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Esteatose

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Gabriella R. de Oliveira
Esteatose
CONCEITO:
É o acúmulo de gorduras neutras (mono, di ou triglicerídeos) no citoplasma de células que, normalmente, não as
armazenam. A lesão é comum no fígado, no epitélio tubular renal e no miocárdio, mas pode ser encontrada também em
músculos esqueléticos e no pâncreas.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:
· A esteatose pode ser provocada por agressões muito diversas. A lesão aparece todas as vezes que um agente interfere no metabolismo de ácidos graxos da célula, aumentando sua captação ou síntese ou dificultando sua utilização, seu transporte ou sua excreção. 
· Esteatose é causada por agentes tóxicos, hipóxia, alterações na dieta e distúrbios metabólicos. A lesão é mais bem conhecida no fígado. Em condições normais, os hepatócitos retiram da circulação ácidos graxos e triglicerídeos provenientes da absorção intestinal e da lipólise no tecido adiposo. Nas células hepáticas, ácidos graxos são utilizados para: (1) produção de colesterol e seus ésteres; (2) síntese de lipídeos complexos (fosfolipídeos e esfingolipídeos) ou de glicerídeos (mono, di ou triglicerídeos); (3) geração de energia por meio da β-oxidação até acetil-CoA e da formação de corpos cetônicos. Glicerídeos sintetizados no REL são transportados ao complexo de Golgi, no qual são conjugados com apoproteínas para formar lipoproteínas. Estas, no interior de vesículas, são excretadas no polo sinusoidal da célula para o espaço de Disse. A excreção depende de transporte intracitoplasmático de vesículas do qual participam microtúbulos e microfilamentos. 
· Os agentes lesivos causam esteatose hepática por interferirem em diferentes passos do metabolismo lipídico, como: (1) maior aporte de ácidos graxos por ingestão excessiva ou lipólise aumentada; (2) síntese de ácidos graxos a partir do excesso de acetil-CoA que não encontra condições de rápida oxidação no ciclo de Krebs; (3) redução na utilização de triglicerídeos ou de ácidos graxos para a síntese de lipídeos complexos, por carência de fatores nitrogenados e de ATP; (4) menor formação de lipoproteínas por deficiência na síntese de apoproteínas; (5) distúrbios no deslocamento de vesículas de lipoproteínas por alterações funcionais no citoesqueleto. 
· Ingestão abusiva de etanol e distúrbios do metabolismo lipídico associados à obesidade são as causas mais comuns de esteatose hepática; desnutrição proteico-energética e substâncias hepatotóxicas também podem produzi-la. O etanol é a causa mais conhecida e estudada de esteatose hepática. No fígado, o álcool é metabolizado por três vias: (1) sistema microssomal (MEOS), envolvendo o citocromo P-450, sobretudo CYP2E1 – ingestão alcoólica induz maior atividade do CYP2E1, o que explica a tolerância ao etanol vista em alcoolistas crônicos; (2) via da álcooldesidrogenase (ADH), no citosol, em que um íon hidrogênio é transferido para o NAD e gera NADH; (3) via da catalase, em peroxissomos. Nessas três vias, o produto final é o acetaldeído, que, por ação da aldeído-desidrogenase (ALDH) em mitocôndrias, é convertido a ácido acético e acetil-CoA.
Captação e destino de ácidos graxos em hepatócitos: Os ácidos graxos circulantes penetram nos hepatócitos e são utilizados para a produção de energia (β-oxidação) nas mitocôndrias e para a síntese de colesterol, triglicerídeos e fosfolipídeos no retículo endoplasmático liso. No complexo de Golgi, estes lipídeos complexos associam-se a proteínas e formam lipoproteínas. Contidas em vesículas, as lipoproteínas são transportadas no citoplasma por microtúbulos (MT) e microfilamentos (MF) e excretadas nos sinusoides.
· No etilismo, a esteatose resulta de vários fatores: (1) menor disponibilidade de NAD (utilizado na reação da ADH) –como o NAD é necessário para a oxidação de lipídeos, sua redução contribui para o acúmulo de gorduras nos hepatócitos; (2) maior disponibilidade de acetil-CoA – excesso de acetil-CoA induz síntese de ácidos graxos, que, somados aos provenientes da circulação, originam triglicerídeos que se acumulam nas células; (3) o acúmulo de triglicerídeos é favorecido também porque o transporte das vesículas de lipoproteínas está comprometido devido à ação do acetaldeído e de radicais livres gerados do metabolismo do etanol no retículo endoplasmático liso sobre microtúbulos e microfilamentos; (4) a esteatose induzida pelo etanol pode ser agravada por desnutrição (redução na disponibilidade de proteínas para a síntese de lipoproteínas) que, frequentemente, acompanha o alcoolismo crônico, embora a lesão possa surgir independentemente de fatores nutricionais.
· Nos estados de hipóxia (anemia, insuficiência cardíaca ou respiratória etc.), há menor disponibilidade de O2 no ciclo de Krebs e, portanto, redução na síntese de ATP. Nesses casos, a esteatose resulta, em boa parte, do aumento na síntese de ácidos graxos a partir do excesso de acetil-CoA, que se acumula nas células, porque sua oxidação no ciclo de Krebs está diminuída. Ao lado disso, os ácidos graxos encontram grande quantidade de α-glicerofosfato (originado de glicólise acelerada por redução na síntese de ATP) e formam triglicerídeos que se acumulam no citoplasma. A redução de ATP também dificulta a síntese de lipídeos complexos e diminui a utilização de ácidos graxos e triglicerídeos, favorecendo o acúmulo desses últimos.
· Na desnutrição proteico-energética, dois fatores são importantes: (1) a carência de proteínas leva à deficiência de fatores lipotrópicos indispensáveis à produção de fosfolipídeos e à diminuição na síntese das apoproteínas, reduzindo a formação de lipoproteínas e a excreção de triglicerídeos; (2) a ingestão calórica deficiente causa mobilização de lipídeos do tecido adiposo, aumentando o aporte de ácidos graxos para o fígado. Em crianças com desnutrição proteica grave, pode haver esteatose em outros órgãos, especialmente coração, rins, músculos esqueléticos e pâncreas. Ao lado de desnutrição havia, também, ingestão de grande quantidade de aflatoxinas com os alimentos, o que poderia representar um cofator na patogênese da esteatose visceral.
· Agentes tóxicos (p. ex., CCl4) lesam o retículo endoplasmático granuloso e reduzem a síntese de proteínas, podendo levar à esteatose por afetar a síntese de lipoproteínas. Embora a síntese proteica deficiente possa resultar em esteatose, isso não é regra geral. Em adultos, desnutrição proteica não induz esteatose semelhante à que se observa na infância, além de inibidores da síntese proteica nem sempre induzirem esteatose hepática. Por outro lado, inibidores da síntese proteica (p. ex., ácido orótico e puromicina) podem provocar esteatose mediante bloqueio na utilização de triglicerídeos sem que a síntese proteica tenha sido reduzida. É possível, portanto, que a esteatose por carência de proteínas (desnutrição) ou por síntese deficiente de proteínas (agentes tóxicos) tenha mecanismos mais complexos envolvendo processos de conjugação de lipídeos com apoproteínas e sua posterior excreção.
· A esteatose é também muito comum na obesidade, que representa hoje um dos mais importantes problemas de saúde pública: em todos os continentes, populações desenvolvidas, em desenvolvimento ou subdesenvolvidas mostram aumento progressivo no número de pessoas com peso acima do aceito como normal para a idade, com frequência associado a aumento do risco para doenças cardiovasculares e diabetes melitus do tipo 2. Essa verdadeira epidemia de obesidade deve-se, sobretudo, à associação de ingestão excessiva de energia (carboidratos e lipídeos) e sedentarismo. 
· Frente à ingestão excessiva de energia, o organismo adapta-se mediante aumento do gasto energético e armazenamento de gordura no tecido adiposo, além de diminuição do apetite. No entanto, essa adaptação é limitada e depende do padrão genético do indivíduo, razão pela qual uma dieta rica em calorias leva a obesidade em frequência e graus variáveis em diferentes pessoas.
Mecanismos patogenéticos da esteatose hepática no alcoolismo: No etilismo, há aumento de radicais livres, acetaldeído e acetil-CoA e redução de NAD. Radicaislivres causam lesão mitocondrial, reduzindo a β-oxidação de gorduras. Radicais livres e acetaldeído interferem no transporte de lipoproteínas no citosol, por afetarem microtúbulos e microfilamentos. O excesso de acetil-CoA induz a síntese de ácidos graxos, que se acumulam na célula. NAD é necessário para a oxidação de lipídeos; na sua carência, ocorre acúmulo de lipídeos. Se há desnutrição concomitante ao alcoolismo, a menor disponibilidade de proteínas diminui a formação de lipoproteínas, prejudicando a eliminação de gorduras dos hepatócitos.
· A obesidade associa-se comumente a certas alterações metabólicas que caracterizam uma nova entidade clínica, conhecida como síndrome metabólica, cujos componentes principais são: (1) obesidade central (aumento da circunferência abdominal ou da relação cintura-quadril); (2) dislipidemia (aumento de triglicerídeos e redução de HDL); (3) intolerância à glicose, geralmente acompanhada de resistência à insulina; (4) hipertensão arterial sistêmica; (5) esteatose visceral; (6) aumento do risco para doença cardiovascular aterosclerótica e diabetes melitus do tipo 2. Na síndrome metabólica, ocorre esteatose visceral no fígado, nas ilhotas de Langerhans, nos músculos esqueléticos e no miocárdio. No fígado, o excesso de ácidos graxos induz aumento da oxidação de ácidos graxos no REL e em peroxissomos. Com isso, ocorre aumento de radicais livres, que alteram proteínas do citoesqueleto e dificultam o transporte de lipoproteínas, favorecendo o acúmulo de triglicerídeos no citosol, os quais estão com síntese aumentada. 
· A esteatose pode evoluir para a esteato-hepatite, que, além do acúmulo de gorduras nos hepatócitos, apresenta corpúsculos de Mallory-Denk, degeneração hidrópica e fibrose, podendo evoluir para cirrose hepática. A inflamação é secundária à necrose focal de hepatócitos, também por ação de radicais livres. A fibrose, do tipo pericelular, resulta da ativação de células estreladas por citocinas liberadas nos focos de inflamação e por aldeídos originados da peroxidação lipídica. 
· Além de necrose focal, há apoptose de hepatócitos induzida por aumento da síntese de ceramida. Nos músculos esqueléticos e cardíaco, admite-se que o excesso de ácidos graxos ativa genes cujos produtos aumentam a lipogênese e a síntese de triglicerídeos, que se depositam nas miocélulas. A fraqueza muscular e a maior predisposição a falência miocárdica em pacientes com diabetes do tipo 2 estão relacionadas, em parte, com a esteatose de miocélulas e com a lipotoxicidade, que favorece apoptose. 
· As células beta do pâncreas acumulam ácidos graxos e aumentam a síntese de triglicerídeos. Com isso, surgem esteatose e aumento de ceramida, esta indutora de apoptose. A esteatose e a facilitação da apoptose parecem ser fatores importantes na insuficiência dessas células, contribuindo para o diabetes melitus do tipo 2. 
· Fatores genéticos são também importantes, já que o risco de diabetes é maior se existe parente próximo que manifestou a doença. Polimorfismos em genes que controlam o metabolismo lipídico e a função mitocondrial nas células beta parecem ser importantes no desenvolvimento da lipotoxicidade e suas consequências nessas células. 
· Algumas formas de esteatose hepática têm patogênese obscura. É o que ocorre com a esteatose microvesicular aguda da gravidez e a que aparece na síndrome de Reye, nas quais parece haver defeito mitocondrial na oxidação de lipídeos. A tetraciclina causa esteatose microvesicular em hepatócitos, possivelmente por alteração na excreção de vesículas de lipoproteínas.
EVOLUÇÃO | CONSEQUÊNCIAS:
Apesar de ser uma lesão reversível, em agressões mais graves a esteatose pode evoluir para morte celular. O excesso de ácidos graxos pode gerar ceramida, que é potente indutor de apoptose. No fígado, os hepatócitos repletos de gordura podem se romper e formar lagos de gordura (cistos gordurosos), podendo ocorrer reação inflamatória com células gigantes. Pode haver, ainda, embolia gordurosa a partir da ruptura de cistos gordurosos na circulação, o que é facilitado por traumatismos. Em alguns casos de esteatose difusa e grave (p. ex., esteatose aguda da gravidez), pode haver manifestações de insuficiência hepática. No etilismo crônico, a esteatose hepática muitas vezes se acompanha de fibrose pericelular, especialmente centrolobular, que pode evoluir para cirrose. Fibrose e cirrose hepáticas podem surgir, também, na evolução de esteato-hepatite não alcoólica, indicando que a esteatose pode estar relacionada diretamente com mecanismos fibrogênicos, possivelmente por meio de alterações no metabolismo lipídico dos hepatócitos. No coração, a esteatose difusa pode agravar a insuficiência funcional do órgão. Como a lesão é reversível, em etilistas crônicos ela se reduz ou desaparece em poucos dias após abstinência.
ASPECTOS MORFOLÓGICOS:
Os órgãos com esteatose apresentam aspecto morfológico variável. O fígado aumenta de volume e peso (pode atingir 3 kg) e apresenta consistência diminuída, bordas arredondadas e coloração amarelada. No coração, a esteatose pode ser difusa (na miocardite diftérica), ficando o órgão pálido e com consistência diminuída; em outros casos (hipóxia prolongada), a esteatose aparece em faixas amareladas visíveis através do endocárdio, criando um aspecto conhecido como coração tigroide. Nos rins, há aumento de volume e peso, tomando o órgão coloração amarelada. Ao ML, a esteatose é muito característica. Os triglicerídeos acumulam-se em pequenas vesículas ou glóbulos revestidos por membrana (lipossomos). Na fase inicial, são encontrados vacúolos de tamanhos variados com tendência a fundir e a formar glóbulos cada vez maiores. Na sua forma clássica, os hepatócitos apresentam um grande vacúolo de gordura no citoplasma, o qual desloca o núcleo para a periferia da célula e lhe confere aspecto de adipócito (esteatose macrovesicular). Em certas condições, a esteatose hepática tem aspecto microvesicular: a gordura acumula-se em pequenas gotículas que se distribuem, geralmente, na periferia da célula, permanecendo o núcleo em posição central. É o que ocorre na esteatose aguda da gravidez, na síndrome de Reye, na intoxicação pela tetraciclina e em algumas formas de hepatite fulminante em crianças. Nessas últimas, os hepatócitos ficam muito tumefeitos, assumindo aspecto moruliforme, devido a numerosos glóbulos de gordura na periferia do citoplasma. No coração, os triglicerídeos depositam-se em pequenos glóbulos dispostos ao longo das miocélulas. Nos rins, os lipídeos aparecem em pequenos glóbulos nas células tubulares, os quais podem coalescer e formar vesículas maiores, embora raramente produzam grande deformidade das células. Como os triglicerídeos se dissolvem no álcool e no xilol usados nas colorações de rotina, o que se observa ao ML são espaços vazios que podem ser confundidos com vacúolos contendo água (como na degeneração hidrópica) ou outras substâncias solúveis nesses solventes. Para se ter certeza do conteúdo lipídico dos vacúolos, são feitas colorações especiais em cortes de material fixado ou não, obtidos após congelação. Os corantes mais utilizados são o Sudam vermelho (Sudam III) ou negro (Sudam IV) e o óleo vermelho O (oil red O).
Esteatose de hepatócitos. A seta preta mostra numerosos pequenos vacúolos citoplasmáticos de gordura (esteatose microvesicular). A seta azul indica grande vacúolo citoplasmático (esteatose macrovesicular).

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