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PRÁTICAS DE ENSINO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Autores: Daniela Viviani Arlindo Costa Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Reitor: Prof. Dr. Malcon Tafner Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Hiandra B. Götzinger Montibeller Profa. Izilene Conceição Amaro Ewald Profa. Jociane Stolf Revisão de Conteúdo: Prof. Júlio Roussenq Neto Revisão Gramatical: Profa. Marli Helena Faust Diagramação e Capa: Centro Universitário Leonardo da Vinci 570 V859p Viviani, Daniela. Práticas de Ensino de Ciências Biológicas. Daniela Viviani; Arlindo Costa. Indaial : Grupo UNIASSELVI, 2010 125 p. il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-354-9 1. Ciências Biológicas; 2. Práticas - Biologia I. Centro Universitário Leonardo da Vinci II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (047) 3281-9000/3281-9090 Copyright © UNIASSELVI 2010 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Daniela Viviani Possui graduação em Ciências Biológicas, pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (2004) e mestrado em Biologia Vegetal, pela Universidade Federal de Santa Catarina (2007). Atuou como Orientadora de disciplinas e áreas de estudo do Centro Universitário Leonardo da Vinci e atualmente é Coordenadora dos cursos de Ciências Biológicas e Gestão Ambiental da mesma Instituição. Possui experiência na área de Educação e Botânica, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação Ambiental (EA) e Ecofisiologia Vegetal (micropropagação vegetal e germinação de pteridófitas). Na área da Educação publicou ‘A Inserção Curricular da Educação Ambiental e a Formação de Professores’ e ‘Fundamentos da Educação Ambiental’, ambos para o Programa de Pós-Graduação EAD da Uniasselvi. Arlindo Costa Possui graduação em Ciências Biológicas, pela FUNORTE E FAFI, especialista em Biologia Geral pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (1987) e mestrado em Educação e Ciências, pela Universidade Federal de Santa Catarina (1994). Atuou como Consultor na Proposta Curricular de Rio Branco-Acre (1996), Participante do grupo multidisciplinar da Proposta Curricular de Santa Catarina (1989, 1996-1998) nas disciplinas de Ciências, Química, Física e Biologia. Atua como docente em cursos de formação continuada de professores da rede pública. Leciona na Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC e Universidade do Contestado. Autor de três livros e consultor de cadernos pedagógicos na área de Biologia. Possui experiência na área de Educação (Metodologia do Ensino Superior, Didática, Metodologia do Ensino de Ciências e Prática de Ensino), além de Botânica e Microbiologia. Sumário APRESENTAÇÃO ..................................................................... 7 CAPÍTULO 1 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas ........ 9 CAPÍTULO 2 Da Teoria à Prática: Perspectivas e Orientações para a Prática Docente ........................................................ 47 CAPÍTULO 3 Planejamento e Construção de Atividades Pedagógicas em Ciências Biológicas ..................................95 7 APRESENTAÇÃO Caro(a) pós-graduando(a): A partir de agora vamos conversar sobre Práticas de Ensino em Ciências Biológicas! Este caderno de estudos foi preparado especialmente para auxiliar você, Professor(a) ou futuro Professor(a), que atuará no ensino de Ciências e/ou Biologia nos Anos Finais do Ensino Fundamental ou no Ensino Médio. Este estudo não tem a intenção de esgotar todos os conteúdos que podem ser abordados dentro da temática “Práticas de Ensino”, mas, sim, fazer uma contextualização geral do ensino de Ciências Biológicas e, por meio desta nossa conversa, propor atividades variadas a fim de construirmos uma metodologia criativa, dinâmica e participativa. Isso porque, ao contextualizarmos os conteúdos de Ciências e Biologia, estaremos lançando mão do conhecimento científico acumulado para compreender os fenômenos reais, conhecer o mundo, o ambiente, seu próprio corpo e a dinâmica da natureza. Dessa forma, o primeiro capítulo trará a você uma visão geral sobre o ensino de Ciências Biológicas. Nosso objetivo neste primeiro momento é, mediante uma reflexão, compreender a importância desta Ciência para o Ensino Fundamental e o Médio. Neste espaço vamos discutir e analisar também as relações entre o Ensino de Ciências Biológicas e a Sociedade, bem como sua importância na construção da cidadania e na formação do sujeito consciente de seu papel perante a coletividade. No segundo capítulo, iremos da teoria à prática através de perspectivas e orientações para a atuação docente. Neste momento vamos construir, juntos, a idéia de inclusão e melhoria de aulas práticas nos programas de ensino, e vamos compreender o uso das novas tecnologias e da comunicação como uma ferramenta para aumentar as possibilidades de aprendizagem de nossos alunos. Será o momento também de conhecermos e/ou revermos diferentes métodos científicos usados na área de Ciências Biológicas. Para finalizar, no terceiro e último capítulo você estudará o planejamento e a construção de atividades pedagógicas em Ciências Biológicas. É o momento de identificarmos de que maneira jogos educativos e atividades lúdicas podem ser utilizados como ferramenta de ensino/aprendizagem e propormos metodologias 8 alternativas para o ensino de Ciências Biológicas. Dessa forma, esperamos que ao final desta disciplina você consiga desenvolver uma postura reflexiva e investigativa que colabore para a construção da autonomia de pensamento e ação sua e, consequentemente, de seus educandos. Bons estudos! Os autores. CAPÍTULO 1 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer as condições em que se realiza o ensino de Ciências Biológicas, para desenvolver programas de curso adequados às condições reais de ensino. 3 Justificar a importância do ensino de Ciências Biológicas no Ensino Fundamental e Médio. 3 Relacionar os conteúdos de Ciências Biológicas buscando um aprendizado significativo e voltado para as necessidades do ser humano na atualidade. 3 Discutir as relações entre Ensino de Ciências Biológicas e a Sociedade como pressuposto para a construção da cidadania. 3 Discutir o papel da CTSA (Ciência-Tecnologia-Sociedade e Ambiente) e suas implicações para o ensino de Ciências Biológicas. 11 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Contextualização Chegamos à última disciplina do curso no qual você teve a oportunidade de estudar, entre outras, as disciplinas de Ciências Biológicas e os PCN, Didática e Avaliação no Ensino de Ciências Biológicas e Temas de Estudo em Ciências Biológicas. Neste momento passaremos para a disciplina de Práticas de Ensino de Ciências Biológicas. Dentro do campo das ciências, as Ciências Biológicas, relatadas ao longo de todo nosso estudo, devem ser entendidas como o ensino de “Ciências” para os Anos Finais do Ensino Fundamental e o de “Biologia” para o Ensino Médio. Assim, pode ser que ao longo de nosso estudo você se depare com o termo Ciências ou somente Biologia, sendo necessário analisar o contexto em que o mesmo se insere. Dessa forma, no primeiro capítulo desta disciplina faremos um breve resgate sobre a história do ensino de Ciências Biológicas para percebermos que, desde muito tempo, a humanidade busca entender como funciona a natureza. Vale ressaltar que você estudou esse conteúdo de maneira mais abrangente na disciplinade Ciências Biológicas e nos PCN. Além disso, vamos buscar compreender a importância desta Ciência para o Ensino Fundamental e Médio e, por fim, discutir e analisar as relações entre o Ensino de Ciências Biológicas e a Sociedade, bem como sua função na construção da cidadania e na formação do sujeito consciente de seu papel perante a coletividade. Reflexões Sobre o Ensino de Ciências Biológicas Desde muito tempo o homem tenta entender o meio em que vive, a natureza à sua volta e a intrincada rede de relações que existem nela. Para tanto, a Biologia, que é a ciência responsável pelo “estudo da vida” (do grego bios = ‘vida’ e logos = ‘estudo’) em toda sua complexidade, busca compreender essas relações dos seres vivos com o meio e o resultado de todas as interações realizadas nesse âmbito. Tanta complexidade não poderia ser compreendida a partir de uma só ciência. Assim, vinculadas às Ciências Biológicas muitas outras ciências surgiram, como a Botânica, Zoologia, Ecologia, Genética, Microbiologia, Paleontologia, Fisiologia entre outras. Dando continuidade a esse pensamento, podemos notar que as pesquisas e descobertas científicas são diariamente divulgadas pela mídia, sendo que os avanços das Tecnologias e a atuação cada vez mais interdisciplinar possibilitaram uma maior velocidade e exatidão nos As Ciências Biológicas estão em constante movimento, pois quanto mais é descoberto, mais questões surgem e, para resolvê- las, muitas vezes surgem novas ciências, como, por exemplo, a Bioestatística, Biotecnologia, Biologia da Conservação, entre outras 12 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas estudos biológicos. Com isso percebemos que as Ciências Biológicas estão em constante movimento, pois quanto mais é descoberto, mais questões surgem e, para resolvê-las, muitas vezes surgem novas ciências, como, por exemplo, a Bioestatística, Biotecnologia, Biologia da Conservação, entre outras. O que se pretende com o Ensino de Ciências Biológicas? Assim, partindo da ideia de que a Biologia abrange o estudo de todos os seres vivos, desde sua classificação, organização, constituição química, funcionamento, comportamento e interação com o ambiente, podemos notar que esta área de conhecimento remonta à própria história do homem. Representações de animais, lutas e estratégias de caça em pinturas rupestres são exemplos dessas observações e registros biológicos desde a pré-história. Pode-se dizer que na pré-história ainda não existia a ciência propriamente dita. Contudo, conhecimentos empíricos permitiam ao homem primitivo, em sua condição de caçador e coletor, conhecer diferentes tipos de animais e plantas e, mais especificamente, o comportamento dos animais, assim como os períodos de frutificação das espécies vegetais de que se alimentava, relacionando inclusive períodos climáticos à movimentação da fauna, ou então com épocas de frutificação de inúmeras espécies de plantas, por exemplo. (GUCHERT, 2007, p. 4). Figura 1 – Pintura Rupestre Fonte: Disponível em: <http://estounasesta.blogs.sapo. pt/2010/02/20/>. Acesso em: 15 abr. 2010. 13 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Quer saber mais? Aprofunde seus conhecimentos e faça uma pesquisa para descobrir quais foram as descobertas biológicas na Antiguidade Clássica, na Idade Média, ou ainda procure conhecer quais foram os avanços e teorias na área da Biologia do século XVII até os dias atuais. Boa Pesquisa! Caro(a) pós-graduando, o nascimento do chamado “conhecimento científico”, bem como a trajetória do ensino de Ciências no Brasil você estudou no primeiro capítulo da disciplina Ciências Biológicas e os PCNs. Para relembrar alguns dos principais eventos relacionados à linha do tempo do ensino de Ciências no Brasil, observe o quadro que segue e, se necessário, retome a leitura da disciplina anteriormente mencionada. Quadro 1 – Linha do tempo do ensino de Ciências no Brasil 1879 É fundada a Sociedade Positivista do Rio de Janeiro. Professores seguem o pressuposto de que o aluno descobre as relações entre os fenômenos naturais com observação e raciocínio. 1930 A Escola Nova propõe que o ensino seja amparado nos conhecimentos da Sociologia, Psicologia e Pedagogia modernas. A influência desses pensamentos não modifica a maneira tradicional de ensinar. 1950 Os livros didáticos são traduções ou versões desatualizadas de produções europeias, e quem leciona a disciplina são profissionais liberais. Vigora a metodologia tradicional, baseada em exposições orais. 1955 Cientistas norte-americanos e ingleses fazem reformas curriculares do Ensino Básico para incorporar o conhecimento técnico e científico ao currículo. Algumas escolas brasileiras começam a seguir a tendência. 1960 A metodologia tecnicista chega ao país, defendendo a reprodução de sequências padronizadas e de experimentos, que devem ser realizados tal como os cientistas os fizeram. 1961 Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 14 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas (LDB), passou a ser obrigatório o ensino de Ciências para todas as séries do Ginásio (hoje do 6o ao 9o ano). 1970 A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência critica a formação do professor em áreas específicas, como Biologia, Física e Química, e pede a criação da figura do professor de Ciências. Sem sucesso. 1971 A LDB torna obrigatório o ensino de Ciências para todas as séries do 1o Grau (hoje Ensino Fundamental). O Ministério da Educação (MEC) elabora um currículo único e estimula a abertura de cursos de formação. 1972 O MEC cria o Projeto de Melhoria do Ensino de Ciências para desenvolver materiais didáticos e aprimorar a capacitação de professores do 2o grau (hoje Ensino Médio). 1980 As Ciências são vistas como uma construção humana e não como uma verdade natural. São incluídos nas aulas temas como tecnologia, meio ambiente e saúde. 1982 Surge o modelo de mudança conceitual, que teve vida curta. Ele se baseia no princípio de que basta ensinar de maneira lógica e com demonstrações para que o aprendiz modifique ideias anteriores sobre os conteúdos. 2001 Convênio entre as Academias de Ciências do Brasil e da França implementa o programa ABC na Educação Científica – Mão na Massa para formar professores na metodologia investigativa. Fontes parâmetros curriculares nacionais / inovação educacional no Brasil: problemas e perspectivas, Walter Garcia (coord.) / história da educação e da pedagogia, Maria Lúcia de Arruda Aranha / formação continuada de professores de ciências no âmbito ibero-americano, L.C. Menezes (org.) / o livro didático de ciências no Brasil, Hilário Fracalanza (org.) Fonte: Disponível em: <http://origin.revistaescola.abril.com.br/ciencias/fundamentos/ curiosidade-pesquisador-427229.shtml?page=3>. Acesso em: 25 mai. 2010. Sendo assim, embora a curiosidade e a necessidade de explicar fenômenos naturais datem de muito tempo, o Ensino de Ciências Naturais (Física, Química e Biologia) de maneira formal é relativamente recente. 15 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Trazendo nossa discussão para o Ensino Médio, mais especificamente para o ensino de Biologia, podemos notar que ele é visto apenas como uma preparação para o vestibular e não como uma continuidade da Educação Básica. É preciso dar um sentido mais amplo a esse nível de Ensino. Essa visão, segundo Bizzo (2010), acaba moldando todo Ensino Médio diante das demandas específicas das camadas médias da população, que aspiram por ensino superior de qualidade, para o qual as universidades públicas são referência obrigatória. Atividade de Estudos: 1) Para você, professor ou futuro professor, quais seriam as principais funções do Ensino Médio? Você concorda com a ideia de que este nível de Ensino se resume somente a uma preparação para o vestibular? ________________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Ainda dentro dessa perspectiva é possível perceber que o ensino de Ciências/Biologia como um todo ainda encontra realidades um pouco diferentes das esperadas, como, por exemplo: atividades práticas irrelevantes, ensino formal com ênfase somente aos aspectos informativos, conforme mencionamos no parágrafo anterior, aulas meramente expositivas e não dialogadas, além de currículos impróprios. Para Luca (2007, p. 26): [...] o ensino de Ciências não está desenvolvendo capacidades e nem acompanhando a evolução dos tempos atuais; há muita ênfase nos aspectos informativos, com os alunos aprendendo por aprender e não para usar esse conhecimento; os conteúdos refletem, erroneamente, uma ciência limitada, bloqueada pelas ações restritivas do [...] o ensino de Ciências não está desenvolvendo capacidades e nem acompanhando a evolução dos tempos atuais; há muita ênfase nos aspectos informativos, com os alunos aprendendo por aprender e não para usar esse conhecimento. 16 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas determinismo, da medição, da continuidade e da ciência acabada; o conhecimento é aceito passivamente; as atividades práticas, se realmente feitas, são simples demonstrações, contrariando a prioridade do experimento sobre as leis e os princípios. Dessa forma, nesse fazer pedagógico, as escritas que se apresentam aos professores deveriam lhes suscitar essa “necessidade intrínseca” de mudanças. Caso contrário, torna-se superficial e sem sentido, sem forma e sem movimento. Os textos oficiais são introduzidos em sua origem como ‘leituras obrigatórias à prática pedagógica do professor’. Na teoria, essa leitura deveria acontecer com base em trocas, discussões, debates, reflexões entre os envolvidos nesse processo e para os quais é destinada – os professores, à medida que são documentos de ‘referência’. No entanto, na prática, os textos ficam a cargo de cada professor e não há espaço, no cotidiano, para o diálogo entre pares. Caro pós-graduando! Você provavelmente já estudou nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), mais precisamente na disciplina de “Ciências Biológicas e os PCNs”, sobre o Ensino de Ciências. Porém, neste momento, faremos um resgate rápido sobre a importância de uma leitura crítica desse documento de referência para a práxis pedagógica. No que diz respeito aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) é necessário que se tenha o cuidado e o olhar crítico referente à história, constituição, elaboração e realidade. Lembramos que são documentos de referências e não de saberes absolutos, ou melhor, únicos no diálogo com o conhecimento. Uma renovação de conteúdos não pode ser avaliada apenas pelas novas temáticas que inclui, mas pelos silêncios e esquecimentos que não inclui. Um deles pode ser silenciar aos docentes as críticas que vêm da academia, e, sobretudo dos movimentos sociais aos ideais e crenças na emancipação pelas letras, pelas ciências e pelas técnicas, pela própria escola. (ARROYO, 2008, p. 108). Os PCNs podem contribuir com a prática pedagógica escolar, porém é um dos recursos para tanto. Como ressaltado anteriormente, sua leitura por si só, No que diz respeito aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) é necessário que se tenha o cuidado e o olhar crítico referente à história, constituição, elaboração e realidade. 17 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 sem interlocutores e inter-relações, perde os possíveis sentidos e significados. De acordo com Arroyo (2008, p.108), “Os Parâmetros poderão ser engavetados, não porque não trazem elementos renovadores, mas pelas crenças ultrapassadas em que tentam legitimá-los para os docentes [...]”. Segundo César Coll e Elena Martín (2004), quanto mais amplos, ricos e complexos forem os significados construídos, isto é, quanto mais amplas, ricas e complexas forem as relações estabelecidas com os outros significados da estrutura cognitiva, tanto maior será a possibilidade de utilizá-los para explorar relações novas e para construir novos significados. Desse modo, as concepções, conteúdos e conhecimentos abordados pelos PCNs são colocações e referências de um tempo e espaço, pois foram produzidos em 2000. A leitura crítica e reflexiva do documento, assim como das demais referências, é significativa à medida que dialogue com o contexto escolar em questão. Em suma, que haja interlocução real e efetiva com o meio, sujeitos e pares de que faz parte. Vale ressaltar que os Parâmetros Curriculares Nacionais são documentos de referência e não obrigatoriedades ao contexto escolar. Seu uso necessita ser pensado como referências, sugestões e leitura no intuito de aprendizados e confecções de planejamentos significativos, e baseado no contexto e cotidiano escolar a que se destina. As Propostas Curriculares (PC) Estaduais também são documentos de referência que merecem análise criteriosa. Este documento visa nortear a prática pedagógica dos educadores na perspectiva da construção de uma escola pública de qualidade para todos. Como exemplo de PC, citamos o documento de referência para o Estado de Santa Catarina que trata da abordagem teórica e metodológica das disciplinas curriculares e disponibiliza os fundamentos que deverão embasar a ação pedagógica dos educadores. Além da fundamentação teórica e metodológica apresentada, que é o principal referencial para a práxis pedagógica dos educadores, este documento traz também uma ampla sugestão bibliográfica que irá auxiliar no aprofundamento da concepção histórico-cultural. As Propostas Curriculares (PC) Estaduais também são documentos de referência que merecem análise criteriosa. Este documento visa nortear a prática pedagógica dos educadores na perspectiva da construção de uma escola pública de qualidade para todos. 18 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Veja o que traz a PC/SC no que diz respeito aos conteúdos que devem ser ministrados no ensino de Ciências e Biologia. Acesse o site: http://www.sed.sc.gov.br/educadores/proposta-curricular?start=1 Atividade de Estudos: 1) É hora de pesquisar! Faça uma comparação entre a Proposta Curricular (PC) do seu Estado com outro no que tange aos conteúdos propostos para o ensino de Ciências e Biologia. Compare, observe se há diferença entre elas, faça uma análise geral e relate neste espaço suas conclusões. Dica: procure as Propostas Curriculares dos Estados escolhidos na página do Governo do Estado; esse documento provavelmente estará vinculado à Secretaria de Educação. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Sabendo então que as Ciências Biológicas trabalham com a compreensão de que a vida se organiza através do tempo e, conforme já mencionado, tece complexas relações de interdependência, devendo ser dada particular atenção às estabelecidas pelos seres humanos, os conhecimentos biológicos não podem ser dissociados dos sociais, políticos, econômicos e culturais. Dessa forma, énosso papel como agentes mediadores na área das Ciências Biológicas pesquisar e proteger o ambiente e a vida, informar e conscientizar devidamente a sociedade, garantindo que o conhecimento seja repassado e 19 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 compreendido. É nossa função também transmitir a ideia de que nós, simples seres, não tecemos a teia da vida e sim somos parte integrante dela, cabendo a nós a aplicação de nossos conhecimentos não em benefício próprio, mas contemplando também o ambiente em que vivemos e as outras formas de vida. a) Por Que e Para Quem Ensinar Ciências Biológicas Nosso objeto de estudo, ao nos dedicarmos às Ciências Biológicas, é a vida e isso inclui seus vários níveis de organização. Esses níveis podem ser entendidos como um conjunto de entidades, sejam elas átomos, moléculas, células, tecidos, órgãos ou até mesmo espécies, agrupadas de forma hierárquica, com uma escala crescente de complexidade. Dessa forma, o estudo de Ciências e/ou Biologia deve levar o aluno a um maior respeito pela vida e as suas expressões. Assim, nosso objetivo, ao ensinar Ciências Biológicas, é fazer com que nossos alunos reconheçam o valor dessa ciência na busca do conhecimento e utilize-se dele no seu cotidiano. Extra, extra!!! Preste atenção nestas notícias!!! O estudo de Ciências e/ou Biologia deve levar o aluno a um maior respeito pela vida e as suas expressões. Assim, nosso objetivo, ao ensinar Ciências Biológicas, é fazer com que nossos alunos reconheçam o valor dessa ciência na busca do conhecimento e utilize-se dele no seu cotidiano. Bactéria contra dengue - 06/04/2010 Uma bactéria que pode bloquear a duplicação do vírus da dengue em mosquitos foi descoberta por cientistas da Universidade do Estado de Michigan, nos Estados Unidos. Divulgado em: http://biologias.com/noticias/665/ Bacteria-contra-dengue Uso de dopamina pode reverter estados vegetativos – 14/04/2010 Estudo visa determinar se a apomorfina poderia acelerar a recuperação de certos tipos de traumas cerebrais. Divulgado em: http://www2.uol.com.br/sciam/noticias/ uso_de_dopamina_pode_reverter_estados_vegetativos. html 20 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Notícias como essas são veiculadas diariamente nos meios de comunicação, e é dessa forma que o ensino de Biologia deve buscar dar significado ao conhecimento científico, criando instrumentos para que o aluno, diante de situações reais, seja capaz de se posicionar, ou pelo menos elaborar argumentos fundamentados a favor e contra os fatos apresentados. Trata-se, portanto, de organizar o conhecimento de uma forma contextualizada, a partir de situações de aprendizagem que partam de situações de vivência e referências do aluno, e que lhe permita adquirir um instrumental para agir em diferentes situações do cotidiano, ampliando a compreensão sobre a realidade (SOUZA; SILVA; DOTTORI, 2010). Vale destacar neste momento que o educando deve ser visto como participante ativo na produção do conhecimento, do qual se apropria, e não somente como receptor de um saber que lhe possa ser meramente transmitido. Sabemos que grande parte do conhecimento, em nosso caso específico Ciências Biológicas, é mediado de maneira formal nas escolas. Assim, precisamos conhecer e compreender alguns pontos fundamentais sobre a escola e a educação escolar. A educação escolar, direito assegurado por lei, tem papel fundamental no desenvolvimento dos indivíduos. Ela tem por princípio auxiliar e contribuir plenamente para o crescimento cognitivo e afetivo dos sujeitos envolvidos de forma crítica, reflexiva, autônoma e consciente. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), lei nº 9.394/96 afirma que (BRASIL, 1997): O educando deve ser visto como participante ativo na produção do conhecimento, do qual se apropria, e não somente como receptor de um saber que lhe possa ser meramente transmitido. DNA coletado na Sibéria sugere espécie humana desconhecida – 12/04/2010 Pela primeira vez, pesquisadores descrevem novo tipo de ancestral humano com base no DNA em vez da anatomia. Divulgado em: http://www2.uol.com.br/sciam/noticias/ dna_coletado_na_siberia_sugere_especie_humana_ desconhecida.html 21 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Nesse sentido, a escola é local privilegiado para mediação e apropriação da educação escolar, propiciando desenvolvimento e crescimento pleno aos sujeitos que dela fazem parte. Segundo Penteado (2000, p. 16), A escola é, sem sombra de dúvida, o local ideal para se promover este processo. As disciplinas escolares são os recursos didáticos através dos quais os conhecimentos científicos de que a sociedade já dispõe são colocados ao alcance dos alunos. As aulas são o espaço ideal de trabalho com os conhecimentos e onde se desencadeiam experiências e vivências formadoras de consciências mais vigorosas porque alimentadas no saber. Porém, a defesa do direito à educação plena a todos os cidadãos, sendo a escola o local privilegiado para tanto, não tem sido suficiente para que na prática esse direito se concretize. Corroborando, Medina; Santos (2000, p.18): A educação deverá liberar-se da fragmentação imposta pelo paradigma positivista e sua racionalidade instrumental e econômica, bem como de seus estreitos pontos de vista; atualizar-se em relação ao conhecimento produzido pelos mais importantes cientistas, artistas e humanistas de nossa época é unir forças com outras instituições sociais visando à construção de um mundo mais humano e sustentável [...]. As propostas pedagógicas precisam ser claras, planejadas, interdisciplinares e mediadas pelos sujeitos integrantes do contexto escolar – professores. Como um todo, o contexto escolar esboça diferentes olhares, falas, discursos, ritmos e conhecimentos. Por isso, a riqueza e vida pertencente à escola, às vezes, é ofuscada pela fragmentação e homogeneização de conteúdos, do conhecer. Neste contexto, ensinar Ciências e/ou Biologia deve ir além de uma transmissão de conceitos e conteúdos. Nós, como mediadores, precisamos preparar nossos alunos a agir de forma crítica diante de questões como: bioética, alimentos transgênicos, biodiversidade, preservação dos recursos naturais e as políticas ambientais, biologia molecular, a descoberta de novas espécies ou novos fósseis que confirmam ou modificam as ideias sobre a evolução da vida. Conhecer, refletir e saber posicionar-se diante dessas e outras questões também faz parte desse aprendizado. A escola é local privilegiado para mediação e apropriação da educação escolar, propiciando desenvolvimento e crescimento pleno aos sujeitos que dela fazem parte. 22 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Para Borges e Moraes (1998, p.15), “Aprender Ciências é aprender a ler o mundo”. Esses autores trazem em sua obra contribuições para o ensino de Ciências nos Anos Iniciais. Porém, ao observarmos a figura que segue, onde são apresentadas algumas razões para este ensino, podemos empregar e/ou adaptar o desenvolvimento dessas inteligências, competências e habilidades para os Anos Finais do Ensino Fundamental e também para o Ensino Médio. Figura 2 – Aprendizagem de Ciências e leitura do mundo Fonte: Borges e Moraes (1998, p. 17). Atividade de Estudos: 1) Escolha uma das contribuições do Ensino de Ciências apresentadas na figura 2 e disserte sobre ela, relacionando-a com as suas atitudes como professor ou futuro professor desta área de conhecimento. “Aprender Ciências é aprender a ler o mundo” (Borgese Moraes, 1998, p. 15)) 23 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ Podemos dizer então que a função social do Ensino de Ciências/ Biologia deve ser a de contribuir para ampliar o entendimento que o indivíduo tem da sua própria organização biológica, do lugar que ocupa na natureza e na sociedade e das possibilidades de interferir na dinamicidade dos mesmos, através de uma ação mais coletiva, visando à melhoria da qualidade de vida (SANTA CATARINA, 1997). Sendo assim, ao ensinar Ciências Biológicas espera-se que o educando seja capaz de refletir e agir criticamente frente às várias questões que envolvem essa ciência, por meio da observação, identificação, comparação, análise e síntese, além, é claro, de utilizar o conhecimento biológico para aprimorar-se humanamente, agindo sempre de maneira equilibrada com seus interesses e capacidades. b) A Formação e o Perfil do Professor de Ciências Biológicas [...] Sou professor pela boniteza de minha própria prática, boniteza que dela some se não cuido do saber que devo ensinar, se não brigo por este saber, se não luto pelas condições materiais necessárias sem as quais meu corpo, descuidado, corre o risco de se amofinar e de já não ser o testemunho que deve ser de lutador pertinaz, que cansa, mas não desiste. Boniteza que se esvai de minha prática se, cheio de mim mesmo, arrogante e desdenhoso dos alunos, não canso de me admirar. Paulo Freire Algumas partes desta seção, no que tange ao conteúdo ‘Formação de Professores’, são abordadas na publicação ‘A Inserção da Educação Ambiental e a Formação de Professores’, disciplina do curso de Pós-Graduação em Gestão e Educação Ambiental Sendo assim, ao ensinar Ciências Biológicas espera- se que o educando seja capaz de refletir e agir criticamente frente às várias questões que envolvem essa ciência, por meio da observação, identificação, comparação, análise e síntese, 24 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas elaborada pela professora Camila P. da Costa. Se o tema lhe interessou, acesse a dissertação de Mestrado “Uma experiência de mediação na leitura da proposta curricular de Santa Catarina” e leia o texto completo, no site: http://www.ppge.ufsc.br/ferramentas/ferramentas/tese_di/arquivos/61. pdf O sujeito, desde seu nascimento, vê-se imerso em uma sociedade pré- existente e da qual faz parte, decorrendo daí toda a sua formação. A sua existência constitui-se e é constituída por uma visão social, historicamente construída. Assim sendo, as relações que estabelece com o meio que o rodeia e as interações que realiza com os sujeitos pertencentes a essa realidade fazem parte de sua constituição, de seu processo de construção humana. Vale ressaltar que o ser humano não se constitui somente na relação com o social, como diz Paulo Freire (2003, p. 93), “[...] nem somos só o que herdamos nem apenas o que adquirimos, mas a relação dinâmica, processual do que herdamos e do que adquirimos”. Quando se apresenta a questão “somos e fazemos parte da nossa história” não se pode ignorar a marca cultural e histórica de identificação e, sim, partir desse conhecimento e ir em busca de mudanças significativas na realidade. Isso quer dizer que nossa identidade se constitui na relação que estabelecemos com o contexto cultural em que vivemos e em nossa própria imersão nesse contexto. A partir dessa fala inicial, que explicita a constituição do sujeito, iniciamos a discussão de aspectos culturais e históricos intrínsecos à formação do professor, em especial o professor de Ciências/Biologia, pontos importantes para compreendermos a realidade atual. A literatura da área informa que há poucos séculos, mais precisamente no século XIX, o ensino formal dava-se prioritariamente em instituições relegadas à Igreja e a seus sacerdotes. É com a progressiva instituição do ensino formal laico que a imagem do professor – de sacerdote - passou a ser constituída, então, em outro contexto, trazendo, no entanto, características que antes lhe eram atribuídas. Ou seja, essa imagem “[...] cruza as referências ao magistério docente, ao apostolado e ao sacerdócio, com a humildade e obediência devidas aos funcionários públicos [...]” (NÓVOA, 1995, p.16). O contexto muda, os papéis mudam e as formas de poder trocam de lugar. O que antes era legitimado pela Igreja, passa a ser conferido ao Estado. Decorrente disso, os conflitos aumentam e tomam dimensões políticas e ideológicas maiores. 25 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Novas escolas são criadas, assim como muda a função do professor e sua formação, professores estes que “[...] não devem saber de mais, nem saber de menos, não se devem misturar com o povo, nem com a burguesia; não devem ser pobres, nem ricos; não são (bem) funcionários públicos, nem profissionais liberais, etc” (NÓVOA, 1995, p.16). E é sob essa indefinição construída, de cunho autoritário, que uma identidade de professor vai imergindo na falta de definição do Estado e da própria sociedade. O professor sabe o que “convém” e ensina o “necessário” na situação que se apresenta. E desse modo, ao longo das décadas, o professor e sua formação vêm se constituindo. De acordo com Cavaco (1995, p.188): O sistema do ensino herdou do passado o fechamento à diversidade, o elitismo, a submissão aos formalismos sociais e acadêmicos, o sentido de tradição e da continuidade. Adapta- se mal [...] à necessidade de alargar e generalizar a formação a todos, de aceitar e de gerir novos saberes, por desvios gerou a massificação, a regularidade e o conformismo. A formação pela qual a profissão de professor vai se estruturando, como ressaltada historicamente nos parágrafos anteriores, é ainda permeada por valores de desprestígio. Kleiman (2001, p. 42) ressalta [...] que as professoras são vítimas de uma situação cruel, pois sua introdução tardia na cultura letrada não lhes permitiria se sentir seguras quanto a seu lugar no grupo. Elas não se percebem a si mesmas, nem são percebidas pelos demais [...] como membros legítimos dos grupos letrados [...]. A situação de desprestígio agrava-se na medida em que o trabalho do professor é intensificado em sala de aula, porém sem condições mínimas de realização, quer para uma prática pedagógica qualificada, quer para recompensa financeira. Tal sobrecarga vem prejudicando, dentre outros aspectos, a formação continuada desse profissional e a própria prática docente. Carvalho, Nacarato e Varini (1998, p. 87-88) alertam para o seguinte fato: Essa intensificação pode contribuir para o aumento de uma desqualificação intelectual do docente, pois, ao ter que cumprir mais essas tarefas [preenchimento de relatórios bimestrais e individuais, número excessivo de aulas,] [...] reduz o seu tempo disponível para estudos individuais ou em grupos, participação O professor precisa saber o conteúdo e como ensiná-lo, adequar-se às mudanças, conhecer as diferentes realidades, trabalhar com as diferenças, avaliar o processo de ensino e aprendizagem levando em conta a realidade do aluno, da escola, as questões afetivas e cognitivas, atualizar- se teoricamente, relacionar teoria e prática em sala de aula. 26 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas em grupos, participação em cursos ou outros recursos que possam contribuir para sua qualificaçãoe favorecer o seu desenvolvimento profissional. O professor precisa saber o conteúdo e como ensiná-lo, adequar-se às mudanças, conhecer as diferentes realidades, trabalhar com as diferenças, avaliar o processo de ensino e aprendizagem levando em conta a realidade do aluno, da escola, as questões afetivas e cognitivas, atualizar-se teoricamente, relacionar teoria e prática em sala de aula. Considerando todos esses saberes e habilidades que lhe são requeridos, resta a pergunta: Por que a figura do professor, em sua prática, perdura como solitária e sobrecarregada pedagogicamente? Atividade de Estudos: 1) Até agora vimos um pouco da história da profissão-professor. Você acredita que a mesma contribuiu, ou não, para a constituição da escola na atualidade? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ___________________________________________________ Não se trata de apontar culpados para essa realidade educacional, mas, sim, refletir sobre o cotidiano desse professor que exerce a profissão de modo solitário, sem interlocutores para a discussão dos conflitos, dos modos pelos quais se apresentam as realidades e os desafios com os quais se depara. Propostas pedagógicas são apresentadas. Livros, referênciais teóricas, produções científicas, documentos oficiais são disponibilizados, mas o que se vê nas escolas é que, por vezes, ficam nas estantes, ou são lidos sem que ocorram possibilidades de diálogos sobre eles. Um conhecimento construído isoladamente tem suas repercussões limitadas, porém quando construído de forma conjunta, através de diálogos, discussões, interações entre pares e em contexto mais amplo, quando Um conhecimento construído isoladamente tem suas repercussões limitadas, porém quando construído de forma conjunta, através de diálogos, discussões, interações entre pares e em contexto mais amplo, quando socializadas as descobertas, torna-se rico e significativo para a formação docente. 27 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 socializadas as descobertas, torna-se rico e significativo para a formação docente. Corroborando Carvalho, Nacarato e Varini (1998, p. 101), há [...] a necessidade de os docentes, no seu ambiente de trabalho, formarem grupos para uma reflexão crítica e sistemática de sua prática, considerando o contexto no qual estão inseridos e visando ações/projetos de intervenção no cotidiano com objetivo de melhoria dessa prática. São estas características que constituem um professor-pesquisador, reflexivo e profissional. A pesquisa, a busca e o conhecimento são quesitos indispensáveis à realidade que se pretende atingir na formação de professores, e, desse modo, acredita-se que a reflexão-crítica do professor irá se construindo. A formação não é um “acúmulo” de cursos e leituras, mas de trocas, reflexões e interação com outros sujeitos para a prática pedagógica, a prática docente e também para o desenvolvimento pessoal. Formação pensada no professor-pesquisador. Nóvoa (1995, p. 25) acrescenta: A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. (OLHO) Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência. O cotidiano, portanto, é parte integrante desse processo de construção do conhecimento, e formação docente, pois não há como dissociar a teoria crítica que construímos e a prática que sob ela é concebida. Trata-se de uma relação dialógica entre “saberes e fazeres”, o lido e o feito. A formação pensada somente no aspecto teórico perde a função significativa para o fazer pedagógico. [...] é inviável o trabalho formador, docente, que se realize num contexto que se pense teórico, mas, ao mesmo tempo, faça questão de permanecer tão longe do, e indiferente ao, contexto concreto, do mundo imediato da ação e da sensibilidade dos educandos (FREIRE, 2003, p. 27). Entende-se, então, como necessária uma formação preocupada com a profissão-professor, voltada para a sua realidade, para a prática pedagógica de sala de aula; atenta ao letramento desse professor, ao caráter político e ideológico do contexto em que está inserido, à afetividade que desenvolve, ao significado crítico e reflexivo e ao sentido que atribui ao contexto no qual está inserido. Para tanto, a formação continuada de professores deve ter como foco o sujeito que dela faz parte – o professor. Se pensarmos no processo de ensino- 28 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas aprendizagem, na importância e significado de partirmos do conhecimento prévio do aluno, o mesmo é válido ao pensar a formação dos professores. Ou seja, é necessário que se pense e se faça uma formação significativa para o professor, no intuito de que ele seja sujeito desse processo e se sinta parte dele. É necessária, portanto, a mediação no processo de formação do professor. Atividade de Estudos: 1) Pensando na formação continuada de professores, o que é necessário para uma formação de qualidade e significativa? ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ ______________________________________________________ Esse pensar a formação de professores de Ciências/Biologia é um tema de suma importância no contexto escolar, à medida que somos e fazemos parte de nossa história. Se somos e fazemos parte de nossa história é necessário que conheçamos significativamente o meio ambiente à nossa volta, uma vez que só gostamos e respeitamos aquilo que conhecemos. O Professor de Ciências, talvez mais do que seus colegas de outras áreas, deve despertar nas crianças e jovens a curiosidade pelas coisas do mundo, pelos seus processos e fenômenos, fazendo o mesmo em relação ao homem e aos outros seres que habitam o planeta; assim, estará desenvolvendo nos seus alunos a autonomia, estimulando- lhes o rigor intelectual e criando as condições necessárias para o sucesso deles no campo do conhecimento, tanto ao nível da educação formal, quanto da educação fora da escola e daquela que necessitam durante toda a sua vida (PROPOSTA CURRICULAR/SC, 1998). Vale lembrar que o Professor de Ciências/Biologia, por melhor preparado que seja, não pode pretender dominar todos os conteúdos ou toda O Professor de Ciências, talvez mais do que seus colegas de outras áreas, deve despertar nas crianças e jovens a curiosidade pelas coisas do mundo, pelos seus processos e fenômenos, fazendo o mesmo em relação ao homem e aos outros seres que habitam o planeta. 29 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 a ciência especializada, em termos do domínio dos conhecimentos científicos, das técnicas e tecnologias mais avançadas (SANTA CATARINA, 1997). Esse conhecimento deve ser construído juntamente com seus educandos, e que assim professor e aluno sejam pesquisadores que formulem suas próprias questões, lancem hipóteses, façam buscas bibliográficas, elaborem conceitos, realizem experimentos, enfim, busquem juntos a realizaçãode um ensino ativo. Observe na figura 3, quais os conhecimentos que os professores de Ciências precisam saber e fazer. Figura 3 – O que deverão “saber” e “saber fazer” os professores de Ciências Fonte: Gil-Pérez e Carvalho (2006, p. 19). Faz sentido esperar que nós consigamos possuir tantos conhecimentos quanto os apresentados? Os mesmos autores que sintetizam os oito aspectos apresentados na figura anterior, o que os professores de Ciências devem “saber” e “saber fazer” para ministrar uma docência de qualidade, relatam que o trabalho docente não deve ser uma tarefa isolada e nenhum professor deve se sentir vencido por um conjunto de saberes como os apresentados que, com certeza, ultrapassam as possibilidades de um ser humano. Portanto, a essência desta discussão é que se possa ter um trabalho coletivo em todo o processo de ensino-aprendizagem. [...] a complexidade da atividade docente deixa de ser vista como um obstáculo à eficácia e um fator de desânimo, para tornar-se um convite a romper com a inércia de um ensino monótono e sem perspectivas, e, assim, aproveitar a enorme criatividade potencial da atividade docente. Trata- se, enfim, de orientar tal tarefa docente como um trabalho coletivo de inovação, pesquisa e formação permanente (GIL-PÉREZ; CARVALHO, 2006, p. 18). [...] a complexidade da atividade docente deixa de ser vista como um obstáculo à eficácia e um fator de desânimo, para tornar-se um convite a romper com a inércia de um ensino monótono e sem perspectivas, e, assim, aproveitar a enorme criatividade potencial da atividade docente. 30 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Desse modo, a mediação do processo ensino-aprendizagem deve acontecer na relação com as realidades de todos os envolvidos no processo de educar, na educação escolar. O professor tem o papel fundamental nesse sentido – o de mediador desse processo. E para ser mediador é necessário ter se apropriado dos conhecimentos necessários para tanto. Daí urge a necessidade de formações inicial e continuada de qualidade e permanentes. No que se refere à formação continuada e permanente do professor, sugerimos a leitura: IMBERMÓN, Francisco. Formação permanente do professorado: novas tendências. Trad. Sandra TrabuccoValenzuela. São Paulo: Cortez, 2009. PIMENTA, S.G. Formação de professores: identidade e saberes da docência. In S.G. Pimenta (Org.), Saberes pedagógicos e atividade docente. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2005. c) A Prática Interdisciplinar e o Professor Pesquisador Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade. Paulo Freire O ensino por pesquisa, no que se refere ao papel do professor, tem como indicadores: • o professor como problematizador de saberes; • o professor como organizador do processo de partilha, interação e reflexão crítica, ou seja, promove debates sobre situações problemáticas, fomentando a criatividade e o envolvimento dos alunos. Antes de abordarmos sobre o professor pesquisador, faremos uma rápida passagem pela Interdisciplinaridade. Pensar interdisciplinariamente é pensar o conhecimento como um todo, respeitando suas especificidades; é romper com a fragmentação dos conteúdos e conhecê-los por inteiro. Pensar interdisciplina- riamente é pensar o conhecimento como um todo, respeitando suas especificidades; é romper com a fragmentação dos conteúdos e conhecê-los por inteiro. 31 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 O professor, mediador do processo de ensino-aprendizagem, precisa preparar- se e pensar sua prática pedagógica no todo (conhecimento do todo), levando em conta as partes (realidade e conhecimentos dos sujeitos envolvidos no processo educativo). A prática interdisciplinar pressupõe uma desconstrução, uma ruptura com o tradicional e com o cotidiano tarefeiro escolar. O professor interdisciplinar percorre as regiões fronteiriças flexíveis onde o “eu” convive com o “outro” sem abrir mão de suas características, possibilitando a interdependência, o compartilhamento, o encontro, o diálogo e as transformações. Esse é o movimento da interdisciplinaridade caracterizada por atitudes ante o conhecimento (TRINDADE, 2008, p. 82). A interdisciplinaridade escolar, para se tornar efetiva no contexto da escola, deve ser concebida em três níveis: curricular, didático e pedagógico. No nível curricular é necessário pensar as ligações entre os conteúdos escolares. No nível didático é o momento de planejar e articular as ligações entre esses conteúdos e conhecimentos escolares. E no nível pedagógico é o momento de atualização didática. Permitir que cada aluno se transforme em “cientista” significa considerá-lo também como protagonista do processo de ensino e aprendizagem. O professor já não possui mais o papel de detentor de todas as possibilidades e nuances do saber. O conhecimento não é julgado estático, mas em constante transformação. As aulas consideram o avanço científico provocado pela diversidade de pesquisas que diariamente alcançam novos resultados, sobretudo pelo vasto aparato tecnológico destinado para este fim, disponíveis em grande parte do planeta (JOSÈ, 2008, p. 90). Retomando sua história escolar, reflita como eram as relações entre as disciplinas escolares, entre os conteúdos escolares. De que modo eles faziam parte no contexto escolar de sua época? Atividade de Estudos: 1) Que práticas conduzem a um maior inter-relacionamento entre o mundo vivido pelo educando e os conteúdos a serem abordados 32 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas no ensino de Ciências/Biologia? Como introduzi-los? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Eleja um artigo de revista científica que possa ser trabalhado na sala de aula, descrevendo os conteúdos abaixo: ZABALA, Antoni (org.) Como trabalhar os conteúdos procedimentais em aula. 2. ed. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. Na prática interdisciplinar todos fazem parte do processo. Todos constroem e (re)constroem a prática todos os dias e nos momentos de mediações e interações. É nas trocas estabelecidas, e nos olhares ao longo dessas trocas, que a interdisciplinaridade transita e caminha. Conteúdos atitudinais Conteúdos procedimentais 33 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 O sentido de olhar interdisciplinar vai além do sentido da visão cuidada, da observação curiosa. Está presente em todos os sentidos e também no silêncio. Um olhar que fala, que ouve, que vê, que percebe com a pele e com o cheiro e tenta olhar o que, aparentemente, não se mostra. O olhar que dialoga, (MIRANDA, 2008, p. 121, grifo nosso). Atividade de Estudos: 1) Estudamos sobre interdisciplinaridade. Para você, quais as atitudes favoráveis à construção de uma prática interdisciplinar? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) O professor de Ciências/Biologia como mediador não é facilitador, não é observador. Deve ir além da atuação específica de ensino; deve levar o aluno a pensar, elaborar os fatos, fenômenos, relações, generalizar.Relacione cinco atividades na área de Ciências/ Biologia em que estejam a postura interacionista, o papel mediador do professor e, acima de tudo, a prática interdisciplinar. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Assim, relembrando alguns pontos que já vimos anteriormente, para que a interdisciplinaridade se efetive no processo ensino-aprendizagem o professor tem papel fundamental na mediação desse processo. Para ser mediador é preciso ter se apropriado dos conhecimentos necessários para tanto. Daí surge a necessidade de formações inicial e continuada de qualidade, além da percepção do próprio professor quanto à sua natureza de pesquisador. 34 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Paulo Freire (1996, p. 29) destaca que “o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa”. Nota-se nesse contexto que não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino, sendo que ambos se complementam e proporcionam ao professor aliar teoria e prática em sua práxis pedagógica. Analisando o desafio de educar pela pesquisa, Demo (2005, p. 5) destaca que essa proposta, de educar pela pesquisa, tem pelo menos quatro pressupostos cruciais, conforme pode ser observado na figura 4. Figura 4 – Educar pela pesquisa Fonte: Demo (2005, p. 6). Perceba que o autor apresenta que a educação pela pesquisa é a educação tipicamente escolar. Ele ressalta que a própria vida é um espaço naturalmente educativo, assim como a família, os amigos, o ambiente de trabalho, à medida que essas relações induzem à aprendizagem. Porém, esses espaços ou agentes educam através de outros métodos que não sejam a pesquisa propriamente dita, como é o caso da escola. Paulo Freire (1996, p. 29) destaca que “o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa”. 35 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Algumas páginas acima, quando estudamos o tópico “Por que e para quem ensinar Ciências Biológicas”, resgatamos alguns pontos importantes sobre a educação escolar. Portanto, se necessário, faça uma nova leitura agora com um enfoque voltado para a percepção da importância da educação formal ou educação escolar no processo de construção do educar pela pesquisa. Na constante busca pelo conhecimento, o trabalho docente sem a pesquisa fica seriamente comprometido porque é através da pesquisa que conseguimos conhecer e/ou assumir uma nova postura frente aos grandes desafios no processo ensino-aprendizagem. A partir disso, notamos que o professor que adota uma postura crítica frente aos conteúdos que pretende trabalhar com seus alunos está articulando seu currículo a favor da aprendizagem e não restringindo seu trabalho ao mero repasse de informações, como já apresentamos em outro momento desta disciplina. Unir ensino e pesquisa significa caminhar rumo a uma educação integrada, envolvendo estudantes e professores numa criação do conhecimento comumente partilhado, ou seja, é questão fundamental tornar a pesquisa uma ação cotidiana no professor e no aluno, desmitificando o paradigma de que a pesquisa pode ser realizada somente por uma casta especial de ‘pesquisadores’. Ainda analisando os pressupostos apresentados na figura anterior, quando o autor traz a educação como um processo de formação da competência humana histórica, podemos apreender que “a pesquisa deve ser usada para colocar o sujeito dos fatos, para que a realidade seja apreendida e não somente reproduzida” (CUNHA, 2006, p. 32). Isso significa sair da condição de objeto e adotar uma postura crítica, consciente, reflexiva e que se reconstrói permanentemente pelo questionamento. Veja o que diz Nóvoa (2010, SP) em uma entrevista, quando indagado sobre o “Professor Pesquisador”: [...] o professor pesquisador é aquele que pesquisa ou que reflete sobre a sua prática. [...] é um professor indagador, que é um professor que assume a sua própria realidade escolar como um objeto de pesquisa, como objeto de reflexão, com objeto de análise. Mas, insisto neste ponto, a experiência por si só não é formadora. John Dewey, pedagogo americano e sociólogo do princípio do século, dizia: “quando se afirma que o professor tem 10 anos de experiência, dá para dizer que ele tem 10 anos de experiência ou que ele tem um ano de experiência repetido 10 vezes”. E, na verdade, há muitas [...] o professor pesquisador é aquele que pesquisa ou que reflete sobre a sua prática. [...] é um professor indagador, que é um professor que assume a sua própria realidade escolar como um objeto de pesquisa, como objeto de reflexão, com objeto de análise. 36 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas vezes esta ideia. Experiência, por si só, pode ser uma mera repetição, uma mera rotina, não é ela que é formadora. Formadora é a reflexão sobre essa experiência, ou a pesquisa sobre essa experiência. Para ler a entrevista na íntegra, acesse o endereço eletrônico: http://www.tvebrasil.com.br/salto/entrevistas/antonio_novoa.htm. A partir do que estudamos, podemos observar que o professor, além de se reconhecer como pesquisador, tem papel fundamental na orientação de seus educandos no que concerne ao incentivo e/ou estímulo à pesquisa em âmbito social e intelectual de desenvolvimento. O objetivo dessa orientação no processo ensino-aprendizagem é justamente o de tornar seus alunos parceiros de trabalho, para que eles possam ser ativos, participativos e produtivos no processo. Pedro Demo, em sua obra “Educar pela Pesquisa” (2005, p. 33-34), destaca que o professor deve orientar o aluno permanentemente para alguns aspectos, conforme apresentado na figura 5. Figura 5 – Orientações do Professor Fonte: Demo (2005, p. 34). Pode ser que neste momento surjam algumas dúvidas ou inquietações a você, professor ou futuro professor, no que tange a sua atuação profissional. Será que conseguirei ser professor pesquisador? Será que o ambiente escolar me proporciona subsídios para realizar pesquisa em sala de aula? Há reconhecimento para a pesquisa escolar? Todas essas indagações serão respondidas se alcançarmos um ensino que favoreça a produção do conhecimento através do estudo, coleta de dados e reflexão. Para tanto Cunha (2006, p. 32) ressalta que: 37 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 Essa concepção exige que a pesquisa deixe de ser um mito para ser uma prática acessível, em suas proporções, a todo professor e a todo aluno. Isto não significa abandonar o rigorismo, mas sim despi-la do aparato burocratizante que a visão positivista nos legou, com o intuito de proteger a ciência para poucos iniciados em seus postulados e normas. Portanto, para que a educação pela pesquisa ocorra, é condição obrigatória que o professor seja pesquisador, sendo reconhecidos pelo menos cinco desafios nesse âmbito (figura 6). Figura 6 – Pesquisa no professor Fonte: Demo (2005, p. 38). Atividade de Estudos: 1) Dentre os desafios apresentados na figura 6, qual você considera o mais difícil de ser alcançado na prática e/ou no dia a dia do professor? Justifique sua resposta. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ________________________________________________________________________________________________________ Essa concepção exige que a pesquisa deixe de ser um mito para ser uma prática acessível, em suas proporções, a todo professor e a todo aluno. 38 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas ____________________________________________________ ____________________________________________________ 2) Como desenvolver no aluno uma ATITUDE CIENTÍFICA diante da contemplação de um fenômeno? ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Esses desafios apresentados na figura anterior, bem como os aspectos que o professor deve incitar em seus educandos (figura 5), estão intimamente relacionados. Ao passo que o professor enfrenta os desafios rumo a uma educação pela pesquisa, reconstruindo permanentemente sua prática pedagógica, automaticamente ele desperta seu aluno para uma postura reflexiva, crítica e a expressar-se de maneira fundamentada. Dessa forma, a reflexão sobre sua experiência, a investigação, a argumentação, a dúvida, os questionamentos e a busca por respostas levam o professor a ser um professor pesquisador, incorporando esses saberes à sua prática pedagógica; e, no que tange a essa prática, cabe ao professor o comprometimento em seu papel como mediador, como já mencionamos anteriormente, despido da postura autoritária e detentora do conhecimento. Não podemos esquecer a importância do trabalho conjunto entre professor/aluno na busca pelo conhecimento, destacando que a pesquisa encontra no âmbito escolar o ambiente perfeito para sua realização, uma vez que temos reunidos nesse espaço alunos e professores comprometidos na busca pelo saber. Para aprofundar seus estudos sobre a temática professor- pesquisador, sugerimos a leitura do autor Pedro Demo. Dentre as obras do autor, destacamos: DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. 7 ed. Campinas/SP: Autores Associados, 2005. Ao passo que o professor enfrenta os desafios rumo a uma educação pela pesquisa, reconstruindo permanentemente sua prática pedagógica, automaticamente ele desperta seu aluno para uma postura reflexiva, crítica e a expressar- se de maneira fundamentada. 39 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 O Papel do Professor de Ciências Biológicas na Construção da Cidadania [...] Será possível que a humanidade, tendo conquistado todos os ambientes da Terra (inclusive o espaço extraterrestre), possa estar chegando ao fim, enquanto nossa civilização se vê diante do risco real de extinção, só porque o ser humano ainda não conseguiu conquistar a si mesmo, compreender sua natureza e agir a partir desse entendimento. Humberto Maturana A escola tem um papel importante na formação dos cidadãos e é, em grande parte, responsável pela educação desses indivíduos. Assim, para que ocorra um processo concreto de Educação para a cidadania é fundamental que, concomitante ao desenvolvimento do conhecimento, sejamos capazes de desenvolver atitudes e habilidades necessárias não só à preservação dos recursos, como também à melhoria da qualidade socioambiental. De acordo com o Art. 22º da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) (1996), “A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores”. Nesse sentido veja o que a LDB estabelece como objetivos para o Ensino Fundamental e Médio: Art. 32º. O ensino fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social. Assim, para que ocorra um processo concreto de Educação para a cidadania é fundamental que, concomitante ao desenvolvimento do conhecimento, sejamos capazes de desenvolver atitudes e habilidades necessárias não só à preservação dos recursos, como também à melhoria da qualidade socioambiental. 40 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas Art. 35º. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades: I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. Por meio das observações, descrições, explicações e relações dos diversos aspectos da vida que as Ciências Biológicas trazem, é possível ampliarmos e modificarmos a visão que nós, seres humanos, temos de nós mesmos e sobre nosso papel como agentes transformadores de nosso espaço geográfico. Penteado (2000, p. 53, grifos da autora) corrobora que Uma coisa é ler e aprender os direitos e deveres defendidos em uma Constituição, outra coisa é descobrir com as pessoas como estão lidando com estes direitos e deveres na sua vida cotidiana e com que resultados. Descobrir com as pessoas significa entrar em relação com elas, desenvolver comportamentos em relação a elas com esta finalidade, isto é, ter uma experiência de participação social organizada especificamente para obtenção de determinado fim. Assim, em virtude da atual crise socioambiental vivenciada nos últimos tempos, e da falta de comprometimento da espécie humana com a coletividade, daremos um enfoque especial ao papel das Ciências Biológicas no que tange à construção da ‘cidadania ambiental’. O modelo de desenvolvimento econômico adotado a partir da segunda metade do século XX foi marcado pelo incentivo à industrialização acelerada, não levando em consideração os custos sociais e principalmente ambientais desse modelo. Assim, problemas de ordem social e ambiental, em decorrência desse modelo de desenvolvimento, passaram a fazer parte da realidade de muitos países, inclusive do Brasil. A partir disso, inicia-se um processo de inclusão dos problemas relativos ao meio ambiente e à saúde nos currículos de Ciências Naturais. Os PCNs compreendem a estreita relação entre homem e meio como fundamental no discurso referente ao Meio Ambiente. Refletem sobre a questão 41 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 ambiental não apenas por temas que norteiam a vida no planeta, mas também a melhoria do meio e consequente qualidade de vida dos sujeitos que dele fazem parte. Esse documento tem como intenção: [...] tratar das questões relativas ao meio ambiente em que vivemos, considerando seus elementos físicos e biológicos e os modos de interação do homem e da natureza, por meio do trabalho, da ciência, da arte e da tecnologia, (BRASIL, 2000, p. 15)Corroboram que a educação escolar sozinha não dá conta de promover mudanças na trajetória e história do planeta, porém tem papel significativo e fundamental para possíveis construções e possibilidades de cidadania. Uma vez que somos e fazemos parte de nossa história, podemos contribuir de modo que realmente façamos parte dessa mudança e da construção de possibilidades para tanto. Freire (1997, p. 58-59) atenta para o fato de que: [...] Gosto de ser gente porque a História em que me faço com os outros e de cuja feitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de determinismo. Daí que insista tanto na problematização do futuro e recuse sua inexorabilidade. A importância, portanto, aqui colocada, é de se educar pensando na formação de cidadãos, empreendedores preocupados e atentos à conservação de um ambiente saudável hoje e futuramente. Além disso, estabeleçam ao longo de suas vidas relações intra e interpessoais com o ambiente – físico e social (BRASIL, 2000). Portanto, se pensamos e desejamos uma educação de qualidade, como também na questão ambiental, é preciso termos em mente que formamos sujeitos cidadãos, críticos e reflexivos. “A cidadania ambiental e a cultura de sustentabilidade serão necessariamente o resultado do fazer pedagógico que conjugue a aprendizagem a partir da vida cotidiana” (GUTIÉRREZ, 2002, p. 59). Dentre os diálogos até então expostos, fica a sugestão de leitura, no intuito de reflexão referente à formação do sujeito cidadão e à Educação Ambiental, disponível no material de apoio da disciplina: HIGUCHI, Maria Inês G.; AZEVEDO, Genoveva C. de. Educação como processo de construção da cidadania ambiental. Revista Brasileira de Educação Ambiental, Brasília, v. il., n. 0, p. 63-78, maio/ago. 2005. Boa leitura! Educar pensando na formação de cidadãos, empreendedores preocupados e atentos à conservação de um ambiente saudável hoje e futuramente. 42 Práticas de Ensino de Ciências Biológicas O Ensino de Ciências/Biologia, no que tange ao movimento da sociedade pela conquista da cidadania, deve estar voltado para a apropriação do conhecimento biológico e para o desenvolvimento da responsabilidade social e, por que não dizer, socioambiental e ética dos alunos, lembrando que a simples quantidade de informações, por si só, não capacita o aluno a apreender o mundo em que vive, nem a agir sobre ele, para a realização dessa conquista (SANTA CATARINA, 1997). Para tanto, vale ressaltar também que não só as Ciências Biológicas como as demais áreas devem aprender ciência como parte integrante de sua formação cidadã, trabalhando de forma interdisplininar, como já visto nesse estudo. Assim, ambiental deve ser a condição de todo e qualquer processo educativo, possibilitando uma atuação consciente e uma verdadeira mudança de atitude diante de um mundo cada dia mais complexo e frágil perante a atual crise socioambiental. Algumas Considerações Encerramos este capítulo conhecendo um breve histórico sobre a trajetória do ensino de Ciências Biológicas e seu papel na construção da cidadania e na formação do sujeito consciente de seu papel perante a coletividade. Dialogamos sobre a formação continuada e permanente de professores, quando se apresentaram, também, reflexões sobre o processo ensino- aprendizagem, especificamente ressaltando a interdisciplinaridade no contexto escolar; interdisciplinaridade no sentido de ruptura, de fragmentação das disciplinas, dos conteúdos escolares e tomada de atitude frente à mediação, interação do conhecimento escolar. Ao falarmos sobre o professor pesquisador, talvez tenham surgido internamente muitas inquietações mas, como você mesmo pode constatar, esses questionamentos serão respondidos quando estivermos atuando e nos capacitando continuamente, sempre buscando um ensino que favoreça a produção do conhecimento por meio do estudo, da coleta de dados e da reflexão. Não nos esqueçamos, professores ou futuros professores, da importância de trabalharmos em conjunto com nossos alunos. Isso certamente tornará o processo de ensino-aprendizagem mais proveitoso para todos os envolvidos. Tomarmos consciência de nosso papel de mediador e pesquisador será um passo importante rumo à educação que (re)forme alunos e professores reflexivos, participativos e críticos. Diante do atual momento de crise em que vivemos, 43 Concepção Geral do Ensino de Ciências Biológicas Capítulo 1 temos a obrigação de educar para uma ‘cidadania planetária’, em que tenhamos cidadãos conscientes e informados sobre os problemas, capazes de assumir suas responsabilidades perante a coletividade e, dessa forma, aptos a tomar atitudes em prol de uma qualidade socioambiental para todos. No próximo capítulo, iremos abordar questões referentes à teoria e à prática no ensino de Ciências Biológicas. Traremos perspectivas e orientações para a sua atuação como docente e construiremos, juntos, a idéia de inclusão e de melhoria das aulas práticas nos programas de ensino. As novas tecnologias também serão nosso objeto de estudo no capítulo 2, sendo que vamos buscar a compreeensão de seu uso como uma ferramenta para aumentar as possibilidades de aprendizagem de nossos alunos. Referências ARROYO, Miguel. Ofício de mestre: imagens e autoimagens. 10 ed. Petrópolis/ RJ: Vozes, 2008. 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