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CARDIOLOGIA TEORIA E PRÁTICA Edição 7 Organizadores: Guilherme Barroso Langoni de Freitas Juliane Cristina de Almeida Paganini Hanan Khaled Sleiman 2023 2023 by Editora Pasteur Copyright © Editora Pasteur Editor Chefe: Dr Guilherme Barroso Langoni de Freitas Corpo Editorial: Dados Internacionais de Cata logação na Publicação (CIP) (Editora Pasteur, PR, Brasil) Dr. Alaercio Aparecido de Oliveira (Faculdade INSPIRAR, UNINTER, CEPROMEC e Força Aérea Brasileira) Ana Karolina Santos Góes (Universidade Estadual do Centro-Oeste - PR) Dra. Aldenora Maria Ximenes Rodrigues MSc. Aline de Oliveira Brandão (Universidade Federal de Minas Gerais - MG) MSc. Bárbara Mendes Paz (Universidade Estadual do Centro-Oeste - PR) Dr. Daniel Brustolin Ludwig (Universidade Estadual do Centro-Oeste - PR) Dr. Durinézio José de Almeida (Universidade Estadual de Maringá - PR) Dr. Everton Dias D’Andréa (University of Arizona/USA) Dr. Fábio Solon Tajra (Universidade Federal do Piauí - PI) Francisco Tiago dos Santos Silva Júnior (Universidade Federal do Piauí - PI) Dra. Gabriela Dantas Carvalho Dr. Geison Eduardo Cambri MSc. Guilherme Augusto G. Martins (Universidade Estadual do Centro-Oeste - PR) Dr Guilherme Barroso Langoni de Freitas (Universidade Federal do Piauí - PI) Dra. Hanan Khaled Sleiman (Faculdade Guairacá - PR) MSc. Juliane Cristina de Almeida Paganini (Universidade Estadual do Centro-Oeste - PR) Dra. Kátia da Conceição Machado (Universidade Federal do Piauí - PI) Dr. Lucas Villas Boas Hoelz (FIOCRUZ - RJ) MSc. Lyslian Joelma Alves Moreira (Faculdade Inspirar - PR) Dra. Márcia Astrês Fernandes (Universidade Federal do Piauí - PI) Dr. Otávio Luiz Gusso Maioli (Instituto Federal do Espírito Santo - ES) Dr. Paulo Alex Bezerra Sales MSc. Raul Sousa Andreza MSc. Renan Monteiro do Nascimento MSc. Talita Cristina Moreira Moraes (Centro Universitário Uniguairacá) Dra. Teresa Leal F866 FREITAS, GUILHERME BARROSO LANGONI DE Cardiologia Teoria e Prática. FREITAS, G.B.L. de et al. - Irati: Pasteur, 2023. 1 livro digital; 205 p.; ed. VII; il. Modo de acesso: Internet ISBN 978-65-815-4986-2 https://doi.org/10.29327/5198921 1. Medicina 2. Cardiologia 3. Cardiopatias I. Título. CDD 610 CDU 616.1 Este livro traz trabalhos sobre um dos sistemas vitais para nossa vida, responsável pelas principais incidências de mortalidade e morbidades, o sistema cardiovascular. Ele possui o coração como ator principal, caracterizado por batidas e frequências graciosamente rítmicas para distribuir sangue e oxigênio a todos os outros órgãos e manter a pressão arterial, filtração glomerular e tantas outras tarefas vitais. Até o final de 1800 a cirurgia cardíaca era algo impensado, entretanto, os avanços da ciência médica permitiram o advento de tratamentos eficientes, cirurgias minuciosamente realizadas de forma presencial e até remota, políticas públicas eficazes para prevenção, controle e tratamento das doenças cardiovasculares. Muitos estudantes, profissionais da área e pesquisadores tornaram este livro possível. Portanto, a Editora Pasteur deixa aqui o seu muito obrigado a todos e deseja uma ótima leitura nesta coletânea de estudos sobre o campo da Cardiologia. Guilherme Barroso Langoni de Freitas Dr. Prof. Dpto. Bioquímica e Farmacologia, Universidade Federal do Piauí (UFPI) Diretor Científico do Grupo Pasteur CAPÍTULO 1 - IMPLANTES CARDÍACOS: UMA REVISÃO DA HISTÓRIA, EVOLUÇÃO E APLICAÇÕES ....................................................... 1 CAPÍTULO 2 - MÉTODOS NÃO INVASIVOS DE DIAGNÓSTICO DE DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA ............................................................ 7 CAPÍTULO 3 - PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DOS ÓBITOS POR INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO NO BRASIL DE 2016 A 2020 .............................. 14 CAPÍTULO 4 - CONTROLE PRESSÓRICO DOS PACIENTES DE PÓS- OPERATÓRIO DE CIRURGIA CARDÍACA NA UTI .................................... 21 CAPÍTULO 5 - MANIFESTAÇÕES CARDIOVASCULARES EM PACIENTES COM COVID-19: REVISÃO DE LITERATURA ..................... 32 CAPÍTULO 6 - CARDIOMIOPATIA CHAGÁSICA: ASPECTOS ATUAIS SOBRE EPIDEMIOLOGIA, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO ................ 43 CAPÍTULO 7 - AS IMPLICAÇÕES CLÍNICAS DA HIPERTENSÃO ARTERIAL EM PACIENTES COM COVID-19: UMA REVISÃO DE LITERATURA ...................................................................................................... 59 CAPÍTULO 8 - ANÁLISE DOS IMPACTOS CARDIOVASCULARES DAS SÍNDROMES RENOCARDÍACAS: REVISÃO DE LITERATURA ............. 68 CAPÍTULO 9 - HIPERTENSÃO ARTERIAL RESISTENTE ........................ 76 CAPÍTULO 10 - COMPLICAÇÕES GERADAS PELO DIAGNÓSTICO TARDIO EM CASOS DE COMUNICAÇÃO INTERATRIAL ....................... 84 CAPÍTULO 11 - CIRURGIAS CARDÍACA CONGÊNITAS: EVOLUÇÕES E DESAFIOS ............................................................................................................. 89 CAPÍTULO 12 - HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA: ABORDAGEM CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICA ......................................................................... 97 CAPÍTULO 13 - DOENÇA REUMÁTICA DO CORAÇÃO: EPIDEMIOLOGIA E DIAGNÓSTICO EM FOCO ....................................... 112 CAPÍTULO 14 - UMA ABORDAGEM FISIOPATOLÓGICA DAS CRISES HIPERCIANÓTICAS NA TETRALOGIA DE FALLOT .............................. 119 CAPÍTULO 15 - TRANSPOSIÇÃO DE GRANDES ARTÉRIAS ................. 126 CAPÍTULO 16 - O MANEJO AO INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO (IAM): UMA REVISÃO DE LITERATURA ................................................... 133 CAPÍTULO 17 - PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DA INCIDÊNCIA DE OBITO POR INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO NAS REGIÕES BRASILEIRAS ................ 145 CAPÍTULO 18 - USO DE INIBIDORES DE SGLT-2 NO AUMENTO DA SOBREVIDA DE PACIENTES COM INSUFICIÊNCIA CARDÍACA SISTÓLICA .. 152 CAPÍTULO 19 - ENDOCARDITE INFECCIOSA: UMA REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................................................ 161 CAPÍTULO 20 - O IMPACTO DA SAÚDE MENTAL SOBRE O CORAÇÃO: UMA REVISÃO SISTEMATIZADA DA INTEGRAÇÃO CÉREBRO-CORAÇÃO ........ 168 CAPÍTULO 21 - ANÁLISE DA MORTALIDADE POR DOENÇAS CARDIOVASCULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DA BAIXADA SANTISTA ....................................................................................................................... 174 CAPÍTULO 22 - DESAFIOS NA APLICAÇÃO DA TERAPIA CELULAR NAS DOENÇAS CARDÍACAS ............................................................................................... 183 CAPÍTULO 23 - USO DE OXIGENAÇÃO POR MEMBRANA EXTRACORPÓREA APÓS REPERFUSÃO MIOCÁRDICA NO CONTEXTO DE SÍNDROME CORONARIANA AGUDA: UM RELATO DE CASO ............................................... 191 1 | P á g i n a 10.29327/5198921.7-1 CAPÍTULO 01 IMPLANTES CARDÍACOS: UMA REVISÃO DA HISTÓRIA, EVOLUÇÃO E APLICAÇÕES CARLOS ROBERTO GOMES DA SILVA FILHO1 MARIA EDUARDA BARACUHY CRUZ CHAVES1 PEDRO GUILHERME PINTO GUEDES PEREIRA1 MARIA FERNANDA STUART HOLMES ROCHA1 EGILMÁRIA LADJA CANDEIA BEZERRA1 MARIA ALICE SANTOS FALCONI DA COSTA3 LUIZ FELIPE MARTINS MONTEIRO1 BIANCA BRUNET CAVALCANTI1 LORENA SOUZA DOS SANTOS LIMA1 CAMYLLA FERNANDES FILGUEIRA DE ANDRADE1 JOAQUIM FRANCISCO DE MELO CAVACANTI FILHO1 ELISE MARIA ANACLETO DE ALBUQUERQUE3 JÉSSICA FREIRE MADRUGA VIANA2 BÁRBARA VILHENA MONTENEGRO1 VICTOR PIRES DE SÁ MENDES¹ 1Discente - Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ 2Discente – Faculdades Nova Esperança - FACENE/FAMENE 3Discente – Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba – FCM/Afya Palavras-chave: Implantes cardíacos; História; Evoluçãoe aplicações. 2 INTRODUÇÃO A atividade elétrica do coração humano foi registrada pela primeira vez por Augustus Wal- ler em 1887, utilizando o Trem de ECG de Wal- ler, parte do Arquivo BCS, como uma valiosa ferramenta de laboratório. No entanto, o galva- nômetro de corda de Willem Einthoven provou ser uma ferramenta mais eficaz como aparelho clínico. Sir Thomas Lewis, presidente da pri- meira reunião do Cardiac Club, foi pioneiro no uso do ECG na prática clínica, graças à sua cor- respondência com Einthoven. Isso é um dos pri- meiros exemplos dos benefícios da colaboração internacional, que foram fundamentais para o desenvolvimento da cardiologia clínica nos úl- timos 100 anos (AMMANNAYA, 2020). Em 1980, o mundo assistiu à revolução da medicina com a primeira implantação bem-su- cedida do ICD (Cardioverter-Desfibrilador Im- plante) em um ser humano. A jornada para esse feito começou com a morte trágica de um co- lega de Michel Mirowski, cirurgião cardíaco, em 1966. Determinado a encontrar uma solução para evitar mortes semelhantes, Mirowski co- meçou a trabalhar em sua ideia de um ICD. Com a ajuda de seus colegas de equipe e apoio financeiro de uma empresa de marcapassos, o primeiro protótipo foi testado com sucesso em um cão em 1969. Após anos de refinamentos e aprovação da Food and Drug Administration (FDA), o ICD foi finalmente implantado em hu- manos com sucesso no Hospital Johns Hopkins em 1980 (AMMANNAYA, 2020). O capítulo tem como objetivo ressaltar a im- portância dos implantes cardíacos ao longo da história da medicina. MÉTODO Uma revisão bibliográfica qualitativa e ex- plicativa de temporalidade serial para estudar o monitoramento móvel na gestão de pacientes em unidades de terapia intensiva. Realizada por meio de estudos publicados entre 2018 e 2023 na base de dados da PubMed. Os dados coleta- dos utilizaram os descritores DeCS/MeSH "Cardiac Pacemaker", "Cardiac Defibrilla- tors", “Evolution" e "History" em combinação com os operadores booleanos "AND" e “OR”. A coleta de dados resultou em 481 artigos, dos quais 33 foram descartados devido à falta do texto completo disponível e 443 foram des- cartados devido ao desvio do tema ou objetivo proposto, ausência do tratamento utilizado, falta de detalhamento das tecnologias de moni- toramento móvel na gestão de pacientes. Os dados coletados foram avaliados por 2 revisores de forma independente e cega, utili- zando o software RAYYAN®, onde os reviso- res selecionaram somente os artigos que cum- priram os critérios de inclusão para compor a síntese, em caso de discrepância enquanto a in- clusão do artigo, um terceiro revisor foi respon- sável pelo desempate. Assim, resultando em 5 artigos incluídos nessa síntese. Os critérios de inclusão utilizados: Artigos publicados entre ja- neiro de 2018 e janeiro de 2023, disponíveis em português, inglês ou espanhol e que contem- plem tecnologias de monitoramento móvel na gestão de pacientes. RESULTADOS E DISCUSSÃO No início da década de 1980, Tony Rickards desenvolveu o primeiro marcapasso responsivo à frequência do mundo, baseado em estudos so- bre os efeitos do exercício, da estimulação atrial e da estimulação ventricular fixa no intervalo QT. Esse sistema permitiu respostas fisiológi- cas ao exercício em pacientes com eletrodos de estimulação unipolar padrão de acordo com o 'Intervalo de estímulo-T'. A pesquisa continuou com o grupo de Richard Sutton publicando so- bre o uso da estimulação AV no tratamento da 3 hipersensibilidade do seio carotídeo e estu- dando a utilidade da estimulação em síncope cardioinibitória e neurogênica. Um estudo de Richard Charles em Liverpool examinou as ten- dências temporais da prescrição do modo mar- capasso em seu centro ao longo de 10 anos, de 1984 a 1994, e mostrou um uso crescente de es- timulação de dupla câmara. Dados fundamen- tais para informar a prescrição de marcapasso foram fornecidos pelos resultados do Estudo UKPACE em 2005, conduzido por William Toff e John Camm, que mostraram nenhum be- nefício significativo de mortalidade para esti- mulação de dupla câmara versus estimulação de câmara única em pacientes > 70 anos (HAYDOCK & CAMM, 2022; AMMAN- NAYA, 2020). Os ICDs de quarta geração, também conhe- cidos como ICDs modernos, são dispositivos cada vez menores e mais sofisticados. Eles têm um peso de 80-90 g e um volume de 30 mL, medindo menos de um centímetro de espessura. As baterias mais recentes, como as de lítio, prata e vanádio, têm duração de até 9 anos. Es- ses ICDs modernos possuem a capacidade de overdrive pacing, ou seja, ATP, o que frequen- temente pode encerrar arritmias sem recorrer à terapia de choque. Além disso, eles também es- tão disponíveis com estimulação biventricular (terapia de ressincronização cardíaca) para me- lhorar os sintomas em pacientes com insufici- ência cardíaca avançada. A importância dos avanços tecnológicos na área de dispositivos cardíacos eletrônicos implantáveis (DCEIs) na prestação de cuidados a pacientes tem permi- tido o monitoramento contínuo por anos e uma ampla gama de recursos de programação e tera- pias. O monitoramento remoto (RM) tem revo- lucionado o cuidado com o dispositivo, melho- rando a satisfação do paciente, reduzindo a hos- pitalização e melhorando a sobrevida entre os pacientes com DCEI (HAYDOCK & CAMM, 2022; AMMANNAYA, 2020). As indicações para implante de Cardiover- sor Desfibrilador Implantável (ICD) podem ser amplamente categorizadas como profilaxia pri- mária e profilaxia secundária contra morte sú- bita cardíaca (MSC). A profilaxia secundária é indicada para pacientes que já tiveram um epi- sódio de fibrilação ventricular (FV) ou taquicar- dia ventricular (TV) com risco de vida, en- quanto a profilaxia primária é indicada para pa- cientes com alto risco de desenvolver MSC, mas que ainda não tiveram nenhum episódio. Múltiplos ensaios clínicos randomizados mos- traram que os ICDs são claramente superiores aos medicamentos antiarrítmicos em pacientes com história de TV e FV com risco de vida e, portanto, as indicações para profilaxia secundá- ria são bem apoiadas por evidências clínicas. No entanto, as indicações para profilaxia primá- ria, que representam a maioria dos implantes de ICD, têm evidências comparativamente bem menos estabelecidas, pois o benefício quantita- tivo mensurável é menor (AMMANNAYA, 2020). Pesquisas recentes têm mostrado que a res- sincronização cardíaca (TRC) e a terapia com ICD têm eficácia clínica comprovada. Por exemplo, um estudo da Circulation Heart Fail, realizado em 2014, demonstrou a eficácia clí- nica da TRC e da terapia com ICD entre 8.936 pacientes ambulatoriais com insuficiência car- díaca e fração de ejeção (FE) reduzida ≤ 35% e encontrou uma redução substancial da mortali- dade em 24 meses em homens e mulheres ele- gíveis com insuficiência cardíaca e FE redu- zida. Uma edição da Circulation Arrhythmia and Electrophysiology de 2015, investigou a re- lação entre profilaxia primária de ICDs e mor- talidade em 852 pacientes de minorias raci- ais/étnicas (raça não branca ou etnia hispânica) 4 e 2.070 pacientes brancos não hispânicos. Paci- entes minoritários com ICD apresentaram uma taxa de mortalidade ajustada menor em 3 anos (44,9%) em comparação com seus equivalentes sem ICD (54,3%). Da mesma forma, pacientes brancos não hispânicos com ICD apresentaram uma taxa de mortalidade ajustada menor em 3 anos (47,8%) em comparação com seus equiva- lentes sem ICD (57,3%). Nenhuma relação sig- nificativa entre raça/etnia e menor risco de mor- talidade com ICD foi encontrada (POKOR- NEY et al., 2015; WILCOX et al., 2014; AM- MANNAYA, 2020). Vários ensaios clínicos randomizados mol- daram as indicações atuais para os CDIs (cardi- oversor-desfibrilador implantável). Alguns dos principais estudos incluem MADIT I & II, CAT, MADIT-CRT, PRESERVE EF e PRO- TECT-ICD. O estudo MADIT-I mostrou que o CDI salva vidas em pacientesde alto risco com doença coronariana. O estudo MADIT-II mos- trou que a terapia profilática com CDI foi asso- ciada a uma sobrevida significativamente me- lhorada em pacientes com cardiomiopatia is- quêmica, definida por doença cardíaca coroná- ria documentada e disfunção ventricular es- querda avançada, sem a necessidade de triagem para arritmias ventriculares ou indutibilidade por testes eletrofisiológicos. Juntos, esses estu- dos, bem como os resultados de vários outros estudos randomizados de CDI, indicam que a terapia com CDI é indicada em pacientes coro- narianos que atendem aos critérios de elegibili- dade MADIT-I ou MADIT-II (CHEUNG & DEYELL, 2018; AMMANNAYA, 2020). O estudo CAT não forneceu evidências a fa- vor do implante profilático de CDI em pacien- tes com CMD de início recente e fração de eje- ção do ventrículo esquerdo prejudicada. Paci- entes com insuficiência cardíaca classe I ou II da New York Heart Association, fração de eje- ção ≤ 30% e bloqueio de ramo esquerdo (BRE) obtêm benefício clínico substancial da TRC-D na forma de redução na progressão da insufici- ência cardíaca e redução no risco de taquiarrit- mias ventriculares. A terapia de ressincroniza- ção cardíaca (TRC) evoluiu, assim, como uma indicação de tratamento de Classe I com Nível de Evidência A, em pacientes com insuficiência cardíaca leve, fração de ejeção do ventrículo es- querdo deprimida e QRS largo. A classificação atual de SCD vs. NSCD falha em identificar eventos de VTA no momento da morte em uma proporção significativa de pacientes. A análise multivariada mostrou que os fatores indepen- dentemente associados à mortalidade por ATV incluíram TV/FV > 72 h antes do evento de mortalidade, hospitalização por insuficiência cardíaca e história de hipertensão. A incidência anual de MSC é de 0,6–1% em pacientes pós- IM com fração de ejeção do ventrículo es- querdo (FEVE) ≥ 40% (AMMANNAYA, 2020). Projeções futuras A evolução desses dispositivos tem sido constante, visando torná-los cada vez menores e equipados com algoritmos de detecção mais avançados. Um exemplo disso é o S-ICD (Sis- tema de Cardioversor Desfibrilador Subcutâ- neo), que não possui eletrodos no coração e pode ser uma opção para pacientes com alto risco de MSC (Morte Súbita Cardíaca). Além disso, a integração potencial com estimulação sem eletrodo pode tornar essa terapia acessível para uma população-alvo maior. Os S-ICDs também podem ser utilizados como dispositi- vos de monitoramento remoto para reconhecer fibrilação atrial, isquemia aguda ou desequilí- brio eletrolítico. Novos dispositivos ICD e CRT-D, como o novo Gallant, estão surgindo no mercado e incluem recursos como integra- 5 ção com aplicativos móveis, como o myMerlin- Pulse™, para simplificar a comunicação entre médicos e pacientes. A incorporação de tecno- logias avançadas, como inteligência artificial, também está sendo estudada para melhorar a capacidade de monitoramento dos pacientes. No entanto, é importante destacar que essas tec- nologias de ponta vêm com ameaças de segu- rança cibernética e, portanto, exigiriam os mais recentes controles de segurança cibernética e parcerias com especialistas em segurança ciber- nética do setor para fornecer informações sobre o design e o teste desses controles para fornecer uma experiência segura e contínua (AMMAN- NAYA, 2020). O monitoramento remoto é uma tecnologia que tem evoluído ao longo dos anos. Os primei- ros dispositivos usavam transtelefônicos moni- toramento (TTM) para a transmissão de dados, onde os pacientes tinham que ligar para um sistema central e transmitir manualmente infor- mações básicas do dispositivo. Já os dispositi- vos modernos usam tecnologias indutivas ou sem fio, fornecendo uma interrogação mais abrangente e permitindo a transmissão de dados por meio de conexões telefônicas ou de banda larga. Alguns dispositivos mais recentes, ainda, se conectam diretamente a uma rede celular, eli- minando a necessidade de uma conexão fixa. Além disso, pode ser dividido em dois tipos: Monitoramento passivo e monitoramento ativo. O monitoramento passivo se refere a transmis- sões programadas pelo paciente, que fornecem todas as informações de diagnóstico necessárias para avaliar o funcionamento do dispositivo e reduzir significativamente a necessidade de acompanhamento presencial. Já o monitora- mento ativo se refere à transmissão automati- zada e antecipada de diagnósticos em caso de falha do dispositivo ou eventos clínicos. Isso pode salvar vidas em caso de falha do disposi- tivo, mas também pode resultar em alertas des- necessários, se não programado adequadamente (CHEUNG & DEYELL, 2018). CONCLUSÃO A história dos implantes cardíacos tem evo- luído ao longo dos anos, desde o primeiro mar- capasso artificial no final da década de 1950 até os dispositivos mais recentes, como os Cardio- versores Desfibriladores Implantáveis (ICDs) e os Dispositivos de Ressincronização Cardíaca (TRC). Esses dispositivos têm sido amplamente utilizados na profilaxia primária e secundária contra a morte súbita cardíaca, e vários estudos clínicos randomizados têm mostrado a sua efi- cácia. No entanto, as indicações para a profila- xia primária ainda têm evidências comparativa- mente menos estabelecidas. Além disso, pes- quisas recentes têm mostrado que a TRC e a te- rapia com ICD têm eficácia clínica compro- vada, incluindo uma redução substancial da mortalidade em pacientes com insuficiência cardíaca e fração de ejeção reduzida. Ainda as- sim, é importante continuar estudando os bene- fícios e riscos desses dispositivos e aplicá-los de forma seletiva e individualizada para cada paciente. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMMANNAYA, G.K.K. Implantable cardioverter de- fibrillators – the past, present and future. Archives of Medical Science – Atherosclerotic Diseases, v. 5, n. 1, p. 163-170, 2020. CHEUNG, C.C. & DEYELL, M.W. Remote monitoring of cardiac implantable electronic devices. Canadian Journal of Cardiology, v. 34, n. 7, p. 941-944, 2018. HAYDOCK, P. & CAMM, A.J. History and evolution of pacing and devices. Heart, v. 108, n. 10, p. 794-799, 2022. POKORNEY, S.D. et al. Primary prevention implanta- ble cardioverter-defibrillators in older racial and ethnic minority patients. Circulation: Arrhythmia and Elec- trophysiology, v. 8, n. 1, p. 145-151, 2015. WILCOX, J.E. et al. Clinical effectiveness of cardiac resynchronization and implantable cardioverter-defibril- lator therapy in men and women with heart failure. Cir- culation: Heart Failure, v. 7, n. 1, p. 146-153, 2014. 7 10.29327/5198921.7-2 CAPÍTULO 02 MÉTODOS NÃO INVASIVOS DE DIAGNÓSTICO DE DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA LÍVIA COUTO MELO 1 LUISA REIS RIBEIRO1 PEDRO VINICIUS SILVA PEREIRA1 1Discente – Medicina da Universidade do Vale do Sapucaí Palavras-chave: Doença arterial coronariana; Diagnóstico invasivo; Diagnóstico não invasivo. 8 INTRODUÇÃO No Brasil, a estimativa de prevalência de angina na população é de 7,6% de casos leves e de 4,2% de casos moderados a graves. Somente no ano de 2015, os gastos relacionados às doen- ças cardiovasculares contabilizaram um total de 31,7 bilhões de reais (CARMO et al., 2021). A cineangiocoronariografia (CAT), que é um exame invasivo, é considerada padrão-ouro para o diagnóstico de doenças arteriais corona- rianas (DAC). Entretanto, o ideal é que testes diagnósticos não invasivos sejam realizados primeiramente, com a finalidade de selecionar quais pacientes devem ser submetidos à confir- mação diagnóstica invasiva, visando reduzir o número de CATs desnecessárias (CARMO et al., 2021). Assim, esse capítulo visa explicar os parâ- metros, as contraindicações e a forma que são realizados os seguintes exames: Ecocardiogra- fia de estresse (EE), cintilografia miocárdica (CM),teste ergométrico (TE) e angiotomogra- fia (ATC). MÉTODOS Para a realização deste capítulo de livro foi feita uma pesquisa baseando-se primariamente no artigo ‘Análise da Custo-efetividade da an- giotomografia coronariana no SUS, em compa- ração com outros métodos não invasivos na sus- peita de DAC estável’. Com base no artigo mencionado fez-se uma busca na internet em diversas bases de dados tais como PubMed, Sci- ELO, Medline e em sites referências da área da saúde como orientações e diretrizes publicadas pela Sociedade Brasileira de Cardiologia. Den- tre os artigos e publicações encontradas, foram selecionados os mais novos e que apresentavam mais evidência científica, tendo como critério a pirâmide de evidência já conhecida, começando com revisões sistemáticas e metanálises até chegar às publicações de menor evidência que são elas: Opiniões de especialistas e relatos de caso. Após aplicados os critérios de seleção cita- dos, os textos restantes foram avaliados e dis- cutidos em grupo, e os métodos foram descritos separadamente, para então, na conclusão, base- ando-se no artigo, apresentarmos os métodos e as combinações deles mais eficazes no diagnós- tico de DAC de forma não invasiva. RESULTADOS E DISCUSSÃO Ecocardiografia de estresse A Ecocardiografia de Estresse (EE) é um método diagnóstico não invasivo de DAC fre- quentemente usado em pacientes admitidos no setor emergencial com dor torácica, enzimas cardíacas normais, ECG não interpretável e com suspeita de angina instável de risco baixo ou intermediário (CAMAROZANO et al., 2009). A indução do estresse pode ser por esforço físico ou por administração farmacológica. No estresse por esforço físico utiliza-se de uma es- teira, seguindo o protocolo de Bruce com ob- tenção de imagens em repouso e logo após o término do esforço; ou de uma bicicleta ergo- métrica, colocada em posição vertical ou su- pina, com aquisição de imagens em repouso, no pico de esforço e na recuperação. A movimen- tação excessiva do paciente aumenta a dificul- dade de captação de imagens nítidas, sendo um fator limitante para a realização do EE por es- forço físico. Já no estresse por administração farmacológica, faz-se a aplicação de doses cres- centes de dobutamina, com possível associação à atropina, visando atingir a frequência cardíaca máxima prevista para a idade do paciente. A aquisição das imagens se faz no estado basal, no pico de estresse e na recuperação. A escolha da técnica utilizada irá depender da capacidade 9 do paciente de realizar esforço físico, da expe- riência do profissional e da disponibilidade de equipamento (MATHIAS JUNIOR, 2013; CASTRO FILHO, 2019). O estímulo ao estresse permite constatar al- terações cardíacas por meio da incitação de is- quemia miocárdica em regiões irrigadas por uma artéria com grau significativo de estenose. Tais alterações poderiam estar ausentes durante o repouso, o que não excluiria a presença de DAC (CAMAROZANO et al., 2009; BARBE- RATO et al., 2019). Quando ocorre a isquemia miocárdica, tem- se uma modificação no movimento e no espes- samento da parede ventricular que pode ser identificada, através do EE, pelo modelo de di- visão do ventrículo esquerdo (VE) em 17 seg- mentos. Cada porção é analisada e classificada em um dos seguintes escores de função: 1 = contração normal (contratilidade miocárdica e espessamento ventricular adequados), 2 = hipo- cinesia (diminuição da contratilidade miocár- dica e espessamento ventricular em menos 40%), 3 = acinesia (ausência de contratilidade miocárdica e espessamento ventricular em me- nos de 10%) e 4 = discinesia (alteração da dire- ção do movimento miocárdico e adelgaçamento ventricular). Ao final da avaliação faz-se a mé- dia entre os escores atribuídos aos segmentos, conhecida como índice de escore de motilidade e espessamento de parede (IEMP). O IEMP igual a 1 indica função normal, já valores iguais ou acima de 2, correlacionam a importante dis- função do VE, com aumento da probabilidade de ocorrência de arritmias graves, insuficiência cardíaca e morte. Assim, o EE é capaz de ava- liar a extensão, a localização e a gravidade da lesão isquêmica, fornecendo dados relaciona- dos ao diagnóstico e ao prognóstico e possibili- tando a estratificação de risco para eventos car- díacos futuros (CAMAROZANO et al., 2009; MATHIAS JUNIOR, 2013). Entre as contraindicações para a realização do EE estão: Dor precordial anginosa típica em repouso de início recente (angina de início re- cente), ou pacientes em período após IAM com- plicado; estenose ou insuficiência valvar grave; pacientes com instabilidade hemodinâmica ou clínica (angina instável grave, cardiomiopatia descompensada, endocardite/miocardites agu- das); gravidez; dissecção de aorta; relato de alergia às drogas a serem utilizadas nos testes farmacológicos (MATHIAS JUNIOR, 2013). Cintilografia miocárdica A Cintilografia é um exame realizado para diagnosticar, de forma precoce e com elevada precisão, os padrões da perfusão miocárdica, sendo possível detectar anormalidades, cuja ex- tensão e intensidade podem estar associadas a eventos adversos (SANTORO, 2018). Para realizar a investigação são necessárias duas etapas. A primeira consiste na injeção in- travenosa de uma droga radioativa ou um radi- ofármaco. O paciente é deixado em repouso e, partir disso, imagens do fluxo sanguíneo são co- letadas após um intervalo de 30 a 60 minutos pelo gama câmara, tecnologia capaz de captar os sinais emitidos pelo medicamento radioa- tivo. Iniciando a segunda fase, o alvo do teste é posto em uma situação de esforço físico. O es- tresse pode ser causado por uma atividade física monitorada, ou por algum medicamento que in- duz o aumento do fluxo sanguíneo nas artérias coronárias, como o dipiridamol ou dobutamina. Quando a dilatação máxima das artérias coro- narianas for atingida, novamente será injetada a mesma substância radioativa a fim de marcar o quão perfundido está sendo o musculo cardíaco. 10 Ao final do exame, é feita a associação das imagens das etapas de repouso e estresse e a in- terpretação, através de scores que analisam as variáveis: Repouso ou estresse, isquemia ou perfusão (FEITOSA, 2002). A análise dos re- sultados obtidos inicia-se ao dividir o ventrí- culo esquerdo em 17 partes, a cada uma é atri- buída valores conforme o grau de defeito perfu- sional variando de 0 (perfusão normal) a 4 (is- quemia total). A apuração deve levar em conta a análise obtida, bem como os parâmetros com- parativos com bancos de dados de indivíduos normais, fornecidos por softwares. Após a atri- buição dos índices para cada região miocárdica tanto em estresse quando em repouso, os valo- res devem ser somados, obtendo a somatória dos sores SS (Summed Scores). A somatória dos scores na imagem de repouso é chamada de SRS (Summed Rest Score) e expressa a exten- são e a intensidade de defeito perfusional em re- pouso e, portanto, a área fibrótica do músculo cardíaco. A somatória dos scores na fase de re- pouso é chamada SSS (Summed Stress Score) e infere as áreas hipoperfundidas durante a indu- ção do stress, representando áreas infartadas ou isquêmicas, que podem ser iguais ou maiores que os defeitos vistos em repouso. A somatória destes scores diferenciais é chamda SDS (Sum- med Difference Score), e dirá exatamente a ex- tensão do miocárdico que apresenta reversibili- dade de perfusão induzida pelo estresse e, por- tanto, áreas isquêmicas em risco (SANTORO, 2018). A cintilografia de perfusão miocárdica é de alta sensibilidade (85-91%) e especificidade (85-87%), e um elevado valor preditivo nega- tivo (> 99%), o que garante ao estufo normal uma predição de risco de eventos cardíacos (morte e infarto agudo) inferior a 1% ao ano (SANTORO, 2018). A duração total do teste, contemplando as duas etapas, tem um intervalo variável de qua- tro a seis horas. Já os resultados das imagens são obtidos de 15a 60 minutos após a conclusão das duas etapas (SANTORO, 2018). As contraindicações são reservadas às mu- lheres grávidas ou lactentes, pelo uso de drogas radioativas (FEITOSA, 2002). Os riscos refe- rentes à execução do exame são mais esperados na cintilografia do miocárdio com estresse far- macológico devido aos efeitos colaterais do medicamento, que podem ser: Sensação de ca- lor na cabeça, dor no peito, enxaqueca, tonturas, diminuição da pressão arterial, falta de ar, en- joos. Contudo, na maioria das vezes, a inspeção não provoca sequelas e não é necessário inter- nação hospitalar (SANTORO, 2018). Teste ergométrico O Teste Ergométrico, hoje, é o teste mais usado e indicado para diagnóstico de doenças cardiovasculares, sendo também usado para avaliar resposta terapêutica, sintomas de arrit- mias ao exercício físico e determinação prog- nóstica. Esse possui baixo custo e fácil reprodu- ção em todas as regiões do Brasil, tornando-lhe um dos principais exames cardiológicos não in- vasivos presentes para estudo dos pacientes (MENEGHELO et al., 2010). O TE foi introduzido no país em 1960, no Instituto de Cardiologia do Estado de Guana- bara, atual Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro. Entretanto, foi introduzido na prática clínica somente em 1972, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (MENE- GHELO et al., 2010). Esse exame possibilita detectar isquemia miocárdica; reconhecer arritmias cardíacas e distúrbios hemodinâmicos induzidos pelo es- forço; avaliar a capacidade funcional e a condi- ção aeróbica; diagnosticar e estabelecer o prog- 11 nóstico de determinadas doenças cardiovascu- lares; prescrever exercício; avaliar objetiva- mente os resultados de intervenções terapêuti- cas; demonstrar ao paciente e aos seus familia- res as suas reais condições físicas e fornecer da- dos para perícia médica. O teste ergométrico trata-se de um procedi- mento de baixo risco, mesmo assim é impor- tante que o profissional que irá conduzir o teste seja capacitado para atuar em caso de uma emergência, tal como uma PCR, além da sala de procedimento possuir os equipamentos neces- sários (MENEGHELO et al., 2010). A ergoespirometria alia os resultados eletro- cardiográficos às análises das variáveis ventila- tórias, aferidas durante a prática de exercício fí- sico de intensidade crescente. É levado em conta também a avaliação subjetiva do paciente quanto à sensação de cansaço, que deve ser me- dido conforme a escala de Borg. No exame são geradas informações tais como: -Consumo de oxigênio (VO2) e produção de gás carbônico (VCO2); -Equivalente ventilatório de oxigênio (VE/VO2) e do gás carbônico (VE/VCO2); -Pulso de oxigênio (VO2/FC); -Quociente respiratório (RQ); -Parâmetros hemodinâmicos como pressão ar- terial (PA) e frequência cardíaca (FC); -Parâmetros eletrocardiográficos. Angiotomografia coronariana A Angiotomografia Coronariana (ATC) consiste em uma tomografia computadorizada das artérias coronárias, o que permite a identi- ficação de alterações na estrutura e no funcio- namento desses vasos, sendo uma modalidade não invasiva de diagnóstico de DAC (MORSCH, 2018). As indicações para realização deste exame dependem das características clínicas apresen- tadas pelo paciente, podendo elas variarem de um quadro sintomático não agudo ou uma ava- liação pós-operatória, a uma avaliação em casos sintomáticos em caráter de urgência. A partir dos dados coletados, é feita uma estratificação por escores, que irá definir qual o grau de reco- mendação do exame. De 7 a 9, a realização ge- ralmente é aceita e a abordagem é racional e aceitável para a indicação. Escores de 4 a 6, a realização e a abordagem são tidas como acei- tável e razoável, respectivamente. Já de 1 a 3, geralmente não é aceita a realização e a aborda- gem é tida como não razoável (SASDELLI NETO, 2013). O preparo para o exame exige jejum com- pleto por pelo menos 4 horas, não ingestão de bebidas cafeinadas e de remédios para trata- mento de disfunção erétil nas 48 horas anterio- res, possível administração oral ou intravenosa de betabloqueadores para diminuir a frequência cardíaca, que deve ficar entre 60 e 65 batimen- tos por minuto (MORSCH, 2018). A angiotomografia não é recomendada para gestantes, pessoas alérgicas ao contraste de iodo (MORSCH, 2018). Durante a realização do exame, o ritmo car- díaco do paciente é registrado com o auxílio de um eletrocardiograma, para que imagens gera- das pelo tomógrafo possam ser sincronizadas com o movimento do coração (sístole e diás- tole). Além disso, faz-se a injeção endovenosa de contraste iodado que circulará na corrente sanguínea, o que permite uma melhor visualiza- ção das artérias coronárias. Alguns pacientes podem referir sensação de calor após a injeção do contraste. Em seguida, o paciente é subme- tido à tomografia, gerando imagens com re- curso 3D. A partir dessas imagens é possível vi- sualizar o lúmen e as paredes das artérias, iden- tificado a possível presença de placas calcifica- das e de placas gordurosas que serão quantifi- 12 cadas quanto ao grau de obstrução do vaso. As- sim, faz-se o diagnóstico não invasivo de DAC, fornecendo informações, quanto ao tipo e ao grau da lesão, importantes para a tomada de de- cisões em relação aos próximos passos no trata- mento (AZEVEDO et al., 2012; MORSCH, 2018). Atualmente, a dose de radiação efetiva esti- mada do exame pode ser reduzida por meio de tomógrafos de última geração, com múltiplos detectores, sem alterações significativas na acu- rácia diagnóstica da imagem (SASDELLI NETO, 2013). Associado à angiotomografia, também pode ser solicitado a avaliação do Escore de Cálcio, um importante indicador de aterosclerose nas artérias, que irá agregar mais informações ao di- agnóstico final (AZEVEDO et al., 2012; MORSCH, 2018). CONCLUSÃO Após a pesquisa, concluiu-se que há diversas modalidades de diagnóstico não invasivo de doença arterial coronariana, sendo que o SUS não contempla apenas a angiotomografia. Com isso, torna-se cada vez menos necessário o di- agnóstico invasivo pela cineangiocoronariogra- fia, evitando possíveis complicações vascula- res, vagais, isquêmicas e alérgicas, associadas a esse procedimento. Assim, a escolha da melhor estratégia diagnóstica não invasiva dependerá da disponibilidade de recursos financeiros de cada instituição para arcar com as despesas da realização desses exames e da capacitação da equipe médica responsável. 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO, C.F. et al. Escore de cálcio e angiotomo- grafia coronariana na estratificação do risco cardiovas- cular. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 98, n. 6, 2012. BARBERATO, S.H. et al. Posicionamento sobre indica- ções da ecocardiografia em adultos – 2019. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 113, n. 1, p.135-18, 2019. CAMAROZANO, A. et al. Sociedade Brasileira de Car- diologia. Diretrizes das indicações da ecocardiografia. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 93, n. 6, supl.3, p. 265-302, 2009. CARMO, P.B.C. et al. Análise da custo-efetividade da angiotomografia coronariana no SUS, em comparação com outros métodos não invasivos na suspeita de DAC estável. Instituto Nacional de Cardiologia, 2021. CASTRO FILHO, J.J.S. Ecocardiografia de estresse na sensibilidade diagnóstica de doença arterial coronariana: Uma revisão sistemática. 2019. Dissertação (Mestrado) - Curso de Medicina, Centro Biomédico, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 2019. FEITOSA, G.S. et al. I Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia Sobre Cardiologia Nuclear. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 78, supl 3, 2002. MATHIAS JUNIOR, W. Manual de ecocardiografia. 3. ed. Barueri, SP: Manole, 2013. MENEGHELO, R.S. et al. III Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Teste Ergométrico. Ar- quivos Brasileiros de Cardiologia,2010. MORSCH, Dr. J.A. O que é, para que serve e riscos do exame de angiotomografia. 2018. Disponível em: https://telemedicina- morsch.com.br/blog/angiotomografia. Acesso em: 16 jan. 2023. ROSSATO, G. et al. Análise das complicações hospita- lares relacionadas ao cateterismo cardíaco. Revista Bra- sileira de Cardiologia Invasiva, v. 15, 2007. SANTORO, V. Cintilografia do miocárdio. DIMEN medicina nuclear. Disponível em: <https://www.dimen.com.br/medicina-nucle- ar/cintilografia-do-miocardio-2/> Acesso em: 16 jan. 2023. SASDELLI NETO, R. et al. Angiotomografia computa- dorizada de coronárias com tomógrafo com 320 fileiras de detectores e utilizando o AIDR-3D: Experiência ini- cial. Einstein, São Paulo, v. 11, n. 3, jul. 2013. https://www.dimen.com.br/medicina-nuclear/cintilografia-do-miocardio-2/ https://www.dimen.com.br/medicina-nuclear/cintilografia-do-miocardio-2/ 14 10.29327/5198921.7-3 CAPÍTULO 03 PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DOS ÓBITOS POR INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO NO BRASIL DE 2016 A 2020 CLARA CECÍLIA RODRIGUES MENDES1 ALYNE ANNE SILVA BARRETO3 BRENDHA KETLYN ANDRADE SILVA2 RAFAELLA ALVES PEREIRA1 GABRIEL VICENTE CORREIA1 GIULIA AMORIM PIRES MIRANDA1 INGRID MIKAELLY CARDOSO CAVALCANTE1 JANAÍNA PACHECO OLIVEIRA E SOUZA1 JOÃO MARCOS GUIMARÃES DE OLIVEIRA1 JORDANNA ARAUJO PRAXEDES1 LARA CARVALHO PAIVA1 MARIANNE LACERDA BARRETO2 SABRINNA RODRIGUES SANTOS1 THAYANA DE MATTOS NOGUEIRA1 LARA CÂNDIDA DE SOUSA MACHADO4 1Graduanda – Faculdade de Medicina, Universidade de Rio Verde – GO 2Graduanda – Faculdade de Fisioterapia, Universidade de Rio Verde – GO 3Graduada – Faculdade de Educação Física, Universidade estadual de Goiás – GO 4Docente – Prof.a Ma. da Faculdade de Medicina pela Universidade de Rio Verde - GO Palavras-chave: Infarto; Cardiologia; Mortalidade. 15 INTRODUÇÃO O Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) cor- responde a uma necrose miocárdica resultante de obstrução aguda de uma artéria coronária. Decorre, principalmente, de aterosclerose, em que placas de gordura se fixam nos vasos san- guíneos e com o seu rompimento formam-se coágulos. Dessa forma, ocorre a interrupção do fluxo sanguíneo, o que gera isquemia do mús- culo cardíaco (MENDES et al., 2022). Esse fenômeno está entre as maiores causas de morte no Brasil e no mundo, sendo a doença cardiovascular que mais leva a óbito nas pri- meiras horas após o início dos sintomas, em que 65% das mortes acontecem na primeira hora e 80% nas primeiras 24 horas após a manifesta- ção dos sintomas. Além disso, sabe-se que os principais fatores que contribuem para o desen- cadeamento do IAM estão ligados a condições modificáveis como uso abusivo de drogas líci- tas e ilícitas, sedentarismo e obesidade (FREI- TAS et al., 2021). O diagnóstico dessa doença pode ser reali- zado por vários métodos, mas o eletrocardio- grama (ECG) é considerado um exame comple- mentar para avaliação cardiológica rápida, de fácil realização e de baixo custo. Por mais que tenha uma baixa sensibilidade nas síndromes coronarianas agudas, o eletrocardiograma con- tinua sendo um exame muito utilizado capaz de fornecer dados diagnósticos, evolutivos e prog- nósticos das doenças cardiovasculares (BEET et al., 2022). Quanto aos exames laboratoriais, diversos avanços na busca de novos biomarca- dores para o diagnóstico dessa doença estão ocorrendo. Contudo, as troponinas e creatino- quinases continuam sendo as mais usadas pelos laboratórios, especialmente por serem reco- mendadas pela SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia) (MOREIRA et al., 2022). A gravidade dessa doença remete a necessi- dade de novas pesquisas que esclareçam e con- tribuam para a diminuição do índice de casos, visto que há uma alta prevalência de mortali- dade e morbidade da doença (SOBRINHO et al., 2015). Assim, o objetivo do presente capítulo é de- finir o perfil epidemiológico dos óbitos por in- farto agudo do miocárdio no Brasil de 2016 a 2020. MÉTODO Trata-se de um estudo ecológico transversal e descritivo, com abordagem quantitativa do perfil epidemiológico dos óbitos por infarto agudo do miocárdio no Brasil de 2016 a 2020. Nos estudos ecológicos, compara-se a ocorrên- cia de uma patologia com a exposição de inte- resse entre agregados de indivíduos como por exemplo populações de países, regiões ou mu- nicípios com o objetivo de verificar a possível existência de associação entre elas (LIMA- COSTA et al., 2003). Os estudos transversais se caracterizam por observarem as variáveis em um momento proposto (uma única vez, sem acompanhamento dos participantes) e os descri- tivos são aqueles que propõe a descrição deta- lhada e organizada de um ou mais fenômenos. Ademais o termo quantitativo, refere-se à expo- sição de números (ZANGIROLAMI-RAI- MUNDO et al., 2018). Incluiu-se na pesquisa dados das “Estatísti- cas Vitais” no item “Mortalidade – desde 1996 pelo CID-10” especificamente os registros da sessão “Mortalidade Geral” contidos no Sis- tema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Foram considerados como critérios de ele- gibilidade, casos de morte por infarto agudo do 16 miocárdio contidos no Brasil entre janeiro de 2016 e dezembro de 2020. Para a avaliação do perfil epidemiológico utilizou-se as variáveis: Causa CID-BR-10 (068.1), faixa etária, sexo, ano, região e etnia. Os critérios de exclusão fo- ram dados qualitativos e anteriores a dezembro de 2015. A análise de dados foi feita e organizada em gráficos, a partir do software Microsoft Excel®, contendo as quantidades de óbitos por infarto agudo do miocárdio. Calculou-se a taxa de mor- talidade, frequência absoluta e percentual para em um segundo momento descrever em forma discursiva uma comparação entre os principais indicadores em que ocorreram oscilações nos números de casos em todo o Brasil. RESULTADOS E DISCUSSÃO Análise dos óbitos por infarto agudo do miocárdio segundo região geográfica Entre 2016 e 2020 foram registrados 466.099 óbitos por infarto agudo do miocárdio. A região com maior número de casos foi a Su- deste com 46,15% (n= 215.093), seguida do Nordeste 27,98% (n= 130.403), Sul 13,59% (n= 63.343), Centro-Oeste 6,64% (n= 30.967) e Norte 5,64% (n= 26.293). Consoante Mendes (2022) apesar da maior suscetibilidade de casos da Região Sudeste, destaca-se a relevância de atenção que deve ser oferecida às regiões menos favorecidas finan- ceiramente, visto que a dificuldade de acesso a serviços de saúde e desinformação sobre as do- enças, causam por consequência uma maior quantidade de óbitos nesses locais (MENDES et al., 2022). Dessa forma, tanto o estudo de Mendes que destacou o perfil dos óbitos por IAM no Brasil entre 2011 e 2021, quanto o pre- sente estudo que analisou o período de 2016 a 2020, concordam no ponto em que a região Su- deste é que ocorre maior percentual de mortes. Entretanto, é válido ressaltar que essa região também é a mais populosa do Brasil, o que con- tribui para uma maior concentração do número de casos. Assim, é coerente a análise da taxa de mor- talidade, visto que ela considera não só o nú- mero de casos, mas considera também a popu- lação de cada região. Dessa forma, constata-se que em todos os anos analisados o Sudeste ob- teve maiores taxas de mortalidade quando com- parada as demais regiões do Brasil sendo o ano de 2016 o de maior taxa com 50,79 óbitos a cada 100 mil habitantes, conforme ilustrado na Tabela 3.1. Tabela 3.1 Taxa de mortalidade por infarto agudo do miocárdio no Brasil, segundo região geográfica, de 2016 a 2020 Taxa de Morta- lidade 2016 2017 2018 2019 2020 Região Norte 27,16 28,91 29,02 29,57 29,79 Região Nor- deste 45,10 45,95 46,37 47,39 43,67 Região Sudeste 50,79 48,93 48,64 50,15 46,85 Região Sul 46,65 42,20 42,74 41,81 39,26 Região Centro- Oeste 38,75 38,4539,13 38,09 38,12 Fonte: DATASUS, 2023. 17 Análise dos óbitos por infarto agudo do miocárdio segundo ano De acordo com os dados obtidos no DATA- SUS, observa-se que os óbitos do ano de 2016 representam 20,20% (n= 94.148) dos casos, 2017 um percentual de 19,88% (n= 92.657), 2018 equivale a 20,01% (n= 93.272), 2019 tra- duz 20,50% (n= 95.557) e 2020 corresponde a 19,41% (n= 90.465). Desse modo, avista-se que o ano de 2019 registrou o maior número de óbi- tos e 2020 a menor quantidade, entretanto, os anos analisados mantiveram uma certa homo- geneidade no número de óbitos, visto que não houve diferenças expressivas entre eles. Além disso, as taxas de mortalidade variaram entre 42,55 óbitos a cada 100 mil habitantes em 2020 e 45,66 mortes a cada 100 mil habitantes em 2016, conforme a Tabela 3.2. Mediante o estudo de Sant’Anna (2021), em 2010 constatou-se que houve aproximadamente 79 mil óbitos relacionados ao IAM (SANT’ANNA et al., 2021). Assim, ao compa- rar os estudos, compreende-se que aconteceu uma elevação de 14,51% (n= 11.465) no nú- mero de óbitos por IAM de 2010 para 2020. Tabela 3.2 Número de casos anuais de óbitos por infarto agudo do miocárdio no Brasil de 2016 a 2020 Ano 2016 2017 2018 2019 2020 Frequência absoluta 94.148 92.657 93.272 95.557 90.465 População (milhões) 206,2 207,8 209,5 211 212,6 Taxa de Mortalidade (por 100 mil habitantes) 45,66 44,59 44,52 45,29 42,55 Fonte: DATASUS, 2023; IBGE, 2022. Análise dos óbitos por infarto agudo do miocárdio segundo faixa etária Observou-se que as três faixas etárias de maior número de casos de óbitos entre 2016 e 2020 foram as de 80 anos ou mais com 26,87% (n= 125.257), seguida das pessoas com idade entre 70 e 79 anos com 25,02% (n= 116.626) e posteriormente pela de indivíduos entre 60 e 69 anos com 23,83% (n= 111.079). Assim, obser- vamos que pessoas com 60 anos ou mais repre- sentam 75,72% do total de óbitos por infarto agudo do miocárdio entre o período analisado, isso pode ser visto na Tabela 3.3. Um estudo realizado por Freitas (2021), constatou que o perfil epidemiológico do paci- ente com infarto agudo do miocárdio contempla maior prevalência do sexo masculino e o início das manifestações clínicas ocorre predominan- temente entre os 45 e 50 anos de idade (FREI- TAS et al., 2021). Logo, vê-se que o intervalo de idade em que ocorrem os maiores índices de início de sintomas está muito próximo da faixa etária em que acontecem maiores números de óbitos por IAM. Tabela 3.3 Número de óbitos por infarto agudo do mio- cárdio no Brasil, conforme faixa etária, entre os anos de 2016 a 2020 Faixa Etária Frequência Absoluta TOTAL 466.099 Menor 1 ano 7 1 a 4 anos 13 5 a 9 anos 13 10 a 14 anos 38 15 a 19 anos 497 20 a 29 anos 2.744 30 a 39 anos 9.322 40 a 49 anos 29.756 50 a 59 anos 70.393 60 a 69 anos 111.079 70 a 79 anos 116.626 18 80 anos e mais 125.257 Idade ignorada 354 Fonte: DATASUS, 2023. Análise dos óbitos por infarto agudo do miocárdio segundo sexo Segundo o sexo, entre 2016 e 2020 o nú- mero de óbitos por infarto agudo do miocárdio foi maior em homens com um percentual de 59,14% (n= 275.656). Já as mulheres represen- tam um percentual de 40,85% (n= 190.407). É válido acrescentar que 36 casos foram ignora- dos, esses dados estão ilustrados no Gráfico 3.1. O perfil epidemiológico das pessoas acome- tidas por IAM traçado por Freitas (2021) evi- denciou maior número de portadores entre pes- soas do sexo masculino (FREITAS et al., 2021). Dessa maneira, o presente estudo verifi- cou que os homens também morrem mais do que as mulheres por essa causa. Gráfico 3.1 Número de casos de óbitos por infarto agudo do miocárdio no Brasil, segundo sexo, de 2016 a 2020 Fonte: DATASUS, 2023. Análise dos óbitos por infarto agudo do miocárdio segundo etnia Entre 2016 e 2020 os casos de óbitos por in- farto agudo do miocárdio ocorreram majoritari- amente entre brancos 51,97% (n= 242.243) e pardos 37,17% (n= 173.229). As demais etnias representam percentuais pequenos sendo elas: Pessoas de pele preta 7,69% (n= 35.858), ama- rela 0,56% (n= 2.615) e os indígenas 0,21% (n= 977). Ademais, 2,40% (n= 11.177) dos óbitos foram ignorados, assim como demonstrado na Tabela 3.4. Outro estudo que traçou o perfil epidemio- lógico dos óbitos por IAM de 2011 a 2021, evi- denciou que a maior quantidade de óbitos pela doença aconteceu entre brancos com 55,56% dos casos, seguido de pardos com 38,26% dos óbitos, pessoas de pele preta com 4,54% e 1,64% entrou na classificação de outros ou não informado (MENDES et al., 2022). Dessa forma, observa-se que apesar de os percentuais não serem os mesmos, o perfil epi- demiológico dos óbitos nos dois estudos classi- ficou em primeiro lugar quanto ao maior nú- mero de casos brancos, seguido por pardos e pessoas de pele preta. Tabela 3.4 Número de óbitos por infarto agudo do mio- cárdio no Brasil, conforme etnia, de 2016 a 2020 Cor/etnia Frequência Absoluta TOTAL 466.099 Branca 242.243 Preta 35.858 Amarela 2.615 Parda 173.229 Indígena 977 Ignorado 11.177 Fonte: DATASUS, 2023. CONCLUSÃO Mediante o panorama supracitado, pode-se concluir que o maior número de óbitos por in- farto agudo do miocárdio no período analisado ocorreu no ano de 2019. Contudo, o período com maior taxa de mortalidade foi em 2016 com 45,66 mortes a cada 100 mil habitantes. O perfil epidemiológico dos óbitos por IAM no Brasil entre 2016 e 2020 foi constituído por pes- Masculino Feminino Ignorados 19 soas da região Sudeste, com 80 anos ou mais, do sexo masculino e etnia branca. O conhecimento do perfil epidemiológico dos óbitos é importante para que os profissio- nais da saúde se atentem aos pacientes com sin- tomas sugestivos de determinada doença para facilitar o diagnóstico e tratamento em tempo hábil. Dessa maneira, evidencia-se a necessi- dade de medidas em saúde com o objetivo de aprimorar o conhecimento da população pe- rante essa temática, bem como qualificar os profissionais da saúde com o fito de mitigar o número de óbitos por essa doença. 20 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEET, M.S. et al. Infarto agudo do miocárdio: Do diag- nóstico à intervenção. Research, Society and Deve- lopment, v. 11, n. 3, 2022. FREITAS, R.B. et al. Perfil epidemiológico do paciente com infarto agudo do miocárdio no Brasil. Revista de Saúde Faculdade Dom Alberto, v. 8, n. 1, p. 100-127, 2021. LIMA-COSTA, M.F. et al. Tipos de estudos epidemio- lógicos: Conceitos básicos e aplicações na área do enve- lhecimento. Epidemiologia e Serviços de Saúde, v. 12, n. 4, p. 189-201, 2003. 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Journal of Human Growth and Development, v. 28, n. 3, p. 356-60, 2018. 21 10.29327/5198921.7-4 CAPÍTULO 04 CONTROLE PRESSÓRICO DOS PACIENTES DE PÓS- OPERATÓRIO DE CIRURGIA CARDÍACA NA UTI LUCIANA MODESTO DE BRITO¹ KYLVIA LUCIANA PEREIRA COSTA2 MÁRIO GUSTAVOLÚCIO ALBUQUERQUE DA NÓBREGA3 MARCOS ANDRÉ PEREIRA4 ARTHUR APOLINÁRIO FEITOSA5 FRANCISCO WILLIAM SARAIVA LEITE6 STÉPHANE APOLINÁRIO LANDIM DA CRUZ5 JANE CAROLINE GUIMARÃES6 MARYANNE PEREIRA FRANCO ADRIANO7 THAISE DE ABREU BRASILEIRO SARMENTO¹ LUCIBEL ALBUQUERQUE DE ANDRADE8 CÍCERA REJANE TAVARES DE OLIVEIRA4 ANILTON JORGE DA NÓBREGA GONÇALVES4 PHILIPPE APOLINARIO FEITOSA LANDIM DA CRUZ8 ROBSON LEITE SAMPAIO8 1Docente – Centro Universitário Santa Maria - UNIFSM . 2Discente – Mestrado em Gestão em Sistemas Agroindustriais do CCTA/UFCG 3Docente – Centro Universitário Dr. Leão Sampaio – UNILEAO . 4Docente – Universidade Federal do Cariri – URCA . 5Discente – Faculdade de Medicina Estácio do Juazeiro do Norte . 6Discente – Universidade José do Rosário Vellano – UNIFENAS . 7Discente – Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ . 8Discente – Centro Universitário Santa Maria - UNIFSM Palavras-chave: Cirurgia cardíaca; Pressão arterial; UTI. 22 INTRODUÇÃO As doenças cardiovasculares no Brasil são as principais causas de morte. Apresentado fator adicional à elevada representatividade epidemiológica nos índices de mortalidade e morbidade, o aumento da expectativa de vida ao nascer e as modificações nos hábitos de vida, principalmente decorrentes dos processos de urbanização e industrialização, que aumentaram a exposição aos fatores de risco para o seu desenvolvimento. Apresentam ainda caráter de cronicidade, podendo ser tratadas de maneira clínica ou cirúrgica (DUARTE et al., 2012). A realização de um procedimento cirúrgico, em especial o cardíaco, envolve uma diversidade de questões psicológicas e físicas que se refletem nas alterações biológicas observadas em uma avaliação adequada das queixas expostas pelos pacientes. Tais manifestações repercutem em dados da análise clínica, que podem ser observados e mensurados (SILVA et al., 2014). É possível citar como forma dessas manifestações fisiológicas as medidas dos sinais vitais, das quais direcionam a estabilidade biológica, como as modificações na pressão arterial, nas frequências respiratória e cardíaca e, influenciando ainda na temperatura corporal (SILVA et al., 2014). Ponte et al., (2010) destacam que as alterações nos níveis tensionais são comumente encontradas nos pacientes submetidos à cirurgia cardíaca e diversos fatores, durante o perioperatório, podem provocar distúrbios que podem comprometer na evolução normal da cirurgia. A hipertensão arterial ocorre de acordo com Woods et al., (2005) em 48% a 55% dos paci- entes nas primeiras 4 (quatro) a 6 (seis) horas após a cirurgia cardíaca, sendo que nas primeiras 12 (doze) horas depois da cirurgia pode ocorrer a hipotensão. Nesse contexto, compreende-se a necessidade de uma assistência sistematizada e individualizada, pois existem pessoas que são assintomáticas, mas que possuem valores de pressão arterial que diferem dos valores considerados normais, por isso a importância de se saber os valores habituais, os quais devem ser avaliados evolutivamente. Para Benetti et al., (2013) apesar dos avanços já alcançados nas cirurgias cardíacas estudos ainda demonstram taxas significativas de complicações no pós-operatório, as quais fazem aumentar o tempo de permanência hospitalar, elevam custos e impactam em uma mortalidade. A identificação de fatores que possam influenciar a evolução clínica dos pacientes pode diretamente auxiliar na indicação cirúrgica, como também prevenir as complicações no pós-operatórias (PIOTTO et al., 2012). A mensuração sistemática da pressão arterial deveria ser uma das ações na prevenção de eventos de complicações. O diagnóstico da hipertensão arterial é fácil, necessitando, para sua aferição, equipamentos acessíveis, baixo treinamento e custo para realizá-los. Contudo os equipamentos podem apresentar variabilidade nas medidas de pressão arterial, dependendo do tipo de equipamento usado (COLARES et al., 2009). Nesse sentido, o presente capítulo tem como objetivo geral realizar uma revisão sobre a importância do controle da pressão arterial nas Unidades de Terapia Intensiva - UTI de paciente em pós-operatório de cirurgia cardíaca. 23 MÉTODO Para alcance do objetivo traçado, foi reali- zada uma revisão integrativa da literatura, que permitiu o uso de evidências presentes em estu- dos por meio da análise de pesquisas relevantes. Formulou-se como questão problema: “Qual importância do controle da pressão arte- rial nas Unidades de Terapia Intensiva - UTI de paciente em pós-operatório de cirurgia cardí- aca? Para busca dos estudos elegíveis, foram uti- lizados descritores não controlados e controla- dos dos vocabulários Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) (Controle Pressão Arterial; Cirurgia Cardíaca; Unidade de Terapia Inten- siva) e Medical Subject Heading – MeSH (Cri- anças; Internados; Procedimentos Cirúrgicos Cardíacos; Hipertensão; Cardiopatias Congêni- tas; Cuidados Críticos), dispostos no Quadro 4.1, conectados pelos operadores booleanos OR, se pertencentes a uma mesma categoria da estratégia PVO, e AND, quando pertencentes a etapas distintas da estratégia. Para encontrar respostas apropriadas à per- gunta de pesquisa e com vistas a uma melhor definição dos descritores, utilizou-se a estraté- gia: Population, Variables and Outcomes (PVO) conforme disposto no Quadro 41. Quadro 4.1 Estratégia PVO Etapa Descrição DeCS/MeSH/ Descritores não controlados Population Pacientes Crianças; Internados Variables Controle Pressão Arterial; Cirurgia Cardíaca; Unidade de Terapia Intensiva Procedimentos Cirúrgicos Cardíacos; Hipertensão Outcomes Cuidados Pós-Operatórios; Complicações Pós-Operató- rias Cardiopatias Congênitas; Cuidados Críticos Após a formulação da questão de pesquisa, procedeu-se à busca nas bases de dados para identificação dos estudos incluídos na revisão. Tais publicações, além de responderem à ques- tão de pesquisa, deveriam atender aos seguintes critérios: Artigos originais, publicados em in- glês, português ou espanhol, nos últimos 05 anos, ou seja, a partir do ano de 2018. As buscas foram conduzidas no mês de já- neiro do corrente de 2023, nas bases de dados eletrônicas indexadas na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS): Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Banco de Dados em Enfermagem (BDenf) e Sistema Online de Busca e Análise de Litera- tura Médica (MEDLINE). A Tabela 4.1 ilustra a estrutura metodoló- gica utilizada. 24 Tabela 4.1 Publicações encontradas do ano de 2018 a 2023 nas bases de dados DESCRITORES BASE DE DADOS LILACS MEDLINE BDENF Controle Pressão Arterial 649 8.837 100 Cirurgia Cardíaca 748 24.259 97 Unidade de terapia Intensiva 2.505 27.382 1.050 Controle Pressão Arterial and Cirurgia Cardíaca 29 156 4 Controle Pressão Arterial and Unidade de Tera- pia Intensiva 81 16 7 Controle Pressão Arterial and Cirurgia Cardíaca and Unidade de Terapia Intensiva 0 3 0 Soma Artigos Achados 4.012 60.653 1.258 Artigos Escolhidos 2 3 1 Os estudos achados nas bases de dados fo- ram agrupados por meio do gerenciador de re- ferências Endnote Web, excluindo-se os artigos duplicados. Os artigos selecionados nesta etapa que pu- deram ser obtidos na íntegra foram avaliados para a leitura. O processo de seleção foi documentado usando o fluxograma Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) (MOHER et al., 2009). A Figura 4.1 mostra o Fluxograma de sele- ção dos estudos. Figura 4.1 Fluxograma de seleção dos estudos 25 Foram mobilizados 63.169 estudos, dos quais se excluiu 31.496 publicações por encon- trarem-se duplicadas e 31.591após a triagem por título e resumo, por não responderem à questão de pesquisa ou não atenderem ao crité- rio tipo de estudo. Em seguida, os 82 artigos se- lecionados foram submetidosà avaliação por meio da leitura na íntegra para adequação aos critérios de elegibilidade, sendo excluídos 76 artigos. Ao todo 06 artigos foram incluídos na revisão. RESULTADOS E DISCUSSÃO No quadro a seguir está descrita a relação de artigos catalogados segundo: Autor/ano, título, objetivos e resultados (Quadro 4.2). Quadro 4.2 Relação de artigos catalogados segundo autores/ano, título, objetivos e resultados Numero Autor e Ano Titulo Objetivo Resultados 01 Cho et al., 2018) Differences in periop- erative femoral and ra- dial arterial blood pressure in neonates and infants undergoing cardiac surgery requiring cardiopulmonary by- pass Avaliaram as diferenças na pressão arterial média (PAM) entre as artérias ra- dial e femoral durante a ci- rurgia cardíaca pediátrica para determinar a eficácia do monitoramento da pres- são arterial femoral. Os autores sugerem que a monitorização da pressão ar- terial femoral pode ser reali- zada com segurança, mesmo em neonatos, e fornece valo- res de PA mais precisos du- rante os períodos de CEC e imediatamente após o des- mame da CEC, especial- mente quando o tempo de CEC foi superior a 60 min. 02 Silva et al., (2022) Bilevel positive airway pressure improves the autonomic balance in the postoperative pe- riod following cardiac surgery: A randomized trial Avaliar os efeitos da Bi- PAP na saturação perifé- rica de oxigênio, sinais vi- tais e balanço autonômico no período de hospitalização após cirur- gia cardíaca Os achados evidenciam que o BiPAP possibilita meca- nismos autonômicos mais eficientes durante a interna- ção após cirurgia cardíaca. O BiPAP atenuou a atividade simpática e melhorou a mo- dulação vagal e o equilíbrio autonômico na alta hospita- lar. Esses achados eviden- ciam que o BiPAP possibi- lita mecanismos autonômi- cos mais eficientes durante a internação após cirurgia car- díaca. O BiPAP atenuou a atividade simpática e melho- rou a modulação vagal e o equilíbrio autonômico na alta hospitalar. Esses acha- dos evidenciam que o Bi- PAP possibilita mecanismos autonômicos mais eficientes durante a internação após ci- rurgia cardíaca. 03 Gutknecht et al., (2020) Non-invasive assess- ment of haemodynamic parameters in patients after Fontan procedure Avaliação não invasiva dos parâmetros hemodinâ- micos em pacientes após a operação de Fontan. Em pacientes após procedi- mento de Fontan, a cardio- grafia de impedância pode ser uma ferramenta útil na avaliação de alterações he- 26 modinâmicas de curto prazo provocadas por alterações posturais. Seu valor clínico em pacientes com cardiopa- tias congênitas deve ser me- lhor investigado. 04 Gören et al., (2021) Comparison of BPAP S/T and average vol- ume-assured pressure support modes for hy- percapnic respiratory failure in the emer- gency department: A randomized controlled trial Comparação randomizada dos modos AVAPS e pres- são positiva nas vias aé- reas em dois níveis espon- tâneo/temporizado (BPAP S/T) na aplicação de venti- lação mecânica não inva- siva com pacientes com in- suficiência respiratória hi- percápnica no departa- mento de emergência. O modo AVAPS é tão eficaz e seguro quanto o BPAP S/T no tratamento de pacientes com insuficiência respirató- ria hipercápnica no departa- mento de emergência. 05 Li & Shi (2019) Análise retrospectiva de fatores de risco para complicações relacionadas com abla- ção química na cardio- miopatia hipertrófica obstrutiva Investigar retrospectiva- mente os fatores de risco de complicações relaciona- das da ablação miocárdica septal transluminal percu- tânea (PTSMA) para cardi- omiopatia hipertrófica obs- trutiva (CMHO). A hipertensão arterial foi um fator de risco independente para complicações conexas as com o procedimento de PTSMA. Pode ser muito mais seguro e eficiente se os procedimentos de PTSMA forem restritos a centros ex- perientes, de acordo com os resultados da análise para a curva de aprendizado 06 Luz et al., (2022) Analisar preditores de complicações em pós- operatório de cirúrgia cardíaca pediátrica Identificar preditores de complicação no pós-opera- tório de cirurgia cardíaca pediátrica. Variáveis de condições clíni- cas, medicações em uso, de- feitos congênitos e intercor- rências intraoperatórias quando associados às com- plicações encontradas no pós-operatório de cirurgias cardiopediátricas mostram- se como preditivos de risco. O monitoramento invasivo da pressão arte- rial é importante para pacientes durante e de- pois da cirurgia de coração aberto (OHS) e a ar- téria radial é o local de cateterizarão mais co- mum durante uma OHS. Porém, muitos estudi- osos relataram que durante a fase inicial de by- pass cardiopulmonar (CPB) em adultos a pres- são arterial femoral é mais alta significativa- mente do que a pressão arterial periférica. Os poucos estudos investigam a diferença entre a PA da artéria femoral e artéria radial durante a cirurgia e no período pós-operatório em neona tos e em bebês (CHO et al., 2018). Para Cho et al., (2018) muitos autores têm relatado a segurança da cateterização da artéria femoral durante a cirurgia cardíaca em adultos; porém, há poucas publicações sobre as caracte- rísticas do monitoramento da pressão arterial femoral em neonatos e em bebês. O estudo de Cho et al., (2018), buscou examinar as diferen- ças entre a pressão arterial femoral e radial em neonatos e bebês e revelou que a pressão arte- rial radial foi normalmente subestimada em comparação com a pressão arterial femoral du- 27 rante o período do CPB-on nessa população. Contudo, esse fenômeno não permaneceu no período da UTI (CHO et al., 2018). Na população estudada por Cho et al., (2018), a pressão arterial radial foi normal- mente subestimada em comparação com a pres- são arterial femoral após o início do CPB e que as diferenças entre a pressão arterial radial e fe- moral foram mais marcadas em pacientes com CPB mais longo. Também identificamos que essas diferenças de pressão não foram evidentes durante o período da UTI (CHO et al., 2018). A pressão arterial radial reduzida pode ser causada por vasoespasmo como resultado de al- guns mecanismos termorregulatórios; da mesma forma, gradientes pressóricos das arté- rias femoral e radial têm sido observados em pacientes com parada circulatória hipotérmica ou em pacientes cirúrgicos gravemente doentes tratados com doses elevadas de agentes vasoa- tivos (CHO et al., 2018). Silva et al., (2022) buscou avaliar os efeitos da BiPAP na saturação periférica de oxigênio, sinais vitais e balanço autonômico no período de hospitalização após cirurgia cardíaca. Os principais achados desta pesquisa indicam a melhora do equilíbrio autonômico em pacientes tratados com BiPAP durante a internação após cirurgia cardíaca. Os autores encontraram uma atenuação da atividade simpática no BiPAPG, enquanto no GC houve aumento do compo- nente simpático. O BiPAP promoveu o au- mento da resposta parassimpática em compara- ção com o GC. A SpO 2 não se alterou na alta hospitalar e foi semelhante entre os grupos (SILVA et al., 2022). O componente LF prevaleceu no GC, en- quanto no BiPAPG o componente HF foi maior. Isso mostra a predominância da ação parassim- pática na alta hospitalar em resposta ao BiPAP, que expressou boa adaptação autonômica cardi- ovascular. Esses achados mostram que o BiPAP trouxe benefícios adicionais à fisioterapia de ro- tina e aos cuidados habituais, que podem ser re- forçados pela melhora do equilíbrio autonô- mico, com predomínio do sistema nervoso pa- rassimpático. A relação LF/HF apresentou se- melhança entre os grupos no pré-operatório, mas foi prejudicada no GC na alta hospitalar. No BiPAPG, encontramos uma atenuação da atividade simpática, associada à predominância de estímulo vagal induzindo melhora da relação LF/HF e consequente benefício ao sistema decontrole autonômico cardiovascular (SILVA et al., 2022). Na insuficiência cardíaca, há comprometi- mento do equilíbrio autonômico decorrente da hiperativação simpática e redução do tônus va- gal cardíaco. Pacientes com insuficiência cardí- aca hospitalizados por descompensação aguda se beneficiaram da terapia com BiPAP devido à melhora das respostas autonômicas via ativação vagal. Queda da VFC é considerada fator de risco independente para mortalidade cardiovas- cular após infarto agudo do miocárdio (SILVA et al., 2022). Gutknecht et al., (2020) buscaram realizar uma avaliação não invasiva dos parâmetros he- modinâmicos em pacientes após a operação de Fontan. O uso de ventilação não invasiva em pacientes com insuficiência cardíaca aumenta o débito cardíaco e o volume sistólico, reduz a pós-carga e apresenta resultados benéficos para a função ventricular esquerda com redução da regurgitação mitral. Esse mecanismo pode ex- plicar nossos achados, sugerindo adaptações funcionais do sistema cardiovascular em res- posta ao uso de pressão positiva nas vias aéreas. Alguns fatores podem ter contribuído para a estase da SpO 2. Todos os pacientes receberam fisioterapia de rotina com exercícios de respira- ção profunda em CP, o que pode ter sido funda- 28 mental para evitar a queda da SpO 2, uma vez que essa intervenção promove a oxigenação após cirurgia cardíaca. Com isso, o BiPAP foi incapaz de promover efeitos adicionais, além da fisioterapia respiratória, na SpO 2. A melhora da oxigenação poderia ter sido obtida se fosse avaliado o efeito agudo do BiPAP ou da fisio- terapia de rotina. Entretanto, a medida da SpO 2 foi realizada em repouso, tanto no pré-opera- tório quanto na alta hospitalar. Ainda assim, as médias de SpO 2 estavam dentro da normali- dade desde o pré-operatório, pois a amostra era composta apenas por pacientes estáveis. O tra- tamento com CPAP é capaz de reduzir signifi- cativamente a pressão arterial em pacientes com hipertensão resistente (GUTKNECHT et al., 2020). Li & Shi (2019) buscaram realizar uma ava- liação não invasiva dos parâmetros hemodinâ- micos em pacientes após a operação de Fontan. Os autores destacaram que complicações du- rante procedimentos de PTSMA e monitora- mento hospitalar ocorreram nesse estudo. Os eventos foram choque cardíaco, insuficiência cardíaca aguda, eventos arrítmicos (assistolia, bradicardia, fibrilação ventricular e taquicardia ventricular sustentada e não sustentada) e morte cardíaca. As complicações da artéria coronária foram dissecção coronariana, infarto agudo do mio- cárdio, perfuração coronariana, tamponamento pericárdico e derrame pericárdico agudo. Com- plicações conexas com punção foram incluídas também para a análise final (LI & SHI, 2019). Nesse sentido, Li & Shi (2019) colocam a necessidade de os pacientes serem monitorados cuidadosamente nas UTIs, uma vez que a cirur- gia cardíaca é um complexo procedimento que tem importantes repercussões orgânicas, alte- rando de diversas maneiras os mecanismos fisi- ológicos dos pacientes. Nesse estudo os pacien- tes foram monitorados cuidadosamente na Uni- dade Coronariana por pelo menos 3 dias após procedimento, e estimulação de apoio foi conti- nuada pela veia femoral quando preciso. A ava- liação intra-hospitalar foi feita para todos os desfechos clínicos, incluindo as complicações hemorrágicas e vasculares (pseudoaneurisma da artéria femoral e hematoma de punção foram incluídos também para análise). Depois da alta, os exames mensais de acompanhamento clínico foram realizados em ambulatório, com a finali- dade de monitorar a ocorrência de eventos ad- versos (LI & SHI, 2019). Em resumo, o trabalho de Li & Shi (2019) mostra que o PTSMA foi efetivo na redução do GVSVE em pacientes com CMHO. A hiperten- são foi o único fator de risco para complicações conexas com o procedimento PTSMA depois da análise de regressão logística multivariada. Os procedimentos de PTSMA podem ser mais seguros e eficientes em centros experientes, se- gundo os resultados da análise para a curva de aprendizado (LI & SHI, 2019). Goren et al., (2021) buscaram realizar uma comparação randomizada dos modos AVAPS e pressão positiva nas vias aéreas em dois níveis espontâneo/temporizado (BPAP S/T) na aplica- ção de ventilação mecânica não invasiva com pacientes com insuficiência respiratória hiper- cápnica no departamento de emergência. Os resultados mostraram que houve altera- ções no exame de ecocardiograma pós-procedi- mento estavam presentes em 47,7% do total avaliado, 14,8% deles apresentavam achados compatíveis com as correções realizadas e em 37,5% não foi possível encontrar o laudo do exame em prontuário. As alterações encontra- das incluíram: Dilatação de cavidades cardía- cas, hipertrofia de ventrículo esquerdo e direito, derrame pleural, derrame pericárdico, artéria do tronco da pulmonar dilatado, tronco da pulmo- 29 nar aumentado, refluxo pós plastia valvar, insu- ficiência valvar, trombose em prótese, coroná- ria dilatada, retalho cirúrgico mal posicionado, retalho cirúrgico com shunt residual, estenose valvar, neoaorta com refluxo e forame oval pa- tente bidirecional (GOREN et al., 2021). Constatou-se que as complicações coexisti- ram entre si e que nenhuma delas causou óbito aos pacientes. Referente ao sistema circulatório foram observadas a presença de: Hipertensão; hipotensão; trombo; hemorragia/sangramento; plaquetopenia; instabilidade hemodinâmica; baixo debito e queda do hematócrito; em se- guida, a ocorrência de distúrbios renais foi ca- racterizada por: Oligúria; poliúria; anasarca; congestão; hematúria; insuficiência aguda; hi- percalemia e hipocalemia. No aspecto metabó- lico foram percebidos: Hipoglicemia; hipergli- cemia; acidose respiratória; alcalose respirató- ria; acidose metabólica; acidose mista; condi- ções pós paradas cardíaca. Foram consideradas complicações respiratórias a ocorrência de: Ex- tubaçáo acidental; broncoespasmo; dispneia; congestão pulmonar; pneumotórax; derrame pleural; atelectasia; presença de secreção em via aérea; pneumomediastino e cânula orotra- queal mal posicionada (GOREN et al., 2021). As complicações costumam ser comuns no período pós-operatório e podem variar quanto ao risco à vida que podem apresentar. Além disso, fatores de risco para complicações pós- operatórias de cirurgia cardíaca pediátrica ainda não foram completamente elucidados (GOREN et al., 2021). A identificação precoce dos preditores de proteção e de complicações para cirurgia cardí- aca congênita pediátrica pode ajudar na melho- ria da assistência prestada ao paciente, na to- mada de decisão, na escolha do tratamento, na redução do tempo de internação e complicações apresentadas e consequentemente, redução do custo com o tratamento (GOREN et al., 2021). Por fim, Luz et al., (2022) buscaram identi- ficar preditores de complicação no pós-operató- rio de cirurgia cardíaca pediátrica. Os resulta- dos foram expressos pelo odds ratio (OR) com nível de significância de 5%. Observou-se idade média de 61 anos com a predominância do sexo feminino. Complicações metabólicas, circulatórias, renais, cardiovasculares e respira- tórias foram identificadas intra e no pós-opera- tória (LUZ et al., 2022). Foi identificada correlação estatística de complicações em: Uso dos diuréticos, hiperten- são arterial, hipertrofia de ventrículo direito, in- suficiência de valva atrioventricular, trissomia do cromossomo 21, derrame pericárdico, san- gramento intraoperatório, leucócitos alterados nos pré-operatórios e alterações no ecocardio- grama pós-operatório (LUZ et al., 2022). Os autores destacam que variáveis de con- dições clínicas, medicações em uso, defeitos conpênitos e intercorrências intraoperatórias quando associadas às complicações encontra- das no pós-operatório de cirurgias cardiopediá- tricas mostram-se como preditivos de risco (LUZ et al., 2022). CONCLUSÃO O período pós-operatóriode cirurgia cardí- aca é propício ao aparecimento de hipotensão arterial, isso ocorre pela somação de vários fa- tores, ameaçando a integridade fisiológica dos pacientes. O controle da pressão arterial nos pa- cientes requer uma monitoração constante e tra- tamento imediato com correção dos fatores cau- sais para minimizar a mortalidade e a morbi- dade. A característica hemodinâmica do estado de choque é a queda do débito cardíaco havendo 30 como resultado um a diminuição do fluxo san- guíneo arterial. Com um fluxo sanguíneo arte- rial reduzido, irrigam-se mal os diferentes ór- gãos e tecidos, nos quais a oxigenação defici- ente condiciona distúrbios do metabolismo ce- lular e alterações estruturais de vários graus até a desvitalização irreversível da célula. Neste sentido, destaca-se a necessidade do monitora- mento constante dos sinais vitais e manter o pa- ciente estabilizado antes, durante e depois da ci- rurgia. Os resultados mostraram também que nos últimos 05 anos poucos estudos avaliaram a questão do controle da pressão arterial nas Uni- dades de Terapia Intensiva - UTI em pós-ope- ratório de cirurgia cardíaca. Conclui-se que os picos de pressão arterial pós-operatório de cirurgia cardíaca podem tra- zer inúmeras complicações aos pacientes. 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BENETTI, J.C. et al. Pacientes em pós-operatório de ci- rurgia cardíaca: Correlação entre dois métodos de medida da pressão arterial. Revista de Enfermagem da UFSM, n. 3, p. 394-401, 2013. CHO, H.J. et al. Differences in perioperative femoral and radial arterial blood pressure in neonates and infants undergoing cardiac surgery requiring cardiopulmonary by-pass. Jornal de Pediatria, v. 94, n. 1, p. 76-81, 2018. COLARES, L.G. et al. Estudo comparativo da pressão arterial sistêmica aferida por três métodos distintos não invasivos. Revista Médica de Minas Gerais, v. 19, n. 3, p. 214-219, 2009. DUARTE, S.C.M. et al. O cuidado de enfermagem no pós-operatório de cirurgia cardíaca: Um estudo de caso. Escola Anna Nery, Revista de Enfermagem, v. 16, n. 4, p. 657-665, 2012. GOREN, N.Z. et al. 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Pos- teriormente, a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, declarou a condição pandêmica da COVID-19 (GUO et al., 2020; OLIVEIRA, 2020). O vírus causador da enfermidade acomete a célula hospedeira e reduz sua atividade, dese- quilibrando sua função no organismo e aumenta as expressões fisiopatológicas da do- ença. Ainda, estudos demonstram que as conse- quências fisiológicas mais nefastas na COVID- 19 estão relacionadas a pacientes com comorbi- dades prévias. E, considerando as características epidemiológicas do Brasil que definem as doen- ças cardiovasculares como a principal causa de morte no país, é necessário se ater a relevância destas, sobretudo nos casos mais severos (AS- KIN et al., 2020; BEVACQUA & PERRONE, 2020; OLIVEIRA et al., 2020). Nesse ínterim, ressalta-se que pacientes com infecção por SARS-CoV-2, com inflamação sis- têmica e complicações pulmonares podem re- sultar em morbidade e mortalidade significati- vas. Diante da manifestação sistêmica, compli- cações cardiovasculares podem ocorrer, inclu- indo miocardite, inflamação pericárdica, síndro- mes coronárias agudas, insuficiência cardíaca, arritmias e eventos tromboembólicos venosos (LONG et al., 2020). Portanto, diante do cenário supracitado, o presente capítulo teve como objetivo principal analisar as principais alterações cardiovascula- res, descritas pela literatura, decorrentes do agravamento fisiopatológico da COVID-19. MÉTODO Desenho do estudo Neste estudo, a opção foi por uma revisão integrativa, realizada a partir de uma abordagem qualitativa de tipo retrospectiva. Para a construção da revisão integrativa é preciso percorrer seis etapas distintas, sendo elas a identificação do tema e seleção da hipó- tese ou questão de pesquisa; estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estu- dos/amostragem ou busca na literatura; defini- ção das informações a serem extraídas dos estu- dos selecionados/ categorização dos estudos; avaliação dos estudos incluídos; interpretação dos resultados; e apresentação da revi- são/síntese do conhecimento (MENDES, 2008). Nesse ínterim, sabe-se que o intuito primário das revisões é promover uma análise sumari- zada acerca de um determinado tópico cientí- fico. Considerando que o contexto do presente trabalho que são as manifestações cardiovascu- lares em pacientes com COVID-19, a revisão in- tegrativa torna-se uma forma eficiente de agre- gação de conhecimento, contribuindo ativa- mente para a prática clínica como um todo (MAGGIO et al., 2016). Base de dados Foi realizada uma busca de artigos publica- dos no período de 2019 a 2021, em periódicos científicos nacionais disponíveis na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Cochrane Library (Cochrane) e Banco de Dados nacionais com artigos pertinentes ao tema. 34 Período da coleta dedados De março a junho de 2021. População de estudo Para se obter uma análise mais aprofundada e adquirir vários ângulos da visão sobre um mesmo assunto, estabeleceu que a amostra do estudo selecionada com os seguintes descritores em Ciências da Saúde: COVID-19, Doenças Cardiovasculares, Infecções Cardiovasculares. Foram utilizados os seguintes filtros: Idioma- português; Ano de publicação 2019 a 2021; Tipo de literatura: Artigo de revisão, metanáli- ses e estudos de coorte. Técnicas e instrumentos de coleta de da- dos A seleção dos estudos analisados se deu a partir dos seguintes critérios de inclusão: Abor- dar a temática em estudo; Constar nas bases de dados selecionadas; Ser redigido ou traduzido em português; E ter sido publicado no período de 2019 a 2021; Estudos que abordavam as te- máticas propostas para esta pesquisa; Estudos do tipo revisão, meta-análise, e de coorte dispo- nibilizados na íntegra. Os critérios de exclusão foram: Textos incompletos ou publicamos na forma de resumo; Repetição de um mesmo ar- tigo em mais de uma base de dados; Não ser es- tudo realizado com âmbito cardiovascular; Texto com acesso indisponível; Falta de relação com alteração fisiológica e o objeto de estudo; Textos que não abordavam diretamente a pro- posta estudada e que não atendiam aos demais critérios de inclusão. Incluímos relatos de casos publicados revi- sados por pares, séries de casos e estudos trans- versais sobre complicações cardiovasculares em pacientes portadores da COVID-19. Organização de coleta de dados Os dados foram organizados de forma com que se pode aproveitar ao máximo possível de informação de cada artigo. Elaborou-se um ro- teiro prévio com o intuito de obter uma base para cada ponto a ser estudado. Publicações referentes a um mesmo estudo foram agrupadas, e em cada um deles foram descritos o desenho do estudo, seus objetivos, as bases de dados encadeadas, e questões metodológicas relevantes relativas à pesquisa. Analisaram-se também as informações fornecidas sobre a qualidade dos dados nos bancos utilizados. Realizou-se a combinação de dados de lite- ratura teórica e empírica. Assim, elaborou-se uma revisão integrativa com diferentes concei- tos, a revisão de teorias ou a análise metodoló- gica. Técnica de análise de dados O método utilizado na análise de dados qua- litativos é o de análise de conteúdo, compreen- dida como um conjunto de técnicas de pesquisa cujo objetivo é a busca do sentido ou dos senti- dos de um documento. Nesse sentido, quando a análise de conteúdo é escolhida como procedimento de análise mais adequado, os dados em si constituem apenas da- dos brutos, que só terão sentido ao serem traba- lhados de acordo com uma técnica de análise apropriada (MOZZATO & GRZYBOVSKI 2011). A análise de conteúdo, além de realizar a in- terpretação após a coleta dos dados, desenvolve-se por meio de técnicas mais ou menos refinadas. Dessa forma, a análise de conteúdo se vem mostrando como uma das técnicas de análise de dados mais utilizada no 35 Brasil, especialmente nas pesquisas qualitativas (DELLAGNELO & SILVA, 2005). Diante do exposto, percebe-se que a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de aná- lise de comunicações, que compreende critica- mente o sentido das informações, seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas (CHIZZOTTI, 2006). No total de 40 publicações selecionadas, 16 entraram na última seleção por enquadrar-se nos critérios de inclusão e constituíram o corpus da análise, houve repetição de 9 artigos entre as bases de dados, 14 artigos foram excluídos após a leitura dos resumos por serem estudos que não tinham relação com o objeto de estudo. Assim sendo, a Figura 5.1 demonstra o pro- cesso de desenvolvimento do presente trabalho, considerando a seleção inicial e aplicação dos critérios de seleção das literaturas, de forma a elucidar as etapas para a construção da revisão. Após encontrar os potenciais artigos científicos a serem escolhidos, foi realizada uma análise crítica do conteúdo, de forma que foram seleci- onados os dezesseis artigos supracitados, para compor esta revisão. Figura 5.1 Seleção de artigos Os resultados foram apresentados em tabe- las, gráficos e quadros, divididos em categorias temáticas abordando: Tipo de estudo; Manifes- tações cardiovasculares; Relação tipo de estudo e manifestações cardiovasculares. RESULTADOS E DISCUSSÃO COVID-19: Pandemia de 2019 Em dezembro de 2019 o mundo viveu a pandemia da doença causada pelo novo coronavírus (COVID-19), que surgiu na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China (ZHENG et al., 2020). Chamado síndrome respiratória aguda grave do coronavírus 2 (SARS-CoV-2), identificado como o agente que causa a doença de coronavírus (COVID-19), nome oficialmente adotado pela Organização Mundial da Saúde. A COVID-19 é uma condição que pode afetar os pulmões, o trato respiratório e outros sistemas (FERRARI, 2020). Complicações cardiovasculares são frequentemente encontradas em pacientes infectados pelo vírus, agregando desafios a identificação e manuseio clínicos desses (LONG et al., 2020). Dentre os desfechos da COVID-19 está uma alta carga inflamatória, o que pode resultar em complicações cardiovasculares - miocardite, in- suficiência cardíaca, arritmias, síndrome coro- nariana aguda, e tendo a pior consequência a deterioração rápida e morte súbita. Estudos e Resultados Os dados são muito escassos em relação à literatura já publicada sobre essa infecção em adultos e suas complicações cardiovasculares. Sob essa ótica, a presente análise identificou, com grande precisão, impacto da infecção no sistema cardiovascular, uma vez que, a compreensão do impacto da COVID-19 •Artigos identificados como potenciais compontes da revisão de literatura: •N=40 Identificação •Artigos selecionados após a remoção de duplicatas: •N=31 Seleção Inicial •Artigos esclhidos após aplicação de critérios de ano de publicação, disponibilidade de dados e relação como tema: •N=16 Critérios/ Inclusão 36 no sistema cardiovascular está em constante evolução. No total de 40 publicações selecionadas, 16 entraram na última seleção por enquadrarem-se nos critérios de inclusão e constituíram o corpus da análise. Para auxiliar na escolha da melhor evidência possível, foi proposto uma hierarquia das evidências, segundo o delineamento da pes- quisa, que é um dos itens mais importantes a se- rem analisados, conforme descrito na Tabela 5.1. Ademais, a prática baseada em evidências focaliza sistemas de classificação de evidências. Geralmente esses sistemas são caracterizados de forma hierárquica, dependendo do delineamento de pesquisa, ou seja, da abordagem metodológica adotada para o desenvolvimento do estudo (GALVÃO, 2006). Em uma publicação recente, a qualidade das evidências é classificada em sete níveis. No nível 1, as evidências são provenientes de revisão sistemática ou metanálises de todos relevantes ensaios clínicos randomizados controlados ou oriundas de diretrizes clínicas baseadas em revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados controlados; Nível 2, evidências derivadas de pelo menos um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado; Nível 3, evidências obtidas de ensaios clínicos bem delineados sem randomização; Nível 4, evidências provenientes de estudos de coorte e de caso-controle bem delineados; Nível 5, evidências originárias de revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos; Nível 6, evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo; Nível 7, evidências oriundas de opinião de autoridades e/ou relatório de comitês de especialistas (MELNYK & FINEOUT-OVERHOLT, 2005). Tabela 5.1 Estudo e nível de evidência ESTUDO TÍTULO TIPO DE ESTUDO P1 Doença cardiovascular preexistente, em vez de fatores de risco cardiovascular, conduzà mortalidade em COVID-19. Estudo de coorte P2 Doença por coronavírus 2019 (COVID-19) complicada com infarto agudo do miocárdio: Etiologia e experiência de enfermagem de três relatos de caso. Relato de caso P3 Biomarcadores cardiovasculares em COVID-19. Revisão de literatura P4 Baixa incidência de compli- cações cardíacas de COVID- 19 e seu tratamento entre pa- cientes hospitalizados em Cingapura. Estudo de coorte P5 Associação de lesão cardíaca com mortalidade em pacien- tes hospitalizados com CO- VID-19 em Wuhan, China. Estudo de coorte P6 Implicações cardiovascula- res de resultados fatais de pa- cientes com doença por coro- navírus 2019 (COVID-19). Estudo de séries de casos P7 Doença de Coronavírus-19 e o Miocárdio. Revisão de literatura P8 Biomarcadores de lesão mio- cárdica e complicações cardí- acas associadas à mortali- dade em pacientes com CO- VID-19. Revisão de literatura P9 O coração e a COVID-19: O que o cardiologista precisa saber. Revisão de literatura P10 COVID-19: dados atualiza- dos e sua relação com o sis- tema cardiovascular. Revisão de literatura P11 Características clínicas de pacientes infectados com Estudo de séries de casos 37 novo coronavírus de 2019 em Wuhan, China. P12 Prevalência e impacto de do- enças metabólicas cardiovas- culares em COVID-19 na China Revisão de literatura/ Metanálise P13 Curso clínico e fatores de risco para mortalidade de pa- cientes adultos internados com COVID-19 em Wuhan, China: Um estudo de coorte retrospectivo. Estudo de coorte P14 Suspeita de lesão miocárdica em pacientes com COVID- 19: Evidências da observação clínica de linha de frente em Wuhan, China. Estudo de séries de casos P15 COVID-19 em pediatria: Re- lato de um caso com múlti- plas complicações e bom desfecho clínico. Relato de caso P16 IAM com supra de ST em pa- cientes com COVID-19. Desfechos clínicos e angio- gráficos. Estudo de séries de casos A maior parte das publicações trata-se de estudos de revisão de literatura (31%), sendo a maioria originários do Brasil, e estes estudos conforme supramencionado são os de maiores evidências científica. Observa-se que os estudos de coorte, estudo de caso e série de casos são em maioria oriundos da China, uma vez que é o país onde a epidemia de COVID-19 teve início e representa ambos 25% das metodologias de estudo utilizadas nesta revisão como no Gráfico 5.1, estudos estes que possuem menor evidência científica compõe o corpus da revisão, no entanto, o relato de uma série de casos que, pelo fato de não ter um critério comparativo, tem um valor um pouco maior que o relato de caso. Gráfico 5.1 Metodologia dos estudos análisados na revisão para classificação de evidências Observa-se que em relação aos estudos de revisão de literatura e metanálise a manifestação cardiovascular mais evidente foi elevação de enzimas cardíacas, seguida de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM)/ Lesão miocárdica e miocardites, como representado na Tabela 5.2. Em relação aos estudos de coorte, foram observadas que as lesões cardíacas e elevação de enzimas cardíacas compuseram também a maioria de alterações cardiovasculares conforme Tabela 5.3, seguidas de IAM e arritmias cardíacas Tabela 5.2 Manifestações cardiovasculares em estudo de revisão e metanálise Manifestação cardiovascular em estudos de revisão e me- tanálise Publicação Arritmias cardíacas P7, P8, P9, P10 Insuficiência Cardíaca Aguda P7, P8, P9 Miocardites P3, P7, P8, P9 Infarto Agudo do Miocárdio e alterações no eletrocardio- grama P3, P7, P8, P9, P10 Elevação de Enzimas Cardí- acas / Lesão Cardíaca P3, P7, P8, P9, P10, P12 Distúrbios de Coagulação P3, P7, P9, P10 Síndrome de Takotsubo P7, P8, P9 Síndrome Coronariana Aguda P7, P9 Choque P9, P10 31% 25% 25% 13% 6% Revisão de Literatura Estudo de Série de Casos Estudo de Coorte Relato de Caso 38 Em relação aos relatos de caso foram obser- vados elevação de enzimas cardíacas, seguidos de distúrbios da circulação com alterações car- diovasculares mais frequentes. Tabela 5.3 Manifestações cardiovasculares em estudo de coorte e série de casos Manifestação cardiovascu- lar em estudos de coorte e série de casos Publicação Arritmias cardíacas P1, P4, P6, P13, P14 Insuficiência Cardíaca Aguda P1, P13 Miocardites P1, P14, P15 Infarto Agudo do Miocár- dio e alterações no eletro- cardiograma P1, P2, P4, P6, P13, P14, P16 Elevação de Enzimas Car- díacas / Lesão Cardíaca P1, P2, P4, P5, P6, P11, P13, P14, P16 Distúrbios de Coagulação P1, P4, P5, P6, P11, P13, P16 Síndrome de Takotsubo P11 Síndrome Coronariana Aguda P13, P14 Desse modo, o mecanismo fisiopatológico de infecção do SARS-CoV-2 em relação ao sistema cardiovascular é baseado na ligação do vírus à membrana de Enzima Conversora de Angiotensina 2 (ECA2) e internalização do complexo pela célula hospedeira (RODRIGUES et al., 2020). É sabido que tal enzima participa do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) e mais especificamente, a ECA2, catalisa a conversão da Angiotensina II (Ang II), em Angiotensina1-7 (Ang 1-7), e o vírus impede essa conversão (RODRIGUES et al., 2020). Segundo Rodrigues et al., (2020) vale ressaltar que, a Ang II desencadeia inflamação, fibrose, estresse oxidativo e vasoconstrição enquanto a Ang 1-7 tem o papel antagonista e, portanto, efeito cardioprotetor. A perda de ECA2 no sistema cardiovascular promove disfunção endotelial, inflamação e exacerbação da aterosclerose e do diabetes. Paralelo a isso, no Sistema Nervoso Central (SNC) há desregulação da pressão arterial do sistema nervoso autônomo e do centro respiratório (RODRIGUES et al., 2020). Além disso, outros fatores podem contribuir para a lesão cardíaca como: Lesão direta no miocárdio pela infecção viral; Lesão por hipoxemia; Altas concentrações de Interleucinas-1β, IFN-γ, IP-10 e MCP-1 são detectadas nos pacientes infectados gerando uma resposta via linfócito T-helper. Gerando assim, o IAM e arritmias como foi encontrado neste estudo (Th1) (RODRIGUES et al., 2020). Dito isso, conclui-se que a Covid-19 cursa com diferentes patologias cardíacas por mecanismos distintos. Tal acometimento é acompanhado pela elevacão dos marcadores como a: Troponina, proteína-c-reativa, ferritina, procalcitonina, aminotransferases e transaminases. Em um estudo de 2019, revisão bibliográfica de 15 publicações utilizadas, 12 são revisão de literatura, 1 estudo de caso, 1 ensaio Clínico e 1 estudo transversal, as publicações utilizadas concluíram pelo uso de biomarcadores como prática eficiente no diagnóstico e prognóstico de doenças cardiovasculares (BORGES et al., 2019). O SARS-CoV-2 tem uma estrutura seme- lhante ao SARS-CoV, esse novo vírus também pode causar danos crônicos ao sistema cardio- vascular, e por isso deve-se enfatizar a atenção à proteção cardiovascular durante o tratamento da COVID-19 (ZHENG et al., 2020). Danos cardíacos relacionados a medica- mentos durante o tratamento com COVID-19 39 são uma preocupação. Em particular, o uso de medicamentos antivirais deve ser monito- rado. Muitos medicamentos antivirais podem causar insuficiência cardíaca, arritmia ou outros distúrbios cardiovasculares. Portanto, durante o tratamento da COVID-19, principalmente com o uso de antivirais, o risco de toxicidade cardí- aca deve ser monitorado de perto (WANG et al., 2019). As publicações também concluíram que esta manifestação cardiovascular está significa- tivamente associada ao desfecho fatal de CO- VID-19. Demais dados necessitam de maiores estudos com metanálises com maiores níveis de evidência. CONCLUSÃO Há algum tempo desde que a sociedade en- frentou uma nova doença de proporções mun- diais, que foi a COVID-19. Considerando as in- formações alcançadas, fica evidenteque este estudo contribui para o corpo de conhecimento dos profissionais da saúde no tocante às princi- pais manifestações cardiovasculares ocasiona- das pela COVID-19. Embora a doença respiratória seja a mani- festação clínica dominante da COVID-19, o peso da doença implica que muitos pacientes com desfechos cardiovasculares, que pode le- var o indivíduo a desenvolver disfunção cardí- aca de início recente durante o curso da doença. Esta revisão indica que pacientes acometi- dos pela COVID-19 tem maior riso de apresen- tar elevação de biomarcadores cardíacos, IAM, arritmias cardíacas, trombocitopenias. Ade- mais, consequentemente o risco de apresenta- rem qualquer outra lesão cardiovascular. Assim, à medida que avançamos no atendimento de pacientes com COVID-19, é essencial monitorar os níveis de enzimas cardíacas em pacientes hospitalizados para identificar e gerenciar qualquer inflamação miocárdica clínica ou subclínica antes do desenvolvimento de patologias cardíacas graves, como miocardite, microangiopatia e IAM permitindo, desta maneira, uma terapia mais específica e mais rápida. Por conseguinte, esta análise induz que o foco de novos estudos necessita que esteja vol- tado as principais condutas em pacientes com essas manifestações, seguido de um fluxo- grama, onde inclua essas alterações identifica- das como red flag (bandeira vermelha). Destacando, assim, a necessidade de um olhar direcionado às alterações frente às enzi- mas cardíacas/ lesões cardíacas, para que haja diagnóstico precoce e o manejo oportuno pe- rante a estas alterações, contribuindo para o es- tabelecimento da reabilitação diante das altera- ções cardiológicas e seus agravos. Concordante ao verificado anteriormente, devido a uma grande magnitude significativa da população com comorbidades subjacentes apre- sentando um risco aumentado de doença grave por COVID-19, esta análise atual pode fornecer informações sobre principais achados clínicos e laboratoriais para populações selecionadas a doenças graves. Fenômenos inflamatórios sistêmicos cardi- ovasculares durante a infecção viral estão bem documentados, podendo evoluir para remodela- mento cardíaco e disfunção miocárdica posteri- ormente. Portanto, é necessária uma cardiovigi- lância desses indivíduos já estudados para mo- nitorar o desenvolvimento de possíveis lesões futuras. O número de pessoas vacinadas a nível na- cional continua a aumentar, mas ainda há hesi- tação em uma parte significativa do país, o que é contrário ao objetivo de reduzir efetivamente o número de infecções por COVID-19 a nível nacional e global 40 Como já supramencionado, as lesões cardi- ovasculares, indicadas pela elevação dos bio- marcadores durante a infecção por COVID-19 são preditores de mortalidade na infecção por SARS-CoV-2. Considerando isso, o entendimento atual so- bre manifestações cardiovasculares e COVID- 19 é escasso. Portanto, é altamente desejável que os estudos futuros sobre COVID-19 descre- vam especificamente a incidência, mecanis- mos, apresentação clínica e resultados de várias manifestações CV nesses pacientes. A frequência de manifestações cardiovascu- lares, incluindo pessoas com sintomas mínimos ou inexistentes durante a infecção inicial, le- vanta questões importantes sobre os possíveis efeitos cardiovasculares a longo prazo também. Uma vez que, as publicações concluíram que esta manifestação cardiovascular está sig- nificativamente associada ao desfecho fatal de COVID-19, é necessário que haja maiores pes- quisas. Estudos futuros são necessários para escla- recer os possíveis mecanismos de lesão cardio- vascular que ocorrem devido a concomitância das duas doenças, para diagnóstico precoce e testar tratamentos adequados. Nesse ínterim, destaca-se que alguns dos medicamentos utilizados para tratar a COVID- 19 apresentam possíveis complicações cardía- cas. Então, é imprescindível que os médicos, principalmente os que atendem na emergência, estejam cientes dessas complicações ao tratar o paciente com COVID-19. Também são necessárias pesquisas para confirmar se as terapias existentes são eficazes a população portadora de COVID, os pós e con- tras/ efeitos adversos. Ressalta-se uma área para futuras de investigação. As limitações neste estudo revelam que uma quantidade significativa de literatura é publi- cada em forma de pré-impressão, antes da con- clusão da revisão completa. Mais dados são ne- cessários sobre as complicações cardiovascula- res discutidas e COVID-19. Embora as questões sobre COVID-19 e do- enças cardiovasculares permaneçam e conti- nuem a surgir, a pandemia demonstrou que a comunidade científica é excepcionalmente de- dicada e capaz de fornecer muitas respostas em relação as maiores complicações e desfechos. 41 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ASKIN, L. et al. O efeito da doença de coronavírus 2019 nas doenças cardiovasculares. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 114, n. 5, p. 817–22, 2020. BEVACQUA, R.J. & PERRONE, S.V. COVID-19: Re- lación entre enzima convertidora de angiotensina 2, sis- tema cardiovascular y respuesta inmune del hués- ped. Insuficiencia cardíaca, v. 15, n. 2, p. 34-51, 2020. BORGES, L.P. et al. 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Uma vez resolvida a infecção aguda, os pa- cientes podem desenvolver doença crônica, que em até 30-40% dos casos é caracterizada por cardiomiopatia, arritmias, megavísceras e, mais raramente, polineuropatia e acidente vascular cerebral (PEREZ-MOLINA & MOLINA, 2018). A doença de Chagas combina condições clí- nicas assintomáticas e/ou de progressão para doença cardio-digestiva de acordo com deter- minantes biológicos e sociais de grande com- plexidade. Dentre os determinantes biológicos, temos a virulência do parasita e a suscetibili- dade das pessoas afetadas, e dentre os determi- nantes sociais temos pobreza, alimentação, mo- radia e educação, entre outros. As doenças tro- picais negligenciadas são aquelas que afetam as populações que vivem em condições de pobreza e vulnerabilidade, também se relaciona a pro- blemas sociais como habitação em áreas de flo- restas e incluindo o estigma (PEREIRA-SILVA et al., 2022). A doença de Chagas está se tornando um problema de saúde emergente em áreas não en- dêmicas devido aos crescentes movimentos po- pulacionais, a detecção precoce e o tratamento de indivíduos assintomáticos e campanhas de prevenção são essenciais para evitar a propaga- ção dessa doença (RASSI et al., 2010). Nas últimas décadas, o perfil epidemioló- gico da doença mudou devido a novos padrões de imigração, melhorias das condições de saúde pública e controle bem-sucedido em sua trans- missão, levando à urbanização e globalização da doença. EPIDEMIOLOGIA Em geral, pessoas soropositivas para doença de Chagas identificadas em estudos epidemio- lógicos ou através de triagem de doadores de sangue não relatam ter tido doença de Chagas aguda e não sabem que estão cronicamente in- fectados pelo T. cruzi. Isso ocorre porque as pessoas com maior risco de adquirir a infecção pelo T. cruzi, ou seja, os pobres da zona rural, geralmente têm pouco acesso a cuidados médi- cos e também porque a doença de Chagas aguda geralmente é uma doença leve (TANOWITZ et al., 2009). O ciclo de transmissão da doença de Chagas apoia-se no vetor triatomíneo como principal transmissor. Porém, após diversas campanhas nacionais e iniciativas de âmbito multinacional, a transmissão por este meio encontra-se parci- almente controlada. Em 2006, o Brasil recebeu da Organização Mundial de Saúde (OMS) cer- tificado de erradicação da transmissão da do- ença pelo mais relevante vetor domiciliado, o Triatoma infestans (SIMÕES et al., 2018). A doença de Chagas é endêmica em toda a América do Sul e Central, incluindo o México, mas não nas ilhas do Caribe ou Porto Rico. A Bolívia tem as maiores taxas de prevalência e incidência, mas Argentina, Brasil e Colômbia têm um número maior de pessoas vivendo com cardiomiopatia chagásica crônica devido a sua maior população ser tradicionalmente mais co- mum em áreas rurais onde a pobreza é genera- lizada (ECHAVARRÍA et al., 2019). Todavia, a OMS ainda estima em 300.000 o número de novos casos por ano na América La- tina e acredita que existam 8 milhões de pessoas infectadas em todo o mundo. A cardiomiopatia crônica da doença de Chagas é considerada um sério problema de saúde pública nas áreas en- dêmicas da América Latina, representando uma das maiores causas de insuficiência cardíaca e 45 morte súbita. Atualmente, graças à globalização e às correntes migratórias, é também uma do- ença emergente em países não endêmicos, como Estados Unidos da América, Canadá, Es- panha, França, Suíça, Itália, Japão, e outros pa- íses da Ásia e da Oceania (SIMÕES et al., 2018) Globalmente, estima-se que 8 a 10 milhões de pessoas sejam infectados pelo T. cruzi e que cerca de 90-100 milhões de pessoas estejam em risco de infecção. Além disso, por volta 12.500 mortes por ano podem ser atribuídas à doença de Chagas (GASCON & PINAZO, 2015). A doença de Chagas é endêmica em 21 paí- ses das Américas e afeta aproximadamente 6 milhões de pessoas. Assim, apresenta incidên- cia anual média de 30.000 novos casos, 12.000 óbitos por ano e 8.600 recém-nascidos infecta- dos durante a gestação. Além disso, estima-se que cerca de 70 milhões de pessoas nas Améri- cas vivem em áreas de exposição e correm o risco de contrair esta doença (“Chagas disease - PAHO/WHO | Pan American Health Organiza- tion”, 2022). O controle de vetores tem se mostrado efi- caz. Os esforços de controle internacional resul- taram em grandes reduções na doença de Cha- gas nos países do Cone Sul da Argentina, Chile, Brasil, Paraguai e Uruguai. O atual reservatório da doença está na América Central. Com uma estimativa de dois milhões deindivíduos infec- tados e mais 26 milhões em risco, a América Central tem aproximadamente 11% dos indiví- duos infectados (prevalência) para todo o con- tinente (MILLS, 2020). No Brasil, atualmente, estima-se pelo me- nos um milhão de pessoas infectadas por T. cruzi. Em estudos recentes, as estimativas vari- aram de 1,9 a 4,6 milhões de pessoas, provavel- mente, mais próximo atualmente à variação de 1,0 a 2,4% da população. Nos últimos 10 anos, foram registrados em média 4.000 óbitos a cada ano no país tendo como causa básica a doença de Chagas (“Secretaria de Vigilância em Saúde | Ministério da Saúde Boletim Epidemiológico Territorialização e vulnerabilidade para doença de Chagas crônica”, 2022). A prevalência de amostras reagentes para doença de Chagas na fase crônica da doença no Ceará, segundo dados do Laboratório Central de Saúde Pública do estado do Ceará (LACEN), variou de 3,2 em 2015 a 2,4% em 2019. Ou seja, aproximadamente, 268 mil pessoas. O resumo da epidemiologia podemos observar na Figura 6.1. Figura 6.1 Representação estimada da população infec- tada pela Doença de Chagas ao longo dos anos FATORES DE RISCO Os aspectos prognósticos mais relevantes são sintomas de insuficiência cardíaca avan- çada, cardiomegalia, disfunção sistólica do ven- trículo esquerdo e taquicardia ventricular não sustentada. A prevenção dos eventos cardioem- bólicos é aspecto importante no manejo dos pa- cientes com cardiomiopatia crônica da doença de Chagas. Agentes anticoagulantes orais de- vem ser indicados para pacientes com risco ele- vado, conforme a presença de um conjunto de fatores de risco: Disfunção sistólica do ventrí- culo esquerdo, aneurisma apical, alteração da 46 repolarização ventricular no eletrocardiograma e idade avançada (SIMÕES et al., 2018). O curso clínico da doença é variável e os mecanismos que determinam o padrão evolu- tivo da cardiopatia ainda não foram completa- mente esclarecidos. Além disso, vários fatores podem predizer prognóstico desfavorável, como a presença de arritmias ventriculares complexas e disfunção ventricular esquerda. Ademais, eventos tromboembólicos são fre- quentes na cardiomiopatia Chagásica, sendo uma importante causa de morbimortalidade, fa- tor que contribui com a necessidade da estrati- ficação de risco dos pacientes com doença de Chagas para definir estratégias terapêuticas. PATOGÊNESE A doença de Chagas tem sua origem da transmissão do protozoário Trypanosoma cruzi geralmente das excretas produzidas pelo inseto da família dos Reduviidae denominado de Tri- atoma infestans ou “Barbeiro”, porém existem outros meios como transmissão materno-fetal durante a gravidez e a via hematogênica através da doação de sangue. Após a transmissão, as formas conhecidas como tripomastigotas do pa- rasita vão adentrar nas células do hospedeiro onde vão se diferenciar na forma amastigota e se multiplicar. Dessa forma, eventualmente vai ocorrer lise celular e liberação dos parasitas na corrente sanguínea, os quais podem tanto infec- tar novas células como novos barbeiros e conti- nuar o ciclo, o que pode ser visto na Figura 6.2 (BONNEY & LUTHRINGER, 2018). Figura 6.2 Representação do ciclo da doença de Chagas 47 FISIOPATOLOGIA Fisiopatologia da fase aguda A fisiopatologia da doença de Chagas é complexa e possui diversos fatores, sendo para- sita, sistema imune do hospedeiro e a inflama- ção fatores chaves. A fase aguda da tripanossomíase americana ocorre semanas após a infecção pelo parasita e esse estágio fisiopatológico pode durar até pou- cos meses. Inicialmente o T. cruzi passa por es- tágios de replicação, os quais geralmente ocor- rem na área de inoculação em que as formas tri- pomastigotas liberadas vão infectar mais célu- las do organismo humano. De forma geral, o protozoário tem capacidade de infectar qual- quer célula nucleada do corpo, porém este pos- sui tropismo natural por miofibras cardíacas es- triadas, em razão disso com a progressão da in- fecção e novas áreas sendo infectadas o coração tende a ser um dos principais sítios acometidos na fase crônica da doença (BONNEY et al., 2018). Existe a possibilidade de se desenvolver mi- ocardite clinicamente significante na fase aguda (<1% dos casos), sendo assim dependendo de fatores como a cepa de T. cruzi e variações ge- néticas e imunológicas do hospedeiro, pode-se ocorrer uma rápida replicação cardíaca, muitas vezes, fulminante. O tecido cardíaco vai sofrer infiltração por diversas células como macrófa- gos e neutrófilos e a ação inflamatória local re- presentada por citocinas e quimiocinas, porém a infecção aguda é geralmente subclínica e não costuma gerar alterações estruturais significati- vas (BONNEY et al., 2018). Fisiopatologia da fase crônica Na fase crônica da doença, os principais sis- temas que podem ser afetados são o sistema cardiovascular e o sistema gastrointestinal. Em razão disso, as alterações fisiopatológicas mais significantes são a cardiomiopatia chagásica, megacólon e megaesofágo (SANTOS & FAL- CÃO, 2020). A respeito das alterações cardiovasculares é sabido que a manutenção do parasita no orga- nismo é um fator central na fisiopatologia da doença, o que somado a resposta inflamatória do hospedeiro é um fator preditor de progressão da doença, porém existem outros como o tro- pismo e a virulência da cepa (MOLINA-PÉ- REZ & MOLINA, 2018). Visto isso, como ex- plicado anteriormente na fase aguda há uma resposta inflamatória necessária para a defesa do organismo invadido, entretanto pode ocorrer uma falha no processo de regulação desta, as- sim diversos agentes como macrófagos ativa- dos por interferon-Y e fator de necrose tumoral- ∝ da fase aguda e imunidade mediada por cé- lulas T da fase crônica podem continuar atu- ando por mais tempo, o que parece um dos me- canismo principais da doença de Chagas (BERN, 2015). Além disso, alguns pesquisadores postulam que a superinfecção que ocorre pela exposição repetida e prolongada ao parasita gera um nível inflamatório crônico mais elevado, o que con- sequentemente promove maiores danos cardía- cos e pior quadro clínico da cardiopatia chagá- sica. Essa hipótese foi testada em modelos ani- mais comparando camundongos infectados uma única vez e outros com várias infecções pelo T. cruzi e foi visto que aqueles infectados mais de uma vez tinham alterações graves mais frequentes ao eletrocardiograma (BERN, 2015). A respeito das alterações gastrointestinais, as alterações conhecidas como megacolón e megaesófago são derivadas de danos a neurô- nios intramurais (BERN, 2015). Dessa forma, há perda da função tanto de neurônios inibitó- rios como de neurônios excitatórios, o que gera 48 dificuldades nas funções fisiológicas de peris- taltismo e de ação dos esfíncteres esofágicos. Além disso, a doença de Chagas gera outras consequências ao sistema digestório como hi- pertrofia das glândulas salivares, menor absor- ção de nutrientes por parte do intestino e dimi- nuição da produção de ácido clorídrico no estô- mago. Portanto, a tripanossomíase americana é capaz de gerar inúmeras mudanças patológicas no organismo a partir da interação de fatores complexos e ainda não completamente conhe- cidos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Manifestações clínicas da fase aguda A doença de Chagas pode se manifestar de forma aguda e de forma crônica. A fase aguda pode ocorrer em qualquer idade e na maior parte dos casos é assintomática. No entanto, quando essa fase é sintomática, as principais manifestações são febre, reação inflamatória no sítio de inoculação do parasito, edema bipalpe- bral unilateral (conhecido como sinal de Ro- maña), hepatoesplenomegalia e linfadenopatia, que geralmente persistem por cerca de 8 sema- nas e se resolvem espontaneamente (MOLINA- PÉREZ & MOLINA, 2018). Em casos mais graves, correspondentes a menos de 1% da to- talidade das infecções, podem ocorrer também miocardite aguda,meningoencefalite e derrame pericárdico (MOLINA-PÉREZ & MOLINA, 2018; BERN, 2015). Em crianças, a miocardite chagásica aguda se manifesta como taquipneia, irritabilidade, suor, anorexia, vômito, hepato- megalia e edema de membros inferiores (DIAS et al., 2016). Os surtos da doença que são relacionados à transmissão oral do T. cruzi foram relacionados à maior incidência de miocardite e pior evolu- ção do quadro em relação à contaminação por meio da via vetorial clássica (BERN, 2015), sendo essa forma de aquisição do parasito par- ticularmente relevante, para o Brasil, na Região Amazônica (DIAS et al., 2016). Outro mecanismo de ocorrência da fase aguda é por meio da exacerbação do quadro em um paciente com a fase crônica já estabelecida (BARRETTO et al., 2011). Essa agudização é mais frequente em pacientes imunossupressos, cujo principal exemplo são os co-infectados por HIV. Nesse contexto, o diagnóstico pode ser di- fícil e de prognóstico fatal, uma vez que os in- divíduos estão sujeitos a evoluírem com o qua- dro grave da doença, sendo possível a ocorrên- cia de sequelas cardíacas e neurológicas. Manifestações clínicas da fase crônica Após a fase aguda inicial, a doença de Cha- gas apresenta três cursos clínicos possíveis: A forma indeterminada, a forma cardíaca (com ou sem disfunção ventricular) e a forma digestiva. A manifestação cardíaca afeta cerca de 30% dos pacientes cronicamente infectados pelo proto- zoário T. cruzi, sendo classificada em quatro es- tágios conforme parâmetros clínicos, eletrocar- diográficos e ecocardiográficos (SARAIVA et al., 2021). Os sintomas crônicos demoram anos ou até décadas para se manifestarem, sendo os de origem cardíaca as mais sérias e mais fre- quentes queixas relatadas (ECHAVARRÍA et al., 2021). A cardiomiopatia chagásica é definida como uma miocardite crônica que pode acome- ter todas as câmaras cardíacas, o sistema de condução e o sistema nervoso autônomo. O pro- cesso de injúria cardíaca é parte de uma com- plexa interação entre a atividade infecciosa crô- nica, denervação e danos endoteliais e micro- vasculares, que levam ao dano tecidual e à re- modelação cardíaca, cujo fim é a insuficiência cardíaca (VIEIRA et al., 2019). O desenvolvi- mento de insuficiência cardíaca (NYHA classe 49 III ou IV) é considerado um fator prognóstico durante essa fase, bem como disfunção ventri- cular sistólica global (DIAS et al., 2016). Do ponto de vista clínico, a cardiomiopatia chagásica apresenta alterações condizentes com o quadro da doença de Chagas no eletrocardio- grama (discutido com mais detalhes na seção de diagnóstico), arritmias, síncope, disfunção ven- tricular esquerda e insuficiência cardíaca con- gestiva. Os sinais precoces mais típicos são os defeitos nos sistemas de condução, representa- dos pelo bloqueio do ramo direito do feixe de His ou do fascículo ântero-superior (BERN, 2015; VELASCO & MORILLO, 2018). De- vido às arritmias, o paciente pode relatar ton- tura, palpitações, lipotímia e síncope (VIEIRA et al., 2019). Já em decorrência da disfunção microvascular e da insuficiência ventricular es- querda, pode ser referida dor torácica. Nessa perspectiva, morte súbita de origem cardíaca é a causa de mortalidade mais fre- quente, respondendo por cerca de 50-60% dos óbitos, seguida por falência cardíaca e embolia (VELASCO & MORILLO, 2018). Em fases mais avançadas da cardiomiopatia, os aneuris- mas de ventrículo esquerdo são comuns. Como consequência das alterações iniciais da fase crô- nica (principalmente arritmias), o paciente pode sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) ou outros eventos cardioembólicos devido à dilata- ção ventricular (BERN, 2015), justificando os importantes índices de mortalidade da progres- são da doença. Como forma de compreender o avanço do dano cardíaco, o II Consenso Brasileiro de Do- ença de Chagas classifica a manifestação cardí- aca em quatro estágios, entre A e D (SARAIVA et al., 2021). Nessa classificação, são incluídos os pacientes que inicialmente apresentam alte- rações no eletrocardiograma (ECG), exemplifi- cadas por extrassístoles ventriculares, bloqueio atrioventricular, bloqueio completo do ramo di- reito do feixe de His, dentre outras. Após a de- tecção de alguma anormalidade ao ECG, os pa- cientes realizam ecocardiograma para avaliação da fração de ejeção do ventrículo esquerdo e Holter ou um teste de estresse para avaliação de arritmia. O objetivo dessa investigação é a con- firmação da presença ou ausência de insuficiên- cia cardíaca (DIAS et al., 2016) e, com esse re- sultado, a doença é classificada nos estágios A, B, C e D (comentados na seção de diagnóstico). Outras manifestações clínicas da fase crônica Na forma indeterminada, não há sinais nem sintomas, e não há alterações detectadas no ele- trocardiograma, na radiografia de tórax e nos exames gastrointestinais (SARAIVA et al., 2021), mas as sorologias e/ou parasitológicos são positivos (DIAS et al., 2016). A forma digestiva ou gastrointestinal é a menos comum, e se caracteriza pelo acometi- mento do esôfago (causando o megaesôfago) e do cólon (causando o megacólon), acarretando impactos relacionados à disfunção peristáltica por lesão dos plexos intramurais (SARAIVA et al., 2021; BERN, 2015). Podem ocorrer em as- sociação à doença cardíaca em 65% dos casos (DIAS et al., 2016). As principais manifesta- ções do megaesôfago são acalasia, odinofagia, disfagia, perda de peso, aspiração e regurgita- ção. Como consequência do megacólon, há constipação que pode propiciar fecaloma, volvo e isquemia intestinal (PÉREZ-MOLINA & MOLINA, 2018). DIAGNÓSTICO A avaliação clínica e cardiovascular dos pa- cientes com DC definida ou suspeita, é essen- cial para detectar os eventuais danos cardíacos e gastrointestinais. A doença de Chagas pode 50 afetar o coração, o esôfago e o cólon. As razões pelas quais alguns pacientes desenvolvem dife- rentes formas clínicas ou permanecem assinto- máticos não são claras, porém acredita-se que os marcadores imunogenéticos teciduais influ- enciam o tropismo do T. cruzi por diferentes ór- gãos (BERNARDO et al., 2016). Dentre os principais exames na avaliação diagnóstica da doença de Chagas temos o ele- trocardiograma, ecocardiograma, RX do tórax, sorologia para Chagas, holter entre outros a de- pender da sintomatologia apresentada pelo pa- ciente. O eletrocardiograma é o teste mais impor- tante na avaliação inicial da função cardíaca, podendo indicar se já há uma cardiomiopatia instalada, presença de arritmias e contribuição para a estimativa do risco cardiovascular. A tempestade elétrica (ES), definida como ≥ 3 episódios distintos de taquicardia ventricu- lar ou fibrilação ventricular sustentada em um período de 24 horas é um problema comum em pacientes com doença cardíaca de Chagas por- tadores de cardiodesfibriladores implantáveis que são usados no tratamento da doença (PA- VÃO et al., 2020). A importância do eletrocardiograma é o seu papel no processo de classificação da cardiomi- opatia chagásica. Em pacientes com doença de Chagas, uma alteração no ECG, em relação aos parâmetros típicos de normalidade, indica a ne- cessidade de outros exames complementares. Inicialmente, as alterações de maior importân- cia são exemplificadas por bloqueio do ramo di- reito do feixe de His, extrassístoles ventricula- res, bloqueio atrioventricular de 2° grau, dis- função do nó sinusal, fibrilação atrial, dentre outras. A partir de algum desses achados, o pa- ciente então realiza um ecocardiograma (ECO) para investigação da fração de ejeção do ventrí- culo esquerdo e um holter ou teste de estresse para avaliação de arritmias. Após o resultado desses exames, há a possibilidade de o paciente possuir ou não insuficiência cardíaca conges- tiva (ICC), sendo esse o critério para a classifi- cação da doença nos estágios de A a D (DIAS et al., 2016). Confirmando-se a ausência de insuficiência cardíaca,o paciente é classificado nos grupos A ou B, enquanto que a presença de ICC confi- gura os grupos C e D. Nessa classificação, o grupo A contém aqueles cujo resultado do eco- cardiograma foi normal e não possuem arritmia, sendo esse distúrbio elétrico supostamente de- tectado ao ECG inicial devendo ser reavaliado. No grupo B, ocorre uma subdivisão: Em B1, os pacientes apresentam alteração da fração de eje- ção ao ECO, mas ela se encontra em pelo menos 45%, e há arritmia; em B2, a fração de ejeção está alterada para menos que 45%, podendo ou não haver arritmias. No grupo C, o ECO está alterado, mas a insuficiência cardíaca está com- pensada, e no grupo D há insuficiência cardíaca refratária detectada ao ECO. Nos grupos C e D a arritmia pode ou não ser presente e, em ambas as classes, bem como na classe B, o paciente deve ser tratado e periodicamente reavaliado (DIAS et al., 2016). As alterações eletrocardiográficas são uma importante ferramenta para diagnóstico da do- ença de Chagas, porém muitas vezes na infec- ção aguda as alterações eletrocardiográficas não são encontradas sendo o diagnóstico soro- lógico um importante marcador para diagnós- tico clínico da doença. Segundo Ramos et al., (2021) a cardiome- galia na RX de tórax foi sempre avaliada na in- cidência posteroanterior e definida como a pre- sença de índice cardiotorácico > 0,5. Foi envi- dado esforço adicional para eventual caracteri- zação de aumento ventricular direito, por com- paração com a telerradiografia em perfil, nos 51 casos em que essa incidência radiológica estava disponível, mas sem sobra de dúvida a ecocar- diografia não deixa dúvidas sobres as alterações morfológicas no coração chagásico. A cardiomegalia pela radiografia de tórax é preditor independente de morte em indivíduos com cardiomiopatia crônica da doença de Cha- gas. A correlação entre o aumento do índice cardiotorácico (ICT) na radiografia de tórax e do diâmetro telediastólico do ventrículo es- querdo pela ecocardiografia é parâmetro ade- quado e com alta especificidade para distinguir entre presença e ausência de cardiomegalia na radiografia de tórax na doença de Chagas (RA- MOS et al., 2021). Já o RX do tórax e do abdome podem de- monstrar a presença de cardiomegalia e mega- cólon, respectivamente. Outros exames importantes que podem ser utilizados são a manometria anorretal e radio- grafia de enema opaco para investigar o mega- cólon, manometria esofágica e serigrafia RX para avaliar megaesôfago e eletrocardiograma ecocardiograma 2-D, teste ergométrico e radio- grafia de tórax para avaliar a cardiomiopatia. O ecocardiograma é o exame padrão outro utilizado para identificar anormalidades estru- turais e funcionais na doença de Chagas tanto na fase aguda como na crônica, bem como na forma indeterminada, e independente de mani- festações clínicas (ACQUATELLA et al., 2018). O ecocardiograma avalia as funções ventriculares sistólica e diastólica, análise regi- onal e global dos ventrículos esquerdo e direito, presença de aneurismas ventriculares, derrame pericárdico principalmente na fase aguda, pes- quisa de trombos, regurgitações mitral e tricús- pide, análise da hipertensão pulmonar. As técnicas laboratoriais para o diagnóstico das doenças não têm apresentado mudanças há anos. A antiga Reação de Machado-Guerreiro (fixação de complemento) não é mais empre- gada por sua baixa sensibilidade, baixa especi- ficidade e complexidade na execução. Na atua- lidade são utilizados os testes de imunofluores- cência indireta, hemoaglutinação e ELISA (imunoensaio enzimático). Tendo em vista a possibilidade de falso-positivos (leishmaniose, malária, sífilis, toxoplasmose, hanseníase, cola- genoses, hepatites) é recomendado que o soro seja testado em pelo menos dois desses métodos para confirmação da positividade da sorologia. Na fase aguda da doença o teste preferido é a PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) (DIAS et al., 2016). O xenodiagnóstico consiste em alimentar-se barbeiros normais em supostos portadores da infecção e determinar-se, depois, se eles adqui- rem ou não o parasitismo. São usadas de três a seis ninfas famintas geralmente empregadas em cada prova, devendo ficar em contacto com o doador até encherem-se completamente (15-30 minutos). Se o exame de fezes – espontanea- mente eliminadas ou obtidas por punção anal – não revelar a presença de flagelados, os insetos devem ser dissecados 40 a 60 dias depois da sucção, para exame do conteúdo duodenal. Na atualidade esse método é pouco utilizado nos grandes centros. Xenodiagnóstico como método de diagnós- tico da Doença de Chagas pode ser útil no diag- nóstico da doença na fase aguda, o momento subclínico da doença, onde não há sinais clíni- cos, e assim poder administrar o tratamento adequado no paciente (SANCHEZ-VEGAS et al., 2020). Com isso, evita-se complicações a longo prazo, o que muda completamente a pre- visão a curto e longo prazo. Os principais diagnósticos diferenciais rela- cionados à retenção parcial de contraste bari- tado no esôfago são o presbiesôfago, esclerose sistêmica, tumor de fundo gástrico, estenose de 52 cárdia, hérnia hiatal, esofagite por refluxo, compressão extrínseca e uso de drogas anticoli- nérgicas, carcinoma antral, a atonia gástrica e as obstruções em duodeno proximal (FIGUEI- REDO et al., 2002). Já o diagnóstico diferencial da duodenopa- tia é feito com as obstruções de causas orgâni- cas em nível do ângulo de Treitz, com o pinça- mento aórtico-mesentérico e com o megaduo- deno funcional de outras etiologias. TRATAMENTO Tratamento antiparasitário O tratamento da doença de Chagas consiste em duas etapas: Um tratamento baseado na eti- ologia (tratamento parasitário) e um tratamento baseado no quadro clínico do paciente (Quadro 6.1). Em relação ao tratamento parasitário, há duas possíveis drogas que podem ser usadas, são elas: A benznidazol (BNZ) e a nifurtimox (NFX), sendo cada uma administrada por 60 dias em monoterapia. O tratamento antiparasi- tário apresenta ótima resposta nas fases agudas da doença, quase que 100% de resposta nos ca- sos de transmissão congênita que são tratados nos primeiros anos de vida. Já em relação ao paciente em fase crônica, a resposta é baixa (ECHAVARRIA et al., 2021). O tratamento com BNZ ou NFX não é reco- mendado a pacientes que estão grávidas. De forma geral, deve-se usar o BNZ como uso pre- ferencial ao uso de NFX, pois mesmo ambas tendo alta taxa de efeitos indesejados, a BNZ tem melhor tolerabilidade (MENDES et al., 2022). O benznidazol e o nifurtimox , são as opções terapêuticas atuais para o tratamento da doença de Chagas, porém são eficazes apenas na fase aguda da doença e apresentam uma série de efeitos adversos importantes. O benznidazol pode produzir hipersensibilidade, erupções cu- tâneas, náusea; cefaleia, vertigem; fadiga; su- pressão da medula óssea e neuropatia perifé- rica, enquanto o nifurtimox costuma produzir doenças gastrointestinais e até 30% dos pacien- tes podem desenvolver perturbações do sistema nervoso central. Dentre as principais alterações temos perda de peso, sonolência, náuseas, vô- mito e cólicas abdominais. É importante ressal- tar que o uso de nifurtimox representa um risco maior de insuficiência cardíaca quando compa- rado ao benznidazol (BERMUDEZ et al., 2016). https://www.sciencedirect.com/topics/immunology-and-microbiology/benznidazole https://www.sciencedirect.com/topics/biochemistry-genetics-and-molecular-biology/nifurtimox 53 Quadro 6.1 Tratamento da doença de Chagas Tratamento antiparasitário da infecção pelo T.cruzi Fases da infecção Idade Medicamento Aguda Todas as faixas etárias Benznidazol e Nifurtimox Crônica indeterminada Pacientes (< 50 anos) Benznidazol (Não usar NFX) Pacientes (> 50 anos) Analisar decisão* Crônica cardíaca (fase inicial) Todas as faixas etárias Decisão compartilhada** Crônicacardíaca (doença avançada) Todas as faixas etárias Não tratar a infecção parasitária *Deve-se avaliar possíveis Insuficiência renal ou hepática **Visto que, para as fases crônicas, os antiparasitários para o T. cruzi são pouco eficientes Fonte: Diretrizes do Ministério da Saúde, 2018. Tratamento para o quadro clínico cardí- aco Já em relação ao tratamento do quadro clí- nico da cardiomiopatia chagásica, ele será ba- seado na terapia para uma insuficiência cardí- aca sistólica (ICC), visto que essa é a principal manifestação clínica cardíaca da doença. O tra- tamento, esquematizado no Quadro 6.2, se ba- seia em usar uma combinação de classes, como betabloqueadores, bloqueadores do receptor de angiotensina (BRAs) e inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECAs). Em casos de classe funcional NYHA II a IV e com fração de ejeção ventricular menor que 35%, pode ser adicionado um antagonista mineralocorticoide. Por fim, aqueles pacientes que mesmo após o tratamento com os medicamentos acima, ainda sejam persistentes nos sintomas, está indicado o uso da sacubitril/valsartana (SANTOS & FALCÃO, 2020). Devido à eficácia parcial e às limitações re- lacionadas à toxicidade dos tratamentos exis- tentes, há uma necessidade urgente de desen- volver novas terapias com eficácia superior e perfis de segurança para tratar com sucesso es- sas doenças. Dessa forma, o investimento em estudos clínicos de fase I, II e III são necessá- rios para aumentar o arsenal terapêutico para tratamento dessa doença. 54 Quadro 6.2. Tratamento da Insuficiência cardíaca secundária a doenças de Chagas Tratamento para a ICC Medicamentos Precauções Momento de usar IECA (Enalapril ou captopril) Hipercalemia, IRA e tosse Usado como primeira linha, associado a um Beta-bloqueador Betabloqueador (Metoprolol succinato ou carvedilol) Bradicardia, hipotensão pos- tural e piora da ICC Usado como primeira linha, com associação com um IECA Diuréticos (Hidroclorotiazida ou Fu- rosemida) Hipocalemia, IRA e hipoten- são postural Usados principalmente em pacientes que tem uma congestão resistente. Antagonista mineralocorticoide (Espironolactona) Hipercalemia, ginecomastia Usado caso o paciente ainda seja sintomático após o uso do tratamento de primeira linha Fonte: Diretrizes do Ministério da Saúde, 2018. Além disso, outras formas de manifestações clínicas radiológicas podem afetar o paciente, e nessas condições o tratamento pode demandar mais especificidade. Em casos de pacientes com bloqueio átrio-ventricular total (BAVT), há propensão à implantação de marcapasso; já os pacientes com associação de arritmias ven- triculares e ICC são elegíveis a uso de amioda- rona junto aos medicamentos usados para a ICC. E por fim, aos pacientes com arritmias se- veras (taquicardia ventricular sustentada ou fi- brilação ventricular), destina-se a possibilidade de implantação de um cardioversor-desfibrila- dor implantável (CDI) (SANTOS & FALCÃO, 2020). PREVENÇÃO No Brasil a doença de Chagas é um pro- blema de saúde pública principalmente nas re- giões Norte e Nordeste de falta de Política so- cial e Políticas de saúde adequadas. Dessa forma, devemos pensar na DC como uma do- ença de caráter social e principalmente um pro- blema de saúde pública, complexo e com dife- rentes dimensões: As ações e as atividades de- vem principalmente visar as pessoas vivendo com DC, fornecendo educação, acesso à infor- mação, e melhoria na sua qualidade de vida (PEREIRA-SILVA, 2022). 55 Observa-se a importância em orientar a po- pulação sobre a necessidade de manter o peri- domicílio organizado e inspecionado quanto à presença de triatomíneos, visto que são obser- vados focos de barbeiros em restos de constru- ção, em casas de taipas e locais precários e de má qualidade. Além disso, esta atenção ao peri- domicílio deve ser reforçada, pois a resposta que as medidas de controle possuem nas áreas extradomiciliares é diminuída, já que os inseti- cidas se deterioram mais rapidamente. CONTAMINAÇÃO PELO CALDO DE CANA No Brasil, o primeiro relato de doença de Chagas aguda adquirida por via oral ocorreu em 1965 no Estado do Rio Grande do Sul, quando 17 pacientes foram infectados simultanea- mente, resultando em 6 casos fatais (SILVA et al., 1968). A transmissão oral do protozoário Trypanosoma cruzi, agente etiológico da do- ença de Chagas, foi documentada em países da América Latina (FRANCO-PAREDES et al., 2020). Os casos relatados de transmissão oral em humanos foram associados à ingestão de ali- mentos, frutas frescas ou sucos contaminados por dejetos de animais ou vetores infectados. A ingestão de alimento contaminado pelo parasita favorece o surgimento de surtos regio- nais com a manifestação de quadro clínico agudo (MONSALVE-LARA et al., 2021). Es- tudo in vivo, através de modelo experimental, sugere que lesões na mucosa gástrica podem fa- cilitar a invasão por cepas do Trypanosoma cruzi e o nível de parasitemia. Diversos estudos epidemiológicos associa- ram a infecção por Trypanosoma cruzi ao con- sumo do sumo extraído da cana-de-açúcar, po- pularmente denominado de caldo de cana ou garapa de cana (MONSALVE-LARA et al., 2021). Desse modo, através de testes experi- mentais in vitro e in vivo, pesquisas buscaram avaliar a sobrevivência do parasita no caldo de cana e sua viabilidade para infecção por via oral. Pode ser observado a sobrevivência do pa- rasita, em amostras de caldo de cana, por até 4 horas, mantido em temperatura ambiente. A pa- rasitemia foi confirmada em 100% dos camun- dongos que receberam a inoculação, por via in- traperitoneal, de alíquotas do caldo de cana con- taminado por cepas de T. cruzi (PINTO et al., 1990). Nova reprodução dessa pesquisa identi- ficou a sobrevida do T. cruzi, no caldo de cana por até 12 horas e a parasitemia foi positiva em 100% dos camundongos inoculados por via oral e 50% dos animais inoculados por via perito- neal, demonstrando alto grau de sobrevivência e capacidade de causar infecção do parasita (CARDOSO et al., 2006). A transmissão da doença de Chagas, por via oral, para seres humanos e outros mamíferos, está bem estabelecida por pesquisa experimen- tal, clínica e epidemiológica. Há casos eventu- ais em todas as regiões do Brasil, sendo mais frequente na Região Norte, e estão relacionados à ocorrência de surtos de doença de Chagas Aguda com quadros graves e elevada mortali- dade. Essa transmissão pode se dar por meio da ingestão de alimentos contaminados que é re- sultado da escassez de boas práticas na sua ma- nipulação. Dessa forma, alguns alimentos po- dem estar relacionados a um risco aumentado de contaminação, com vetores do T. cruzi, du- rante a colheita, armazenamento, transporte, processamento ou preparo. Frutas frescas e ve- getais in natura estão entre os alimentos mais susceptíveis a contaminação acidental por inse- tos infectados ou suas fezes, ou secreções de animais infectados, bem como o consumo de leite cru, sangue ou carne sem cocção ade- quada. 56 CONTAMINAÇÃO PELO AÇAÍ A contaminação da doença de chagas (DC) relacionada ao consumo de açaí, dar-se a partir do processo de trituração do fruto, que advindo de uma colheita que possua o inseto (barbeiro) infectado pelo T. cruzi, proporciona a contami- nação por via oral possível. Uma vez que, o bar- beiro é atraído pela reflexão da luz (ROGEZ & AGUIAR, 2012) ou pelos odores exalados no processo fermentativo do fruto pelo calor e a umidade, favorecendo a deterioração do ali- mento pelo protozoário. No Brasil, durante os anos de 2012 a 2016 foram evidenciados pela Secretaria de Vigilância em Saúde, registrados pelo SINAN, 19.914 casos suspeitos de DCA, nos quais 1.190 casos foram confirmados. Nesse contexto, segregando os casos confirma- dos por região, foi possível depreender que cerca de 97,14% pertencem à região norte, va- lor muito superior ao encontradoem outras áreas, 2,01% ao nordeste, 0,33% ao sudeste e 0,25% ao sul e centro-oeste. Sintetizando as formas de contaminação evidenciou-se princi- palmente a via oral como fonte de contamina- ção, responsável por cerca de 73% dos casos, que fortalece a evidência da transmissão pelo elevado consumo do açaí na região norte, espe- cialmente no estado do Pará que detém 86,21% dos casos confirmados de DCA por transmissão oral (SANTOS et al., 2021). A doença de Chagas e suas repercussões, como a cardiomiopatia chagásica, são fatores preocupantes para a saúde pública, especial- mente no estado do Pará onde, por exemplo, ocorreu um crescimento de 96,31% dos casos de infecção por via oral nos últimos 20 anos, decorrente especialmente do consumo do suco de açaí. Enfatiza-se que mesmo em temperatu- ras negativas, o parasito permanece ativo nas suas variadas apresentações alimentícias (SAN- TOS et al., 2021). É importante salientar que tais procedimen- tos para a segurança no consumo do açaí pela BPF garantem um açaí seguro, sem mudanças de cor e sabor, sendo comprovados por testes sensoriais e possuindo grande incentivo a reali- zação dos processos de produção pelos produ- tores artesanais de açaí. Em síntese, compre- ende-se a importância que o açaí possui na nu- trição e na rentabilidade dos brasileiros, sendo de fundamental que tal produto não traga male- fícios em seu consumo. 57 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACQUATELLA, H. et al. 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Além disso, a carga da doença é sentida desproporcionalmente em países de baixa e mé- dia renda, onde estão dois terços dos casos, em grande parte devido ao aumento de fatores de risco nessas populações nas últimas décadas (RIBEIRO & UEHARA, 2022), sendo definida clinicamente a partir de uma pressão arterial sistólica (PAS) ≥ 140 e/ou pressão arterial di- astólica (PAD) ≥ 90 mm Hg (GOMES et al., 2022). Aproximadamente metade das pessoas que vivem com hipertensão arterial desconhe- cem sua condição, o que as coloca em risco de complicações médicas evitáveis e morte (SA- LAZAR et al., 2022). Conforme as Diretrizes Brasileiras de Hi- pertensão Arterial publicada em 2020, são elen- cados alguns fatores de risco para o desenvolvi- mento dessa condição, tais como genética, idade, gênero, etnicidade, sobrepeso a/ou obe- sidade, alto consumo de sódio, estilo de vida se- dentário, consumo de álcool, baixa escolari- dade, condições inadequadas de habitação e baixa renda familiar. O seu estabelecimento ocorre quando há disfunção vascular, devido ao desbalanço entre substâncias vasodilatadoras e vasoconstritoras sobre o endotélio, bem como ao enrijecimento e perda da complacência de grandes artérias conforme se envelhece. Nesse sentido, desencadeia alterações funcionais e es- truturais em órgãos-alvo, as quais poderiam fa- vorecer a infecção pelo SARS-CoV-2 e maior risco de desfechos desfavoráveis nesses pacien- tes (RIBEIRO & UEHARA, 2022). Os primeiros estudos epidemiológicos suge- riram que doenças cardiovasculares (DCV), in- cluindo HAS, estão associados à mortalidade ou gravidade em pacientes afetados pelo CO- VID-19. Esta possibilidade é preocupante, visto que a HAS é muito comum: Afeta cerca de 1,39 bilhão de indivíduos em todo o mundo e a pre- valência aumenta com a idade, afetando aproxi- madamente 70% dos idosos. Mundialmente, es- tima-se que a taxa de mortalidade em pacientes com COVID-19 e com doença cardiovascular pré-existente seja próxima a 10,5%, com hiper- tensão arterial sistêmica (HAS) seja de 6% e sem condições pré-existentes é de 0,9% (AL- MEIDA et al., 2022; VERANES-MUSTELIER et al., 2022). Segundo Ribeiro & Uehara (2022) quanto à relação entre hipertensão e COVID- 19, indivíduos hipertensos com infecção por SARS-CoV-2 tiveram riscos 2,27 e 3,48 vezes maiores de gravidade e letalidade, respectiva- mente, em comparação com casos de COVID- 19 sem hipertensão. Estudos apontam que a existência de comor- bidades, como insuficiência arterial sistêmica e a hipertensão em indivíduos com COVID-19 pode levar a resultados desfavoráveis, inclu- indo um aumento do risco de morte. O mau prognóstico desses pacientes está relacionado a uma disfunção endotelial que afeta diretamente a função vascular resultando em perda na com- placência das grandes artérias, sendo crucial na patogênese das complicações cardiovasculares. Associada ao processo de envelhecimento, a hi- pertensão resulta em enrijecimento progressivo e perda de complacência das grandes artérias, sendo crucial na patogênese das complicações cardiovasculares relacionadas ao COVID-19 (SALAZAR et al., 2022). A hipertensão arterial sistêmica se apresenta como um dos principais fatores de risco para os resultados adversos de pacientes com COVID- 19 (RIBEIRO & UEHARA, 2022). Dessa forma, o objetivo do presente capítulo é identi- ficar os desencadeamentos clínicos da hiperten- 61 são arterial em pacientes portadores do novo coronavírus. MÉTODO Este é um estudo de revisão bibliográfica, com intuito de pesquisar as informações acerca das implicações clínicas da hipertensão arterial em pacientes com COVID-19, a pesquisa foi re- alizada no período de 2022, por meio de buscas nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Sa- úde (BVS) e SciELO. Foram utilizados os des- critores: Hipertensão; COVID-19; Manejo. Desta busca foram encontrados 1.694 artigos, posteriormente submetidos aos critérios de se- leção. Os critérios de inclusão foram: Artigos com textos completos, em idiomas espanhol, inglês e português, publicados durante o período de 2022, que abordavam as temáticas propostas para a relevância desta pesquisa, revisões bibli- ográficas, estudos retrospectivos e relatos de caso disponibilizados na íntegra. Os critérios de exclusão foram: Os artigos duplicados, disponi- bilizados na forma de resumo, que não aborda- vam a proposta diretamente a proposta estudada e que não atendiam aos demais critérios de in- clusão. Após os critérios de seleção, restaram 9 ar- tigos os quais foram submetidos à leitura minu- ciosa para coleta de dados. Além disso, também foi utilizado livros, revistas e sites para detalhar as informações acerca desse assunto sob o ponto de vista da ciência. Todos os artigos sele- cionados foram lidos na íntegra e apresentados na Tabela 7.1 abaixo, contendo: Numeração; Autor e ano; Título de estudo; Idiomas; Bases de dados. RESULTADOS E DISCUSSÃO No que concerne em relação às pesquisas feitas da produção científica na plataforma pes- quisada utilizando os descritores específicos, é importante destacar que foi notório encontrar 74 artigos correspondentes à temática na base de dados da SciELO, após a aplicação dos fil- tros, 23 artigos foram selecionados para discus- são da problemática, sendo que todos são do pe- ríodo de 2022 a 2023. Além disso, outra base de dados utilizada foi o banco de dados da Biblio- teca Virtual em Saúde (BVS), no qual, 1.620 ar- tigos acerca da temática foram encontradas, após a aplicação dos filtros, 22 artigos foram se- lecionados para a análise do assunto, sendo que todos são do período entre 2022 a 2023, como também foram utilizadas as palavras - chaves “ COVID-19” e “ Hipertensão”, no geral, foram 45 artigos ao total para discussão da proposta acerca do assunto na seleção de artigos . A COVID-19 dispõe de uma fisiopatologia complexa e multissistêmica, atuando de ma- neira notória no desequilíbrio da homeostase. E, as comorbidades (hipertensão arterial sistê- mica (HAS) e doença cardíaca, por exemplo) que normalmente estão relacionadas às formas mais graves da doença, podem contribuir para o aumento do tônus simpático, proporcionando a hiperativação do sistema nervoso autônomo (SNA) simpático. Além disso, portadores de doenças cardiometabólicas possuem maior tônus simpático naturalmente, com isso, estão mais suscetíveis a exibir hiperatividade do SNA simpático, contribuindo assim, para maiores complicações e elevada morbimortalidade (SA- LAZAR et al., 2022). O SNA é fundamental na regulação do apa- relho cardiovascular e suas alterações podem causar diversas manifestações clínicas. Dessa forma, a interferência do SARS-CoV-2 no SNA pode desencadear várias implicações, como a instabilidade da pressão arterial. No entanto, ainda é um desafio para a prática clínica a de- tecção precoce da disfunção autonômica, inter- 62 ferindo na evoluçãodo tratamento e, conse- quentemente, no quadro clínico do paciente acometido por essa disfunção (SALAZAR et al., 2022). É importante citar que os fatores de riscos cardiovasculares apresentam relevância clínica para o prognóstico da COVID-19, como hiper- tensão arterial, tabagismo e dislipidemia. A pre- sença de injúria miocárdica pode aumentar con- sideravelmente as chances de óbito do paciente, que pode ser associado com importante au- mento de troponina, enzima cardíaca que pode indicar o desenvolvimento de lesão. Esse fato é de notabilidade clínica por se tratar de um exame laboratorial rotineiro que pode auxiliar na condução clínica para busca de um melhor prognóstico para o paciente. Além disso, é pos- sível realizar uma análise entre a presença de fatores de risco e a necessidade de utilização da ventilação mecânica, em que esse manejo clí- nico em unidades de tratamento intensivo se apresenta em maior número à medida que a quantidade de fatores de risco está presente (GOMES et al., 2022). É importante analisar que a hipertensão arterial sistêmica se apresenta como uma doença precursora de consequência cardiovasculares de maior gravidade, indicando para uma possível estratégia de saúde pública no tratamento e prevenção dessa doença, com o objetivo de diminuir o risco de lesões miocárdi- cas e de melhorar o prognóstico dos pacientes diagnosticado com COVID-19. A relação da COVID-19 com o músculo cardíaco pode ser analisada a partir de exames que apontam para disfunção de ventrículo no coração. É válido destacar os pacientes que apresentam o menor grau de fatores de riscos cardiovasculares, em comparação com os de- mais pacientes, obtiveram um menor percentil de disfunção do ventrículo esquerdo nessa par- cela de indivíduos. É importante considerar que os pacientes que já apresentavam fatores de ris- cos cardiovasculares ou doença cardiovascular prévia podem ter o desenvolvimento dessa dis- funcionalidade anteriormente à infecção pelo novo coronavírus. Além da relação com os fa- tores de riscos, achados ecocardiográficos apre- sentaram dados importantes para a análise de consequências cardiovasculares relacionadas à COVID-19, como a presença de 25% de disfun- ção do ventrículo esquerdo em pacientes inter- nados (BARBERATO et al., 2022). A pesquisa para a elucidação dessa questão necessita de de- senvolvimento, os estudos feitos até então mos- tram que há relação entre a doença e fatores car- diovasculares, no entanto, é preciso melhor en- tendimento se a infecção pelo novo coronavírus desencadeia lesões no músculo cardíaco ou ocorre a aceleração no desenvolvimento de uma injúria estabelecida previamente. Ademais, vale citar que o acompanhamento multiprofissional oferecido na atenção primária à saúde a pacientes com doenças cardiovascu- lares é de extrema importância, tendo em vista que as implicações dessa patologia representam um risco significativo ao bem estar do indiví- duo. Além disto, Ignácio (2022) aponta que a incidência de indivíduos infectados pela CO- VID-19 está associada às doenças cardiovascu- lares, referindo também a importância da aten- ção primária, no que tange o fator preventivo, valorizando as consultas periódicas em favor do controle da patologia, pois a presença das doen- ças cardiovasculares ocasiona o aumento dos casos extremos da infecção por COVID-19, au- mentando as chances de mortalidade (IGNÁ- CIO et al., 2022). Outrossim, o cuidado integral é adequado sendo ofertado aos pacientes acometidos por doenças crônicas como as doenças cardiovascu- lares, resulta em uma maior qualidade no trata- mento da infecção por COVID-19, bem como, 63 boas práticas de saúde que podem ser adotadas pelo próprio indivíduo, como: Sono regular, ali- mentação balanceada, atividade física acompa- nhada por um profissional, evitando tabagismo e etilismo, essas práticas são orientadas na aten- ção primária a fim de prevenir possíveis com- plicações ao quadro do paciente, com isso, des- taca-se também a importância do calendário va- cinal atualizado, prevenindo infecções secundá- rias do SARS-CoV-2. O quadro de doenças car- diovasculares requer um manejo que contemple a integralidade do cuidado ofertado desde o pri- meiro nível de atenção à saúde, tendo em vista que, as doenças cardiovasculares representam um marcador de risco na atenção primária à sa- úde, evidenciando a importância deste nível de atenção e sua necessidade no que tange o con- trole da patologia e a prevenção de possíveis complicações (SALAZAR et al., 2022). A hipertensão arterial sistêmica (HAS), é uma condição clínica multifatorial, relacionada com fatores genéticos, epigenéticos, ambientais e sociais, caracterizada pela elevação persis- tente dos níveis pressóricos maiores ou iguais a 140 e/ou 90 mmHg. Alguns principais fatores de riscos relacionados com o desenvolvimento da hipertensão arterial sistêmica incluem enve- lhecimento, sedentarismo, sexo, etnia, sobre- peso ou obesidade, elevada ingestão de sódio, ingestão de álcool, além de fatores socioeconô- micos como baixa escolaridade e baixa renda familiar (RIBEIRO & UEHARA, 2022). Indi- víduos com HAS apresentam uma disfunção endotelial caracterizada pelo desequilíbrio en- tre substâncias vasodilatadoras e vasoconstrito- ras, a qual afeta diretamente a função vascular. Dessa maneira, essa condição associada com o envelhecimento, resulta em enrijecimento pro- gressivo e perda de complacência das grandes artérias, apresentando-se como fator de risco para o desenvolvimento de complicações (RI- BEIRO & UEHARA, 2022). Nesse sentido, é válido destacar que a hiper- tensão arterial sistêmica é considerada um fator de risco para o desenvolvimento de quadros graves de COVID-19. Segundo Moraes et al., (2021), os indivíduos com HAS apresentaram maior morbidade e pior prognóstico, além de uma maior necessidade de internação. Isso por- que, uma das consequências da infecção por SARS-CoV-2 é a disfunção endotelial, a qual inicia processos pró-trombóticos e pró-inflama- tórios. Nesse sentido, ocorre uma elevação na produção de citocinas pró-inflamatórias, o que induz a perda da função antitrombótica e anti inflamatória e promove uma disfunção no pro- cesso de coagulação, auxiliando para quadros de trombose micro e macrovascular. Dessa forma, indivíduos que possuem co- morbidades prévias que promovem disfunção endotelial, como a HAS, associadas com o de- sequilíbrio ocasionado pelo SARS-CoV-2, apresentam agravamento do quadro clínico e da doença (ALMEIDA et al., 2022). No concernente a dados psicossociais, o principal perfil encontrado foi de homens com 50 anos, e a média de 10 anos de instrução, en- contrando proporcionalidade entre tempo de es- tudo e grau de autocuidado na saúde, além do maior entendimento sobre as complicações da doença. A incidência de HAS, juntamente ao diabetes mostraram-se mais prevalentes como comorbidades que resultam em complicações de COVID-19, ao passo que enfermidades como a HAS, presente em cerca de 32,3% dos adultos fomentando doenças cardiovasculares (DCV) (NASCIMENTO et al., 2022). Primariamente, destacar -se que a similitude com outras enfermidades também notadamente presentes na sociedade, à exemplo da diabetes, 64 hipertensão e de doenças cardiovasculares e respiratórias. Ademais, tal fato é relacionado com os principais indutores de desigualdade es- tudados a seguir listados como: Condições ad- versas de trabalho, riscos profissionais, desem- prego e pobreza; somado a fatores estruturantes como moradias em condições inadequadas de equipamentos urbanos e baixo Índice de Desen- volvimento Humano. Um fator destacável foi a educação, com fator maior de desigualdade em relação à renda, além de ser mais marcante na condição feminina, proporcional aos melhores indicadores de saúde ao nível de escolaridade. Por fim, notadamente a presença marcante de desigualdade nos fatores analisados fomentam os fatoresde risco que podem levar à mortali- dade por COVID-19 (RIBEIRO & UEHARA, 2022). A infecção da COVID-19 em pacientes que apresentam a hipertensão arterial sistêmica está estatisticamente associada a um risco maior de óbito. Isso se deve ao fato de que, em casos gra- ves, essa doença pode provocar lesões cardíacas agudas. Ademais, foi evidenciado uma conta- gem maior de neutrófilos e leucócitos entre os pacientes hipertensos, em relação aos normo- tensos. Outros fatores associados ao pior desfe- cho entre os pacientes com HAS e COVID-19 foram os níveis alterados dos parâmetros relati- vos ao funcionamento de órgãos importantes como o coração, o fígado, os pulmões e os rins. Nos pacientes hipertensos, foi possível obser- var os níveis elevados de troponina T, creati- nina quinase-banda miocárdica, mioglobina, pró-peptídeo natriurético cerebral N-terminal (NT-proBNP), creatinina e nitrogênio ureico. Isso indica que a gravidade da COVID-19 em pacientes hipertensos está associada principal- mente com as lesões que os tecidos cardíaco e renal podem sofrer durante a infecção (AL- MEIDA et al., 2022; BARBERATO et al., 2022). Tabela 7.1 Tabela acerca dos artigos incluídos para o escopo da pesquisa Autor e ano Título de estudo Idiomas Base de dados GOMES et al., 2022 Impacto do alto risco cardiovascular na mortali- dade hospitalar em pacientes internados em terapia intensiva por COVID-19 Inglês e Por- tuguês BVS IGNÁCIO et al., 2022 Prevalência e fatores sssociados à SRAG por CO- VID-19 em adultos e idosos com doença cardiovas- cular crônica: Uma análise crítica Inglês e Por- tuguês BVS RIBEIRO & UEHARA, 2022 Hipertensão arterial sistêmica como fator de risco para a forma grave da COVID-19: Scoping review Inglês e Por- tuguês BVS SALAZAR et al., 2022 SARS-CoV-2 infection and autonomic dysfunction - pressure liability at COVID-19 Inglês e Por- tuguês BVS 65 MORAES et al., 2021 A influência dos cuidados periodontais sobre os bi- omarcadores inflamatórios de pacientes com CO- VID-19 Inglês e Por- tuguês BVS BARBERATO et al., 2022 Achados ecocardiográficos anormais em pacientes internados com COVID-19: uma revisão sistemá- tica e metanálise Inglês e Por- tuguês SciELO ALMEIDA et al., 2022 Resultados e efeitos dos pacientes que se recupera- ram da COVID-19: Identificação da relação com fatores de risco e comorbilidades Inglês e Por- tuguês SciELO VERANES-MUSTE- LIER et al., 2022 Fatores cardiometabólicos preditivos de mortali- dade em pacientes com SARS-CoV-2/COVID-19 Espanhol e Português SciELO NASCIMENTO et al., 2022 Associação entre características biopsicossociais e complicações clínicas por COVID-19 autorreferi- das em um município brasileiro Inglês e Por- tuguês SciELO CONCLUSÃO Diante do exposto, pode-se concluir que a hipertensão arterial sistêmica é um problema sério, que implica aos portadores um aumento potencial de desenvolvimento e/ou maior gravi- dade, de doenças adjacentes. Em um aspecto mais amplo, por afetar mais de um bilhão de pessoas, que representam a população adulta, com maiores incidências em países de baixa e média renda, garante à HAS um status de mul- tiplicador de agravo importante em saúde. Além disso, cerca de metade desses indivíduos hipertensos convivem com a comorbidade sem o senso sobre seu quadro e sobre a realidade dos riscos a que estão submetidos devido à sua con- dição clínica. Dentre os desencadeamentos clínicos da hi- pertensão arterial em pacientes portadores do novo coronavírus, observou-se a presença de uma hiperatividade do SNA simpático. A hipe- ratividade do SNA simpático é um quadro co- mum em pacientes com HAS associada à infec- ção causada pela SARS-CoV-2, principalmente em pacientes portadores de doenças cardiome- tabólicas, os quais dispõem naturalmente de maior tônus simpático. Essa associação pode desencadear diversas implicações, como a ins- tabilidade da pressão arterial e outras complica- ções hemodinâmicas. Não obstante, ainda são necessários mais estudos devido aos desafios de detecção precoce da disfunção autônoma nesses pacientes. Ademais, destaca - se que a existência de quadro hipertensivo concomitante a outros fa- tores de risco cardiovascular, como tabagismo e dislipidemia, que são importantes para a rele- vância clínica, podem estar relacionados ao au- 66 mento da incidência das taxas de gravidade, bem como intervir no grau de disfunção dos ventrículos e necessidade do uso de ventilação mecânica durante o tratamento em unidades de terapia intensiva. Desse modo, é de suma im- portância despender de exames laboratoriais e ecocardiograma para analisar os pacientes in- fectados pela SARS-CoV-2, uma vez que, as- sim, é possível apontar a relação entre a função do músculo cardíaco e a infecção, sendo viável a ponderação entre quadros de injúria do mio- cárdio ao aumento de troponina e a determina- ção do grau de disfunção do ventrículo, por- tanto buscando melhor condução clínica. Por fim, é imprescindível destacar que a atu- ação da equipe multiprofissional na atenção pri- mária, visto que a prevenção e tratamento da HAS reduz os casos extremos de infecção grave por COVID-19, logo, neste nível de atenção à saúde deve ser o foco das políticas públicas, para o eficiente manejo periódico dessa doença, com o intuito de diminuir o risco de lesões mi- ocárdicas e de melhorar o prognóstico dos paci- entes diagnosticados com COVID-19. 67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ALMEIDA, L.V. et al. Resultados e efeitos de pacientes que se recuperaram da COVID-19: Identificando a rela- ção com fatores de risco e comorbidades. Ciência & Sa- úde Coletiva, v. 27, n. 8, p. 2963–2972, 2022. BARBERATO, S.H. et al. Achados ecocardiográficos anormais em pacientes hospitalizados com COVID-19: Uma revisão sistemática e metanálise. Arquivos Brasi- leiros de Cardiologia, v. 119, n. 2, p. 267–279, 2022. GOMES, B.F.O. et al. Impact of high cardiovascular risk on hospital mortality in intensive care patients hos- pitalized for COVID-19. Arquivos Brasileiros de Cardi- ologia, v. 118, n. 5, p. 927–934, 2022. IGNÁCIO, F.G. et al. Prevalência e fatores associados à SRAG por COVID-19 em adultos e idosos com doença cardiovascular crônica: Uma análise crítica. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 118, n. 4, p. 787–788, 2022. MORAES, L.E.B. et al. A influência dos cuidados peri- odontais sobre os biomarcadores inflamatórios de paci- entes com COVID-19. Internacional Journal of Science Dentistry, v. 1, n. 57, p. 125-134, 2021. NASCIMENTO, M.C. et al. Association between bi- opsychosocial factors and self-reported COVID-19 cli- nical complications in a Brazilian city. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 25, e220033, 2022. RIBEIRO, A.C. & UEHARA, S.C.S.A. Systemic arterial hypertension as a risk factor for the severe form of COVID-19: Scoping review. Revista de Saúde Pública, v. 56, 2022. SALAZAR, G.O. et al. Infecção pelo SARS-CoV-2 e disfunção autonômica – labilidade pressórica na COVID- 19. Revista Brasileira de Hipertensão, v. 29, n. 1, p. 10– 13, 2022. VERANES-MUSTELIER, Y. et al. Factores cardiome- tabólicos predictivos de mortalidad en pacientes con SARS-CoV-2/COVID-19. Revista Información Cientí- fica, v. 101, n. 2, 2022. 68 10.29327/5198921.7-8 CAPÍTULO 08 ANÁLISE DOS IMPACTOS CARDIOVASCULARES DAS SÍNDROMES RENOCARDÍACAS: REVISÃO DE LITERATURA LAURO ROCHA SEABRA¹ CRISTIANO CÉSAR RODRIGUES AUGUSTO GONÇALVES¹ BEATRIZ BANDEIRA DE LAVÔR FARIAS¹ HANNAH DE ALENCAR SANTOS¹ DAVI DOS SANTOS LIMA¹ GABRIELA ARRUDA NAVARRO TAVARES¹ AMANDA JORGE DE SOUSA VASCONCELOS¹ 1Discente - Medicina da Universidade de Fortaleza Palavras-chave: Síndromes cardiorrenais; Síndromes renocardíacas; Impactos cardiovasculares. 69 INTRODUÇÃO O estudo da relação entre rins e coração vem sendo feitodesde 1836 a partir da observação da conformidade de doença cardiovascular em pacientes com doença renal e secreção de albu- mina urinária (JUNHO et al., 2022). Em 2004, a National Heart, Lung, and Blood Institute, de- finiu a síndrome cardiorrenal como um au- mento do volume sistêmico a partir da interação do rim com os outros compartimentos circula- tórios, e assim, acentuando os sintomas de insu- ficiência cardíaca (IC) e sua progressão. Em 2008, a Acute Dialysis Quality Initiative, defi- niu a síndrome cardiorrenal de forma mais am- pla, dividindo-a em dois grandes grupos, sín- dromes cardiorrenais e renocardíacas, sendo posteriormente subdividida em outros 5 subgru- pos de acordo com a gravidade da doença e no envolvimento sequencial de órgãos (RAN- GASWAMI et al., 2019). Atualmente, estima-se que cerca de 50% dos pacientes com IC crônica possuam uma taxa de filtração glomerular (TFG) estimada compatível com doença renal crônica moderada abaixo de 60 mL/min/1,73 m². Além disso, tal valor é preditivo de aumento de risco de morta- lidade por todas as causas, morte por falha da bomba e hospitalização por IC (COSTANZO, 2020). Na perspectiva da síndrome renocardíaca aguda, classificada como síndrome cardiorrenal (SC) tipo 3, é cabível conceituá-la como uma disfunção ou lesão aguda do coração que foi proporcionada por uma lesão renal aguda (LRA). Ainda nessa ótica, há a síndrome cardi- orrenal tipo 1, a qual, ao contrário do que acon- tece na SC tipo 3, é a lesão, também aguda, no coração seguida de sua consequente disfunção que irá levar à LRA. Ademais, no tocante de outras síndromes renocardíacas, há o tipo 4, que, ao invés de ser um processo agudo, o que ocorre é uma disfunção crônica no coração humano, que tende a levar o paciente à hipertrofia e a outros eventos cardiovasculares em pacientes com Doença Renal Crônica (DRC) (CRUZ et al., 2013). Além disso, tais síndromes, em especial sín- drome cardiorrenal tipo 4, apresentam alguns fatores de risco tidos como tradicionais, como diabetes mellitus, hipertensão, dislipidemia, se- dentarismo e tabagismo, os quais aumentam os índices de mortalidade principalmente nos pa- cientes mais idosos. Há, também, os não tradi- cionais, como anemia, doença mineral óssea e presença de toxinas urêmicas, os quais, em por- tadores de DRC, têm seu risco cardiovascular elevado. Alguns desses fatores de risco tendem a estimular a microcalcificação vascular e fi- brose do miocárdio, o que ocorre em razão da disfunção do endotélio e do miocárdio, que pro- move estresse oxidativo e inflamação dos teci- dos. Todos esses acontecimentos de nível mi- croscópico por consequência estimulam a redu- ção da contratilidade das células cardíacas e hi- pertrofia das câmaras do coração. No tocante ao acometimento renal, pode haver fibrose do pa- rênquima e esclerose de glomérulos (UDU- MAN et al., 2018; MINCIUNESCU et al., 2023). Somente na década de 2000 a síndrome car- diorrenal foi sistematicamente descrita e carac- terizada, o que contribuiu para avanços obser- vados no diagnóstico e tratamento atualmente presentes. No entanto, os mecanismos molecu- lares e celulares envolvidos nos diferentes tipos de síndromes cardiorrenais ainda não são com- pletamente compreendidos. Assim, a medicina tem buscado novas estratégias para combater as diversas causas relacionadas e, por isso, o en- tendimento de todos os agentes envolvidos na relação rim-coração continua sendo de suma re- levância. 70 A partir disso, o presente capítulo tem como objetivo analisar, como forma de revisão literá- ria, os diversos aspectos cardiovasculares en- volvidos e suas repercussões nas estratégias de prevenção, diagnóstico e tratamento das síndro- mes renocardíacas. MÉTODO Foi feita uma revisão da literatura científica de caráter analítico em fevereiro de 2023, sendo as informações obtidas a partir de pesquisas na base de dados PubMed. Como descritores, fo- ram utilizados ‘’Cardiorenal Syndrome”, “Re- nocardiac Syndromes”, “Chronic Kidney Di- sease”, “Acute Kidney Injury" e “Heart Fai- lure’’. Foi utilizado o conectivo "AND" para encontrar a interseção entre os descritores e seus impactos em relação à insuficiência cardí- aca. Desse modo, as buscas encontraram 1.530, 1.000, 14.153 e 3.822 artigos, respectivamente, tendo sido posteriormente submetidos aos crité- rios de seleção. Os critérios de inclusão foram: Artigos es- critos na língua inglesa publicados entre 2009 e 2023 e que abordavam o conteúdo necessário para realização do presente estudo, como forma de revisões sistemáticas e artigos originais, por exemplo. Já como critérios de exclusão, estão artigos que iam de encontro aos critérios de in- clusão, artigos duplicados e que não supriam a proposta da revisão literária. Após os critérios de seleção, foram selecio- nados para compor o presente estudo um total de 16 artigos, os quais passaram por detalhada leitura para coleta e análise de dados por parte dos autores que compõem esse capítulo. Assim, os resultados foram apresentados de forma des- critiva, divididos em categorias temáticas: Sín- drome renocardíaca crônica e síndrome reno- cardíaca aguda, abordando aspectos da relação entre disfunção renal e seus impactos cardio- vasculares na insuficiência cardíaca aguda e crônica, destacando seus mecanismos fisiopato- lógicos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Conforme já explicado, a síndrome renocar- díaca pode ser dividida em aguda e crônica. Foi realizada, a seguir, uma revisão sobre cada um desses tipos e, logo após os principais mecanis- mos fisiopatológicos serão explicitados. Síndrome renocardíaca aguda A síndrome cardiorrenal tipo 3 ou síndrome renocardíaca aguda ocorre quando uma injúria renal aguda (IRA) contribui e/ou precipita o de- senvolvimento de uma lesão cardíaca aguda. As interações fisiopatológicas entre o rim e o cora- ção durante a IRA incluem a ativação do sis- tema imunológico (liberação de citocinas e qui- miocinas pró-inflamatórias e anti-inflamató- rias) e sistema nervoso simpático (SNS), além da ativação do SRAA e cascatas de coagulação (RONCO et al., 2018). A oligúria pode levar à retenção de sódio e água com consequente sobrecarga hídrica e de- senvolvimento de edema, sobrecarga de vo- lume, hipertensão, edema pulmonar e lesão mi- ocárdica. Distúrbios eletrolíticos (principal- mente hipercalemia) podem contribuir para o risco de arritmias fatais e morte súbita, en- quanto a acidose metabólica relacionada à ure- mia pode afetar o metabolismo dos miócitos e produzir vasoconstrição pulmonar, aumento da pós-carga do ventrículo direito e efeito inotró- pico negativo (RONCO et al., 2018). No tocante aos efeitos elétricos, temos que a hipercalemia está associada a uma sequência distinta de alterações no eletrocardiograma (ECG). O excesso de potássio extracelular au- mentará a atividade do canal de potássio, resul- tando em repolarização mais rápida e, assim, 71 criando a base estreita e a onda T alta. Por outro lado, isso inativará o canal de sódio, impedindo a condução adequada da atividade elétrica. A hipercalemia moderada a grave ocasionalmente induz elevações do segmento ST nas derivações precordiais direitas (V1 e V2) e simula um pa- drão isquêmico de corrente para lesão. No en- tanto, mesmo a hipercalemia grave pode estar associada a achados eletrocardiográficos atípi- cos ou não diagnósticos. Pacientes com hiper- calemia grave significativa (sérico [K +] >7,0 mmol/l) podem apresentar pseudo bloqueio de ramo direito e elevação persistente do segmento ST em pelo menos duas derivações precordiais, induzindo um padrão semelhante a Brugada no ECG. A hipermagnesemia grave pode causar distúrbios de condução nodal atrioventricular (AV) e intraventricular que podem culminar em bloqueio cardíaco completo e parada cardíaca (BAGSHAW et al., 2013). Em relação aos efeitos isquêmicos, a ativa- ção do SNS pode levar à vasoconstrição e au- mento da demandamiocárdica de oxigênio. Es- tes podem levar à isquemia quando a oferta de oxigênio é restrita, em particular em pacientes suscetíveis. Ademais, durante a IRA, níveis mais altos de demanda de oxigênio do miocár- dio desencadeariam má distribuição do fluxo sanguíneo ventricular e resultam em isquemia subendocárdica. Estudos recentes sugerem que biomarcadores relacionados ao dano renal agudo, como a lipocalina associada à gelatinase de neutrófilos e molécula de lesão renal-1, po- dem circular para ter efeitos fisiopatológicos distintos no coração, incluindo inflamação mi- ocárdica, desestabilização de placas ateroscle- róticas e suscetibilidade a eventos isquêmicos (BAGSHAW et al., 2013). Síndrome renocardíaca crônica A síndrome renocardíaca crônica, também denominada Síndrome Cardiorrenal tipo 4 (RSC), é o subtipo definido por uma doença re- nal crônica (DRC), que progressivamente pro- move com insuficiência cardíaca crônica. A SRC tipo 4 está associada a altas morbidade e mortalidade, nos quais os pacientes com DRC têm maior probabilidade de morrer prematura- mente de doença cardiovascular acelerada do que das consequências da própria insuficiência renal (SILVA et al., 2016). A lesão renal aguda (LRA) é um evento co- mum e grave que pode levar a complicações crônicas, incluindo a progressão da doença re- nal crônica (DRC). Embora muitos pacientes com LRA possam ter recuperação completa ou quase completa da função renal, estudos têm demonstrado que esses indivíduos ainda apre- sentam risco aumentado de desenvolver DRC progressiva. Além disso, quando a LRA ocorre em pacientes que já têm DRC, a sobreposição dessas duas condições está associada a uma aceleração significativa na taxa de progressão da doença, aumentando o risco de chegar a um estágio terminal da doença renal (HOLGADO et al., 2020). A insuficiência cardíaca gera uma lesão mi- ocárdica que leva ao remodelamento do ventrí- culo e ativa mecanismos compensatórios, inclu- indo o rim, que regula a homeostase hidroele- trolítica e o volume circulante. A hipertrofia do ventrículo esquerdo é uma adaptação ao au- mento do trabalho cardíaco induzido por sobre- carga de pressão, volume ou ambos, sendo co- mum em pacientes com DRC e insuficiência re- nal terminal (SEGALL et al., 2014). Assim, a insuficiência cardíaca e renal pode 72 se interligar e influenciar mutuamente, resul- tando em sintomas clínicos característicos desta condição combinada, principalmente relaciona- dos à sobrecarga de volume e bomba cardíaca ineficaz: Dispnéia, fadiga e dor crônica. Além desses sintomas serem os mais comuns nas po- pulações de IC e DRC, a depressão é outro sin- toma altamente prevalente nessas doenças (RANGASWAMI et al., 2019). Fisiopatologia Sabe-se que a relação entre o coração e os rins é complexa e bi-direcional, sendo já bem estabelecida na literatura. Três mecanismos fi- siopatológicos estão envolvidos no desenvolvi- mento e na progressão das disfunções cardiore- nal e renocardíaca: 1. Alterações hemodinâmicas decorrentes da diminuição do débito cardíaco e/ou diminui- ção do retorno venoso. 2. Desregulação neuro-hormonal por ati- vação simpática e/ou ativação do sistema re- nina-angiotensina-aldosterona (SRAA). 3. Outras condições que aceleram a pro- gressão: Inflamação crônica e ativação da imu- nidade celular; Alterações no metabolismo ós- seo; Anemia (SCHEFOLD et al., 2016). Alterações hemodinâmicas No início do século 20, foi estabelecida a importância da redução do Fluxo Sanguíneo Renal (FSR) e do aumento da pressão venosa central (PVC) como mecanismos efetores pri- mários para insuficiência renal. Estudos publi- cados por Cody et al., (1990), demonstraram que em pacientes virgens de IECA a redução do FSR foi desproporcional à redução do débito cardíaco, enquanto a TFG foi mantida, fenô- meno explicado pela autorregulação renal. Po- rém, à medida que o FSR cai ainda mais, a TFG diminui conforme a capacidade autorregulató- ria se esgota (DAMMAN et al., 2015). No tocante ao aumento da PVC, já foi de- monstrado que em pacientes com IC, indepen- dentemente da redução da FSR, existe uma as- sociação epidemiológica entre o aumento da PVC e uma redução da TFG. Na IC aguda, Mullens et al., (2009) mostrou que o principal fator determinante para aumentar o risco de agravamento da função renal no contexto intra- hospitalar é uma maior PVC, sendo este fator superior a um baixo débito cardíaco (DAM- MAN et al., 2015). Desregulação neuro-hormonal A angiotensina II possui efeito direto na per- fusão renal, afetando diretamente a TFG, além de induzir a hiporesponsividade ao peptídeo na- triurético e mediar a ativação do sistema ner- voso simpático (SNS). Este último pode alterar o coeficiente de ultrafiltração e está associado à lesão tubular e à formação de espécies reativas de oxigênio (EROS). O efeito do estresse oxi- dativo e da disfunção endotelial também é mo- dulado pela angiotensina II, mediante a ativa- ção do NADP[H], promovendo a formação de espécies reativas de oxigênio, que podem cau- sar danos nos túbulos proximais (DAMMAN et al., 2015). Inflamação crônica e ativação da imuni- dade celular A inflamação representa uma resposta fisio- lógica destinada a fornecer proteção e promover cura na ocorrência de lesão. Paradoxalmente, esses mesmos processos protetores, caso não sejam controlados, podem promover dano e le- são tecidual. Quando mecanismos controlado- res estão sobrecarregados, a atenuação da infla- mação não ocorre, podendo gerar uma resposta 73 fisiopatológica aguda ou crônica. Tanto a Insu- ficiência Cardíaca (IC) quanto a Doença Renal Crônica (DRC) induzem a inflamação, a qual, por sua vez, piora os quadros de IC e de DRC, o que gera uma queda nas funções renal e car- díaca, agravando progressivamente o quadro dos pacientes (COLOMBO et al., 2011). Disfunções renais e cardíacas promovem re- tenção de fluidos, o que força o organismo a funcionar em pressões venosas e intersticiais significativamente elevadas acima do normal. Em um ambiente de alta pressão, o estresse bi- omecânico do estiramento vascular e da con- gestão tecidual pode aumentar a inflamação, prejudicando ainda mais as funções e estruturas de órgãos vitais, como coração, vasculatura e rins (COLOMBO et al., 2011). Além disso, levando-se em consideração as citocinas pró-inflamatórias, o fator de necrose tumoral-α (TNF-α) é aumentado na circulação durante a IC descompensada, sendo um preditor independente significativo de mortalidade car- díaca e não cardíaca em pacientes com IC. Um novo biomarcador, indutor fraco relacionado ao TNF do apoptose (Tweak), um membro da su- perfamília do TNF, possui níveis circulantes mais altos em pacientes com cardiomiopatias dilatadoras idiopáticas do que em grupos con- troles saudáveis. Além do TNF-α e suas proteí- nas relacionadas, aumentos semelhantes foram encontrados entre a interleucina-6 (IL-6), inter- leucina-1 (IL-1) em pacientes com IC. Tam- bém foi demonstrado repetidamente que a DRC avançada está associada a níveis elevados das mesmas citocinas pró-inflamatórias. Uma das citocinas mais bem estudadas é IL-6 que, como no IC, correlaciona-se com progressão da do- ença, aumentando as chances de elevação no es- tágio da DRC. Dessa forma, em geral, elevação de TNF-α, IL-1 e IL-6 em pacientes com DRC e IC podem sugerir um possível papel dessas ci- tocinas na modulação da inflamação que ocorre na síndrome cardiorrenal (COLOMBO et al., 2011). Alterações no metabolismo ósseo À medida em que a função renal diminui, ocorre um prejuízo progressivo na homeostase mineral, causando alterações nas concentrações séricas e teciduais de fosfato e cálcio, bem como mudanças nos níveis circulantes de hor- mônios, como hormônio da paratireóide (PTH), metabólitos da vitamina D (calcidiol e calci- triol) e Fator de crescimento fibroblástico 23 (FGF-23). No estágio 3 da Doença renalcrônica (DRC), os rins mostram uma capacidade redu- zida de excretar adequadamente o fosfato, re- sultando eventualmente em hiperfosfatemia, que desencadeia elevações nas concentrações de PTH e FGF-23. Além disso, a conversão pre- judicada do calcidiol em calcitriol reduz a ab- sorção intestinal de cálcio e aumenta os níveis de PTH. Como o rim é incapaz de responder adequadamente ao PTH, a fosfatúria e a reab- sorção de cálcio são comprometidas. Além disso, o rim não responde ao FGF-23 secretado pelo osso, reduzindo ainda mais a excreção de fosfato, o que ocasiona o seu acúmulo. Dessa forma, as anormalidades ósseas são quase oni- presentes em pacientes com DRC dependentes de diálise e bioquimicamente detectáveis na maioria dos pacientes com DRC estágios 3 a 5 (CHARYTAN et al., 2015). Anemia Uma síntese reduzida de eritropoietina (EPO; 90% dos quais é produzida nos rins, 10% no fígado e em outros órgãos) é considerada uma causa importante de anemia na Doença Re- nal Crônica (DRC). O principal estímulo para a produção de EPO é a hipóxia renal, mas esse mecanismo é prejudicado em pacientes com 74 DRC. À medida que a função renal decai, as di- minuições no EPO são acompanhadas por uma redução do ferro disponível, o que dificulta ainda mais a eritropoiese, a proliferação de pre- cursores do eritróide e a produção de receptores EPO. Finalmente, anormalidades na disponibi- lidade de ferro, níveis excessivos de inflamação e distúrbios na homeostase óssea e mineral pa- recem diminuir a responsividade da medula ós- sea a EPO, exacerbando a anemia à medida em que a DRC progride (CHARYTAN et al., 2015). CONCLUSÃO Os estudos realizados sobre a síndrome re- nocardíaca crônica e aguda apontam, por meio dos mecanismos fisiopatológicos apontados, para um aumento de impactos cardiovasculares nessa população, no que tange a um maior risco de eventos no coração e nos vasos sanguíneos derivado de uma disfunção renal. Nessa perspectiva, foi observado que a sín- drome cardiorrenal aguda pode ocasionar com- plicações como insuficiência cardíaca, lesão miocárdica e arritmias, aumento da pós-carga do ventrículo direito e isquemia. Ademais, a síndrome cardiorrenal crônica resulta principal- mente em alterações típicas de um quadro pro- longado, como remodelamento ventricular es- querdo. Assim, a síndrome renocardíaca é uma con- dição que apresenta grandes desafios tanto para o paciente quanto para os profissionais de sa- úde. Dessa forma, é fundamental que os profis- sionais de saúde envolvidos, como nefrologis- tas, cardiologistas e enfermeiros, tenham um treinamento multidisciplinar que englobe toda a complexidade das relações entre o rim e o cora- ção. Torna-se, também, essencial uma melhor clareza e detalhamento das diretrizes das socie- dades médicas envolvidas, principalmente quanto à definição e fisiopatologia nas síndro- mes renocardíacas. Por fim, evidencia-se a ne- cessidade de um monitoramento mais atencioso aos pacientes com síndromes renocardíacas para detectar e tratar precocemente quaisquer complicações cardiovasculares. 75 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALPRECHT-QUIROZ, P. et al. Cardiorenal syndrome: Clinical and echocardiographic aspects. Archivos de Cardiología de México, v. 90, n. 4, p. 503-510, 2020. BAGSHAW, S.M. et al. 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Neste contexto, a Hipertensão Arterial Re- sistente (HAR), foi definida, de acordo com a American Heart Association, como uma pres- são arterial (PA) que permanece acima da meta, a despeito do uso concomitante de três anti-hipertensivos, utilizados em doses máxi- mas preconizadas e otimizadas, sendo um de- les um diurético. Pacientes com uso de quatro ou mais medicações anti-hipertensivas tam- bém são consideradas portadoras de HAR (TOWNSEND & FORMAN, 2022). O termo HAR difere-se de Hipertensão Descontrolada, visto que esta inclui esquemas de tratamento inadequado e pseudorresistên- cia. Para exclusão de pseudorresistência, deve-se garantir uma correta técnica de aferi- ção da PA, inclusive fora do consultório mé- dico, e a não adesão à terapia anti-hiperten- siva. Por fim, o termo Hipertensão Arterial Refratária (HARf), foi definido como a inca- pacidade de obter o controle da PA, com o uso de pelo menos cinco medicamentos anti-hi- pertensivos, incluindo clortalidona e espiro- nolactona, o que representa, aproximada- mente, 3% dos casos de HAR (TOWNSEND & FORMAN, 2022). A real prevalência de HAR no mundo não é conhecida, no entanto, estima-seque entre 10-20% dos pacientes hipertensos apresentam hipertensão resistente. Essa variação se deve principalmente a critérios distintos utilizados para estabelecimento do diagnóstico e às dife- rentes populações estudadas. No Brasil, um estudo multicêntrico (ReHOT study), eviden- ciou por meio do monitoramento ambulatorial da pressão arterial (MAPA) uma prevalência de HAR de 11,7% na população (YUGAR- TOLEDO et al., 2020). Essa prevalência abrange tanto a hiperten- são arterial sistólica, quanto a diastólica, sendo a primeira a mais comum. Fatores como idade, presença de obesidade, raça negra, sín- drome metabólica, nefropatia, consumo de ál- cool ou sal e sedentarismo, estão relacionados ao aumento dessa prevalência (YUGAR-TO- LEDO et al., 2020). A maioria destes pacien- tes também deve ser avaliado em relação a condições secundárias coexistentes como a presença de aldosteronismo primário, este- nose da artéria renal, doença renal crônica e apneia obstrutiva do sono, feocromocitoma, Síndrome de Cushing e coarctação aórtica. Outro fator importante inclui o uso de medi- cações, que além de aumentarem a pressão ar- terial, interferem no efeito anti-hipertensivo de qualquer agente, exceto bloqueadores do canal de cálcio. Dentre essas medicações, es- tão incluídos, principalmente, os anti-inflama- tórios não esteroidais (AINEs), e outros medi- camentos como, simpaticomiméticos, glico- corticóides, contraceptivos contendo estrogê- nio, inibidores de calcineurina e antidepressi- vos (TOWNSEND & FORMAN, 2022). Dessa forma, o presente capítulo tem como objetivo discorrer sobre o diagnóstico, causas e abordagem da HAR. MÉTODO Trata-se de uma revisão narrativa reali- zada no período de fevereiro a março de 2023, que buscou discorrer sobre a HAR. A pes- quisa foi realizada através das bases de dados SciELO e Pubmed, bem como o sumário Up- https://www.uptodate.com/contents/spironolactone-drug-information?search=hipertensao+arterial+resistente&topicRef=3818&source=see_link https://www.uptodate.com/contents/spironolactone-drug-information?search=hipertensao+arterial+resistente&topicRef=3818&source=see_link 78 todate, e guidelines da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Foram utilizados os seguintes descritores: Hipertensão; Resistente; Secun- dária; Tratamento. Os critérios de inclusão foram: Artigos nos idiomas inglês e português; publicados no pe- ríodo de 2006 a 2023 e que abordavam as te- máticas propostas para esta pesquisa, disponi- bilizados na íntegra. Os critérios de exclusão foram: Artigos duplicados, disponibilizados na forma de resumo, que não abordavam dire- tamente a proposta estudada e que não aten- diam aos demais critérios de inclusão. Após os critérios de seleção restaram 10 artigos que foram submetidos à leitura minu- ciosa para a coleta de dados. Os resultados fo- ram apresentados em forma descritiva e em fi- guras. RESULTADOS E DISCUSSÃO A HAR, assim como a hipertensão arterial, possui múltiplos fatores envolvidos na sua gê- nese, o que determina os diferentes graus de resistência à terapia anti-hipertensiva (BAR- ROSO et al., 2021). Nos indivíduos portadores de HAR, são observadas algumas alterações relacionadas ao aumento da volemia, que se deve principal- mente, à persistência de retenção de fluidos, à sensibilidade aumentada ao sódio, ao hiperal- dosteronismo e à disfunção renal. Assim, a al- teração na relação entre volume e pressão ar- terial elevada parece ser o principal meca- nismo envolvido no aparecimento da doença, o que justifica, inclusive, o uso de diuréticos na terapia farmacológica (BARROSO et al., 2021). Embora a HARf seja interpretada, muitas vezes, como um espectro da HAR, a HARf di- verge em sua fisiopatologia. Há nela o predo- mínio da hiperatividade do sistema nervoso simpático e uma maior rigidez vascular, o que sugere, que a HAR e a HARf sejam condições distintas (BARROSO et al., 2021; MUX- FELDT, et al., 2019). Investigação diagnóstica Os pacientes portadores de HAR, a priori, devem ser acompanhados em serviços especi- alizados de hipertensão arterial e que apresen- tem uma abordagem multidisciplinar (BAR- ROSO et al., 2021). Diante a suspeita clínica, a investigação diagnóstica se inicia com a exclusão da pseu- dorresistência por meio da confirmação da aderência ao tratamento, da correta posologia das medicações e da técnica adequada de afe- rição da PA, conforme ilustrado na Figura 9.1 (YUGAR-TOLEDO et al., 2020). Essa aferi- ção deve ser feita com a avaliação da pressão arterial fora do consultório, utilizando-se da Monitorização Ambulatorial da PA de 24 ho- ras (MAPA) e da medição residencial da pres- são arterial (MRPA), a fim de se excluir o efeito do avental branco e da hipertensão mas- carada (BARROSO et al., 2021). Uma vez confirmado o diagnóstico, o pró- ximo passo inclui a realização de exames es- pecíficos para avaliação do comprometimento de LOA e de Hipertensão Arterial Secundária (HASec) (BARROSO et al., 2021). Figura 9.1 Avaliação da HAR Fonte: YUGAR-TOLEDO et al., 2020. 79 Hipertensão Arterial Secundária A Hipertensão Arterial Secundária é defi- nida como um aumento da PA devido a uma causa identificável (YUGAR-TOLEDO et al., 2020). A investigação da HASec de forma ampla é onerosa e, portanto, deve-se basear em indícios clínicos que, isoladamente ou combinados, sugerem uma etiologia especí- fica. Alguns desses indícios incluem a labili- dade pressórica em pacientes com valores de PA previamente estáveis, idade inferior a 30 anos em pacientes não obesos e sem outros fa- tores de risco, hipertensão maligna ou associ- ada a distúrbios hidro-eletrolíticos (TEXTOR, 2022). As principais causas incluem a apneia obs- trutiva do sono, hiperaldosteronismo primá- rio, estenose de artéria renal e a doença do pa- rênquima renal. Outras causas menos comuns incluem o feocromocitoma, Síndrome de Cus- hing e coarctação de aorta (TEXTOR, 2022). Dentre elas, a apneia obstrutiva do sono pode estar relacionada com maior risco de HAR, devido a hiperativação do sistema ner- voso simpático, podendo afetar 60 a 80% dos hipertensos resistentes. Questionários como STOP-BANG e escala de Epworth são úteis no rastreio desta comorbidade, sendo o seu di- agnóstico feito por meio da polissonografia (YUGAR-TOLEDO et al., 2020; MUX- FELDT et al., 2019). Já o hiperaldosteronismo primário, está presente em 10 a 20% dos pacientes com HAR. Suspeita-se do hiperaldosteronismo pri- mários nos pacientes com hipopotassemia. Os pacientes com HAR devem ser triados com aferição da aldosterona plasmática e atividade da renina. As principais causas são hiperplasia adrenal (mais comum) e adenoma, que podem ser identificadas com TC ou RM de abdome (YUGAR-TOLEDO et al., 2020; MUX- FELDT et al., 2019; BARROSO et al., 2021). A estenose de artéria renal pode ocorrer por displasia fibromuscular, em pacientes mais jovens, ou mais comumente, por ateros- clerose. Pode-se suspeitar da estenose de arté- ria renal em pacientes com sopro abdominal ou que apresentem alteração da função renal após introdução de medicações que blo- queiam o sistema renina-angiotensina-aldos- terona (SRAA). A maioria dos pacientes com HAR devem ser rastreados com exames de imagem não invasivos, principalmente paci- entes que sabidamente possuem doença arte- rosclerótica em outros leitos vasculares. Após o diagnóstico com exames de imagem como US com doppler, angioTC ou angioRM, deve- se instituir tratamento clínico ou intervencio- nista. O tratamento clínico é preferencial, uti- liza-se fármacos que bloqueiam o SRAA, para reduzir a hiperfiltração no rim contralateral e a proteinúria. É importante a monitorização adequada do potássio e da creatinina A abor- dagem intervencionista é recomendada para aqueles com HAR ou hipertensão arterial ace- lerada com perda progressiva da função renal, com estenose bilateral ou estenose em rim único (YUGAR-TOLEDO et al., 2020;MUXFELDT et al., 2019; BARROSO et al., 2021). Lesão de Órgãos-alvo Os pacientes com HAR têm maior preva- lência de lesão de órgãos-alvo (LOA). Nela, ocorre disfunção endotelial, que promove va- soconstrição e remodelamento vascular. O comprometimento macrovascular é caracteri- zado por doença ateosclerótica coronariana, cerebral e periférica. Pode haver também re- modelamento cardíaco, com hipertrofia ven- 80 tricular esquerda (HVE) e disfunção diastólica do ventrículo esquerdo. A doença renal crô- nica está associada a HAR, podendo ser causa ou consequência. A hiperfiltração e hipertro- fia glomerular culminam em glomeruloescle- rose (DOROSZKO et al., 2016; YUGAR- TOLEDO et al., 2020). Assim, ao diagnóstico, é importante que os pacientes sejam rastreados para LOAS. Reco- menda-se realização de eletrocardiograma, função renal, albuminúria ou relação prote- ína/creatinina. É importante também exames para avaliação de perfil metabólico e comor- bidades associadas. A albuminúria e redução do ritmo de filtração glomerular identificam pacientes com alto risco renal e cardiovascu- lar, sendo uma meta terapêutica a diminuição da proteinúria (YUGAR-TOLEDO et al., 2020; MUXFELDT et al., 2019). Tratamento O tratamento da HAR envolve a associa- ção da adoção de modificações no estilo de vida e medicamentos anti-hipertensivos que tenham ação sobre a maioria dos mecanismos fisiopatológicos de elevação da PA, Figura 9.2 (BROOK & TOWNSEND, 2023; BAR- ROSO et al., 2021). 1) Não farmacológico: Sabe-se que modificações no estilo de vida, como prática de exercício físico, perda ponderal e dieta são eficazes na redução do risco cardiovascular nos pacientes em geral, e podem reduzir a pressão arterial. Poucos estu- dos, até então, foram feitos especificamente para a população com HAR (BROOK & TOWNSEND, 2023; OZEMEK et al., 2020). Recomenda-se que a ingestão de sódio seja de 1,5 g/dia. A restrição de sódio compro vadamente reduz a PA, uma vez que a sensi- bilidade ao sódio e a sobrecarga volêmica res- pondem pelo principal mecanismo fisiopato- lógico da HAR (YUGAR-TOLEDO et al., 2020). A atividade física também se mostrou be- néfica na HAR, atenua a ativação neuro-hu- moral e reduz a mortalidade. Exercícios físi- cos aeróbicos, bem como exercícios resistidos mostraram-se benéficos na redução da PA imediatamente após sua realização e cronica- mente (BROOK & TOWNSEND, 2023; OZEMEK et al., 2020). Apesar de não haver estudos sobre a redu- ção da ingestão de álcool e controle da PA em hipertensos resistentes, recomenda-se a redu- ção ou cessação do etilismo. Essa recomenda- ção pode ser extrapolada por estudos que de- monstram redução da PA em pacientes hiper- tensos que reduziram o consumo de álcool (ROERECKE et al., 2017). Nos pacientes com insuficiência cardíaca ou doença arterial coronariana é preferível um betabloqueador (BB) ao invés do bloqueador de canal de cálcio no esquema inicial (BAR- ROSO et al., 2021). Nos pacientes que já estejam em uso do es- quema tríplice inicial citado anteriormente e ainda não alcançaram metas pressóricas, a pri- meira estratégia é trocar o diurético para um mais potente. Em pacientes com clearance de creatinina acima de 30, recomenda-se a subs- tituição da hidroclorotiazida por indapamida ou clortalidona. Já nos pacientes com clea- rance de creatinina abaixo de 30, deve-se tro- car para um diurético de alça (furosemida). Durante a troca de medicações, é essencial manter a vigilância quanto a distúrbios hidro- eletrolíticos (BROOK & TOWNSEND, 2023). 81 Figura 9.2 Manejo da HAR Fonte: BROOK & TOWNSEND, 2023. Alguns pacientes ainda não atingem a meta pressórica com esquema anti-hiperten- sivo com quatro medicamentos. Nestes casos, há pouca evidência quanto a quinta ou sexta droga a ser acrescentada ao esquema (BROOK & TOWNSEND, 2023). Deve-se avaliar características individuais dos pacientes. Nos pacientes com frequência cardíaca acima de 70 batimentos por minuto, por exemplo, pode ser benéfico um betablo- queador, de preferência com ação vasodilata- dora. Como última estratégia pode-se citar: Os anti-hipertensivos de ação central como clonidina (preferencial); latadores diretos como hidralazina e minoxidil (BROOK & TOWNSEND, 2023; BARROSO et al., 2021). 2) Novos tratamentos: Nos últimos anos, diversos tratamentos in- tervencionistas experimentais têm ganhado espaço, principalmente nos pacientes não res- ponsivos ao tratamento clínico. Dentre eles, o estímulo direto do seio carotídeo é capaz de levar ao aumento da atividade dos barorrecep- tores, com consequente redução da atividade simpática e da pressão arterial. A denervação renal entra também como uma nova opção te- rapêutica, capaz de reduzir a atividade renal eferente, com consequente aumento do fluxo sanguíneo renal, diminuição da ativação do SRAA e da retenção de água. Por meio da de- nervação, é possível também reduzir a ativi- dade aferente renal, o que leva a diminuição da ação simpática no sistema cardiovascular (YUGAR-TOLEDO et al., 2020). Esses tratamentos, além de invasivos, apresentam alto custo e importantes efeitos colaterais. Dessa forma, devem ser bem indi- cados e realizados apenas em centros de refe- rência treinados para o procedimento (YU- GAR-TOLEDO et al., 2020). 82 CONCLUSÃO A HAR é uma condição relativamente pre- valente entre os hipertensos em geral. O au- mento do risco cardiovascular e de LOAS neste grupo de pacientes, faz com que seja es- sencial o diagnóstico e manejo adequados. Quanto ao diagnóstico, deve-se garantir a medição precisa da PA e uma adesão ade- quada à terapia medicamentosa anti-hiperten- siva, bem como a maioria dos pacientes com HAR deve ser avaliado em relação a condi- ções secundárias coexistentes. Em relação ao manejo, primeiramente deve-se enfatizar e garantir mudança de estilo de vida, com dieta hipossódica e prática de exercício físico. O tratamento medicamen- toso, deve se apoiar na intensificação da tera- pia diurética, destacando o papel da espirono- lactona como quarta droga do esquema anti- hipertensivo. Em pacientes refratários às es- tratégias convencionais, novas abordagens como estímulo direto do seio carotídeo e de- nervação renal têm sido estudadas, porém mais estudos são necessários para mostrar real benefício e segurança dessas intervenções. 83 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROSO, W.K.S. et al. Diretrizes Brasileiras de Hi- pertensão Arterial – 2020. Arquivos Brasileiros de Car- diologia, v. 116, p. 516-658, 2021. BROOK, R.D. & TOWNSEND, R.R. Treatment of re- sistant hypertension. 2023. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/ treatment-of-resis- tant-hypertension?source=history_widget. Acesso em: 01 mar. 2023. DOROSZKO, A. et al. Resistant hypertension. 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Arquivos Brasileiros de Cardiologia, p. 576-596, 2020. 84 10.29327/5198921.7-10 CAPÍTULO 10 COMPLICAÇÕES GERADAS PELO DIAGNÓSTICO TARDIO EM CASOS DE COMUNICAÇÃO INTERATRIAL MARIANA MENEZES RONDON¹ ANNIELE ELINE LIMA MENEZES1 WANESSA FERNANDES GOMES1 ISABELI MARIA MANSANO PARDI1 BRUNA KATHARINE CAVALCANTE NASCIMENTO1 ANA CLÁUDIA ZANDONA DE PAULA MATTOS1 RENATA GONÇALVES SILVA SANTOS1 VALÉRIA SANTOS DE JESUS2 1Discente - Medicina do Centro Universitário São Lucas 2Docente - Instituto Cardiovascular de Rondônia (Incardio Rondônia) Palavras-chave: Comunicação; Átrio; Cardiopatia. 85 INTRODUÇÃO A comunicação interatrial (CIA) se enqua- dra dentre as cardiopatias congênitas acianóti- cas de shunt esquerdo-direito, além disso exis- tem 4 tipos de comunicação interatrial: Ostium secundum, Ostium primum, seio venoso, seio coronário. Independentemente da classificação, se caracteriza pelo desenvolvimento anormal do septo que divide os átrios e, consequente- mente, permanência de um orifício na parede que divide essas câmaras. Em decorrência disso, o pulmão recebe um hiperfluxo sanguí- neo tolerado, de maneira silenciosa, o que faz com que na grande maioria das vezes, essa do- ença tenha um diagnóstico tardio, podendo per- manecer assintomática ao longo de muitos anos na vida de indivíduos portadores dessa condi- ção (RIBEIRO et al., 2017; BRAGA et al., 2019). Nos casos em que o paciente apresenta manifestações clínicas é possível encontrar dis- pnéia, sudorese e dificuldade para se alimentar. Diante disso, é possível observar que por ser um quadro de diagnóstico tardio, os pacientes apre- sentam complicações no coração e pulmões (BRAGA et al., 2019). Nessa cardiopatia, como já dito anterior- mente, há o aumento do fluxo sanguíneo para os pulmões, isso pode gerar hipertensão pulmo- nar e doença obstrutiva vascular pulmonar, já em alguns casos pode acarretar também em in- suficiência cardíaca congestiva nas crianças. Além disso, outras complicações são arritmias atriais como fibrilação atrial e flutter e, conse- quentemente, há um risco maior para eventos trombóticos. Alguns portadores dessa condição podem desenvolver a Síndrome de Eisenmen- ger, a qual se caracteriza pelo aumento da resis- tência pulmonar com chance de progressão da hipertensão pulmonar. Essa condição gera in- versão de shunt, tornando o paciente cardiopata cianótico e com um prognóstico ruim (BRAGA et al., 2019). Os exames de imagem como o ecocardio- grama transtorácico e transesofágico são neces- sários para avaliar cada caso, como a forma, ta- manho, padrão de fluxo e localização do defeito do septo interatrial e após isso definir o trata- mento a ser realizado. Na CIA tipo Ostium se- cundum, a terapêutica de escolha é o fecha- mento percutâneo. No entanto, em situações em que a anatomia não é favorável, pode ser indi- cada a correção cirúrgica. Para os demais tipos de CIA, indica-se o tratamento cirúrgico con- vencional infeccioso (RIBEIRO et al., 2017). O capítulo tem como objetivo reunir conhe- cimentos acerca das complicações que o diag- nóstico tardio de casos de CIA podem gerar e realizar uma análise das informações coletadas. MÉTODO Trata-se de uma revisão de literatura narra- tiva e um estudo quantitativo-qualitativo, onde foram analisados os artigos científicos que abordam sobre as complicações que acometem os indivíduos que possuem o diagnóstico tardio da comunicação interatrial, principalmente as manifestações clínicas. As pesquisas foram fei- tas nas bases de dados do PubMed, Biblioteca Virtual em Saúde e SciELO, do qual apresenta- vam relação com o tema abordado. Foram utili- zados os descritores: Comunicação interatrial, septo interatrial, persistência e cardiopatias congênitas. Assim, foram encontrados dez artigos, pos- teriormente submetidos aos critérios de seleção. As informações e conteúdo foram analisadas e escolhidas de forma minuciosa e que tivessem caráter mais relevante e acessível, dessa forma foi abordada a temática do estudo. Além disso, foram utilizados critérios de inclusão artigos 86 publicados nos anos de 2003 a 2023, nos idio- mas português e inglês e que abordavam o con- ceito, a fisiopatologia da doença, o diagnóstico, fatores de risco e manifestações clínicas e do- enças associadas devido às complicações da do- ença. Os critérios de exclusão foram artigos que se apresentavam apenas na forma de resumo, artigos duplicados, que não abordavam o tema proposto e que não estavam inseridos nos crité- rios de inclusão. As pesquisas foram feitas no mês de fevereiro de 2023. RESULTADOS E DISCUSSÃO A comunicação interatrial permite que o sangue rico em oxigênio passe do átrio es- querdo através do defeito (abertura) no septo, e mistura-se com o sangue rico em gás carbônico no átrio direito. Esse tipo de cardiopatia tem como característica estar presente desde o nas- cimento, não causam nas extremidades e lábios cianose, por isso é conhecida por fazer parte do grupo das cardiopatias congênitas acianóticas (DANTAS, 2017). Por ser uma doença pouco sintomática, apresentando poucos sintomas durante décadas, é mais comum que seja diagnosticada apenas na vida adulta. Os problemas clínicos começam a aparecer por volta da 3°, 4°, 5° e às vezes até a 6° década de vida, incluem arritmias secundá- rias à dilatação atrial direita, doença vascular pulmonar, disfunção sistodiastólica esquerda, que esta última pode ser acarretada de uma al- teração crônica da interatividade ventricular e anormalidade da contração do septo interventri- cular (PEDRA et al., 2003). Esses problemas trazem consequências clí- nicas como fadiga, cansaço, limitações de ativi- dades diárias e consequentemente piora na qua- lidade de vida. Portadores desse defeito congê- nito tem um risco aumentado para desenvolver complicações como: Fibrilação atrial, circula- ção pulmonar aumentada, insuficiência cardí- aca e hipertensão pulmonar (DANTAS, 2017). O diagnóstico geralmente é sugerido pela presença de sopro cardíaco ejetivo em foco pul- monar e 2° bulha com desdobramento constante e fixo em crianças com crescimento pôndero- estatural normal, na radiografia de tórax são en- contradas áreas cardíacas discretamente au- mentadas, hiperfluxo pulmonar e abaulamento do tronco pulmonar, o eletrocardiograma geral- mente mostra a sobrecarga do ventrículo di- reito, mas às vezes esses achados são passados por despercebido e acontece o diagnóstico ape- nas na fase adulta (PEDRA et al., 2003). São 4 tipos de comunicação interatrial, o Ostium secundum, que afeta a parte medial do septo interatrial, é o mais comum; o Ostium pri- mum, que afeta a parte inferior, é muito comum na Síndrome de Down segundo uma pesquisa realizada em 1995 por Nunes et al., onde já mostrava que 6,75% de casos em sua pesquisa que tratava acerca da incidência de cardiopatias congênitas na Síndrome de Down, eram de Co- municação Interatrial do tipo Ostium primum, e apenas 2,25% dos casos eram do tipo Ostium primum. Além do mais, a CIA é a cardiopatia congê- nita mais prevalente relacionada a etiopatoge- nia da hipertensão pulmonar podendo evoluir para Síndrome de Einsenmenger, a qual se apre- senta como a versão mais temível da hiperten- são pulmonar secundária a derivações não cor- rigidas de fluxo sanguíneo da esquerda para a direita devido ao seu grande poder de morbi- mortalidade causadas por hipoxemia e altera- ções hematológicas secundárias. Com isso, elu- cida-se uma complicação extremamente inde- sejáveldo diagnóstico tardio da comunicação interatrial, porque sua possibilidade de evolu- ção para este quadro acontece em 4-6% das ve- zes. O tratamento de escolha para a Síndrome 87 de Einsenmenger perpassa pela correção da CIA (LIMA et al., 2017). Ademais, a ocorrên- cia da regurgitação tricúspide, que tem como uma das principais causas a hipertensão pulmo- nar, pode ter como causa a CIA com sobrecarga de volume devido à dilatação cardíaca direita e do anel tricúspide (DONAL & YAMADA, 2022). Eventos embólicos sistêmicos podem ocor- rer em importante parte dos pacientes com en- docardite infecciosa devido a comunicação in- teratrial concomitante, pois 40 a 50% desses ca- sos apresentam embolias quando diagnostica- dos. É necessário salientar que a endocardite é uma doença que predispõe a formação de trom- bos, porém, como já evidenciado, a CIA traz uma problemática ainda maior devido a facili- tação da disseminação do êmbolo (SOCESP, 2022). Ademais, a fibrilação atrial, segundo Mo- reira et al., (2009), é uma das principais arrit- mias cardíacas e possui sintomas como dis- pneia, palpitações, precordialgia, além de risco de tromboembolismo sistêmico. De acordo com Chen et al., (2022), grandes defeitos do septo atrial estão grandemente associados com a fi- brilação atrial, a qual possui baixos níveis de re cuperação. CONCLUSÃO Indivíduos que possuem comunicação inte- ratrial possuem um risco elevado de desenvol- verem futuras complicações cardíacas, entre- tanto, vale destacar que esse defeito congênito evolui de maneira silenciosa e se manifesta com mais frequência na fase adulta e na senescência, devido a isso, grande parte dos pacientes procu- ram atendimento somente quando os problemas clínicos começam a ser mais evidentes, como a fadiga e cansaço. Assim sendo, é necessário in- vestigar a existência desse defeito em pacientes que apresentem os sinais clínicos expostos acima. Além disso, a comunicação interatrial gera um aumento de pressão nos pulmões, o que gera uma sobrecarga no coração e intensifica sintomas como dispneia e cianose, caracteri- zando-se com alto grau de mortalidade na fase. Assim, é de extrema importância abordar a te- mática nos dias atuais, visando esclarecer e conscientizar a população e os profissionais de saúde acerca da importância do diagnóstico pre- coce dessa cardiopatia, para que ocorram me- nos desfechos negativos. 88 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BELO, W.A. et al. Perfil clínico-hospitalar de crianças com cardiopatia congênita. Cadernos Saúde Coletiva, v. 24, n. 2, p. 216–220, 2016. BRAGA, L. et al. Comunicação interatrial no adulto: Uma revisão de literatura. 2019. Disponível em: https://www.atenaedito- ra.com.br/catalogo/post/comunicacao-interatrial-no- adulto-uma-revisao-de-literatura. Acesso em: 10 fev. 2023. CHEN, Y. et al. Permanent atrial fibrillation is restored and sinus rhythm maintained without catheter ablation after atrial septal defect closure: A case report. The Heart Surgery Forum, v. 25, n. 5, p. E676-E679, 2022. DANTAS, M.D.O. et al. Comunicação interatrial (cia): Uma relação entre a formação embrionária e a cardiolo- gia. 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A primeira ci- rurgia para correção de uma cardiopatia congê- nita foi realizada em 1938. No Brasil, a primeira ocorreu 10 anos depois, em 1948, quando Ar- thur Domingues Pinto realizou a cirurgia de Blalock-Taussig, quatro anos depois de ter sido feita pela primeira vez (OLIVEIRA et al., 2021). Com o avanço das técnicas e tecnologias para facilitar o tratamento cirúrgico de doenças cardíacas como, por exemplo, a circulaçãoex- tracorpórea - utilizada pela primeira vez em 1951 - houve aumento da possibilidade de tra- tamento e diminuição da mortalidade de cardi- opatias congênitas diagnosticadas. No Brasil, as cardiopatias congênitas estão presentes em cerca de 0,9% dos nascidos, sendo que as cia- nóticas necessitam de tratamento cirúrgico por serem mais graves, entre essas, a mais comum é a Tetralogia de Fallot. As acianóticas, in- cluem, por exemplo, a comunicação interatrial (CIA), comunicação interventricular (CIV) de- feito do septo atrioventricular, estenose aórtica, persistência do canal arterial (PCA) e coarcta- ção da aorta (SILVA et al., 2018). As cardiopatias congênitas podem exigir di- ferentes procedimentos dependendo da idade do paciente, das características morfológicas da patologia e das repercussões clínicas. Como exemplos de procedimentos cirúrgicos para es- sas cardiopatias, podem ser citados: Inserção de retalho de tecido animal ou sintético em casos de comunicação interventricular; aortoplastia como a de Waldhausen ou Teles de Mendonça para coarctação de aorta; cirurgia de Blalock- Taussig-Thomas para T4F; cirurgia de Jatene para transposição de grandes artérias; cirurgia do cone para anomalia de Ebstein, dentre ou- tras. Geralmente, há mais de uma opção de tra- tamento para cada cardiopatia, mesmo que já estejam apresentando repercussões mais graves (JATENE, 2002; NEVES, 2020). A evolução dos procedimentos cirúrgicos, assim como das informações relacionadas às cardiopatias, possibilita uma melhora da qua- lidade de vida do paciente, que outrora, carre- garia a doença ou suas sequelas para o resto da vida. As questões sobre a realização de um pro- cedimento cirúrgico, podem incluir, por exem- plo, em qual idade ele é feito, como na transpo- sição de grandes artérias ou coração univentri- cular. Em relação aos fatores que favorecem a necessidade da correção cirúrgica de uma car- diopatia, além do fato de geralmente haver um comprometimento total da função do coração ao longo dos anos, é a relação do coração com o pulmão e a oxigenação do sangue, já que al- terações estruturais e o comprometimento fun- cional do coração podem ser a origem desde uma leve diminuição da hematose até um edema pulmonar agudo (BARROS et al., 2018). No Brasil, segundo o Ministério da Saúde (2022), anualmente, cerca de 30.000 bebês nas- cem com cardiopatias congênitas e, aproxima- damente, 12.000 precisam realizar uma cirurgia já no primeiro ano de vida. Diante de números tão expressivos, a busca e o aprimoramento do conhecimento acerca dos procedimentos, inclu- indo cirúrgicos, que servem para tratamento dessas patologias, se fazem cada vez mais ne- cessários. O objetivo desse capítulo foi realizar uma revisão bibliográfica acerca da evolução e do cenário atual do tratamento cirúrgico das car- diopatias congênitas no Brasil, com foco na efe- tividade das técnicas e a relação com a sobre- vida dos pacientes após os procedimentos, além da análise de quais delas são mais recentes ou 91 quais são as mais frequentemente utilizadas, por seus benefícios, pelos cirurgiões. MÉTODO A metodologia aplicada ao estudo, teve ca- ráter exploratório com abordagem qualitativa em fontes bibliográficas, sendo este estudo rea- lizado no período de dezembro de 2022 à ja- neiro de 2023. Utilizou-se para a elaboração do capítulo as bases de dados PubMed, SciELO Acadêmico, Lilacs, Scopus e Cochrane. Relaci- onando os descritores “Cirurgia cardiopatia congênita”, “Cardiopatia congênita”, “Cardio- patia congênita no Brasil”, "Cirurgias cardíacas cianóticas", “Tratamento cirúrgico de cardiopa- tias congênitas”, “Cardiopatias congênitas”, “Cardiopatias congênitas e tratamento”, “Car- diopatias congênitas e técnicas”, “Tetralogia de Fallot”, “Tetralogy of Fallot”, “Comunicação interatrial”, “Interatrial communication”, “Co- municação interventricular” e “Interventricular communication" ao cenário atual do tratamento cirúrgico das cardiopatias congênitas no Brasil. Foram selecionados ao todo 20 artigos, nos idi- omas português e inglês, relacionados às prin- cipais cardiopatologias congênitas acianogêni- cas e cianogênicas. Ademais foram incluídos os artigos que abordassem a efetividade das técni- cas e a sobrevida dos pacientes pós tratamento cirúrgico, além de artigos que analisaram com- parativamente as técnicas usadas para a aborda- gem em cada tipo de patologia congênita, desde que estes fossem publicados no período das úl- timas duas décadas. Não foi considerada qual- quer restrição quanto aos tipos de estudos abor- dados nos artigos científicos, no entanto, foram considerados como critérios de exclusão os ar- tigos anteriores ao período selecionado para o estudo. Além disso, como esgotar a temática não era o objetivo final desta pesquisa, não fo- ram feitas análises sistemáticas dos artigos, mas sim, apenas uma seleção suficiente para forne- cer um panorama geral sobre o assunto. Poste- riormente a seleção, os textos foram submetidos à leitura e a uma análise meticulosa para a co- leta de dados e informações relevantes para o desenvolvimento do capítulo. Os resultados fo- ram apresentados em forma de discussão. RESULTADOS E DISCUSSÃO Embora muitos pacientes cardiopatas adqui- ram uma condição de saúde estável, parte deles apresenta defeitos residuais e sequelas impor- tantes na vida adulta, apesar de inúmeras corre- ções cirúrgicas. As cardiopatias congênitas são consideradas condições crônicas devido aos fa- tores que as acompanham em longo prazo e que interferem na vida diária desses pacientes, in- cluindo a incerteza em relação ao curso da do- ença, o prognóstico, os sinais e sintomas, e as restrições na atividade física (MOONS et al., 2002). A investigação da qualidade de vida nessa população, em diversas faixas etárias, tem ga- nhado maior atenção como um importante des- fecho de saúde, não só relacionado a sintomas e condições clínicas, mas também em termos do seu nível de bem-estar e satisfação com a vida como um todo (MOONS et al., 2002). Os avanços nas técnicas de cirurgia cardíaca e o diagnóstico precoce têm possibilitado maior sobrevida de indivíduos com cardiopatias con- gênitas. A investigação da qualidade de vida em crianças e adolescentes com cardiopatias con- gênitas fornece informações complementares aos dados clínicos que podem auxiliar na to- mada de decisão dos profissionais de saúde (BERTOLETTI et al., 2014). O tratamento cirúrgico das cardiopatias congênitas, sejam cianogênicas ou acianogêni- cas, deve-se basear no princípio básico de pro- curar, sempre que possível, devolver ou ofere- 92 cer à criança portadora de cardiopatia adequada qualidade de vida, com redução ou abolição de sintomas, bem como perspectiva de sobrevida a longo prazo. Em algumas situações, os sinto- mas são pouco importantes, ficando a ideia de oferecer o tratamento sob o ponto de vista pre- ventivo, uma vez que se conheça a história na- tural da cardiopatia em questão. Na dependên- cia do tipo de cardiopatia, o tratamento cirúr- gico definitivo deve ser considerado opção ini- cial e imediata, com excelentes perspectivas fu- turas. Um exemplo são os neonatos portadores de transposição das grandes artérias, situação em que o tratamento preconizado deve ser a correção definitiva nos primeiros dias de vida, com sobrevida tanto imediata como a longo prazo extremamente favorável. Ao contrário, em neonatos portadores de coração univentricu- lar e hipofluxo pulmonar, deve-se pensar na possibilidade imediata de correção paliativa por meio de “shunt” sistêmico pulmonar, ficando a correção definitiva postergada para um mo- mento mais adequado dentro da evolução da criança. Como regra geral, uma vez feito o di- agnóstico da cardiopatia, deve-se pensar na cor- reção do defeito, em momento adequado para cada caso em particular, na dependência do grau de repercussão clínica e da magnitude do defeito (JATENE, 2002). A DoençaCardíaca Congestiva (DCC) crí- tica costuma ser letal quando o paciente não é operado no primeiro ano de vida. Desde o pri- meiro reparo com uso de circulação extracorpó- rea em 1953, o diagnóstico preciso e o trata- mento eficaz tornaram-se factíveis, mesmo tra- tando-se de lesões cardíacas incorporadas mais complexas. As terapias cirúrgicas efetivamente garantiram a expectativa de vida (ZANINI, 2022). A taxa de sobrevivência em crianças com cardiopatia aumentou e sobreviveu desde a dé- cada de 1980. Atualmente, mais de 85% das cri- anças com DCC podem atingir a idade adulta. Apesar da melhora na sobrevida desses pacien- tes nas últimas décadas, seu manejo ainda é complexo devido à fisiologia cardíaca e pulmo- nar que são interdependentes. As complicações pulmonares de DCC são multifatoriais, bem como podem ser consideradas, em decorrência de complicações ou perturbação das forças de Starling. Em certos tipos de DCC, essas altera- ções levaram a danos na membrana alvéolo-ca- pilar e edema pulmonar. Por sua vez, tais lesões resultam em pulmões com baixa complacência e com um padrão de função restritivo que pode se deteriorar e evoluir para hipoxemia. Sob tais circunstâncias, a capacidade do coração de au- mentar o fluxo sanguíneo sistêmico e/ou pul- monar é frequentemente limitada. A pressão parcial de oxigênio arterial pode ser diminuída por lesões de shunt a distribuição de oxigênio não pode atender às necessidades dos tecidos. Frequentemente, o distúrbio circulatório tam- bém exerce pressão sobre o próprio sistema controlado. Patologias em ambos os sistemas coexistem constantemente e impactam uns aos outros, tornando o diagnóstico e o manejo dos pacientes mais exigentes (ZANINI, 2022). No Brasil, os achados observacionais apon- taram que o perfil dos pacientes com cardiopa- tias congênitas foi de lactentes, pré-escolares e escolares, sem predomínio de gênero. Observa- se maior prevalência das cardiopatias congêni- tas acianóticas. Por outro lado, a maioria do nú- mero de óbitos estava entre as cardiopatias cia- nóticas (ZANINI, 2022). Apesar das melhorias na sobrevida precoce após cirurgia cardíaca, os pacientes ainda têm morbidade e mortalidade a curto e longo prazo. Para desenvolver estratégias mais individuali- zadas, é necessário aprofundar nosso conheci- mento dos fatores preditores que trabalham um 93 paciente em risco após cirurgia cardíaca. Dados sugerem que fatores preditores não tradicional- mente incorporados aos modelos de risco po- dem ter um impacto importante nos resultados. Esses fatores explicam uma proporção relativa- mente pequena de variação na mortalidade to- tal. Esta variação sem explicação destaca a ne- cessidade de explorar novos fatores preditores em pacientes que requerem cirurgia cardíaca (ZANINI, 2022). Por fim, podemos considerar que aborda- gens inovadoras para procedimentos, gerencia- mento de pacientes e pesquisa clínica tiveram o campo da medicina cardiovascular pediátrica desde o seu início. A evolução no diagnóstico e tratamento dos defeitos anatômicos cardiovas- culares em um ambiente hospitalar apresenta potencial para o desenvolvimento de novos mo- delos de atendimento. Esses modelos serão cen- trados no paciente e cada vez mais personaliza- dos, com abordagens mais assertivas, dado o perfil de risco individual. Evitando assim even- tos adversos, otimizando a sobrevida, a funcio- nalidade e a qualidade de vida dos pacientes (ZANINI, 2022). Em se tratando de classificação, em virtude da baixa concentração de oxigênio no sangue – hipóxia, as cardiopatias congênitas podem ser classificadas em cianóticas e acianóticas, sendo as acianóticas as mais prevalentes (ZANINI, 2022). As cardiopatias congênitas classificadas como acianóticas são: Comunicação interatrial (CIA), a comunicação interventricular (CIV), defeito no septo atrioventricular total (DSAVT) ou parcial (DSAVP), a estenose aórtica, persis- tência do canal arterial (PCA) e a coartação da aorta (CoA), ao passo que entre as cianóticas está a T4F, sendo a mais prevalente e que apre- senta maior gravidade no quadro do paciente (SILVA et al., 2022). À exceção de casos de persistência do canal arterial e coartação de aorta, o tratamento cirúr- gico da maioria das cardiopatias congênitas, se- jam cianóticas ou acianóticas, necessitam da utilização de equipamento auxiliar para circula- ção extracorpórea (BISCEGLI, 2002). Dentre as malformações cardíacas cianóti- cas, ou seja, que cursam com hipóxia, a Tetra- logia de Fallot (T4F) é a mais prevalente, aco- metendo cerca de três a cada 10.000 nascidos vivos no mundo, com incidência maior em pa- cientes do sexo masculino (KUPAS et al., 2021). Essa malformação, sugestivamente, se caracteriza por quatro defeitos congênitos na anatomia do coração: Comunicação interventri- cular, estenose da valva pulmonar, hipertrofia ventricular direita e dextroposição da artéria aorta. Basicamente, a fisiopatologia dessa doença gira em torno do defeito do septo interventricu- lar, o qual gera comunicação interventricular (CIV) e obstrução da via de saída do ventrículo direito, duas características que dificultam a sa- ída do sangue não oxigenado do ventrículo di- reito para a circulação pulmonar e acarretam a hipertrofia do ventrículo direito. Dessa ma- neira, o sangue é impulsionado para o ventrí- culo esquerdo e se mistura com o sangue oxige- nado, sendo levado à circulação sistêmica, o que também é facilitado pela dextroposição da aorta. Essa obstrução severa ao fluxo sanguíneo pulmonar e circulação de sangue não oxigenado pelo corpo levam a uma insaturação sistêmica e, portanto, à hipóxia prolongada (CHAMIÉ, 2021). A importância de um tratamento definitivo, comumente realizado entre três e seis meses de idade, está nas dimensões que as consequências graves da hipoxemia crônica progressiva po- dem causar. Esse tratamento se dá através de ci- rurgia cardíaca aberta, modalidade mais tradici- 94 onal de tratamento, a qual possibilita a correção da anatomia cardíaca e normaliza a saturação do fluxo sistêmico (CHAMIÉ, 2021). No en- tanto, alguns pacientes não são candidatos à ci- rurgia aberta e necessitam de procedimentos pa- liativos da cardiologia intervencionista para au- mentar a saturação sistêmica via cateterismo. Atualmente, discute-se que, com os avanços da cardiologia intervencionista, o tratamento da T4F será feito interventivamente em até duas décadas, no entanto, não houve relato de ne- nhum reparo completo transcateter até o mo- mento. É necessário que essa abordagem trans- cateter também mostre viabilidade e segurança comparáveis ao padrão atual de tratamento, visto que a taxa de mortalidade e reoperação é muito baixa no reparo da T4F em situações pa- drão (RAHMATH & BOUDJEMLINE, 2020). Já entre as malformações cardíacas acianó- ticas, pode-se citar, por exemplo, a persistência do canal arterial (PCA). Trata-se de uma estru- tura arterial que comunica duas grandes arté- rias, aorta e pulmonar, que possuem diferentes resistências; ela encontra-se presente no feto e, sua persistência após o nascimento, torna-a pa- tológica. Ela ocorre entre 5 a 10% dos recém- nascidos a termo com doença cardíaca congê- nita, existindo uma predileção pelo sexo femi- nino. Para o tratamento, é indicada a interven- ção cirúrgica, na qual o procedimento se inicia com uma incisão torácica posterolateral de 1,5 a 2,0 cm, dissecção dos planos subcutâneos e muscular, dissecção do plano da pleura costal ou abertura da pleura até o mediastino médio. Em seguida, há a dissecção do canal arterial, tri- pla clipagem com clip cirúrgico correspondente ao tamanho do canal, drenagem pleural, quando se abre a cavidade, com selo de água e fecha- mento por planos (PRADO et al., 2019). Os defeitos do septo ventricular (DSV) são as malformações cardíacas congênitas mais co- muns, consistindo em defeitos no septo inter- ventricular que permitem o shunt de sangue en- tre asduas câmaras ventriculares (ANDERSON et al., 2019). O organismo deflagra diversas tentativas espontâneas de correção desses defei- tos, porém, em médio ou longo prazo, isso pode alterar a estrutura e a função do coração, reper- cutindo em manifestações clínicas importantes ao paciente, visto que essas lesões são um fator de risco para o desenvolvimento de endocardite infecciosa, por exemplo (RIVERA et al., 2008). Nos casos de comunicação interventricular, o tamanho do defeito determina a conduta quanto ao momento da indicação cirúrgica. Em casos de pequenos defeitos, pode-se adotar a atitude expectante, haja vista a possibilidade de ocorrer o fechamento espontâneo da comunica- ção interventricular, sendo comum ocorrer em comunicação do tipo muscular, mas pode tam- bém acontecer em interventricular perimembra- nosa, caso o defeito apresentado seja pequeno, pois o tecido da cúspide septal da valva tricús- pide pode se sobrepor e ocluir a comunicação interventricular (JATENE, 2002). No trata- mento cirúrgico, há a recomendação da utiliza- ção de remendo, podendo ser de pericárdio bo- vino, ou autólogo, além de outros tecidos sinté- ticos. A sutura contínua pode ser usada a fim de fixar o remendo, entretanto, acredita-se que a utilização de pontos separados pode apresentar maior eficiência (JATENE, 2002). Além do tra- tamento cirúrgico, há a opção de realizar uma oclusão percutânea. Essa alternativa surgiu ainda na década de 1980, porém foi a partir do lançamento de prótese própria para esse proce- dimento que ele passou a ser mais aceito. Uma das técnicas sugeridas é a via retrógrada para a oclusão percutânea das CIVs, a qual mostrou- se eficaz, apesar do pequeno número de casos, em todos os tipos morfológicos de CIVs em que foi executada. Esse procedimento é realizado 95 sob anestesia geral, com intubação orotraqueal, sendo usados equipamentos como ETE e fluo- roscopia para a confirmação de diagnóstico e obtenção de maiores detalhes anatômicos. Ade- mais, nesse procedimento é realizada a profila- xia antimicrobiana. A Comunicação Interatrial (CIA) é outro exemplo de malformação cardíaca acianótica e corresponde em torno de 6 a 10% de todas car- diopatias congênitas, tendo predileção pelo sexo feminino na razão de 2:1 (COSTA et al., 2013). O tratamento cirúrgico do tipo “ostium secundum” (70% dos casos) ocorre por meio de cirurgia aberta, onde se faz uma rafe da CIA, aproximando as bordas com sutura contínua, ou plastia com placa de pericárdio bovino ou autó- logo, fixando a placa às bordas da CIA (JA- TENE, 2002). No entanto, um estudo brasileiro de 2013 já apresentava evidências de que o tra- tamento minimamente invasivo percutâneo em crianças e adolescentes deveria ser a modali- dade terapêutica de eleição, apresentando baixa taxa de morbidade no grupo tratado de maneira percutânea (COSTA et al., 2013). CONCLUSÃO O presente capítulo tratou-se de uma revisão acerca do tópico de cardiopatias congênitas, al- terações na estrutura do coração. Notou-se que a prevalência de cardiopatias congênitas no Brasil é de cerca de 0,9% dos nascidos, sendo que as cianóticas necessitam de tratamento ci- rúrgico, devido maior gravidade por interferên- cia na oxigenação geral do organismo. Ademais, ao abordar os impactos das cardi- opatias congênitas na vida do paciente, discu- tiu-se a interferência na vida diária, pelo caráter crônico da doença, e incerteza quanto à evolu- ção e tratamento. O tratamento cirúrgico é a pri- meira opção, sendo necessária uma análise pro- funda sobre o melhor momento para realizá-lo. Tal patologia costuma ser letal quando não tra- tada. Em casos leves pode-se optar por esperar para realizar a intervenção cirúrgica, uma vez que o defeito pode solucionar sozinho. Em ca- sos mais graves, por outro lado, além do trata- mento cirúrgico (com cirurgia normalmente aberta), há a opção de realizar uma oclusão per- cutânea Além disso, infere-se que o manejo do paci- ente cardiopata congênito é de difícil realiza- ção, muitas vezes devido a complicações pul- monares e alteração no fluxo sanguíneo, geral- mente sendo necessária a circulação extracor- pórea. Após a análise realizada, concluiu-se que as cardiopatias congênitas, embora alvo de diver- sos estudos e mesmo com a evolução das técni- cas cirúrgicas, são alterações altamente graves e que necessitam de um intenso acompanha- mento e cuidado pela equipe e de um tratamento adequado, sistematizado e humanizado, le- vando em conta os anseios do paciente e a re- percussão do quadro clínico no seu cotidiano. 96 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, R.H. et al. Remodeling of the embryonic interventricular communication in regard to the description and classification of ventricular septal defects. 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Em 2017, das mais de 1,3 milhão de mortes, cerca de 27% estavam associadas a doenças cardiovasculares, sendo que desses casos, 45% estavam filiadas à hipertensão arterial sistêmica (DE LIMA et al., 2021). A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma doença crônica não transmissível que se caracteriza por níveis pressóricos maiores ou iguais a 140x90 mmHg que persistam ao menos em duas ocasiões de aferição (DO PRADO et al., 2022). Em 2000 a prevalência da HAS era de 25% nos adultos em todo o mundo (MACEDO et al., 2019), porém dados mais recentes revelam que 31% da população adulta tem esse diagnóstico (o correspondente a 1,2 bilhão de pessoas). No Brasil a perspectiva é a mesma, uma média de 30% da população sendo portadora da doença (DE LIMA et al., 2021), sendo que mais de 60% dos idosos estão incluídos nesse diagnóstico (DO PRADO et al., 2022). Entre alguns aspectos importantes para essa condição, dentro do contexto fisiopatológico diverso da HAS, temos como principais fatores de risco a obesidade, resistência à insulina, con- sumo de bebidas alcoólicas e sal, idade avan- çada, sedentarismo, estresse, baixa ingestão de potássio e cálcio e tabagismo (DO PRADO et al., 2022). Outros aspectos que ainda se confi- guram como risco para o desenvolvimento da doença: Síndrome da apneia obstrutiva do sono, uso de anticoncepcionais, etnia, sexo e fatores genéticos (CARDOSO et al., 2020; MACEDO et al., 2019). O objetivo deste capítulo foi compreender a hipertensão arterial e capacitar a sociedade ci- entifica com o conhecimento. MÉTODO Trata-se de um estudo sistemático reali- zado no período de janeiro de 2023 a março de 2023, através de pesquisas nas bases de dados UpToDate e em Diretrizes de Sociedades Bra- sileiras. Foram utilizados os descritores: Hiper- tensão arterial sistêmica, Pressão sistólica, Pressão diastólica. Os artigos foram seleciona- dos de acordo com a abordagem da temática proposta em cada tópico do estudo. Após seleção, realizou-se já um estudo minucioso de cada artigo para a coleta e a descrição dos dados. Os resultados foram apresentados de forma descritiva, divididos em categorias temáticas, abordando pressão arterial e dano vascular, diagnóstico e classificação, avaliação clínica e complementar, estratificação do risco cardiovascular, decisão e metas terapêuticas, tratamento não medicamentoso, tratamento medicamentoso, condições clínicas associadas, crise hipertensiva, particularidades no idoso e hipertensão arterial sistêmica secundária. RESULTADOS E DISCUSSÃO Pressão arterial e dano vascular A pressão arterial é a pressão que o sangue exerce contra a parede das artérias. Alguns fatores podem influenciar diretamente no seu valor, como o débito cardíaco e a resistência periférica. O débito cardíaco representa o volume sanguíneo mobilizado para fora do coração a cada minuto, podendo ser calculado pela multiplicação do valor do débito sistólico pela frequência cardíaca. A resistência periférica é a oposição que o sistema circulatório oferece ao fluxo sanguíneo gerado pelo coração, estando relacionada principalmente com o diâmetro dos vasos e com a fricção do sangue contra as paredes dos vasos. 99 Sendo assim, a pressão arterial varia de maneira proporcional à variação desses valores, gerando um mecanismo de controle que visa suprir as necessidades fisiológicas momentâneas (BROUWERS et al., 2021). Diante disso, nota-se que valores elevados de pressão arterial constituem um importante mecanismo de gênese de doenças cardiovasculares tanto por ser um fator de risco para doença aterosclerótica quanto por gerar dano estrutural em artérias e arteríolas (NOVO et al., 1991). A hipertensão pode gerar dano vascular por diversos mecanismos, como hipertrofia e hiperplasia de células musculares lisas, comprometimento da complacência da parede arterial, disfunção endotelial (PUPITA et al., 1991) e aumento de espécies reativas de oxigênio, uma vez que, na hipertensão, pode ocorrer desequilíbrio dos mecanismos antioxidantes endógenos, o que leva a um estado de estresse oxidativo, associado a lesões vasculares em várias patologias (MASI et al., 2019). Portanto, considerando os diversos mecanismos de dano vascular, a hipertensão deve ser devidamente tratada, pois pode evoluir para quadros mais graves, como acidentes vasculares encefálicos, infarto, insuficiência cardíaca, alterações na visão e problemas renais (TOUYS et al., 2000). Diagnóstico e classificação Introdução No âmbito clínico, a pressão arterial deve ser medida de modo correto pelo profissional de saúde, utilizando de início os dois braços em avaliação concomitante. Após a verificação dos valores, priorizar-se-á nas próximas avaliações o braço que apresentar os maiores números. É importante também se atentar à diferença das medidas de cada membro, visto que quando esta é superior a 15 mmHg, há risco cardiovascular (CV) aumentado por potencial doença aterosclerótica. Em pacientes obesos e naqueles com elevada muscularidade, é fundamental o uso de manguitos de maior diâmetro para que se reduza o risco de diagnósticos imprecisos e, em suspeita de HAS causada por coarctação de aorta, deve-se também medir a pressão arterial do membro inferior (BARROSO et al., 2020). É possível também fazer a medição fora do consultório a partir da Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial (MAPA), que possui maior eficiência na detecção de LOA e de risco CV do que a aferição em consultório e da Monitorização Residencial da Pressão Arterial (MRPA), a qual reflete com maior verossimilhança o cotidiano do paciente, além de evitar medições enviesadas, como ocorre na Hipertensão do Avental Branco (HAB) (BARROSO et al., 2020). Critérios diagnósticos e fenótipos Diagnostica-se a HAS em um paciente em múltiplos cenários. No interior do consultório, confirma-se o quadro de HAS estágio I a partirdo achado de pressão sistólica superior ou igual a 140 mmHg e/ou de pressão diastólica superior ou igual a 90 mmHg em duas medições distintas e espaçadas por dias ou semanas, sendo o quadro definido pelo maior valor. Pressões sistólicas (PAS) maiores ou iguais a 160 mmHg e/ou diastólicas (PAD) maiores ou iguais a 100 mmHg já configuram HAS estágio II. Diagnostica-se hipertensão estágio III com PAS superiores ou iguais a 180 mmHg e de PAD superiores a 110 mmHg (BASILE et al., 2022). Fora do ambiente médico, pode-se diagnosticar HAS em duas situações: Se a PAS e a PAD médias obtidas em MRPA forem superiores ou iguais a 130 mmHg e 80 mmHg, respectivamente ou se, em MAPA, as PAS e as PAD médias do período da manhã (em um 100 período de 12 horas) forem superiores ou iguais a 130 mmHg e 80 mmHg, respectivamente (BASILE et al., 2022). Caso encontre-se uma medida alterada em ambiente domiciliar e uma normotensão à consulta, tem-se a Hipertensão Mascarada (HM), normalmente relacionada ao estilo de vida do paciente (tabagismo, sedentarismo, estresse etc.). A HAB consiste em achados pressóricos alterados em consultório em contraste com uma normotensão em medição residencial. Em suspeita, é prudente utilizar a MAPA para a confirmação diagnóstica (BARROSO et al., 2020). É possível firmar o diagnóstico sem medições seriadas em caso de urgência/emergência hipertensiva, isto é, o achado de PAS e de PAD superiores ou iguais a 180 e 120 mmHg, respectivamente e, se em única medição forem encontrados valores de PAS e PAD superiores ou iguais a 160 e 100 mmHg, respectivamente, associados à LOA previamente conhecida, define-se o paciente como hipertenso. Caso o paciente apresente valores pressóricos nos limites de normalidade dentro e fora do consultório, ele será classificado clinicamente como normotenso (BASILE et al., 2022). Estratificação do risco cardiovascular A VI Diretriz Brasileira de Hipertensão (2010) utilizou os seguintes itens como base para a estratificação: Reconhecimento dos fatores de risco cardiovasculares, fatores adicionais para a HAS, identificação de lesões em órgãos-alvo e identificação de lesões subclínicas nesses órgãos. São considerados fatores adicionais para HAS são: Homens > 55 anos e mulheres > 65 anos; tabagismo; dislipidemias; presença de diabetes mellitus; e histórico familiar prematuro de doença cardiovascular. Já a identificação de lesões subclínicas em órgãos-alvo é feita principalmente pela presença de Hipertrofia Ventricular Esquerda (HVE) ao ECG associada a outros indicativos, como: ECG com índice de massa de Ventrículo Esquerdo > 134 gramas por metro quadrado em homens, ou acima de 110 gramas por metro quadrado em mulheres; espessura médio- intimal das carótidas >0,9 mm; a presença de placa de ateroma nas carótidas detectada pelo doppler; índice tornozelo-braço <0,9; depuração de creatinina < 60 mL/min; baixo ritmo de filtração glomerular; presença de microalbuminúria e velocidade de onda de pulso >12 m/s. (D’AGOSTINO et al., 2008). A estratificação de risco é dividida em: HAS de baixo risco cardiovascular (estimativa de risco cardiovascular <10% em 10 anos), HAS de moderado risco cardiovascular (estimativa de risco cardiovascular entre 10% a 20% em 10 anos) HAS de alto risco cardiovascular (estimativa de risco cardiovascular > 20% em 10 anos) (D’AGOSTINO et al., 2008). O cálculo da estimativa dos riscos é realizado a partir da pontuação de duas tabelas para cada sexo (Figura 12.2 e 12.4). Essas tabelas são montadas de acordo com a escala de risco de Framingham revisada (Figura 12.1 e 12.3) (D’AGOSTINO et al., 2008). Figura 12.1 Escore de Framingham revisado para mulheres Fonte: D'Agostino et al., 2008. 101 Figura 12.2 Estimativa de risco cardiovascular para mulheres Fonte: D’Agostino et al., 2008. Figura 12.3 Escore de Framingham revisado para homens Fonte: D’Agostino et al., 2008. Figura 12.4 Estimativa de risco cardiovascular para homens . Fonte: D’Agostino et al., 2008. Decisão e meta terapêutica Hipertenso com risco baixo ou moderado Os pacientes hipertensos que não apresentam muitos fatores de risco podem ser classificados em risco baixo e moderado. Neste, a pressão arterial está consideravelmente elevada (> 160 mmHg); já naquele, a elevação é menor. Os indivíduos ainda podem ser divididos em hipertensão estágio 1 e hipertensão estágio 2 (risco baixo e moderado respectivamente) (BARROSO et al., 2020). No contexto geral, evidências científicas comprovam o benefício e as vantagens de se tratar pacientes no estágio 2. Entretanto, o estágio 1 segue nebuloso pela dificuldade em se manter um estudo com grande quantidade de indivíduos e por tempo suficiente para analisar os efeitos gerais do tratamento nesses casos. Assim, as pesquisas que usaram dados individuais são as utilizadas para nortear a decisão e a meta terapêutica nesses casos, uma vez que estes estudos mostram a influência do tratamento na diminuição de acidente vascular encefálico e mortalidade total (BARROSO et al., 2020). Portanto, foi analisado que as metas pressóricas para os pacientes de baixo ou moderado risco cardiovascular devem ser PA sistólica <140 mmHg e PA diastólica <90 mmHg, sendo que há maior redução dos desfechos cardiovasculares quando PA sistólica entre 120 e 130 (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com alto risco Hipertensão com alto risco são os pacientes com 3 ou mais fatores de risco, diabéticos, com lesões em órgãos-alvo, doença cardiovascular ou renal (BARROSO et al., 2020). 102 Nesse contexto, conclui-se que a meta terapêutica deve ser de PA sistólica entre 120 e 129 mmHg e PA diastólica entre 70 e 79 mmHg (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com doença coronária A doença arterial coronariana está diretamente relacionada com os níveis pressóricos, sendo influenciada principalmente pela PA diastólica antes dos 50 anos, e pela PA sistólica após os 60 anos (BARROSO et al., 2020). A hipertensão arterial é o maior fator de risco para a DAC, independentemente de raça, idade e gênero (PIRES et al., 2016). Recomenda-se que pacientes hipertensos com DAC precisam ter PA <130/80 mmHg, mas não menos que 120/70 mmHg. Deve-se ter atenção redobrada nos idosos com DAC e pressão de pulso elevada porque a redução da pressão sistólica pode causar valores muito baixos da diastólica e acarretar em isquemia miocárdica (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com história de AVE A hipertensão arterial é o principal fator de risco de Acidente Vascular Encefálico (AVE) isquêmico e hemorrágico e as metas levam em conta o histórico de AVE e a idade do paciente. Nos casos de indivíduos jovens sem doença cardiovascular ou renal, a PA ideal é de 120/80 mmHg, o que serve como prevenção cerebrovascular. Concomitantemente, pacientes com histórico prévio de AVE precisam atingir PA <130/80 mmHg, mas caso tenham também doença arterial crônica ou idade avançada, a pressão deve ser de 120/70 mmHg (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com insuficiência cardíaca A hipertensão arterial é um fator de risco para insuficiência cardíaca (IC). Sabe-se que conforme o aumento da pressão arterial, a incidência de insuficiência cardíaca cresce drasticamente (ROLANDE et al., 2012). As metas terapêuticas são as mesmas para os pacientes com fração de ejeção reduzida e preservada: PA entre 120/70 e 130/80 mmHg (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com doença renal crônica A associação entre doença renal crônica (DRC) e hipertensão arterial é de grande risco, pois aumenta as chances de diversas doenças, além de poder acarretar em morte. Paralelamente, a DRC por si só pode agravar as complicações da hipertensão arterial (LEITE et al., 2020) O adequado controle pressórico está associado à redução de proteinúria, que quando elevada, é responsável por agravar e causar progressãoda DRC (BARROSO et al., 2020). Hipertenso com diabetes A associação da hipertensão com diabetes é comum, principalmente no tipo 2. A normalização da pressão arterial em diabéticos consegue fazer proteção renal, diminuindo a albuminúria e diminuir risco de AVE, sendo essencial a PA < 130/80 mmHg, evitando valores sistólicos abaixo de 120 (BARROSO et al., 2020). Tratamento não medicamentoso Abordagens dietéticas Várias revisões sistemáticas evidenciam consistentemente que a ingesta limitada de sódio resulta na redução significativa da PA, sendo o efeito hipotensor maior entre os indivíduos hipertensos (DHUNGANA et al., 2022). Além disso, padrões alimentares, como as dietas DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension) e Mediterrânea, são medidas 103 eficazes na redução de PA tanto em indivíduos hipertensos quanto nos pré-hipertensos. Controle de peso e atividade física O ganho de peso está intimamente relacionado à hipertensão e suas causas secundárias, como a apneia obstrutiva do sono (SILVA et al., 2022). O controle de peso tem importância hipotensora e melhora a eficácia dos anti-hipertensivos, devendo ser alcançada por abordagem multidisciplinar que envolva acompanhamento nutricional e atividade física regular (SILVA et al., 2022). De modo geral, a atividade física regular confere menor morbimortalidade cardiovascular. Observa-se que, apesar do treinamento de moderada a alta intensidade provocar maior redução dos níveis de PA, a atividade física regular, mesmo em baixa intensidade, quando comparada aos indivíduos não ativos, está associada à redução de mortalidade (DHUNGANA et al., 2022; SILVA et al., 2022). Redução do álcool e cessação do taba- gismo Há interação linear entre consumo de álcool e elevação pressórica, sendo o consumo abusivo associado à maior prevalência de hipertensão. Espera-se redução de 3-4 mmHg na PAS com abstinência completa ou redução da ingesta para menos de 2 doses por dia com 2 dias de folga por semana (SILVA et al., 2022). Segundo a OMS, não existe padrão seguro de consumo de álcool. O tabagismo, como fator de risco para HAS, deve ser cessado (BARROSO et al., 2020; UNGER et al., 2020). Tratamento medicamentoso Princípios Gerais De acordo com a Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial Sistêmica - 2020, a grande parte dos pacientes hipertensos terá a necessidade da utilização de algum fármaco associado às mudanças de estilo de vida para que ocorra o controle pressórico (BARROSO et al., 2020). Existem vários tipos de medicamentos disponíveis, as principais classes são os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), bloqueadores dos receptores de angiotensina (BRA), diuréticos (DIU), bloqueadores dos canais de cálcio (BCC) e betabloqueadores (BB). O tipo de medicamento utilizado dependerá da gravidade da hipertensão, da presença de outras doenças e da resposta individual do paciente (BARROSO et al., 2020). Esquemas terapêuticos O tratamento da hipertensão arterial pode ser realizado com monoterapia ou associação de dois ou mais medicamentos anti-hipertensivos para aumentar a eficácia do tratamento. A escolha do esquema terapêutico depende da gravidade da hipertensão, da presença de outras condições médicas, e dos possíveis efeitos colaterais (BARROSO et al., 2020). Os medicamentos mais utilizados em monoterapia são os DIU, IECA, BRA, BCC e BB. Indica-se monoterapia nos casos de HAS estágio 1 com risco cardiovascular baixo, PA 130-139/85-89 de risco cardiovascular alto ou em indivíduos idosos frágeis. No primeiro caso, pode-se aguardar 3 meses para o efeito da mu- 104 dança do estilo de vida. A terapia medicamentosa não é recomendada em pacientes pré-hipertensos (PA 130-139/85-89) sem doença cardiovascular pré-existente e risco cardiovascular baixo a moderado (BARROSO et al., 2020). Deve-se dar preferência aos BCCs em idosos, casos de angina de peito e HAS sistólica. Pacientes com hiperplasia benigna de próstata devem ser medicados com alfa- bloqueadores enquanto diuréticos tiazídicos em pacientes em pós-AVC (BARROSO et al., 2020). A terapia antiagregante plaquetária consiste no uso de agentes antiplaquetários, como a aspirina em dose baixa, comprovadamente reduz a morbimortalidade cardiovascular em pessoas que apresentam HAS com doença cardiovascular concomitante. Portadores HAS e risco cardiovascular alto, recomenda-se o uso de aspirina profilática, na dose de 100 mg/dia, após o controle ideal ou próximo do alvo de pressão arterial inferior a 140/90 mmHg (EGAN et al., 2020). A terapia combinada deve ser feita com medicamentos de classes distintas em baixas doses, como o uso de tiazídicos em associação com IECAs ou BCCs. As combinações em doses fixas e comprimido único são preferenciais por gerarem maior adesão ao tratamento (BARROSO et al., 2020). HAS e condições clínicas associadas Os níveis elevados pressóricos estão correlacionados a diversas condições induzindo complicações clínicas, o que impacta na mortalidade e prognóstico. Em indivíduos com diabetes mellitus, essencialmente tipo 2, a persistência de níveis de pressão arterial superiores a 140/90 mmHg está associada ao aumento da incidência de acidente vascular encefálico (AVE), síndromes coronárias e doença renal crônica. Os pacientes diabéticos não apresentam restrição ao uso de medicamentos utilizados na redução da PA. É indicado o uso dos bloqueadores do sistema renina-angiotensina-aldosterona, essencialmente na presença de lesão de órgão- alvo, podendo ser associados aos bloqueadores dos canais de cálcio (BCC) e/ou diurético. Na Síndrome Metabólica, a pressão alta está relacionada a estados pró-trombóticos e pró- inflamatórios, necessitando de tratamento quando PA ≥ 140/90 mmHg (BARROSO et al., 2021). A hipertensão arterial pode estar em conjunto a outras doenças cardiovasculares. Estudos apontam que na Doença Arterial Coronária (DAC), 25% dos infartos são atribuídos aos aumentos da pressão. O manejo deve ser feito preferencialmente com BB, IECA ou BRA, além de estatinas e aspiras e sem o objetivo de redução excessiva dos níveis pressóricos, principalmente da diastólica, uma vez que isso predispõe outros eventos cardiovasculares. Na insuficiência cardíaca, a HA atua propiciando aparecimento de HVE, disfunção diastólica e sistólica do ventrículo esquerdo, devendo ser controlada sobretudo em idosos. Em situações de acidente vascular encefálico hemorrágico, é contraindicado a imediata redução da PA, exceto em valores de PAS ≥ 220 (BARROSO et al., 2021). Crise Hipertensiva A crise hipertensiva (CH), importante com- plicação decorrente da hipertensão arterial sis- têmica (HAS), é definida como situação clínica sintomática em que há acentuada elevação da pressão arterial sistólica (PAS) ou pressão diás- 105 tólica (PAD) igual ou acima de 180 mmHg e 120 mmHg, respectivamente. (BARROSO et al., 2021; PIERIN et al., 2019). Pode ser classificada em urgência hiperten- siva, quando essa elevação da pressão arterial ocorre na ausência de lesão aguda e progressiva em órgãos-alvo e na ausência do risco de morte; e em emergência hipertensiva, quando cursa com presença de lesão aguda e progressiva de órgãos-alvo e com risco iminente de morte (BARROSO et al., 2021). A emergência hipertensiva é definida pela situação clínica do paciente, e não pelo valor dos níveis pressóricos, de forma que indivíduos com menores reservas funcionais em determi- nados órgãos podem desenvolver o quadro mesmo em níveis pressóricos menores do que 180/120 mmHg. Pode manifestar-se como um evento cardiovascular (dissecção aguda de aorta, edema agudo de pulmão com insuficiên- cia ventricular esquerda, síndromes coronaria- nas agudas), cerebrovascular (encefalopatia hi- pertensiva, acidente vascular encefálico isquê- mico, acidente vascular encefálico hemorrá- gico,hemorragia subaracnóidea), renal, ter en- volvimento de múltiplos órgãos (hipertensão acelerada/ maligna, hipertensão de múltiplos órgãos) ou na forma de pré-eclâmpsia com si- nais de gravidade/eclampsia. Sua letalidade, caso não seja tratada, se aproxima de 80% em um ano, sendo o tratamento anti-hipertensivo associado a uma considerável melhora do prog- nóstico (BARROSO et al., 2021). Segundo Barroso et al., (2021), a CH cor- responde de 0,45% a 0,59% de todos os atendi- mentos da emergência hospitalar, sendo a emer- gência hipertensiva responsável por 25% de to- dos os casos de CH, com predominância de aci- dente vascular isquêmico e edema agudo de pulmão. A pseudocrise hipertensiva consiste em uma elevação transitória da pressão arterial por in- fluência de estressores emocionais ou doloro- sos, como enxaqueca, tontura rotatória, cefa- leias vasculares e de origem musculoesquelé- tica ou manifestações da síndrome do pânico. Geralmente o paciente se apresenta oligossinto- mático ou assintomático e sem lesão aguda de órgãos-alvo ou risco imediato de morte (BAR- ROSO et al., 2021; PIERIN et al., 2019). Elevações agudas da pressão arterial podem resultar de alterações no débito cardíaco (DC) e/ou da resistência vascular periférica (RVP), já que a PA sistêmica consiste no produto entre DC e RVP. Portanto, a crise hipertensiva pode ser desencadeada por aumento de volume intra- vascular, aumento da resistência vascular peri- férica, produção reduzida de vasodilatadores endógenos e/ou ativação de sistemas vasocons- tritores, resultando em maior vasorreatividade e aumento da PA (BARROSO et al., 2021). A investigação clínica deve ser direcionada para a avaliação da PA e para a busca de lesões agudas em órgãos-alvo. Deve-se realizar a me- dição da PA nos dois braços, em ambiente calmo, repetidamente, até estabilização do pa- ciente ou, no mínimo, realizar três medidas. A coleta de informações acerca de qual é o valor habitual de PA do paciente, quais situações po- deriam desencadear sua elevação, quais comor- bidades o paciente apresenta, se fez ou faz uso de fármacos anti-hipertensivos ou se consumiu substâncias que potencialmente poderiam ter elevado a PA é indispensável. Portanto, avalia- ção dos sinais e sintomas, anamnese, exame fí- sico e, caso necessário, investigação comple- mentar, irão direcionar para a realização do di- agnóstico correto (BARROSO et al., 2021). O tratamento a ser realizado dependerá do diagnóstico clínico do paciente. Na pseudocrise 106 hipertensiva, o paciente deve ser submetido a um ambiente calmo e passar por um período de observação, apresentando resolução do quadro após repouso ou uso de analgésicos ou tranqui- lizantes (BARROSO et al., 2021). No caso da urgência hipertensiva, o trata- mento agudo é baseado na administração do captopril, um inibidor da enzima conversora de angiotensina I (ECA), ou da clonidina, um ago- nista dos receptores alfa-2-adrenérgicos. O cap- topril, na dose de 25 a 50 mg, tem pico máximo de ação em 1 hora a 1,5 horas. Já a clonidina, na dose de 0,100 a 0,200 mg, apresenta ação máxima entre 0,5 a 1 hora do momento da ad- ministração. As cápsulas de nifedipina de libe- ração rápida são proscritas, pois não apresen- tam segurança e nem eficácia no tratamento da urgência hipertensiva (BARROSO et al., 2021). O objetivo do tratamento da emergência hi- pertensiva visa reduzir rapidamente a PA e im- pedir a progressão das lesões em órgãos-alvo. O uso de anti-hipertensivos tem se mostrado be- néfico e redutor da mortalidade na prática clí- nica e na evolução dos pacientes tratados. Deve-se admitir o paciente em unidade de tera- pia intensiva (UTI), realizar o tratamento com anti-hipertensivos intravenosos e realizar in- tensa monitorização, evitando a ocorrência de quadros de hipotensão. Segundo Barroso et al. (2021), recomenda-se que a PA média na 1ª hora após a instituição do tratamento seja me- nor ou igual a 25% da PA inicial, e que atinja o valor de 160/110 mmHg nas primeiras 2 a 6 ho- ras e 135/85 mmHg nas 24 a 48 horas subse- quentes. Além disso, deve-se abordar o sistema ou órgão-alvo acometido para resolução com- pleta do quadro (BARROSO et al., 2021). No caso da encefalopatia hipertensiva, emergência hipertensiva neurológica caracteri- zada por sinais e/ou sintomas de edema cerebral secundário à elevação súbita e/ou sustentada da PA, o objetivo do tratamento consiste na redu- ção lenta da PA, já que reduções abruptas não são indicadas por provocarem hipoperfusão e perda do mecanismo de autorregulação cere- bral. É recomendado o uso de nitroprussiato de sódio, um vasodilatador que atua reduzindo a resistência vascular e, consequentemente, a PA; devendo ser associado a anti-hipertensivos de administração oral nas primeiras 24 a 48 h (BARROSO et al., 2021). O Acidente Vascular Encefálico (AVE) tem como principal fator de risco a HAS. A tomo- grafia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RNM) de crânio possibilitam defi- nir o tipo de AVE, sendo o isquêmico (AVEI) responsável por 85% dos casos e o hemorrágico (AVEH) por 15%. Em casos de AVEI com in- dicação de trombólise ou trombectomia, é reco- mendada redução na PA abaixo de 185/110 mmHg antes da instituição da terapia, não de- vendo ser realizado o procedimento caso não haja essa redução. Nas primeiras 24 h após trombólise, deve-se manter a PA abaixo de 180/105 mmHg. Caso a PA esteja igual ou acima de 220/120 mmHg e o paciente apresente outros órgãos acometidos, deve-se reduzir a pressão inicial em 15%. Nos demais pacientes com AVEI, a redução da PA em 5 a 7 dias do evento inicial apresenta efeitos neurológicos controversos, portanto a conduta em cada caso deve ser individualizada (BARROSO et al., 2021). Em relação ao AVEH, a PA elevada poten- cializa o risco de aumento do hematoma e de morte, resultando em pior prognóstico neuroló- gico. O edema cerebral costuma ocorrer nas pri- meiras 24 h após o AVEH e em 30% dos paci- entes, sendo indicada nesse caso a craniotomia descompressiva e o encaminhamento para cen- tros especializados. Em pacientes com menos 107 de 6 h do início do AVEH, caso a pressão arte- rial sistólica (PAS) se encontre na faixa entre 150 a 220 mmHg, recomenda-se a sua redução mantendo-a abaixo de 180 mmHg. Se a PAS es- tiver maior do que 220 mmHg, deve-se consi- derar a sua diminuição a partir de infusão IV contínua e monitoramento frequente do paci- ente (BARROSO et al., 2021). Nas síndromes coronarianas agudas, o au- mento da pressão arterial associado ao aumento da resistência vascular periférica resultam na elevação da demanda de oxigênio pelo miocár- dio. Portanto, o objetivo do tratamento consiste na redução da pós carga sem gerar aumento da frequência cardíaca e sem redução acentuada da pré-carga, pois esse quadro levaria a um au- mento ainda maior do consumo de oxigênio pelo miocárdio. É recomendado o uso dos beta- bloqueadores esmolol ou metoprolol ou do va- sodilatador nitroglicerina, mantendo a PAS abaixo de 140 mmHg e a PAD entre 70 e 80 mmHg. O uso de nitratos IV, como a nitrogli- cerina, promove a redução da RVP, a melhora da perfusão coronariana e um efeito venodilata- dor sistêmico, resultando em redução da pré- carga e do consumo de oxigênio pelo miocár- dio. É proscrito o uso de hidralazina, NPS ou nifedipina (BARROSO et al., 2021). O Edema Agudo de Pulmão (EAP) associ- ado à emergência hipertensiva deve ser abor- dado em UTI, com uso de medicação IV para gradativa redução da PA e constante monitora- mento. Nitroglicerina e nitroprussiato de sódio, medicamentos vasodilatadores, podem ser utili- zados para redução da pré e pós carga. O diuré- tico de alça também é indicado, pois diminui a sobrecarga de volume e, consequentemente, atua na redução da PA (BARROSO et al., 2021). A dissecção aguda de aorta deve ser inves- tigada em todo paciente com crise hipertensiva e que apresente dor precordial e elevação daPA. O valor da PA e a velocidade de ejeção ven- tricular irão determinar a progressão da dissec- ção. É recomendado o uso de opiáceos IV para controle da dor, além de nitroprussiato de sódio associado a um betabloqueador de ação rápida e titulável (metoprolol, labetalol, esmolol), para controle da pressão arterial e redução da fre- quência cardíaca (FC). É proscrito o uso isolado do NPS. A FC do paciente deve ser mantida abaixo de 60 bpm e a PAS deve ser reduzida a valores menores que 120 mmHg em 20 minu- tos, sendo mantida entre 120 e 100 mmHg (BARROSO et al., 2021). HAS no idoso A prevalência de multimorbidade é maior entre os indivíduos com 65 anos ou mais de idade (WHISON et al., 2022). A investigação da HA em idosos segue as mesmas orientações das demais faixas etárias, porém, pode ser dificultada pela presença de múltiplas comorbidades e polifarmácia. A in- vestigação de causas secundárias de HA deve ser realizada de forma mais criteriosa, avali- ando-se os riscos e os benefícios dos procedi- mentos (BARROSO et al., 2020). Em idosos hígidos, os valores pressóricos sistólicos recomendados para o início de trata- mento consistem em ≥140 mmHg, enquanto a meta pressórica a ser atingida com o tratamento seria 130-139 mmHg (BARROSO et al., 2020). Em idosos frágeis, os valores pressóricos sistólicos recomendados para o início de trata- mento consistem em ≥160 mmHg, enquanto a meta pressórica a ser atingida com o tratamento seria 140-149 mmHg (BARROSO et al., 2020). Em idosos, devido à maior variabilidade pressórica e a algumas peculiaridades, alguns fatores podem interferir na medida da PA, po- 108 dendo resultar em valores inexatos. Estes prin- cipais fatores são presença de hiato auscultató- rio, presença de pseudo-hipertensão e variações posturais e pós-prandiais (BARROSO et al., 2020). O diagnóstico e o controle dos níveis pres- sóricos alterados em idosos resultam em redu- ção de acidente vascular encefálico (AVE), in- farto agudo do miocárdio (IAM), insuficiência cardíaca (IC) e mortalidade, e previne declínio cognitivo e demência (BARROSO et al., 2020). Na população geriátrica, recomenda-se a re- alização de triagem para hipertensão arterial sistêmica anualmente (HEFLIN et al., 2023). Tratamento não medicamentoso A escolha da estratégia terapêutica utilizada em pacientes idosos com HAS deve considerar a presença de comorbidades, a autonomia, a ca- pacidade funcional, o grau de fragilidade e as condições social e mental, não devendo basear- se apenas na idade (BARROSO et al., 2020). Como em pacientes mais jovens, modifica- ções no estilo de vida contribuem para a redu- ção da pressão arterial em pacientes idosos com hipertensão, sendo as principais perda de peso, restrição de sal na dieta e realização de exercí- cios físicos (EGAN et al., 2023). As medidas de mudanças de estilo de vida (MEV) recomendadas para o tratamento não medicamentoso no indivíduo jovem são tam- bém válidas para o idoso, porém com avaliação prévia de riscos e benefícios potenciais. O acompanhamento por equipe multidisciplinar e o envolvimento de familiares/cuidadores são importantes no tratamento de pacientes idosos (BARROSO et al., 2020). Modificações na dieta devem ser orientadas. A restrição salina para idosos é mais eficaz, uma vez que seus níveis pressóricos são mais sensíveis ao sal. Nesta recomendação, é neces- sário avaliar a possibilidade de hiponatremia e perda de apetite que podem ser desencadeados pela diminuição excessiva da ingestão de sal, levando à desnutrição. Dietas ricas em potássio podem ser indicadas, porém com cautela devido ao risco de hipercalemia, à presença frequente de doença renal crônica (DRC) e ao uso de fár- macos que reduzem a excreção de potássio (BARROSO et al., 2020). A realização de exercícios físicos de menor impacto, aeróbicos e resistidos devem ser ori- entados. Deve-se abordar e orientar sobre a ces- sação do tabagismo e do consumo de álcool. Os medicamentos em uso pelo paciente devem ser revisados, avaliando se algum específico ou a interação medicamentosa podem resultar em aumento de pressão (BARROSO et al., 2020). Tratamento medicamentoso A terapia medicamentosa anti-hipertensiva deve ser iniciada em pacientes idosos hiperten- sos caso as mudanças no estilo de vida não se- jam suficientes. Deve-se iniciar com doses ini- ciais mais baixas para minimizar risco de efei- tos colaterais, e promover uma redução gradual da pressão arterial (2 a 4 meses), devido à len- tificação dos barorreceptores e das respostas neurais simpáticas nos idosos (EGAN et al., 2023). Recomenda-se iniciar o tratamento utili- zando monoterapia ou combinação em doses baixas e, conforme necessidade, realizar au- mento ou combinação gradual de outros fárma- cos anti-hipertensivos, com intervalo mínimo de duas semanas (BARROSO et al., 2020). Inicialmente, o anti-hipertensivo de escolha para ser utilizado em monoterapia pode ser um diurético tiazídico, um bloqueador dos canais de cálcio (BCC) ou um bloqueador do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) [ini- bidor da enzima conversora da angiotensina 109 (IECA) ou bloqueador do receptor AT1 da an- giotensina II (BRA)]. As indicações e cuidados no monitoramento são semelhantes aos adultos (BARROSO et al., 2020). Não se deve utilizar betabloqueadores (BB) em monoterapia inicial em pacientes idosos, ex- ceto na presença de algumas comorbidades e de indicações específicas, como na como insufici- ência cardíaca (IC) ou insuficiência coronariana aguda. Pacientes com asma brônquica ou do- ença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), mas com indicação clínica para o uso de BB, devem ser tratados com BB cardiosseletivo após com- pensação respiratória e sob monitorização (BARROSO et al., 2020). Outras classes de anti-hipertensivos (medi- camentos de ação central, antagonistas da al- dosterona e vasodilatadores diretos) devem ser vistas como exceções no tratamento de HAS do idoso (BARROSO et al., 2020). HAS secundária As diretrizes brasileiras de hipertensão arte- rial (2020) definem hipertensão arterial secun- dária como aquela cuja etiologia pode ser iden- tificada, podendo ou não ser tratada com uma intervenção específica e resultando em melhora no perfil pressórico. Segundo Amodeo et al., (2010), antes de se investigarem causas secun- dárias de hipertensão é necessário excluir fato- res como má aferição da pressão arterial, hiper- tensão do jaleco branco, tratamento não ade- quado ou má adesão ao tratamento. Suspeita-se de hipertensão secundária em situações como hipertensão em pacientes jo- vens (< 30 anos) e com elevação severa e súbita da pressão arterial e pacientes que são submeti- dos ao tratamento tradicional para hipertensão e não obtêm melhora (SILVA et al., 2019). As principais causas de hipertensão arterial secundária são divididas em causas endócrinas (hiperaldosteronismo primário, feocromoci- toma, hipotireoidismo e hipertireoidismo, hi- perparatireoidismo primário, Síndrome de Cus- hing, obesidade, acromegalia), não endócrinas (doença renal crônica, hipertensão renovascu- lar, displasia fibromuscular, coarctação de aorta, apneia obstrutiva do sono) e aquelas in- duzidas por substâncias (BARROSO et al., 2021). O diagnóstico e tratamento específicos são direcionados à causa base. CONCLUSÃO A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) é uma condição cuja incidência e prevalência vêm aumentando significativamente com o pas- sar dos anos devido a fatores socioambientais, fisiológicos, entre outros. Apesar do amplo co- nhecimento já obtido acerca dessa doença, no- vos entendimentos a respeito de seus sinais, sin- tomas e os múltiplos desdobramentos sistêmi- cos, a relação entre os níveis pressóricos e o risco cardiovascular, bem como a correta tipifi- cação e diagnóstico quanto aos possíveis fenó- tipos são fundamentais para uma abordagem te- rapêutica adequada e eficiente. Antes de definira forma de tratamento, o profissional da saúde deve se munir de uma anamnese completa, investigando fatores de risco intrínsecos e extrínsecos ao paciente, a presença de outras comorbidades, além de um exame físico preciso e realizado com técnica correta. Por fim, apesar de caber ao médico o seguimento de uma linha de raciocínio indivi- dualizada para cada caso, é preciso reforçar me- didas de eficácia global, como o controle do es- tresse, a realização de exercícios físicos e uma dietética equilibrada, ações que, juntamente com a terapêutica farmacológica, podem garan- tir a estabilização do paciente e melhorar ex- pressivamente sua qualidade de vida. 110 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMODEO, C. et al. Hipertensão arterial sistêmica se- cundária. Brazilian Journal of Nephrology, v. 32, suppl 1, p. 44-53, 2010. BARROSO, W.K.S. et al. Diretrizes Brasileiras de Hi- pertensão Arterial – 2020. Arquivos Brasileiros de Car- diologia, v. 116, n. 3, p. 516-658, 2021. BASILE, J. et al. Overview of hypertension in adults. UpToDate, 2022. 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Inicialmente, podem ser observados sintomas de artrite e de cardite, os quais podem ser bastante severos e levam a uma morbidade significativa do coração, cronificando e culmi- nando na Doença Reumática do Coração (DRC), com acometimento valvar importante. A valva mitral é a mais comumente acometida em cerca de 50 a 60% dos casos (ARVIND & RAMAKRISHNAN, 2020; DASS & KAN- MANTHAREDDY, 2023). A DRC afeta, mundialmente, com mais fre- quência crianças e jovens, devido a alta incidên- cia de faringoamigdalite estreptocócica em pa- cientes de 5 a 18 anos. No Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há cerca de 30 mil casos de febre reu- mática advindas de faringoamigdalite a cada ano, correspondendo a 7 casos a cada 1000 in- divíduos em idade escolar no país. Além disso, as baixas condições socioeconômicas também são fatores relevantes na maior incidência da DRC em países subdesenvolvidos e em desen- volvimento (FIGUEIREDO et al., 2019). Classicamente, o acometimento cardíaco envolve lesões valvares, tipicamente do lado es- querdo do coração, tendo destaque a valvopatia mitral. A doença aórtica isolada ocorre em 2% dos casos, sendo esta mais comum em associa- ção com a valvopatia mitral, e os acometimen- tos da valva tricúspide e pulmonar são mais in- frequentes. Na fase aguda, pode ser observado uma dilatação do ânulo da valva, enquanto que na segunda fase, de aspecto mais crônico, ocorre a estenose valvar, secundário ao pro- cesso de calcificação e de espessamento dos fo- lhetos valvares e do aparato subvalvar, assim como encurtamento das cordas tendíneas. Di- ante disso, o paciente pode apresentar regurgi- tação, resultando, com frequência, em sintomas dispneicos. Porém, miocardite, arritmias e insu- ficiência cardíaca congestiva podem ocorrer (KUMAR et al., 2020; KANMANTHARE- DDY, 2023; LEAL et al., 2019). Os exames complementares para a investi- gação da febre reumática podem ser agrupados em três categorias: Evidência de estreptococos prévios, detecção de alterações laboratoriais de- correntes de processos inflamatórios, caracteri- zação e quantificação dos efeitos morfológicos, funcionais e hemodinâmicos do acometimento cardíaco. Exames laboratoriais devem ser reali- zados para confirmar a etiologia estreptocócica. Embora inespecíficos, os ensaios inflamatórios são úteis para diagnosticar a atividade da do- ença e documentar a regressão na fase aguda. A proteína C-reativa é muito sensível nos estágios iniciais da doença (KUMAR et al., 2020; KAN- MANTHAREDDY, 2023; LEAL et al., 2019). Sob a evidência de DRC, um eletrocardio- grama e uma radiografia de tórax podem ser in- dicados como exames iniciais. O primeiro pode identificar sinais de hipertrofia de átrio es- querdo e ventrículo esquerdo, tipicamente, as- sim como as várias formas de bloqueio atrio- ventricular, do 1° grau até o 3° grau. Nos casos mais severos, até mesmo o padrão de fibrilação atrial pode ser notado. Quanto ao exame radio- gráfico, sinais de cardiomegalia e de congestão pulmonar podem ser vistos, sugerindo falência cardíaca. Vale destacar que resultados normais de ambos exames não descartam a cardite, de- corrente da DRC, pois esses exames apresen- tam baixa especificidade e baixa sensibilidade. Porém, o exame diagnóstico mais preciso con- siste no ecocardiograma. Este possibilita a constatação do grau de severidade da valvopa- 114 tia, mediante análise da morfologia, espessa- mento, mobilidade e grau de calcificação da valva, a determinação de consequências fisioló- gicas, como a hipertensão pulmonar, e planeja- mento de procedimento cirúrgico (KUMAR et al., 2020; KANMANTHAREDDY, 2023; LEAL et al., 2019). Tendo em vista esse contexto apresentado, este capítulo visa discorrer sobre a perspectiva atual da epidemiologia da DRC, dando enfoque nos métodos diagnósticos e na prevalência de tal distúrbio cardíaco no contexto nacional e mundial, suas complicações e fatores de riscos associados. MÉTODO Esse estudo trata-se de uma revisão integra- tiva, realizada no período de janeiro a fevereiro de 2023, buscando-se embasamento na litera- tura a partir da busca de artigos nas bases de da- dos National Library of Medicine (PubMed), originalmente nas línguas Inglesa e Portuguesa, publicados entre os anos de 2019 e 2023, sendo feita uma análise de dados por meio de uma lei- tura exploratória e seletiva de 6 estudos publi- cados diante da busca utilizando-se palavras- chave, como “Rheumatic heart disease”; “Rheumatic disease”; “Epidemiology”; “Diag- nosis”, o que disponibilizou mais de 20.000 es- tudos. Artigos que não tinham como enfoque o acometimento cardíaco diante da febre reumá- tica; ou que não demonstraram informações epidemiológicas relevantes para a escrita deste trabalho foram excluídos. Além disso, foram utilizados livros-texto da Sociedade Brasileira de Cardiologia, bem como documentos elaborados pelo Ministérioda Sa- úde do Brasil e pela Organização Mundial da Saúde (OMS); assim como descrições epidemi- ológicas presentes no Banco de Dados do Sis- tema Único de Saúde - DATASUS. Os resultados do estudo diante da busca e análise de artigos relevantes foram expostos de forma descritiva, sendo subdivididos em dados relevantes acerca da epidemiologia, que quando alinhados com as tabelas para auxílio no diag- nóstico da doença reumática no coração anco- ram a relevância do assunto estudado e da sua importância de reconhecimento no meio mé- dico. RESULTADOS E DISCUSSÃO Epidemiologia A doença reumática do coração continua sendo uma das principais causas de morte pre- venível e de incapacidade em crianças e adultos jovens. Em 2017, foi publicado o Global Bur- den of Disease Study, um relatório global acerca do impacto nacional, regional e global de determinadas doenças, que revelou um declínio mundial da DRC, reduzindo bastante o seu im- pacto na saúde pública. Entretanto, o estudo en- controu níveis persistentemente elevados da do- ença nas regiões mais pobres do mundo, onde a doença permanece endêmica (KUMAR et al., 2020). Além disso, é importante destacar que cerca de 2% das mortes por doenças cardiovasculares no mundo estão relacionadas à DRC, que con- siste na forma mais crítica de doença adquirida do coração entre crianças e adultos jovens, me- nores de 25 anos, de países em desenvolvi- mento. Estes têm maior prevalência dessa en- fermidade, devido, muitas vezes, a um status socioeconômico mais precário, à má nutrição, ao saneamento básico escasso e ao menor acesso aos serviços de saúde. Segundo estudos, em 2015, havia 33,4 milhões de casos de DRC e ocorreram cerca de 305 mil mortes. Destes ca- sos totais, 40% estavam localizados na Índia. Sabe-se também que a prevalência tende a au- 115 mentar com a idade: De 4,7 casos dentre 1000 crianças de 5 anos para 21 casos dentre 1000 adolescentes de 16 anos (DASS & KANMAN- THAREDDY, 2023; LEAL et al., 2019). No Brasil, entre os anos de 2017 e 2021, to- talizaram 33.517 internações por DRC, destes 2.786 evoluíram para óbitos. Quanto à taxa de internações, houve prevalência no sexo femi- nino e na região sudeste, seguida da nordeste (respectivamente, 40,71% e 30,55%). Em rela- ção aos óbitos, a taxa da região sudeste segue o mesmo padrão das internações, enquanto na re- gião nordeste observa-se uma queda de cerca de 5% dos casos que evoluíram para óbito. A incidência da febre reumática aguda e a da sua sequela a longo-prazo, DRC, é baixa em países desenvolvidos, principalmente devido a melhorias nas condições socioeconômicas da população e nos sistemas de saúde e o controle eficiente com Penicilina-G benzatina. Todavia, em alguns países desenvolvidos como a Austrá- lia e a Nova Zelândia, a DRC continua sendo relevante, particularmente em populações indí- genas, o que está diretamente relacionada à po- bre acessibilidade desse povo ao tratamento médico. A maior quantidade de mortes causa- das por DRC foram observadas, em ordem des- cendente, na Índia, China e Paquistão, que fa- zem parte do grupo de países em desenvolvi- mento, onde a doença é desproporcionalmente mais prevalente, em comparação com os países desenvolvidos. Diagnóstico O diagnóstico de DRC é realizado principal- mente por uma análise clínica do paciente com a utilização dos Critérios de Jones, os quais são guidelines desenvolvidas em 1944 e que defi- nem critérios maiores e menores para o diag- nóstico de febre reumática e cardite. Desde seu desenvolvimento foi modificado e revisado re- petidamente, com o intuito de tornar essas dire- trizes mais específicas para o diagnóstico. Em 1992, a American Heart Association (AHA) re- alizou atualizações aos Critérios de Jones, as quais foram a base para os critérios estabeleci- dos pela OMS em 2004. Nessa última guide- line, foram estabelecidos mecanismos para o di- agnóstico tanto de primeiro surto e recidiva de FR, como de coreia de Sydenham, de cardite de início insidioso e de DRC. Os critérios, presentes na Tabela 13.1, esta- belecidos pelas diretrizes são baseados nas ma- nifestações clínicas presentes na FR e divididos em maiores e menores de acordo com a especi- ficidade que a manifestação tem para o diagnós- tico dessa patologia. Nessa perspectiva, os cri- térios maiores são os mais específicos e são ne- cessários para efetivar o diagnóstico de pri- meiro surto de FR e de recidiva em pacientes sem DRC prévia, enquanto os critérios menores são menos específicos e não se consegue reali- zar esses diagnósticos apenas com a análise iso- lada dessas manifestações. Além disso, nesses casos, é necessário evidência de infecção es- treptocócica nos últimos 45 dias. Tabela 13.1 Manifestações dos critérios de Jones modificados Critérios maiores Critérios menores Evidência de infecção estreptocócica há 45 dias Cardite Febre PRi prolongado Coreia de Sydenham Poliartralgia ASO elevado 116 Critérios maiores Critérios menores Evidência de infecção estreptocócica há 45 dias Eritema marginado Leucocitose EβHGA positivo em swab de garganta Nódulos subcutâneos VHS elevada Escarlatina recente Poliartralgia PCR elevada VHS: taxa de sedimentação de eritrócitos; PCR: proteína C-reativa; PRi: intervalo P-R no eletrocardiograma; ASO: antiestreptolisina; EβHGA: estreptococo beta-hemolítico do grupo A. Fonte: World Health Organization. Rheumatic fever and rheumatic heart disease: report of a WHO expert consultation. Geneva: WHO; 2004. Para o diagnóstico de DRC, de acordo com os Critérios de Jones modificados (OMS, 2004) presentes na Tabela 13.2, deve haver a pre- sença de lesões crônicas nas valvas cardíacas, como estenose de valva mitral ou dupla lesão mitral, associada ou não, com valvopatia aór- tica. A identificação precoce da lesão através do rastreio ecocardiográfico é de extrema impor- tância, pois possibilita a realização de uma pro- filaxia mais efetiva, no entanto, essa prática ainda não faz parte das políticas públicas (KU- MAR et al., 2020). Tabela 13.2 Critérios de Jones modificados Categorias diagnósticas Critérios Primeiro surto de FR 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores + Evidência de infecção estreptocócica de grupo A recente Recidiva de FR sem DRC diagnosticada 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores + Evidência de infecção estreptocócica de grupo A recente Recidiva de FR com DRC diagnosticada 2 critérios menores + Evidência de infecção estreptocócica de grupo A recente Coreia de Sydenham Cardite de início insidioso Não é necessário outros critérios ou evidências para o diagnóstico de FR Estenose mitral ou dupla lesão mitral e/ou valvopatia aórtica Não requer critérios adicionais para o diagnóstico de DRC Fonte: World Health Organization. Rheumatic fever and rheumatic heart disease: report of a WHO expert consultation. Geneva: WHO; 2004. CONCLUSÃO Diante disso, por ser uma condição potenci- almente incapacitante e mortal, porém prevení- vel, justifica-se uma atenção maior quando se trata de DRC. Apesar do declínio mundial da prevalência, esta condição permanece com im- pacto considerável nos sistemas de saúde, prin- 117 cipalmente em países de menor desenvolvi- mento econômico. O perfil epidemiológico as- sociado às estratégias diagnósticas são de maior valia para o auxílio médico. Como demons- trado, áreas de menor poderio econômico, de- mograficamente densas, com presença de desi- gualdade social e menor acesso aos serviços de saúde possuem maior prevalência da DRC, in- clusive com maior risco tanto para desfecho fa- tal como cronificação da doença. Além disso, pode-se concluir que o conhe- cimento dos critérios diagnósticos é de suma importância, ao mesclar sinais clínicos e com- plementares, objetivando uma maior especifici- dade. De acordo com os Critérios de Jones, tal especificidade pode ser atingida com auxílio da ecocardiografia,modalidade nem sempre dis- ponível em regiões mais precárias. Portanto, de acordo com os dados apresen- tados, é extremamente necessário amplificar a atenção do sistema de saúde à DRC. Isso pode ser feito por meio da capacitação dos profissio- nais de saúde e de um maior investimento em recursos tecnológicos nas áreas mais afetadas que, de acordo com a epidemiologia, também são as que mais precisam do sistema público de saúde, uma vez que são mais precárias e têm menos acesso a esse sistema. Assim, ao realizar esses investimentos, o diagnóstico da DRC se tornará mais fácil e, portanto, mais precoce, o que poderá trazer maior resolutividade aos ca- sos. 118 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARVIND, B. & RAMAKRISHNAN, S. Rheumatic fever and rheumatic heart disease in children. Indian Journal of Pediatrics, v. 87, n. 4, p. 305–311, 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Banco de dados do Sis- tema Único de Saúde-DATASUS. Disponível em: http://www.datasus.gov.br. Acesso: 18 fev. 2023. CASTRO, I. et al. (ed.). 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Professor de Pós-graduação em Cardiologia Palavras-chave: Tetralogia de Fallot; Crises Hipercianóticas; Fisiopatologia. 120 INTRODUÇÃO As malformações congênitas referem-se a defeitos no desenvolvimento fetal de caráter funcional ou estrutural, presentes antes do nas- cimento. Os defeitos congênitos do coração compreendem um significativo grupo de mal- formações congênitas (MARANGONI et al., 2020). A tetralogia de Fallot (TF) é a cardiopatia congênita cianótica mais frequente e corres- ponde a cerca de 10% de todos os defeitos con- gênitos do coração, além de ser a principal causa de óbito infantil em países de primeiro mundo dentre todas elas. Essa condição é com- posta por um conjunto de quatro alterações ana- tômicas cardíacas, sendo elas: A estenose da ar- téria pulmonar com obstrução do fluxo de saída ventricular direito, comunicação interventricu- lar (CIV), dextraposição aórtica e hipertrofia ventricular direita (MARANGONI et al., 2020). Outras apresentações anatômicas cardí- acas podem estar associadas, como a persistên- cia do canal arterial, comunicação interatrial, comunicação interventricular múltiplas e atre- sia pulmonar, além de anomalias extracardía- cas, como a Síndrome de DiGeorge e Síndrome de Charge (CROTI, 2017; HERDY, 2022; JA- TENE et al., 2021). As anomalias provocam deficiência da oxi- genação sanguínea. O sangue não consegue atingir os pulmões em quantidade suficiente para retornar oxigenado para o átrio e ventrí- culo esquerdo devido a obstrução da via de sa- ída do fluxo do ventrículo direito (VSVD) e ao Shunt direita-esquerda através do CIV. A insa- turação periférica, denominada cianose, é a principal consequência desse desequilíbrio en- tre oferta e demanda de oxigênio, sendo o sin- toma mais prevalente. Outros sinais e sintomas também podem estar presentes como sopro sis- tólico e dispneia (HERDY, 2022; RIBEIRO et al. 2019). Os pacientes com Tetralogia de Fallot fre- quentemente desenvolvem exacerbações paro- xísticas de cianose, também conhecidas como crises hipercianóticas. Apresentam quadro clí- nico distinto e surgem por obstrução completa ou quase completa da VSVD resultando na re- dução abrupta do fluxo pulmonar e em episó- dios paroxísticos de hiperpneia, com estados de agitação ou desidratação. As crises podem cau- sar fraqueza, retardo no crescimento, policite- mia, coagulopatias, convulsão, acidente cere- brovascular, abscesso cerebral e até morte (BARREIRA, 2017; CROTI, 2017; PARK, 2016). Na maioria dos casos as crises hipercianóti- cas são identificadas ainda na infância de forma precoce, entre o segundo e o quarto mês de vida. Ao nascimento, o fluxo pulmonar é ade- quado, porém, dentro das primeiras semanas ou meses de vida, a obstrução da VSVD e o SHUNT direita-esquerda tornam-se evidentes e progressivamente mais severos, com crises gra- dativamente mais graves. Porém, quando a obs- trução VSVD é grave ao nascimento, observa- se cianose já nos primeiros dias de vida, neces- sitando de rápida intervenção (CROTI, 2017; HERDY, 2022; JATENE et al., 2021). Diversos fatores contribuem para o desen- cadeamento das crises hipoxêmicas. A anemia, o aumento do consumo de oxigênio por esforço físico, desidratação, infecções, febre e drogas vasodilatadoras são os mais comuns. Eles tam- bém favorecem o agravamento das crises hiper- cianóticas. E é devido à gravidade dos sintomas que a Tetralogia de Fallot é considerada uma emergência cardiológica, a qual deve ser rapi- damente diagnosticada e tratada (HERDY, 2022; PARK, 2016). 121 Diante disso, o objetivo do capítulo é des- crever sobre os aspectos referentes às crises hi- percianóticas da Tetralogia de Fallot, abor- dando os seus conceitos fisiopatológicos e sintomatológicos. MÉTODO Trata-se de uma revisão integrativa reali- zada no início fevereiro e com término em março, por meio de pesquisas nas principais ba- ses de dados disponíveis, sendo elas: SciELO, PubMed e Biblioteca Virtual em Saúde; além do uso de livros específicos da área de cardio- logia pediátrica. Com o intuito em desenvolver o trabalho, formularam-se etapas para serem seguidas tais como, a definição do tema norteador, os seus critérios de exclusão e inclusão, a procura das informações assertivas para embasamento te- mático com critérios específicos, além da aná- lise e interpretação dos resultados obtidos para a confecção da revisão. Foram utilizados os descritores: Tetralogia de Fallot, Crises hipercianóticas e fisiopatolo- gia. Desta busca foram encontrados 140 artigos, posteriormente submetidos aos critérios de se- leção. Nessa óptica, como critérios de inclusão foram utilizados: Idioma, sendo selecionados artigos em português e inglês; o período, que foi delimitado de 2016 a 2023; os tipos de estudos, revisão bibliográfica e relato de caso; e por fim, artigos que atendessem a temática proposta para esta pesquisa. Os critérios de exclusão foram: Embasados em publicações inferiores a 2016, que não abordavam diretamente a proposta es- tudada e que não atendiam os demaiscritérios de inclusão. Após critérios de seleção restaram 11 arti- gos e 3 livros que foram submetidos a leitura minuciosa para coleta de dados. Os resultados foram apresentados em forma descritiva, divi- dindo em categorias abordando: Conceito, sin- tomatologia, diagnóstico, crises hipercianóticas e estenose pulmonar. RESULTADOS E DISCUSSÃO A Tetralogia de Fallot, cardiopatia rara, é a mais comum na pediatria, composta por um conjunto de malformações durante o desenvol- vimento fetal causadas principalmente por fato- res genéticos (dentre eles as anomalias cromos- sômicas) tendo vários níveis de gravidade, po- dendo inclusive causar o óbito neonatal (QUIN- TÃO, 2018) A estenose pulmonar (estreitamento da vál- vula semilunar pulmonar), comunicação inter- ventricular (defeito do septo interventricular), hipertrofia do ventrículo direito (por sobrecarga de atividade) e o dextroposição da aorta (desvio aórtico para a direita) são os quatro defeitos congênitos que caracterizam a tetralogia. Esses defeitos interligam-se devido ao acúmulo de lí- quido no ventrículo direito e sua ejeção para a circulação pulmonar é prejudicada pela este- nose da válvula pulmonar acarretando um au- mento da contração do ventrículo direito, ten- tando vencer a resistência da estenose, entre- tanto, com a comunicação entre os ventrículos, há o fluxo de sangue desoxigenado para a cavi- dade cardíaca esquerda, apesar das cavidades da parte esquerda do coração apresentarem alta pressão interna não há grande desvio sanguíneo para a direita devido à hipertrofia do ventrículo direito e estenose pulmonar, não havendo o re- fluxo de grande volume do sangue da parte es- querda cardíaca desoxigenada para a parte di- reita cardíaca oxigenada (QUINTÃO, 2018; MAGOON et al., 2022). Esses fatores fazem com que ocorram mu- danças circulatórias pois ocasionam um shunt para a esquerda gerando algumas sintomatolo- gias encontradas na cardiopatia como: Cianose, 122 dispneia durante a amamentação e defecação, déficit de crescimento e crises hipercianóticas. Dentre elas, os sinais mais importantes são a dispneia e a cianose que repercutem bastante durante a amamentação por acarretar dificul- dade de ganho de peso, aumento do número de eritrócitos (policitemia), baqueteamento digital e hipóxia (QUINTÃO, 2018). A saturação do oxigênio é o parâmetro prin- cipal de avaliação da gravidade da cardiopatia, sendo o principal causador da cianose a este- nose da artéria pulmonar, gerando o shunt da direita para a esquerda. A posição de cócoras (postura abaixada com braços para frente, pés apoiados no solo e coluna ereta) auxilia na me- lhora do quadro de hipóxia por aumentar a re- sistência vascular sistêmica, aumentando a pressão no ventrículo esquerdo para bombear mais sangue para a aorta. O aumento dessa pressão faz com que o shunt direita esquerda mude e o sangue passa a ser forçado a vencer a estenose da valva pulmonar e chegue aos pul- mões, aumento assim, de forma considerável, a oxigenação sanguínea e melhorando os sinto- mas de hipóxia causados pelas atividades de es- forço (QUINTÃO, 2018). A crise hipercianótica ou crise de hipóxia tem natureza súbita e ocorre frequentemente ao despertar, com uma duração estimada entre 15 e 60 minutos, sendo composta por sintomas como taquipneia, cianose bem evidente e possí- veis alterações de consciência como irritabili- dade ou síncope. Dessa forma, seu acompanha- mento é de extrema relevância já que tais crises podem ter como consequência danos cerebrais ou até mesmo causar o óbito da criança (QUIN- TÃO, 2018). A Tetralogia de Fallot é um conjunto de de- feitos congênitos que causam a cianose e até crise de hipoxemia. Quando um paciente, prin- cipalmente recém-nascidos, apresentam es- forço respiratório e cianose, é extremamente re- comendado que seja submetido a uma investi- gação minuciosa, podendo fazer uso de exames complementares para confirmação da hipótese diagnóstica, avaliando a gravidade da patologia e podendo tratar de forma correta e rápida, ex- cluindo ainda os diagnósticos diferenciais (ou- tras possíveis cardiopatias) (QUINTÃO, 2018). Dentre os exames a serem solicitados incluem: -Ecocardiograma - Exame mais preciso para avaliar os defeitos morfológicos da Tetralogia de Fallot, onde pode ser visualizado com preci- são a localização e tamanho da comunicação in- terventricular, a gravidade da estenose da arté- ria pulmonar medindo o seu espessamento, o posicionamento da artéria aórtica e por fim, mas não menos importante, a localização das arté- rias coronarianas, para evitá-las durante o trata- mento cirúrgico. Pode ser usado inclusive para verificar outras alterações cardíacas associadas. O diagnóstico definitivo é geralmente estabele- cido pela ecodopplecardiografia bidimensional - padrão ouro (QUINTÃO, 2018). -Radiografia - Para ilustração da área cardíaca e pulmonar com possíveis achados de imagem de bota por hipertrofia de ventrículo direito, fluxo pulmonar reduzido, artérias pulmonares distendidas (por folhetos rudimentares da valva pulmonar) e mais raramente dextrocardia com possibilidade de situs inversus (inversão da anatomia corporal) (QUINTÃO, 2018). -Eletrocardiograma (ECG) - Para detectar pos- síveis arritmias bem como também a sobre- carga cardíaca, sendo constatado quando há desvio do eixo QRS para a direita (entre +90º e +150º) somado a hipertrofia do ventrículo di- reito (Ondas S predominantes em V6 e Ondas R predominantes em V4R e V1) (QUINTÃO, 2018). -Cateterismo cardíaco - Apesar de ser um exame bastante eficaz é invasivo para recèm- 123 nascidos, porém é escolhido quando o ecocar- diograma não for satisfatório, usa-se para exa- minar a estenose pulmonar ou melhor compre- ensão da localização das artérias coronárias como também é apresentado shunt direita-es- querda no exame (QUINTÃO, 2018). -Ressonância Magnética (RM) - É importante tanto no pré quanto no pós-operatório já que no pré pode ser observado as artérias pulmonares centrais e colaterais sistêmico pulmonares, e no pós-operatório para revelar complicações pro- venientes da cirurgia como o refluxo (regurgi- tação) causando a insuficiência pulmonar (QUINTÃO, 2018; KOZAK, 2021). Normalmente a morfina é usada para seda- ção de pacientes com crises hipercianóticas, po- rém, há a possibilidade de ser usado a dexme- detomidina para estas crises, onde o agonista dos receptores alfa2-adrenérgicos do sistema nervoso central provoca um efeito sedativo por diminuição do fluxo simpático central. Já que a morfina causa literalmente dilatação arterial e venosa acarretando paradoxalmente aumento da cianose além de afetar a respiração aumen- tando o risco de apnéias repetitivas como de su- pressões respiratórias atrasadas, no entanto a dexmedetomidina não tem efeito direto na res- piração assim efeitos adversos respiratórios são poucos e mínimos, por este motivo há efeitos benéficos na utilização pelo maior risco de ins- tabilidade respiratória dos recém-nascidos (DE MEDEIROS OLIVEIRA et al., 2021). Os estudos revelam que as crianças que pas- saram por procedimento cirúrgico corretivo da patologia com o fechamento da comunicação interventricular e desobstrução da estenose da artéria pulmonar, com idade variando de 1 a 11 meses (média: 7,2 meses) e pesando entre 4 a 10 quilos (média: 7,1 kg), quando em compara- ção com crianças maiores, foi constatado que o quanto antes a correção for possível de ser rea- lizada, melhor é o prognóstico dessa criança, tendo baixa morbidade mortalidade e bem como também bons resultados tardios por res- taurar precocemente a fisiologia normal do co- ração, restabelecendo a circulação e elevando a saturação arterial de oxigênio poupando a hipo- xemia de órgãos alvos e o seu regular desenvol- vimento. Para a realização da cirurgia foi ado- tado a circulação extracorpórea convencional com oxigenador de membrana e hipotermia moderada (25ºC), com proteção miocárdicapor infusão na aorta de solução cardioplégica cris- talóide gelada e hipotermia tópica do coração. A via utilizada com maior frequência é a trans- ventricular, enquanto que a via atriopulmonar é pouco utilizada (DE MEDEIROS OLIVEIRA et al., 2021). Para pacientes sintomáticos que não são ele- tivos cirurgicamente por terem má anatomia e baixo peso ao nascimento, o uso do implante de stent na via de saída do ventrículo direito - VSVD para sua desobstrução tem se mostrado um procedimento promissor para o tratamento da sintomatologia da tetralogia de Fallot, tendo uma taxa de óbito de 33%, podendo ser um ca- minho promissor para tratamento (KUPAS, 2021; CHAMIÉ, 2021). CONCLUSÃO A Tetralogia de Fallot é uma cardiopatia congênita cianótica, que impede a realização correta das trocas gasosas, e por conseguinte, leva a uma cianose. Em casos graves, as crises hipercianóticas, que são episódios súbitos de hi- póxia, podem levar à convulsões, crises de ta- quipneia, alteração de consciência, síncopes e até mesmo ao óbito do lactente. Uma crise hipercianótica, pode ser desenca- deada tanto por queda na saturação de oxigênio, quanto por diminuição da resistência vascular periférica. Ocorre principalmente ao despertar 124 pela manhã, e pode ocorrer também durante a amamentação e choros. Por ser potencialmente letal, trata-se de uma emergência cardiológica, que deve ser rapidamente diagnosticada. Após feito o diagnóstico, é necessário que seja feita avaliação de qual o melhor método te- rapêutico para aquele paciente. É primordial que o tratamento seja feito no primeiro ano de vida do paciente, para garantir uma melhor qua- lidade de vida à criança. 125 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARREIRA, M.C. Tetralogia de Fallot – Um Desafio Multidisciplinar. Universidade de Lisboa. Dissertação de Mestrado. 2017. Chamié F. 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TCC (Graduação) - Curso de Residência Médica, Comissão de Residência Médica do Hospital do Servidor Público Municipal, São Paulo, 2018. 126 10.29327/5198921.7-15 CAPÍTULO 15 TRANSPOSIÇÃO DE GRANDES ARTÉRIAS VICTOR MOTA MACIEL¹ AMANDA ARLETE GURGEL DO AMARAL BACELLAR2 RAYANE DA SILVA SOUZA2 RAMYLE DA SILVA SOUZA2 LUANA COSTA RIBEIRO2 1Discente – Bacharelado em Medicina do Centro Universitário Aparício Carvalho 2Discente – Bacharelado em Medicina do Centro Universitário São Lucas Palavras-chave: Transposição de grandes artérias; Neonatologia; Aorta. 127 INTRODUÇÃO A transposição das grandes artérias (TGA) é uma cardiopatia congênita cianótica na qual há discordância ventrículo-arterial, de modo que a aorta se origina do ventrículo direito e a artéria pulmonar do ventrículo esquerdo. As- sim, as circulações sistêmica e pulmonar dis- põem-se em paralelo (COHEN, 2020). A trans- posição é a anomalia cardíaca cianótica mais comum diagnosticada na primeira semana de vida, representando 5-7% de todas as cardiopa- tias congênitas. Ademais, a patogênese da transposição das grandes artérias envolve um defeito embriológico por falha do septo aortico- pulmonar em espiralar (SZYMANSKI, 2022). Eventualmente, o médico pode estar suspei- tando de TGA quando o recém-nascido apre- senta baixa oxigenação no sangue, especial- mente quando evoluem rapidamente com clí- nica de insuficiência cardíaca. O exame diag- nóstico mais indicado é o ecocardiograma, no qual evidencia a transposição dos grandes vasos e outras condições anômalas associadas. O ca- teterismo cardíaco também pode ser utilizado, pois os pacientes com diagnóstico de TGA po- dem apresentar variações anatômicas, princi- palmente no ponto de inserção das artérias co- ronárias. A radiografia de tórax pode demons- trar aumento das câmaras cardíacas, no entanto não é tão específico quanto o ecocardiograma (SZYMANSKI, 2022). Enquanto isso, o tratamento da TGA é cirúr- gico, que quando bem executado pode propor- cionar um aumento da sobrevida. Uma das prin- cipais dificuldades da TGA é a presença de va- riações anatômicas concomitantes, sendo im- portante afirmar a importância da experiência e a qualificação do cirurgião cardiovascular, as- sim como é imprescindível a atuação de um bom ultrassonografista. O objetivo deste capítulo foi denotar a im- portância do diagnóstico da TGA em parelho com o tratamento. MÉTODO O presente trabalho trata-se de uma revisão de literatura, baseada em pesquisas realizadas nas bases de dados PubMed e Dynamed. Para isso, foram utilizados os descritores: Transposi- tion of the great arteries; Congenic cardiopatics; Aorta; Pediatrics. Através dessa busca foram selecionados doze artigos que se enquadravam nos descritores pré-estabelecidos e no tema desse presente trabalho. Foram utilizados como critérios de inclusão, artigos publicados na língua inglesa e portu- guesa dentro de um período entre 2014 a 2023, além disso foram incluídos estudos que se en- quadravam nas seguintes categorias: Relato de caso, metanálise e revisão de literatura. Os critérios de exclusão foram artigos que abordavam outras cardiopatias congênitas e pa- tologias cardiovasculares que não enquadravam no tema proposto, pois tais artigos não foram considerados pertinentes para acréscimo no presente estudo. Após a aplicação de todos os critérios, os artigos foram analisados detalhada- mente para a coleta dos dados utilizados nesse presente estudo. Os resultados foram dispostos de forma descritiva divididos em morfologia da transposição das grandes artérias, diagnóstico e pré-natal na atualidade, importância do diagnóstico precoce e tratamento. RESULTADOS E DISCUSSÃO Morfologia da transposição das grandes artérias A transposição das grandes artérias (TGA) é uma doença cardíaca congênita (DCC) que apresenta uma morfologia na qual a aorta se ori- 128 gina do ventrículo direito e o tronco pulmonar do ventrículo esquerdo, na TGA completa (D- TGA) há uma conexão ventrículo atrial associada a situs solitus e conexão atrioventricular (AV) concordante, fato que gera o estabelecimentodas circulações sistêmica e pulmonar funcionando em “paralelo”. Todavia, a TGA (Figura 15.1) também pode se apresentar com a conexão ventrículo atrial discordante, sendo chamada de transposição corrigida congênita (L-TGA) (FRESCURA & THIENE, 2016). Além disso, há também alterações no septo interventricular que se apresenta com uma curvatura anormal, podendo haver outras alterações como as anomalias coronarianas, que tornam a TGA complexa (VALENZUELA et al., 2020). Devido a configuração anatômica dessa doença cardíaca congênita, o sangue desoxigenado das veias cava superior e inferior drena para as câmaras direitas e a aorta. Enquanto na circulação pulmonar, o sangue oxigenado das veias pulmonares drena para as câmaras esquerdas e o tronco pulmonar. Essas alterações presentes na D-TGA são bem toleradas a vida fetal, porém após o nascimento, a menos que haja alguma comunicação entre os lados esquerdo e direito, como a persistência do canal arterial, essa circulação é incompatível com a vida (CANAN et al., 2021). Figura 15.1 TGA – Situs Sollitus Atrial Fonte: FRESCURA & THIENE, 2016. Diagnóstico pré-natal na atualidade Atualmente, a taxa de detecção pré-natal de TGA melhorou de forma significativa, porém ainda permanece abaixo de 50% (ESCOBAR- DIAS et al., 2015). Com o avanço de novas tec- nologias, como a ultrassonografia/eco-cardio- grafia tridimensional (3D) e quadridimensional (4D), houve melhora no diagnóstico e a avalia- ção de muitas doenças cardíacas congênitas (DCCs). Contudo, mesmo diante desses avan- ços, a transposição simples das grandes artérias (TGA) é comumente subdiagnosticada in útero (VALENZUELA et al., 2020). As diretrizes para exames de triagem cardí- aca fetal e programas de treinamento possuem potencial para melhorar as taxas de detecção de doenças cardíacas congênitas (DCC) (VA- LENZUELA et al., 2020). As recomendações de várias sociedades de ultrassom pré-natal se modificaram ao longo do tempo, havendo em 2013 a incorporação da visão da via de saída (OTV) no exame de triagem cardíaca fetal em conformidade com as diretrizes do American 129 Institute of Ultrasound in Medicine e da World Association of Perinatal Medicine. Desse modo, é essencial o aprimoramento educacio- nal para que haja um desempenho consistente e interpretação precisa do OTV para detecção pré-natal das doenças congênitas, dentre as quais pode-se destacar a TGA (ESCOBAR- DIAZ et al., 2015). Classicamente, o diagnóstico fetal da TGA é baseado na identificação da bifurcação da ar- téria pulmonar, que origina-se no ventrículo posterior (VE). No entanto, é difícil a visualiza- ção dos ramos da artéria pulmonar na via de sa- ída do VE, contribuindo assim para a perma- nência do desafio atual do diagnóstico pré-natal de TGA. Este caso ocorre especialmente em pa- cientes com TGA simples, cujo corte de quatro câmaras parece normal, sendo sugerida a reali- zação de uma cuidadosa avaliação da via de sa- ída do ventrículo esquerdo. Diante disso, atual- mente, há uma variedade de marcadores ultras- sonográficos importantes envolvendo as vias de saída do coração, dentre os quais se encontram a identificação de dois vasos em vez de três na visão traqueal de três vasos: “Sinal dos três va- sos” (VALENZUELA et al., 2020). Contudo, o encontro desse sinal não é pato- gnomônico, visto que é observado também em fetos com tronco arterial comum e em algumas formas de dupla via de saída. Consequente- mente, achados ultrassonográficos adicionais têm sido usados para melhorar o diagnóstico de TGA em fetos, sendo a curvatura convexa para a direita da saída do VD referida como o “Sinal bumerangue” (Figura 15.2), um novo marca- dor mais precoce, fácil e confiável de TGA. Além desse sinal, a presença de vaso longo (aorta) originando-se do VD “em forma de I” também foi apontado como um sinal que deve aumentar a suspeita clínica de TGA durante exames ultrassonográficos de rotina, sendo uma ferramenta importante no diagnóstico de TGA (VALENZUELA et al., 2020). Figura 15.2 Sinal do bumerangue na ecocardiográfia fe- tal Fonte: VALENZUELA et al., 2020. Importância do diagnóstico precoce A realização de um diagnóstico pré-natal possibilita a centralização do parto dos neona- tos portadores de TGA em locais com nível de complexidade adequado para o gerenciamento ideal da DCC apresentada (HAUTALA et al., 2020). Assim, o diagnóstico pré-natal da TGA possui benefícios significativos contribuindo para melhores condições de pré-operatório e re- sultados cirúrgicos. Além disso, pode estar as- sociado a redução do custo de cuidados ao pos- sibilitar um manejo ideal e um menor tempo de internação, apesar de em muitos locais com pouco recurso esse diagnóstico é dificultado (KUNDE et al., 2021). Escobar-Diaz et al., (2015) em seu estudo de 20 anos, constatou que apenas 5% dos paci- entes com diagnóstico pós-natal nasceram em uma unidade obstétrica especializada, sendo os pacientes desse grupo internados no centro car- díaco em média 1 dia mais tarde do que os do grupo pré-natal. Ademais, os pacientes diag- nosticados no pré-natal tiveram menor probabi- lidade de necessitar de ventilação mecânica e ti- veram uma septostomia atrial por balão (BAS) realizada mais cedo (ESCOBAR-DIAZ et al., 130 2015). O resultado neonatal se mostrou melhor em bebês nascidos em centros especializados em relação aos nascidos em maternidades lo- cais, tendo em vista a menor mortalidade em bebês nascidos em centros especializados. Em adição, o diagnóstico pré-natal mostra-se rela- cionado a correção cirúrgica precose, apesar de não haver diferença significativa na mortali- dade pós-operatória (KUNDE et al., 2021). Nos pacientes com TGA que sobrevivem até a idade adulta nota-se a prevalência de mor- bidades neuropsicológicas e psiquiátricas leves a moderadas de longo prazo, sendo descrito por estudos um fenótipo comportamental e neuro- desenvolvimental comum associado ao d - TGA. Isto se apresenta em crianças por defici- ências em áreas relacionadas a habilidades mo- toras visuais, espaciais e finas, funcionamento executivo, velocidade de processamento e cog- nição social. Além disso, pode haver com o en- velhecimento a piora dos déficits nas habilida- des cognitivas de ordem superior, problemas no ajustamento psicossocial e uma taxa maior do que o esperado de transtornos psiquiátricos, como transtorno de déficit de atenção e hipera- tividade, depressão e ansiedade (KASMI et al., 2017). As taxas mais altas de problemas de neuro- desenvolvimento em crianças após a correção da TGA possui como principal explicação a ocorrência de complicações hipóxicas que ocorrem antes e durante a cirurgia, sendo me- lhores resultados neurocognitivos obtidos em crianças cujo diagnóstico se deu no período pré- natal. Este fato está atribuído à oferta de cuidados pré-cirúrgicos otimizados com o diag- nóstico precoce e ao manejo em parte compro- metido nos lactentes com um diagnóstico pré- natal, nos quais nota-se uma incidência maior de hipóxia, fechamento do ducto arterial e dis- função renal (VELZEN et al., 2015). Na maio- ria dos relatórios é documentada a existência de correlação entre eventos perioperatórios, como acidose, circulação extracorpórea prolongada, hipoxemia significativa, baixo débito cardíaco e as alterações no neurodesenvolvimento (VIL- LAFAÑE et al., 2014). Por fim, avaliando a detecção pré-natal e as taxas de mortalidade e morbidade no primeiro ano após o nascimento, o diagnóstico precoce de TGA está associado a menor uma taxa de mortalidade na avaliação de múltiplos indica- dores objetivos da gravidade da doença (VEL- ZEN et al., 2015). Tratamento No que se refere ao manejo inicial, é funda- mental garantir a oxigenação adequada do paci- ente com D-TGA para melhores prognósticos (SZYMANSKI et al., 2022). Sendo assim, a te- rapia com prostaglandina E1 (PGE1) intrave- nosa, que é umpotente vasodilatador, ajuda a estabilizar os pacientes abrindo e mantendo a desobstrução do canal arterial, aumentando o fluxo sanguíneo pulmonar e melhorando a cir- culação sistêmica. Porém, se o forame oval do paciente tiver uma abertura pequena, a PGE1 vai causar um aumento no retorno sanguíneo ao átrio esquerdo, podendo fechar o forame oval. Posto isto, a mistura interatrial vai ser insufici- ente, dificultando a oxigenação adequada e ele- vando a pressão arterial esquerda. A PGE1 pode causar vasodilatação periférica considerável e em seguida uma hipotensão. Já que é uma mo- lécula pró-inflamatória, pode causar febre, leu- cocitose e edema tecidual, devendo assim ser utilizada com precaução e monitoração fre- quente dos pacientes (SÉGUÉLA et al., 2017). Além disso, nos casos em que o forame oval tiver uma abertura pequena é necessário ampliar ou criar uma comunicação interatrial bidirecional realizado pelo procedimento de 131 septostomia atrial por balão (BAS). O BAS consiste na ruptura do septo atrial através da passagem de um cateter insuflado com a ponta de balão do átrio esquerdo para o direito atra- vés do forame oval. Esta manobra é realizada em unidade de terapia intensiva sob orientação ecocardiográfica e em laboratório de catete- rismo cardíaco sob orientação fluoroscópica (SÉGUÉLA et al., 2017). Visto que o paciente está hemodinamica- mente estável, é realizado o tratamento cirúr- gico de forma precoce, uma vez que a cirurgia tardia está associada a maior taxa de mortali- dade, sendo que alguns autores consideram que a partir da idade > 3 semanas, o paciente corre maior risco de ficar em ventilação mecâ- nica, prolongando sua internação hospitalar (SÉGUÉLA et al., 2017). Portanto, o reparo cirúrgico da d-TGA geralmente é realizado na primeira semana de vida, existindo atualmente dois procedimentos cirúrgicos comumente usados, a operação de troca artérias (ASO) e o procedimento de Rastelli (SZYMANSKI et al., 2022). A ASO é o procedimento padrão para os pacientes com d-TGA sem estenose pulmonar importante, que consiste em transeccionar o tronco pulmonar e a aorta, translocando-as para suas posições anatomicamente corretas. Ocorre também a reimplantação das artérias coronárias no trono aórtico e se um VSD esti- ver presente, também será reparado nesse mo- mento (SZYMANSKI et al., 2022). Já o pro- cedimento de Rastelli é realizado em paciente que apresentam d-TGA, um grande VSD e es- tenose pulmonar. Ele consiste em fechar o VSD usando um defletor, que vai fazer com que o sangue oxigenado do ventrículo es- querdo seja direcionado para a aorta, sendo ou- tro colocado no ventrículo direito para a artéria pulmonar, desviando o sangue desoxigenado para a artéria pulmonar (SZYMANSKI et al., 2022). Após a realização destes procedimentos, a sobrevida de um paciente na idade adulta é co- mum e o risco de reoperação é baixo. Porém, a reparação cirúrgica tem consequências por toda a vida do paciente, como estenose neopul- monar, regurgitação neoaórtica, dilatação da raiz neoaórtica e doença arterial coronariana, exigindo assim uma vigilância médica contí- nua (VILLAFAÑE et al., 2014). CONCLUSÃO Portanto, é válido ressaltar que a transposi- ção de grandes artérias (TGA) é uma cardiopa- tia congênita crítica, a qual necessita de um di- agnóstico precoce no período do pré-natal, com o intuito de evitar cianose extrema, hipóxia pro- gressiva, acidose e óbito do paciente. Deste modo, o diagnóstico realiza-se substancial- mente durante a triagem cardíaca fetal, por meio da ultrassonografia e do ecocardiograma. Como resultado, pode-se ter um parto planejado alinhado a um devido manejo perinatal, redu- zindo assim a morbimortalidade fetal. Acerca do tratamento da TGA, nota-se que a realização da operação de troca arterial (ASO) ou do procedimento de Rastelli evidencia bons resultados e maior sobrevida no período pós- operatório. Ademais, a septostomia atrial por balão (BAS) e a terapia com prostaglandina E1 (PGE1) intravenosa são técnicas também utili- zadas no manejo terapêutico da transposição de grandes artérias. Por fim, faz-se necessário que a equipe de saúde tenha treinamento e capacitação para o diagnóstico e conduta mais adequada, princi- palmente em casos de instabilidade hemodinâ- mica. Além disso, é imprescindível fornecer educação à família acerca da TGA, tanto no pré-operatório como no pós-operatório e alta. 132 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COHEN, M.S. et al. Diretrizes de multimodalidade de imagem em pacientes com transposição das grandes ar- térias: Relatório da Sociedade Americana de Ecocardio- grafia desenvolvido em colaboração com a Sociedade de Ressonância Magnética Cardiovascular e Sociedade de Tomografia Computadorizada Cardiovascular. Arquivo Brasileiro de Cardiologia, v. 33, n. 1, e000AE1, 2020. CANAN, A. et al. Multimodality imaging of transposi- tion of the great arteries. Radiographics, v. 41, n. 2, 2021. ESCOBAR-DIAZ, M.C. et al. Prenatal diagnosis of transposition of the great arteries over a 20-year period: Improved but imperfect. 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Journal of American College of Cardiology, v. 64, n. 5, p. 498-511, 2014. 133 10.29327/5198921.7-16 CAPÍTULO 16 O MANEJO AO INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO (IAM): UMA REVISÃO DE LITERATURA NAILLA BYATRIZ SILVA DE MORAIS¹ ANDERSON ALMEIDA ROSA¹ GABRIEL DA SILVA SOUSA¹ HEVERSON PACHECO PONTES¹ ISRAEL MUKUNA KADIATA¹ JEISSICA LUANY DOS ANJOS SEABRA² JOSÉ PEREIRA NETO¹ JOÃO VICTOR LOBO OLIVEIRA PEREIRA³ JOÃO DE SOUZA GOMES JUNIOR¹ KANYSLAN VALADÃO NETO NUNES¹ LUCAS GUILHERME MEDEIROS E SILVA¹ LARISSA CRISTINA SOARES SANTOS³ MAYKON LEAL BRANDÃO¹ RODRIGO ARISON BARBOSA RIBEIRO¹ RAYANE GONÇALVES DOS SANTOS4 1Discente - Medicina na Universidade Federal do Pará (UFPA) 2Discente - Nutrição na Universidade Federal do Pará (UFPA) 3Discente - Enfermagem na Universidade Estadual do Pará (UEPA) 4Discente - Medicina Veterinária na Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) Palavras-chave: Ataque cardíaco; Cardiologia; Infarto agudo do miocárdio. 134 INTRODUÇÃO Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) e condições econômicas A alta mortalidaderelacionada a doenças cardiovasculares tem gerado grande impacto econômico e social em todo o mundo e uma constante preocupação em compreender os principais fatores desencadeantes. Dentre as di- versas causas relacionadas pode se destacar o tabagismo, dislipidemia, hipertensão arterial (HA), obesidade, diabetes e o sedentarismo (DATTOLI-GARCÍA et al., 2021). Tais fato- res, por sua vez, estão intimamente atrelados ao hábito de vida da população. Logo, é ampla- mente conhecido que a adesão aos hábitos de vida mais saudáveis, como parar de fumar, a prática regular de atividade física e a alimenta- ção saudável contribuem fortemente para diri- mir a incidência de tais complicações na saúde. Em adição a isso, podemos destacar a condição socioeconômica como um dos fatores prepon- derantes ao surgimento das doenças cardiovas- culares (BRANT & PASSAGLIA, 2022). O Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) tem se configurado uma das principais causas de morte na população ao longo das últimas déca- das, tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, entretanto, o perfil epidemio- lógico mundial tem apresentado importantes mudanças nesse cenário, já que nações em que a população dispõe de renda mais elevada apre- sentaram diminuição progressiva no número de óbitos por Doenças Isquêmicas do Coração (DIC), enquanto que em países de renda inferior essa redução não foi observada (BRANT & PASSAGLIA, 2022). Desse modo, é funda- mental levar em consideração fatores de risco mais amplos e complexos, como sociais, cultu- rais, econômicos e políticos, e como tais fatores são capazes de afetar a saúde cardiovascular da população. No Brasil, essa disparidade pode ser obser- vada entre as regiões, uma vez que a partir do início do século XXI houve uma elevação das mortes relacionadas a fatores cardiovasculares nas regiões norte e nordeste do país, com res- pectiva diminuição nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste (FERREIRA et al., 2020; TIMÓ- TEO, 2021). Dessa forma, pode-se afirmar que condições clínicas como IAM são entendidas e determinadas por fatores que refletem a escola- ridade, condições de trabalho e acesso à saúde, e que indicadores como renda per capita são fa- tores condicionantes para o IAM. Reperfusão miocárdica precoce: Uma ob- tenção de melhores prognósticos A prevalência de mortes causadas por IAM, e das complicações causadas durante a fase aguda da doença, faz com que haja a necessi- dade de novas abordagens terapêuticas para o tratamento. A reperfusão miocárdica precoce demonstra-se como uma abordagem interes- sante para a redução das taxas de mortalidade, garantido melhores prognósticos aos pacientes. O uso da reperfusão precoce com intervenção coronária percutânea primária (ICPP) é reco- mendada segundo as Diretrizes Nacionais e In- ternacionais para pacientes internados que apre- sentaram os sintomas de IAM com intervalo de até 12 horas (OLIVEIRA et al., 2021; CORBA- LÁN, 2021). Para garantir maiores taxas de sucesso dessa abordagem, a reperfusão miocárdica precoce é acompanhada de uma estratégia fármaco-inva- siva prévia, sendo ela a trombólise (TL) com Tenecteplase (fármaco indicado para o trata- mento trombolítico do IAM), tendo sua dose ajustada de acordo com o peso e idade do paci- ente e administrada nas primeiras 4 horas após o início do quadro clínico. Essa etapa minimiza as complicações que podem ser causadas pelo 135 IAM, e em seguida o paciente poderá ser enca- minhado para dar início à intervenção coronária percutânea em um centro especializado (COR- BALÁN, 2021). O tratamento com reperfusão após a TL em centros especializados demonstrou redução nas incidências de complicações causadas pelo IAM. O choque cardiogênico, por exemplo, teve sua prevalência reduzida para 6,1% entre 2005 e 2017, quando comparado à antiga taxa de 7,0%. Essa porcentagem de 6,1% representa uma ligeira redução, porém demonstra que a aplicabilidade do procedimento traz resultados positivos (CORBALÁN, 2021). No Brasil, os resultados para as demais complicações prove- nientes do IAM (isquêmicas, embólicas, peri- cárdicas) após a aplicação do procedimento são escassos, o que demonstra a falta ou insuficiên- cia de dados para compor uma base de estudo eficiente de pacientes que foram submetidos ao ICP, dificultando a criação de um índice de con- fiança suficiente para garantir o consentimento dos pacientes para a realização do tratamento (ALVES & POLANCZYK, 2020). O diagnóstico precoce feito pela equipe de saúde é fundamental para garantir o tempo ideal para a reperfusão e a eficácia da terapia, redu- zindo a necessidade de centros não-especializa- dos transferirem o paciente, o que atrasa o tra- tamento. Para isso, é necessário que as equipes de saúde dos hospitais sejam treinadas para atuar nos serviços de emergência com eficiên- cia para evitar o diagnóstico tardio do IAM, ga- rantido o manejo do paciente para o tratamento por ICP em tempo hábil, proporcionando o me- lhor prognóstico para os pacientes e a redução da taxa de mortalidade (ALVES & POLAN- CZYK, 2020). Como o tratamento tardio do quadro de IAM afeta a sobrevida do paciente? O intenso avanço da tecnologia e a fácil acessibilidade a informações, a nível global, proporcionam à sociedade uma melhor percep- ção e entendimento sobre as doenças cardiovas- culares, sobretudo as que acometem o homem contemporâneo em consequência de seus hábi- tos. Apesar disso, é possível associar a alta in- cidência de infarto agudo do miocárdio (IAM) com o desconhecimento dos pacientes acerca da natureza da doença, além de fatores socioeco- nômicos que influenciam a capacidade destes indivíduos de manejar sua condição de forma melhorada e, principalmente, a tratar precoce- mente (KHALFALLA et al., 2022). O tempo, portanto, vem a ser um fator prog- nóstico crítico em indivíduos que sofrem de dor torácica, em específico o período entre o início dos sintomas no paciente e o momento em que é realizada a chamada para um centro de emer- gência (LAPOSTOLLE et al., 2021). Levando em consideração pacientes com apresentação tardia (>12-24 horas) afetados por IAM e que relataram início de dor torácica no horário no- turno, é possível compreender a relação intrín- seca do desconhecimento com o tempo ade- quado para o tratamento eficaz da enfermidade: Se caso estes pacientes tivessem ciência da na- tureza do IAM, eles teriam chamado por uma ambulância ainda no período da noite para se- rem encaminhados ao hospital e realizarem a revascularização precoce por ICPP, evitando maiores complicações relacionadas ao sistema cardiovascular, ao invés de somente aguarda- rem em suas residências para recorrer à auxílio médico pela manhã. Em decorrência disso, notou-se maior nú- 136 mero de óbitos entre os indivíduos que se apre- sentam tardiamente no hospital em comparação aos que recorrem ao atendimento nas primeiras horas em que apresentaram os sintomas, além de maiores danos no músculo cardíaco expres- sos pelo marcador CK-MB (KHALFALLAH et al., 2022). Desta forma, percebe-se o impacto da desinformação por parte dos enfermos refle- tida na relutância em buscar ajuda médica du- rante a noite, além de outras motivações, como a distância da morada dos pacientes em relação à área de abrangência hospitalar, o que pode re- tardar, também, o tempo para o atendimento ne- cessário (FIGUEIREDO et al., 2020). Ademais, tendo em vista que pacientes pro- venientes de meios sociais desfavorecidos po- dem ter sua sobrevida reduzida após o infarto agudo do miocárdio (IAM), é importante que sejam realizados o controle e a correção de fa- tores de risco relacionados à doença cardiovas- cular, como: A dislipidemia, diabetes mellitus, hipertensão, além de hábitos como o tabagismo, por exemplo; na questão da prevenção, os obje- tivos deste tratamento visam a redução das complicações para o indivíduo como uma pre- venção secundária (KHALFALLAHet al., 2022; GARCÍA et al., 2022). O IAM associado à gravidez O Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) apre- senta disparidades regionais nas tendências temporais das taxas de mortalidade dos últimos anos. Nas últimas décadas, as doenças cardio- vasculares (DCV), especificamente a Doença Isquêmica do Coração (DIC), tornaram-se as principais causas de morte no mundo, embora as taxas de mortalidade padronizadas por idade tenham diminuído (SOARES, 2020). O IAM, também conhecido como Ataque Cardíaco ou apenas Infarto, é a condição patológica emer- gencial resultante da insuficiente (ou nula) irri- gação sanguínea em determinadas áreas do te- cido muscular do coração. A iminente falta de sangue ou isquemia provoca dor intensa e ime- diata e a falta de oxigênio causa a morte gradual dos tecidos, os quais depois de algumas horas podem se tornar irreversíveis em sua fisiologia. Em questão de epidemiologia de IAM du- rante a gravidez, a ocorrência de IAM é rara, sendo estimado que possa ser diagnosticado en- tre 3-10 casos para cada 10.000 gestações. A sua incidência vem aumentando à medida que as mulheres estão engravidando com maior idade. A mortalidade materna descrita em pu- blicações recentes varia de 4,8% a 7,3%, e a fe- tal/neonatal de 7% a 13% (SOARES, 2020). Apesar de ocorrer em qualquer período ges- tacional, é mais frequente no terceiro trimestre da gravidez. O IAM está provavelmente relaci- onado ao acréscimo do consumo (e menor de- manda) de oxigênio pelo músculo do miocár- dio, devido ao aumento do volume sanguíneo, frequência cardíaca e débito cardíaco fisiológi- cos da gestação. Outros mecanismos favorece- dores seriam o estado fisiológico de hipercoa- gulabilidade, a redução do transporte de oxigê- nio por diminuição do conteúdo de hemoglo- bina (anemia fisiológica da gestação) e a redu- ção da pressão arterial diastólica e consequente diminuição do fluxo sanguíneo coronariano. Os fatores de risco descritos como associados ao IAM na gestação são, por exemplo: Hiperten- são arterial, trombofilia, diabetes, tabagismo, transfusão, infecção puerperal e idade materna superior a 30 anos (FIGUEIREDO et al., 2020). O IAM associado à obesidade Considerada uma das doenças cardiovascu- lares que mais mata e, por abranger uma infini- dade de fatores de riscos, o Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) não escapou da probabilidade de estar comumente associado com a obesi- 137 dade. Estudos apontam que a obesidade é um dos principais fatores para pessoas com menos de 45 anos desenvolverem doenças cardiovas- culares, seja por seu aumento da medida de cir- cunferência abdominal, seja por aumento de te- cido adiposo localizado com proximidade a ór- gãos vitais (DATTOLI-GARCÍA et al., 2021). É possível perceber a gravidade da obesi- dade, uma vez que, apesar de ser um fator de risco modificável, essa comorbidade ainda pre- valece na população, além disso, está forte- mente atrelada à saúde da população mundial. Outrossim, em decorrência do aumento de ca- sos de obesidade – que acometem pessoas de todas as idades – houve um aumento de mortes por IAM em jovens, anteriormente não muito frequente (DATTOLI-GARCÍA et al., 2021). Logo, faz-se necessária a maior preocupa- ção com a obesidade em relação ao IAM, pois tem-se em vista que essa comorbidade é um grande potencial agravante da doença e de sua instalação. Um estudo feito em 2020, utilizando dados de 2014, apresentou a obesidade como um dos maiores motivos para readmissão hos- pitalar de pessoas que tiveram IAM, com uma diferença de 21,2% de readmissão de pacientes não obesos para pacientes obesos (SCHUL- LER, 2020). Além disso, um outro estudo concluiu que em pacientes com Síndrome Coronária Aguda (SCA) existe uma relação entre o aumento de peso corporal e o avolumamento da área de mi- ocárdio. Utilizando apenas o IMC dos pacien- tes, sem se atentar a distinção de gordura intra e extra-abdominal ou da proporção de músculo e gordura corporal, o estudo indicou esse fator como agravante em pacientes com IMC elevado (ARREBOLA-MORENO et al., 2014). Em contrapartida, outros estudos chamam atenção para o "paradoxo da obesidade". Espe- cificamente, porque tal paradoxo revela que – entre pacientes com doenças cardiovasculares – pessoas com o IMC indicando sobrepeso tem o risco de mortalidade cardiovascular menor ao de pessoas com o IMC normal. Contudo, ainda é comumente aceito que a obesidade é um fator de risco, uma vez que, o estudo relatou que pa- cientes com IMC indicando obesidade grave apresentaram um risco de mortalidade cardio- vascular maior (ARREBOLA-MORENO et al., 2014). Diante disso, torna-se notável o impacto da obesidade nessa situação. Por ser um fator de risco de diversas doenças graves, é imprescin- dível que essa comorbidade seja efetivamente tratada. Para isso, bons hábitos como exercícios físicos e uma alimentação saudável seriam boas soluções para uma diminuição significativa desses problemas, o que mostra a necessidade de uma prevenção multidisciplinar. MÉTODO O presente estudo trata-se de uma revisão integrativa de literatura a respeito da temática “O manejo ao Infarto Agudo do Miocárdio (IAM): Uma revisão de literatura”, na qual fo- ram coletados 92 artigos finais para compor a estrutura textual da pesquisa entre o total de 1.171 artigos encontrados na plataforma Sci- ELO (Scientific Electronic Library Online), a qual está com o quantitativo de 943 artigos, e na plataforma PubMed (National Library of Medicine), estando esta com a oferta de 228 ar- tigos científicos. Dentre os 943 artigos da pla- taforma SciELO, 22 artigos foram analisados e selecionados para o escopo desta pesquisa. Já na plataforma PubMed, com seus 228 artigos disponíveis, 70 foram metodologicamente agrupados para a escrita da pesquisa (Tabela 16.1). Com a adição dos artigos da plataforma SciELO e PubMed totalizam-se os 943 artigos finais da presente pesquisa. A busca foi reali- 138 zada com artigos publicados no intervalo de 10 anos, de 01 de janeiro de 2012 a 01 de janeiro de 2022, através dos filtros presentes nas bases eletrônicas em ambas as plataformas (SciELO e PubMed). A revisão de literatura foi feita por intermédio de dois descritores “Infarto Agudo do Miocárdio" e “IAM” (de forma a contemplar a conhecida sigla desta cardiopatia na busca), e não houve restrição de idioma na busca dos ar- tigos, pois foi utilizado a ferramenta Google Tradutor que abrange cerca de 133 idiomas de forma eficiente e compreensível ao pesquisa- dor. Assim, de forma minuciosa, os artigos fo- ram escolhidos para integrar a produção cientí- fica deste estudo com base em sua relação in- trínseca com a temática proposta da cardiolo- gia, com foco no Infarto Agudo do Miocárdio (IAM). Para tal, foi, também, considerada aten- ciosamente as diretrizes atuais do respectivo as- sunto com objetivo de nortear a prática clínica da cardiologia de forma atualizada e integrar as informações coletadas sobre o IAM nesta pes- quisa. Tabela 16.1 Fluxograma quantitativo da metodologia Plataforma SciELO (Scientific Electronic Li- brary Online) PubMed (National Library of Medi- cine) Artigos disponíveis (1.171) 943 228 Artigos selecionados (92) 22 70 RESULTADOS E DISCUSSÃO Fatores socioeconômicos e o IAM Um estudo realizado por Khalfallah e cola- boradores (2022) com 570 pacientes apresen- tando IAMCSST (Infarto do Miocárdio com Supradesnivelamento do Segmento ST) subme- tidos ao procedimento de revascularização por ICPP. A divisão dos pacientes foi feita em dois grupos levando em conta o tempo total de is- quemia: -Grupo I: 280 pacientes (49,1%) com manifes- tações precoces (1-12 horas); -Grupo II: 290 pacientes (50,9%) com manifes- tações tardias (>12-24 horas). Não foi constatado diferença estatistica- mente significativa entre os dois grupos em re- lação à idade, distribuição por gênero, presença de hipertensão,dislipidemia e tabagismo atual. O número de pacientes com fibrilação atrial no grupo II foi significativamente maior do que no grupo I. A fração de ejeção do ventrículo es- querdo foi maior no grupo I do que no grupo II. Em relação aos resultados laboratoriais, os ín- dices de concentração de CK-MB e creatinina sérica foram significativamente menores no grupo I do que no grupo II. Levando em conta a situação socioeconô- mica dos participantes do estudo, seguimento médico, adesão à medicação e conscientização sobre os benefícios da revascularização precoce foram comparados. Ocorreu uma diferença es- tatisticamente relevante entre os dois grupos quanto ao número de pacientes atendidos por médico especialista no ano anterior, sendo maior no grupo I. Notamos também que o número de pacien- tes que aderiram ao tratamento médico também foi significantemente mais amplo neste grupo. O número de pacientes que sofreram isola- mento social foi maior no grupo II do que no grupo I. O número de pacientes com menor ní- vel de escolaridade foi significativamente 139 maior no grupo II do que no grupo I. Quanto à conscientização dos pacientes sobre os benefí- cios da revascularização precoce, o número de pacientes conscientes disso foi significativa- mente maior no grupo I do que no grupo II. O número de pacientes com início dos sintomas durante a noite foi maior no grupo II e o número de pacientes que moravam longe de prestadores de serviços de saúde também foi maior no grupo II. A Reperfusão Miocárdica Precoce obtém melhores prognósticos? Analisando cientificamente 878 pacientes com diagnóstico de IAMCSST (Infarto do Mi- ocárdio com Supradesnivelamento do Seg- mento ST), dos quais 33,4% eram mulheres, ob- servou-se que as mulheres, comparativamente aos homens, apresentaram maiores taxas de di- abetes mellitus (42% vs 28,5%), hipertensão ar- terial sistêmica (75,1% vs 59%) e dislipidemia (20,2% vs 33,3%) do que os homens. No estudo vigente, pode-se visualizar que as mulheres possuíram menor taxa de reperfusão e maior taxa de mortalidade em comparação aos ho- mens. Os resultados se mostram semelhantes a outras pesquisas acerca do tema já feitas no Brasil, relatando uma taxa de reperfusão em pa- cientes com IAMCSST de 52,5% no norte e nordeste, comprovando que o país está longe de acompanhar o desenvolvimento de outros paí- ses mais evoluídos, nos quais 98,2% dos paci- entes foram tratados com estratégias de reper- fusão (como trombólise com ou sem resgate, ou ICP primária) (OLIVEIRA et al., 2021). As baixas taxas de reperfusão das mulheres foram diretamente associadas a um atraso na chegada ao hospital com serviço de hemodinâ- mica, uma vez que a reperfusão precoce é es- sencial para o tratamento. Comprova-se isso com um tempo muito superior ao sugerido pela diretriz brasileira para a chegada da paciente no primeiro hospital e, avaliando o tempo médio gasto do início dos sintomas até a chegada ao hospital, o atraso é ainda maior entre as mulhe- res. Nesse sentido, a demora na chegada ao hos- pital com angioplastia causa baixas taxas de uso de ICP (intervenção coronária percutânea) pri- mária na população geral, sendo a taxa menor em mulheres (OLIVEIRA et al., 2021). Com o intuito de amenizar os impactos da mortalidade de IAM (Infarto Agudo do Miocár- dio), um estudo avaliou um treinamento de mé- dicos e enfermeiros de serviços de emergência em cinco hospitais públicos que apresentavam uma taxa de morte por IAM elevada, e compa- raram com os dados de um hospital com uma equipe não treinada. Os resultados obtidos fo- ram de uma redução intensa da mortalidade nos centros treinados (CORBALÁN, 2021). O fluxo de atendimento ao paciente com IAM com hospitais sem ICP ou com ICP frágil exige uma transferência para outros mais espe- cializados, sendo quase 15% o número de paci- entes que passaram por duas unidades hospita- lares antes do atendimento no SUS em Aracaju, capital do Estado de Sergipe, Brasil, uma vez que somente um hospital possui ICP eficiente e que atende pacientes do SUS, o que atrasa con- sideravelmente a recuperação dos pacientes (RAFACHO, 2022). Estresse psicossocial: Um fator de risco ao IAM no público feminino do Brasil Nas últimas décadas a mulher tem cada vez mais expandido sua participação no mercado de trabalho. Isso é devido a fatores econômicos, sociais e culturais, uma vez que a expansão in- dustrial e uma importante redução da taxa de fe- cundidade possibilitou a maior inserção da mu- lher no mercado de trabalho. No entanto, hoje, se verifica que a mulher executa uma dupla jor- 140 nada, pois é ela que suporta a, senão a totali- dade, quase totalidade do trabalho doméstico não remunerado. Essa circunstância expõe a mulher a uma maior carga de estresse psicosso- cial, que é causado pelo excesso do grau de exi- gência do trabalho. A existência do estresse pode ser avaliada por meio do Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de LIPP (ISSL), instrumento vali- dado pelo Conselho Federal de Psicologia. Ele é composto por uma lista de 53 sintomas físicos e psicológicos, divididos em períodos: Nas últi- mas 24 horas, na última semana e no último mês. Além de informar a existência ou não de estresse, o instrumento categoriza-o em quatro fases: Alerta (corresponde à pontuação obtida nos sintomas das últimas 24 horas); resistência e quase exaustão (pontuações da última se- mana) e exaustão (sintomas que estiveram pre- sentes no último mês) (SCHMIDT et al., 2020). Em um estudo utilizando-se o ISSL com 330 entrevistados, 89% das mulheres e 70% dos homens apresentaram estresse; o sexo feminino quase triplicou as chances de sofrê-lo (EXP (B) 2,79; p = 0,02). Quanto às quatro fases, as mu- lheres mostraram-se mais em quase exaustão e exaustão, e os homens, mais em resistência. A fase de alerta caracteriza-se por reações do sis- tema nervoso simpático logo que o organismo percebe o estressor. A de resistência apresenta- se quando um estressor permanece presente com o passar do tempo, fazendo com que a pes- soa resista e busque forças para continuar li- dando com o estresse, embora ainda tenha os sintomas (SCHMIDT et al., 2020). Na fase de quase exaustão, o processo de adoecimento se inicia, e os órgãos com maior vulnerabilidade genética ou adquirida passam a mostrar sinais de deterioração. Se não há alívio para o estresse com a remoção dos estressores ou o uso de estratégias de enfrentamento, ele chega à sua fase de exaustão, causando diversos problemas, como úlceras, gengivites, psoríase, hipertensão arterial, depressão, ansiedade, entre outros (SCHMIDT et al., 2020). Assim, pode- se prejudicar o sistema cardiovascular e corro- borar em complicações cardíacas ao indivíduo, por conta do estresse, alterar o nível de autocui- dado da pessoa consigo mesma também. Além disso, o estresse psicossocial deve ser estudado usando-se uma medida composta, pois ocorrem várias manifestações na esfera subjetiva, biológica e comportamental, justifi- cando-se uma abordagem integrada, o que per- mitirá antever intercorrências cardiovasculares em mulheres com alto nível de estresse (FI- GUEIREDO et al., 2020). Desse modo, convém compreender que as desigualdades nas relações sociais entre ho- mens e mulheres se concretizam em problemas de saúde que afetam decisivamente em maior prejuízo à população feminina. Portanto, é im- portante identificá-los, criticá-los e buscar pro- mover a mudança de fatores estressores neces- sária na sociedade, e o estresse psicossocial é um desses problemas produtores de adoeci- mento e morte que podem e devem ser modifi- cados. O IAM e a obesidade O Infarto Agudo do Miocárdio (IAM), o qual é uma Síndrome Isquêmica Miocárdica Instável (SIMI), está fortemente vinculada às variações que extrapolam os parâmetros pa- drões das taxas de IMC. Desta forma, a obesi- dade é uma comorbidade que se associa, estrei- tamente,com os casos mais graves de IAM, em decorrência do alto acúmulo de placas ateros- clerótica nas paredes dos vasos que suprem de sangue o corpo humano (VAZ et al., 2020). As- sim, os fatores que preconizam o surgimento de tal patologia são: Alimentação inadequada e 141 baixa frequência ou ausência total de exercícios físicos praticados. Por conseguinte, a obesidade é definida como um excesso de massa gorda oriunda do desequilíbrio entre a ingestão e perda de calorias (VAZ et al., 2020). Desse modo, a faixa etária mais acometida pela IAM associada à obesidade tem sido entre 60 e 79 anos em função do consumo inadequado de ali- mentos inapropriados, sedentarismo e doenças osteomusculares. Diante de tal problemática, uma pesquisa proporcionada pelo Projeto Idoso Goiânia ana- lisou 418 idosos com idade média de 70 anos e IMC médio de 27 kg/h2 (o sexo feminino apre- sentou um IMC médio de 5% superior em rela- ção aos homens, o qual foi de 26,1 kg/h2). A prevalência de obesidade se distribuiu da se- guinte forma: Homens com 45,1% (IC95% 36,7-53,6%), mulheres com 51,1% (IC95% 45,0-57,1%) e geral com 49,0% (IC95% 44,2- 54,0%). Desse modo, a distribuição de pessoas obe- sas deu-se principalmente entre os idosos inse- ridos na faixa etária de 60 a 79 do que aqueles inseridos na faixa etária com mais de 80 anos. Destarte, a IAM se tornou mais prevalente na- queles em situação de obesidade, possuindo al- gumas particularidades entre a população idosa, os quais não possuíam uma alimentação balan- ceada. Dentre os participantes da pesquisa, ape- nas 46,8% e 53,8% consumiam leguminosas e frutas, respectivamente. Em contrapartida, o restante não seguia uma alimentação saudável regular. Além do mais, o monitoramento do va- lor nutricional ingerido pelo idoso é de suma importância a fim de remediar a obesidade, hi- pertensão arterial sistêmica, entre outras doen- ças que, por consequência, venham a provocar alguma disfunção cardiovascular. Como o tratamento tardio de IAM afeta a sobrevida do paciente? De acordo com a Organização Mundial de Saúde, países emergentes apresentaram um grande crescimento no número de doenças car- diovasculares, com especial destaque para o IAM, e consequentemente, o número de mortes. O IAM é uma situação de emergência que ne- cessita de decisões e intervenções rápidas, uma vez que a duração da isquemia é um determi- nante da gravidade do infarto já que a morte do miócito é diretamente proporcional à duração da oclusão da artéria coronária (KHALFAL- LAH et al., 2022). Além disso, é fundamental a adesão ao tratamento medicamentoso. Acre- dita-se que com um treinamento adequado para diferentes tipos de público é possível amenizar esse crescimento. A Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo treina cardiologistas para o diagnós- tico e tratamento da IAM, desde 1976, mas não treina profissionais não-cardiologistas que atuam na emergência. Tendo em vista, que os pacientes geralmente buscam ajuda em prontos- socorros, mas os profissionais que ali estão são médicos generalistas, enfermeiros e outros que não possuem o treinamento específico ade- quado. A Sociedade de Cardiologia, juntamente com a Secretária de Saúde do Estado de São Paulo e Secretaria de Saúde da cidade de São Paulo, desenvolveram um programa de treina- mento que capacitou aproximadamente 200 médicos e 350 enfermeiros que participaram de pelo menos uma sessão de treinamento de maio de 2010 até dezembro de 2013, com intuito de diminuir o tempo de diagnóstico e a taxa de mortalidade. Após a conclusão do período de treinamento, o número de diagnósticos de infar- tos aumentou em 12,61%, mas as taxas de mor- talidades associadas tiveram uma redução de 142 3,06% e uma redução de risco relativo de 21,39% (CESAR et al., 2021). Ademais, óbitos intra e extra-hospitalares por IAM nas capitais apresentam diferenças so- ciodemográficas e progressivo aumento da ocorrência extra hospitalar. Meios sociais des- favorecidos estão associados às grandes dificul- dades e atrasos no acesso aos serviços de saúde, que determinam a apresentação precoce ou tar- dia do paciente (MACEDO et al., 2021). Em um estudo apresentado por Khalfallah et al., (2022) foi observado que pacientes com maior nível socioeconômico tinham mais conheci- mentos sobre o tratamento médico e conse- guiam utilizar os prontuários para obter mais in- formações enquanto os pacientes com menor nível econômico pareciam não ter conhecimen- tos sobre o tratamento e têm dificuldade em compreender as informações que lhe são forne- cidas. Aspectos clínicos, epidemiológicos, ele- tro-cardiológicos, ecocardiográficos e tera- pêuticos em pacientes diabéticos com IAM Um estudo global da prevalência de IAM em diabéticos de 4,5 milhões de pessoas com diabetes mediu uma prevalência de 11,9% em homens e 9,8% em mulheres (KIM et al., 2018). No entanto, outro estudo (EINARSON et al., 2018) descobriu que mulheres com diabetes ti- veram um prognóstico mais rápido e pior para Infarto Agudo do Miocárdio. Além do mais, os resultados da presente série estão de acordo com a publicação de (CARDOSO et al., 2020) sobre Infarto Agudo do Miocárdio, a qual afirma que a faixa etária de maior incidência é de 60 a 69 anos, com 51,7% de homens e 42,9% de mulheres. Da mesma maneira, outro estudo transversal (AHMED et al., 2018) encontrou associação entre a idade dos pacientes e o fato de terem ou não diabetes como fator de risco para Infarto, tanto em pacientes com Diabetes Mellitus quanto em pacientes não diabéticos. Em casos relatados por (AHMED et al., 2018) o risco de um evento composto (morte, insuficiência car- díaca, acidente vascular cerebral, IAM) foi 1,61 vezes maior em insulino-dependentes do que em pacientes não diabéticos. Entretanto, constatou-se que sobre doenças cardiovasculares avaliando a presença de com- plicações associadas ao Infarto Agudo do Mio- cárdio, as anormalidades da condução atrioven- tricular foram as mais comuns, seguidas da fi- brilação atrial (CARDOSO et al., 2020). Os mesmos autores mostraram que 72% usaram te- rapia trombolítica, enquanto os pacientes que não receberam essa terapia tiveram maior taxa de mortalidade, representando 58% de todas as mortes. Nesse sentido, nenhuma conexão esta- tística foi identificada na série atual. CONCLUSÃO Diante do exposto acima, é notório que os fatores que acarretam a maior prevalência de distúrbios cardiovasculares, como o IAM, vão além dos fatores biológicos de cada paciente, uma vez que estudos supracitados destacaram correlações do IAM com fatores socioeconômi- cos, ambientais, culturais, alimentares, entre outros. Diante disso, é de extrema importância a promoção de estratégias terapêuticas que vi- sam tratar essa patologia levando em conside- ração sua origem multifatorial. Além disso, os dados que constatam uma maior sobrevida correlacionados a um diagnós- tico precoce ressaltam a importância de uma li- nha de cuidado que tenha como objetivo reduzir o diagnóstico tardio de distúrbios cardiovascu- lares. Estratégias como a telecardiologia, apri- moramento do atendimento pré-hospitalar, bem como campanhas públicas acerca dos sintomas, 143 entre outras, podem ser utilizadas para diminuir os problemas que acarretam um diagnóstico tar- dio dos distúrbios cardiovasculares, dentre eles o IAM. A obesidade é uma condição que, quando não tratada, pode aumentar significativamente o risco de doenças cardiovasculares, incluindo o IAM, aumento da pressão arterial, aumento do colesterol, resistência à insulina e inflama- ção crônica. O tratamento do IAM em pacientes com obesidade pode ser desafiador e muitas ve- zes envolve uma abordagem multidisciplinar, que inclui mudanças no estilo de vida, como di- eta e exercícios regulares e controlados, além de medicamentos para controlar os fatores de risco. Dessa forma, a prevenção também é funda-