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Religiões do mundo mediterrâneo e as origens do cristianismo Sarita dos Santos Carvalho Marco Aurélio de Brito © 2020 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Imagens Adaptadas de Shutterstock. Todos os esforços foram empregados para localizar os detentores dos direitos autorais das imagens reproduzidas neste livro; qualquer eventual omissão será corrigida em futuras edições. Conteúdo em websites Os endereços de websites listados neste livro podem ser alterados ou desativados a qualquer momento pelos seus mantenedores. Sendo assim, a Editora não se responsabiliza pelo conteúdo de terceiros. Presidência Rodrigo Galindo Vice-Presidência de Produto, Gestão e Expansão Julia Gonçalves Vice-Presidência Acadêmica Marcos Lemos Diretoria de Produção e Responsabilidade Social Camilla Veiga Gerência Editorial Fernanda Migliorança Editoração Gráfica e Eletrônica Renata Galdino Luana Mercurio Supervisão da Disciplina Ana Paula Moraes da Silva Maccafani Revisão Técnica Ana Paula Moraes da Silva Maccafani Iara Gumbrevicius 2020 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Brito, Marco Aurélio. B862r Religiões no mundo mediterrâneo e as origens do cristianismo / Marco Aurélio de Brito, Sarita dos Santos Carvalho. – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2020. 183 p. ISBN versão digital 978-65-5903-019-4 1. Cristianismo primitivo. 2. Povo hebreu. 3. Igreja Católica e Romana. I. Carvalho, Sarita dos Santos. II. Título. CDD 200 Raquel Torres CRB-6/2786 Sumário Unidade 1 Religião, sociedade e suas fronteiras ........................................................... 7 Seção 1 Matriz judaica ..................................................................................... 9 Seção 2 Formação do povo de Israel ............................................................20 Seção 3 Estruturas políticas: povo de Israel ................................................35 Unidade 2 Cristianismo .................................................................................................56 Seção 1 Origem e expansão ...........................................................................57 Seção 2 Igreja: A era apostólica .....................................................................70 Seção 3 O cenário religioso medieval ..........................................................84 Unidade 3 História, cultura e religião .......................................................................100 Seção 1 Período helenístico ........................................................................101 Seção 2 Contexto sociocultural no Mediterrâneo ...................................113 Seção 3 A ética e o advento do cristianismo ............................................126 Unidade 4 Literatura, religião e sociedade ...............................................................143 Seção 1 Os gêneros literários do antigo e novo testamento ...................144 Seção 2 Tipos de narrativas bíblicas ..........................................................156 Seção 3 Literatura neotestamentária .........................................................166 Palavras do autor Caro aluno!Esta disciplina foi elaborada pensando nos conteúdos necessários e indispensáveis à sua formação como teólogo. Para isso, é importante o entendimento sobre as diversas religiões, suas crenças e seus costumes, e considerando a influência do judaísmo em relação ao cristianismo, este material é fundamental para seu entendimento sobre a doutrina cristã. Trabalharemos de forma que você consiga compreender as práticas religiosas das religiões mesopotâmicas, bem como do cristianismo. Sobre esta última, será primordial entender as práticas dos grupos e das comuni- dades cristãs no seu período de formação e fixação. Pelo nascimento do judaísmo e o evento do cristianismo, muitas instituições se estabeleceram, e a igreja cristã como conhecemos hoje é o resultado desse passado histórico de acontecimentos felizes ou desastrosos, resultado de escolhas dos homens, cada uma em seu tempo. Ao longo da disciplina, veremos a origem do judaísmo, bem como a importância e o conteúdo da Torá, a era patriarcal, os personagens que foram formadores do povo e de seus costumes básicos, bem como a escolha pela monarquia, suas consequências entre vitórias e perdas; estudaremos, também, sobre os clãs patriarcais, a organização social a política, a divisão dos reinos e os movimentos que buscavam a restruturação da nação. Posteriormente, conheceremos a expansão do domínio romano sobre a Palestina e a pessoa de Jesus na formação e expansão do cristianismo. Entraremos, então, na história do cristianismo, desde a Igreja Primitiva, com Paulo, seguindo para a formação da Igreja Medieval, a Igreja Católica, a Reforma Protestante e a Contrarreforma, seguida do período Helenístico, quando a cultura, em suas reviravoltas, influenciou também a religião. Retomaremos o contexto sociocultural do Mediterrâneo, agora em diferente cenário cultural e religioso. Ainda, aprenderemos sobre o cristianismo como difusor de princípios éticos e filosóficos, propagadores da ordem moral e da justiça social, assuntos de suma importância para estabelecer uma teologia contextualizada atual- mente. Estudaremos os gêneros literários do Antigo e do Novo Testamentos e os tipos de narrativas, fontes ricas e criativas na forma de textos históricos, épicos, tragédia e romance. Sobre os livros neotestamentários, veremos o criticismo sobre os textos, a formação do cânon, as literaturas apócrifas e a interpretação dos textos. Sugerimos que você tenha a disposição de acompanhar textos bíblicos, sempre que possível, aprimorando sua leitura deste livro, o qual, além de ser considerado sagrado por religiões, é um instrumento histórico muito importante. A sua dedicação e curiosidade serão de grande importância para aprimorar sua vocação profissional. O teólogo, além de conhecedor das religiões, é aquele que deverá ter respostas para orientar pessoas e suprir suas indagações a respeito das religiões. Estamos aqui para ajudá-lo! Unidade 1 Sarita dos Santos Carvalho Religião, sociedade e suas fronteiras Convite ao estudo Caro aluno, nesta unidade, você aprenderá sobre o judaísmo, desde o seu surgimento até os tempos que precederam o nascimento de Jesus. Mais que um conhecimento histórico, você entenderá porque uma religião tão antiga ainda tem seus adeptos espalhados pelo mundo e a influência que eles têm sobre as sociedades. Em disciplinas anteriores, você já conheceu a importância da Bíblia e sua formação. Agora, você compreenderá como os livros históricos permeiam a vida de uma nação que valoriza mais a sua religiosidade do que qualquer outra coisa, já que entende ter sido separada como mensageira e propagadora da Palavra de Deus. Além disso, verificará a complexidade das crenças judaicas e uma série de instruções comportamentais que regem o judaísmo, mas que podem ser seguidas por outras sociedades, de forma a promover o consenso e a igual- dade social. Abra a mente, libere a sua curiosidade e aproveite os estudos! 9 Seção 1 Matriz judaica Diálogo aberto Aluno, seja bem-vindo a esta disciplina! Nesta seção, dentro da unidade Religião, sociedade e suas fronteiras,aprofundaremos as questões sobre a matriz judaica – características, origem, crenças e livro sagrado. O judaísmo tem total relação com o cristianismo, pois sem os princípios registrados da história judaica não teríamos os princí- pios da argumentação da salvação pela graça. Outro ponto interessante é a contribuição que as leis judaicas ofereceram para a composição dos direitos jurídicos de diversos povos, como preceito de justiça e credibilidade. Para tornar a religião judaica mais conhecida, adentraremos à situação- -problema que propomos a você. O município de Campinas deseja a parti- cipação de um estudioso da teologia para participar de uma feira ecumê- nica, na qual várias atividades serão apresentadas sobre diversas religiões. Trata-se de uma exposição, a qual acontecerá em um ginásio escolar, com trabalhos dos mais variados – palestras, obras de arte, arte interativa, música, jogos, entre outros. Serão expostos painéis, utensílios característicos de cada religião, roupas, etc., na intenção de torná-las conhecidas e promover proxi- midade com os diversos públicos. Deve-se considerar que, estando no Brasil, há uma maioria de pessoas que conhece o cristianismo, portanto, para as apresentações das religiões menos conhecidas, deve-se dispender um esforço maior para que sejam vistas e compreendidas. Você, como estudante de teologia, foi chamado para auxiliar na montagem da apresentação da religião judaica na feira. Você deverá expor o que é o judaísmo, suas origens, suas crenças e tradições, bem como seus princí- pios especiais. Bons estudos! Não pode faltar O que é judaísmo? Quando falamos em religião, qual a primeira palavra que lhe vem à mente? As religiões de origem cristã? 10 É comum a nós, brasileiros, com tradição histórica cristã – porque, afinal, nossos colonizadores europeus trouxeram o catolicismo como religião para este lugar e o impuseram por muito tempo como a religião oficial do país – pensar que outras religiões sejam seitas, ou movimentos menos importantes, ou simplesmente culturas de determinado grupo. O judaísmo é uma religião que também é a cultura e o movimento de uma nação, ou seja, o fato de o povo de Israel ter começado com uma família, ter crescido e se multiplicado, com a visão de povo escolhido por Deus, é tão forte que, mesmo Israel tendo ficado tempos sem um território, o conceito de nação não se desfez. Você compreende a diferença entre país e nação? A nação judaica é um ótimo exemplo para compreender a diferença. Ela perma- nece nas pessoas que dela fazem parte, considerando-se um grupo com a mesma descendência, que conserva, obrigatoriamente, costumes e crenças, independentemente do país em que estejam habitando. O judeu, dentro ou fora da Palestina, continua praticando o shabat, a circuncisão, a abstinência a determinados alimentos, a prática da leitura da Torá, entre tantos outros rituais que fazem parte da sua essência. O judaísmo, portanto, é uma religião primordialmente (a primeira) monoteísta, sendo a mais antiga do mundo, tendo se originado por volta do século XVIII a.C. Presume-se que tenha, hoje, de 12 a 15 milhões de adeptos. Atualmente, uma pessoa pode se converter ao judaísmo sem que seja descendente de judeus, mas deve seguir todos os rituais religiosos. O severo cumprimento das leis da Torá, contudo, é exigido apenas ao povo judeu por descendência. Mas, os mandamentos devem ser seguidos por todos os homens, indistintamente de sua origem ou nação, pois o judaísmo acredita que a Palavra de Deus foi enviada não apenas a Israel, são regras mais que religiosas, são para a sociedade. A origem do judaísmo Você já parou para pensar que um determinado povo começou a sua história há mais de quatro mil anos e que, apesar das mais terríveis ameaças a ele, manteve-se vivo e com suas tradições até hoje? Esse povo é o judeu, que se iniciou com o chamado de Abrão para emigrar da cidade de Ur, dos Caldeus, para tomar posse de Canaã. Abrão tornou-se figura histórica, aquele que se deslocou com seus rebanhos, tendas, esposa (Sarai) e concubinas, de norte a sul da Palestina. O texto bíblico clássico sobre o chamado dele está em Gênesis, capítulo 12, versículos de 1 a 3: 11 Ora, o SENHOR disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra. (BÍBLIA, 2005, p. 12) Mas, por que Abrão foi chamado? A região da Caldeia era constituída por povos de cultura politeísta. Abrão era homem que já se dedicava a um único Deus, assim como seu antepas- sado, Sem, filho de Noé. Portanto, ele não havia se corrompido com a cultura dos caldeus, mesmo tendo algumas relações com aquela sociedade, isto é, Abrão tinha alguns contatos comerciais entre os caldeus e estes lhe garantiam proteção no caso de perigo com a invasão de dominadores. Segundo a história bíblica, Deus, desde a criação do homem, desejava que os povos da Terra se mantivessem íntegros e justos, para que com eles pudesse se relacionar. Assim, Deus escolhe Abrão para ser o precursor desse povo e, ainda hoje, judeus se consideram “filhos de Abrão”. O fato é que, nos tempos de Abrão, o império egípcio vinha com tentativas de dominar todas as terras da região da Mesopotâmia; concomitantemente, poderes assírios enfrentavam os egípcios e subjugavam pequenos outros povos. Todos desejavam essa terra privilegiada de Canaã, contida entre as praias do Mar Mediterrâneo e as areias da Península Arábica, regada pelo Rio Jordão, em uma mistura de vegetação exuberante, desertos, planícies e vales. Uma visão exuberante! Mediante a esses fatos, Roth (1962, p. 5) afirma: “Foi por causa da visão de algo de algo mais elevado e da esperança de alcançar uma satisfação mais completa, que Abrão parece ter abandonado seu país”. Assim, além de uma visão romântica ou sobrenatural a respeito do chamado de Abrão, pode-se considerar que ele foi também impulsionado pelos benefícios que aquela nova região oferecia, sem desmerecer o fato de que Deus também desejava o bem e a prosperidade de seu povo. A descendência de Abrão torna-se o povo escolhido para transmitir a mensagem de Deus. Você verá, no decorrer desta unidade, como a sua história foi construída com base na obediência e desobediência aos mandamentos de Deus, o que, de certa forma, permeia as principais crenças deste povo. Vamos conhecê-las? 12 As principais crenças judaicas Há religiões que estão repletas de objetos místicos, dos quais se acredita que emane poder. Outras creem que há determinados rituais que promovem concessão de poder sobrenatural, ou que despertam a atenção de Deus sobre os homens. São crenças movidas pela fé, nem sempre explicáveis. No caso do judaísmo, há determinadas tradições e crenças que perpassaram gerações. Você tem ideia da quantidade de regras presentes na lei judaica para o povo? O livro de Deuteronômio está repleto delas. Além disso, os intérpretes da lei produziam a lei oral, que era uma interpretação para casos específicos, já que aquilo que estava escrito nem sempre abrangia especificidades. As principais crenças judaicas estão firmadas no entendimento de que Deus é único e o criador da Terra e dos Céus, do universo inteiro. É onisciente, onipresente e onipotente. Ele não tem gênero, mas é chamado de forma masculina por convenção. Por meio das Escrituras, Deus comunicou ao povo judeu as suas instruções de comportamento em relação a Ele e ao próximo. Elas são imutáveis, e se encontram no Tanakh (similar ao Antigo Testamento que conhecemos). O povo de Israel foi escolhido para receber a Palavra de Deus, perpetuá-la, protegê-la e divulgá-la ao resto do mundo. Além dos dez mandamentos, há outros 613 nas escrituras que devem ser considerados e seguidos. Todo judeu deve receber instruçãopara a leitura e o aprendizado da Torá, nesse sentido, o judaísmo não aceita os escritos do Novo Testamento como Palavra de Deus. Ainda segundo os judeus, Deus julga os homens por seus atos, indepen- dentemente de raça, etnia ou gênero, considerando que ao homem foi dado livre-arbítrio para agir para o bem ou para o mal. Assim também é responsa- bilidade de cada um a expiação pelos próprios pecados, sendo que a correção dos erros vem por meio da oração, da meditação, do Yom Kippur (dia do perdão) e pelo arrependimento, desejando não cometer os mesmos erros novamente. O judaísmo crê na vinda de um messias, mas não como alguém que tomará os pecados do mundo, como Jesus. O messias judaico é aquele que reunirá todo o povo judeu na Terra de Israel, um rei judeu, e isso ocorrerá no tempo da paz universal. Jerusalém é o coração do judaísmo; os judeus ainda creem que aquela terra é especial para Deus, e têm uma relação interessante e física com ela. Todo menino nascido judeu deve ser circuncidado ao oitavo dia de vida. Portanto, o homem judeu tem uma marca física e íntima que o identifica como separado para esta religião. 13 Exemplificando Atualmente, na maioria dos países ocidentais, é garantido um dia de folga do trabalho no fim de semana. Você já parou para pensar que essa norma tem fundamento nas leis judaicas? Deus determinou ao povo um dia de descanso, o shabat, que seria o sábado, quando o homem não deveria produzir nada, mas se dedicar aos serviços de prece, refei- ções festivas com família e amigos e descanso. Esse dia de descanso tem referência ao fato de que Deus criara o mundo em seis dias e teria também descansado no sétimo. Veja que a lei foi feita para o bem do homem, para preservá-lo da exploração, dando o direito ao descanso a todo e qualquer trabalhador. Figura 1.1 | Menino lendo a Torá – Bar Mitzvah Fonte: ShutterStock. Reflita Em tempos antigos, todos os meninos eram iniciados na leitura e compreensão das Escrituras, seguidos por um rabi (mestre). Aqueles que se destacavam no aprendizado eram tomados como discípulos do mestre para estudarem cada vez mais, até que também se tornassem rabis na idade adulta. Aqueles de pouco ou nenhum destaque eram excluídos do ensino e voltavam para serem instruídos na profissão de seus pais. Portanto, ser chamado para acompanhar um rabi (ou rabino) era motivo de grande orgulho e, para muitos, a única oportunidade de seguir uma vida social diferente daquela da família. 14 Há, ainda, muitos outros elementos que fazem parte das crenças judaicas: amuletos, artefatos, festas e objetos sagrados que fazem parte desse universo religioso. Esteja atento e disposto a pesquisar mais a respeito e conhecer seu mundo de tradições. Dentre as tradições, a leitura e memorização da Torá é uma tarefa complexa. Verificaremos algumas características desse importante livro dos judeus! Torá: o livro sagrado do judaísmo Manusear um objeto antigo é algo fascinante, você não acha? Há um certo poder místico que envolve as antiguidades, que traz à mente a possibilidade de imaginar a vida de pessoas que já se foram e que carregaram ou produ- ziram tais objetos. Como seria entrar em uma casa de mais de dois mil anos e poder provar e sentir seus utensílios preservados, suas paredes, seus móveis? Observar a Torá é adentrar em uma história de quatro mil anos. Ela é produto de registros realizados há muito tempo, mas que persistem até os nossos dias, sendo cada vez mais difundidos. Já parou para pensar em quantas pessoas já tiveram contato com este livro, leram e repetiram seus muitos textos? A Torá, a Lei de Moisés ou Pentateuco (em hebraico, Chumash, Chumishá Chimishê Torá) é o conjunto dos livros “de Moisés”: Gênesis (Bereshit), Êxodo (Shemót), Levítico (Vayikrá) e Deuteronômio (Devarim). Os nomes dos livros (em português) derivam do grego e estão relacionados ao conteúdo; já os nomes em hebraico fazem referência à primeira ou principal palavra do início de cada livro. A autoria é referida a Moisés, e os últimos versículos a Josué, substituto de Moisés após a sua morte. Mas, a autoria é uma questão polêmica entre teólogos ocidentais, pois, considerando que Moisés morrera no deserto, preci- saria ter realizado um trabalho complexo, a fim de redigir diversos rolos nas condições em que ele e o povo se encontravam, e carregá-los por regiões tão áridas ao longo de tanto tempo. Alguns estudiosos defendem que as leis eram conservadas oralmente, desde Moisés, e que, em algum momento da história, fiéis sacerdotes passaram a registrá-las em rolos, e assim sucessivamente. “O Pentateuco contém a história da criação do homem, a origem do povo hebreu e toda sua legislação civil e religiosa, finalizando com a morte de Moisés.” (TORÁ, 2001, p. XIII). 15 Assimile Na Bíblia cristã, o Pentateuco contém os livros da Torá. Eles são funda- mentais para a religião cristã, pois contêm elementos que fazem a ligação entre a criação do homem, sua queda e redenção, que será, na literatura, concretizada no Novo Testamento, por meio do sacrifício de Jesus. Na Torá está descrito o ritual do sacrifício para perdão dos pecados, cumprido por Jesus, o cordeiro perfeito oferecido pelas trans- gressões da humanidade. A Torá contém 5.845 versículos, compilados nos cinco livros. A tradição judaica considera a Torá sagrada e considera motivo de grande alegria ela ter sido revelada por Deus, por meio de seu mensageiro Moisés. Para ela, de acordo com a história da peregrinação no deserto, Moisés sobe ao monte Sinai e passa muitos dias na presença do Senhor. Ao descer do monte, Moisés traz a Lei e, somente por esse ato, o povo comemorou, mesmo antes de conhecer seu conteúdo. Esse dia é lembrado com a festa da Simchat Torá, quando todos dançam e cantam com alegria, agradecendo a Deus a dádiva da sua Palavra. Ao passo que Moisés apresentava as leis ao povo, puderam perceber que elas forneciam a chave não para alcançar a riqueza, mas para dar significado à sua existência, proporcionando a felicidade em viver conforme a Torá. Vale dizer que muitos preceitos da lei judaica se tornaram base legislativa de muitos povos ocidentais, e mais ainda depois da invenção da imprensa, por Gutemberg, em 1430. O primeiro livro a ser produzido na imprensa de Gutemberg foi a Bíblia, o que promoveu sua divulgação mais rápida às pessoas mais distantes, e mais ainda com a posterior tradução para diversas línguas. Importante, ainda, ressaltar que há três redações diferentes dos livros da Lei: a versão judaica, a samaritana e a grega (a Versão dos Setenta – Septuaginta – e a versão latina – Vulgata). A redação judaica foi transcrita por rabinos massoraítas (escritos massoréticos), no século VII d.C.; as versões gregas (Septuaginta e Vulgata) são bem semelhantes à massorética, no entanto, a samaritana é a que mais difere. A você, aluno, aconselhamos que, se tiver uma oportunidade, manipule um exemplar da Torá, seja em um museu, uma biblioteca, ou uma livraria em sua cidade. Observar seu conteúdo lhe despertará a sensibilidade para perceber quão precioso é este livro – se não for segundo as suas crenças, ao menos como uma verdadeira joia literária. Nesta seção, você recebeu informações essenciais para a compreensão de uma das religiões mais antigas do mundo. Além disso, aprendeu sobre os princípios e motivos de seu surgimento, suas crenças e um de seus objetos 16 sagrados. Sobre o judaísmo, há, ainda, muito o que aprender, pois é uma religião milenar e com diversas nuances curiosas. Ler a Bíblia em sua totali- dade é uma das formas de conhecer ainda melhor essa religião e suas tradi- ções. Veremos, nas próximas seções, mais sobre o povo judeu, o desenrolar de sua história e como suas escolhas influenciaram seu futuro. Sem medo de errar Conforme vimos na situação-problema desta seção, para a feira ecumê- nica, será montado um estande sobre a origem das diversas religiões, portanto, você deve elaborar um painel com as principaisinformações a respeito do judaísmo, elencando as crenças e sua fonte de inspiração. No caso do judaísmo, há determinadas tradições e crenças que perpas- saram gerações. Você tem ideia da quantidade de regras presentes na lei judaica para o povo? O livro de Deuteronômio está repleto delas. Além disso, os intérpretes dela produziam a lei oral, que era uma interpre- tação para casos específicos, já que aquilo que estava escrito nem sempre abrangia especificidades. As principais crenças judaicas sobre Deus são: • Deus é único e o criador da Terra e dos Céus, do universo inteiro. • Onisciente, onipresente e onipotente. • Não tem gênero. Quanto ao povo: • Foi escolhido para receber a Palavra de Deus, que é imutável. Israel deveria perpetuá-la, protegê-la e divulgá-la ao resto do mundo. • Todo menino nascido judeu deve ser circuncidado ao oitavo dia de vida. Quanto às Escrituras: • Além dos dez mandamentos, há outros 613 que devem ser conside- rados e seguidos. • Todo judeu deve receber instrução para a leitura e o aprendizado da Torá. O judaísmo não aceita os escritos do Novo Testamento como Palavra de Deus. Aos homens, em geral: • Ao homem foi dado livre-arbítrio para agir para o bem ou para o mal. 17 • É responsabilidade de cada um a expiação pelos próprios pecados, por meio da oração, da meditação, arrependimento, desejando não cometer os mesmos erros novamente. O messias judaico é aquele que reunirá todo o povo judeu na Terra de Israel, um rei judeu, e isso ocorrerá no tempo da paz universal. Jerusalém é o coração do judaísmo. O estande pode ser decorado com exemplares ou cópias de artigos religiosos judaicos, similares aos presentes nos templos e nas sinagogas: o candelabro, as tábuas da Lei de Moisés, o cajado de Moisés, a Arca da Aliança, entre outros. Uma das melhores formas de apresentar a lei judaica é você dispor de um ou mais exemplares da Torá, deixando-os disponíveis ao manuseio do público. Outras ações podem ser apresentadas, usando a sua criatividade. Faça valer a pena 1. Quanto à caracterização do povo de Israel enquanto povo eleito por Deus, é necessário que se compreenda tal expressão como referente, unicamente, ao fato de que Deus escolheu os judeus para que recebessem sua Lei, cumprissem os mandamentos contidos na mesma e a estudassem, a fim de poderem segui-la de forma consciente. Deste modo, esta escolha não deve, em hipótese alguma, ser interpretada por um prisma etnocêntrico, ou seja, significando a superioridade de um povo em detrimento de quaisquer outros, quer esta superioridade seja defen- dida por critérios religiosos, étnicos, sociais, econômicos, políticos ou morais. Segundo Lillenthal (1997), a eleição deve ser compreendida como marcada pela condição de obediência, dever e serviço a Deus. Tal condição revela que o povo de Israel foi escolhido apenas como instrumento para garantir o cumprimento de um propósito divino maior - a defesa do monoteísmo. (EPELBOIM, 2004, [s.p.]) Com base no texto a respeito das crenças do judaísmo, assinale a alternativa correta: 18 a. O povo judeu foi escolhido por Deus devido à sua notória e superior capacidade evolutiva sobre os demais povos. b. O povo judeu acredita que foi separado para não se contaminar com outros povos, pois sua impureza significa ceder ao Diabo. c. Faz parte das crenças judaicas o fato de que os judeus foram escolhidos, como um privilégio, para receber as leis do Senhor e permanecerem como seu guardião e propagador. d. Moisés foi escolhido para ser o portador da mensagem de Deus, sua Lei, porque foi chamado para sair da terra de Ur, da Caldeia, para uma terra totalmente desconhecida e, mesmo assim, obedeceu. e. O fato de os judeus terem recebido a Lei de Deus não foi por se tratar de uma etnia mais desenvolvida que outras, pois eles sempre estiveram atrás no desenvolvimento social e tecnológico. Em toda a história, não têm um nome de relevância na ciência. 2. Em português, Torá vem da palavra hebraica tohráh, que pode ser traduzida como “instrução”, “ensinamentos” ou “lei”. O livro de Provérbios contém as seguintes passagens: “Filho meu, não te esqueças da minha lei, e o teu coração guarde os meus mandamentos. Porque eles aumentarão os teus dias e te acrescentarão anos de vida e paz” (3:1); “O que guarda a lei é filho sábio, mas o companheiro dos desregrados envergonha a seu pai” (28:4); “Atentai para a minha repreensão; pois eis que vos derramarei abundante- mente do meu espírito e vos farei saber as minhas palavras” (1:23). A Torá contém a lei judaica, e é também conhecida como Pentateuco, que faz parte do Antigo Testamento da Bíblia cristã. Assinale a alternativa que contém os livros que compõem a Torá: a. Provérbios, Eclesiastes, Salmos, Cânticos de Salomão e Levítico. b. Provérbios, Eclesiastes, Levítico, Números e Deuteronômio. c. Eclesiastes, Livro da Sabedoria, Levítico, Números e Deuteronômio. d. Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. e. Levítico, Números, Deuteronômio, Josué e Samuel. 19 3. As leis do Shabat para o judeu ortodoxo são bastante complexas. A princípio, parecem uma série de estranhas restrições, mas os praticantes acreditam que, se alguém de fora presenciar a prática da tradição, pode passar a se sentir à vontade com as leis do Shabat, desde que perceba que se tornar shomer Shabat (observante do Shabat) é um processo gradual, e não uma transformação da noite para o dia.Texto. Sobre as crenças e os rituais do judaísmo, o que é o shabat? a. A lei judaica que se refere à circuncisão dos meninos ao oitavo dia do nascimento. b. A lei judaica a respeito do descanso semanal. c. A lei judaica sobre a abstinência de determinados alimentos, como as carnes impuras. d. A lei judaica sobre o jejum. e. A lei judaica sobre a abstinência sexual para dedicação à meditação. 20 Seção 2 Formação do povo de Israel Diálogo aberto Caro aluno, bem-vindo a mais uma seção de estudos sobre o povo de Israel. Estudaremos a estruturação do Estado de Israel a partir de um desen- rolar de acontecimentos, iniciando com a história de seus patriarcas, os personagens importantes para a história de todo judeu, o período monár- quico e o exílio – período crítico de domínio e escravização por outros povos. Você consegue relacionar, por exemplo, a importância dos portugueses colonizadores na constituição dos nossos costumes, na formação das nossas cidades e na arte brasileira? Isto sem falar na língua, que é um dos nossos maiores patrimônios culturais. Da mesma forma, temos a influência africana, trazida pelos povos, de maioria bantu, como escravos e que é claramente presente na nossa cultura, no nosso vocabulário e, talvez, ainda, na forma de ser do povo brasileiro: alegre, festivo, que preza por relacionamentos. Com essa figura em mente, faça um paralelo sobre a cultura judaica, influenciada por seus “fundadores”, os patriarcas, em uma cultura acentuada- mente patriarcal; depois, vivendo nos exílios, sendo influenciada por outras culturas, um eterno conflito entre conservar-se ou mestiçar-se. Para colocar em prática mais esta seção de aprendizagem, relembraremos a situação-problema da seção anterior. O município de Campinas promoverá uma feira ecumênica, na qual diversas atividades serão apresentadas sobre várias religiões. Você, como estudante de Teologia, foi convidado a apresentar o judaísmo e, agora, foi solicitado que monte uma tabela com os principais acontecimentos da história judaica, desde o surgimento de Israel até a liber- tação do exílio. O grande desafio refere-se à grande extensão de tempo que envolve a formação do Estado de Israel, desde o período da revelação, a escra- vidão, o período de peregrinação, a chegada à terra prometida e toda a longa trajetória. Também é desafiante devido às influências sofridas pelo povo judeu por meio dos diversos contatos com povos e culturas diversos. Você já sabe que, para descrever a história judaica, terá que tangenciaras histórias desses vários povos, assim como que os tempos de ascensão e queda do povo de Israel contêm diversas histórias e personagens – os patriarcas, os reis, os líderes importantes. Você deve estar muito motivado a fazer a relação desses acontecimentos, personagens e datas aproximadas dos acontecimentos. 21 Não pode faltar A era dos patriarcas Você já aprendeu a explicação sobre a origem do judaísmo, cuja figura de Abraão é fundamental na história de Israel. Ele, seu filho Isaque e seu neto Jacó são os patriarcas de Israel, por serem os herdeiros diretos da promessa do Senhor. De sua descendência foi gerada toda uma nação, e por meio de sua dedicação a Deus foram mantidas tradições até os dias de hoje. Abrão era chefe de uma família nômade, natural de Ur, da Caldeia. Estudos mostram que a região de Ur já era, nos tempos dele, um local de cultura refinada, mas de religião politeísta, com belos templos dirigidos por sacerdotes (ROTH, 1962). A região de Canaã era fértil, com colinas e vales, bela vegetação e desertos, planícies e vales, regados pelo Rio Jordão. Ela era desejada por muitos naqueles tempos. Não diferente, Abrão a desejava e entendia como um chamado do Senhor partir de sua cidade para este lugar, com um certo altruísmo e com a esperança de alcançar uma espiritualidade mais elevada, distanciando-se do politeísmo daquelas culturas. Ao sentir-se chamado por Deus, segundo a Bíblia, ele recebeu a promessa de que seria pai de uma numerosa nação. Porém, era casado com Sarai, mulher estéril, mas acreditava em algum milagre que o Senhor pudesse lhe conceder. Partiu, então, com seus rebanhos, servos e servas. Abrão passa a ser chamado de Abraão, e Sarai, de Sara. Em determinado momento, eles receberam novamente a palavra de Deus de que seriam pais de uma grande nação. Duvidosos da promessa, por estarem em idade avançada para terem filhos, resolveram que Abraão deveria ter um filho com a serva Hagar. Nasceu, então, Ismael (este que, segundo a tradição, é o herdeiro de Abraão e precursor do povo islâmico). Deus, entretanto, confirmou que o herdeiro e precursor da grande nação seria filho de Sara. Esta, então, aos 90 anos, teve seu primogênito, Isaque. Com a morte de Abraão, Isaque assumiu sua herança e deveria perpetuar a promessa que Deus havia feito ao seu pai de constituir uma numerosa nação fiel a Deus. Ele se casou com Rebeca, uma parente da região da Mesopotâmia, e se manteve fiel ao Senhor, que lhe deu filhos e multiplicou seus bens sobre a terra. Em devido tempo, sua esposa deu à luz filhos gêmeos – Esaú e Jacó. Aquele foi o primeiro a nascer, portanto, tinha, por tradição, o direito à primo- genitura, e este recebeu esse nome justamente porque, segundo a tradição, saiu segurando o calcanhar de seu irmão. 22 Esaú era um homem ligado à caça, enquanto Jacó era um filho mais presente e próximo de sua mãe. Quando Isaque já era velho e cego, Rebeca armou um plano para que seu marido desse a bênção da primogenitura para Jacó, história registrada em Gênesis 27:5-30. Depois desse episódio, Esaú, irado com a traição de Jacó, passou a perseguir seu irmão, o qual fugiu para outras terras por muitos anos. Jacó, em uma noite, travou uma luta com um anjo do Senhor, o qual lhe feriu a coxa, mas Jacó segurou o anjo até que o abençoasse, o que represen- taria o perdão do Senhor por seus atos cometidos contra seu irmão e seu pai e significava a confirmação de que ele teria a promessa de descendência de um povo do Senhor, como seu pai, Isaque, e seu avô, Abraão. O nome de Jacó, então, foi mudado para Israel (aquele que luta com Deus). Seu nome é sinônimo de uma nação que permanece até hoje. A promessa de uma grande descendência, dada a Abraão por Deus, firmou-se com Israel, que teve doze filhos e para os quais a terra de Canaã foi dividida e onde se espalharam muitas pessoas, filhos de seus filhos. Todos esses acontecimentos que envolvem a vida dos patriarcas ocorreram no século XVII a.C. Para a tradição judaica, os nomes de Abraão, Isaque e Jacó são respeitados e honrados como seus patriarcas, aqueles que enfrentaram muitas dificul- dades, mas que obedeceram à voz do Senhor e que receberam, em primeira mão, a promessa de serem líderes de uma grande nação monoteísta, entre tantas outras com seus deuses. Segundo Roth (1962), longe de uma visão romântica de tranquilidade e homogeneidade de pensamentos, o monote- ísmo do povo de Israel foi uma evolução lenta e contínua, uma descoberta gradual do homem sobre Deus. A monarquia Após Israel e seus filhos terem subido ao Egito por causa de um grande período de fome que assolou a região, passaram-se muitos anos e outra dinastia egípcia tomou o trono e começou a dominar outros povos. Vivendo sob pesadas condições, o povo de Israel desejou sair do Egito e voltar às suas terras, além do Jordão. Para isso, levantou-se Moisés, um novo líder que ajudou a libertar o povo da opressão egípcia até que fossem novamente doutrinados nos costumes monoteístas e chegassem de volta a Canaã (séc. XIII a.C.). Após a morte de Moisés, Josué assumiu a liderança e, com o povo, tomou posse das terras em batalhas históricas. 23 As terras foram divididas entre as tribos, as quais eram, basicamente, representantes das famílias dos filhos de Jacó e de José (seu filho). Eram elas: Rúben, Simeão, Levi, Judá, Dã, Naftali, Gade, Aser, Issacar, Zebulom, José e Benjamim, Manassés e Efraim (estes eram filhos de José). Muitos anos se passaram, houve contendas e lutas para a manutenção das terras frente aos conquistadores. Dentre estes, os filisteus, um povo forte e muito organizado militarmente, que sempre foi o maior problema para Israel. A organização tribal era fraca, cada tribo tinha sua própria organização, e uma ajudava a outra em tempos de combate. A justiça e o governo eram exercidos por anciãos, líderes nomeados como juízes, que orientavam e aconselhavam sobre todas as coisas, de forma a manter a ordem, mas sob a condução divina. Assimile Dentro da história dos juízes de Israel, encontramos no livro de Juízes 4:4-5 a figura de Débora, uma mulher sábia e profetisa, que exerceu a função de juíza e liderou a batalha contra o rei do povo canaanita, Hazor, e o general Sisera. Nos tempos dela, houve quase uma coalizão entre todas as tribos de Israel contra os canaanitas. Israel, apesar de conservar uma tradição patriarcal, tem relatos de mulheres importantes que se sobressaíram em suas funções, e isso é muito importante para compreender o papel da mulher nesta socie- dade. A história de Débora é prova de que Deus não excluiu as mulheres do seu serviço, mas lhes deu oportunidades iguais. Os inimigos grandes de Israel fixaram-se na faixa costeira da Palestina e caminharam para seu interior. Frente a muitos conflitos, o próprio povo pediu a Samuel (sacerdote, profeta, juiz e administrador) que ungisse um rei em Israel, para que o representasse nas batalhas e unificasse as tribos. A monarquia, porém, era contrária à tradição antiga de que somente Deus era o rei em Israel; apesar disso, Samuel, mesmo alertando o povo sobre as consequências do estabelecimento de um rei, unge a Saul como o primeiro rei de Israel (1020 a.C.). Com o passar do tempo, ficou claro que Saul não fora uma boa escolha como monarca. Ele era bom militar, mas não era sábio para comandar uma nação. Surgiu, então, Davi, filho de Jessé, que, em princípio, fazia parte das tropas de Saul e se mostrava grande guerreiro contra os filisteus. Com sua fama, o próprio Saul se viu ameaçado e tentou matá-lo. Davi se refugiou entre os próprios filisteus e, em tempo oportuno, Saul e seus filhos foram mortos 24 em batalha. Davi lamentou a morte de seu rei, mas não perdeu a oportu- nidade de assumir o reinado do sul, Judá, estabelecendo Jerusalém como o centro do reino (1000 a.C.). Davi, porém, depois de muitos feitos, bons e maus, em seu leito de morte desejou que seu filho mais novo, Salomão, fosse ungido rei sobre Israel.Salomão, o rei conhecido por todos como aquele de mais nobre sabedoria, consolidou sua posição no sul e fez aliados importantes no Egito, na Índia e na Fenícia, ativando o comércio com outros povos e fazendo de seu reinado o mais rico da história. Foi ele quem construiu o primeiro templo em Jerusalém (960 a.C.), uma obra de magníficas proporções (1Rs; 6). Em 928 a.C., depois de terminada a construção do templo, pesados impostos eram cobrados do povo. Roboão, filho de Salomão, assumiu o trono após a morte do pai e não conseguiu manter a unidade do reino, iniciando-se uma guerra civil, a qual culminou na divisão em Reino do Norte e Reino do Sul, enfraquecendo novamente a ambos diante dos inimigos. O Reino do Norte, composto por 10 tribos, continuou a ser chamado de Israel. O Reino do Sul, apenas com as tribos de Benjamim e Judá, passou a ser chamado de Judá. Seguiram-se 200 anos de disputas e uma sucessão de reis. Foram estes os reis de Israel, em ordem de sucessão: Jeroboão, Nadabe, Baasa, Elá, Zinri, Onri, Acabe, Acazias, Jorão, Jeú, Jeoacaz, Jeoás, Jeroboão II, Zacarias, Salum, Menaem, Pecaías, Peca e Oséias. Foram estes os reis de Judá, em ordem de sucessão: Roboão, Abias, Asa, Josafé, Jeorão, Acazias, Atalia, Joás, Amazias, Azarias (Uzias), Jotão, Acaz, Ezequias, Manassés, Amom, Josias, Jeoacaz, Jeoaquim, Joaquim e Zedequias. De acordo com Roth (1962), o reino de Judá foi o que perpetuou a tradição hebraica, sendo transmitida até os nossos dias, mas o Reino do Norte vivia em conflito. Muitos de seus reis governaram apenas por alguns meses, e a metade deles sofreu morte violenta por seus sucessores, sendo que poucos foram sucedidos pelos herdeiros naturais. Reflita Foram muitos os reis de Israel e Judá. Uma sucessão de erros e acertos. Na Bíblia, nos livros de 1 e 2 Reis, você pode verificar que alguns deles seguiram conforme a tradição de obediência a Deus e foram generosos com o povo. Outros foram cruéis, enganosos e distantes da vontade de Deus. Há um texto importante em 1Sm 8.10-22, com as palavras que Samuel deu ao povo como resposta de Deus. 25 Reflita sobre o conselho que Samuel deu ao povo antes de ungir a Saul, rei de Israel, e as consequências de sua escolha. O exílio dos israelitas Nos tempos do rei Jeoaquim, o Império Babilônico dominava a região. Sendo o rei ainda muito jovem (18 anos), percebendo que não podia mais lutar contra o domínio, entregou-se à misericórdia do inimigo. Em troca da sua vida e de sua mãe, bem como de toda a família real, aceitou que Nabucodonosor tomasse as terras e os tesouros do palácio e do Templo (586 a.C.). Nabucodonosor não impediu que Israel mantivesse seu governo sobre seu povo, mas continuaria a ele subordinada, de forma semi-independente. Ele tomou a classe nobre de Judá para auxiliá-lo no seu governo. Foi nesse período que Daniel e seus amigos foram levados para a Babilônia e, exemplar- mente, segundo o livro de Daniel, serviram ao rei, mas sem abandonar suas crenças. A história de Daniel coloca a fidelidade dele e de seus jovens amigos como a causa de livramentos e como o motivo de sua sabedoria acima da média entre os demais jovens. Quanto ao rei de Judá, Jeoaquim, foi substituído por Zedequias, que tentou um acordo com os egípcios para derrotar os babilônios. Sem sucesso, foi morto e, antes, viu a execução de toda a sua família. Em 586 a.C., o general babilônico Nebuzaradan saqueou Jerusalém, destruiu os edifícios e as forti- ficações da cidade e levou como cativos aqueles que não foram mortos nas batalhas. Grupos de judeus permaneceram nos arredores de Judá, outros fugiram para o Egito, mas a maior parte ficou cativa na Babilônia. O cativeiro babilônico oferecia certa liberdade para seus dominados, permitindo que trabalhassem como artesãos, arquitetos e comerciantes. Nessa época, os judeus adotaram o aramaico como língua oficial e adquiriram diversos costumes e cultura do povo (SZPILMAN, 2012). É devido a essa mistura cultural e, inevitavelmente, religiosa que surgiram os profetas (Isaías, Jeremias, Elias, Eliseu, Oséias, Joel, Naum, Habacuque e todos os outros) entre os judeus, exortando o povo sobre seus atos. O povo já não se lembrava mais das promessas do Senhor e da sua Palavra, já não se cumpriam os rituais e os cultos de adoração, mesmo sendo permitidos pelos dominadores. Em 538 a.C., Ciro, rei da Pérsia (atual Irã), derrotou os babilônios. Como novo dominador dos territórios babilônios, os persas transformaram a área do antigo reino de Judá em província persa – denominada Judeia. Ciro deu mais liberdade aos judeus, permitindo que retornassem e reconstruíssem seu Templo em Jerusalém, comandados por Esdras, o escriba, e restaurassem os muros e a cidade, comandados por Neemias (515 a.C.). 26 Neemias servia como copeiro do rei Dario (filho de Ciro), função de grande confiança, pois, naquela época, o copeiro deveria experimentar todo alimento que era servido ao rei para evitar qualquer contaminação ou envenenamento. Ele expôs ao rei sua angústia por saber que Jerusalém estava desolada, e o rei lhe ofereceu todas as facilidades para que conseguisse ir à cidade fazer os reparos necessários, inclusive, oferecendo materiais para a reconstrução. Em 516 a.C., foi reerguido o segundo Templo de Jerusalém. Em 512 a.C., Esdras promoveu uma cerimônia pública, na qual fez a renovação da aliança entre Deus e seu povo, que lhe prometeu fidelidade e obediência à Torá. Mesmo sob domínio persa, o povo tinha boas influências na corte e acreditava que isso seria motivo de proteção. No reinado de Xerxes aconteceu o seu casamento com Ester, uma judia. Xerxes, por desavenças políticas, nomeiou Hamã como seu primeiro-ministro, um homem que tinha ódio dos judeus e tentou destruí-los. Ester, no entanto, intercedeu junto ao rei, e o povo reagiu diante da possibilidade de morte (473 a.C.). Hamã sorteou (pur) a data em que os judeus seriam mortos. Mas, devido ao livramento que eles creram ser a providência de Deus, passaram a celebrar a Festa de Purim. Após retornar às terras de Canaã, o povo de Israel ainda passou pela conquista de Alexandre, o Grande (em 332 a.C.) e pela revolta dos Macabeus (166 a.C.) contra a prática do judaísmo e a profanação do Templo. Dos anos 142 a 66 a.C., Israel passou por um período de independência e autonomia, sob a monarquia dos asmoneus. Contudo, em 63 a.C., Jerusalém foi invadida pelo Império Romano. Nos livros históricos e proféticos do Antigo Testamento podemos encon- trar todos os relatos do exílio, escritos sob a ótica dos dominados, colocando sempre a tragédia exílica como o castigo pelo afastamento e pela desobe- diência do povo do seu Deus, aquele que prometera protegê-lo enquanto permanecessem fiéis. Nos tempos de Josué, ao adentrarem à terra de Canaã, prometeram, cada um com sua família, que serviriam ao Senhor (Josué 24:15): Porém, se vos parece mal aos vossos olhos servir ao Senhor, escolhei hoje a quem sirvais; se aos deuses a quem serviram vossos pais, que estavam além do rio, ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais; porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor. (BÍBLIA, 2015, p. 213) Os profetas, no entanto, exortavam a todos devido ao pecado permanente. Se eram um povo escolhido por Deus para receber sua bênção, também seria 27 para receber a disciplina. E seu maior pecado era a falta de compaixão com o próximo. Mesmo escravo, ou exilado, o povo não atentava para a palavra de Deus, a qual era somente para que fossem justos, tivessem misericórdia e caminhassem com Deus. Roth (1962, p. 57) lembra que “o profeta hebreu nunca deixa de voltar ao ponto fundamental de justiça social”. O Estado de Israel Por séculos, o povo judeu viveu espalhado por diversos países, entre eles, Alemanha, França e Polônia. Vivendo, principalmente, em países europeus, foi fácil para o regime antissemita nazista, dominando essas regiões, “capturar” os judeus e tentar exterminá-los. O fato é que, com o fim da SegundaGuerra Mundial, muitos judeus que sofreram os horrores dos campos de concentração embarcaram no navio Exodus (1947), na intenção de começar uma nova vida na Palestina. O navio contava com 4.515 judeus europeus mais os tripulantes. O governo britânico, dominador do espaço palestino, interveio, interceptando a viagem e deslo- cando os passageiros de volta à Europa. Numa tentativa de desembarcar os judeus na França, britânicos foram impedidos, pois os franceses não permi- tiram tal feito. De outro lado, judeus se recusaram a desembarcar, o que fez o governo britânico deixá-los sem água e comida por um longo tempo. Os judeus afirmavam que só desembarcariam na Palestina. Depois de muitas negociações, todos acabaram fugindo para a França ou Itália e, em 1948, já estavam todos na Palestina. A união dos países em redor das Nações Unidas retirou o mandato britânico sobre a Palestina e definiu a partilha desta em dois estados: árabe e judeu. Contudo, os árabes não aceitaram com facilidade a decisão, pois teriam de ceder seu território. Em 29 de novembro de 1947, a Assembleia Geral da ONU aprovou um Plano de Partilha da Palestina, ficando Jerusalém sob uma administração internacional, a fim de controlar possíveis conflitos (SZPILMAN, 2012). O espaço foi dividido: 50% da área com 650 mil judeus-palestinos, e os outros 50% com 1.200 mil árabes-palestinos. Nesta partilha, estavam em jogo as negociações com ambos os Estados sobre seu potencial de petróleo. Ben Gurion, líder em Israel, em 14 de maio de 1948, divulgou um documento declarando a independência do Estado de Israel, apoiado pelos norte-americanos. Segundo Szpilman (2012, p. 265), “imediatamente, Ben Gurion formou um governo provisório e criou a Força de Defesa de Israel. O povo de Israel (e de Moisés) voltou oficialmente à sua antiga pátria, Canaã, na Judeia, 1.800 anos após ter sido expulso de lá”. 28 Importante colocar que Israel foi formado como Estado laico, sendo o judaísmo a religião do povo, e não uma religião oficial do Estado. Portanto, o Estado judeu se refere ao povo judeu, não à sua religião. Como língua oficial foi instituído o hebraico e, pouco depois, o estado já contava com 806.000 habitantes. Como fez o rei Davi, Ben Gurion, em 1949, estabeleceu Jerusalém como a capital de Israel, mas a ONU não a reconhece como tal. Segundo a partilha estabelecida, “a Planície Costeira, a Galileia e todo o Neguev ficaram sob a soberania israelense, a Judeia e a Samaria (Cisjordânia) ficaram sob o domínio da Jordânia, a Faixa de Gaza ficou sob a administração egípcia, e a cidade de Jerusalém ficou dividida, com a Jordânia controlando a parte leste, incluindo a Cidade Velha, e Israel, o setor ocidental” (CONSULADO GERAL DE ISRAEL EM SÃO PAULO, [s.d.], [s.p.]). Israel considera Jerusalém como sua capital desde sempre, uma questão que mescla política e religião, mas que sempre gerou muitas disputas e conflitos até hoje. Exemplificando A pessoa de Jesus comparada a um rei nos céus é comum entre os cristãos. Há cânticos que O exaltam como rei, há passagens bíblicas que assim se referem a Ele. Mas, a figura do monarca é pouco habitual na cultura ocidental. Pensar em um Jesus nos moldes governamentais dos países latino-americanos, por exemplo, é imaginá-lo presidente, ou líder legislativo, alguém que o povo aguarde com extrema ansiedade, como um “salvador da pátria”. Você compreende esse significado? Imagine, então, que o povo de Israel continua aguardando pelo seu messias, aquele que virá e restaurará a soberania de Israel. É difícil crer? Para eles, não. Visualizando tudo o que pudemos aprender nesta seção, a história de Israel é muito complexa. Encontrar nela um período pacífico e tranquilo é tarefa difícil! Religiosos e o próprio povo judeu podem compreender sua trajetória como o caminho que o próprio Deus tem traçado para que a nação volte a ser fiel, uma luta contínua e milenar desse povo. Como você pode perceber, a história de Israel é primordial para entender as relações do homem com a religião e com o cristianismo. Veremos mais pontos impor- tantes na próxima seção. Até lá! 29 Sem medo de errar Depois de conhecer todo o conteúdo desta seção, você é capaz de resolver a proposta da situação-problema? Lembre-se de que Abraão foi o primeiro chamado por Deus para habitar uma nova terra e recebeu a promessa de que seria pai de uma grande nação. Seu filho, Isaque, deu continuidade à sua descendência, tendo seus filhos Esaú e Jacó. Este teve seu nome mudado para Israel, e constituiu uma grande família. Em tempos de fome sobre a Palestina, toda a família de Israel foi para o Egito, onde se multiplicou e acabou como escrava naquele lugar. Moisés, então, foi chamado para libertar o povo e trazê-lo de volta às suas terras. Com o passar do tempo, devido às batalhas contra povos dominadores, o povo pediu um rei sobre Israel. Seu primeiro rei, então, foi Saul. Apesar de um grande militar, ele não conseguiu harmonia em seu reino. Davi o substi- tuiu, depois de sua morte, e tornou-se o grande rei de Israel, estabelecendo Jerusalém como capital. Salomão, seu filho, fez o reinado mais suntuoso da história, construindo o Templo do Senhor, aprimorando a cultura, as relações comerciais e as riquezas no seu reinado. Uma série de conflitos surgiram após o reinado de Salomão, os quais levaram à separação de Israel em dois reinos. Uma sucessão de dinastias, aos poucos, enfraqueceu a nação, que acabou nas mãos de dominadores babilô- nicos e persas. Ainda durante o domínio persa, Neemias e Esdras foram autorizados a retornar a Jerusalém para reconstruir a cidade e o templo. Com essas informações em mãos, recordaremos a situação-problema: participando da feira ecumênica, você, como estudante de Teologia, foi convi- dado a apresentar o judaísmo e, agora, foi solicitado para montar uma tabela com os principais acontecimentos da história judaica, do surgimento de Israel até a libertação do exílio. Sabendo que os tempos de ascensão e queda do povo de Israel contêm diversas histórias e personagens – os patriarcas, os reis, os líderes importantes –, faça a relação deles e as datas aproximadas dos acontecimentos. Assim, sendo elaboramos a tabela que segue. Outros personagens, fatos ou datas, relacionados aos fatos que envolvem o povo de Israel, ou que sejam também relevantes historicamente, podem ser acrescentados. 30 Quadro 1.1 – Personagens, acontecimentos e data aproximada da história de Israel PERSONAGEM ACONTECIMENTO DATA APROXIMADA Abraão, Isaque e Jacó. Estabelecem-se na terra de Canaã. Séc. XVII a.C. Moisés. Sai do Egito com o povo. Séc. XIII a.C. Saul. É ungido rei. 1020 a.C. Davi. Faz de Jerusalém o centro do reino. 1000 a.C. Salomão. Constrói o Templo. 960 a. C. Povo cativo. Exílio babilônico. 586 a.C. Povo cativo. Exílio persa. 538 a. C. Neemias. Reconstrução dos muros. 515 a. C. Esdras. Reconstrução do II Templo. 500 a. C. Fonte: elaborado pela autora. Esses eventos são importantes para o entendimento do complexo histó- rico judaico, ligando eventos mundiais, locais e sobrenaturais (aqueles descritos como obra e intervenção divina). Outras datas e eventos podem ser listados. Para a Teologia, não nos esqueçamos que ela é um estudo da religião, sem desconsiderar a história, a economia e a cultura, as quais que a influen- ciam constantemente. Avançando na prática Por que a Palestina é tão importante para Israel? Você tem um amigo, professor de História, que atua no Ensino Médio de uma escola que está ensinando sobre os conflitos no Oriente Médio. Ele foi questionado por um aluno sobre a oposição entre israelenses e palestinos, a fim de compreender porque aqueles não poderiam habitar outra região para formar seu país, ao invés de tentar expulsar os palestinos já ali alocados. Seu amigo, então, pede que você participe de uma aula, para explicar aos alunos as posições cultural e religiosa que fazem com que israelenses lutem por esta causa. 31 Resoluçãoda situação-problema Para explicar a posição de Israel quanto à sua luta pela consolidação de seu Estado, é necessário explicar o processo cultural e religioso em relação àquela terra. A área da Palestina já foi, no passado, ocupada por Israel. Sua tradição histórica e religiosa diz que, em seu antepassado, havia patriarcas e deus ancestrais, os quais receberam a promessa de Deus que seriam os precursores de uma grande nação e que habitariam aquelas terras, porque Ele havia dado a eles. Depois de muitos conflitos, israelenses foram tomados como escravos por outros impérios e nunca mais conseguiram autonomia sobre seu território, dispersando-se por outros países, inclusive. Ao final do século XIX, um grupo de israelitas (ou judeus) pensou que deveria novamente se concentrar como nação em suas antigas terras, então, começou um movimento de retorno ao território. Desde então, a Palestina tem sido cada vez mais ocupada por judeus, enfrentando conflitos internos para se estabelecerem, em detrimento dos palestinos que ali residem também. Para Israel, a “Terra Prometida” foi-lhes dada pelo próprio Deus, e não é direito de outra organização determinar que as terras não sejam a ele resta- belecidas. É importante compreender que, na história de Israel, o religioso sempre perpassou o político, havendo, por vezes, uma alternância de poder entre Deus e reis, mesmo que, para eles, estes representassem a mão de Deus sobre eles. Além disso, Israel ainda espera pelo messias político, que há de ser aquele que trará paz a Israel e que consolidará seu Estado de poder, restituindo tudo aquilo que lhe fora prometido. O messias, portanto, não é um libertador espiritual, mas um libertador que trará autonomia ao povo. Faça valer a pena 1. No Antigo Testamento, há três figuras principais que estão envolvidas repetidas vezes. Essas figuras são conhecidas como os “patriarcas” do judaísmo, as primeiras a seguir obedientemente a vontade de Deus. O primeiro deles é ____________, cuja fé em Deus é exaltada por toda Bíblia. Seu nome foi mudado para ____________ depois da promessa de que seria pai de uma grande nação. O segundo é ____________, que foi usado para 32 prova de fidelidade de seu pai. O terceiro é ____________, que se tornaria pai de 12 tribos, formando a nação de ____________. Assinale a alternativa que contém as palavras que completam corretamente as lacunas: a. Abraão; Abrão; Ismael; Jacó; Israel. b. Abraão; Abrão; Israel; Jacó; Judá. c. Abrão; Abraão; Isaque; Jacó; Israel. d. Abrão; Absalão; Ismael; Israel; Judá. e. Arão; Abraão; Israel; Esaú; Jacó. 2. Em boa medida, a versão da história das monarquias de Israel que nos transmite a Bíblia (seja, inicialmente do reino único, logo dividido em dois - os reinos de Judá, e o reino de Israel) é bastante crítica em relação à conduta dos monarcas. Elas estão repletas de lutas sangrentas, de luta pelo poder, seja no interior das monarquias ou entre elas, de introdução de cultos pagãos e de maus-tratos ao povo. Embora na narrativa bíblica possam ser identificadas duas grandes correntes - uma associada à realeza e outra à profética -, esta última tende a prevalecer, sem se eliminar a primeira. Assim, a monarquia é vista na Bíblia a partir da visão crítica dos profetas. Estes confrontam e denunciam os desvios dos monarcas e dos poderosos e profetizam o castigo divino às casas reais e ao povo. (SORJ, 2014, p. 60) Assinale a alternativa que contém os nomes dos cinco primeiros reis de Israel: a. Josué; Samuel; Davi; Salomão; Abias. b. Moisés; Arão; Samuel; Davi; Salomão. c. Samuel; Saul; Davi; Salomão; Roboão. d. Saul; Davi; Salomão; Roboão; Abias. e. Jessé; Saul; Salomão; Davi; Israel. 33 3. Samuel transmitiu todas as palavras do Senhor ao povo, que estava lhe pedindo um rei dizendo: ‘O rei que reinará sobre vocês reivindicará como seu direito o seguinte: ele tomará os filhos de vocês para servi-lo em seus carros de guerra e em sua cavalaria, e para correr à frente dos seus carros de guerra. Colocará alguns como comandantes de mil e outros como comandantes de cinquenta. Ele os fará arar as terras dele, fazer a colheita, e fabricar armas de guerra e equipamentos para os seus carros de guerra. Tomará as filhas de vocês para serem perfumistas, cozinheiras e padeiras. Tomará de vocês o melhor das plantações, das vinhas e dos olivais, e o dará aos criados dele. Tomará um décimo dos cereais e da colheita das uvas e o dará a seus oficiais e a seus criados. Também tomará de vocês para seu uso particular os servos e as servas, e o melhor do gado[a] e dos jumentos. E tomará de vocês um décimo dos rebanhos, e vocês mesmos se tornarão escravos dele. Naquele dia, vocês clamarão por causa do rei que vocês mesmos escolheram, e o Senhor não os ouvirá’. Todavia, o povo recusou-se a ouvir Samuel, e disse: ‘Não! Queremos ter um rei. Seremos como todas as outras nações; um rei nos governará, e sairá à nossa frente para combater em nossas batalhas’. (BÍBLIA, 2015, p. 268) Neste texto de 1 Samuel 8:11-21, o profeta exorta o povo que o rei que eles pediam traria mais trabalho do que benefícios ao povo, o que realmente veio a acontecer ao longo da história. Por que não era dos planos de Deus que Israel tivesse reis? a. Todo e qualquer rei, devido ao poder quase ilimitado que possui, acaba tomando decisões incorretas frente aos desafios que encontra, porque todos são homens, com suas imperfeições. Na história de Israel, todos acabaram se perdendo e se distanciando dos desígnios de Deus. b. As nações que tinham reis eram dominadoras e usavam de seu poderio armamentista para subjugar outros povos. Deus não queria que Israel se tornasse dominador, pois sabia de seu coração puro e dedicado somente a coisas boas. https://www.biblegateway.com/passage/?search=1+Samuel+8&version=NVI-PT#fpt-NVI-PT-7386a 34 c. Era dos planos de Deus que Israel tivesse líderes escolhidos democra- ticamente pelo voto do povo, mas um sistema monárquico, no qual o trono é passado de pai para filho ou para o herdeiro mais próximo. d. Israel, como um povo monoteísta e teocrático, poderia escolher um rei, desde que não fosse do seu próprio povo, pois um rei da descen- dência de Israel seria como uma pessoa que se colocasse acima do governo do Senhor. e. Israel foi um povo escolhido para ser monoteísta e liderado direta- mente pelo seu Deus. Nenhuma figura humana, mesmo que desig- nada por Deus, poderia ser melhor governador e rei do que o próprio Senhor. 35 Seção 3 Estruturas políticas: povo de Israel Diálogo aberto Caro aluno! Iniciaremos mais uma seção de estudos sobre o judaísmo, mais direta- mente sobre seu sistema socioeconômico e governamental. Você já parou para pensar que há países com formas de governo muito diferenciadas? No continente americano, temos, predominantemente, o sistema presidencialista e, quanto à economia, a maioria vive sob o sistema capitalista. Na América do Sul, há um departamento francês, a Guiana Francesa, cujo sistema é completamente diferente, pois é sujeito à França e regido localmente por uma Assembleia com um presidente. Brasileiros e argentinos, por exemplo, votam diretamente na escolha de seus presidentes, enquanto os norte-americanos escolhem por voto indireto, de forma representativa. No Reino Unido e em pequenos países da África, por exemplo, o sistema monárquico está presente – alguns parlamentaristas, outros não. Pelo que se conhece sobre a monar- quia inglesa, por exemplo, o trono precisa ser transferido à descendência do rei ou da rainha. A família real, portanto, tem prestígio reconhecido inter- nacionalmente. Como uma pessoa comum, sem descendência proeminente, poderia ascender a um trono? E as terras desse reino, a quem pertence? Aos súditos, à coroa, à família real? Adentraremos ao conteúdo deste estudo verificando a formação dos clãs em Israel, seus sistemas econômicos e de governo; na sequência, veremos mais sobre a ruptura dogoverno monárquico; finalmente, aprenderemos de que se constitui o movimento sionista. Você se recorda da proposta de trabalho desta unidade? O município de Campinas convidou um aluno de Teologia para participar de uma feira ecumênica, na qual diversas atividades serão apresentadas sobre várias religiões. Trata-se de uma exposição, que acontecerá em um ginásio escolar, com trabalhos dos mais variados – palestras, obras de arte, arte interativa, música, jogos, etc. Serão expostos painéis e utensílios característicos de cada religião, na intenção de torná-las conhecidas e promover proximidade com os diversos públicos. Você, aluno convidado, foi chamado para auxiliar na montagem da apresentação da religião judaica. Agora, sabendo que o judaísmo teve sua origem no Oriente Médio, mas passou por divisões de governo e exílios e que se espalhou por todo o mundo, você deverá elaborar mapas expositivos. 36 Como você disporia no mapa a divisão das tribos de Israel? E sobre a divisão entre o Reino do Norte e o Reino do Sul? Qual seria o território de unificação desejado por Israel? Ao elaborar os mapas, reflita: por que, para Israel, é tão importante a terra física? Não pode faltar Já sabemos que o povo de Israel começou com a família de Abraão e seus descendentes. Depois do êxodo do Egito e da entrada na terra de Canaã, cada tribo recebeu sua parte em terras, onde deveria se estabelecer e povoar, e ganhou o nome de um dos filhos de Israel (Jacó), porque o povo foi separado de acordo com sua ascendência. Clãs patriarcais Ao estudar a Bíblia, em geral, não nos atemos a genealogias, mas nos apegamos mais a histórias que possam ser contextualizadas e colocadas em prática. Contudo, ao estudar Teologia, importa também conhecer a relevância das formações familiares na antiga Israel. Pense que, no Brasil, o território é dividido em estados. Na antiga Israel, o território inicial foi dividido por tribos, formadas cada uma por um tronco genealógico, e receberam uma porção de terra. Meyaer (1896 apud KIPPENBERG, 1988, p. 22), sobre o sistema judaico de parentesco, afirma que “as gerações são as unidades superiores das famílias. Em todos os documentos do tempo pós-exílico encontramo-las como principal subdivisão do povo”. No livro de Esdras, capítulo 2, pode-se encontrar uma relação de pós-exílicos que retor- naram a Israel e que só foram considerados por pertencerem à geração das tribos. Já nos versículos 59, 61 e 62 aparecem alguns que não conseguiram comprovar que sua família era israelita (BÍBLIA, 2015). Por que a importância desse registro em Esdras? Em Israel, o princípio de parentesco não é somente uma questão de relação pessoal, familiar, mas de aspecto jurídico. Ser descendente de Israel é ter o direito de moradia e de posse de terra, bem como a ideia de pertencimento a uma tribo específica. Se comparado aos nossos dias, encontrar sua descendência era ter direito à cidadania. Em Israel, o termo para esse grupo entre pais e filhos que transmite a relação genealógica era mispahã, grupo de descendência patrilinear. Uma mispahã é referência para a partilha de terras – sendo que o grupo habita o mesmo espaço –, para as relações de casamento e para a convocação para o exército. Para Murdock (1949), a mispahã pode ser, então, denominada clã. Os direitos de posse são transmitidos por herança, pertencem ao clã, o que torna 37 um parente próximo herdeiro, no caso da falta de filhos diretos. O clã, então, era um conjunto de famílias (cada qual com um pai, que tinha direitos sobre sua esposa e filhos), mas todas com uma relação consanguínea. Ele necessi- tava ser mantido com suas características de consanguinidade, havendo uma relação de responsabilidade de seus membros. Por exemplo, se um homem do clã morre e deixa uma esposa sem filhos, seu irmão mais próximo deveria se casar com ela, para que tivesse filhos descendentes da mesma família. A essa prática chamou-se levirato. No caso de não haver irmãos, um parente mais próximo tinha esse direito e dever. Este fato é próprio da história de Rute, a qual, viúva, volta com a sogra israelita Noemi (também viúva e sem seus dois filhos) para seu clã e é “resgatada” por um parente de seu marido, com quem se casa e tem um filho, que é dedicado a Noemi, como seu herdeiro. Reflita No livro de Juízes, capítulo 14, Sansão declara aos seus pais que deseja se casar com uma filisteia. Seus pais lhe dizem: “Não há, porventura, mulher entre as filhas de teus irmãos, nem entre todo o meu povo, para que tu vás tomar mulher dos filisteus, daqueles incircuncisos?” (BÍBLIA, 2015, p. 247). A lei judaica estabelecia que o povo de Israel deveria casar-se entre si. Mais ainda, entre pessoas de um mesmo clã, da mesma família – primos ou tios, principalmente. Sansão desejava casar-se com uma mulher de um povo inimigo. Esta questão da proibição dos casamentos “mistos” seria por causa do perigo em ter de compartilhar a herança da terra com outros povos? Seria pelo temor em ver uma descendência sendo extinta por casamentos com estrangeiros? Seria por causa da cultura politeísta de outros povos, que poderia contaminar a cultura de Israel? Você tem conhecimento de grupos religiosos atuais que são desfavoráveis ao casamento “misto” religioso? Nos clãs, o sistema patrilinear era muito importante, razão pela qual havia regras para nortear as relações de casamento. Um filho deveria se casar com uma prima, de preferência filha de um tio paterno, promovendo a dupla descendência de uma mesma família ao filho nascido do casamento. Por esse fato, entendemos por que havia uma predileção pelo nascimento de meninos, pois as filhas de um clã eram apenas cooperadoras na transmissão do paren- tesco. Assim, quanto mais próxima a relação (pai, filho, neto, primo), melhor se mantém a estrutura do clã, mais se fortalece e melhor se garante a posse das terras. Veja o box explicativo: 38 Sistema matrilinear O tipo de organização familiar no qual somente a linhagem ou descendência da mãe é considerada. O poder é exercido pela mulher e, especialmente, pelas mães de uma comunidade, em uma família que tem como base a mulher, mãe, filha. Por ocasião do casamento, é o homem que deixa sua casa, abandona seus laços familiares e vai morar com a família da esposa. Sistema patrilinear Organização familiar na qual somente a linhagem masculina é considerada. A descendência é contada apenas pela linha paterna, e geralmente envolve herança de propriedades, nome ou título de nobreza. Organização social e política dos hebreus Ainda pensando no formato social firmado em clãs, havia diferenças entre famílias: algumas tinham certos privilégios em relação a outras do mesmo clã, podiam ser mais ou menos autônomas e alguns chefes de família tinham mais relevância devido à sua atividade econômica. A família, portanto, era a unidade econômica fundamental, um tipo de economia doméstica fechada, ou seja, tudo o que produzia era para consumo interno. Abrindo um parêntese, há estudiosos que discordam um pouco que esse tenha sido um tipo econômico exclusivo, supondo que antigas socie- dades já haviam desenvolvido um sistema de troca (KIPPENBERG, 1988). Outros, porém, como Sahlins e Godolier (apud KIPPENBERG, 1988), etnólogos, defenderam que as sociedades judaicas tinham potencial para produzir excedentes, mas não o faziam, a não ser a partir da instalação da monarquia, quando as famílias passaram a pagar tributos para a coroa e a manutenção do exército. Quanto à produção agrícola, as terras que se encontravam ao longo do Rio Jordão eram mais produtivas, pois um sistema de irrigação era possível. Já nas regiões montanhosas, a produção era menor e dependia das chuvas. Em terras irrigadas, plantavam-se cereais, e nas demais desenvolvia-se o cultivo das oliveiras, parreiras e figueiras, plantas de raízes mais profundas. Os hebreus também eram bons produtores de animais (cabras, ovelhas, bois e jumentos), dos quais se utilizavamlã e peles, bem como a carne e o leite. Quanto à organização política, antes da monarquia, havia um sentimento nacional, expresso, principalmente, pelo culto religioso comum, ou seja, pelo monoteísmo, mas não havia um controle sobre todos os clãs ou famílias. Os grupos ou tribos prestavam ajuda uns aos outros em épocas de perigo de ameaça de invasores. Observe, na Figura 1.2, a divisão das tribos. 39 Figura 1.2 | Mapa da divisão das tribos de Israel antigo Fonte: Wikimedia Commons. A Figura 1.2 mostra o mapa antigo de Israel, dividido em tribos. O terri- tório atual do Estado de Israel é menor, equivalendo à perda dos territórios que pertenciam às tribos de Manassés, Gade e Ruben, ao leste. Se considerarmos que havia um poder político, podemos dizer que estava nas mãos dos anciãos, os pais das famílias. Cada cidade ou vila era uma unidade independente. Uma vez ou outra, uma figura tornava-se notável, em virtude de algum feito militar, o que lhe dava o direito de julgar seu povo por um tempo. Assim foram os juízes, que aconselhavam o povo, julgando 40 casos necessários e organizando os homens para as batalhas. Havia, porém, em determinadas épocas, conflitos entre as tribos. A fim de controlar esses conflitos, Abimeleque, filho de Gideão, o juiz, tentou estabelecer um governo central em Sechem, mas o centro sentimental de Israel estava no lugar onde ficava a Arca da Aliança, em Silo. Por cerca de três séculos, assim viveu e conviveu o povo de Israel, até que se instaurou a monarquia e, depois do reinado de Salomão, começaram as campanhas de separação do reino. Os reinos de Israel e Judá: o cisma político-religioso Salomão, filho de Davi, teve um reinado suntuoso. O maior de seus feitos foi construir, no Monte Zion (em Jerusalém), um grande santuário para abrigar a Arca da Aliança que Davi havia trazido de Silo. A partir daí as grandes festas judaicas passaram a ser comemoradas em Jerusalém, tornan- do-se esta a capital religiosa e política de Israel. Para aumentar ainda mais a importância da cidade, começaram a ser proibidos os sacrifícios de animais em outros lugares, forçando os hebreus a peregrinarem até Jerusalém para ofertarem. Todo esse movimento levou a Judá muitos impostos, recolhidos dos povos de outras tribos, tornando-a próspera economicamente, além de ser a detentora da dinastia real. Esses fatos descontentavam as tribos do Norte, as quais se viam obrigadas a um reinado que não se ocupava de todo o território nacional, mas que mantinha seus interesses na região ao sul, onde se encontrava. Quando Salomão morre e seu filho inexperiente, Reoboão, assume o trono, as tribos solicitaram uma revisão na cobrança dos impostos, que foi rejeitada. Isto levou a uma rebelião geral, e as tribos do Norte aclamaram Jeroboão como rei, que era líder de uma antiga rebelião contra Salomão. Assim, aqueles da tribo de Judá, de Benjamim e alguns remanescentes de Simeão compuseram o Reino do Sul. Os demais, já também enfraquecidos devido a diversas batalhas, compuseram o Reino do Norte. Por dois séculos, a história de Israel ficou assim dividida: um só povo, sob a guarda de um único Deus, o mesmo patriarca, mas dois poderes cercados de insatisfações e disputas. Conheceremos um pouco mais sobre cada um deles. 1. O Reino de Israel (Reino de Samaria). Quando da separação dos reinos, Judá já se encontrava em certa estabili- dade, pois, de certa forma, já se acostumara com o reinado de Davi e Salomão naquela região. Diferentemente, o Reino de Israel passava por turbulências. As tribos não se entendiam, vivendo em constantes disputas pelo trono 41 – qualquer chefe militar mais proeminente que surgisse era motivo de ameaça ao trono. Ao todo, passaram pelo trono de Israel, em 200 anos, 19 reis – alguns tiveram reinados curtos, de alguns meses, e outros, de alguns anos. A metade deles sofreu morte violenta, provocada por seus suces- sores. Somente duas dinastias duraram mais que duas gerações sem serem usurpadas (ROTH, 1962). O primeiro rei, Jeroboão, percebendo a tática de Judá em forçar o povo a cumprir seus atos religiosos em Jerusalém, construiu, em Dan e em Betel, santuários que passaram a desviar os peregrinos. Outra estratégia do rei foi criar um calendário religioso paralelo, com datas diferentes de Jerusalém para as mesmas festas judaicas. Porém, ele erigiu estátuas de ouro para compor os templos, o que mudou a visão monoteísta de parte da população. No reinado de Omri, a capital foi deslocada para Samaria. Omri estabe- leceu aliança com os fenícios, promovendo o casamento de seu filho Acabe com a princesa Jezabel. Esta trouxe ideias absolutistas para o governo e incluiu ofertas de sacrifícios humanos ao deus Baal. Depois de muito horror e injustiça, a dinastia de Omri caiu aos pés de Jeú, que promoveu uma verda- deira revolução política e religiosa. Ao longo dos reinados, os assírios conseguiram penetrar no território do Norte diversas vezes. Por fim, Samaria foi tomada e toda a nobreza foi levada para lugares distantes. Com a contínua invasão de Samaria, outros colonos de terras distantes vieram e ocuparam a região, casando-se com aqueles que permaneceram nas terras e absorvendo parcialmente suas tradições. A esse povo deu-se o nome de samaritanos – aqueles que, em relação aos da Judeia, eram próximos no parentesco de sangue, mas com interesses políticos e etnia diferentes. Assim, as “Dez Tribos Perdidas” eram aquelas que se fundiram às pessoas que ocuparam os territórios, restando apenas o Reino de Judá com as características originais da nacionalidade judaica (ROTH, 1962). 42 Figura 1.3 | Os dois reinos: Israel e Judá Fonte: Shutterstock . 2. O Reino de Judá Judá não sofreu conflitos internos, tal como o Reino de Israel. Devido ao reinado de Davi ter sido marcante para o povo, sempre houve respeito à sua dinastia, como aquela ungida pelo Senhor. Contudo, territorialmente e em número de habitantes Judá era muito menor que Israel (cerca de um quinto), o que o colocava em desvantagem, principalmente militar. Mas foi em Judá que se firmou a tradição judaica, o conhecimento por meio das literaturas da época, elementos que a colocaram como herança da humanidade. 43 De início, Judá se opôs ao reino separatista do Norte, mas não obteve êxito. Por vezes, precisou oferecer as joias do Templo e do palácio para aqueles que tentavam tomar suas cidades. Em uma das batalhas, Jeorão, descendente de Davi, foi morto, e a rainha-mãe subiu ao trono, porém com os mesmos modelos de Jezabel no Norte. Depois de uma revolta contra a rainha e sua morte, Joás, com apenas 7 anos, foi colocado no trono. Ele, então, com um longo reinado, restaurou a religiosidade em Judá e recuperou os tesouros perdidos do Templo. Infelizmente, Judá, quando necessitava de proteção, contava com o reino de Samaria, mas os conflitos foram ficando cada vez mais intensos, até que, depois do fim da dinastia de Jeú, Judá não mais aceitou a união de acordos entre Samaria com os Assírios. Acaz tomou a cidade de Jerusalém e colocou no Templo imagens de outros deuses pagãos, contami- nando o espaço que era tão sagrado para os judeus. Com o fim do Reino do Norte, Judá também se viu sozinha entre a Assíria e o Egito. Influenciada por outros povos, sofreu uma mistura cultural e religiosa pagã. Novamente, subiu ao trono Josias, que procurou restaurar o patriotismo judaico, limpando o Templo de tudo aquilo que não lhe pertencia. Em uma dessas limpezas, os rolos do código mosaico foram encontrados e lidos ao rei, que fez com que todo o povo também ouvisse de forma solene. A tradição estava esquecida há tempos, as gerações passaram, e somente a atitude de Josias fez com que muitos se voltassem às suas tradições monoteístas. Depois de Josias, seu filho Jeoacaz subiu ao trono, mas foi derrubado e levado cativo ao Egito. Seu irmão, Jeoaquim, corrompeu-se a outros povos dominadores, sendo tomado, posteriormente, pelo Império Babilônico. Grande
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