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o regIMe MIlItar 217 Texto 2 Eu gostaria de fazer uma dupla dedicatória deste trabalho; primeiro, em memória de Edson Souto, Marco Antônio Brás de Carvalho, Nelson José de Almeida (“Escoteiro”) e a tantos outros heroicos combatentes e guerrilheiros urbanos que caíram nas mãos dos assassinos da polícia militar, do exército, da marinha, da aeronáutica, e também do DOPS, instrumentos odiados da repressora ditadura militar. Segundo, aos bravos camaradas – homens e mulheres – aprisionados em calabouços medievais do go- verno brasileiro e sujeitos a torturas que se igualam ou superam os horrendos crimes cometidos pelos nazistas. Como aqueles camaradas cujas lembranças nós reverenciamos, bem como aqueles feitos pri- sioneiros em combate, o que devemos fazer é lutar. [...] A acusação de “violência” ou “terrorismo” sem demora tem um significado negativo. Ele tem adquirido uma nova roupagem, uma nova cor. Ele não divide, ele não desacredita, pelo contrário, ele representa o centro da atração. Hoje, ser “violento” ou um “terrorista” é uma qualidade que enobrece qualquer pes- soa honrada, porque é um ato digno de um revolucionário engajado na luta armada contra a vergonhosa ditadura militar e suas atrocidades. MARIGHELLA, Carlos. Pequeno manual do guerrilheiro urbano. Disponível em: <www.midiaindependente.org/pt/ red/2004/06/283439.shtml>. Acesso em: 12 mar. 2013. A partir dos eventos ocorridos no “ciclo revista” de 1978/1980, os sujeitos coletivos puderam definir suas identidades e articular suas reivindicações frente ao Estado. Neste processo, a “questão democrática” foi reelaborada historicamente, deixando de ser apenas um tema que inspirava a resistência contra a dita- dura, para nortear diversos projetos de sociedade. A “questão operária” consolidou, no espaço público, uma outra formulação da “questão democrática”, que se exercitava desde o início dos anos 70: não mais se tratava de criar a produção do consenso mas, sobretudo, aprimorar a equação do conflito. NAPOLITANO, Marcos. As greves do ABC: a questão social encontra a questão democrática. In: Cultura e poder no Brasil republicano. Curitiba: Juruá, 2002. p. 104. a) Faça uma pesquisa, em livros ou na internet, e relembre o que foi o Período do Terror durante a Revolu- ção Francesa. Defina-o brevemente. b) No texto 1, o que Benjamin Constant quer dizer ao afirmar que o terror existe quando “o crime é o sis- tema de governo e não quando é seu inimigo”? Explique relacionando essa afirmação com o contexto do Período do Terror. c) Que acusações Marighella faz ao Estado brasileiro vigente em 1969, presentes no texto 2? d) Que argumentos Marighella utiliza para defender que “hoje, ser ‘violento’ ou um ‘terrorista’ é uma qua- lidade que enobrece qualquer pessoa honrada”? Justifique. e) De acordo com o pensamento de Benjamin Constant, as ações violentas cometidas pelos guerrilheiros dos anos 1960 seriam formas de “terror”? E as ações da ditadura militar? Justifique suas respostas. 3 análise de texto historiográfico Leia o texto abaixo do historiador brasileiro Marcos Napolitano. Em seguida, responda às questões. a) Releia o texto didático e identifique quem eram os participantes do que o autor chama “ciclo grevista” e porque eles estavam insatisfeitos. b) De acordo com o autor, por que as greves dos metalúrgicos redefiniram o movimento pela volta da de- mocracia e introduziram novas questões entre os opositores da ditadura militar? Justifique. HGB_v3_PNLD2015_192a217_U2_C11.indd 217 4/15/13 10:31 AM 218 Do pós-guerra ao século XXI o fim da Guerra Fria e a nova ordem mundial12 caPítUlO p Desde o colapso do socialismo real na união soviética, em 1989, várias foram as repúblicas per- tencentes ao bloco que lutaram pela independência. Na foto, de 1991, destroços do antigo monu- mento em homenagem a lênin, removido da área central da cida- de de vilnius, capital da lituânia, após ter sido proclamada a inde- pendência do país em relação a Moscou, em março de 1990. G e ra rd F o u e t/ A g ê n c ia F ra n c e -P re s s e /G e tt y I m a g e s Os desafios da globalização Como podem ser preservados os interesses nacionais de qualquer país diante da formação de grandes blocos compostos de nações hege- mônicas? Com a globalização, qual o destino dos Estados nacionais do ponto de vista político? As políticas públicas devem priorizar urgentemente as questões so- ciais, subordinando os interesses do mercado ao bem-estar de todos, ou devem ser direcionadas para o desenvolvimento da livre concorrência, sujeitando a sociedade às leis de mercado? PARA PENSAR hISTORICAMENTE HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 218 4/15/13 10:32 AM o fIM Da guerra frIa e a Nova orDeM MuNDIal 219 o Fim dA GUerrA FriA p Jimmy carter (estados unidos), à esquerda, e leonid Brejnev (união soviética), à direita, durante a cerimônia de encer- ramento da conferência do tratado de salt-2, ocorrida em viena em junho de 1979. W a ll y M c N a m e e /C o rb is /L a ti n s to ck A détente (em português, “distensão”), instituída nas relações entre os Estados Unidos e a União Sovié- tica no início da década de 1970, caracterizou-se por acordos bilaterais que tinham o objetivo de diminuir os riscos de uma guerra nuclear e amenizar os con- fl itos Leste-Oeste. Nesse contexto, destacaram-se os acordos da série Salt (Strategic Arms Limitations Talks – Conversações sobre Limitações de Armas Estratégi- cas), entre 1972 e 1979, que efetivamente passaram a controlar o arsenal nuclear das duas superpotências. No início da década de 1980, porém, o presidente norte-americano Ronald Reagan retomou a chamada “política da intimidação”, acentuando a corrida arma- mentista e frustrando quaisquer tentativas de acordo entre 1985 e 1986. A Europa, temendo transformar-se em palco de uma guerra nuclear, pressionou a reto- mada dos encontros de cúpula entre os Estados Uni- dos e a União Soviética. Ao mesmo tempo, o dirigente soviético Mikhail Gorbatchev imprimiu em seu país, a partir de 1985, a reestruturação econômica e a abertura política, que remodelaram não só o bloco socialista (levando ao colapso de suas estruturas), como também as rela- ções internacionais mundiais. Em novembro de 1987, Reagan e Gorbatchev, abrindo nova rodada de negociações sobre desarma- mento, assinaram um acordo para a eliminação dos mísseis de médio alcance na Europa e na Ásia. Em janeiro de 1988, o governo soviético anunciou o início da retirada de suas tropas do Afeganistão (veja boxe p o fi m da união soviética foi seguido do nascimento da comunidade de estados Independentes, uma reunião de estados em permanente disputa pelos despojos da era soviética, em que sobressai a federação russa (antiga rússia). Adaptado de: DUFOUR, Annie (Ed.). Grand Atlas d’aujourd’hui. Paris: Hachette, 2000. p. 56. Em 1997, a capital do Casaquistão passa a ser Astana. A ll m a p s /A rq u iv o d a e d it o ra da página 224); no ano seguinte, a abertura política e os efeitos da perestroika desmontaram o bloco so- cialista, apressando o fi m da confrontação tradicional com os Estados Unidos. No início dos anos 1990, aceleraram-se acordos de desarmamento nuclear; em 1991, o Comecon e o Pacto de Varsóvia foram dissolvidos, ao mesmo tem- po que tiveram início gestões para a remodelação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Em dezembro de 1991, a União Soviética desa- pareceu, dando lugar à Comunidade de Estados Independentes (CEI), tendo a Rússia como principal herdeira da ex-União Soviética em termos políticos, geopolíticos e econômicos. Veja o mapa abaixo. A seguir, você conhecerá melhor o período que antecedeu e preparou o fi m da Guerra Fria. OCEANO GLACIAL ÁRTICO Círculo Polar Ártico 120º L OCEANO PACÍFICO R Ú S S I A Talim Riga ESTÔNIA LETÔNIA LITUÂNIA Vilna Kaliningrado Moscou Minsk BELARUS Kiev UCRÂNIA MOLDOVA CASAQUISTÃO Chisinau Mar NegroMar Cáspio GEÓRGIA Tbilisi Baku USBEQUISTÃO Alma-Ata Tashkent Bishkek QUIRGUISTÃOARMÊNIA Erivã AZERBAIJÃO TURCOMENISTÃO TAJIQUISTÃOAshgabat Dushanbe M a r M e d i t e r r â n e o CEI Ex-repúblicas soviéticas não integrantes da CEI 0 557 km 1114 comunidade dos Estados independentes — 1991 HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 219 4/15/13 10:32 AM 220 Do pós-guerra ao século XXI Os Estados Unidos a partir dos anos 1960 Mantendo o consenso entre as elites norte-ame- ricanas, os partidos republicano e democrata conti- nuaram se revezando no poder. Richard Nixon, eleito pelo Partido Republicano em 1968 e reeleito em 1972, governou os Estados Unidos até 1974. Retomou a rea- proximação com os países comunistas, sem perder o tradicional caráter ofensivo, e iniciou mais um pe- río do de détente, tendo à frente o secretário de Estado Henry Kissinger. Em 1971, os Estados Unidos apoiaram a entrada da China comunista no Conselho de Segurança na ONU e, em 1972, o presidente norte-americano en- controu-se com Mao Tse-tung. A aproximação com a China representava mais um passo ofensivo do gover- no norte-americano, ao unir-se a uma potência vizi- nha e rival dos soviéticos. Logo após a visita à China, Nixon foi à União So- viética, onde assinou com o presidente Leonid Brejnev o tratado Salt-1, de limitação de armas nucleares. O período Nixon caracterizou-se também pela pressão da opinião pública em relação à Guerra do Vietnã, o que o levou a adotar a política de “vietnami- zação” da guerra, ou seja, a tentativa de retirar os sol- dados norte-americanos do conflito, oferecendo, em contrapartida, armamentos a seu aliado, o governo do Vietnã do Sul. Enquanto levava adiante esse projeto, Nixon procurou enfraquecer os guerrilheiros do Vietnã do Sul, os vietcongs, bombardeando maciçamente seus aliados comunistas do Vietnã do Norte. Estes, entre- tanto, avançaram progressivamente, respondendo aos ataques. Apesar da aproximação diplomática com os paí ses comunistas, os Estados Unidos não descui- davam de sua supremacia sobre os países subdesen- volvidos. Além da questão do Vietnã, participaram oficiosamente da derrubada do presidente chileno Salvador Allende, de tendência socialista, em 1972, cujas reformas prejudicavam os interesses econô- micos norte-americanos. Após um golpe sangrento, instaurou-se no Chile a ditadura militar de Augusto Pinochet, como já vimos. O fim do governo Nixon deu-se com o caso Watergate, iniciado em 1972. Membros do Partido Republicano – ao qual Nixon pertencia – foram sur- preendidos tentando instalar um sistema de escuta para espionar os escritórios do rival Partido Demo- crata, no edifício Watergate, em Washington, a quatro meses das eleições presidenciais. Denunciado pelo jornal Washington Post, que não poupou sequer a alta cúpula governamental, o es- cândalo atingiu Nixon e mobilizou toda a imprensa e a opinião pública norte-americana. Comprovado seu envolvimento, o presidente foi obrigado a renunciar. Caso não o fizesse, seria impedido, pelo Congresso, de governar (impeachment). A presidência foi então ocu- pada pelo vice-presidente Gerald Ford (1974-1976), que, em 1975, concedeu “perdão pleno e absoluto” a Nixon por todos os delitos que pudesse ter cometido enquanto ocupava a presidência. Marcado pela derrota norte-americana na Indo- china (Vietnã, Laos e Camboja), o governo Ford viveu a plena desmoralização de seu partido e da adminis- tração republicana, o que impossibilitou sua tentativa de reeleição. A situação econômica norte-americana enfrentou dificuldades, como a elevação dos preços do petróleo determinada já desde 1973 pela Organi- zação dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), dominada pelos países árabes. Os efeitos dessa alta foram sentidos em todo o mundo capitalista, espa- lhando recessão e dificuldades, o que minou a lide- rança norte-americana e o governo Ford. Eleito presidente pelo Partido Democrata, Jimmy Carter (1977-1980) fez acordos de distensão com os soviéticos, assinou o Salt-2 (1979) e adotou uma política de defesa dos direitos humanos. Sua política internacional motivou a redemocratização p richard Nixon e Mao Tse-tung, pequim, fevereiro de 1972. a visita de Nixon à china e à união soviética caracterizou o degelo nas relações internacionais, embora os estados uni- dos não tenham abandonado a ofensividade contra o bloco socialista soviético. A g ê n c ia F ra n c e -P re s s e /G e tt y I m a g e s HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 220 4/15/13 10:32 AM o fIM Da guerra frIa e a Nova orDeM MuNDIal 221 Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) envol- veu o governo Carter em novas dificuldades para sua política externa. Candidato à reeleição nas eleições presidenciais de 1980, Carter foi derrotado por Ronald Reagan, iniciando um novo período de predomínio do Partido Republicano. Reagan assumiu em 1981 e foi reeleito em 1984, permanecendo no poder por oito anos, épo- ca de impulso nas pregações em favor da economia de mercado, o neoliberalismo. Logo no início de seu primeiro mandato, Reagan ampliou as sanções econômicas à União Soviética e a repressão aos regimes de esquerda na América Cen- tral e no Caribe. Ao mesmo tempo, retomou a corrida armamentista, implantando uma política intimida- dora aos soviéticos. A instalação de armas poderosas na Europa fez crescer os protestos populares, provo- cados pelo medo de que o continente se transformas- se em arena de um conflito nuclear. Contrários ao rearmamento norte-americano, os soviéticos retiraram-se das conversações em curso em Viena, em 1983, mesmo ano em que Reagan inter- veio em Granada, na América Central, afastando um governo que não atendia aos interesses de seu país na região. Na Nicarágua, até o final da década, aumentou as pressões aos sandinistas, apoiando abertamente os guerrilheiros contrarrevolucionários (“os contras”) e fazendo sucessivas ameaças de uma ação militar na região, semelhante à que empreendera em Granada. Reagan iniciou também um programa militar que ficou conhecido como Guerra nas Estrelas, sofis- ticado projeto bélico que visava proteger os Estados Unidos contra possíveis mísseis inimigos com base na formação de um “escudo” de mísseis dirigidos para o céu. Após sofrer pressões internas e externas, o proje- to não chegou a ser implantado. O desenvolvimento econômico interno ocorri- do durante seu governo garantiu-lhe popularidade e permitiu que se reelegesse em 1984. Por causa das pressões europeias e da política implantada pelo novo governante soviético, Mikhail Gorbatchev, o governo norte-americano reverteu a política de intimidação ao bloco socialista, retomando a distensão com a União Soviética. Em 1987 foram assinados acordos de desarma- mento nuclear, ratificados na viagem do presidente norte-americano à União Soviética no ano seguinte. Internamente, o país adotou uma política de corte de gastos públicos, principalmente na área de bem-estar social, e de desregulamentação da economia, provo- cando o desemprego e a concentração da renda pelos de países capitalistas governados por ditaduras e in- tensificou as críticas às limitações das liberdades pú- blicas nos países comunistas. Diante das denúncias de violações dos direitos humanos, como tortura, prisões e cerceamento da oposição, Carter chegou a negar créditos para a compra de armamentos a vários países da América Latina, na época sem liberdades democráticas estabelecidas, como Brasil, Argentina, El Salvador e Guatemala. Carter também mediou a Conferência de Camp David, em 1978, que deu origem a um tratado de paz entre o Egito, governado na época por Anuar Sadat, e Israel, dirigido por Menachem Begin. Com esse tra- tado, estabeleceram-se relações diplomáticas entre esses países, que estavam em guerra havia anos. Era o ponto de partida paraa pacificação do Oriente Mé- dio, a qual só avançou limitadamente na década de 1990. No final do governo Carter, emergiram diver- sas crises internacionais que arruinaram o prestígio da administração democrata. No Irã, em 1979, o xá Reza Pahlevi, tradicional aliado dos Estados Unidos, foi derrubado por uma revolução islâmica. O novo líder do país, aiatolá Khomeini, passou a pregar um nacionalismo religioso com posições radicalmente antinorte-americanas, levando a uma postura de en- frentamento com os Estados Unidos. ∏ Jimmy carter, em foto de 1979. em seu governo foram promovi das ações de defe sa dos di- reitos humanos. D ia n a W a lk e r/ T im e L if e P ic tu re s /G e tt y I m a g e s Na Nicarágua, também em 1979, a Revolução Sandinista, de inspiração marxista, acabou com o longo período de dominação da família Somoza, alia- da histórica dos Estados Unidos. A derrubada do dita- dor Anastácio Somoza pelos guerrilheiros da Frente HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 221 4/15/13 10:32 AM 222 Do pós-guerra ao século XXI mais ricos, dentro dos princípios do neoliberalismo, como veremos mais à frente. George Bush foi eleito sucessor de Reagan pelo Partido Republicano, para o período de 1989 a 1993, dando continuidade à política de entendimento com Gorbatchev em meio à desmontagem dos regimes so- cialistas do Leste Europeu até o desaparecimento da União Soviética, no início da década de 1990. Reafirmando sua supremacia internacional e sob o respaldo da ONU, os Estados Unidos praticamente comandaram, no início de 1991, a Guerra do Golfo contra o Iraque. Essa guerra decorreu da invasão do território do Kuwait, em 1990, pelo Iraque, governa- do por Saddam Hussein, que procurava projetar-se como grande líder das nações árabes. A coalizão internacional de aproximadamente trinta países, liderada pelos Estados Unidos, iniciou em janeiro de 1991 o bombardeio contra o Iraque, desencadeando a operação Tempestade no Deserto, a maior mobilização militar mundial desde a Segun- da Guerra. O confronto terminou em quarenta dias com a derrota do Iraque, que sofreu grandes perdas materiais e humanas. Terminada a guerra, a ONU es- tabeleceu sanções econômicas ao Iraque, especial- mente o embargo sobre suas exportações de petró- leo, além de impor a eliminação de seus arsenais de armas nucleares, biológicas e químicas e dos mísseis de longo alcance. Até 1992, o presidente Bush experimentou osci- lações em sua popularidade, ora ganhando prestígio, com a hegemonia do país depois da queda do bloco socialista, ora perdendo, com sinais de aumento do desemprego e queda da produtividade da economia norte-americana. Diante disso, foi derrotado quando tentou se reeleger, nas eleições de 1992, pelo candida- to do Partido Democrata, Bill Clinton, que assumiu o governo em 20 de janeiro de 1993. Com Clinton, a economia norte-americana apresentou sucessivos índices de crescimento, o que favoreceu sua reeleição em 1996. Apesar de governar em um período de excelente desempenho econômi- co, entre 1998 e 1999 foi ameaçado de impeachment por seu envolvimento com uma ex-estagiária da Casa Branca, Monica Lewinsky. Em fevereiro de 1999, o Se- nado absolveu o presidente. Nas eleições presidenciais de 2000, o partido de Clinton indicou Al Gore para concorrer com o candi- dato do Partido Republicano, George Walter Bush, filho do ex-presidente Bush. Numa apuração de votos repleta de irregularidades, com várias recontagens, George W. Bush saiu vitorioso. Em janeiro de 2001, George W. Bush assumiu o cargo de 43º- presidente dos Estados Unidos, procla- mando, em seguida, a reativação militar, especialmen- te a montagem de um escudo antimísseis, o National Missile Defense. Diversos analistas e especialistas da política internacional chamaram atenção para a reto- mada da corrida armamentista tão típica do pe río do da Guerra Fria e do governo Reagan, mas dessa vez com um novo agravante: a instalação desse sistema, pelo menos em tese, daria aos Estados Unidos a capa- cidade de se defender de um ataque nuclear e, portan- to, de lançar uma resposta arrasadora. No dia 11 de setembro de 2001, a questão do escudo antimísseis norte-americano foi colocada em segundo plano: terroristas suicidas destruíram p o oriente Médio tem sido palco de frequentes conflitos e guerras civis, envolvendo também interesses estrangeiros. Na foto de 1991, soldados norte-americanos sobre um tan- que durante a guerra do golfo. P e te r T u rn le y /C o rb is /L a ti n s to ck A oferta de petróleo às potências ocidentais a preços baixos e a busca de novos acessos do Iraque ao Golfo Pérsico foram os pretextos para a invasão e posterior anexação territorial do Kuwait. Respalda- das pela ONU, as grandes potências, tendo à frente os Estados Unidos, exigiram a desocupação do Kuwait e, não sendo atendidas, declararam guerra a Saddam Hussein. HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 222 4/15/13 10:32 AM o fIM Da guerra frIa e a Nova orDeM MuNDIal 223 completamente dois grandes edifícios, as torres do World Trade Center, em Nova York, e parte do Pen- tágono, nos arredores de Washington. Os ataques, tidos como os maiores sofridos até então pelos Es- tados Unidos em seu próprio território, foram rea- lizados com aviões de carreira sequestrados e se voltaram contra os símbolos do poderio econômico e militar dos Estados Unidos, deixando milhares de mortos e uma forte sensação de vulnerabilidade no país mais poderoso do mundo. ∏ as torres do World Trade center atingi- das por dois aviões pilotados por terro- ristas em 11 de setembro de 2001. MUralhas Quando os chineses iniciaram a Grande Muralha, em 214 a.C., e Adriano contratou seu sistema defensivo no norte da Inglaterra, 300 anos depois, eles estavam reagindo precisamente ao mesmo instinto que está movendo a política norte-americana agora – manter distan- tes os bárbaros hostis. O Escudo de Defesa Antimísseis é, em termos militares, uma muralha, embora excepcionalmente complexa. Mas as muralhas têm o hábito de ser vencidas ou contornadas, como qualquer historiador da Linha Maginot poderia confirmar, e esta muralha pode ser evitada com bombas nucleares de baixa potência em maletas ou por alguém numa lancha, disparando em volta da Ilha de Manhattan. Portanto, defesa não é, evidentemente, a história toda, e entre as razões que motivaram Bush é preciso lembrar que sua mu- ralha vai custar entre US$ 60 bilhões e US$ 100 bilhões, a maior parte deles gasta com as indústrias de defesa. PORTER, Henry. Falando com as paredes: ao querer afastar os “bárbaros”, os EUA se isolam do mundo. The Observer. Carta Capital. Ano VII, n. 147 (23 maio 2001). p. 40. linha Maginot: linha de fortifica- ções na fronteira francesa da suí- ça até a Bélgica, visando defender- -se da alemanha. construída nos anos 1930 e idealizada pelo políti- co andre Maginot, de nada serviu para conter o avanço nazista. A situação desdobrou-se na primeira guerra de- clarada do século XXI, tendo como alvo um grupo ter- rorista fixado no Afeganistão (a Al-Qaeda, responsável pelos ataques de 11 de setembro) e apoiado pelo gru- po governamental Talibã. O período de “guerra ao terror”, iniciado em 2001, resultou na derrubada do governo Talibã no Afeganistão e implantou nos Estados Unidos várias medidas policiais destinadas a evitar novos atentados terroristas. Um desdobramento foi a adoção da Dou- trina Bush, sustentada na possi- bilidade de ação militar unilateral dos Estados Unidos em qualquer país do mundo, acima de leis e políticas internacionais, e sempre tendo como justificativa a “guerra ao terror”. A ameaça estaria nos paí- ses que formavam o “eixo do mal”, como Iraque, Irã e Coreia do Nor- te, que, segundo Bush, fabricavam armas de destruição em massa e patrocinavamo terrorismo inter- nacional. A partir de então, os Es- tados Unidos adotaram medidas agressivas e de endurecimento con- tra os rivais, como a transferência de prisioneiros de guerra do Afega- nistão para a base norte-americana de Guantánamo (onde seriam víti- mas de maus-tratos denunciados pela imprensa a partir de 2004), e pressão e ameaça de guerra, espe- cialmente contra o Iraque. G e tt y I m a g e s /< w w w .g e tt y im a g e s .c o m > HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 223 4/15/13 10:32 AM 224 Do pós-guerra ao século XXI Em razão de sua posição geográ- fica estratégica, o Afeganistão sempre foi área sujeita a invasões e disputas (desde os gregos de Alexandre Magno, na Antiguidade, passando pelos mon- góis, turcos, ingleses e paquistaneses, até os russos e norte-americanos nos períodos seguintes). A monarquia cen- tralizada, estabelecida no século XVIII e que duraria até 1973, foi um dos alvos, nas disputas coloniais do século XIX, dos confrontos entre o Império Russo e o Britânico, ficando este último com o domínio regional até a independência do país em 1919. Com a queda da monarquia em 1973, quando Daud Khan destituiu o rei Zahir Shah, deu-se uma sucessão de golpes militares, conflitos e interven- cionismos que arrasaram o país, pro- vocando a fuga de milhões de afeganes (cerca de 2,5 milhões). Daud Khan foi assassinado em 1978 e, sob a lideran- ça de Mohamed Taraki, instalou-se um regime de partido único inspirado na União Soviética e sujeito à crescente oposição de grupos islâmicos apoiados por Paquistão e Irã e armados pelos Esta- dos Unidos. As lutas entre as facções políticas, étnicas e religiosas culminaram no fuzi- lamento de Taraki, em 1979, seguido da invasão da União Soviética, na qual morreram mais de 15 mil russos e cerca de 800 mil afega- nes. Os soviéticos retiraram-se do país dez anos depois, mantendo o apoio (financeiro e em armas) ao governo de Mohammad Najibullah, que foi obrigado a renunciar em 1992, quando grupos guerrilheiros tomaram Cabul, a capital do país. Seguiram-se confrontos entre as facções políticas e islâ- micas rivais, destacando-se o grupo islâmico Talibã ou Taleban (“estudante”, em persa), milícia que ganhou supremacia sobre aproximadamente 90% do território nacional no final da década de 1990, impondo-lhe rígidas leis muçulmanas. Esse grupo era for- mado pela maioria étnica do Afeganistão, os pashtuns, enquanto em outro grupo, que controlava pequenas áreas ao norte do terri- tório, conhecido como Aliança do Norte, predominavam três gru- pos étnicos minoritários: os usbeques, os tajiques e os hazaras. Em 1998, os Estados Unidos dispararam mísseis contra al- vos no Afeganistão, sob a acusação de serem centros de apoio às ações terroristas internacionais, especialmente da Al-Qaeda, organização liderada por Osama bin Laden. Esse fundamentalista islâmico era um milionário de origem saudita que migrara para o Afeganistão, onde obteve ajuda militar e financeira dos Estados Unidos no combate aos soviéticos, na Guerra do Afeganistão, durante a década de 1980. Bin Laden fundou a Al-Qaeda (em português, A Base) em 1990 e, no final dessa década, controlava uma ampla rede de ação em diver- sos países contra o que chamava de “influência ocidental” e interferência dos Estados Unidos no mundo islâ- mico. Em 1999, a ONU determinou sanções contra o governo Talibã, como restrições aos voos interna- cionais e exigências de extradição de Bin Laden para julgamento em um tribunal internacional. Em 11 de setembro de 2001, nos atentados realizados em Nova York e Washington, quando as torres do World Trade Center e o Pentágono foram atingidos por aviões seques- trados por terroristas, Osama bin Laden foi acusado pelas autoridades norte-americanas de ser o articu- lador da ação, que deixou milhares de mortos nos Estados Unidos. O presidente Bush declarou guerra aos terroristas e aos Estados que os abrigassem, exigindo do governo afegane a prisão e a entrega de Bin Laden. O desdobramento da crise foi o bombardeio, por parte dos Estados Unidos, sobre o Afe- ganistão e a derrubada do Talibã. Osama bin Laden foi morto numa operação militar dos Estados Unidos no Paquistão em maio de 2011. Após a derrota militar e a queda do Talibã, foi estabelecido um governo provisório, aliado dos Estados Unidos e chefiado por Hamid Karzai (dezembro de 2001), com a difícil tarefa de pôr fim às permanentes disputas das várias facções e reconstruir o país. Mesmo sem a presença do Talibã, continuou a haver conflitos ar- mados entre chefes guerreiros regionais, crescimento do consu- mo de ópio, criminalidade e descontrole governamental. No final de 2004 realizaram-se eleições presidenciais, tendo sido vitorioso o presidente interino Hamid Karzai, reeleito em 2009 para mais um mandato de cinco anos. Em 2012, continuava a crescer a pro- dução de ópio, os atentados, a reorganização do Talibã e as segui- das disputas armadas entre milícias pelo domínio de territórios no Afeganistão. Os Estados Unidos e seus aliados da Otan definiram um acordo de retirada de suas tropas do país até 2014, sendo que no início de 2012 ainda mantinham cerca de 350 mil soldados no Afeganistão, sendo 90 mil norte-americanos. p Bush e Bin laden em anúncio criado por agência de publicidade para uma revista de grande circulação no Brasil. o anúncio mostra o rosto desses líderes desenhado com palavras significativas. observe. R e p ro d u ç ã o /G e n ti lm e n te c e d id o p o r A lm a p b b d o P u b li c id a d e e C o m u n ic a ç õ e s L td a . a cOnstrUçãO da crisE nO afEganistãO HGB_v3_PNLD2015_218a247_U2_C12.indd 224 4/15/13 10:32 AM