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História geral e do Brasil - Vol 2 Claudio Vicentino-38

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BrasIl:	surGe	um	País	 187
provocando a interferência pessoal do príncipe re-
gente para forçar seu comandante a abandonar o Rio 
de Janeiro. Em seguida, a demissão em massa dos 
ministros portugueses levou dom Pedro a organizar 
um novo ministério, formado só por brasileiros, sob a 
chefia de José Bonifácio.
O novo ministério estabeleceu, em maio de 1822, 
o “Cumpra-se”, decreto pelo qual as ordens de Portu-
gal só seriam executadas dentro do território brasi-
leiro com a expressa autorização do príncipe regen-
te. Por essas e outras atitudes que confirmaram seu 
comprometimento com os brasileiros, foi intitulado 
Defensor Perpétuo do Brasil, pela Câmara do Rio de 
Janeiro. Em junho de 1822, dom Pedro convocou uma 
Assembleia Constituinte para elaborar a lei básica 
que deveria regulamentar a vida dos brasileiros, tor-
nando cada vez mais inevitável uma confrontação 
com Portugal. Em agosto, enquanto estava em visita 
às comarcas da província de São Paulo, chegaram no-
vas ordens de Lisboa, anulando suas decisões e exi-
gindo seu imediato regresso, sob a ameaça de envio 
de tropas portuguesas ao Brasil.
Dom Pedro voltava de Santos e, no caminho, en-
controu um mensageiro enviado por José Bonifácio 
com as notícias recém-chegadas da Corte. O encontro 
se deu na tarde do dia 7 de setembro, às margens do 
riacho Ipiranga, em São Paulo. Ao ler as notícias e as 
considerações feitas pelo conselheiro José Bonifácio 
e por sua esposa dona Leopoldina, que o substituíra 
durante sua ausência, dom Pedro decidiu proclamar 
o Brasil independente de Portugal.
Dom Pedro teve ainda que enfrentar as tropas 
portuguesas sediadas no Brasil, que se opunham à in-
dependência. Depois de derrotá-las, foi coroado im-
perador do Brasil, com o título de dom Pedro I.
O processo de independência, dirigido pela aris-
tocracia e contando com a participação popular tão 
somente nos enfrentamentos contra as tropas por-
tuguesas, trouxe o fim da subordinação a Portugal, 
mas não implicou mudanças na estrutura produtiva 
nem na sociedade brasileira. Significava a libertação 
de amarras coloniais, mas a dependência econômi-
ca permaneceria enquanto se mantivessem os pri-
vilégios ingleses. O predomínio socioeconômico e 
político da aristocracia rural, subjugando a maioria 
da população, foi mantido, garantindo-se os interes-
ses da elite agrária: a escravidão, que era a base da 
economia brasileira, e a produção agrícola voltada 
para a exportação. Como as elites não eram politica-
mente homogêneas e não tinham um projeto claro 
de ordenamento para a 
nova nação, a questão a 
se discutir era como se 
estruturaria o Estado 
nacional brasileiro.Mu
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∏	 O príncipe dom Pedro e Jorge 
Avilez na fragata União,	 em	 8	
de	 janeiro	de	1822	 (detalhe).	
retratado	 como	 herói	 por	
oscar	Pereira	da	silva,	nessa	
pintura	de	1922	(ano	do	cen-
tenário	 da	 independência	 do	
Brasil),	dom	Pedro	trata	com	
firmeza	 o	 representante	 mi-
litar	das	cortes	portuguesas.	
assim	 se	 constrói	 um	 mito	
nacional.
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188	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XIX
3 3
1 5
INDEPENDÊNCIA 
DO BRASIL (1822)rei português
•	Constituição
•	fim do absolutismo 
em Portugal
elite agrária 
brasileira
Bloqueio Continental 
(1806)
p
objetivos
p p
invasão da 
Rússia (1811)
domínio 
estrangeiro em 
Portugal
invasão da península 
Ibérica (1807)
Cortes 
portuguesas
modernizadores reacionários
guerras 
napoleônicas Inglaterra
fuga do rei de 
Portugal
fim do domínio 
francês sobre a 
Europa
em Portugal: 
Revolução Liberal 
do Porto (1820)
enfrenta
período 
joanino na 
colônia
rejeita
derrota de 
Napoleão 
(1815)
abertura dos 
portos (1808)
oposição
apoia
reconhece 
(1825)
•	revogação da abertura dos portos
•	medidas contrárias à autonomia 
administrativa do Brasil
para recordar: a independência do brasil
atIvIdades
com	base	no	que	foi	estudado	ao	longo	do	capítulo	e	do	esquema-resumo	acima,	realize	as	atividades:
1.	 	Faça	um	novo	esquema-resumo	com	as	principais	características	das	conjurações	mineira	e	baiana	e	da	revolução	
Pernambucana.
2.	 	Indique	as	diferenças	entre	os	objetivos	modernizadores	e	reacionários,	apontados	no	esquema-resumo	das	cortes	
portuguesas	no	contexto	da	revolução	liberal	do	Porto.
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1 leitura de textos e tabela
	 Os	 textos	 a	 seguir	 abordam	 a	 questão	 da	 construção	 de	 heróis	 nacionais.	 O	 primeiro	 é	 do	 historiador	
brasileiro	José	Murilo	de	Carvalho	e	o	segundo,	uma	reportagem	da	Agência	Senado.	O	quadro	relaciona	
os	nomes	que	figuram	no	Livro	dos	Heróis	da	Pátria.	Leia-os	e	responda	às	questões.
exercícIos de hIstórIa
texto 1
Heróis são símbolos poderosos, encarnações de ideias e aspirações, pontos de referência, fulcros de iden-
tificação coletiva. São, por isso, instrumentos eficazes para atingir a cabeça e o coração dos cidadãos a 
serviço da legitimação dos regimes políticos. Não há regime que não promova o culto de seus heróis e não 
possua o seu panteão cívico. Em alguns casos, os heróis surgiram quase espontaneamente das lutas que 
precederam a nova ordem das coisas. Em outros, de menor profundidade popular, foi necessário maior es-
forço na escolha e promoção da figura do herói. É exatamente nesses últimos casos que o herói é mais im-
portante. A falta de envolvimento real do povo na implantação do regime leva à tentativa de compensação, 
por meio da mobilização simbólica. Mas, como a criação de símbolos não é arbitrária, não se faz no vazio 
social, é aí também que se colocam as maiores dificuldades na construção do panteão cívico. Herói que se 
preze tem que ter, de algum modo, a cara da nação. Tem de responder a alguma necessidade de aspiração 
coletiva, refletir algum tipo de personalidade ou comportamento que corresponda a um modelo coletiva-
mente valorizado. Na ausência de tal sintonia, o esforço de mitificação de figuras políticas resultará vão. 
Os pretendidos heróis serão, na melhor das hipóteses, ignorados pela maioria e, na pior, ridicularizados.
CARVALHO,	José	Murilo	de.	A formação das almas.	São	Paulo:	Companhia	das	Letras,	1990.	p.	55-56.
texto 2
[...], o que dá a um vulto histórico a dimensão he-
roica? Ou, como lembram os historiadores, vale 
a pena cultuar heróis?
O dramaturgo alemão Bertolt Brecht cunhou a 
frase “Infeliz o país que precisa de heróis”. Mas 
todos os países têm os seus. Os americanos cul-
tuam a memória dos seus chamados founding	
fathers (pais fundadores), como Thomas Jefferson 
e Benjamin Franklin. Um Panteão em Paris abri-
ga os restos mortais de célebres franceses como 
Voltaire e Victor Hugo. […]
O modelo brasileiro, de seleção de heróis por 
meio de projetos de lei, não tem paralelo em ou-
tros países. Em geral, o status de herói — aliás, 
duramente criticado pela historiografia contem-
porânea — é alcançado por meio do tempo e pelo 
reconhecimento do povo. No caso mais recen-
te, da indicação pelo senador Marconi Perillo 
(PSDB-GO) de Getúlio Vargas para integrar a lis-
ta, entra em cena outro aspecto do debate: afinal, 
os “heróis” precisam ser “perfeitos”, à imagem dos personagens mitológicos como Hércules e Aquiles?
— Se o fossem, teríamos que reescrever a história do Brasil. Esta postura só revela a ignorância sobre 
a competente historiografia que vem sendo realizada em nossas universidades, que traz à tona não 
“heróis” cuidadosamente maquilados, mas atores históricos de carne e osso, interagindo com os dife-
rentes momentos políticos, a sociedade, a economia e as mentalidades de uma época — diz a carioca 
Mary Del Priore, autora de livros e professora de pós-graduação em História.
LIvRO DOS HERóIS DA PátRIA – LEIS Em vIgOR
Herói Data da lei Data da inscrição
Tiradentes 11/12/1989 21/4/1992
Deodoro da Fonseca 11/12/1989 15/11/1997
Zumbi dos Palmares 20/11/1996 21/3/1997Dom Pedro I 30/8/1999 5/9/1999
Plácido de Castro 2/5/2002 17/11/2004
Duque de Caxias 28/1/2003 28/1/2003
Almirante Tamandaré 5/12/2003 13/12/2004
Chico Mendes 22/9/2004 Ainda não ocorreu
José Bonifácio 19/5/2005 21/4/2007
Almirante Barroso 25/5/2005 11/6/2005
Santos Dumont 9/5/2006 26/7/2006
Frei Caneca 11/10/2007 Ainda não ocorreu
Marechal Osório 27/5/2008 Ainda não ocorreu
Barão de Serro Azul 15/12/2008 Ainda não ocorreu
Fonte: Agência Senado. Disponível em: <www.senado.gov.br/Comunica/agencia/quadros/qd_019.
html>. Acesso em: 15 nov. 2012. 
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190	 Para	entender	nosso	temPo:	o	século	XIX
a)	 Observe	a	imagem	com	atenção	e	identifique	a	personagem	principal	da	obra.	Quem	é	ela?	Que	aspectos	
da	obra	o	levaram	a	essa	identificação?	
b)	Preste	atenção	às	personagens	que	rodeiam	a	figura	central	da	obra.	Caracterize-as	e	depois	responda:	
essas	 personagens	 representam	 fielmente	 o	 perfil	 da	 população	 brasileira	 no	 início	 do	 século	 XIX?	
Justifique.	
c)	 Sabendo	que	Moureaux	não	foi	testemunha	ocular	da	cena	que	ele	pintou,	você	diria	que	a	obra	é	uma	
representação	idealizada	da	Independência	ou	uma	representação	realista?	Por	quê?	
d)	Compare	a	cena	retratada	na	tela	aos	fatos	que	relatam	a	proclamação	da	independência	expostos	no	
texto,	principalmente	em	relação	à	participação	social.	De	que	maneira	a	imagem	e	o	texto	do	capítulo	
representam	a	participação	popular	na	proclamação	da	independência?
e)	 Em	sua	opinião,	a	maneira	como	o	pintor	retratou	o	momento	da	proclamação	pode	estar	relacionada	à	
criação	do	mito	do	herói	citada	no	texto	de	José	Murilo	de	Carvalho?	Por	quê?
p	 Proclamação da independência,	pintura	de	François-rené	moreaux,	feita	a	pedido	do	senado	Imperial	em	1844.
a)	 De	acordo	com	o	historiador	José	Murilo	de	Carvalho,	como	surge	o	mito	de	um	herói?
b)	Analisando	a	 listagem	do	 livro	dos	heróis,	que	outros	personagens	históricos	 já	estudados	por	 você	
foram	transformados	em	heróis?
c)	 Para	José	Murilo	de	Carvalho,	que	característica	um	herói	deve	possuir	para	que	não	seja	ignorado	ou	
ridicularizado?
d)	De	acordo	com	a	historiadora	Mary	Del	Priore,	qual	a	contribuição	da	historiografia	atual	no	que	diz	
respeito	à	heroificação?
2 leitura de imagem e reflexão
	 Observe	a	pintura	e	responda	às	questões	propostas.
 […]
— Ao privilegiar o culto à figura do “herói nacional”, criou-se, no imaginário coletivo da população brasi-
leira, a ideia de que a solução para nossos inúmeros problemas sociais depende, única e exclusivamente, 
da ação isolada de um homem/mulher. A historiografia contemporânea considera que todos fazem a His-
tória, ou seja, todos somos sujeitos históricos — ensinava o deputado [federal Paulo Lima, do PMDB-SP].
Livro	dos	Heróis	da	Pátria	tem	hoje	apenas	dez	nomes.	20	de	março	de	2009.	Disponível	em:	<www12.senado.gov.br/
noticias/materias/2009/03/20/livro-dos-herois-da-patria-tem-hoje-apenas-dez-nomes>.	Acesso	em:	15	nov.	2012.
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as independências na 
américa espanhola14
cApíTulo
	 	 191
p	 José	de	san	martín	e	seu	exér-
cito	cruzando	a	cordilheira	dos	
andes,	em	1817.	Quadro	de	
1890,	de	augusto	Ballerini.
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Américas e seus processos de independência
Em 2010, ocorreu uma série de eventos comemorativos referentes 
ao Bicentenário da Independência da América espanhola. As efemérides 
favorecem embates em torno da memória e da história, além de possi-
bilitar reavaliações nas experiências latino-americanas. Somos acostu-
mados, desde pequenos, a ter determinadas visões sobre o nosso país e 
outras visões ainda sobre os países vizinhos. Embora conheçamos mal 
a sua história, nos achamos no direito de defi nir o “caráter nacional” e o 
comportamento dos habitantes dos outros países da América. De acordo 
com o fi lósofo búlgaro Tzvetan Todorov, o conhecimento pode conduzir 
à compreensão e à comunicação não violenta. Para isso, nada melhor que 
começar pelo surgimento dos atuais estados nacionais latino-americanos 
e pensá-los em comparação com o processo de surgimento do Brasil. 
Em que medida o processo de independência na América espanhola 
foi diferente do ocorrido na América portuguesa? E hoje, o que nos une 
aos demais países latino-americanos e o que nos separa deles?
para pensar HistOricaMente
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