, onde o culto e o templo, vinculados à lei, são as mediações privi legiadas entre Deus e o povo. 35 Nessa segunda parte, a esperança na libertação está organizada em torno de três figuras-chave da história passada de Israel. São elas: Davi, Elias e Josias. E um texto de esperança dirigido parajerusa lém, para a Judeia e para os descendentes de Davi (12,8). Em Zc 12, a referência ao “traspassado” (12,10) é uma provável lembrança do assassinato do rei Josias da dinastia de Davi, em 609 a.C., para compreender o sentido do sofrimento pelo qual o povo estava agora passando sob o peso da opressão dos Ptolomeus. O sofrimento tinha um sentido purificador e transformador na vida do povo. Os pri meiros cristãos aplicaram essa passagem a Jesus ao 19,37; Ap 1,7). Em Zc 13, o acento principal é a luta contra a idolatria. E o per sonagem principal da história de Israel que serviu de modelo na luta pela libertação dos ídolos é o profeta Elias (lR s 18-19). A libertação ple na para o povo somente será possível no momento em que forem ven cidos os falsos profetas junto com os ídolos que legitimam sistemas de opressão. Somente então o Deus libertador terá seu nome santificado. Zc 14 celebra a manifestação da realeza de YHWH, que será o úni co rei do mundo (14,9). Serão vencidos todos que se opuserem a Jerusa lém, que habitará em segurança. Então todos os povos virão a Jerusalém para celebrar, no templo de YHWH, a festa das Tendas (14,16-21). Tobias: Deus é fiel à fidelidade do justo “Se você vê um pobre, não desvie o rosto, e Deus não afastará seu rosto de você. ” (Tb 4,7) Data, destinatários e gênero literário O Livro de Tobias foi redigido em grego e é um dos sete livros que não estão na Bíblia hebraica. Consequentemente, também não se encontra na Bíblia usada pelas igrejas protestantes. Foi escrito em tomo de 200 a.C. Embora situe os acontecimen tos no século 8 a.C., de fato, o Livro de Tobias se refere aos judeus da 36 diáspora durante o período dos gregos. O modo de vida da grande po tência era uma tentação para os judeus. Em vez de resistir, muitos prefe riram o caminho mais fácil, aderindo à cultura helênica, que sustentava ideologicamente o sistema de opressão do império. Tal como o Livro de Ester, também seus destinatários são as co munidades judaicas dispersas pelas cidades do império. Os acontecimen tos narrados em Tobias igualmente são localizados fora da Palestina. Tobit, o pai de Tobias, é do Reino do Norte, da tribo de Neftali (1,1). E um sinal de que o livro se dirige para qualquer israelita na dispersão. O Livro de Tobias não faz parte do gênero literário histórico, mas sapiencial. E uma espécie de novela, como o Livro de Ester. Tema e objetivo do livro Diante da perda da identidade cultural judaica em meio a um am biente hostil, o Livro de Tobias quer incentivar os judeus dispersos a manterem sua identidade original, seus costumes, sua cultura, suas leis, sua religião. Tobias quer estimular os judeus da diáspora a permanece rem fiéis à fé de Israel, mesmo que tivessem que falar o grego e viver a partir das categorias do modo de vida dos gregos, de sua visão do mun do. O Livro de Tobias nos apresenta uma família judaica como modelo de fidelidade na dispersão. A novela de Tobias propõe uma vida totalmente de acordo com a vontade de Deus. Para o judeu, isso quer dizer uma vida conforme a lei, que expressa a vontade de Deus. Viver a lei, ser fiel a Deus é “ser justo”. A fidelidade a Deus traz a plena realização aos fiéis. Deus mesmo provi dencia tudo o que é preciso para alcançar o sentido da vida. Deus oferece gratuitamente seus dons. Da mesma forma, Ele quer que as pessoas também ajam com gratuidade e não de forma inte- resseira. O nome de Tobias quer dizer “YHWH é bom”. Com isso, o autor da novela quer mostrar que Deus é fiel ao justo, àquele que cum pre sua vontade, sua lei. Nesse sentido, podemos perceber a presença do dogma da retribuição. Apesar de todas as provaçõespor que passa Tobit, pai de Tobias, ele é fiel a Deus que, por sua vez, o abençoa com 37 uma idade avançada, com a honra, com descendência e com prosperi dade (14,2-3). Os autores do Livro de Tobias representam a visão nacionalista da comunidade judaica pós-exílica. São fiéis à rigorosa observância da lei (1,8). Representam, portanto, a tradição ortodoxa do Judaísmo pós-exílico na diáspora. O livro O Livro de Tobias tem quatro partes bem delimitadas. 1,3-3,17: Prólogo: são vários acontecimentos a respeito da vida de Tobit, pai de Tobias, e de sua família. Apesar de se encontrar no exílio em meio a um contexto multicultural, Tobit se manteve fiel à lei e às tradições dos judeus. Exalta as virtudes de Tobit (1,3-22), descreve sua cegueira e sua oração (2,1-3,6) e se refere às provações e à oração de Sara, futura esposa de Tobias (3,7-15). • 4-9: Viagem de Tobias a Ecbátana para resgatar um di nheiro. Depois das orientações de Tobit a seu filho (4,lss), Tobias arru ma um acompanhante (5,lss) e captura um peixe durante a viagem (6,1-9). Já próximo a Ecbátana, o acompanhante Rafael ou Azarias propõe a To bias que se case com Sara (6,10-19). De fato, Tobias se apaixona por ela (7,lss), expulsa dela o demônio Asmodeu ao incinerar as vísceras do peixe (8,lss), resgata o dinheiro de seu pai e se casa com ela (9,lss). • 10-13: A volta para casa. Tobias volta com Sara e Rafael para Nínive (10,lss) e se reencontra com o pai, curando sua cegueira com o óleo do peixe (ll,lss). Rafael, que protegera Tobias do peixe, curara Sara e Tobit, revela sua identidade de anjo e segue para junto de Deus (12,lss). Diante disso, Tobit entoa um hino de louvor (13,lss). • 14: Epílogo: Por sua fidelidade a Deus, de acordo com a doutrina da retribuição, também Deus foi fiel a Tobit, permitindo que morresse com idade avançada, com honra, com descendência e com prosperidade. Antes de morrer, Tobit recomenda a seu filho que viva de acordo com a justiça, isto é, de acordo com a lei. Depois da morte dos pais, Tobias vai morar junto com seu sogro Ragüel em Ecbátana, onde morre. 38 O Helenismo e a crença em demônios Sobre a influência da demonologia persa na crença israelita em demônios, você já leu no quadro sobre Satanás nas páginas 171a 174 do volume 5. Porém, como Asmodeu, o demônio persa, da ira e da violência, exerce um papel importante no Livro de Tobias (3,7-8; 6,8-19; 8,1-3), e como a expulsão de demônios terá um importante significado na práti ca libertadora dejesus, convém que voltemos a esse assunto. A ideia de Platão (429-347 a.C.) a respeito dos demônios é a base da crença dos gregos nessas entidades. Entre os principais as pectos da crença em demônios no mundo grego, destacamos os seguintes: • Tinham a ideia de que, entre o mundo das pessoas e o Olimpo, o monte das divindades, havia uma série de demônios, exercendo a função de guardiães dos templos. • Acreditavam que o mundo estava também cheio de demônios. • Achavam que os demônios eram o elemento unificador do universo. • Imaginavam os demônios como seres intermediários entre as divindades e as pessoas. • Tanto podiam ser bons como maus. Enquanto os bons serviam como guardas das pessoas, os malignos causavam pestes, guerras, desordens, etc. • Pensavam que eram imortais como as divindades, de um lado, e, de outro, sujeitos a paixões como a humanidade. • Sua habitação natural seria o ar. • Julgavam que os demônios tinham influência sobre as pes soas, por isso elas precisavam recorrer à magia e à bruxaria para agradá-los ou neutralizar seus ataques. • Por fim, criam que a alma de quem morria podia vir a ser um demônio. Essas crenças dos gregos influenciaram também a concepção judaica a respeito dos demônios nos dois séculos que antecederam o movimento dejesus de Nazaré. 39 Especialmente a partir da época altamente conflitiva dos Selêu cidas, que veremos logo adiante, os judeus piedosos passaram a inter pretar, cada vez mais, a realidade como uma grande batalha cósmica. De um lado, estava guerreando Deus com seus anjos, isto é, os judeus que lhe haviam ficado fiéis. De outro, guerreava Satanás com seus anjos, isto é, os exércitos dos Selêucidas e os judeus que aderiram ao Helenismo. E importante destacar que, para os judeus piedosos, a figura de Satanás foi cada vez sendo mais personificada. Sua ação acontece nas pessoas inimigas dos fiéis judeus. Ainda mais que os governan tes gregos diziam que eram descendentes das divindades, da sua união com mulheres humanas. Não é difícil entender que os judeus fiéis também demonizassem as classes altas dos judeus, bem como os sumos sacerdotes, responsáveis pela intermediação entre Deus e o povo, quando estes promoveram a helenização do Judaísmo. Não será por acaso que Jesus verá nos escribas, representantes da ideologia da sinagoga e do templo (cf. Mc 3,22-30), a ação dos de mônios que precisam ser “amarrados”, tal como o fez o anjo Rafael com Asmodeu no Livro de Tobias. Compare Tb 8,3 com Mc 3,27! Leia agora Mc 5,1-20 e perceba que também não será por aca so que Jesus verá na dominação romana a ação demoníaca que pre cisa ser afogada no mar, tal como já acontecera com faraó e seus exércitos junto ao Mar dos Juncos (Ex 14,15-31). E provável que na adesão de judeus ao modo de vida dos gre gos, esteja a origem do mito dos anjos decaídos como se pode ler no primeiro livro apócrifo de Enoque. Para atualizar o Livro de Tobias para nossa realidade, pode ríamos fazer as mesmas perguntas que fizemos acima para o Livro de Ester. Poderíamos ainda perguntar: que ensinamentos as orienta ções de Tobit para Tobias têm a nos dizer para a educação dos fi lhos, para a relação entre pais e filhos? Qual o papel da família na vida das pessoas? Como a família pode educar no sentido de trans mitir os valores da vida de geração em geração? 40 Dominação dos Selêucidas (198-142 a.C.) “Destes reis brotou uma rai\ iníqua, Antíoco Epífanes, filho do rei Antíoco. ” (IMc 1,10) 223-187 a.C.: Antíoco III. Depois de muitas batalhas contra os Pto lomeus, o rei selêucida Antíoco III conquista a Pales tina em 198 a.C. 198-142 a.C.: A Palestina sob o domínio dos Selêucidas. Em torno de 180 a.C., edição do Livro do Eclesiástico. 196-175 a.C.: Sumo sacerdote Onias III, filho do sumo sacerdote Si mão II, que é elogiado em Eclo 50,1-21 por sua fideli dade à lei. Onias foi o último sumo sacerdote da linhagem de Sadoc que exerceu seu sacerdócio por su cessão hereditária. 188 a.C.: Paz de Apameia. Roma se impõe como a maior potência no Oriente Médio. 187-175 a.C.: Seleuco IV, filho de Antíoco III. 175-163 a.C.: Antíoco IV Epífanes, outro filho de Antíoco III. 174-172 a.C.: Sumo sacerdote Jasão, irmão de Onias III, corrompeu Antíoco IV para conseguir o cargo, prometendo au mentar a oferta de impostos e a helenização da comu nidade cultuai dejerusalém (2Mc 4,7-9). 172-163 a.C.: O sumo sacerdote Menelau também é favorável à he lenização do Judaísmo. Disputando o cargo de sumo sacerdote com Jasão, também comprou o cargo, cor rompendo os Selêucidas com uma soma ainda maior de dinheiro (2Mc 4,23-26). Mandou assassinar Onias III em 170 a.C. (Dn 9,25-26; 11,22; 2Mc 4,30-31). 169 a.C.: Antíoco IV Epífanes, ao voltar de uma campanha militar contra os Ptolomeus no Egito, saqueou o templo de Jerusalém com a cumplicidade do sumo sacerdote Menelau (IMc 1,16-28). Em 167 a.C., impõe a ferro e 41 fogo a cultura grega aos judeus. Transformajerusalém em pólis grega (lMc 1,29-35) e exige o oferecimento de sacrifícios a Zeus, divindade suprema do panteão grego, no templo de Jerusalém (lM c 1,54-59; 2Mc 6.1-2; Dn 11,31). É provável que tenha colocado no templo de YHWH a estátua de Zeus, a pedido dos sa cerdotes helenizantes (2Mc 6,2). Ordenou que fossem erigidos altares em todas as partes, exigindo dos judeus o culto a Zeus. Proíbe os costumes judaicos e a obser vância da lei. 167-142 a.C.: Revolta dos macabeus, iniciada pelo levita Matatias,contra a política de Antíoco IV; bem como contra a corrupção que havia em Jerusalém. Livros de Daniel, Judite e 2 Macabeus. 166-160 a.C.: Judas Macabeu, filho de Matatias, chefe dos judeus (lM c 3.1-9,22). 164 a.C.: Purificação do templo e restauração do culto. 163-162 a.C.: Antíoco V é rei. No entanto, Lísias exerce o poder. 163-160 a.C.: O levita Alcimo é sumo sacerdote no lugar de Menelau (lM c 7,5-25). Aliado dos gregos, era inimigo dos macabeus. 161-150 a.C.: Demétrio I, filho de Seleuco IV, assume como rei, de pois de mandar matar Antíoco V e Lísias. 160-143 a.C.: Jônatas, filho mais novo de Matatias, chefe dos judeus (lM c 9,23-12,53). 152 a.C.: Jônatas é nomeado sumo sacerdote (lM c 10,20s). 143-134 a.C.: Simão, outro filho de Matatias, sumo sacerdote e go vernador dos judeus (lM c 13-16). 142 a.C.: Fim da ocupação selêucida na Palestina. O reinado do Selêucida Antíoco III (223-187 a.C.) foi o período em que os gregos chegaram ao auge de seu poder no Oriente Médio. Foi também o início de sua decadência. Antíoco III tentou avançar sobre a Europa. Porém, foi rechaçado pelos romanos. Estes impuseram-lhe uma paz humilhante e exigiram que entregasse parte de seu império. 42 Além de cobrar pesadas indenizações, os romanos tomaram seu filho como refém (IMc 8,6-7). Foi nessa época que Roma começou a se des tacar como uma nova potência que estava surgindo no horizonte. Dn 11,18 refere-se à derrota de Antíoco III para Roma. Em 198 a.C., Antíoco III, depois de muitas batalhas com os Pto lomeus do Egito, foi vitorioso, tomando posse da Síria, da Fenícia e da Palestina. Eclo 10,8 faz referência a essas batalhas. Antíoco III conce deu regalias ao sumo sacerdote, bem como ao pessoal do templo. Logo passou a receber o apoio das famílias ricas, como a dos Tobíadas. Antíoco III seguiu a mesma política dos Ptolomeus, não impon do à força o Helenismo. Permitiu que os judeus continuassem a seguir a sua própria lei. Mesmo assim, a cultura grega cada vez mais se fazia sen tir na Palestina. E nessa época, pelo ano 180 a.C., que foi escrito o Livro do Eclesiástico. Seu objetivo principal foi reavivar o modo de vida dos judeus diante da influência da cultura grega, como veremos adiante. Quando Antíoco III foi morto, seu filho S eleu co lV (187-175 a.C.) o sucedeu. Para poder pagar as dívidas a Roma, tentou saquear o templo dejerusalém . 2Mc 3 e Dn 11,20 referem-se a esse episódio. Quando foi morto por seu ministro, seu irmão assumiu o trono. A situação dos pobres se agravava por causa da ganância dos ri cos e do seu amor ao lucro. Confira a situação de pobreza na Palestina em Eclo 3,30-4,10; 5,1-8; 13,1-24 e 27,1! Diferentemente de seu irmão, Andoco IV Epífanes (175-163 a.C.) quis impor o Helenismo à força na Palestina. O título que assumiu (Epífanes) já indi ca sua pretensão de ser a “manifestação de Deus”, de Zeus. Sua nova política foi a imposição da cultura grega, sua religião e seus costumes sobre os judeus. Sua intenção era humilhar a comunida de judaica, proibindo a circuncisão, a observância do sábado e exigindo sacrifícios para divindades gregas. Chegou a construir em Jerusalém uma cidadela fortificada (IMc 1,33-35). Dessa forma, Jerusalém ficou dividida. Por um lado, havia os ju deus favoráveis ao Helenismo, instalados na cidadela dentro da cidade "Mandou-o também profanar o santuário de Jerusalém e dedicá-lo a Júpiter Olím pico." (2Mc 6,2) 43 santa, onde construíram um ginásio de esportes, bem como um templo consagrado a Júpiter ou Zeus. Eles tinham o apoio dos Selêucidas que tinham uma guarnição militar na fortaleza. Por outro lado, havia na Pa lestina os “hassideus” ou judeus “piedosos” que resistiam em defesa da tradição judaica, fechando-se cada vez mais dentro dos limites estabele cidos pela lei. Além de sentir a opressão política e econômica, os judeus passa ram a sofrer também uma forte dominação cultural. Da mesma forma como, em séculos antes, reinava a dominação dos impérios, simboliza dos pela cidade de Babel, mais uma vez “toda a terra usava uma só lín gua e as mesmas palavras” (Gn 11,1). Certamente, a narrativa sobre a cidade de Babel em Gn 11,1-9 se tornou atual como nunca nesse novo contexto. Diante da helenização da tradição de Israel, os judeus se dividem Diante disso, o Judaísmo da Palestina se dividiu. Por um lado, es tava a classe dirigente. De outro, estavam os grupos de resistência, que veremos logo adiante. A classe dirigente aceitou passivamente a influência do Helenismo. Até mesmo colaborava na sua implementação. Com a conivência do sumo sacerdote Jasão, que corrompeu o rei selêucida para obter o cargo (2Mc 4,7 -9), o Helenismo entrou inclusive em Jerusalém. Repare que Ja são bem como Menelau, seu sucessor, têm nomes gregos. Com a nomea ção de Jasão para o sumo sacerdócio no lugar de Onias III, foi quebrada a sucessão hereditária dos sadoquitas no cargo de sumo sacerdote. Os moradores de Jerusalém que aderiram ao Helenismo recebe ram inclusive o título de “cidadãos antioquenos”. Antes de continuar seu estudo neste volume, leia lM c 1,10-64! Como você pôde perceber, até um ginásio para atletismo foi construído na cidadela dentro de Jerusalém (lM c 1,14-15; leia ainda 2Mc 4,7-20!). Pior que tudo isso, foi introduzir no próprio templo o culto a Zeus Olímpico, correspondente a Júpiter dos romanos, bem como proibir a ob servância do sábado, da circuncisão, etc. Não deixe de ler 2Mc 6,1-11! 44 Em Dn 11,31 e 12,11, a instalação do culto dejúp iter no templo d e je rusalém é chamado de “abominação da desolação”. Confira! Os saduceus Os saduceus eram um grupo organizado, formado pela classe di rigente. Organizaram-se para defender seus interesses e privilégios. Eram da aristocracia sacerdotal, bem como dos setores leigos e ricos. Eram a elite ligada aos interesses econômicos do governo, do latifún dio, do templo e do grande comércio. Durante a dominação dos gregos, sua posição política era favorável à adoção da cultura helênica e à alian ça estratégica com os Selêucidas, que lhes garantia uma situação econô mica privilegiada. Além de serem conservadores, viviam em torno do templo, con trolando o poder e o comércio. Os saduceus mantinham sua influência sobre o povo através das alianças com quem detinham o poder. Eles não tinham mentalidade apocalíptica. Consequentemente, não esperavam por um Messias, nem acreditavam na ressurreição. So bre a teologia apocalíptica, trataremos adiante. Mais tarde, apoiariam os reis hasmoneus abertos à helenização da cultura judaica, como ainda veremos. Alexandre Janeu (103-76 a.C.), por exemplo, apoiou-se neles, quando lutou contra os fariseus. Porém, Salomé Alexandra, sua esposa, que o sucedeu no trono (76-67 a.C.), ad mitiu novamente os fariseus no Sinédrio. A partir de então, começou um conflito entre os dois grupos no grande conselho, em que os sadu ceus continuaram sendo a maioria. Literatura na época dos Selêucidas O primeiro a reagir diante das provocações de Antíoco IV foi Matatias, levita (IMc 2,1; lC r 24,7) da aldeia de Modin situada a noroes te dejerusalém. Ali, matou o representante do rei, bem como um judeu que sacrificava às divindades gregas sobre o altar sob a ordem dos gre 45 gos (lM c 2,24-25). Assim começou a luta contra os judeus que aderiram ao modo de vida helênica e contra a opressão dos Selêucidas. Durante o exílio babilônico, o 2° Isaías havia iniciado uma aber tura de Israel para o mundo, como vimos no volume 5. Esdras e Neemias, ao contrário, impuseram um Judaísmo exclusivista. Contra eles reagi ram os livros de Rute e de Jonas. Os judeus de Alexandria retomaram o universalismo do 2° Isaías. Nesse sentido, o Helenismo foi um desa fio para Israel na retomada da sua missão de ser “luz para as nações” (Is 42,6; 49,6). Porém, os hassideus insistiram no Judaísmo legalista e preso a suas tradições. Em boa parte, a literatura bíblica nos dois últi mos séculos a.C. reflete, com diferentes ênfases
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