Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
ESTUDO DO MOVIMENTO I: ANATOMIA E FISIOLOGIA André Osvaldo Furtado da Silva Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Identificar as principais estruturas anatômicas do sistema nervoso periférico. � Descrever as principais funções e diferenças entre os nervos sensitivos, motores e mistos. � Analisar a organização dos sentidos gerais e especiais. Introdução O sistema nervoso periférico (SNP) é composto de nervos (12 pares crania- nos e 31 pares espinais), gânglios, plexos entéricos e receptores sensoriais, responsáveis pela condução de informações entre órgãos, glândulas e músculos com o sistema nervoso central (SNC). Ele ainda estimula e realiza as ações na periferia, que são os órgãos externos ao corpo humano. Neste capítulo, você estudará as principais funções do SNP, sua im- portância para as ações e reações do indivíduo no dia a dia, as principais funções e diferenças entre os nervos, bem como a organização dos sentidos gerais e especiais. Estruturas anatômicas do sistema nervoso periférico O sistema nervoso é subdividido em SNC e SNP, sendo este formado por nervos, gânglios, plexos entéricos e receptores sensoriais que têm a função de fazer a ligação do SNC com o organismo humano, realizando-a por meio da transmissão de impulsos nervosos. Já os nervos são estruturas que possuem em seu interior milhares de axônios de neurônios, associados a um tecido conectivo e aos vasos sanguíneos, por meio deles, ocorre a conexão entre o SNC e os receptores sensoriais, músculos e glândulas. Todos os nervos do corpo provêm de pares que se originam dire- tamente no encéfalo, como os cranianos, ou daqueles originados da medula espinal, chamados de nervos espinais. Um gânglio, por sua vez, é uma pequena massa de tecido nervoso, formada basicamente por uma coleção de corpos celulares dos neurônios localizados fora do encéfalo e da medula. A união de diversos nervos e gânglios formam os plexos, que são extensas redes de neurônios e seus axônios situadas fora do SNC. Os plexos podem ser motores e sensoriais, responsáveis pela inervação da musculatura lisa, como no caso do plexo lombossacral, ou relacionados às funções autônomas, como os plexos entéricos, que se localizam nas paredes dos órgãos do trato gastrintestinal. O termo plexo significa “rede” e descreve a organização de interconexões nervosas, que se tratam das ramificações de diferentes nervos espinais unindo-se umas às outras para formar um plexo. Os cinco principais plexos derivados das ramificações ventais são o cervical, originado entre C1 e C4; o braquial, entre C5 e T1; o lombar, entre L1 e L4; o sacral, entre L4 e S4; e o coccígeo, formado pelo nervo oriundo de S5 e associado ao nervo coccígeo. Essas estruturas são a base do SNP, que se divide em funções sensoriais e motoras. As sensoriais atuam devido aos neurônios aferentes e identificam diversos estímulos, sejam dos sentidos somáticos, como tato, pressão, tempe- ratura e dor, ou dos sentidos especiais, como olfato, gustação, visão e audição (VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016). Já as motoras se classificam em sistema nervoso somático, que trata de ações voluntárias, por exemplo, mover um dedo da mão; e sistema nervoso autônomo, responsável por movimentos involuntários, separando-se ainda em divisão simpática e parassimpática (MARIEB; HOEHN, 2009). Como você viu anteriormente, os nervos do SNP se originam no SNC, podendo provir diretamente do encéfalo e atuar como componentes das divisões sensorial e motora, sobre os quais se discutirá a seguir. Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico2 Nervos cranianos Os nervos cranianos são responsáveis por realizar a conexão dos órgãos dos sentidos e da musculatura com o encéfalo, sendo constituídos de 12 pares numerados no sentido craniocaudal, em que exercem uma função sensitiva e motora, bem como possuem sua numeração em algarismos romanos. Cada par desse nervo tem função sensitiva ou motora ou sensitivas e motoras ao mesmo tempo, sendo que somente os dois primeiros, o nervo óptico e o olfatório, não apresentam a relação anatômica com o tronco encefálico. O restante deles tem origem ou terminações e núcleos do mesencéfalo, da ponte ou do bulbo. O primeiro par de nervos (I) inclui os nervos olfativos, que se originam na região olfatória de cada fossa nasal, atravessam o osso etmoide e chegam ao bulbo olfativo, com função sensitiva, cuja responsabilidade é realizar a condução dos impulsos olfativos. O segundo par de nervos (II) se trata dos nervos ópticos, que se compõem de um grosso feixe de fibras e têm função sensitiva, iniciando na região da retina e penetrando no crânio pelo canal óptico. Já o terceiro par de nervos (III) são os nervos oculomotores, responsáveis por fazer a movimentação dos olhos e possuem exclusivamente a função motora, sendo considerados um nervo motor. O quarto par de nervos (IV) envolve os nervos trocleares, envolvidos com os movimentos dos olhos e a visão, portanto, estão relacionados às funções sensitiva e motora, sendo chamados de mistos. O quinto par de nervos (V) são os nervos trigêmeos, considerados mistos por fazerem as funções motora e sensitiva. Quanto à motora, eles auxiliam na mastigação; já na porção sensitiva, têm três ramos: oftálmico, maxilar e mandibular, responsáveis pela ação da face, de uma parcela do couro cabeludo e das regiões mais internas do crânio humano. O sexto par de nervos (VI) inclui os nervos abducentes, que cuidam dos nervos do músculo reto lateral do olho. Já o sétimo par de nervos (VII) são os nervos faciais, considerados mistos e apresentam uma função motora e outra sensorial. Quanto à porção motora, ele é representado pelo nervo facial e está relacionado às expressões faciais, com a secreção de saliva e a produção das lágrimas, sendo responsável por proporcionar a inervação motora para todos os músculos cutâneos da cabeça e do pescoço. Já o nervo facial na parte sensorial se chama nervo intermédio e atua na sensibilidade muscular e gustativa. O oitavo par de nervos (VIII) são os nervos vestibulococlear, considerados sensitivos e que possuem uma parte vestibular e outra coclear. Na porção co- clear, estão ligados à audição e, na vestibular, se associam ao equilíbrio. O nono par de nervos (IX) inclui os nervos glossofaríngeos, que têm funções sensitiva e motora, sendo responsáveis pela sensibilidade de uma parte da língua, da 3Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico faringe e da tuba auditiva. Quanto à porção motora, estão relacionados aos músculos da faringe. O décimo par de nervos (X) envolve os nervos vagos, cuja função remete às ações motoras e sensitivas, responsabilizando-se pela inervação dos órgãos que estão localizados abaixo do pescoço. Eles ainda estão relacionados à manutenção das funções vitais. Já o décimo primeiro par de nervos (XI) são os nervos acessórios, essen- cialmente motores e responsáveis pela deglutição e movimentação da cabeça e do pescoço. Por fim, o décimo segundo par de nervos (XII) se trata de nervos hipoglossos, exclusivamente motores, que emergem do crânio por meio do canal hipoglosso e se dirigem aos músculos intrínsecos e extrínsecos da língua, responsabilizando-se pela sua movimentação. Dessa forma, pode-se observar a atuação tanto sensorial como motora dos nervos cranianos, mas ainda há outros que compõem o SNP e se originam ao longo da medula espinal, conhecidos como nervos espinais. Nervos espinais Os nervos espinais conectam o SNC aos receptores sensoriais, músculos e às glândulas em todas as partes do corpo, se originando diretamente na medula espinal por meio de 31 pares, que também são nomeados e numeradores de acordo com a região e o nível da coluna vertebral dos quais emergem. Dos 31 pares, oito têm origem na coluna cervical; 12 na coluna torácica; cinco na coluna lombar; cinco na coluna sacral; e um nas vértebrascoccígeas. Com exceção do primeiro par de nervos cranianos, que emerge acima da vértebra Atlas (C1), todos os outros nervos espinais deixam a coluna e passam pelos forames intervertebrais. Tradicionalmente, um nervo espinal tem duas conexões com a medula espinal: a raiz posterior ou dorsal, que contém axônios sensoriais, uma ter- minação aferente responsável por trazer as informações da periferia; e a raiz anterior ou frontal, com axônios motores, uma terminação eferente que leva os estímulos originados no SNC aos tecidos alvo. Portanto, os nervos espinais são classificados como mistos. Como os nervos espinais atuam nas duas grandes divisões do SNP, a sensorial e a motora, você verá com mais detalhes a divisão sensorial a seguir. Divisão sensorial do sistema nervoso periférico A divisão sensorial do SNP é responsável pelas sensações, que se tratam de estímulos feitos sobre receptores sensoriais, distribuídos na periferia do Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico4 corpo. Elas são transmitidas por neurônios aferentes até o SNC, no qual se conscientizam em forma de percepção, que faz a atribuição de significado a elas e determina como você responde aos estímulos. Por exemplo, uma pe- drinha que esteja incomodando dentro do sapato causa a sensação de grande pressão, mas a percepção é a consciência do desconforto e, devido a essa identificação, sua resposta será parar, tirar o sapato e retirar a pedrinha que lhe provoca o incômodo. Você sabia que as mesmas sensações podem causar diferentes percepções de acordo com o contexto e o ambiente em que está inserido? Imagine uma situação em que você esteja assistindo a um filme, aconchegado em um sofá confortável e na companhia de alguém de que gosta, mas, de repente, tem a sensação de algo tocando sua nuca. Devido à situação em questão, é provável que a sensação captada pelo SNP seja identificada pelo SNC como uma carícia da pessoa que o acompanha, assim, sua resposta será de relaxamento e aceitação de tal gesto. Agora, suponha que você esteja fazendo uma trilha ecológica, no meio de uma mata repleta de pequenos insetos, como formigas e aranhas, o que o deixa apreensivo, pois possui a tendência natural a ter medo de certos animais. Nesse caso e ambiente, se perceber a sensação de algo tocando sua nuca, certamente atribuirá outra percepção a ela, como se fosse algum inseto, tornando sua resposta completamente diferente da situação anterior. A forma como o encéfalo recebe informações é chamada de sentido, que se divide em gerais e especiais. Os sentidos gerais são mais abrangentes, porque ocorrem devido aos receptores espalhados por boa parte do corpo e se classificam em somáticos, os quais incluem tato, pressão, temperatura, dor e propriocepção, fornecendo basicamente informações sensoriais do corpo e ambiente; e viscerais, que trazem informações sobre os órgãos internos, principalmente sensações de dor e pressão. Contudo, apesar de o SNP ser frequentemente estimulado e receber in- formações, captando as sensações, muitas delas são processadas no SNC de forma inconsciente, como a pressão arterial, que é constantemente regulada e controlada devido às percepções do SNP, mas ajustada de modo inconsciente. Isso se torna muito importante, pois se você tivesse consciência das sensações que chegam ao SNC, provavelmente não seria capaz de realizar outras funções, ficando bastante envolvido na atuação e no controle de todas elas. 5Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico A complexidade da divisão sensorial do SNP é gigante, tanto que se pode perceber claramente as mínimas diferenças em temperatura, de superfícies quentes ou frias; mudanças de pressão; quando algo está somente encostando na sua pele ou caso esteja apertando-a; e diferenças de textura, por exemplo, algo liso ou rugoso. Tudo isso é possível devido à grande variabilidade de receptores sensoriais que compõem o SNP. Os diferentes receptores podem ser classificados pelo estímulo ativador dessas estruturas. � Mecanorreceptores: são células nervosas responsáveis por perceber diferentes estímulos mecânicos, gerando impulsos nervosos quando eles ou tecidos adjacentes se deformam por uma força mecânica, como toque, pressão, vibração e estiramento. Eles também se tornarão muito importantes na atuação dos sentidos especiais. � Quimiorreceptores: são responsáveis por responder aos estímulos quí- micos, sendo estimulados quando ocorre a ligação de alguma molécula aos seus receptores de membrana. Eles estarão bastante envolvidos nos sentidos olfato e gustação. � Termorreceptores: são células especializadas e sensíveis que respon- dem às alterações na temperatura. As terminações responsáveis por essa detecção respondem de acordo com seu tipo de receptor, assim, o receptor de frio aumenta a produção do potencial de ação quando a pele é resfriada, podendo ser ativado por mentol, que atribui à menta seu aspecto refrescante. Existem ainda os receptores de calor, que elevam sua taxa de produção de potencial de ação quando a temperatura da pele aumenta. Por fim, há o receptor de dor, que se estimula por calor extremo (temperatura acima de 47ºC) ou frio extremo (temperatura abaixo de 12ºC). � Fotorreceptores: respondem aos estímulos luminosos, gerando im- pulsos nervosos quando a luz atinge suas células receptoras. Eles são primordiais para a visão. � Nociceptores: respondem aos estímulos dolorosos e, portanto, são os únicos receptores que respondem a mais de um tipo de estímulo, con- siderando que a dor pode ser resultante de danos físico, térmico ou químico ao tecido, sendo potencialmente lesivos ao organismo. Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico6 Em geral, os receptores sensoriais se localizam na pele, são denominados de cutâneos e responsáveis por fornecer informações sobre o ambiente ex- terno. Em vísceras ou órgãos, há os visceroceptores, que trazem informações sobre o ambiente interno e, por fim, os receptores associados a articulações, tendões, músculos e outros tecidos conectivos, chamados de proprioceptores e fornecem informações sobre a posição corporal, o movimento e a magnitude do estiramento muscular ou da força da contração muscular. Além desses receptores sensoriais espalhados pelo corpo, atuando nos sentidos gerais, as sensações são percebidas por órgãos sensoriais complexos que permitem detectar as menores mudanças no ambiente. A partir desses órgãos, pode-se organizar e estruturar os sentidos especiais. Sentidos especiais Historicamente, considerou-se que os seres humanos tinham cinco senti- dos básicos: olfato, paladar, visão, audição e tato. No entanto, o sentido originalmente chamado de tato foi classificado em múltiplos sentidos gerais, como pressão, dor, tato, entre outros, que foram vistos no tópico anterior. Como substituto, incluiu-se o sentido do equilíbrio ao grupo dos sentidos especiais. Essa mudança na classificação foi feita por considerar que, para compor o grupo dos sentidos especiais, se deve atender a três requisitos básicos: órgão sensorial, condução do sinal e área no cérebro especializada em processá-lo. Já o tato é composto de receptores espalhados ao longo do corpo, logo, não há um órgão específico para sua percepção. Na Figura 1, você pode observar a representação da integração dos sentidos especiais entre SNP e SNC. 7Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico Figura 1. Representação da integração dos sentidos especiais entre SNP e SNC. Fonte: Adaptada de Silverthorn (2017). Olho Nariz Língua Equilíbrio Som Tronco encefálico Córtex visual Córtex auditivo Córtex gustatório Córtex somatossensorial primário Córtex olfatório Bulbo olfatório Cerebelo Tálamo Sentidos somáticos Visão Entre os sentidos especiais, a visão é o dominante, pois em torno de 70% dos receptores sensoriais do corpo encontram-se nos olhos e aproximadamente metade do córtex cerebral está envolvido em algum aspecto do processamento visual. Trata-sedo processo pelo qual a luz refletida por objetos no meio externo é traduzida em uma imagem mental. O principal órgão sensorial da visão é o olho, que funciona como uma câmera, focando a luz sobre uma superfície sensível a ela (retina) por uma lente e uma abertura (pupila), cujo tamanho pode ser ajustado para modificar a quantidade de luz que entra (dilatação da pupila). O olho adulto é uma esfera com diâmetro de mais ou menos 2,5 cm, sendo visível apenas um sexto da Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico8 superfície ocular, já o restante fica circundado e protegido pelo corpo adiposo e pela parede óssea da órbita. Na primeira etapa da via visual, a luz que entra no olho sofre desvios de duas maneiras. Uma delas é pela modulação no diâmetro da retina, modifi- cando a quantidade de luz que chega aos fotorreceptores e, ainda, a luz pode ser focalizada por meio de alterações na forma da lente. Anatomicamente, o olho (ou bulbo do olho) é uma esfera levemente irregu- lar, sendo que, em sua porção mais anterior, está o polo anterior e, na porção mais posterior, o polo posterior. Já sua parede se compõe de três túnicas, denominadas de fibrosa, vascular e nervosa. A túnica fibrosa é a estrutura mais externa do olho, composta de tecido conjuntivo avascular, com duas regiões diferentes: esclera e córnea. A esclera se trata da maior parte da camada fibrosa, caracterizada pelo branco do olho, sendo rígida como um tendão que protege e dá forma ao bulbo. Já a córnea é transparente, faz saliência anteriormente a partir de sua junção com a esclera e forma uma janela que deixa a luz penetrar no olho, sendo a principal parte do aparelho que curva a luz que entrou. Já a túnica vascular é a camada intermediária do olho, chamada de úvea pigmentada, que tem três regiões: corioide, corpo ciliar e íris. A coroide se trata de uma membrana de coloração marrom-escuro e altamente vascularizada, cujo pigmento ajuda a absorver a luz, prevenindo sua dispersão e o reflexo dentro do olho. Anteriormente, ela se transforma no corpo ciliar, um anel espesso de tecido que circunda o cristalino e atua por meio de músculos lisos no controle da sua forma. Por fim, a íris é a porção colorida e visível do olho, situando-se entre a córnea e o cristalino, já no seu interior, está a pupila, que permite a entrada da luz. A túnica mais interna do bulbo do olho é conhecida como retina, formada por uma camada pigmentada externa, epitélio simples cuboide pigmentado e uma camada neural interna, que responde à luz. Nela, ocorre a formação das imagens. Conforme a luz entra através da pupila, córnea e lente, focaliza sobre a retina e ocorre a sua conversão em potenciais de ação, que são transmitidos, diretamente pelo córtex visual, ao encéfalo, que os interpreta. Basicamente, a visão se divide em três etapas, nas quais ocorre a entrada da luz no olho até ser focalizada na retina, em que os fotorreceptores transduzem a energia luminosa em um sinal elétrico por meio das vias neurais da retina para o cérebro, havendo o processamento desses sinais em imagens visuais. Assim, pode-se observar a complexidade estrutural dos olhos e da visão, que contribuem para esse sentido especializado. 9Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico Audição e equilíbrio Estes dois sentidos se originam do mesmo órgão especializado (o ouvido), o qual se divide em três grandes porções: ouvido externo, que inclui a aurí- cula e o canal auditivo externo; ouvido médio, que é um espaço preenchido por ar com os ossículos da audição (estribo, materno e bigorna); e ouvido interno, que abriga os órgãos sensoriais da audição e do equilíbrio, como vestíbulo e cóclea. A função auditiva se inicia com a vibração do ar na forma de ondas sonoras, as quais são coletadas pelas aurículas do ouvido externo e conduzidas pelo canal auditivo externo em direção ao tímpano. Ao atingi-lo, elas causam sua vibração que, por sua vez, provoca a vibração dos três ossículos do ouvido médio, sendo transferida mecanicamente e amplificada para a janela oval, na qual começa o vestíbulo e está a perilinfa. Já as vibrações da perilinfa são transmitidas para a endolinfa, que causa a deformação da membrana basilar e, a partir disso, estimula-se as células ciliadas quimicamente, liberando neurotransmissores que induzem a geração e o envio de potenciais de ação dos neurônios cocleares para o córtex cerebral, em que essa informação é percebida como um som. Já o equilíbrio ocorre em uma porção específica do vestíbulo, chamada de labirinto, que se classifica em estático e dinâmico. O estático é composto de utrículo e sáculo, responsáveis principalmente por avaliar a posição da cabeça em relação à gravidade, respondendo bem nas acelerações ou desacelerações lineares; e o dinâmico se associa aos canais semicirculares, envolvidos na movimentação da cabeça. O funcionamento primordial do equilíbrio acontece pela movimentação da ampola (ou uma porção do canal semicircular), na qual estão distribuídas as células ciliadas que percebem a movimentação dos pequenos cristais e, ao serem estimuladas por eles (que estão em um meio líquido e, por isso, se deslocam de acordo com a movimentação e o posicionamento do corpo), emitem estímulos elétricos pelo nervo vestibulococlear ao SNC. Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico10 A contribuição do labirinto para o equilíbrio é tão grande que, quando ocorre alguma inflamação, conhecida como labirintite, entre os principais sintomas estão perda de equilíbrio, desorientação, enjoo e náuseas. Isso acontece pois, devido à inflamação no labirinto, este percebe o corpo em um posicionamento, mas os outros sentidos, como visão e propriocepção, indicam outra posição. Paladar A gustação é a identificação dos diferentes sabores e ocorre devido aos botões gustatórios localizados em porções especializadas da língua, cha- madas papilas gustativas. Esses botões são estruturas ovais embutidas no epitélio da boca, nos quais estão presentes as células sensoriais do tipo quimiorreceptores. As pequenas porções de alimento dissolvidas na saliva entram nos poros gustatórios e causam a excitação dessas células sensoriais por diversos motivos. Existem cinco tipos principais de sabores: salgado, amargo, ácido, doce e umami, mas como essas estruturas são quimiorreceptores, sua distinção ocorre por diferentes aspectos químicos. Por exemplo, o salgado acontece por difusão do sódio nas células gustatórias, resultando na sua despolarização; o ácido, pela despolarização causada por íons de hidrogênio; o doce e o amargo, por despolarização via proteína G; e o umami resulta da ligação dos aminoácidos (sobretudo o glutamato) com as células gustatórias. Apesar da gustação ter um aspecto bastante relacionado ao prazer da alimentação, ela também assume outras características importantes, por exem- plo, a prova do alimento em relação à sua qualidade, se ele está apto para o consumo ou não. Se você já provou um alimento estragado, certamente, sentiu de imediato uma sensação de repulsa e nojo, pois essa é a resposta de defesa do organismo, classificando-o como impróprio para o consumo, desencadeando uma reação que provavelmente não o permitirá comê-lo e evitando que ele cause problemas severos. 11Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico Assim, nota-se a importância e o funcionamento, por meio de reações químicas, para identificação dos sabores. Outro sentido derivado de receptores químicos e que está bastante relacionado ao paladar é o olfato. Para demonstrar como eles estão interligados, experimente provar algum alimento com o nariz obstruído e verá como é difícil distinguir seu gosto. Olfato A olfação ou sentido de cheirar ocorre em resposta aos odores que estimulam receptores sensoriais na parte superior da cavidade nasal, chamada de região olfatória, que possui um epitélio olfatório especializado. No epitélio, estão milhões de neurônios olfatórios que se projetam para os bulbosolfatórios e, a partir deles, os tratos olfatórios seguem para o córtex cerebral. As moléculas transportadas no ar, que entram na cavidade nasal, são dis- solvidas no muco que recobre o epitélio olfativo. Algumas delas se chamam odorantes e se responsabilizam por ligarem-se às membranas de quimiorrecep- tores e desencadearem a resposta que identifica seu odor. Esses receptores de odorantes se compõem de sete subunidades e podem produzir em torno de mil combinações diferentes, o que permite a detecção de uma ampla variedade de aromas, classificados em até 50 odores primários, como canforáceos (p. ex., naftalina), almiscarados, florais, mentolados, etc.. Esse estímulo nos quimiorreceptores olfativos é transmitido diretamente ao córtex olfatório, responsável pela percepção consciente do odor e que está localizado no lobo temporal do cérebro. Existem ainda áreas olfatórias secundárias, que cuidam das reações viscerais e emocionais aos odores, como a olfativa medial. Desta forma, foi possível observar a contribuição do SNP para as sensações e percepções, que certamente produzem diversas respostas no organismo, das quais, muitas são realizadas pela divisão motora do sistema. Atuação motora As vias motoras são descendentes e contêm axônios responsáveis pelo trans- porte dos potenciais de ação de regiões do cérebro para a medula espinal (SNC) e os neurônios inferiores, que levam o estímulo às células-alvo (SNP). Essas vias podem ser classificadas como diretas, quando os neurônios do córtex cerebral formam sinapses diretamente com os neurônios motores inferiores; ou indiretas, no momento em que os axônios de neurônios motores Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico12 que saem do cérebro fazem sinapse em um núcleo intermediário no tronco encefálico. Já a porção eferente do SNP se subdivide em somática, responsável pelo controle voluntário dos músculos esqueléticos; e autônoma, que controla de forma involuntária os músculos liso e cardíaco, diversas glândulas e parte do tecido adiposo. Atuação motora somática Os neurônios do controle motor somático possuem seus corpos celulares no corno ventral da medula espinal ou no encéfalo e estendem seu axônio único e longo até o músculo esquelético alvo. Perto de seus alvos, os neurônios motores ramificam-se em diversos conjuntos terminais axonais alargados, dispostos na superfície da fibra muscular esquelética, assim, essa estrutura ramificada controla várias fibras ao mesmo tempo. Essa comunicação entre o neurônio e a fibra muscular também é denominada de sinapse, cujo espaço se chama junção neuromuscular e tem três componentes: � terminal axonal pré-sináptico do neurônio motor; � fenda sináptica; � fibra muscular esquelética. A partir da estimulação do neurônio motor na junção neuromuscular, os receptores de membrana da fibra muscular desencadeiam uma cascata de eventos que tem como resultado o movimento de força entre actina e miosina, caracterizando o processo de contração muscular. Atuação motora autônoma O sistema nervoso autônomo está associado ao SNP e, na maioria das vezes, controla as atividades que não dependem da vontade dos indivíduos, por isso, suas ações são involuntárias. Ele é responsável por realizar funções como controle das frequências cardíaca e urinária, tônus da musculatura lisa, regulação da pressão arterial, secreções exócrina e endócrina, me- tabolismo intermediário, peristaltismo, constrição ou dilatação pupilar, salivação, etc.. Esse sistema possui duas divisões: parassimpática, relacionada, por exem- plo, às questões de repouso e digestão; e simpática, associada às ações de luta ou fuga. Na Figura 2, você pode conferir a representação do sistema nervoso autônomo. 13Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico Figura 2. Representação do sistema nervoso autônomo. Fonte: Silverthorn (2017, p. 362). O sistema nervoso autônomo O sistema nervoso autônomo possui duas divisões: a divisão simpática e a divisão parassimpática Legenda Simpático Parassimpático SIMPÁTICO PARASSIMPÁTICO Hipotálamo Formação reticular Hipotálamo. Formação reticular Ponte Bulbo Nervo vago Olho Gânglio Constrição pupilar (miose) Dilatação pupilar (midríase) Secreção de muco e enzimas Glândulas salivares Secreção aquosa Redução da frequência cardíaca Aumento da frequência e da contratilidade cardíaca Coração Constrição das vias aéreas Pulmões Relaxamento das vias aéreas Inibição da digestão Gânglio Medula espinal Ponte Bulbo Redução da secreção de enzimas e de insulina Inibição da digestão Inibição da digestão Aumenta a secreção de renina Relaxamento da bexiga Figado Estômago Intestino Bexiga urinária Indução da ejaculação Pênis Indução da ereção Testículo Ingurgitamento e secreção Útero Estímulo a contração Cadeia simpática Aumenta a secreção de bile Aumenta a motilidade e a secreção Aumenta a motilidade e a secreção Medula espinal Pâncreas Liberação de enzimas e de insulina Medula da glândula suprarenal Secreção de catecolaminas Rim Liberação de urina Nervos pélvicos C1 2 3 4 5 6 7 8 T1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 L1 2 3 4 5 S1 2 3 4 5 Co1 C1 2 3 4 5 6 7 8 T1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 L1 2 3 4 5 S1 2 3 4 5 Co1 Sistema nervoso simpático O sistema nervoso simpático também é conhecido como adrenérgico ou sistema toracolombar, porque suas fibras pré-ganglionares originam-se do primeiro segmento torácico ao segundo ou terceiro segmento lombar da medula espinal. Os primeiros gânglios, cujas fibras pós-ganglionares seguem com os nervos cervicais, se denominam cervical superior (inervam pupila, glândulas salivares e lacrimais), médio e inferior (inervam coração e pulmão). Esse sistema tem uma cadeia composta de 23 gânglios que surgem no bulbo raquidiano e se conectam nos dois lados da medula. “A distribui- ção de axônios simpáticos ocorre por meio de nervos espinais, simpáticos Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico14 e esplâncnicos. Ramificações desses nervos estendem-se aos efetores ou reúnem-se em plexos que, por sua vez, inervam os efetores” (VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016, p. 553). Como já comentado, o sistema nervoso simpático está associado às situações de luta ou fuga, assim, sua atuação promove respostas sistêmicas para que possa fazer isso. Imagine uma situação em que você esteja em um piquenique, relaxando e, de repente, avista uma cobra perto de suas coisas. Imediatamente, frente a esse estímulo percebido, o sistema promove uma série de respostas, como aumento da frequência cardíaca, redirecionamento do fluxo sanguíneo para os membros inferiores, dilatação da pupila, relaxamento das vias aéreas, etc., com o objetivo de preparar seu corpo para fugir correndo ou tentar caçar o animal. Sistema nervoso parassimpático Entre outras funções, o sistema nervoso parassimpático é responsável por mediar o consumo de energia, liberando-a e economizando-a em alguns momentos, bem como auxiliar quando se está saindo de um estado de alerta e entrando em um de estabilização ou calma — depois da ativação do sistema nervoso simpático. Ele ainda está implicado em realizar tarefas associadas às funções essenciais para o organismo, que ocorrem de modo inconsciente ou involuntário. “A divisão dos axônios parassimpáticos ocorre por meio dos nervos cranianos e nervos esplâncnicos pélvicos. As ramificações desses nervos direcionam-se diretamente aos órgãos alvo ou unem-se aos plexos, que, por sua vez, inervam os órgãos” (VANPUTTE; REGAN; RUSSO, 2016, p. 555). Quanto às suas ações no organismo, tem-se a regulação nos sistemas cardiovascular, digestivo, excretor e visual, por exemplo. Na ação de modo inconsciente, uma característica do sistema nervoso autônomo, o sistema nervoso parassimpático atua no cardiovascular por meio do nervo vago que regula o ritmo cardíaco em relação à sua frequência e contração, bem como reduz a pressão sanguínea. Sobre o sistema digestivo, ele controla as paredes do estômago, auxiliandonas contrações, na atividade peristáltica e na facilitação da secreção de hormônios envolvidos na digestão, como insulina, secretina e gastrina. Ele ainda regula a saliva e a deglutição, sendo que durante o processo de digestão, concentra a energia do corpo para tal. No excretor, o sistema nervoso parassimpático controla a regulação na ação de eliminação dos esfíncteres quanto à coordenação da micção. Ele atua no sistema genital, formado por nervos e gânglios, com grande relevância na sexualidade dos indivíduos, pois o estímulo sexual e a excitação ocorrem 15Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico por meio dele. Em relação ao sistema respiratório, ele age nos pulmões de modo fundamental para estimular a constrição dos brônquios, assim, é o mecanismo pelo qual as vias aéreas se estreitam com a finalidade de diminuir o fluxo de oxigênio ou bloqueá-lo. Por fim, o sistema visual tem relação com o parassimpático, porque este contrai a pupila quando você se encontra em um estado de repouso ou se não necessitar mais captar luz. Será que diferentes estímulos auditivos musicais geram diferentes respostas do sistema nervoso autônomo? Visando responder a essa pergunta, Ferreira, Vanderlei e Valenti (2015) compararam a resposta aguda desse sistema perante a exposição de estímulos auditivos de música clássica e de heavy metal por 10 minutos, via fone de ouvido. Para saber se a música conseguiu promover mudanças no sistema nervoso autônomo e se houve diferença entre os estilos, acesse o link a seguir. https://qrgo.page.link/cDzg4 Durante o estudo sobre o SNP, pode-se perceber que ele assume uma grande gama de funções e atuações, desde os nervos cranianos, a divisão sensorial geral e os sentidos especiais até a divisão motora somática e a autônoma, nas quais os sistemas simpático e parassimpático possuem ações opostas. O primeiro atua nos estímulos de ação rápida e reação aos estímulos, como um estado de alerta e estresse; já o segundo diminui as ações do corpo e causa uma estabilidade, calmaria e um relaxamento. A partir desses conhecimen- tos, foi possível compreender um pouco melhor como funciona o complexo FERREIRA, L. L.; VANDERLEI, L. C. M.; VALENTI, V. E. Resposta aguda do sistema nervoso autônomo a diferentes estímulos auditivos musicais em mulheres. Revista Neurociências, São Paulo, v. 23, n. 3, p. 420–426, 2015. Disponível em: http://www.revistaneurociencias. com.br/edicoes/2015/2303/original/987original.pdf. Acesso em: 5 maio 2019. Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico16 MARIEB, E. N.; HOEHN, K. Anatomia e fisiologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. 1072 p. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. 960 p. VANPUTTE, C.; REGAN, J.; RUSSO; A. Anatomia e fisiologia de Seeley. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2016. 1264 p. Leituras recomendadas MARTINI, F. H.; TIMMONS, M. J.; TALLITSCH, R. B. Anatomia humana. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. 904 p. TANK, P. W.; GEST, T. R. Atlas de anatomia humana. Porto Alegre, Artmed, 2009. 448 p. TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Corpo humano: fundamentos de anatomia e fisiologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. 704 p. 17Anatomofisiologia do sistema nervoso periférico
Compartilhar