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153Os reinos africanos Capítulo 19 Lendas angolanas As narrativas transmitidas oralmente são uma das tradições culturais mais fortes na África. Mitos, lendas, acontecimentos históricos e costumes mile- nares são transmitidos de uma geração a outra por meio da oralidade. Assim, os contadores de histó- rias estão entre as figuras mais prestigiadas em di- versas regiões do continente. Chamados de griôs na África ocidental, eles percorrem as comunida- des contando e cantando poemas épicos, fatos da história de seu povo, batalhas, genealogias, etc. As duas histórias que você vai ler agora são contos tra- dicionais de Angola que foram compilados e reuni- dos em livros pelo estudioso da literatura oral afri- cana, o suíço Héli Chatelain. Leia os textos e res- ponda ao que se pede. O esquilo e a realeza Uma vez prometeram ao esquilo a realeza e ele respondeu: — Que seja hoje mesmo. — Estamos à procura da insígnia. — De qualquer forma, desde que seja imedia- tamente. Como represália, as pessoas decidiram: — Quem não pode esperar pela insígnia para ser proclamado rei, também não será capaz de governar condignamente o povo. Portanto, não o queremos! Pelo que ficou dito prova-se que a expressão imediatamente privou o esquilo de ser rei. O cão e a realeza Uma vez resolveram dar ao cão o privilé- gio da realeza e pensaram em todas as insígnias: a coroa, o bastão, os anéis, a pele de mukaka, etc. Quando já estava tudo pronto marcaram o dia da coroação. Não faltaram as festas com to- cadores de tambor e marimba e uma infinida- de de pessoas de categoria. Para o soberano se sentar ofereceram-lhe amavelmente tapetes e esteiras. Depois, principiaram a distribuir as insígnias. Nessa altura, o cão avistou um peito de gali- nha. Com sofreguidão agarrou-o e correu para o mato. A multidão comentou o fato e se disper- sou. O roubo praticado pelo cão fê-lo perder a realeza. In: CHATELAIN, Héli (Org.). Contos populares de Angola. Lisboa: Edição Agência-Geral Ultramar, 1964. p. 401-403. 1. Os dois contos revelam algumas diretrizes que deveriam nortear os procedimentos de um bom rei africano. Que diretrizes seriam essas? 2. Em sua opinião, que valores são necessários para caracterizar um bom governante? Faça uma lista desses valores, juntamente com argumentos que justificam a escolha. Em seguida, compare a sua lista com a de seus colegas. 3. Baseado nesses modelos, elabore um pequeno conto no qual um ou mais valores listados por você fiquem evidenciados. Em seguida, leia seu conto para a classe. No mundo das letras Hora de reFletir Assim como Marco Polo, mercador veneziano que percorreu a China e outras regiões do Oriente a partir de 1271 (releia o capítulo 17), Ibn Battuta foi um grande viajante. Em sua opinião, de que modo a ação dos viajantes pode contribuir para que haja mais tolerância religiosa, política e cultural entre os povos? Individualmente, escreva dois argumentos. Depois, apresente-os à classe. E coletivamente, ela- borem um documento enumerando todos os argu- mentos apresentados pelos colegas. Mundo virtual n Casa das Áfricas – Site do instituto cultural voltado para o estudo das sociedades africanas. Disponível em: <www.casadasafricas.org.br/>. Acesso em: 17 out. 2012. HMOV_v1_PNLD2015_144a153_U04_C19.indd 153 3/6/13 11:00 AM 154 Com cerca de 9 milhões de habitantes, Istambul está situada na parte europeia da Turquia, às margens do estreito de Bósforo, entre o mar Negro e o mar Egeu. Herdeira de várias culturas, é um verdadeiro ponto de encontro entre o Oriente e o Ocidente. Antes de ser tomada pelos turcos em 1453 ela se chamava Constantinopla e era sede do antigo Império Romano do Oriente, ou Império Bizantino. Como veremos neste capítulo, o Império Bizantino perdurou por Richard T. Nowitz/Corbis/Latinstock O Império Bizantino Capítulo 20 Objetivos do capítulo Explicar o processo de formação e desagregação do Império Bizantino. Analisar aspectos da organização social e política do Império Bizantino. Conhecer características da cultura bizantina e a influência do cristianismo na vida dessa sociedade. aproximadamente mil anos e se caracterizou pela estreita união entre o Estado e a Igreja e por unir em seu vasto território povos de culturas bem diversas. H o m er o s/ S h u tt er st o ck /G lo w Im ag es Vista da cidade de Istambul, na Turquia, tendo ao fundo a Basílica de Santa Sofia. Fundada em 330, Istambul foi a capital do Império Bizantino. Na época chamava-se Constantinopla, em homenagem ao imperador Constantino, que mandou construí-la. Foto de julho de 2012. HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 154 3/6/13 10:59 AM 155O Império Bizantino Capítulo 20 Império dividido Como vimos na unidade anterior, a partir do fi- nal do século II, o Império Romano foi abalado por guerras civis, disputas internas pelo poder e inva- sões estrangeiras, entre outros fatores de desagre- gação. Tentando controlar a crise, em 395 o impera- dor Teodósio dividiu o Império entre seus dois filhos, Honório e Arcádio. Honório assumiu o Império Romano do Ociden- te, cuja capital ficava em Milão. A Arcádio coube o Império Romano do Oriente, sediado em Constan- tinopla (reveja o mapa da página 123). Este último também ficou conhecido como Império Bizantino, pois sua capital havia sido erguida no lugar da antiga cidade grega de Bizâncio. A capital de Constantino Concebida para ser capital do Império Romano, originalmente ela deveria se chamar Nova Roma, mas sua população consagrou o nome com que passa- ria à História: Constantinopla. Inaugurada em maio de 330, ela foi construída por ordem do imperador Constantino no estreito de Bósforo, a meio caminho entre o Oriente e o Ocidente, no cruzamento de im- portantes rotas comerciais. 1 A n ci en t A rt A rc h it ec tu re C o lle ct io n L td a, L o n d re s/ To p fo to /K ey st o n e Constantinopla (Istambul) em representação artística do século XVI. escolas, que passaram a reunir tesouros do pensa- mento e da literatura da Antiguidade. Devido ao grande número de pessoas de diver- sas origens que nela se instalaram, Constantinopla logo se transformou em uma cidade cosmopolita, sofrendo influência tanto de povos ocidentais como orientais. Em seu período áureo, no século VI, chegou a contar com mais de um milhão de habitantes. O poder do basileu Morto Teodósio em 395, os dois impérios te- riam destinos completamente diferentes. Enquanto o do Ocidente se esfacelava sob o impacto das inva- sões germânicas (reveja o capítulo 16), o Império do Oriente se consolidava como uma das principais po- tências da Ásia e do mundo mediterrâneo. Do ponto de vista de sua organização políti- ca, o Império Bizantino assumiu a forma de auto- cracia absoluta. O imperador, chamado de basileu (rei), controlava a legislação, podia nomear ou demi- tir quem quisesse e era o comandante das forças mi- litares. Além disso, era também o chefe da Igreja, e como tal convocava concílios, nomeava bispos e pro- mulgava regras e disposições religiosas. Considerado pessoa sagrada e vice-rei de Deus na Terra, o poder do basileu era tão grande que até a arte estava a serviço de sua autoridade. Assim, ao exaltar o Estado os artistas glorificavam também o Deus cristão, como você vai ver no item 5, A arte bizantina. A sociedade bizantina era fortemente hierarqui- zada (veja a seção Olho vivo). Em seu topo estavam o imperador e sua família. Em torno deles encontra- vam-se a nobreza urbana – composta de comercian- tes, donos de oficinas, banqueiros, altos funcionários públicos – e a rural, constituída pelos grandes pro- prietários de terras. Na base da sociedade ficavam os trabalhadores livres, abaixo dos quais estavam os ser- vos presos à terra e os escravos. O governo de Justiniano Desde a queda do último imperador romano do Ocidente em 476, sob a ação dos povos germânicos, os bizantinos acalentavam o desejo de reconstruiro Império Romano. Essa aspiração ganhou força a par- tir de 527, com a chegada ao trono do imperador Justiniano e de sua mulher, a imperatriz Teodora (veja a seção Olho vivo, nas páginas 156 e 157). 2 3 Constantino importou pinturas e esculturas de diversas partes do mundo, com as quais seus artistas decoraram construções públicas, praças e museus. Pergaminhos e outros documentos pertencentes a acervos gregos foram incorporados às bibliotecas e HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 155 3/6/13 10:59 AM 156 Unidade 4 Diversidade religiosa O mosaico desta seção, A imperatriz Teodora e seu séquito, de autor anônimo, exibe uma das poucas imagens conhecidas da imperatriz Teodora (c. 500-548). Ele se encontra na Igreja de São Vitale, em Rave- na, na Itália, e foi concluído em 547 d.C., um ano antes da morte da imperatriz. Com cerca de 47 anos à época, Teodora estava casada com o imperador Justiniano havia mais de vinte anos. Olho vivo A imperatriz Teodora A rainha veste as insígnias reais: o diadema de pedras preciosas, o toucado com joias e o manto de seda de cor púrpura sobre os ombros. O uso da cor púrpura era reservado a poucas pessoas do Império. O cinturão indica que ambos são dignitários, ou seja, altos funcionários do Império. O tablion (pedaço de pano em forma de losango pregado sobre a roupa) na cor púrpura é outro sinal de que essas pessoas eram altos funcionários do Império. As túnicas curtas foram introduzidas no Império Bizantino durante o governo de Justiniano. O eunuco Narsés era funcionário de confiança da imperatriz. A dalmática (tipo de manto) era usada sobre as túnicas pelos representantes das camadas mais elevadas da sociedade bizantina. As demais pessoas as usavam apenas em ocasiões especiais. HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 156 3/6/13 10:59 AM 157O Império Bizantino Capítulo 20 Quando os dois se conheceram, Teodora era atriz e dançarina de circo. Por essa razão, ao se tornar imperatriz, em 527, sofreu grande preconceito por parte da aristocracia bizantina. No mosaico, contudo, ela é representada de forma respeitosa. Ao retratá-la, o artista anônimo imprimiu à sua imagem uma co- notação sagrada, como veremos a seguir. A auréola em torno da cabeça denota o caráter sagrado da imperatriz Teodora. Aqui estão bordados os três reis magos com suas oferendas. Antonina, amiga da imperatriz e administradora do palácio. A cor púrpura do manto indica a proximidade de Antonina com a realeza. Joanina, filha de Antonina. As estolas eram uma peça comum do vestuário feminino da época. Os sapatos brancos e pretos compunham o uniforme dos dignitários. Eram entregues pelo próprio imperador juntamente com o certificado de nomeação para o cargo. Fonte: HAGEN, Rose Marie; HAGEN, Rainer. Los secretos de las obras de arte. Tomo I. Madrid: Taschen, 2005. A kg -I m ag es /L at in st o ck HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 157 3/6/13 10:59 AM 158 Unidade 4 Diversidade religiosa Em 533, depois de fortificar suas próprias fron- teiras e reequipar o exército, Justiniano se lançou à conquista do norte da África. Vitoriosas, logo depois suas tropas ocuparam a península Itálica. Em 550, fi- nalmente, o exército bizantino penetrou na penínsu- la Ibérica, conquistando o sul da região, após quatro anos de batalhas (veja o mapa a seguir). Juntamente com esse esforço de restauração do antigo Império Romano, o governo de Justinia- no dedicou-se também a sistematizar um de seus maiores legados, o Direito Romano. Dez juristas transformaram em código os principais preceitos le- gais do Direito Romano que regulavam a vida na so- ciedade bizantina. Dado a conhecer em 529, o trabalho recebeu o nome de Código de Justiniano. Posteriormente, outras leis foram reunidas no Digesto, publicado em 533. Além disso, o governo de Justiniano refor- mou as escolas de Direito e produziu um manual para estudantes sobre a legislação bizantina. Esse trabalho constituiu por séculos a base do Direito europeu e é, ainda hoje, o fundamento de muitas leis no mundo ocidental. Um longo declínio Morto Justiniano em 565, seus sucessores não conseguiram manter a unidade do Império. Entre os séculos VII e VIII, o Império Bizantino perdeu territórios para outros povos. Em seguida, também a Palestina, a Pérsia, o Egito – e, em 711, a península Ibérica – pas- saram do domínio bizantino para o controle do islã. Nos séculos seguintes o Império sofreu crises in- ternas, revoltas e conflitos religiosos. Em 1204, uma cruzada organizada por venezianos que seguia em direção a Jerusalém mudou de rumo e invadiu Cons- tantinopla (sobre as Cruzadas, veja o capítulo 23). Tesouros, obras de arte e livros, preservados por vá- rios séculos, foram destruídos ou saqueados. A ca- pital bizantina foi incendiada e não conseguiu mais se recuperar. Em 1453, após sete semanas de resistência, Constantinopla sucumbiu ao ataque dos turcos oto- manos chefiados por Maomé II. O episódio marcou não apenas a queda do Império Bizantino, mas tam- bém o término do período que a historiografia con- vencionou chamar de Idade Média. 4 Rio Tejo Mar Negro OCEANO ATLÂNTICO 45º 0º Tânger Cartagena Toledo Barcelona Marselha Córsega Sardenha Milão Ravena Aquileia Roma Siracusa Cartago Cesareia Tarento Toulouse Trípoli Cirene M ar Verm elho Atenas Constantinopla Creta Sicília Icônio SinopeEstr. deBósforo SelêuciaÉfeso Antioquia Arbela Ctesífon Alexandria Ptolemaida Jerusalém Chipre Rio Tigre Rio Loire LOMBARDOS GÉPIDAS ÁVAROS ALANOS NOVO IMPÉRIO PERSA REINO DOS OSTROGODOS REINO DOS FRANCOS REINO DOS VISIGODOS O Império Bizantino no início do reinado de Justiniano (527-565) Conquistas de Justiniano Rio Eufrates R io N ilo M ar Cáspio M a r M e d i t e r r â n e o R E I N O D O S VÂ N DA LO S O IMPÉRIO BIZANTINO SOB JUSTINIANO Fonte: GRAND atlas historique. Paris: Larousse, 2006. 0 330 QUILÔMETROS ESCALA 660 HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 158 3/6/13 10:59 AM 159O Império Bizantino Capítulo 20 A Rússia e o cristianismo No século IX, os rus, povo originário da Escan- dinávia, estabeleceram-se no território que hoje corresponde à Federação Russa, onde fundaram diversos povoados. Em 882, os dois povoados mais importantes, Kiev e Novgorod, passaram a ser go- vernados por um único líder, Oleg, que consolidou assim o reino dos rus. Pouco mais de cem anos depois, em 989, Vladimir, soberano desse povo, casou-se com a princesa Ana, irmã de Basílio II, imperador do Império Bizantino, e se convertou ao cristianismo. Vladimir mandou destruir estátuas e templos não cristãos em seu território e ordenou a construção de igrejas. A partir dessa época, a re- ligião cristã se constituiu em fator importante no processo de unifi cação da Rússia (nome derivado de rus). Kiev – atual capital da Ucrânia – se tornou então o grande centro cristão do Leste Europeu. ¡sso...Enquanto Catedral de São Basílio em Moscou, na Rússia, em foto de dezembro de 2008. Templo da Igreja ortodoxa, ou Igreja Cristã do Oriente, reflete em suas linhas arquitetônicas a influência da arte bizantina na Rússia. T ib o r B o g n ar /A FP P h o to A arte bizantina A arte bizantina é uma síntese do cristinianismo, do helenismo e do orientalismo. Ao lado de seu cará- ter fortemente cristão, ostenta um ar majestoso que exprime poder e riqueza. A majestuosidade da arte bizantina pode ser ob- servada tanto na arquitetura como nas pinturas e nos mosaicos que decoram o interior das igrejas. O mosaico – técnica que consiste na colocação, lado a lado, de pequenos pedaços de pedra de cores dife- rentes sobre uma superfície de gesso ou argamassa, formando imagens – foi a forma de expressão prefe- rida dos artistas do Império Bizantino. Paralelamente, monges bizantinos inventavam os ícones, pinturas que representavam figuras sagra- das do cristianismo, frequentemente decoradas comjoias e pedras preciosas, e veneradas nas igrejas e ora- tórios familiares. Em 726, o imperador Leão III, preo- cupado com o excesso de poder conquistado pelos monges, mandou destruir os ícones, fato que provo- cou uma guerra civil. Foi a chamada Questão icono- clasta, que só terminou em 843, quando a adoração aos ícones voltou a ser permitida. 5 Na arquitetura, a obra mais destacada é a igre-ja de Santa Sofia. Inaugurado em 537, o templo foi construído em cinco anos por 10 mil trabalhadores (veja a foto abaixo). Após a queda de Constantino- pla, em 1453, os turcos otomanos a transformaram em mesquita (templo muçulmano). A rt u r B o ga ck i/A la m y/ O th er Im ag es Igreja de Santa Sofia. Monumento arquitetônico mais famoso do Império Bizantino, a igreja foi inaugurada em Constantinopla em 537 d.C. Com a queda da cidade em 1453, foi convertida em mesquita. Por essa época, foram-lhe acrescentadas as quatro torres pontiagudas, conhecidas como minaretes. Em 1934, foi transformada em museu. Foto de junho de 2011. HMOV_v1_PNLD2015_154a160_U04_C20.indd 159 3/6/13 10:59 AM
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