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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO CIRURGIA CURSO DE MEDICINA Catarina Kin Masukawa de Souza Fibrinólise em isquemia crítica de membros inferiores Florianópolis 2022 Catarina Kin Masukawa de Souza Fibrinólise em isquemia crítica de membros inferiores Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao curso de Medicina do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Medicina. Orientador: Prof. Dr. Gilberto do Nascimento Galego, Coorientador: Prof. Dr. Rafael Narciso Franklin Florianópolis 2022 Souza, Catarina Kin Masukawa Fibrinólise em isquemia crítica de membros inferiores / Catarina Kin Masukawa Souza ; orientador, Gilberto do Nascimento Galego, coorientador, Rafael Narciso Franklin, 2022. 26 p. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Graduação em Medicina, Florianópolis, 2022. Inclui referências. 1. Medicina. 2. Fibrinólise. 3. Isquemia crítica de membros inferiores. 4. Doença Arterial Periférica. I. do Nascimento Galego, Gilberto. II. Narciso Franklin, Rafael. III. Universidade Federal de Santa Catarina. Graduação em Medicina. IV. Título. Catarina Kin Masukawa de Souza Fibrinólise em isquemia crítica de membros inferiores Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do título de Bacharelado em Medicina e aprovado em sua forma final pelo Curso de Medicina. Florianópolis, 09 de novembro de 2022. ___________________________ Coordenação do Curso Banca examinadora ____________________________ Prof. Dr. Gilberto do Nascimento Galego Orientador Prof. Dr. Pierre Galvagni Silveira Universidade Federal de Santa Catarina Prof. Dr. Rafael Narciso Franklin Universidade Federal de Santa Catarina Florianópolis, 2022 RESUMO A isquemia crítica de membros inferiores é uma importante causa de morbidade principalmente na população idosa. Sua principal etiologia, a doença arterial periférica (DAP), tem prevalência estimada entre 3-10% da população e correlação estreita com a arteriosclerose. Frente a esse problema de magnitudes globais, a busca por técnicas minimamente invasivas tem se intensificado e, o uso de fibrinolíticos – intra-catéter ou sistêmicos – figura atualmente como uma alternativa, tanto de maneira isolada quanto associada à outras modalidades de tratamento. Apesar de amplamente difundido, o uso dessa droga para tratamento da isquemia crítica de extremidades não consta em bula, sendo considerado off-label. Nesse contexto, a presente pesquisa teve como objetivo analisar o uso do fibrinolítico rt-PA Actilyse ® no manejo da isquemia crítica de membros inferiores, avaliando a eficácia e segurança do método, dose e tempo de infusão e dados antropométricos dos pacientes submetidos à essa terapêutica. Método: Foi realizado um estudo transversal e retrospectivo, através da análise de dados de registros internos da Clínica Coris de pacientes submetidos ao uso de fibrinolítico rt-PA entre 2019-2021. Resultados: Encontramos dados de 17 pacientes. Quatro destes foram excluídos do estudo por não obedecerem aos critérios de inclusão. A média de idade dos participantes foi de 68.07 anos (DP: +/- 14.20365). A média de peso dos participantes de 80.5 kg (DP: +/- 23.98317), sendo observado sobrepeso/obesidade (em 70% dos pacientes). A HAS foi a comorbidade mais prevalente (presente em 84% dos pacientes), seguido de tabagismo (61%), vasculopatias prévias (46%) e DM2 (38%). O uso de fibrinolítico isolado não foi feito em nenhuma ocasião, mas sempre associado à outra técnica. A dose de ataque de fibrinolítico foi de 18 mg em média, variando de 10-50 mg, no entanto, não encontramos outros dados como método e tempo de infusão. A ocorrência de sangramento menor foi observada em quatro pacientes e a de sangramento maior – definidos como àqueles que levaram à instabilidade hemodinâmica ou que a queda progressiva de hematócrito – ocorreu também em quatro pacientes. A taxa de sucesso, entendida como a preservação do membro, ocorreu em nove ocasiões. O insucesso, entendido como a indicação de amputação foi observado em quatro procedimentos. Conclusão: Esse pequeno estudo encontrou pacientes com os mesmos fatores de risco descritos na literatura. O uso de fibrinolítico parece ser seguro, apesar das complicações hemorrágicas. Por fim, os dados para padronização do uso de fibrinolíticos foram inconclusivos, sendo necessário uma continuidade do estudo com acesso integral aos prontuários. Palavras-chave: isquemia crítica; doença arterial periférica; fibrinolítico. ABSTRACT Critical limb ischemia is an important cause of morbidity, mainly in the elderly population. Its main etiology, peripheral arterial disease (PAD), has an estimated prevalence between 3-10% of the population and a close correlation with arteriosclerosis. Faced with this problem of global magnitude, the search for minimally invasive techniques has intensified, and the use of fibrinolytics – intracatheter or systemic – is currently the technique of choice, isolated or in association with other modalities. Despite being widely disseminated, the use of this drug for the treatment of critical limb ischemia is considered off-label. In this context, the present study aimed to analyze the use of fibrinolytic rt-PA Actilyse ® in the management of critical limb ischemia, evaluating the efficacy and safety of the method, dose and infusion time, and anthropometric data of patients who underwent this therapy. Method: We conducted a cross-sectional and retrospective study through the analysis of data from internal records available by Clínica Coris, of patients submitted to the use of fibrinolytic rt-PA between 2019-2021. Results: We found data from 17 patients. Four of these were excluded from the study because they did not meet the inclusion criteria. The mean age of participants was 68.07 years (SD: +/- 14.20365). The participants' mean weight was 80.5 kg (SD: +/- 23.98317), with overweight/obesity observed (in 70% of patients). Arterial hypertension was the most prevalent comorbidity (present in 84% of patients), followed by smoking (61%), previous vascular diseases (46%) and DM2 (38%). The use of fibrinolytic alone was not observed on any occasion, but always associated with other antithrombotic therapy. The medium dose of rt-PA was of 18 mg, varying from 10-50 mg, however, we did not gain full access to the method or infusion time. The occurrence of minor bleeds was observed in four patients, and major bleeds – defined as those that led to hemodynamic instability or a progressive drop in hematocrit – also occurred in four patients. Success was defined as limb preservation and was observed in nine occasions. Failure was defined as indication of amputation and was seen in four procedures. Conclusion: This small study found patients with the same risk factors described in the literature. The use of fibrinolytics is thought to be safe despite the occurrence of bleeding. Finally, it was not possible to gather all the data necessary to standardize the use of fibrinolytics, so, we suggest further studies, with full access to the patients' medical records. Keywords: critical ischemia; peripheral arterial disease; fibrinolytic. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária AVC Acidente Vascular Cerebral CDC Centers For Disease Control and Prevention CH Concentrado de hemácias CONEP Comitê de Ética em Pesquisa com SeresHumanos DAP Doença Arterial Periférica DCV Doença Cardiovascular DM2 Diabetes Mellitus tipo 2 EUA Estados Unidos da América ESVS European Society for Vascular Surgery FDA Food and Drug Administration IAM Infarto Agudo do Miocárdio ITB Índice Tornozelo-Braquial NHS National Health Service rt-PA Recombinant Tissue Plasminogen Activator SBACV Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular STILE Surgery or Thrombolysis for Ischemic Lower Extremitiy SVS Society for Vascular Surgery TC Tomografia Computadorizada TOPAS Thrombolysis or Peripheral Arterial Surgery t-PA Tissue Plasminogen Activator SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 16 2 OBJETIVO ............................................................................................................. 24 2.1 OBJETIVO GERAL:............................................................................................. 24 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS: .............................................................................. 25 3 HIPÓTESE ............................................................................................................. 25 4 MÉTODO ................................................................................................................ 25 4.1 LOCAL ................................................................................................................. 26 4.2 PARTICIPANTES ................................................................................................ 26 4.2.1 Critérios de inclusão ...................................................................................... 26 4.2.2 Critérios de exclusão ................................................................................ 26 4.3 INSTRUMENTOS ................................................................................................ 26 5 RESULTADOS ....................................................................................................... 27 6 DISCUSSÃO .......................................................................................................... 31 7 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 33 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 34 ANEXO A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................. 37 16 1 INTRODUÇÃO Segundo o dicionário Merriman e Webster (2022), isquemia é definida como “suprimento deficiente de sangue à uma parte do corpo, devido à obstrução do fluxo do sangue arterial”1. De forma análoga, os autores José Carlos Baptista Silva e Emil Burihan da Universidade de São Paulo, conceituam a isquemia como “um conjunto de sinais e sintomas decorrentes da insuficiência arterial aos tecidos de um determinado seguimento do corpo humano”2. Segundo esses mesmos autores, a isquemia crítica seria o "turning point" da isquemia, um momento decisivo com potencial de evoluir com melhora ou piora. A isquemia crítica, para Silva e Burihan pode ser classificada em aguda, quando há "parada aguda da circulação em um membro que tinha previamente perfusão adequada ao repouso" e em crônica, quando há “dor em repouso persistente”2. Essa conceituação nos leva ao primeiro impasse teórico desse trabalho: frequentemente, ao revisarmos a literatura, observamos saltos teóricos nos quais os autores transitam entre os conceitos de “isquemia aguda de membros inferiores” e “isquemia crítica de membros inferiores”, dando o entendimento de que essas duas expressões são sinônimas. No entanto, nesse trabalho, compreendemos a isquemia crítica da mesma forma que Silva e Burihan: um momento chave de uma isquemia – que pode ser aguda ou crônica – que demanda intervenção. Outra questão conceitual enfrentada por nós foi de desvencilhar a isquemia crítica de membros inferiores da Doença Arterial Periférica (DAP). De fato, a DAP é a principal causa de isquemia crítica – tanto aguda quanto crônica3 e será amplamente abordada nesse trabalho. No entanto, não podemos deixar de mencionar a existência de outras causas de isquemia crítica de membros inferiores. Essas etiologias são infinitamente menos comuns, mas citá-las é de suma importância, pois entram no diagnóstico diferencial da isquemia crítica por DAP. São elas: as vasculites, o trauma arterial, aneurismas arteriais periféricos, dissecção arterial, embolização, síndrome de aprisionamento de poplítea e trombofílias3. Essas causas menos frequentes foram excluídas do presente estudo com o objetivo de reduzir a quantidade de variáveis. Nesse trabalho, o enfoque foi a DAP como principal causa da isquemia crítica de membros inferiores. 17 A DAP é conceituada de maneira diversa na literatura e de forma pouco específica. Diversas sociedades versam sobre essa entidade, mas sua abrangência torna o conceito vago. A European Society for Vascular Surgery (ESVS) define a DAP como uma doença que age afetando os membros inferiores no qual há uma desordem da circulação sanguínea nas artérias que suprem os membros, que pode ser parcial (devido uma estenose) ou completa (devido uma oclusão)3. O Centers For Disease Control and Prevention (CDC), entidade americana, conceitua a DAP de membros inferiores como o “estreitamento ou bloqueio dos vasos que carregam sangue do coração para as pernas”4. O National Health Service (NHS) entidade nacional de saúde do Reino Unido, por sua vez, é mais específico e conceitua a DAP através de sua etiologia: DAP é uma condição comum na qual o acúmulo de depósitos de gordura nas artérias restringe o suprimento de sangue para os músculos da perna. Também é conhecida como Doença Periférica Vascular5. Por fim, a Society for Vascular Surgery (SVS) define a DAP como uma “doença crônica, na qual placas acumulam nas artérias das pernas”6. Com essas conceituações, retiradas dos principais referenciais em saúde atuais, fica clara a correlação direta entre a DAP e a arteriosclerose. Para esses autores, a DAP é consequência do processo tromboembólico da arteriosclerose. Assim, podemos inferir facilmente que, se a isquemia crítica tem como principal causa a DAP, e esta tem como principal etiologia a arteriosclerose, temos uma cadeia fisiopatológica. A arteriosclerose é o processo patológico considerado o principal fator de risco para doenças cardiovasculares (DCV). É difícil estipular a prevalência desse processo patológico, mas alguns trabalhos traduzem esse dado de maneira indireta. Em um estudo americano com 2876 homens e mulheres entre 15-34 anos, que morreram de causas não cardíacas, o resultado da necropsia de todos mostrava estrias gordurosas na aorta7. Da mesma forma, outro estudo com ultrassonografia (USG) demonstrou que um em cada seis adolescentes americanos tem espessamento anormal da camada íntima da aorta8. 18 Em vista da incalculável prevalência de arteriosclerose e entendendo a DAP como uma de suas consequências, podemos compreender a magnitude da prevalência da DAP: dados de 2019 calculam que esteja presente entre 3 a 10% da população geral9. Em 2010, foi matematicamente estimada a presença de DAP em 202 milhões de pessoas globalmente10. Dentre os casos de DAP, aqueles diagnosticados como quadro de isquemia crítica de membro inferior possuem incidência de aproximadamente 1,5 casos a cada 10.000 pessoas por ano11. Entretanto, Björck, M. et al afirmam que a verdadeira incidência é desconhecida. Isso se deve à heterogeneidade das apresentações clínicas que, frequentemente, levam os estudos epidemiológicos a discutir a isquemia crítica – aguda ou crônica - sem uma definição clara3. Essa ampla variedade de fatores e a complexidade do quadro clínicofazem com que a taxa de complicações entre pacientes com isquemia crítica seja alta. Mesmo com diagnóstico e tratamento adequados, a amputação é necessária em 10-15% dos pacientes, sendo essas em sua maioria supra condíleas, ocasionando perda da funcionalidade laboral e um incalculável ônus na qualidade de vida do paciente. A mortalidade nessa população também aumenta enormemente, sendo calculada entre 15-20% no primeiro ano desde a apresentação do primeiro sintoma11. O diagnóstico de DAP e de sua complicação mais proeminente, a isquemia crítica, se baseia em três pilares: a história do paciente, o exame físico e os exames de imagem. Pacientes com isquemia crítica frequentemente têm em sua história a queixa de claudicação intermitente e fatores de risco para DAP. Os mais importantes são o tabagismo, a hipertensão, a insuficiência renal e a diabetes3. No exame físico, a presença dos seis mnemônicos pain, pallor, pulselessness, poikilothermia, paraesthesia, and paralysis – traduzidos, como: dor, palidez, ausência de pulsação, pele fria, parestesia e paralisia – podem ajudar no diagnóstico e na classificação da severidade da isquemia3. Também, é mandatória a determinação do Índice Tornozelo-Braquial (ITB). Esse é um exame complementar não invasivo que consiste no cálculo da razão da pressão 19 sistólica da artéria braquial – direita ou esquerda – pela pressão sistólica das artérias tibial anterior ou posterior. O resultado dessa divisão é considerado normal se estiver entre 0,91-1,29. A tabela 1 traz os possíveis resultados e intepretações do ITB3. Fonte: Vasa (2019, p.19) Por fim, o terceiro pilar, que compreende os exames de imagem, é utilizado para elucidar o diagnóstico, classificar a severidade e planejar a intervenção. Hoje, não existe evidência de superioridade entre os métodos de imagem: técnicas como eco Doppler vascular, angiografia por tomografia computadorizada (Angio-TC) e angiografia por ressonância nuclear magnética (Angio-RNM) podem ser escolhidos com base na expertise do serviço e disponibilidade3. No entanto, a Angio-TC desponta como o método mais utilizado por sua ampla difusão, rapidez e por auxiliar no planejamento da intervenção3. Uma vez estabelecido o diagnóstico podemos prosseguir para o manejo: o tratamento inicial da isquemia crítica de membros inferiores inclui analgesia apropriada, hidratação venosa e a administração de heparina não fracionada – inicialmente na dose de 5000 UI ou 70-100 UI/kg. Essa medida tem nível C de evidência, pois apesar de amplamente difundida, não possui estudos randomizados recentes que confirmem seu benefício na isquemia crítica, ou qualquer estudo randomizado que compare a heparina não fracionada com outros anticoagulantes. O objetivo teórico do uso de heparina é de reduzir a propagação do trombo e promover efeito anti-inflamatório3. Valor ITB Interpretação >1,3 Valor falsamente elevado (suspeitar de esclerose calcificante da média) 0,91 – 1,29 Normal 0,75 – 0,9 DAP mínima 0,5 – 0,75 DAP moderada < 0,5 DAP severa Tabela 1: Interpretação do ITB 20 A ESVS em Clinical Practice Guidelines on the Management of Acute Limb Ischaemia, coloca que a urgência do tratamento é diretamente proporcional a severidade da isquemia do membro, que deve ser estipulada conforme a classificação de Rutherford (tabela 2)3. Tabela 2: Classificação de Rutherford Fonte: Vasa (2019, p. 10) A revascularização de urgência é recomendada em casos nos quais haja déficit neurológico, particularmente com envolvimento motor, o que já classificaria a isquemia em Rutherford II3. As opções de tratamento são inúmeras e dependem de diversas variáveis, que permeiam a experiência do cirurgião e fatores do próprio paciente, como a severidade da doença, localização, riscos inerentes e comorbidades12. Essa grande diversidade de tratamentos permite que os cirurgiões utilizem de técnicas mistas, sendo essa prática a mais comum. As principais opções terapêuticas são: Tromboembolectomia: Introduzida em 1962 por Fogarty. Durante muitos anos permaneceu como terapia de escolha na isquemia crítica de causa embólica, principalmente no tratamento de oclusões de leitos Classificação Grau Manifestação Rutherford 0 0 Assintomático Rutherford 1 I Claudicação leve. Rutherford 2 Claudicação moderada. Rutherford 3 Claudicação grave. Rutherford 4 II Dor em repouso. Rutherford 5 III Úlcera isquêmica limitada, não excedendo dígitos Rutherford 6 III Úlcera isquêmica severa ou gangrena franca 21 arteriais saudáveis. Consiste na inserção um cateter de Fogarty, que adentra o vaso e retira o material oclusivo12. By-pass ou cirurgia aberta: É considerado o principal tratamento na isquemia crítica, sendo também utilizado quando a recanalização intravascular não oferece sucesso. É feito uma ponte, que pode ser com veia autóloga ou uma prótese, conectando a porção arterial distal a obstrução12. Aspiração de trombo: Consiste na retirada mecânica do trombo com a ajuda de dispositivos endoluminais. Atualmente diversas marcas comerciais encontram-se disponíveis. Em geral essa técnica apresenta melhor resultado em trombos agudos, com menos de 14 dias de formação12. Trombectomia mecânica endovascular: Também realizada com dispositivos endoluminais de ação reolítica (atuam por meio de um jato salino de alta pressão gerando um gradiente que permite a destruição e remoção do trombo) ou com microfragmentação, que atuam quebrando mecanicamente o trombo12. Trombólise acelerada por ultrassom: consiste na emissão de ultrassom em alta frequência e baixa intensidade. Se baseia em estudos in vitro que demonstraram a aceleração do processo enzimático de lise do trombo por relaxamento das fibras de fibrina e aumento da permeabilidade, favorecendo a exposição de receptores de plasminogênio13. Tema da presente pesquisa, a fibrinólise tem configurado uma terapêutica alternativa diante desse cenário de crescente incidência e morbimortalidade. No entanto, essa modalidade ainda não figura como método plenamente padronizado no tratamento da isquemia crítica de membros inferiores ou como terapia adjuvante em procedimentos endovasculares. Apesar de amplamente utilizado e discutido, o uso de fibrinolíticos para esse fim ainda é considerado off label, ou seja, não segue as indicações homologadas em bula. Assim, entidades como a brasileira Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e sua correspondente americana Food and Drug Administration (FDA), ainda não especificam o uso do medicamento com esse objetivo14. A droga fibrinolítica pode ser utilizada por via sistêmica ou 22 preferencialmente com liberação in loco, através de um cateter posicionado próximo ao local da obstrução. São diversos os estudos que comparam o uso de fibrinolíticos em técnicas endovasculares com a cirurgia aberta para o tratamento de isquemia crítica de membros inferiores. No entanto, pouco se fala da padronização desse tratamento para que atinja um ponto ótimo de eficácia e segurança15,16,17,18. A escassez de protocolos, por si só, afeta a qualidade desses estudos comparativos e impossibilita a aprovação do uso terapêutico de fibrinolíticos para esse fim específico. Tendo em vista a crescente complexidade dos procedimentos endovasculares, por vezes nos deparamos com uma isquemia crítica de extremidade que obriga o uso de técnicas mais avançadas e as drogas fibrinolíticas podem cumprir um papel importante nesta terapêutica especializada. Essas substâncias agem diretamente na catalisação da conversão do plasminogênio em plasmina. A plasmina é a enzima responsável por degradar a fibrina, um dos principais constituintes do trombo3. Os fibrinolíticos são usados desde meados dos anos 1950, mas apenas em 1990 teve início a era moderna21. Tudo começouem 1933, quando os pesquisadores Tillett e Garner, no Hospital Johns Hopkins, perceberam a capacidade de cepas hemolíticas do Streptococcus pyogenes de dissolver coágulos de fibrina. A esse produto, deram o nome de fibrinolisina estreptocócica e iniciaram os testes em seres humanos. Foi apenas em 1950, em um estudo direcionado a produzir dados sobre a segurança do agente, que a Estreptoquinase foi administrada pela primeira vez para fins terapêuticos. Os principais efeitos colaterais observados à época foram febre, hipotensão e sangramento21. De maneira concomitante, mais especificamente em 1947, Macfarlane e Pilling descreveram o potencial fibrinolítico da urina humana e isolaram uma molécula ativa a qual denominaram Uroquinase. Por ser uma molécula alogênica apresentava menor potencial antigênico e, consequentemente, menor probabilidade de reações como febre e hipotensão21. Vinte e três anos mais tarde, em 1980, é isolado o ativador de plasminogênio tecidual (t-PA). Esse agente, diferentemente dos anteriores, atua com mais intensidade no trombo devido a sua maior afinidade com a fibrina. Assim, possui 23 atividade mais restrita ao sítio da trombose. Ele age ligando-se ao plasminogênio e à fibrina induzindo uma mudança conformacional às duas moléculas, o que resulta na conversão do plasminogênio em plasmina. A plasmina é responsável por causar a lise da fibrina, dissolvendo o coágulo21. Ainda no início dos anos 80, pesquisas com técnicas moleculares de clonagem tornaram possível a produção do t-PA recombinante, o rt-PA. Essa tecnologia permitiu a produção em larga escala do fibrinolítico. Nesse contexto, em novembro de 1987, o rt-PA foi aprovado para uso médico nos EUA como tratamento de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM). Isso acontece 7 anos após o início dos primeiros estudos com t-PA, tornando a Alteplase uma das drogas de desenvolvimento mais rápido da história22. Menos de dez anos depois, em 1995, um estudo conduzido pelo National Institute of Neurological Disorders and Stroke, mostrou a efetividade do rt-PA intravenoso na reversão de Acidente Vascular Cerebral (AVC) isquêmico. Esse estudo pontuou a mudança de um paradigma no manejo do AVC mundo afora23. Em 1990 a DAP e a trombólise se encontram dando início à era moderna da terapia fibrinolítica, como coloca o autor Ouriel em A History of Thrombolytic Therapy. Nesta época, foram desenhados três estudos multicêntricos com intuito de comparar a fibrinólise com a cirurgia convencional21. O primeiro deles, o estudo Rochester, comparou o uso da Uroquinase com a cirurgia aberta em 114 pacientes com isquemia crítica de membros inferiores. O estudo demonstrou taxas de sobrevida maior no grupo de pacientes que recebeu terapia fibrinolítica (84%), quando comparado ao grupo de pacientes que recebeu tratamento convencional (58% de sobrevida em 12 meses). A taxa de salvamento de membros foi a mesma em ambos os grupos (80%)18. Concomitantemente, o estudo Surgery or Thrombolysis for Ichemic Lower Extremity (STILE), financiado pela Genentech, produtora do rt-PA Activase ®, analisou o uso de fibrinolíticos versus cirurgia em 393 pacientes randomizados entre os grupos de cirurgia, Uroquinase ou rt-PA. No decorrer do estudo os pacientes dos grupos fibrinolíticos foram combinados quando se percebeu a similaridade de seus resultados15. Nesse trabalho, os autores perceberam que pacientes com isquemia aguda (definida como < 14 dias) submetidos à fibrinólise apresentaram menores índices de amputação e menor tempo de internação. Em contrapartida, em pacientes https://en.wikipedia.org/wiki/National_Institute_of_Neurological_Disorders_and_Stroke https://en.wikipedia.org/wiki/National_Institute_of_Neurological_Disorders_and_Stroke 24 com isquemia crônica, a cirurgia demonstrou desfechos melhores. Assim, concluíram que na isquemia crítica o mais indicado seria fibrinólise podendo ser complementada pela cirurgia, enquanto na isquemia crônica a revascularização cirúrgica persistia como tratamento de primeira linha28. O terceiro e último grande estudo, Thrombolysis or Peripheral Arterial Surgery (TOPAS), financiado pelo Laboratório Abbott, comparou o uso da Uroquinase com a intervenção cirúrgica em 544 pacientes. Após um ano de seguimento a taxa de amputação entre os dois grupos foi similar (68,2% no grupo Uroquinase e 68,8% no grupo cirúrgico)16. Esses três estudos confirmaram a aplicabilidade da fibrinólise em casos de isquemia crítica de extremidades com taxas de amputação e mortalidade similares aos procedimentos cirúrgicos. E ainda sugerem que a fibrinólise seja considerada adjuvante à terapia cirúrgica ou percutânea para desobstrução de vasos de pequeno calibre ou oclusões de múltiplos leitos, onde o acesso cirúrgico isoladamente seria difícil. Essa modalidade, os chamados tratamentos híbridos, parecem diminuir a complexidade da cirurgia direta e dos procedimentos endovasculares28. Na prática, é a modalidade mais utilizada nos centros de referência. Atualmente, os principais agentes fibrinolíticos são a Uroquinase (nos EUA) e o rt-PA (no Reino Unido)19, 27. No Brasil, o fármaco de escolha é o rt-PA (Actilyse ®), apresentado em frasco liofilizado com 50 mg29. Em vista dessa terapia inovadora ainda não plenamente padronizada e utilizada rotineiramente nos principais Serviços de Cirurgia Vascular e Radiologia Intervencionista, associado a um crescente número de casos de isquemia crítica de membros inferiores, o presente trabalho foi desenhado para avaliar a eficácia e segurança do rt-PA. Outro objetivo deste estudo foi de reunir dados na tentativa de padronização do método, principalmente relacionado a dose e método de infusão. 2 OBJETIVO 2.1 OBJETIVO GERAL: Avaliar a eficácia, segurança e método de uso de rt-PA (Actilyse ®) no tratamento de pacientes com isquemia crítica de membros inferiores 25 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS: Registrar dose e tempo de infusão de rt-PA; Avaliar taxa de sucesso do tratamento através da análise da preservação do membro; Calcular a incidência das principais complicações descritas na literatura e em bula – sangramento maior (quando há repercussão hemodinâmica ou queda progressiva do hematócrito) e sangramento menor (hemorragias superficiais, devido a punções, hematomas, equimoses). Relacionar taxa de complicações aos dados clínicos e anatômicos dos participantes. 3 HIPÓTESE Hipotetizamos que o uso de fibrinolítico rt-PA configura uma terapêutica segura e eficaz no manejo da isquemia crítica de membros inferiores. 4 MÉTODO Foi realizado um estudo do tipo série de casos, transversal e retrospectivo, através da análise de dados anonimizados disponibilizados pela Clínica Coris Medicina Vascular. Os casos foram localizados através do banco de dados da farmácia da clínica supracitada que mantém guarda da dispensação dos medicamentos. A busca encontrou dados de 17 pacientes que fizeram uso de rt-PA entre janeiro de 2019 e dezembro de 2021. Primeiramente analisamos os dados conforme os critérios de inclusão e exclusão, o que resultou na retirada de quatro participantes. Todos os participantes excluídos foram submetidos à fibrinólise por isquemia em outros leitos que não membros inferiores. Dentre os selecionados, coletamos variáveis epidemiológicas (gênero, idade), antropométricas (peso, altura) e de saúde (medicamentos de uso contínuo, comorbidades, indicação da fibrinólise, tempo de infusão, dose utilizada de rt-PA, tempo de internação, indicação de amputação e complicações). Esses dados foram agrupados em tabelas e gráficos para facilitar a análise. O sucesso foi definido como a capacidade de salvar o membro, enquanto o insucesso foi definido como a indicação de amputação. Entendendo a hemorragia como reação adversa mais frequentemente associada ao uso de rt-PA, definimos como complicações do procedimentoa ocorrência de sangramentos menores (de caráter superficial, equimoses ou hematomas) e sangramentos maiores (quando gera 26 instabilidade hemodinâmica ou queda progressiva do hematócrito). O desfecho óbito foi considerado em nossa análise se ocorreu em até um ano do uso de fibrinolítico. Por fim, a apresentação dos resultados foi feita por meio de cálculos estatísticos simples e a discussão relaciona os resultados encontrados com uma breve revisão de literatura. 4.1 LOCAL Clínica Coris Medicina Vascular. Localizada na cidade de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. 4.2 PARTICIPANTES Dados referentes à pacientes maiores de 18 anos, com diagnóstico de isquemia crítica de membros inferiores, submetidos ao tratamento com fibrinolítico rt-PA entre os anos de 2019 e 2021. 4.2.1 Critérios de inclusão Foram incluídas no estudo informações de pacientes adultos (>18 anos) submetidos ao tratamento com o fibrinolítico rt-PA devido quadro de isquemia crítica de membros inferiores entre os anos de 2019 a 2021 na Clínica Coris Medicina Vascular. 4.2.2 Critérios de exclusão Foram excluídos desse estudo: Dados de pacientes menores de 18 anos; Dados de pacientes que tenham recebido o fibrinolítico rt-PA (Actilyse ®) para tratamento de outras enfermidades que não isquemia crítica de membros inferiores; Dados de pacientes que tenham sido submetidos ao tratamento fora do período em análise estipulado (2019-2021). 4.3 INSTRUMENTOS Foi utilizada base de dados e registros internos anonimizados do setor de Farmácia da Clínica Coris Medicina Vascular. 27 5 RESULTADOS Identificamos 17 pacientes submetidos à terapia com fibrinolítico rt-PA nos anos de 2019 a 2021. Quatro destes pacientes foram excluídos do estudo porque a abordagem não envolvia os membros inferiores. Dos 13 pacientes incluídos no estudo, cinco são do sexo feminino e oito do sexo masculino. A média de idade dos participantes foi de 68.07 anos (DP: +/- 14.20365). A análise de dados antropométricos demonstrou uma média de peso dos participantes de 80.5 kg (DP: +/- 23.98317) e a análise do IMC classificou 30% dos participantes em “peso normal” (IMC de 18,5 - 24,9 kg/m2), 46% em “sobrepeso” (IMC 25-29,9 kg/m2), 15% em “obesidade grau I” (IMC 30-34,9 kg/m2) e 9% em “obesidade grau 2” (IMC 35-39,9 kg/m2), vide gráfico 1. Gráfico 1 - Classificação dos participantes segundo o IMC Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular Os dados referentes à história mórbida pregressa dos participantes evidenciaram a HAS como comorbidade mais prevalente presente em 11 dos 13 participantes. Em segundo lugar observamos o sobrepeso/obesidade (presente em 10 participantes) e em terceiro lugar o tabagismo em oito participantes. Também notamos a prevalência de vasculopatias prévias em seis participantes, diabetes mellitus tipo 2 (DM2) em cinco participantes e neoplasia em dois. Esses dados são expostos no gráfico 2. 30% 46% 15% 9% CL AS S IF ICAÇ ÃO S EG U N D O O IM C Normal Sobrepeso Obesidade grau I Obesidade grau II 28 Gráfico 2 - Prevalência de comorbidades entre os participantes Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular A classe de medicamentos de uso contínuo mais prevalente foi a dos anti- hipertensivos, em segundo lugar os anticoagulantes e em terceiro as estatinas. Gráfico 3 - Medicamentos em uso contínuo pelos participantes Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular Percebemos que 71% dos pacientes apresentavam isquemia crítica recidivada no momento do uso do fibrinolítico, ou seja, apresentaram pelo menos um episódio prévio de intervenção por isquemia em membros inferiores em sua história mórbida pregressa. Apenas um dos 13 participantes foi submetido ao uso de fibrinolítico em duas ocasiões na mesma internação. 11 10 8 6 5 2 P R EVA L ÊN CIA D E CO M O R B IDAD ES HAS Sobrepeso / obesidade Tabagismo Vasculopatia prévia Diabetes Neoplasia Hipoglicemiantes 7% Insulina 3% AAS 13% Estatinas 19% Antiarrítmicos 7% Anticoagulantes 19% Antihipertensivos 32% M ED ICAM EN TO S D E U S O CO N T ÍN U O 29 Observamos que o uso de fibrinolítico isolado não foi feito em nenhuma ocasião, mas sempre associado à outra terapia: quatro procedimentos associaram o uso de rt-PA à angioplastia e, em dez ocasiões foram realizados concomitantemente a fibrinólise, a trombectomia mecânica e a angioplastia. Essa informação é exposta no gráfico 4. Gráfico 4 – Relação dos procedimentos realizados Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular A dose de rt-PA utilizada nos procedimentos variou de 10 a 50 mg, com uma média de 18,16 mg de dose de ataque. Apenas em um procedimento foi descrito a dose em bomba de infusão. Nesse caso isolado foi utilizado 0.7 mg/h de rt-PA. Outros dados como a descrição do método e tempo de infusão foram escassos. A média de dias de internação em UTI dos pacientes submetidos à fibrinólise foi de 5.69 dias (DP: +/- 4.15) e a média de dias de internação em enfermaria foi de 4.18 dias (DP: +/-3.7 dias). Por fim, quanto às complicações, observamos sangramentos menores em quatro pacientes todos em região de ferida operatória e revertidos com compressão local. Em um dos pacientes foi necessária a suspensão de fibrinolítico por 1h. Esses quatro eventos ocorreram em pacientes submetidos à fibrinólise + angioplastia + trombectomia mecânica. Os sangramentos maiores ocorreram também em quatro pacientes. Houve a necessidade de transfusão de concentrado de hemácias (CH) em 4 10 P R O CED IM EN TO S R EAL IZ AD O S Fibrinólise + Angioplastia Fibrinólise + Angioplastia + Trombectomia mecânica 30 três pacientes. A média de CHs transfundidos foi de 2 por paciente. Todos os eventos de sangramento maior foram associados à queda progressiva do hematócrito e nenhum por instabilidade hemodinâmica. Gráfico 5 - Ocorrência de Sangramento Menor e Maior por procedimento Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular Percebemos que a associação fibrinólise + angioplastia apresentou a menor ocorrência relativa de complicações. Observamos sucesso em nove procedimentos e insucesso em quatro procedimentos. No grupo fibrinólise + angioplastia, em dois dos quatro pacientes o desfecho foi classificado como sucesso. O grupo apresentou um procedimento malsucedido, no qual houve indicação de amputação transfemoral e um óbito no pós-operatório imediato, o que impossibilitou a avaliação de sucesso/insucesso. Totalizando apenas uma amputação no grupo. No grupo fibrinólise + angioplastia + trombectomia mecânica, observamos sete salvamentos de membro e três indicações de amputação: uma a nível infrapatelar, a segunda a nível transfemoral e última bilateralmente (não sendo especificado o nível da amputação). Nesse último caso, a paciente recusou a amputação bilateral e evolui com morte em menos de um ano. 0 4 2 2 Fibrinólise + Angioplastia Fibrinóse + Angioplastia + Trombectomia mecânica O CO R R ÊN CIA D E EF E ITO S ADV ER S O S Sangramento Menor Sangramento Maior 31 Gráfico 6: Taxa de sucesso na fibrinólise + angioplastia Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular Gráfico 7: Taxa de sucesso de fibrinólise + angioplastia + trombectomia mecânica Fonte: Base de dados da Clínica Coris Medicina Vascular Por fim, foram observados quatro óbitos em um ano. Dois pacientes evoluíram com morte ainda na mesma internação em que fizeram uso de fibrinolítico, esses dois pacientes pertenciam ao grupo da fibrinólise + angioplastia. A morte do primeiro paciente foi relacionada à insuficiência renal aguda e rabdomiólise no pós-operatório imediato. O segundo paciente, por sua vez, aguardava a delimitação da área isquêmica para amputação quando evoluiu com suboclusão intestinal e insuficiência renal.6 DISCUSSÃO O perfil do paciente descrito no presente estudo corresponde ao encontrado na literatura. Björck et al da ESVS em Clinical Practice Guidelines on the Management of Acute Limb Ischaemia de 2020, descrevem a isquemia crítica de membro como “uma doença dos idosos” e “um problema do final da vida”, relacionado a fragilidade. De Sucesso 67% Insucesso 33% F IB R IN Ó L IS E + AN G IO P L AS T IA Sucesso 70% Insucesso 30% F I B R I N Ó L I S E + A N G I O P L A S T I A + T R O M B E C T O M I A M E C Â N I C A 32 fato, a média de idade do grupo estudado foi de 68 anos, com apenas três pacientes com menos de 60 anos. Quanto ao gênero, a literatura não descreve uma preferência, apesar do presente estudo ser representado por um número maior de homens3. Também, como evidenciado em nosso estudo, a presença de HAS (presente em 84%), sobrepeso/obesidade (observado em 70% dos pacientes), tabagismo (61%), vasculopatia prévia (46%) e DM2 (38%) foram compatíveis com os principais fatores de risco de DAP descritos na literatura3. Como nosso trabalho não conseguiu registrar precisamente o método e tempo de infusão do rt-PA, fomos em busca de revisões sistemáticas recentes e encontramos os mais diversos protocolos. Bjork et al afirmam que a heterogeneidade nos protocolos de administração do rt-PA na isquemia crítica de membros inferiores impede a confecção de meta-análises, que, de fato, são inexistentes3. Decidimos utilizar como base teórica o recomendado pela ESVS, que seriam 40 mg como dose máxima de rt-PA dirigida por cateter intra-arterial. Em nosso trabalho, as doses de ataque variaram de 10-50 mg, ultrapassando o limite superior sugerido pelo guideline. No entanto, a dose de 50 mg foi feita em apenas uma ocasião isolada e não cursou com complicações hemorrágicas. A média foi calculada em 18,16 mg de dose de ataque. Em bomba de infusão a mesma fonte recomenda doses entre 0,02 e 0,1 mg/kg/hora, resultando numa média de 0,25-1 mg/hora de infusão. Nosso pequeno estudo acessou o registro de apenas uma administração em infusão, na qual foi utilizada a dose de 0,7 mg/hora. Quanto a efetividade das técnicas, percebemos melhores desfechos nos procedimentos que envolviam fibrinólise + angioplastia + trombectomia mecânica. As principais complicações descritas na literatura também foram observadas nessa pequena série de casos. O procedimento de fibrinólise + trombectomia mecânica apresentou a maior proporção de ocorrências, em três de quatro pacientes. Entretanto, nesse grupo todos os casos foram de sangramentos menores sendo prontamente controlados por meio de compressão. Os sangramentos maiores não foram resultado de instabilidade hemodinâmica, mas sim queda progressiva do hematócrito e não resultaram em óbitos. A literatura aponta taxas de sangramento 33 maior entre 8-10%3. A taxa encontrada no presente estudo foi superior (30%). Esse dado deve ser entendido como um viés devido a pequena casuística. Nesse trabalho também percebemos que a indicação de amputação parece se relacionar com uma maior taxa de mortalidade precoce assim como na literatura20. Dentre os 13 pacientes, quatro tiveram indicação de amputação, o que corresponde à 30%. Destes, dois evoluíram com morte em um ano. Creager et al calcularam que, mesmo com diagnóstico e tratamento adequados, a amputação é necessária em 10- 15% dos pacientes. Os mesmos autores calculam a mortalidade em 15-20% desde a apresentação do primeiro sintoma11. Em nossa pequena série de casos, essa porcentagem foi de 30%, também compreendida por nós como consequência da pequena casuística. 7 CONCLUSÃO O uso de rt-PA para tratamento de pacientes com isquemia crítica de membros inferiores parece ser um método seguro, apesar da possibilidade de complicações hemorrágicas. Como hipotetizado, as principais complicações descritas em bula, sangramento menor e maior, foram observados na incidência de aproximadamente 30% em nossa casuística. A pequena casuística não permitiu uma correlação entre dados clínicos e anatômicos com o desfecho. A base de dados consultada não forneceu informações suficientes para a sugestão de uma padronização do método, mas a dose de ataque observada encontra-se em concordância com os principais guidelines, sendo proposta dose máxima de 40 mg de rt-PA. Compreendemos que uma avaliação dos prontuários com informações mais detalhadas possa auxiliar na estruturação de um protocolo assistencial adequado. 34 REFERÊNCIAS 1. 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Apresentamos documentação com a declaração da instituição onde aconteceu a coleta de dados, se responsabilizando em fornecer os dados anonimizados. Nos comprometemos em manter a confidencialidade sobre os dados coletados e o anonimato dos indivíduos envolvidos, como estabelecido na Resolução CNS 466/2012 e suas complementares. Os dados foram coletados na Clínica Coris Medicina Vascular, a partir da base de dados anonimizada. A Clínica Coris Medicina Vascular possui uma série de protocolos de coleta de dados em vários tipos de doenças ou tratamentos efetuados nas suas dependências. Essas informações são anexadas a essa base de dados no momento do atendimento do paciente, sem nenhuma informação pessoal do indivíduo. Declaramos, ainda, estar cientes de que é nossa responsabilidade a integridade das informações e a privacidade dos participantes da pesquisa. Também nos comprometemos de que os dados coletados não serão repassados a pessoas não envolvidas na equipe da pesquisa. Estamos cientes do direito do participante da pesquisa em solicitar indenização por dano causado pela pesquisa (por exemplo a perda do anonimato) nos termos da Resolução CNS nº. 466, de 2012, itens IV.3 e V.7; e Código Civil, Lei 10.406, de 2002, artigos 927 a 954, Capítulos I, "Da Obrigação de Indenizar", e II, "Da Indenização", Título IX, "Da Responsabilidade Civil"). Os pesquisadores declaram conhecer e cumprir os requisitos da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei Nº 13.709, de 14 de agosto de 2018) quanto ao tratamento de dados pessoais e dados pessoais sensíveis que serão utilizados para a execução do presente projeto de pesquisa e se comprometem a conduzir o projeto e zelar pela confidencialidade dos dados e privacidade dos participantes, de acordo com as Resoluções CNS 510/2016 (pesquisas em Ciências Humanas e Sociais), bem como as demais normativas e legislações vigentes e aplicáveis. Os pesquisadores também 38 pactuam, por meio do Termo de Compromisso de Uso de Dados, que não terão acesso a informações pessoais passíveis de identificação do paciente, de forma que os dados acessados sejam puramente clínicos e epidemiológicos, obedecendo assim ao parágrafo único, item V da Resolução N0 510, de abril de 2016 do Conselho Nacional de Saúde. Nos comprometemos, ainda, com a guarda, cuidado e utilização das informações apenas para cumprimento dos objetivos previstos na pesquisa citada acima, e que somente foram coletados após a sua aprovação no protocolo de pesquisa no Sistema CEP/CONEP. 1 INTRODUÇÃO 2 OBJETIVO 2.1 Objetivo Geral: 2.2 Objetivos Específicos: 3 HIPÓTESE 4 MÉTODO 4.1 LOCAL 4.2 PARTICIPANTES 4.2.1 Critérios de inclusão 4.2.2 Critérios de exclusão 4.3 INSTRUMENTOS 5 RESULTADOS 6 DISCUSSÃO 7 CONCLUSÃO REFERÊNCIAS ANEXO A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido