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Apostila - Módulo 4 - Formação em Psicanálise

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Prévia do material em texto

VERSÃO REVISADA - 2024-2025
(C) TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. USO EXCLUSIVO DOS ALUNOS DO CURSO.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 1
http://psicanaliseclinica.com
Módulo IV - O Método Psicanalítico
Índice
1. A técnica da psicanálise para Freud 8
1.1. Freud e a Técnica da Psicanálise 8
2. O método da Associação Livre 13
2.1. O início da Psicanálise e a Associação Livre hoje 14
2.2. A gênese da Associação Livre 15
2.3. O significado de “Livre” 17
3. O início do tratamento e as entrevistas preliminares 21
3.1. O que Freud chamou de “tratamento de ensaio” 23
3.2. Para que servem as Entrevistas Preliminares? 26
4. O “meio” do tratamento: seu manejo 31
4.1. Resistências, transferência e contratransferência 32
4.2. A Psicanálise Selvagem 33
4.3. O erro e o dado em Psicanálise 35
4.4. Alteridade: o outro e o Grande Outro 41
5. Recursos e ferramentas que podem integrar a Associação Livre 47
5.1. O recurso da Atenção Flutuante 48
5.2. O método socrático (maiêutica) em Psicanálise 50
5.3. O recurso da interpretação dos sonhos 53
5.4. O recurso da análise dos mecanismos de acesso ao inconsciente 55
6. Uma síntese sobre os Procedimentos de Análise 59
7. Fim do Tratamento em Psicanálise e a ideia de Cura 63
7.1. O que não é cura em psicanálise? 64
7.2. A cura psicanalítica para Freud 66
7.3. A cura psicanalítica para Lacan 67
7.4. Análise terminável e interminável 69
7.5. Sobre o conceito de Alta 71
7.6. Encaminhamento de paciente a psiquiatra 74
7.7. Recusa ou interrupção do tratamento pelo psicanalista 76
7.8. Os objetivos de um tratamento em psicanálise 78
7.9. Reconhecer (ou constituir) seu próprio desejo 79
8. Mecanismos de acesso ao inconsciente 85
8.1. Chistes 86
8.2. Atos falhos 90
8.2.1. Definição de ato falho 91
8.2.2. Tipos de atos falhos 94
8.2.2.1. Atos falhos de linguagem 95
8.2.2.2. Atos falhos de esquecimento 97
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 2
http://psicanaliseclinica.com
8.2.2.3. Atos falhos de comportamento 99
9. Teoria Topográfica: Primeira Tópica Freudiana 102
9.1. Conceituação da Teoria Topográfica 103
9.1.1. Como representar a Teoria Topográfica? 106
9.2. Instâncias psíquicas da teoria topográfica 106
9.2.1. O Consciente 106
9.2.2. O Pré-Consciente 114
9.2.3. O Inconsciente 119
9.3. Processo primário e processo secundário 125
9.4. Processos de funcionamento do Inconsciente 134
9.5. A topografia de personalidade 139
10. Teoria Estrutural: a segunda tópica freudiana 141
10.1. Em que consiste a Teoria Estrutural? 141
10.2. Instâncias psíquicas da teoria estrutural 143
10.2.1. O Id 144
10.2.2. O Ego 148
10.2.3. O Superego 151
10.3. O funcionamento das instâncias 154
10.3.1. O funcionamento do Id 154
10.3.2. O funcionamento do Ego 158
10.3.3. O funcionamento do Superego 164
10.4. A personalidade e sua dinâmica na Teoria Estrutural 167
11. Uma representação visual para as duas tópicas 169
11.1. Revisão: Primeira e Segunda Tópicas 171
12. Quizzes (Enquetes) 175
13. Referências bibliográficas 187
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Introdução
Esta é a apostila base referente ao módulo IV da parte teórica do Curso.
Nesse módulo, vamos aprofundar alguns conceitos centrais que estruturam a
clínica psicanalítica, isto é, começaremos a abordar a metapsicologia freudiana
(ou seja, a psicanálise falando de si mesma, analisando-se enquanto método) e
da relação entre analista e analisando.
Ao longo da apostila, logo ao final de alguns capítulos, estão indicadas
leituras, vídeos e/ou filmes que são importantes para o curso de formação, haja
vista a relevância desses conteúdos no desenvolvimento profissional. Quando
as leituras forem opcionais, haverá a indicação no próprio material.
Temos também vídeo-aulas e lives de revisão dos módulos (na área de
membros), que resumem os assuntos dos módulos. Para fins de realização de
prova, a leitura das apostilas é suficiente. Na fase final do Curso (Supervisão),
isto é, após você concluir os 12 módulos teóricos, você terá encontros ao vivo
por videoconferência (transmissões ao vivo por vídeo), em que serão debatidos
estudos de casos, a dinâmica da clínica psicanalítica e suas técnicas, bem
como serão revisados alguns conceitos teóricos essenciais à melhor
interpretação dos casos.
À primeira vista, você pode pensar que a leitura desta apostila é muito
extensa. Porém, a organização dos conteúdos foi feita para ser bastante
didática. Você vai perceber que a leitura flui bem, porque a apostila faz revisões
frequentes, traz resumos, mapas mentais e enquetes, com o objetivo de fixar
os conteúdos mais importantes.
Na fase final do Curso (Supervisão), isto é, após você concluir os 12
módulos teóricos, você terá encontros ao vivo por vídeo-conferência
(transmissões ao vivo por vídeo), em que serão debatidos estudos de casos, a
dinâmica da clínica psicanalítica e suas técnicas, bem como serão revisados
alguns conceitos teóricos essenciais à melhor interpretação dos casos.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 4
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Estamos adicionando quizzes ou enquetes nos módulos. Este módulo 4
já tem enquetes, ao final desta apostila. As enquetes servem para revisar e
fixar conteúdos.
Importante: a prova do módulo (contendo 10 perguntas de múltipla
escolha e uma redação) é diferente das enquetes (que são perguntas de
verdadeiro ou falso). O que constata que você de fato terminou um módulo é
fazer a prova deste módulo (10 questões de múltipla escolha + redação).
Depois de ter feito a prova de um módulo, você já pode imediatamente
começar os estudos do módulo seguinte.
Para todos os módulos, a parte obrigatória do Curso de Formação são
Apostilas + Vídeo e Provas (questões + redação) cujos links foram marcados
com flechas em vermelho (acima). Estude a apostila e faça a prova (10
questões + uma redação) para concluir um módulo (então, faça o módulo
seguinte, até o módulo 12). Já os materiais complementares (indicados com
flechas azuis acima) são opcionais.
Dedique-se ao máximo às leituras e demais materiais. Embora a
formação on-line possibilite uma autonomia de tempo e andamento para a
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compreensão dos conteúdos, a qualidade do entendimento das temáticas
fundamentais à formação e prática profissional depende muito do
comprometimento e da seriedade com que você irá se dedicar.
Aproveite bem os materiais e bons estudos!
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 6
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IMPORTANTE
Estamos constantemente revisando e melhorando nosso material.
Você está recebendo esta que é a nova versão da apostila do Módulo 4,
atualizada para 2023-2024.
Nossos materiais são revisados e melhorados com certa frequência.
Recomendamos que, após concluir o Curso, você revise os módulos já
estudados: servirá para você aprofundar seu aprendizado e para verificar
novas versões de nossos materiais.
Este material pertence ao Curso de Formação em Psicanálise Clínica
(www.psicanaliseclinica.com). Sua divulgação paga ou gratuita não é
permitida sem prévia autorização do nosso Instituto Brasileiro de
Psicanálise Clínica (CNPJ 28.447.037/0001-81). Informe-nos qualquer uso
não autorizado, pelo e-mail contato@psicanaliseclinica.com.
Este material é parte das aulas do Curso de Formação em Psicanálise.
Proibida a distribuição onerosa ou gratuita por qualquer meio, para não alunos
do Curso.
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mailto:contato@psicanaliseclinica.com
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1. A técnica da psicanálise para Freud
Embora haja uma modificação dos conceitos teóricos de Freud ao longode sua obra, dois pontos são mantidos no que concerne à sua importância:
● o papel central da sexualidade, que se origina desde a vida infantil; e
● o inconsciente.
No que diz respeito à técnica da Psicanálise, após passar a adotar o
método da associação livre, Freud não abandonará mais este método. Este
método é, também, uma constante na obra de autores pós-freudianos.
Ao associar livremente suas ideias, o paciente no decorrer do tratamento
vai superando as suas resistências e deste modo os conteúdos do inconsciente
são trazidos para a consciência.
1.1. Freud e a Técnica da Psicanálise
O paciente neurótico é aquele no qual o conflito psíquico entre
consciente e inconsciente é intenso. O recalque incide sobre o neurótico e sua
satisfação é realizada nas “formações de compromisso”, principalmente por
meio dos sintomas.
Segundo Freud, a mola mestra da clínica psicanalítica é a
transferência, que é ambígua, ou seja, positiva e negativa: amor transferencial
e hostilidade.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 8
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A transferência é, então, a “permissão” que o analisando concede para
que o analista esteja imerso na rede de significados deste analisando,
permitindo ao analista indagar e propor interpretações.
É através dessa inserção do psicanalista na cadeia de representações
do paciente que o psicanalista pode, por meio da interpretação e construção,
dar prosseguimento à análise.
Como a doença (ou sintoma, ou demanda) inicial do paciente não é
estática, com a transferência ela se transforma em neurose de transferência.
Segundo Freud, “eliminar essa neurose equivale a eliminar a doença inicial”.
A construção designa a atividade do analista de completar aquilo que
foi esquecido, a partir dos traços que foram deixados pelo paciente
(analisando). A interpretação indica o desejo.
A psicanálise pelo método da associação livre se contrapõe à sugestão
hipnótica; esta tenta solucionar os sintomas por meio de sugestões, e por
outro lado o seu próprio emprego acarreta no encobrimento do recalque.
A psicanálise é uma análise causal, isto é, busca identificar evidenciar
as relações entre causa e consequência, sendo:
● a causa: aquilo que está recalcado (a representação-meta);
● a consequência: os sintomas ou os incômodos que o paciente relata
(as representações substitutas daquilo que foi interditado no
inconsciente).
A Psicanálise se propõe a identificar e remover suas causas. Apesar
disso, a Psicanálise não incide só sobre as raízes dos fenômenos, mas possa
também refletir sobre as consequências (a forma de ver os sintomas, por
exemplo).
Deste modo, a Psicanálise com seu arcabouço teórico se insere no
campo da ética, e, como tal, se revela a ética do impossível, já que não impõe
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 9
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uma determinada moral aos seus pacientes, mas deixa a cargo dos mesmos
tomar a decisão por si mesmos.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 10
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INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
Em algumas de nossas apostilas, indicaremos artigos relacionados aos
assuntos do módulo. A leitura desses artigos é opcional para fins de prova,
mas recomendamos que você busque sempre essas (e outras) fontes para
se aprofundar nos temas abordados.
● Artigo: O que é o Método Psicanalítico?
● Artigo: Etapas da Terapia Psicanalítica
● Artigo: Conceito de Representação em Freud
LIVES
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 11
https://www.psicanaliseclinica.com/o-que-e-metodo-psicanalitico/
https://www.psicanaliseclinica.com/etapas-terapia/
https://www.psicanaliseclinica.com/representacao/
http://psicanaliseclinica.com
Acesse sua área de membros e, depois, clique em “Lives & Gravações”.
Você terá acesso a dezenas de lives gravadas, muitas delas abordando
assuntos debatidos neste Módulo.
Além disso, também na área de membros você encontra vídeo-aulas sobre
os assuntos deste Módulo.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 12
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2. O método da Associação Livre
Teremos oportunidade de aprofundar outros aspectos da clínica
psicanalítica, como transferência, contratransferência e resistência. Faremos
isso nos módulos seguintes e nos estudos de casos práticos na etapa de
Supervisão do nosso Curso.
Por ora, convém abordar a essência da clínica psicanalítica, que é a
técnica ou método da associação livre.
Vimos nos módulos anteriores que Freud substituiu a primazia da
sugestão hipnótica em favor da associação livre. Isso significa dizer que a
associação livre passa a ser o método psicanalítico por excelência, o que
permanecerá durante toda a trajetória de Freud. Em outras palavras, a
associação livre é a forma mais notadamente psicanalítica para conduzir uma
sessão de análise.
O paciente fala e, falando, já há um alívio psicofísico, pelo simples fato
da mobilização mecânica descarregar parte da tensão psíquica. Mas, além
deste aspecto quantitativo, há a dimensão qualitativa, isto é, do conteúdo:
falando o que lhe vier na cabeça (sem autocensura, sem censuras do
analista e sem censuras das representações sociais ou morais), o
paciente “distrai” seus mecanismos de defesa, permitindo aflorar
aspectos inconscientes.
Nesse sentido, não há certo ou errado, não há “perder o foco”. Ou
melhor, Freud diria que “perder o foco” é exatamente a chave para encontrar
o inconsciente. Afinal, os sonhos, os atos falhos e os chistes são exemplos
desses ricos “erros”.
Nós nos basearemos na contribuição de LAPLANCHE & PONTALIS,
para aprofundarmos a reflexão sobre a associação livre.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 13
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A associação livre é um método que consiste em exprimir
indiscriminadamente todos os pensamentos que ocorrem ao espírito, quer
a partir de um elemento dado (palavra, número, imagem de um sonho,
qualquer representação), quer de forma espontânea.
O processo de associação livre é constitutivo da técnica psicanalítica.
Não é possível definir uma data exata de sua descoberta, que se deu de modo
progressivo entre 1892 e 1898, e por diversos caminhos.
2.1. O início da Psicanálise e a Associação Livre
hoje
Vimos nos módulos anteriores que Sigmund Freud, nos seus trabalhos
com Jean-Martin Charcot e Josef Breuer, usou da sugestão hipnótica e do
método catártico. Vimos também que, mesmo nessa fase inicial, já existiam
sinais de uma nascente associação livre. E que, depois que Freud seguiu sua
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 14
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atuação mais autônoma, rejeitou a hipnose e a sugestão, para desenvolver
reflexões sobre o seu método definitivo: a associação livre.
Então, hoje não é possível o psicanalista “escolher” qual método usar,
pois aconselhamentos, sugestões e hipnose não integram fazer psicanalítico,
embora tudo isso tenha uma importância na gênese da psicanálise como
campo do saber.
Também, a nosso ver, a atenção flutuante, a interpretação dos
sonhos ou a maiêutica não são outros métodos da psicanálise. A nosso ver,
são ferramentas que podem integrar a Associação Livre. Falaremos sobre
todos estes assuntos a seguir.
2.2. A gênese da Associação Livre
Como é demonstrado pelos Estudos sobre a histeria (Freud, 1895), a
associação livre emana de métodos pré-analíticos de investigação do
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 15
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inconsciente que recorriam à sugestão e à concentração mental do paciente
em uma determinada representação; a procura insistente do elemento
patogênico desaparece em proveito de uma expressão espontânea do
paciente (entenda melhor este aspecto lendo os comentários de Freudao caso
Emmy Von N., abaixo sintetizado). Os Estudos sobre a histeria põem em
evidência o papel desempenhado pelos pacientes nesta evolução.
Paralelamente, Freud utiliza o processo de associação livre na sua
auto-análise e particularmente na análise dos seus sonhos. Aqui, é um
elemento do sonho que serve de ponto de partida para a descoberta das
cadeias associativas que levam aos pensamentos do sonho.
As experiências anteriores à Freud consistiam no estudo das reações e
dos tempos de reação (variáveis segundo o estado subjetivo) a palavras
indutoras. Isto é, o analista sugeria algumas palavras e o analisando respondia
rapidamente, com o que lhe vinha à cabeça.
Carl Gustav Jung põe em evidência o fato de que as associações que
assim se produzem são determinadas pela totalidade das idéias em relação a
um acontecimento particular dotado de uma coloração emocional, totalidade à
qual dá o nome de complexo.
Freud, em A história do movimento psicanalítico (1914), admite o
interesse dessas experiências “para se chegar a uma confirmação
experimental rápida das constatações psicanalíticas e para mostrar
diretamente ao estudante esta ou aquela conexão que um analista apenas
pode relatar”.
Talvez convenha ainda fazer referência a uma fonte que o próprio Freud
indicou em Uma nota sobre a pré-história da técnica analítica (1920): o
escritor Ludwig Börne, que Freud leu na juventude, recomendava, para alguém
“se tornar um escritor original em três dias”, escrever tudo o que ocorre ao
espírito, e denunciava os efeitos da autocensura sobre as produções
intelectuais.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 16
http://psicanaliseclinica.com
Essas ideias, sem dúvidas, influenciaram a livre associação de Freud,
que, depois, aproveitaria a noção da livre expressão de ideias como forma de
minimizar a autocensura. Além disso, Freud não focaria no processo de induzir
o paciente com palavras sugestivas de forma aleatória, mas sim aproveitando
de conteúdos trazidos pelo próprio analisando (seus sonhos, seus atos falhos,
seus desejos relatados etc.).
No mais das vezes, a iniciativa das escolhas sobre o que falar se
originavam do próprio analisando, sendo o analista alguém que faz
apontamentos curtos, em geral na forma de perguntas que provocam no
analisando o sentido por trás de suas associações.
2.3. O significado de “Livre”
Nesse sentido, a título de conclusão, o termo “livre” na expressão
“associação livre” exige as seguintes observações:
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 17
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● Mesmo nos casos em que o ponto de partida é fornecido por uma
palavra indutora (experiência de Zurique) ou por um elemento do sonho
(método de Freud em A interpretação de sonhos, 1900), pode-se
considerar que é “livre” o desenrolar das associações, na medida
em que esse desenrolar não é orientado e controlado por uma
intenção seletiva;
● Essa “liberdade” acentua-se no caso de não ser fornecido qualquer
ponto de partida. É nesse sentido que se fala de regra de associação
livre como sinônimo de regra fundamental para a Psicanálise.
● Na verdade, não se deve tomar liberdade no sentido de uma
indeterminação: a regra de associação livre visa em primeiro lugar
eliminar a seleção voluntária dos pensamentos, ou seja, segundo os
termos da primeira tópica freudiana, pôr fora de jogo a censura dos
processos secundários (entre o consciente e o pré-consciente). A
associação livre ajudaria a revelar, assim, as defesas
inconscientes, quer dizer, a ação da primeira censura (entre o
pré-consciente e o inconsciente), a censura daquilo que está mais
profundamente recalcado.
● Por fim, o método das associações livres destina-se a pôr em evidência
uma ordem determinada do inconsciente: “Quando as
representações-metas conscientes são abandonadas, são
representações-metas ocultas que reinam sobre o curso das
representações”, diz Freud.
Explicando esta última frase de Freud: uma ideia fixa trazida à terapia
(por exemplo, uma fobia específica) é uma representação consciente, isso
pode ir se relacionando a outras ideias (livremente associadas), de modo a
sugerir um sistema de funcionamento psíquico que motivaria a fobia e todo
aquele constructo, até então oculto.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 18
http://psicanaliseclinica.com
Verifique esta ideia sobretudo no que Freud nos relata da sua paciente
Emmy Von N. Respondendo à solicitação insistente de Freud, que busca a
origem de um sintoma, ela lhe diz “... que [Freud] não deve ficar sempre
perguntando de onde vem isto ou aquilo, mas deixá-la contar o que tem para
contar” (Estudo sobre a histeria, 1895).
Sobre a mesma paciente, Freud nota que ela parece ter-se apropriado
do seu processo”:
“As palavras que me dirige [...] não são tão inintencionais como parecem;
reproduzem antes com fidelidade as recordações e as novas impressões que
agiram sobre ela desde a nossa última conversa e emanam muitas vezes, de
modo inteiramente inesperado, de reminiscências patogênicas de que ela se
liberta espontaneamente pela palavra.” (idem)
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 19
http://psicanaliseclinica.com
INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
● Artigo: O Método da Associação Livre em Psicanálise
● Artigo: Associação Livre para Freud e a Psicanálise
● Artigo: Freud, Charcot e a Hipnose na paciente Emmy Von N.
● Artigo: Freud e o Inconsciente
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 20
https://www.psicanaliseclinica.com/metodo-da-associacao-livre-em-psicanalise/
https://www.psicanaliseclinica.com/associacao-livre-freud/
https://www.psicanaliseclinica.com/freud-charcot-e-a-hipnose-na-paciente-emmy/
https://www.psicanaliseclinica.com/freud-e-o-inconsciente/
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3. O início do tratamento e as entrevistas
preliminares
Quando dizemos que uma pessoa está fazendo análise, queremos
dizer que esta pessoa está fazendo um tratamento clínico com psicanálise, ou
seja, ela faz terapia com um psicanalista.
Neste texto, você aprenderá como é o início de um processo de
análise, e falaremos também sobre a diferença entre demanda e desejo.
Utilizaremos a teoria de Freud e algumas elaborações de Jacques Lacan,
fazendo referência principalmente a Jacques Alain Miller.
Também a Psicanálise se utiliza das entrevistas em seu método clínico,
porém o faz com algumas peculiaridades em relação às terapias de natureza
comportamentais.
Vejamos alguns pontos centrais. 
Na Psicanálise, para que seja possível o início do tratamento, é
recomendado que seja realizado durante um período entrevistas preliminares.
Durante esse período, é realizada uma sondagem diagnóstica para que seja
possível iniciar o tratamento. Essa sondagem não se resume a um questionário
de anamnese com perguntas e respostas no formato “sim” ou “não”. Mas um
diálogo entre potenciais analista-analisando no qual seja possível o sujeito
fazer uma narrativa de sua própria vida, da sua história.
As entrevistas preliminares podem durar uma única sessão, ou mesmo
algumas semanas. São necessárias para que se possa conhecer as
motivações que levaram o paciente a procurar o Psicanalista. Algumas vezes,
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 21
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● uma sessão é suficiente para o início de uma compreensão inicial e
para firmar o contrato terapêutico,
● embora algumas sessões seguintes ainda façam parte de uma
compreensão mais completa, nesta fase de tratamento de ensaio.
Aqui, neste texto, quando falarmos da entrevista psicanalítica estaremos
entendendo, via de regra, não somente a primeira sessão, mas sim as
primeiras sessões necessárias para cumprir os objetivos do tratamento de
ensaio.
Além de ter a motivação diagnóstica, de possibilitar a identificação, ou
pelomenos, gerar uma suspeita de qual tipo de estrutura Psíquica (neurose,
psicose ou perversão) o sujeito está enquadrado, é o período em que o
profissional traça a direção do tratamento mais adequado para aquele paciente.
A sondagem diagnóstica possibilita diferenciar se os sintomas
apresentados são de uma neurose histérica ou obsessiva, ou de o início de um
desencadeamento de uma psicose, que só poderá ser percebido após um
período, ou pelo menos crie suspeitas desse possível diagnóstico. A
Psicanálise não é composta de métodos pré-definidos, com causas e efeitos
determinados.
MÓDULO IV - CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE. (c) psicanaliseclinica.com. Pág. 22
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3.1. O que Freud chamou de “tratamento de
ensaio”
Freud, em “Sobre o início do tratamento” (1913), menciona a importância
do que chamava de tratamento de ensaio. Este ocorria antes da análise
propriamente dita, e nesta etapa Freud decidia se aceitaria ou não o
paciente. Posteriormente, Lacan irá falar em entrevistas preliminares, que
seriam correlatas ao tratamento de ensaio de Freud. Esta fase seria anterior ao
paciente “deitar-se no divã”, ou seja, é a fase de estabelecimento do contrato
psicanalítico. Veja que, como “contrato”, entende-se a formação de um
“acordo de entendimento” sobre o paciente (e suas demandas iniciais), o
analista, os horários, os pagamentos e o funcionamento do método da
associação livre. Isso não significa um contrato escrito.
Assim, embora existam diferenças entre autores, é possível
compreender como sinônimos:
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Tratamento de Ensaio
Entrevistas Preliminares
Entrevista Psicanalítica ou Analítica
Formação do contrato psicanalítico
Início do tratamento
O objetivo principal das entrevistas preliminares consiste em
● direcionar a transferência àquele analista específico;
simultaneamente, serve para
● elaborar uma hipótese diagnóstica, a produção de um sintoma
analítico – o qual não é necessariamente aquele do qual o sujeito chega
se queixando – e a produção de uma demanda de análise propriamente
(Quinet, 1991). 
As entrevistas preliminares marcam que o início de uma análise não se
dá com a entrada do paciente (também chamado de analisando) no consultório
do analista. É o fim das entrevistas preliminares que cumpre a função de
estabelecer um corte, marcando a entrada no discurso analítico. 
Numa primeira vista, essa diferença pode não ser facilmente perceptível,
pois as entrevistas preliminares seguem as mesmas regras da análise:
também nas entrevistas preliminares o sujeito deve associar livremente,
isto é, mencionar livremente “o que lhe vier à cabeça”.
Contudo, não se interpreta o discurso do paciente durante essas
entrevistas. Nesse momento, o analista fala o mínimo possível, apenas o
suficiente para que o sujeito prossiga em seu discurso. Isto porque está em
jogo a questão diagnóstica: deixa-se o paciente falar para que uma hipótese
possa ser formulada acerca da estrutura do sujeito (neurose, perversão,
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psicose), e também porque é próprio paciente quem introduz os significantes
que irão “guiar” sua análise. 
É nesse momento que o analista decide se irá ou não acatar aquela
demanda de análise. “O fato de receber alguém em seu consultório não
significa que o analista o tenha aceito em análise” (Quinet, 1991, p.15).
O analista pode recusar-se a autorizar uma análise se, por exemplo,
perceber uma estrutura psicótica (se entender que há riscos de
desencadeamento de um surto, pelo qual terá que se responsabilizar), ou
porque o paciente já se encontra num estágio que o analista acha por bem não
levar adiante – lembremo-nos daquela máxima que uma análise só vai até o
ponto onde foi a análise do analista.
É importante reforçar que a informação anterior foi apenas a título de
exemplo. Há psicanalistas que trabalham com pacientes psicóticos.
Vamos reforçar este aspecto: o analista, após formado, segue fazendo
sua própria análise, isto é, deve ser ele analisando de outro psicanalista.
Além disso, deve ter vínculo com Instituto, Associação ou Psicanalista mais
experiente, que lhe acompanhe na supervisão dos casos que estiver
atendendo.
Se o analista não enfrenta suas questões em sua análise e supervisão
e, depois, se depara com um paciente cujas demandas vão além daquelas que
o próprio analista já estudou e analisou em si mesmo (junto a outro
profissional), dizemos que a análise foi além do ponto de análise do analista,
este analista não estará apto para aceitar aquele paciente. A rigor, sem ser
analisado e ser supervisionado, o analista não pode seguir atuando.
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3.2. Para que servem as Entrevistas Preliminares?
As entrevistas preliminares servem também para que se configure o
sintoma analítico enquanto tal. O sintoma do qual o sujeito chega ao
consultório se queixando expressa, geralmente, uma demanda de cura, ou
demanda de amor (no sentido de “ter a dedicação de atenção” do analista),
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mas não uma demanda de análise: esta deverá ser produzida através da
retificação subjetiva. 
Quando o sujeito procura o analista, ele se apresenta a este através de
seu sintoma: um significante. Por exemplo, se a demanda do paciente é uma
angústia insuportável, este é o significante a partir do qual a entrevista partirá.
É este significante que irá representar o paciente, num primeiro
momento, ao menos para o analista. O paciente é esta angústia. O analista,
por sua vez, é um outro significante, um significante qualquer fabricado pelo
analisando em sua fantasia.
Como regra, o analisando atribui ao analista um significante de
autoridade, ou de alguém que irá resolver suas dores, ou de alguém que não
levará o paciente a lugar nenhum: essas ideias são criadas pelo paciente em
decorrência de sua trajetória, de sua formação mental e deste contato inicial
com o psicanalista. Este analista passa a ser, na visão do paciente, o que
Jacques Lacan chama de sujeito suposto-saber. Isto é, o analista é o sujeito
que o analisando supõe ter um notório saber e que poderá “resolver seu
problema”. Isso, no início, é fundamental para a formação do par analítico
(analista-analisando) e da relação transferencial.
Assim, o sujeito, no início do processo, acredita que o analista detém um
saber ou um poder de cura, e coloca o analista no lugar de autoridade, que
Lacan denominou de sujeito suposto-saber. 
Se no início do processo a demanda do sujeito é a de se desvencilhar,
de se curar de um sintoma, a retificação subjetiva fará com que o sintoma
inicial passe ao estatuto de sintoma analítico (ou seja, um sintoma que agora
estabelece o vínculo entre analista e analisando), constituindo uma demanda
de análise propriamente dita, endereçada àquele analista específico.
Ao mesmo tempo, estabelece-se a transferência, que tem um caráter
simbólico, em relação ao analista. Este fenômeno é essencial para que se dê
uma análise. Ao se configurar o sintoma analítico, este passa a ser um enigma
a ser decifrado pelo sujeito analisando (com o suporte do analista). Este
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enigma aponta para uma divisão do analisando: uma parte de si é o paciente
que livre-associa, a outra parte de si é aquele enigma (sintoma) que buscará
ser desvendado. É o que se chama de histericização do discurso. 
É como se a energia afetiva do paciente se voltasse menos para o
sintoma em si e mais para o sintoma analítico (aquele demandado pelo
analisando e sintetizado pelo par analítico nas entrevistas preliminares)e para
a forma como esse sintoma analítico ajudou a criar o vínculo de transferência
com o analista.
Esse sintoma analítico é a imagem inicial criada pelo par analítico que
responde à demanda do analisando e que resume respostas a perguntas
como: “qual ideia inicial sobre mim mesmo?” e “qual sintoma me identifica
ou me define?”. Obviamente que este sintoma analítico tende a ser
constantemente reformulado (via de regra, complexificando-se) com o
andamento das sessões.
Assim, resumidamente, as entrevistas preliminares cumprem as
seguintes funções:
● instaurar a transferência num nível simbólico e estabelecer o vínculo
terapêutico (diz-se que a transferência é o motor da análise);
● apresentar a demanda de cura, que inicialmente é acolhida pelo
analista (por exemplo, quando o sujeito diz “tenho depressão”);
● realizar a retificação subjetiva dessa demanda, transformando a
demanda de amor ou de demanda de cura em demanda de análise;
● implicar (isto é, comprometer) o sujeito (analisando) no sintoma, para
que se configure um sintoma analítico (“você disse que tem depressão,
mas como é para você ‘ter depressão’?”);
● colocar o sujeito a questionar-se sobre seu sintoma, histericizando seu
discurso e
● permitir a elaboração, por parte do analista, de uma hipótese
diagnóstica inicial.
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Resumindo, sobre o começo do tratamento:
Quando ocorrem as
entrevistas
preliminares?
A partir do momento em que o potencial analisando
procura o psicanalista, com uma demanda analítica
ou demanda de cura.
Quanto tempo
duram?
Pode durar uma sessão, duas sessões, um mês
etc. Não há tempo pré-definido. As Entrevistas
Preliminares duram o tempo necessário para o
psicanalista criar uma hipótese terapêutica e o
analisando se localizar no ambiente de confiança
para livre-associar.
Para que servem? - Estabelecer o vínculo terapêutico
- Recolher e retificar a demanda de cura
- Permitir uma hipótese diagnóstica inicial
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INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
● Artigo: Entrevistas preliminares e o início do tratamento
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https://www.psicanaliseclinica.com/inicio-do-tratamento/
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4. O “meio” do tratamento: seu manejo
No tópico anterior, abordamos o início do tratamento: as entrevistas
preliminares.
Não há um marco muito objetivo para se saber quando acaba este
tratamento de ensaio e começa o "meio do tratamento". De toda forma, esse
"meio" aconteceria depois de já haver um reconhecimento inicial: sobre o
paciente, sobre sua demanda inicial e, pelo paciente, sobre o funcionamento do
método da associação livre e sobre o analista.
É importante lembrar que tudo que vamos falar nos próximos tópicos
sobre “meio do tratamento” se aplicam também ao início e ao fim do
tratamento. Não há um método diferente para cada “etapa” do tratamento. O
tratamento, inclusive, é marcado por muitas idas e vindas, sendo que a ideia
positivista de progresso precisa ser vista com cautela.
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4.1. Resistências, transferência e
contratransferência
O que entendemos é que este “meio” é normalmente a parte mais
extensa de um tratamento, onde tudo relacionado à análise pode acontecer.
Por ser mais extenso, é onde a análise se complexifica e onde ficam mais
nítidos fenômenos como:
● resistências: por exemplo, o paciente empregando os mecanismos de
defesa durante as sessões de terapia, para interditar um maior
aprofundamento sobre suas dores e seus desejos;
● transferência: haveria um fortalecimento do vínculo entre analista e
analisando, o que pode se dar tanto pelo que Freud chama de
transferência negativa (o tratamento arredio ou fechado que o
analisando pode adotar para com o terapeuta) quanto a transferência
positiva (que é o aspecto deste vínculo que favorece o analisando
sentir-se mais seguro na análise e livre-associar mais);
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● contratransferência: é possível que o analista tente implicar no seu
próprio desejo e na sua visão de mundo (do analista) o analisando.
Também é possível que o analista assuma um lugar de "conselheiro", o
que é indesejável à psicanálise.
Sobre os mecanismos de defesa (vistos em módulos anteriores), é
importante destacar que integram a vida psíquica do sujeito dentro e fora da
terapia. Quando ocorrem na terapia, costuma-se dizer que estão funcionando
como resistências à clínica.
Como regra, a contratransferência tende a ser prejudicial ao progresso
da análise, pois rompe com os princípios da neutralidade e abstinência pelo
analista. Lembrando que o analisando não precisa ser neutro, mas isso é um
princípio ou uma meta na ética do analista.
4.2. A Psicanálise Selvagem
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Em conexão com o tema da contransferência, há o que Freud chamou
de psicanálise selvagem; tal psicanálise seria aquela conduta despreparada e
apressada do psicanalista em interpretar e “oferecer respostas” ao analisando.
Além da pressa na análise, o psicanalista selvagem usa ideias de
conceitos entendidos superficialmente para definir o analisando. É nítido que a
psicanálise selvagem é um ato narcisista do analista, porque o analista se
coloca como o juiz e como a medida de todas as coisas, mesmo quando seu
conhecimento ainda se encontra em um nível raso para isso.
O psicanalista selvagem age como Procusto, no mito clássico grego,
em que as vítimas precisavam ter o tamanho exato do leito ou cama desse
carrasco:
● se fossem menores que o leito, Procusto as esticava até ficarem do
tamanho da cama;
● se fossem maiores, Procusto serrava parte de seus corpos (cabeça ou
pernas);
De um jeito ou de outro, as vítimas ficavam do tamanho exato do leito de
Procusto. Trata-se de uma alegoria da psicanálise selvagem e também da
pretensão humana de aniquilar as diferenças e as especificidades, adequando
à visão de mundo do intérprete aquilo tudo que lhe é exterior e lhe seria
desconhecido. Uma forma de reconhecer o desconhecido.
Entende-se que a contratransferência indevida e a psicanálise selvagem
são evitadas (ou atenuadas) quando o analista leva a sério sua atuação,
seguindo o método psicanalítico e seguindo seu tripé psicanalítico, mesmo
depois de formado:
● aprendendo e revisando constantemente a teoria psicanalítica, por
meio do estudo de novos cursos e livros;
● sendo supervisionado por psicanalista mais experiente, para debater
os casos que estiver atendendo; e
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● fazendo sua própria análise pessoal, para resolver suas questões, junto
a outro psicanalista.
4.3. O erro e o dado em Psicanálise
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Inicialmente, precisamos propor uma diferenciação entre erro e dado.
Nosso objetivo é demonstrar que uma posição em favor do dado é mais
propícia ao aprendizado, tanto nos estudos da linguagem quanto na
Psicanálise.
Para os objetivos deste texto, entende-se:
● Erro: o oposto de “certo” ou de “acerto”. Então, adotar uma postura
apressada de julgar algo como certo ou errado pode muitas vezes limitar
nosso aprendizado acerca não só do objeto estudado, mas também
acerca do comportamento dos sujeitos que o observam.
● Dado: elemento que possa se tornar informação e, depois,
analisado para tornar-se conhecimento. Assim, o objeto observado
não é visto como certo ou errado, mas sim como um dadopotencialmente informacional.
Não estamos aqui defendendo uma postura “isencionista”. Nossa mente
trabalha também por meio de julgamentos. E há muitas situações diárias em
que a definição de um certo ou errado é colocada a nós (mas tentemos ser
menos apressados ao atribuir essa definição).
Também não defendemos a ideia de que o dado seja independente do
sujeito: não existe dado em si, não existe dado “transparente”, pois os dados
dependem dos sujeitos que os olham. Coletar um dado em vez de outro é uma
atitude do sujeito.
Então, o dado:
● não é apenas objetivo (da coisa analisada),
● mas é também subjetivo (permeado pelo sujeito que o observa ou
mesmo que o cria).
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Se adotarmos a postura do erro ou se simplemente tentarmos
“corrigi-lo”, vamos encerrar o debate e pouco aprenderemos além do que já
sabemos. Já se adotarmos a postura do dado, vamos ter uma oportunidade de
nos perguntar sobre o que levou àquele “erro”. Esta última perspectiva
parece-nos mais adequada ao método científico.
Se o psicanalista tem seus conceitos teóricos ou morais muito
rigidamente formados, poderá julgar o analisando a partir de seus critérios
absolutos. Assim, o analista estará atento aos “erros” do analisando, isto é, às
ocasiões em que o analisando extrapole a moral do analista ou não se encaixe
aos conceitos que o analista decorou.
Por outro lado, se o analista enxerga um elemento como um dado (e
não como um erro), terá a oportunidade de lançar um novo olhar sobre o
analisando e a terapia. Assim, observará a relação do evento com outros
eventos, dentro de um sistema de valores mais contextualizado àquele
analisando.
Claro que poderá haver um certo ou um errado, quando adotamos a
postura de priorizar um dado. Mas esse certo ou errado será dentro de um
contexto do próprio analisando e será enunciado depois de atenuadas as
nossas armaduras.
Vamos pensar nas três partes da psique humana conforme propostas
por Freud na segunda tópica:
● ego: a instância de maior vocação racional, que responde para o mundo
e para o próprio ser “quem eu sou?”, que possibilita o atendimento das
demandas do mundo exterior ao ser e que também “negocia” (dentro do
possível) um “acordo de interesses” entre as duas outras instâncias;
● id: a instância que é totalmente inconsciente, pulsional, “selvagem”, uma
instância que busca a pura satisfação e que não se expressa numa
linguagem clara aos padrões da racionalidade, tampouco se submete
aos padrões de temporalidade e espacialidade.
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● superego: uma instância que é uma especialização de Freud
responsável pelos valores morais (certo/errado) e impõe ao ego uma
dimensão de sacrifício do prazer em prol dos benefícios que o ego terá
com a divisão social do trabalho, possibilitada pela vida em sociedade.
O erro, então, é inerente à psique humana. Afinal, essas instâncias da
mente não se comunicam numa mesma “linguagem” e com base em iguais
interesses. É impossível não pensar que o erro seja um fator constante na
interação entre essas instâncias.
Mesmo quem desconfie se nossa psique funciona mesmo assim, é
inegável a ideia de que temos vozes interiores discrepantes, que nos
constituem. E a existência dessas vozes configuram barreiras a qualquer ideia
de uniformidade mesmo individual, quanto mais uma ideia uniformidade entre
duas pessoas diferentes, ou na sociedade.
Algumas perguntas que servem como antídoto a esta rotulação
apressada (e também antídotos à contratransferência imprópria e à psicanálise
selvagem), e que podem ser usadas no setting analítico:
● é certo ou é errado do ponto de vista de quem?
● definir isso como errado (ou como certo) me permite aprender o quê a
respeito do objeto ou dos sujeitos?
● o que este suposto erro (ou acerto) pode me “revelar”? como posso
aprender com ele?
● como isso afeta a vida do analisando, sua vida psíquica, sua
autopercepção, seus relacionamentos?
● ao identificar algo como errado (ou como certo), estou mobilizando quais
princípios e ideologias?
● quem acha certo (ou errado)? como? para quem? por quê? quando?
quanto? quão relevante?
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4.4. Alteridade: o outro e o Grande Outro
Assim, o erro é uma possibilidade trazida pela diferença. E é um fator
de enriquecimento psíquico e social. Muitas vezes, a aniquilação do erro é um
erro ainda maior: a aniquilação da diferença e do outro. Em última instância, o
erro é o desejo de um ditador em aniquilar as diferenças relevantes, em
aniquilar a alteridade (a perspectiva de outro).
Este “outro” pode ser:
● a) O outro de nós mesmos (com “o” minúsculo), nosso
desconhecido, nosso inconsciente ou mesmo nosso id. Vimos que este
“outro” está presente na terapia. Por exemplo, quando o analisando diz
que não consegue cumprir as metas que ele mesmo se impõe. Isso
sugere haver pelo menos dois “eus”: o que quer o cumprimento da meta
(talvez um superego) e o que não quer cumpri-las (talvez um id).
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● b) O Grande Outro (com “O” maiúsculo), conforme definição de
Jacques Lacan. Para Lacan, o Grande Outro é o lugar daquilo que nos
faz dizer “eu sou, eu sei, eu quero, eu posso”. Veja que isso independe
de regras ou leis escritas, nem depende necessariamente de punição. É
o lugar do outro que é internalizado em nós e que nos orienta em nossas
decisões, nos nossos medos e desejos, até na forma com que sentimos
e nos relacionamos. Por exemplo, uma paciente pode revelar grande
apreço pelos ensinamentos de seu pai, ou de um professor, ou de um
amigo, ou de um pensador, ou de uma ideologia, ou de uma religião.
Todos esses exemplos de “heróis” ou “ideais de verdade” representam o
Grande Outro, que estabelece um ideal superegoico do que este
sujeito deve ser, fazer ou desejar.
Um exemplo do “outro” com “o” minúsculo é o do próprio analisando no
setting analítico. O analisando é, ao mesmo tempo:
● o “eu” (aquele que toma a palavra para falar com o psicanalista e que,
pelo menos em tese, busca uma “melhora” ou uma “cura”),
● mas é também o “outro” (aquele que é analisado, seu enigma, seu
sintoma).
E, como exemplo do Grande Outro na terapia: quando o paciente se
diz desvinculado de uma pessoa, uma ideologia política ou religiosa (como uma
religião ou um ideal político ou o pai) mas que pode ainda estar exercendo
inconscientemente os ditames deste Grande Outro. Assim, é como se este
Grande Outro passasse a fazer parte de seu “ideal de eu”, um superego a
reger sua conduta. Isso é internalizado na vida psíquica pela palavra (pelo
discurso, que é a palavra aplicada à vida social).
Pode até mesmo ocorrer de o psicanalista se tornar o Grande Outro
de seu paciente. Como quando o paciente tenta dizer para o analista coisas
que, na visão desse analisando, passariam pelo crivo do analista, muitas vezes
até mesmo usando o discurso e vocabulário do analista. É como se o
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analisando só se expressasse depois de refletir sobre a imagem que ele faz da
imagem que o analista faz dele (analisando). Veja que a atribuição do sujeito
suposto-saber é recorrente e, de certa forma, favorável à relação transferencial
do início de tratamento. Entretanto, o excesso pode verter esse suposto-saber
em uma autoridade ainda maior, “sagrada”, do Grande Outro.
Essa conduta via de regrainconsciente do analisando em tomar o
analista como o Grande Outro poderá ser uma resistência a ser vencida, como
uma racionalização. Vencendo-a, permite-se que o analisando revele-se mais
sobre si mesmo e sobre seu desejo.
Veja como a alteridade nos constitui como sujeitos. Isto é, nós somos
a imagem que fazemos da imagem que o (O)outro faz de nós. Isto é bastante
óbvio na cultura. A rigor, não escolhemos nossa língua materna, nem nossa
forma de nos vestir ou pensar, nem nossas crenças religiosas.
Ainda por uma linha lacaniana, podemos dizer que até mesmo o
nome-do-pai (o prenome que escolheram para nós e o sobrenome que
herdamos via de regra da linhagem paterna) é escolha que outros nos fizeram.
Portanto, já nascemos imersos em discursos (e desejos) dos outros, que
depois incorporamos como discursos (e desejos) nossos. E toda essa reflexão
estará, obviamente, presente na terapia, dentre os relatos e demandas de
nossos analisandos.
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INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
● Artigo: O Erro e o Dado em linguística e psicanálise
● Artigo: Procusto: o mito e seu leito na mitologia grega
● Artigo: Psicanálise Freudiana: 50 principais conceitos resumidos
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https://www.psicanaliseclinica.com/erro-e-dado/
https://www.psicanaliseclinica.com/procusto/
https://www.psicanaliseclinica.com/psicanalise-freudiana/
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● Artigo: Racionalização como mecanismo de defesa
● Artigo: O que é Alteridade em linguística e psicologia
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https://www.psicanaliseclinica.com/racionalizacao/
https://www.psicanaliseclinica.com/o-que-e-alteridade/
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5. Recursos e ferramentas que podem
integrar a Associação Livre
Existem alguns princípios que regem a associação livre, como vimos
anteriormente. Entretanto, não há um arcabouço rígido do que pode ser
usado no setting analítico. Por exemplo, “fazer perguntas ao analisando” é
uma técnica bastante útil para favorecer a livre associação, embora não seja
um recurso específico da psicanálise.
A rigor, quaisquer recursos que não contrariem os princípios da
associação livre e da Psicanálise podem ser usados, com o objetivo de
quebrar resistências (do analisando e do analista) e favorecer a livre
associação.
Veremos a seguir algumas ferramentas que entendemos que possam
complementar o método psicanalítico. Tais ferramentas integram uma lista não
exaustiva, isto é, são apenas exemplos.
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5.1. O recurso da Atenção Flutuante
A atenção flutuante é muitas vezes chamada de método psicanalítico, o
que a nosso ver não estaria correto. Isso porque não é algo diferente da
associação livre, mas sim é um conjunto de ferramentas ou recursos que
integram a associação livre.
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Assim, de uma forma simplificada, podemos dizer que:
● o paciente livre-associa,
● enquanto o analista mantém sua atenção flutuante.
A atenção flutuante do analista é importante para:
● minimizar a contratransferência imprópria, quando o analista não decide
ele mesmo quais temas serão tratados na análise;
● sem se prender a uma ideia fixa, o analista poderá “fisgar” ideias
lançadas pelo analisando e elaborar estruturas sistêmicas (em relação
ao que o analisando disse em outras sessões).
Estas elaborações interpretativas que o analista faz não são imposições. O
interessante é que sejam propostas (como na forma de perguntas ao
analisando). Pois, o essencial é haver tempo e elementos para o próprio
analisando realizar uma ideia sobre si, sobre sua trajetória e sobre o que virá a
ser, o que em psicanálise se chama de perlaboração.
Assim, a atenção flutuante pressupõe que o analista não se prenda a
padrões rígidos de julgamento ou de auto-certezas, nem limite assuntos fixos
que o analisando poderá trazer. Deve, sim, o analista oferecer ao analisando
uma presença atenta (com perguntas, implicações e análises) em que a
associação livre possa reverberar e ir tomando linhas de significados.
Concluímos que a atenção flutuante não é um método da
psicanálise. É, sim, um conjunto de ferramentas e técnicas que integram o
método da associação livre, como a interpretação dos sonhos e as técnicas da
maiêutica. Em contrapartida à fala livre que faz o analisando, a atenção
flutuante representa uma “escuta livre” que faz o psicanalista, por isso a
atenção flutuante rege a conduta e a ética do psicanalista no setting. E isso
integra o método psicanalítico maior da Associação Livre.
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5.2. O método socrático (maiêutica) em Psicanálise
Sabemos que a associação livre é o método psicanalítico por
excelência. Trata-se de oportunizar ao analisando o espaço seguro para falar
livremente sobre si, sua infância, suas experiências mais recentes, seus
valores, seus ideais, seus desejos e suas frustrações.
O método socrático pode ser um recurso adicional dentro do método
da livre associação. Isso porque é uma forma de ajudar a trazer avanços nesta
parte do "meio do tratamento". Não se opõe ao método da associação livre;
pode, sim, ser ferramenta adicional para favorecer a livre associação do
paciente.
Dá-se este nome a uma dinâmica conversacional inspirada no estilo
dialógico de perguntas e respostas atribuído a Sócrates, conforme relatos de
obras de Platão.
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Sócrates (470 – 399 a.C.) foi um filósofo ateniense do período clássico
da filosofia grega. Considerado um dos precursores da filosofia, inspirou tanto
Platão quanto Aristóteles.
Em pedagogia e filosofia, entende-se método socrático como sendo o
método indutivo de ensino-aprendizado e reflexão. Por este método, o
“mestre” realiza perguntas, muitas delas já de certa forma direcionadas, para
que o aprendiz responda (usando o raciocínio lógico) e chegue às suas
próprias conclusões. Supõe-se que Sócrates usava este método com seus
discípulos; algumas dessas lições chegariam até nós pela escrita de Platão,
que buscou reproduzir em partes os diálogos socráticos.
Do ponto de vista pedagógico, o método socrático (também chamado de
maiêutica socrática ou método dialógico) é interessante por:
● engajar o aprendiz no processo de ensino-aprendizado;
● ao concluir, o aprendiz psicologicamente considera o aprendizado
como sendo “seu”, potencializando a internalização desse
conhecimento.
Então, em Pedagogia, podemos dizer que um professor que seja mais
expositivo possivelmente não aplicará o método socrático. Já um professor que
elabora perguntas para os alunos responderem e a partir disso vá criando uma
elaboração indutiva de construção do conhecimento estará usando o método
socrático.
Em comparação com o método socrático, podemos dizer que existem
semelhanças e diferenças em relação ao método psicanalítico da associação
livre.
Semelhanças entre associação livre e método socrático
● a associação livre é também um método indutivo,
● a associação livre existem idas e vindas de perguntas e respostas
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● existe a elaboração psíquica-intelectual do “aprendiz” (no caso, o
analisando),
● há o suporte do “mestre” (no caso, o analista),
● é fundamental o interesse do aprendiz (analisando),
● valorizam-se as falas do analisando e a perlaboração(que é uma forma
de internalizar o autoconhecimento).
Diferenças entre associação livre e método socrático
● o analista precisa evitar direcionar o pensamento do analisando,
● não há um aprendizado final que seja igual para todos os analisandos,
● não deve haver uma ideia de sugestão moral de “certo” ou “errado” pelo
analista (apenas o analisando é medida de si),
● não há mestre/aprendiz no setting analítico (embora o analisando atribua
ao analista o lugar de sujeito suposto-saber),
● o setting terapêutico tem suas especificidades e seus objetivos
diferentes do simples ensino-aprendizado ou da “transmissão de
conceitos”.
Então, há várias semelhanças do método socrático com o método da
associação livre.
Apesar disso, é importante reforçar que o diálogo terapêutico possui
elementos diferentes a outras interações verbais (como o
ensino-aprendizado), pois existem especificidades quanto ao setting analítico,
à formação do par analítico e às técnicas próprias de manejo da resistência,
transferência e contratransferência.
O analisando não é “aprendiz” (embora estejamos todos em constante
aprendizado) e o analista não é “professor” ou “mestre”. Ainda que o
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analisando atribua este lugar de sujeito suposto-saber (de “mestre”), o analista
não deve usar desta atribuição para exercer este papel, nem para ser um
conselheiro.
Ressalte-se que, na maiêutica, muitas vezes o mestre está conduzindo o
aprendiz por um caminho falsamente livre. O mestre pode já saber as
respostas ao perguntar, sendo que suas perguntas ao aprendiz funcionariam
como se fossem perguntas retóricas. Já em psicanálise, essa condução
guiada pelo analista seria um exemplo desastroso de psicanálise selvagem e
de contratransferência imprópria.
Apesar dessas diferenças, consideramos que algumas aplicações do
método socrático (ou maiêutica) podem ser proveitosas na reflexão sobre o
fazer do método psicanalítico.
5.3. O recurso da interpretação dos sonhos
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Vimos que a psicanálise não usa mais técnicas de sugestão hipnótica,
nem usa de aconselhamentos. Costuma-se dizer que a psicanálise usa apenas
dois métodos:
● o método da associação livre pelo analisando e
● a interpretação dos sonhos.
Porém, a rigor, entendemos que a Psicanálise enquanto método
resume-se tão-somente à associação livre, porque a interpretação de
sonhos se dá na terapia e também mediada pela livre associação. Afinal, o
analisando irá falar na terapia sobre seus sonhos usando a livre associação,
como poderia falar sobre quaisquer assuntos.
Falaremos especificamente sobre a interpretação dos sonhos nos
módulos seguintes do nosso Curso de Formação. Por enquanto, nossa ideia de
trazer este tema é apontar que a interpretação dos sonhos não seria um
método diferente (muito menos discordante) do que é a Associação Livre.
Afinal, a interpretação dos sonhos (para as finalidades psicanalíticas)
aconteceria dentro da terapia, isto é, no setting analítico, entre analista e
analisando.
Não significa que o analisando conheça tudo isso de maneira consciente
(pois, como sabemos, há grande parte inconsciente). Mas, por múltiplas
aproximações e correlações sistemáticas, vai se chegando a um sistema
psíquico do analisando, com a ajuda da interpretação do psicanalista.
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5.4. O recurso da análise dos mecanismos de
acesso ao inconsciente
Vamos ampliar um pouco o que falamos no início do tópico anterior. Há
também quem entenda que a psicanálise usa de dois métodos:
● o método da associação livre pelo analisando e
● a interpretação dos sonhos, chistes, sintomas e atos falhos.
Sobre a interpretação dos sonhos, já falamos no tópico anterior. Agora,
precisamos pontuar que, a nosso ver, a interpretação de chistes, atos falhos e
sintomas não são métodos diferentes da associação livre.
Novamente, reforçamos que o método psicanalítico resume-se
tão-somente à associação livre. Afinal, a interpretação de sonhos, chistes,
sintomas e atos falhos se dá na terapia e também mediada pela livre
associação.
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A interpretação dos sonhos será aprofundada nos módulos futuros do
Curso. Já sobre os outros mecanismos de acesso ao inconsciente (chistes,
atos falhos e sintomas) serão abordados mais adiante neste Módulo. E teremos
ainda um módulo específico sobre psicopatologias, em que a temática do
sintoma será aprofundada.
Anteriormente neste Módulo, falamos sobre erro e dado em Psicanálise.
Os erros podem ser motivados por causas potencialmente inconscientes
Vamos retomar esta discussão, agora sob a perspectiva de entendermos como
o analista pode manejar esses erros como dados, com o objetivo de
quebrar resistências e propiciar novos conteúdos de análise.
Assim:
● os sonhos, tão valorizados pela interpretação dos sonhos em
psicanálise, “erram” a lógica lúcida, como ao modificar as relações de
causa-efeito, espacialidade e temporalidade;
● os chistes e os atos falhos (que abordaremos mais adiante neste
Módulo) são “erros” potencialmente reveladores do desejo etc.;
● os sintomas psicossomáticos são “erros” na forma como o corpo
converte a energia psíquica recalcada em uma manifestação
física/corporal;
● as interações entre nossas instâncias psíquicas (ego, id e superego)
não se baseiam em uma linguagem unívoca e num acordo de interesses
que tenham reais chances de resultarem num “acerto”.
Da mesma forma, especificamente quanto ao método psicanalítico:
● a associação livre, método psicanalítico por excelência, explora a ideia
de que as relações de verdade começam a ser estabelecidas quando
analista e analisando se esforçam (sem pressa) para depurar (e até
mesmo realçar) os aparentes erros e irrelevâncias que emergem da fala
do analisando no setting analítico;
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● a atenção flutuante, forma de proceder do analista no setting analítico,
pressupõe que o analista não se prenda a padrões rígidos de julgamento
ou de auto-certezas, nem limite assuntos fixos que o analisando poderá
trazer, mas oferecer ao analisando uma presença atenta (com
perguntas, implicações e análises) em que a associação livre possa
reverberar e ir tomando linhas de significados.
E estes são apenas alguns exemplos, poderíamos citar muitos outros de
como a Psicanálise valoriza o “erro” como um “dado”.
E ainda temos o Complexo de Édipo. Este complexo baseia-se na
história mítica de um erro: do filho (Édipo) que “sem querer” mata o pai (Laio)
para desposar a mãe (Jocasta). E Freud pinça este “erro” trágico como um
dado, que é compreendido como uma informação. E, depois, Freud ainda verte
esta informação em um conhecimento, ao alegorizar essa narrativa em um
Complexo útil à compreensão sobre o desenvolvimento humano.
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INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
● Artigo: O que é Complexo de Édipo? Conceito e História
● Artigo: Livro Os Chistes e sua Relação com o Inconsciente
● Artigo: Atos falhos
● Artigo: A Interpretação dos Sonhos: análise do livro de Freud
● Artigo: Atenção flutuante
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https://www.psicanaliseclinica.com/conceito-complexo-de-edipo/
https://www.psicanaliseclinica.com/chistes/
https://www.psicanaliseclinica.com/atos-falhos/
https://www.psicanaliseclinica.com/a-interpretacao-dos-sonhos/
https://www.psicanaliseclinica.com/atencao-flutuante-significado/
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6. Uma síntesesobre os Procedimentos de
Análise
Os psicanalistas praticam técnicas específicas e que se valem,
acessoriamente, de vários outros conhecimentos para atuar sobre a dinâmica
humana definida como Psíquica e que se caracteriza por ser uma realidade
absoluta de natureza intangível e idiossincrática (individualizada).
Falamos do não tangível apenas para, de saída, reforçarmos a
dificuldade do nosso trabalho, pois, se os males a que nos contrapomos são
reais, tudo o mais que temos de considerar é impalpável, simbólico e de
complexo acesso, uma vez que lidamos com o emocional e um emocional, na
maioria das vezes, desconhecido por ser inconsciente.
Nós, psicanalistas, não usamos instrumentos físicos e, tratando de
pessoas, não as tocamos, não lhes ministramos qualquer droga, nem ao
menos lhe damos conselhos. Ainda assim, os procedimentos da psicanálise
são capazes de provocar melhoras significativas e, para alguns casos, a
cura para sintomas geradores de mal-estar.
Daí dizermos que o nosso ofício é uma arte, desafiadora, é verdade, e
que, por isso mesmo, exige de nós uma total dedicação, o máximo de horas de
estudo, supervisão, pesquisa e análise pessoal.
Segundo Freud,
“Os processos psíquicos são, em si mesmos, inconscientes e os processos
conscientes são atos isolados, frações da vida psíquica total. Os processos da
vida psíquica inconsciente, são dominados, na maior parte, pelas tendências
que podem ser qualificadas de sexuais, no sentido restrito ou lato do termo.
Este último pressuposto é, na realidade, a característica fundamental da
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Psicanálise, que consiste, essencialmente, na tentativa de explicar a vida
inteira do homem e não só aquela privativa ou individual, mas também a
pública e a social, recorrendo a uma única força que é o instinto sexual ou
libido, no sentido técnico deste termo.”
Temos que ter sempre presente que, mesmo sendo dedicadamente
estudiosos, jamais teremos atingido o grau desejável de conhecimento, pois
nunca nos firmaremos num diagnóstico a partir do estudo de peças
anatômicas, nem de filmes radiográficos, nem de exames laboratoriais, nem da
descoberta de novas drogas, nem de testes psicométricos, uma vez que o
nosso paciente é um ser humano ímpar, que veio de um ambiente familiar
ímpar e que se desenvolveu ajustando-se às condições ímpares, influenciadas
pela maneira ímpar como ele entendeu o que atuou sobre ele de forma
continuada ou então lhe aconteceu por uma fração de segundo, num abrir e
fechar de olhos.
Concluindo, como sugestão para o “meio da análise”, é o psicanalista
estar atento aos sonhos, chistes, atos falhos e sintomas trazidos pelo
analisando, bem como às suas dores e desejos (diretos ou latentes).
Essas sugestões aqui permitem evitar o esvaziamento da terapia:
● refletir sobre as resistências, transferências e contratransferências
que emergem das sessões de psicanálise;
● pedir para que o analisando conte seus sonhos, e buscar possíveis
interpretações reveladoras do padrão psíquico do analisando;
● abordar os chistes e atos falhos do analisando, inclusive atos falhos
cometidos pelo paciente durante as sessões; se um paciente troca uma
palavra, esquece-se de um nome ou acha graça de alguma coisa, são
assuntos potencialmente relevantes à sua vida psíquica, sobre os quais
o psicanalista poderá perguntar;
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● aprofundar-se sobre os autodiagnósticos trazidos pelo analisando
acerca de sua condição (como “tenho depressão”, perguntando-lhe “o
que para você é ter depressão?”) e refletir sobre as causas dos
sintomas relatados pelo analisando (como fobias, angústias,
ansiedades e compulsões);
● refletir sobre os comportamentos ou “repetições” de conduta do
analisando: aquilo que ele sempre diz fazer ou como ele sempre se diz
sentir (como os hábitos, manias ou compulsões);
● refletir sobre as frustrações e os desejos do analisando (lembrando
que desejos mais profundos podem ser reconhecidos e afirmados
quando a análise já está mais avançada);
● pensar seus relacionamentos com os outros (na infância, na
adolescência, hoje…);
● refletir sobre como o analisando define a si, define os outros e como
se relaciona com os Grandes Outros de sua vida atual ou pregressa;
● refletir sobre como o analisando define certos conceitos relevantes
para sua vida psíquica (como quando o psicanalista lhe pergunta: “o
que é depressão para você?”; “você entende que havia amor neste
acontecimento que você trouxe?”).
Tudo isso pode ser feito sem perder de vista a atenção flutuante e as
perguntas inspiradas no método socrático.
Por esvaziamento, entende-se a perda do desejo do analisando em
continuar em análise, o que pode ter muitas razões.
O silêncio não é necessariamente um sinal do esvaziamento; então, o
analista não deve se preocupar em preencher cada brecha mínima de silêncio.
Muitas vezes, o silêncio é um momento de interiorização e reflexão necessário
ao analisando, para elaborar conteúdos antes abordados em terapia, ou sobre
o que de relevante ele trará depois (em palavras) para a análise.
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INDICAÇÃO DE LEITURA (OPCIONAL)
● Artigo: Recordar, repetir, elaborar
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7. Fim do Tratamento em Psicanálise e a
ideia de Cura
A ideia de cura em psicanálise pressupõe uma resolução da dor
psíquica do sujeito. Mas, será possível uma solução completa para todas as
dores psíquicas? Se partirmos das ideias de que somos sujeitos desejantes e
de que o inconsciente não pode ser totalmente acessado, sempre restará um
lugar não resolvido para as dores psíquicas.
Falar em cura em psicanálise, segundo Sigmund Freud e Jacques
Lacan, significa em certa medida falar em uma significativa melhora. Isto é,
reduzir determinados sintomas psíquicos que antes eram definidoras do sujeito
(como “eu sou muito depressivo”), em favor de um quadro de melhora em que
esse sintoma (no exemplo, “depressão”) deixe de resumir o próprio sujeito
analisando, da perspectiva desse sujeito.
Afinal, não há uma medida exata para saber se a pessoa está de fato
curada, por serem aspectos subjetivos. A autopercepção do sujeito-analisando
será fundamental.
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7.1. O que não é cura em psicanálise?
Antes de falar o que é, vamos começar falando o que não é.
A cura em psicanálise NÃO é:
● Inserir o sujeito em um esquema de normalidade ou normatividade que
seja alheio ao desejo do próprio sujeito.
● O sujeito ter domínio completo sobre si mesmo, algo impossível
exatamente pelas dimensões do inconsciente e do desejo.
● Um progresso linear (a terapia é um processo sujeito a idas e vindas).
● Uma panaceia (solução para todos os males).
● Um “ensino”, algo que se ensina a outra pessoa, nem mesmo um
analista pode ensinar a cura a um analisando.
● O analista desejar algo para o analisando, ou seja, não é dizer o que o
analisando deve desejar.
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Começamos pelas definições negativas: o que não é. Porém, sabemos
que, da perspectiva da filosofia, o conceito terá mais força se sua definição for
positiva: o que é.
Então, o que é cura em psicanálise?
Qual a definição de cura ou conceito de cura? Qual sua real
possibilidade?
Correntes psicanalíticas terão diferentes concepções sobre cura ou
melhora psíquica ou término do tratamento, como:
● Melanie Klein: uma “cura” seria elaborar sobre percepção/posição
depressiva.● Donald Winnicott: uma “cura” seria desenvolver o verdadeiro self.
● Escola da Psicologia do Ego: uma “cura” seria maior adaptabilidade do
ego às suas zonas não conflituosas.
Aprofundaremos estas três abordagens acima em outra oportunidade.
Por enquanto, vamos focar nas concepções de cura para Freud e para
Lacan.
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7.2. A cura psicanalítica para Freud
Para Sigmund Freud, o objetivo do tratamento é o que chamou de cura
prática, ou uma “melhora significativa”.
Esta cura ou melhora pode ser vista:
● por um aspecto qualitativo (mudança de estado) e
● por um aspecto quantitativo (redução do “quantum” de dor do sintoma).
Grosso modo, a psicanálise tem como objetivo tornar consciente o que
estava inconsciente, isso inclui ampliar a visão do sujeito sobre si mesmo e
sobre seu mal-estar.
Então, no processo analítico, o sintoma passa a ter uma dupla
dimensão:
● Parte consciente: possíveis causas do mal-estar vão se tornando
conhecidas; elaborar esse conhecimento a partir da personalidade do
sujeito é um dos caminhos para a melhora psíquica.
● Parte inconsciente: mesmo fazendo análise, muitos elementos
continuarão inconscientes. Afinal, é no inconsciente que está a maior
parte de nossa vida psíquica. Então, é de se supor que parte das causas
do sintoma continue não sabidas.
Mas, ainda que o sintoma não desapareça, a psicanálise ajudará o
sujeito a passar por um processo em que não se estigmatize nem se
incapacite como alguém definido pelo sintoma (reduzido ao sintoma). Isso
significa que, se um analisando chegou à clínica dizendo “sou depressivo”, um
sinal de melhora seria, ao final, ele não se definir mais assim.
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E isso, ainda que não seja uma cura em termos absolutos, será uma
melhora possível, uma cura prática ou uma cura relativa que será possível
alcançar e que vai melhorar a vida do sujeito.
Ainda para Freud, as mais importantes tarefas da psicanálise seria esta
ideia de melhora, que passaria principalmente por:
● Fortalecimento do ego: para que o ego consiga cumprir suas funções
de identidade, da ordem desejante nos conflitos entre id e superego e
das demandas da realidade externa.
● Recuperação das capacidades de amar (gozar) e realizar (trabalhar,
agir sobre o mundo).
7.3. A cura psicanalítica para Lacan
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Para Jacques Lacan, a demanda de cura vem da voz de um sofredor.
Nesse sentido, a voz do analisando é central para determinar se um tratamento
está caminhando para cura/melhora ou para piora.
O desejo é muitas vezes disforme. Uma maneira de entender o desejo
de alguém é quando esta pessoa consegue reduzir o seu desejo a uma
demanda. Por exemplo, “eu quero X”.
Cabe ao analista recolher essas demandas trazidas pelo analisando.
E, no processo clínico, elaborar essas demandas, com o objetivo que o
analisando encontre-se consigo.
Encontrar-se consigo seria, em resumo, encontrar-se com seu
desejo: reconhecer os desejos que lhe causem satisfação (ou menos tensão) e
afirmá-los.
Então, para Lacan, a cura em psicanálise é uma melhora que passa
também por um fortalecimento do ego, que pode ser expresso
principalmente por dois termos lacanianos:
● Travessia da fantasia: percurso sobre a significância e autodefinição do
próprio ser, com o sujeito sendo capaz de se afirmar como ser desejante
(“eu sou…”).
● Destituição subjetiva: no setting analítico, significa que o analisando
vai “destronar” (retirar do trono) o sujeito suposto-saber do analista;
este lugar em que, de início, o analisando colocou o analista para o bem
da análise e para a formação dos laços transferenciais.
De forma similar à destituição subjetiva, a cura ou melhora passará por
um movimento do analisando em destituir o equivalente ao sujeito
suposto-saber também de fora do setting (fora da terapia). Isso implica
deixar de reverenciar todos os outros Grandes Outros e o desejo dos outros,
colocando no lugar o desejo do próprio analisando.
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7.4. Análise terminável e interminável
Uma psicanálise pode ser interminável?
No caso específico da Psicanálise, embora costume ser uma terapia de
longo prazo, isso não significa necessariamente uma análise interminável.
Sabemos que há psicanalistas que seguem uma linha de psicanálise
breve, o que pode ser questionável e até correr o risco de uma “psicanálise
selvagem”. A psicanálise breve adota uma tese de ser possível um caminho
mais ágil para um encerramento do tratamento, focado em demandas iniciais
específicas.
Entendemos que a duração de uma psicanálise dependerá muito:
● das demandas trazidas pelo analisando e
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● da forma que ele entenda o sempre perigoso termo “progresso”.
Há analisandos que fazem análise há anos (ou mesmo décadas); em
grande medida, conseguiram resolver suas principais demandas, sentem-se
melhor, mas querem continuar fazendo análise enquanto viverem,
exatamente em razão da dimensão inesgotável que é a experiência humana.
Se certos analisandos entenderem que, apesar de sua melhora nos
aspectos mais urgentes de suas dores psíquicas, a psicanálise deverá seguir
por toda a vida, que assim o façam. Os analisandos que pensam assim
provavelmente terão uma percepção interessante sobre si e sobre a dinâmica
do método psicanalítico: novas demandas vão surgindo, o desenvolvimento
psíquico é contínuo, ninguém poderá supor estar pronto(a).
Quanto aos tipos de término de uma terapia psicanalítica, podemos
dizer que a análise pode ser:
● interrompida, quando o analisando abandona a análise, mesmo
sentindo que não alcançou a resolução sequer parcial das demandas
iniciais ou decorrentes da terapia. A interrupção pode ocorrer por
inúmeros motivos, muitas vezes ligados às resistências do analisando e
à falta de vínculo transferencial no setting analítico.
● concluída, isto é, encerrar a terapia por um caminho que se costuma
chamar de “alta”, quando o analista e o analisando convencionam que a
terapia cumpriu ao menos parte de seu propósito e que, também por
inúmeras razões, outras demandas parecem não surgir, ou o analisando
estabeleceu resistências rígidas demais para novas questões.
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7.5. Sobre o conceito de Alta
A visão de ser possível uma análise concluída é questionada por linhas
da psicanálise, que concebem que psicanalista não dá alta, só o analisado.
Porém, está ideia é um pouco reducionista, porque:
● o conceito de “alta” tem uma semântica médica; pode-se optar por não
usá-lo em psicanálise, mas usá-lo como sendo escolha do paciente,
parece-nos um desvio bastante significativo, sendo melhor falar em
interrupção, neste caso, sobretudo quando o analista (a outra parte do
par analítico) não corrobora este término;
● há técnicas (como a psicanálise breve), escolas e autores da psicanálise
que defendem a ideia de que seja possível chegar a uma situação de
“fechamento” (ainda quando prefiram não usar o termo “alta”);
● entender uma situação de fechamento por motivos de certo
esgotamento das demandas de cura do analisando em razão de sua
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melhora, ou do esgotamento do desejo do analisando com a terapia ou
até mesmo do esgotamento da capacidade do analista, não resulta em
considerar que o analisando esteja “pronto”, mas apenas considerar
que aquele par analítico cumpriu certo propósito, dadas certas
condições.

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