Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 1/29 Unidade 1 - A República Velha (1889-1930): bases de estruturação Pietro Henrique DelalliberaIniciar Introdução Você já parou para pensar em qual é o signi�cado do termo “República”? A palavra vem do latim e remonta à Idade Antiga. Sua tradução seria mais ou menos “coisa (no latim, res) de todos”, “coisa pública”. Por isso, a época em que a cidade de Roma foi governada pelo Senado �cou marcada como “período da República”: a autoridade máxima não era um Rei ou um Imperador, mais sim uma assembleia formada por membros das famílias nobres e alguns representantes plebeus. Todos nós sabemos que o Brasil é uma república. Aliás, o nome “completo” do nosso país é “República Federativa do Brasil” (já vamos explicar o que esse “federativa” quer dizer...). O que você provavelmente ainda não sabe é quando e como nos tornamos uma República. Vamos começar esta unidade estudando justamente esse assunto: o momento no �nal do século XIX em que o Brasil adotou o sistema político que ele tem hoje 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 2/29 1. Grupos de poder envolvidos na proclamação da República Antes de qualquer coisa, precisamos nos localizar melhor na linha do tempo. Nosso país viveu entre 1822 (ano da independência) e 1889 o Período Imperial – ou seja, o período em que a autoridade máxima do governo era o imperador, não um presidente. No dia 15 de novembro de 1889, isso mudou. A República foi o�cialmente proclamada, derrubando o imperador Dom Pedro II. A partir de então entraríamos na “República Velha”, que durou até 1930. Portanto, nossa linha do tempo �ca assim: Figura 1 – Linha do tempo. Fonte: Elaborado pelo autor. Observado esses marcos cronológicos básicos, talvez você já tenha percebido a primeira grande pergunta que precisamos responder nesta unidade: o que deu tão 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 3/29 errado durante o império de Dom Pedro II para que ele fosse derrubado do poder em 1889? Por que não antes ou depois? Que grupos estavam insatisfeitos com o Império? Ou seja, precisamos conhecer aqueles que causaram o �m da monarquia e quais foram suas motivações. O primeiro grupo que temos que analisar é o dos cafeicultores. Durante o século XIX, o Brasil tinha se tornado o maior exportador de café do mundo. As elites tradicionais do país estavam em crise – quando falamos em “elites tradicionais”, pense, por exemplo, nos donos dos grandes engenhos de cana de açúcar do Nordeste, em estados como Bahia ou Pernambuco. Já os estados do Sudeste, como Minas Gerais, parte do Rio de Janeiro e, principalmente, São Paulo, cresciam numa velocidade impressionante. Os chamados “barões do café”, donos das grandes plantações, tinham se tornado, nas décadas �nais do período imperial, a elite mais rica do Brasil. Seu sucesso e riqueza estavam transformando o país de várias maneiras. Cidades como São Paulo e Rio de Janeiro cresceram e passaram por reurbanizações para que �cassem mais parecidas com as grandes capitais europeias, especialmente Paris, a “cidade luz”. Ferrovias começaram a cortar a região, construídas com o objetivo principal de levar o café até o porto de Santos (SP). A população também mudou com a chegada de milhões de imigrantes italianos, portugueses, espanhóis etc. que serviam de mão-de- obra nas lavouras cafeicultoras. Você sabia? Muitas construções famosas das cidades brasileiras estão relacionadas com o crescimento dos barões do café. Em São Paulo, por exemplo, no ano de 1867 foi inaugurada a Estação da Luz, um entreposto importante naquela época para os trens que vinham do interior do estado carregados de café. Uma década depois começou a ser construído o Viaduto do Chá. Mais tarde, o Teatro Municipal, inspirado no prédio da Ópera de Paris. Também foram abertas algumas grandes avenidas como a 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 4/29 Tiradentes, na vizinhança da Estação da Luz em São Paulo. Esse tipo de via mais larga, feita para comportar automóveis, era outra forma de copiar tendências urbanísticas da Europa. O problema era o seguinte: apesar dessa riqueza enorme, o poder político desses barões do café ainda era pequeno. O parlamento do Império brasileiro só tinha dois partidos: o Liberal e o Conservador. Ambos eram bem antigos, representavam elites tradicionais, escravistas, ligadas àqueles estados que no passado tiveram economias poderosas. Logo, o sistema não dava espaço para que estados emergentes como São Paulo ou Minas Gerais ocupassem lugares de destaque no parlamento. Os cafeicultores se sentiam extremamente injustiçados. Eram a elite mais rica do Brasil, pode-se dizer até que “carregavam o país nas costas” (pelo menos do ponto de vista da balança comercial), mas não tinham uma in�uência política proporcional a esse poder econômico todo. Como era de se esperar, na segunda metade do século XIX começou a crescer entre eles a ideia de que o Império precisava ser derrubado e substituído por outro regime político. Mas qual? Naquela época, “República” era uma ideia, digamos assim, “na moda”. Isso vinha desde o século XVIII, época do movimento Iluminista e das lutas contra as monarquias absolutistas. Vários países europeus tinham se tornado repúblicas ao longo do século XIX, no pós-Revolução Francesa (1789). Além disso, tínhamos um ótimo exemplo de governo republicano que era nosso vizinho de continente: os Estados Unidos. A ideia de um governo que fosse “coisa pública”, com eleições, mandatos não-vitalícios, separação entre Estado e Igreja, liberdade de expressão etc., já estava, portanto, bem divulgada e bem amadurecida no mundo todo. Todos naquele tempo entendiam muito bem como a República podia ser um bom antídoto para abusos de poder dos reis. Portanto, os barões do café começaram a adotar o republicanismo principalmente por ser um discurso pronto e já “testado” contra o Império, pouco importando os detalhes do seu conteúdo político. Haviam os republicanos convictos, é claro, mas a maioria dos cafeicultores não ligava muito para os princípios “democráticos” e 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 5/29 “liberais” de uma República. Sua estratégia era simplesmente aproveitar o que existisse de mais e�ciente para enfraquecer o governo de Dom Pedro II – o que, na época, era o republicanismo. Em outras palavras, eles não se incomodavam com o aspecto autoritário do governo, mas sim com o fato de estarem de fora daquele governo autoritário. A partir da década de 1860, foram abertos os chamados Clubes Republicanos, espaços de discussão (e também de conspiração) frequentados por intelectuais, escritores, jornalistas, políticos e demais setores da “nova elite”. No ano de 1870, foi lançado o jornal A república, que trazia na sua primeira edição, de 03 de dezembro, um “Manifesto Republicano”, importante documento que expunha as ideias políticas centrais do grupo. E �nalmente em 1873, num evento chamado Convenção de Itu, os fazendeiros de São Paulo fundaram o Partido Republicano Paulista (PRP). Ele foi criado justamente para romper com o jogo de cartas marcadas feito pelo Partido Liberal e pelo Partido Conservador. O PRP seria um importante protagonista da proclamação da República. Aliás, dois dos nossos primeiros presidentes – Prudente de Morais e Campos Salles – saíram desse partido. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb…6/29 Figura 2 – Prudente de Morais. Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Prudentedemorais.jpg . Esse era, então, o primeiro grupo social que se colocou contra o Império: os cafeicultores. Vamos analisar agora o segundo grupo, que são os militares. No meio do século XIX, o Brasil participou da famosa Guerra do Paraguai (1864-1870). Esse con�ito envolveu quatro países – Brasil, Argentina, Uruguai, unidos na Tríplice https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Prudentedemorais.jpg 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 7/29 Aliança contra o Paraguai – e foi a maior guerra da história da América do Sul. Nossas Forças Armadas foram vitoriosas e se tornaram motivo de orgulho para a população. Você quer ver? Se quiser saber mais sobre a Guerra do Paraguai, con�ra esta entrevista com o professor Francisco Doratioto, autor do in�uente livro Maldita Guerra, e o antropólogo e historiador André Toral, dois dos maiores pesquisadores brasileiros sobre o tema. Veja em: https://www.youtube.com/watch?v=Q5Yxrh9MX8Q Logo, nossos generais esperavam que quando terminasse o con�ito, o Exército passaria a ter mais in�uência na política do país – por exemplo, mais militares ocupando cargos públicos. Seria uma forma de, digamos assim, “recompensar” nossos soldados pela vitória. Essas expectativas foram totalmente frustradas. Dom Pedro II continuou nomeando uma maioria de civis para cargos chave no governo, como os de Ministro. Também não ocorreram grandes melhorias, por exemplo, nos salários. Portanto, ao longo da década de 1870, os militares começaram a se revoltar contra as “injustiças” do império e vários deles se tornaram republicanos. Esses atritos entre governo e militares �caram conhecidos como “Questão militar”. Para muitos deles, o motivo da adesão ao republicanismo também não tinha nada a ver com as suas “belas ideias” como democracia, igualdade, liberdade de imprensa etc. Seus objetivos eram corporativistas: derrubar a monarquia para instalar um novo regime no qual eles próprios, os militares, tivessem mais poder. Portanto, no �nal do século XIX, o país viveu esse casamento perfeito entre dois setores descontentes: cafeicultores e militares. Ambos desejavam o �m da monarquia, cada um com seus motivos particulares. Esses foram os principais grupos responsáveis pela proclamação em 15 de novembro de 1889. https://www.youtube.com/watch?v=Q5Yxrh9MX8Q 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 8/29 O descontentamento era impulsionado por um elemento extra: a �loso�a positivista que conquistava adeptos no Brasil naquela época. O Positivismo é uma escola de pensamento surgida na França a partir da obra de Auguste Comte (1798-1857). Resumidamente ele prega a valorização intransigente da ciência e da razão, negando qualquer forma de conhecimento tradicional, mítico-religioso ou mesmo metafísico. É uma forma de cienti�cismo, de racionalismo extremo. No plano político, que é o que nos interessa aqui, o positivismo defendia que o governo deveria se basear em leis e regras racionais, não na tradição. Logo, os positivistas não aceitavam a existência de uma monarquia católica como a nossa. Mas como construir esse novo governo “cientí�co”, “técnico”, totalmente racional? Eles acreditavam no caminho autoritário: uma ditatura de intelectuais e “técnicos” que reformasse a sociedade, livrando-a de todas as “velharias”. Não por acaso o positivismo ganhou muitos adeptos entre os militares. Para eles, a República ideal seria um governo centralizado, autoritário e que faria “de cima para baixo” um processo de modernização (econômica, jurídica, política) do país. Agora, sim, temos uma imagem melhor de como era esse “inimigo” que o Império enfrentou no �nal do século XIX: uma aliança política entre dois setores muito poderosos, cafeicultores e militares, temperada intelectualmente pelo projeto autoritário positivista. Você quer ver? O vídeo abaixo (com legendas em português) faz uma exposição sintética e bem didática da doutrina de Comte, com ênfase na sua tentativa de fundar uma “nova religião” ateia e racional, substituindo as religiões do passado que, segundo ele, �caram obsoletas na era da razão, da ciência, do Iluminismo. Veja em: https://www.youtube.com/watch?v=OhVamhT4Q3s https://www.youtube.com/watch?v=OhVamhT4Q3s 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=szb… 9/29 Você quer ler? Con�ra o livro A formação das almas, obra fundamental do historiador José Murilo de Carvalho. Ele fala do “imaginário” construído pela República, dedicando um capítulo inteiro ao positivismo. Mas, e os apoiadores do Imperador, onde estavam? Por que não foram capazes (ou não quiseram) proteger Dom Pedro II contra o levante dos republicanos em 1889? O regime imperial era sustentado principalmente pelas tais elites agrárias “tradicionais”, isto é, aquelas que estavam no poder desde o período colonial. Estamos falando daqueles grandes donos de terra em estados como Rio de Janeiro, capital do Império desde a chegada da Família Real em 1808, ou Bahia e Pernambuco, tradicionais produtores de cana de açúcar. Figura 3 – Bandeira do Império do Brasil. Por Tonyje�, based on work of Jean- Baptiste Debret - XIX century, Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1397090 https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1397090 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 10/29 https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1397090 Esses grupos se sentiram “apunhalados” pelo governo em 1888: naquele ano foi proclamada a Lei Áurea, que aboliu a escravatura no país. O problema não foi exatamente a proibição da escravidão, pois todos já esperavam que, mais cedo ou mais tarde, isso aconteceria. Aliás, várias leis abolicionistas foram aprovadas ao longo do século XIX, como a Lei Eusébio de Queiroz (1850) ou a Lei do Ventre Livre (1871). No entanto, essas elites tradicionais contavam que haveria algum tipo de indenização pelos escravos libertados, ou seja, uma compensação �nanceira pela perda do “investimento” que havia sido feito comprando mão-de-obra escrava. A Lei Áurea não estabeleceu nada do tipo (até porque não haveria dinheiro su�ciente no Brasil para indenizar cada dono de escravos) e isso incomodou profundamente os membros das elites tradicionais. A partir daquele momento, então, romperam com o Império e cruzaram os braços quando, um ano depois, veio a proclamação da República. Alguns, inclusive, apoiaram abertamente o movimento de 1889. Você sabia? Uma frase “profética” foi dita no 13 de maio de 1888 durante a sessão parlamentar que aprovou a Lei Áurea. O Barão de Cotegipe, membro do Partido Conservador e opositor da abolição, voltou-se para a Princesa Isabel, quem assinou a lei, e disse: “Vossa Alteza libertou uma raça, mas perdeu o trono”. De fato, pouco mais de um ano depois a República seria proclamada. Outra base de sustentação da monarquia era a Igreja. Ela também escolheu se omitir diante da ameaça republicana, mas por outro motivo. Dom Pedro II dava muito espaço para os maçons no seu governo – vários deles ocupavam cargos no parlamento ou nos ministérios, por exemplo, o que desagradava profundamente as lideranças católicas. Mesmo com os avisos por parte dos clérigos, o imperador não fez nada para diminuir essa in�uência da Maçonaria na administração pública. A https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1397090 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 11/29 Igreja“deu o troco” quando, em 1889, não usou sua enorme in�uência para convencer o povo a defender seu imperador. Essa grande con�uência de fatores deixou o terreno pronto para que a monarquia fosse derrubada. Vamos retomar, então, o jogo de forças políticas do �nal do século XIX. De um lado, os cafeicultores e os militares desejavam o �m do governo Imperial para que tivessem mais controle sobre a administração do país. De outro, os setores que deveriam apoiar o imperador (as elites “tradicionais” e a Igreja) escolheram, no mínimo, se omitir. A derrubada o�cial do Império veio no dia 15 de novembro de 1889, quando o Marechal Deodoro da Fonseca liderou um levante de tropas no Rio de Janeiro (então capital do país), instituiu um governo provisório, tornando-se ele próprio o primeiro presidente brasileiro. Então, veja só, aqui já temos duas enormes contradições da nossa República. Em primeiro lugar, a mais �agrante: ela nasceu com um golpe militar. Em segundo lugar, perceba que em nenhum momento estamos falando de participação popular, de uma revolução “das massas” ou algo do tipo. Todo o movimento foi pensado e conduzido por setores das elites. A historiadora Emília Viotti da Costa, num livro clássico sobre o assunto, deu uma espécie de resumida no processo republicano. Vamos ler: “O progresso econômico da segunda metade do século XIX acarretou profundo desequilíbrio entre poder econômico e poder político. Concebido em 1822, o sistema político parecia pouco satisfatório aos setores novos, na década de 1880. As novas elites urbanas não se sentiam su�cientemente representadas e os fazendeiros das áreas cafeeiras mais novas, que produziam boa parte da riqueza do país, sentiam-se peados pelas estruturas políticas do Império. O Partido Republicano recrutou adeptos nesses grupos sociais insatisfeitos. (...) A República se faria como a Independência se �zera – sem a colaboração das massas. O novo regime resultaria de um golpe militar. Nos meios republicanos, a estratégia conspiratória prevaleceu sobre a estratégia revolucionária. O Exército apareceu aos olhos das novas elites como o instrumento ideal para derrubar a Monarquia e instituir um novo regime que as colocasse no poder” (COSTA, Emilía Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 9ªed. São Paulo: Unesp, 2010, p. 17). 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 12/29 Repare como a autora diz que o exército foi um “instrumento”, isto é, uma ferramenta que as elites cafeicultoras e urbanas aproveitaram para conseguir chegar no poder. Os militares foram de certa forma “usados” e, se dependesse dos barões do café, sua função era derrubar o imperador e depois sair de cena. Repare, então, que aqui já temos um con�ito em potencial: esses dois grupos, cafeicultores e militares, uniram-se em torno de um objetivo comum, que era derrubar o Império; tirando isso, eles concordavam em muito pouco e estariam dispostos a brigar para permanecer liderando o Brasil. Portanto, quando a monarquia foi vencida em 1889, começou uma “segunda briga”: qual projeto de país iria prevalecer, o civil (cafeicultores) ou o militar? Vamos ver agora como se desenrolou essa disputa. 2. "República da Espada" (1889-1894): O Executivo versus o Legislativo A República Velha, como vimos, vai de 1889 até 1930. No entanto, sua primeira fase, um curto período que vai até 1894, foi apelidada de “República da Espada”. O nome vem do fato de que nossos dois primeiros presidentes foram militares: o Marechal Deodoro da Fonseca, proclamador da República que, no meio de uma grave crise em 1891, renunciou e cedeu lugar para seu vice, o também Marechal Floriano Peixoto, que governou até 1894. A “República da Espada” foi um período muito importante para a montagem das instituições do país – por exemplo, foi nesse período que a nova Constituição foi aprovada e se o�cializou a nossa bandeira nacional, com o lema positivista “Ordem e Progresso”. Foi também um período muito conturbado, marcado por con�itos políticos e bélicos. Vamos entender o porquê 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 13/29 Figura 3 – República da espada. Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Republica_no_brasil.jpg Os militares ocupavam o poder Executivo – a presidência. Haviam diferenças entre Deodoro e Floriano: o primeiro era mais velho, um saudosista da época da monarquia; o segundo era mais identi�cado com os setores positivistas mais jovens do exército. No entanto, ambos tinham uma mentalidade política muito parecida no essencial – o que era, aliás, a mentalidade dos militares: o poder deveria ser bastante centralizado. O governo federal deveria concentrar várias funções, dar pouca autonomia para os estados e liderar, de forma inclusive autoritária, o processo de modernização do país. Isso gerava uma tremenda briga com o Legislativo – ou seja, os deputados e senadores que representavam os diferentes estados brasileiros. Eles eram de modo geral mais federalistas. Ficamos devendo uma explicação sobre esse termo, você se lembra? Lá vai: federalismo é a ideia de que os estados que compõem um país https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Republica_no_brasil.jpg 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 14/29 (federação) devem conservar sua autonomia. Portanto, embora as unidades federativas sejam parte de uma União, elas continuam tendo leis próprias, polícias próprias, impostos próprios e assim por diante. Você sabia? O melhor exemplo de Estado federativo são os Estados Unidos da América – não por um acaso, a maior inspiração dos nossos republicanos no século XIX. Até a metade daquele século, mesmo uma questão crucial como proibir ou não a escravidão era decidida por cada estado conforme sua vontade. Pense também em exemplos “polêmicos” dos dias de hoje: há estados americanos em que o comércio de maconha foi liberado, há estados em que ele continua proibido; há estados que têm pena de morte, outros não; o mesmo acontece com relação ao aborto; e assim por diante. Ou seja, cada estado-membro da federação tem autonomia para legislar sem precisar seguir o governo central. Num país muito menos federativo como o nosso, esses assuntos são todos regulados por uma lei federal que se aplica a todos. Era esse modelo de governo que os representantes dos vários estados queriam para o Brasil: uma República Federativa. Era, aliás, o que mandava a Constituição. E era justamente isso que os presidentes militares queriam impedir, pois achavam que desorganizaria o comando do país. Portanto, o que marcou a “República da Espada” foi esse con�ito entre “modelo centralizador” versus “modelo federalista”. Um era defendido pelos presidentes militares, que controlavam o poder Executivo; o outro modelo era defendido pelos representantes civis dos estados que dominavam o Legislativo (o parlamento). 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 15/29 Você quer ler? O ponto máximo desse con�ito foi o estouro da chamada Revolução Federalista. Ela começou em 1893 no estado do Rio Grande do Sul e opôs grupos aliados ao presidente Floriano Peixoto a setores que queriam uma Constituição própria, inspirada no positivismo, para o estado. A revolução se transformou em guerra civil, se espalhou para Santa Catarina e Paraná e durou até 1895. Foi o con�ito mais sangrento da República Velha.Se quiser saber mais sobre este episódio, con�ra este artigo do Centro de Pesquisa e Documentação da FGV: https://cpdoc.fgv.br/sites/default/�les/verbetes/primeira- republica/REVOLU%C3%87%C3%83O%20FEDERALISTA.pdf Essa contradiçãocomeçou a ser resolvida, depois de muita discussão e muito sangue derramado, em 1894. Foi a data em que acabou a República da Espada e nosso primeiro presidente civil, representante dos cafeicultores paulistas, assumiu. A partir daquele momento, a “República Velha” foi ganhando suas características mais marcantes, que duraram até 1930. 3. República Oligárquica (1894 – 1930): a quadratura do círculo Os presidentes civis brasileiros estavam condenados a enfrentar dois grandes problemas. Vamos tentar entendê-los. Em primeiro lugar, esses presidentes precisavam lidar com vários interesses regionais muitas vezes con�itantes. Você se lembra que a elite mais poderosa economicamente do período eram os cafeicultores, certo? Pois bem: como eles poderiam governar o país de acordo com seus interesses e, ao mesmo tempo, agradar às demais elites, como as urbano-industriais ou os latifundiários que não eram do ramo do café? Em outras palavras, como tocar uma política econômica https://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/REVOLU%C3%87%C3%83O%20FEDERALISTA.pdf https://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/REVOLU%C3%87%C3%83O%20FEDERALISTA.pdf 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 16/29 nacional se várias regiões queriam, à moda federalista, desenhar estratégias comerciais diferentes? Era preciso manter o parlamento e os vários governadores de estado contentes, algo que os dois primeiros presidentes militares não souberam fazer, já que optaram por medidas autoritárias ao invés da negociação. O segundo problema mais fatal ainda. A proclamação da República foi, como já estabelecemos, um movimento das elites, e os partidos e grupos envolvidos no processo não tinham pautas e conexões populares. No entanto, a Constituição de 1891 estabelecia, obviamente, eleições. Portanto, como essa elite republicana, dominada pelos cafeicultores, poderia se eleger se suas ideias não tinham nada a ver com os objetivos do “povo”? Para tentar resolver esses dois enormes problemas, nosso primeiro presidente civil, Prudente de Morais, começou a elaborar um arranjo político que seria aperfeiçoado por seu sucessor, Campos Salles, e daí em diante deslancharia. Eles encontram uma fórmula complexa, mas muito e�ciente, que fez a “República Velha” funcionar politicamente por mais de três décadas. Esse arranjo �cou conhecido como “Política dos Governadores” e é fundamental que você entenda como ele funcionava. A base de tudo era um acordo informal entre o governo federal e os governadores estaduais, uma troca de favores. O presidente liberava verbas e dava ampla autonomia política para as oligarquias de cada estado. Estas podiam, portanto, usar esse poder e esse dinheiro para manter-se no poder inde�nidamente. Em troca, os governadores garantiam que, nos seus estados, apenas deputados e senadores favoráveis ao governo seriam eleitos. Com isso, o presidente tinha sempre certeza de que o Poder Legislativo seria “dócil”. O ciclo se repetia a cada eleição, garantindo que sempre as mesmas oligarquias mandassem no país e também dando certeza para o governo federal de que seus projetos encontrariam pouquíssima oposição no Congresso. Talvez você tenha notado o seguinte: todo esse sistema só era possível porque havia algum jeito de manipular as eleições. Senão, seria impossível para as oligarquias estaduais garantir que seus conterrâneos realmente “votaram direito”, não é mesmo? 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 17/29 O sistema eleitoral brasileiro estabelecido pela Constituição de 1891 era cheio de problemas. Em primeiro lugar, ele não permitia que mulheres e analfabetos participassem das eleições. Resultado: no Brasil da República Velha, não mais do que 5% da população adulta participava de eleições presidenciais. E o mais grave era o seguinte: o voto era descoberto, isto é, não-secreto. O eleitor precisava declarar em voz alta na junta eleitoral qual candidato ele escolheu, o que permitia que seu voto fosse, na verdade, vigiado. Você sabia? O Brasil só passou a permitir voto e candidaturas femininas em 1934, após o �m da República Velha. Naquele ano foi aprovada uma nova Constituição e a médica e pedagoga paulista Carlota Pereira de Queirós (1892-1982) tornou-se a primeira deputada federal da história do país. O sistema oligárquico da República Velha estava assentado num fenômeno chamado de “coronelismo”. Os “coronéis” eram homens de grande poder econômico, geralmente donos de terras, muitos deles em municípios do Nordeste, que exerciam in�uência sobre a política local de duas maneiras. A primeira, mais típica, era por meio das trocas de favores. Um coronel podia conseguir de tudo, de empregos e cargos públicos até comida e remédios para uma população carente. Mas em troca ele exigia �delidade política, isto é, que os seus “protegidos” votassem nos candidatos apontados por ele. Essa relação de troca desigual entre um poderoso e o povo é chamada de clientelismo. A segunda maneira que um coronel brasileiro tinha de exercer in�uência era pela violência pura e simples: grandes senhores de terra em regiões afastadas do país podiam decidir sobre a vida e a morte de seus desafetos políticos. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 18/29 Por uma combinação desses métodos, os coronéis formavam os chamados currais eleitorais, isso é, zonas cujas votações eram controladas por eles. Como o voto era aberto, o coronel podia conferir, por meio de seus “espiões”, quem estava realmente seguindo suas orientações na hora de ir às urnas. Esse fenômeno �cou conhecido como “voto de cabresto” (cabresto é a corda ou tira de couro que se coloca na cabeça de um cavalo ou burro para poder guia-lo quando for montado; portanto, a expressão faz alusão ao fato de que os eleitores eram guiados bovinamente de acordo com a vontade dos coronéis). Você quer ler? O grande escritor Lima Barreto (1881-1922), no livro satírico Os Bruzundangas, narra o seguinte sobre as eleições na República Velha: “(...) todos os representantes do povo, desde o vereador até ao Presidente da República, eram eleitos por sufrágio universal, e, lá, como aqui, de há muito que os políticos práticos tinham conseguido quase totalmente eliminar do aparelho eleitoral este elemento perturbador — ‘o voto’. Julgavam os chefes e capatazes políticos que apurar os votos dos seus concidadãos era anarquizar a instituição e provocar um trabalho infernal na apuração (...)” (BARRETO, Lima. Os Bruzundangas. Belém: Universidade da Amazônia, 1922, P. 48 e 49). O livro na íntegra pode ser lido em: http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do? select_action=&co_obra=16833 Todas essas peças se encaixavam perfeitamente na Política dos Governadores. Acompanhe bem os passos para que não �que nenhuma dúvida: o governo federal (presidente) liberava verbas para os governadores dos estados; estes usavam essa verba para “comprar” o apoio dos coronéis (líderes regionais); os coronéis garantiam que a população de cada zona eleitoral iria votar nos candidatos “certos” para todos os níveis do governo: vereador, deputado, senador, governador e presidente; tudo http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=16833 http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=16833 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 19/29 isso era possível porque o número de eleitores era reduzido (fácil de controlar) e o voto era aberto; a cada governo eleito o ciclo se repetia,garantindo que as mesmas elites �cassem no poder. Com a Política dos Governadores funcionando a todo vapor, o céu era o limite para as elites cafeicultoras. Vejamos então de que modo elas usaram todo esse poder político. 4. A economia a serviço dos barões de café Nosso primeiro presidente, Deodoro da Fonseca, tentou em 1890 um plano ousado de modernização da economia. Como você se lembra, ele era um militar e o país vivia a República da Espada (1889-1894). Portanto, seu projeto não tinha compromisso com nenhum setor produtivo especí�co, como o dos cafeicultores. Seu plano era fazer o possível para promover o crescimento do país e, especialmente, da indústria nacional, área responsável pelas mercadorias mais valiosas e que ainda era bastante tímida em comparação com o setor de agroexportação. O Ministro da Fazenda da época, chamado Ruy Barbosa (1849-1923), elaborou um plano. Era preciso melhorar a oferta de moeda e de crédito na economia brasileira. Isso porque a renda era muito concentrada em nosso país. Logo, era muito difícil para um cidadão “comum”, que não fosse já membro de alguma família rica, abrir uma empresa ou comércio, adquirir uma terra para plantação, começar uma fábrica do zero. Se as possibilidades de empréstimo fossem ampliadas, mais brasileiros poderiam empreender. A estratégia adotada pelo governo, porém, provou ser um desastre. Na tentativa de aumentar o volume de dinheiro que circulava na economia, Ruy Barbosa autorizou que alguns bancos privados emitissem moeda por conta própria. Consequentemente, essas instituições começaram a soltar no mercado moedas sem lastro. Com o grande volume �nanceiro circulando, o crédito foi ampliado e uma in�nidade de empresas novas foram fundadas, muitas delas de fachada. A economia 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 20/29 cresceu euforicamente e a bolsa de valores registrou recordes no ano de 1890, mas tudo não passava de uma bolha especulativa. Essa política �cou conhecida como Encilhamento. Ela produziu uma enorme desvalorização da moeda brasileira e, portanto, in�ação nas alturas, tudo consequência do excesso de dinheiro que foi posto para circular no mercado. Além disso, o país assistiu a muitas falências, tanto de empresas quanto de bancos (que nunca tiveram seus empréstimos pagos pelas empresas fantasma). O Encilhamento, embora muito mal planejado, foi uma medida bem-intencionada, pois pretendia industrializar e urbanizar o país. Representou, assim, um “ponto fora da curva” na política econômica da “República Velha”, pois tentava diversi�car o mercado brasileiro e promover um crescimento de setores que não fossem os agroexportadores. A partir do momento em que as elites cafeicultoras tomaram o poder e colocaram a Política dos Governadores para funcionar, a regra passaria a ser uma só: sempre privilegiar os produtores de café. Você sabia? O apelido “encilhamento” é uma referência às corridas de jóqueis. “Encilhar” signi�ca colocar o arreio (equipamento onde �ca a sela) no cavalo, ou seja, é o preparativo �nal antes de uma corrida começar. O momento do encilhamento dos animais é justamente quando o público corre para fazer apostas. Esse instante de entusiasmo dos apostadores lembrava o frenesi especulativo irresponsável que a política de Ruy Barbosa gerou no ano de 1890. Quando terminou a República da Espada em 1894, a tarefa mais urgente do país era resolver uma situação de crise econômica. Essa crise tinha vários motivos: os preços do café estavam em queda naquela década, os gastos com os militares haviam crescido, nossa balança comercial era de�citária, pois precisávamos importar todo tipo de produto manufaturado do exterior etc. Tudo foi agravado com o 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 21/29 Encilhamento, que acrescentou dois novos componentes a essa situação tóxica: in�ação e crescimento da dívida pública. Nosso quarto presidente (o segundo civil), Campos Sales, resolveu encarar o problema por meio de uma renegociação da dívida externa brasileira com os credores estrangeiros. O país obteve uma moratória (suspensão da dívida) de mais de uma década e um empréstimo adicional de 10 milhões de libras esterlinas. Essa operação recebeu o nome de Funding Loan – o que, em tradução literal, quer dizer algo como “empréstimo de �nanciamento”, exatamente o que o Brasil tentou fazer: renegociar o pagamento da dívida externa, obter um empréstimo novo e, com isso, “ganhar tempo” para reestruturar suas contas públicas. Ao longo da história republicana, o país se veria forçado a fazer outros funding loans. De toda forma, a renegociação feita por Campos Sales, no �m da década de 1890, foi su�ciente para equilibrar as contas por um tempo. Nosso quarto presidente (o segundo civil), Campos Sales, resolveu encarar o problema por meio de uma renegociação da dívida externa brasileira com os credores estrangeiros. O país obteve uma moratória (suspensão da dívida) de mais de uma década e um empréstimo adicional de 10 milhões de libras esterlinas. Essa operação recebeu o nome de Funding Loan – o que, em tradução literal, quer dizer algo como “empréstimo de �nanciamento”, exatamente o que o Brasil tentou fazer: renegociar o pagamento da dívida externa, obter um empréstimo novo e, com isso, “ganhar tempo” para reestruturar suas contas públicas. Ao longo da história republicana, o país se veria forçado a fazer outros funding loans. De toda forma, a renegociação feita por Campos Sales, no �m da década de 1890, foi su�ciente para equilibrar as contas por um tempo. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 22/29 Figura 4 – Campos Sales. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Campos_Sales#/media/File:Campos_Sales.jpg Talvez a prática mais marcante da economia da República Velha seja a chamada “política de valorização do café”. Você provavelmente já ouviu falar dela com outro nome: eram as famosas “queimas de café” que ocorriam na virada do século no Brasil. Mas por que o governo mandaria destruir toneladas e toneladas do seu produto de exportação mais valiosos? A resposta, por mais estranha que pareça, é a seguinte: justamente para mantê-lo valioso. Para entender tudo isso, precisamos relembrar um conceito básico de economia, a chamada “lei de oferta e demanda”. Se a oferta de um bem é muito grande ou a procura por ele é baixa, seu preço cai. Se o oposto acontece – oferta baixa e/ou demanda alta – o preço sobe. Em termos práticos: se uma mercadoria está “sobrando” no mercado, está em “excesso”, os produtores precisam abaixar seu preço para conseguir vendê-la. https://pt.wikipedia.org/wiki/Campos_Sales#/media/File:Campos_Sales.jpg 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 23/29 Esse era o caso do café. Em períodos de baixa na economia mundial, as safras gigantescas brasileiras acabavam “encalhando” por falta de compradores. Um ótimo exemplo disso é o que ocorreu durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A Europa estava concentrando cada centavo nos gastos bélicos, consequentemente, sua demanda pelo café brasileiro caiu bastante e parte da safra brasileira “encalhou”. Pelas regras de mercado, o destino dos cafeicultores seria ter um enorme prejuízo com a queda no preço do produto. Qual política poderia ser feita então para “valorizar o café”? Muito simples: o governo federal se comprometia a comprar ou reter o excedente das safras, mantendo o preço do café (e o lucro dos cafeicultores) sempre num patamar arti�cialmente alto. Quando esse excedente era muito grande, não havia o que fazer com tanta mercadoriae ela precisava ser destruída, o que explica as queimas do café. Do ponto de vista da saúde das contas públicas, a política de valorização do café não fazia o menor sentido. O Estado brasileiro gastava uma quantia enorme de dinheiro público (dinheiro “de todos”) para privilegiar uma oligarquia agrária. Era, portanto, assumidamente um compromisso do governo federal em repartir os prejuízos de um grupo de produtores com toda a nação. Porém, com a Política dos Governadores, o Estado havia se tornado uma espécie de propriedade privada desse grupo de produtores. Isso explica porque dizemos que durante a República Velha existiu no país a chamada “política do café-com-leite”. O nome faz referência, respectivamente, aos estados de São Paulo e Minas Gerais (que apesar de seu um polo pecuarista, também tinha muitas lavouras de café), que detinham poder inigualável na República Velha. Isso ocorria por dois motivos: em primeiro lugar, eram as regiões mais ricas do período e, por isso mesmo, apontaram todos os presidentes brasileiros desde o �m da República da Espada. Isso não quer dizer que todos os presidentes foram paulistas ou mineiros, mas sim que eram políticos apoiados pelas oligarquias paulistas e mineiras e tinham suas vitórias asseguradas devido à Política dos Governadores. Em segundo lugar, São Paulo tinha a vantagem de ser o estado mais populoso da federação, o que lhe dava mais acentos no parlamento. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 24/29 Nessas condições de República do “café-com-leite”, �ca fácil entender como políticas absurdas como a da “valorização do café” podiam ser aprovadas embora contrariassem vários interesses regionais. Você sabia? A ideia de “política do café-com-leite” é uma simpli�cação usada por historiadores para estudar esse período no qual, de um modo geral, interesses das elites de Minas e São Paulo prevaleceram. Não se engane: os barões do café também enfrentavam oposição e a política dos governadores não era um mecanismo “perfeito”. Nos grandes centros urbanos, por exemplo, não haviam coronéis típicos com os quais se podia negociar; logo, outras estratégias precisavam ser adotadas. Como sempre, a realidade histórica é mais rica e complicada do que qualquer conceito generalizador. Com o passar do tempo, essa irresponsabilidade quase arrogante dos cafeicultores na condução da política do país começaria a revoltar as demais oligarquias regionais – mas isso será assunto para outra unidade. 5. República Velha, diplomacia nova Com o passar do tempo, essa irresponsabilidade quase arrogante dos cafeicultores na condução da política do país começaria a revoltar as demais oligarquias regionais – mas isso será assunto para outra unidade. Os presidentes da República Velha foram os responsáveis por de�nir as atuais fronteiras nacionais. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 25/29 No �nal do século XIX, o Brasil tinha ainda cinco regiões que eram disputadas com outros países. Em primeiro lugar, a região do atual estado do Amapá, no Norte, era motivo de atrito com a Guiana Francesa. Os con�itos ganharam intensidade em 1895 e passaram a chamar a atenção do governo federal. A questão foi resolvida cinco anos depois: o Brasil �cou com o Amapá e postulou que sua fronteira norte seria o rio Oiapoque – hoje tornou-se até um clichê dizer que nosso país vai “do Oiapoque ao Chuí (no Rio Grande do Sul)”. Também em 1895, resolvemos com a Argentina uma questão histórica, que se arrastava desde a época colonial, estabelecendo que a região de Palmas, localizada entre Santa Catarina e Paraná, �caria com o Brasil. Um ano depois, negociamos com a Inglaterra a posse sobre a Ilha de Trindade, até hoje o pedaço de terra brasileiro mais afastado do continente. Mais tarde, em 1904, decidimos como dividir a região do Pirara, no extremo norte do país, fronteira com a Guiana (ou Guiana Inglesa). A aquisição territorial mais importante do país viria mesmo em 1907: assinamos naquela data o Tratado de Petrópolis, por meio do qual compramos da Bolívia a região que hoje é o estado do Acre e resolvemos um con�ito que se arrastava desde pelo menos 1902. Foi a última vez que ampliamos nosso território; desde então, o país nunca mais aumentou de tamanho. Mas por que adquirir o Acre? O que havia de importante naquela região a ponto de gerar desavenças entre dois vizinhos continentais? É preciso entender o contexto: na virada do século XIX para o XX, os Estados Unidos e vários países europeus haviam passado pela Segunda Revolução Industrial. Desde a década de 1880, as bicicletas se popularizavam nas capitais do mundo todo. Na década seguinte, o automóvel começaria a se disseminar e nunca mais pararia. A fabricação desses produtos exigia um material indispensável: a borracha, matéria- prima dos pneus e também de alguns componentes do interior dos veículos. Todos perceberam que a região amazônica, Acre em especial, era riquíssima em seringueiras, as árvores de onde se extrai o látex para fabricação de borracha. Houve, portanto, uma espécie de “corrida” até a região e começaram os con�itos violentos entre brasileiros e bolivianos, ambos os lados reivindicando exclusividade sobre a atividade extrativista. O Tratado de Petrópolis veio em 1907 para apaziguar essa situação e o�cializar a posse brasileira sobre aquela terra. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 26/29 O chamado “ciclo da borracha” foi relativamente curto, mas não trivial: durante seu auge, entre os anos de 1890 e 1910, a borracha representou mais ou menos 25% de todas as exportações brasileiras, �cando atrás apenas do café. O arquiteto político por trás de vários desses tratados e negociações territoriais foi um homem chamado José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do Rio Branco (1845-1912), nosso Ministro das Relações Exteriores no início do século XX. Sua importância para história brasileira é gigantesca, pois ele formulou linhas gerais da nossa política externa que, de um modo ou de outro, até hoje seguimos. Talvez sua principal contribuição tenha sido a mudança do alinhamento diplomático da Inglaterra para os Estados Unidos. Até aquele momento, o Brasil seguia uma tradição herdada da família real portuguesa de privilegiar relações com Londres – nossa dívida externa, nossos principais acordos comerciais, nossas alianças militares, en�m, todos esses aspectos da inserção brasileira no mundo eram pautados pelos ingleses. O Barão do Rio Branco nos alinhou no início do século XX com Washington e assim estamos até hoje, com doses maiores ou menores de “pragmatismo” (isto é, de “barganha” para atender a interesses nacionais próprios) e de independência ao longo da história. Você quer ler? Em 2012, centenário da morte do Barão do Rio Branco, o professor Antônio Carlos Lessa, do Instituto de Relações Internacionais da UnB, publicou esse breve balanço do legado do diplomata da República Velha. Boa sugestão caso você queira entender um pouco melhor o legado do Barão para a política brasileira: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-73292012000100001 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-73292012000100001 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 27/29 Outra mudança introduzida pelo Barão do Rio Branco foi a relação entre o Brasil e seus vizinhos continentais, como você já deve ter percebido após ler a listagem acima de aquisições territoriais. A partir da sua gestão, nosso país seria bem mais envolvido nas questões sul-americanas, o que abriu portas, crioucondições para inúmeras políticas de integração regional que vieram no futuro – incluindo, muitos e muitos anos depois, o próprio Mercosul. A diplomacia do Barão do Rio Branco nos fez abandonar uma postura histórica de virar as costas para os vizinhos “latinos” e levou o Brasil a assumir um papel mais ativo nos assuntos regionais. 5.1 Considerações finais: uma República contraditória Neste ponto da leitura, você certamente já percebeu que a República Velha era cheia de contradições. Mas exatamente por quê? Quais contradições? Vamos ler um parágrafo do historiador Boris Fausto que ajuda a esclarecer esse problema: “A análise dos acordos entre as várias oligarquias nos indica que o Estado – no sentido de poder central – não foi um simples clube dos fazendeiros de café. O Estado se de�niu como articulador de uma integração nacional que, mesmo frágil, nem por isso era inexistente. Tinha de garantir uma certa estabilidade no país, conciliar interesses diversos, atrair investimentos estrangeiros, cuidar da questão da dívida externa. Isso não quer dizer que os negócios do café – nos quais os fazendeiros representavam apenas um elo de uma cadeia que ia até os consumidores externos, passando pelos exportadores – tivessem importância secundária. Pelo contrário, eles foram o eixo da economia do período. Ao longo da República Velha, o café manteve de longe o primeiro lugar na pauta das exportações brasileiras, com uma média em torno de 60% do valor total. No �m do período, representava em média 72,5% das exportações. Dependiam do produto o crescimento e o emprego, nas áreas mais desenvolvidas do país. Ele fornecia também a maior parte das divisas necessárias para as importações e o atendimento dos compromissos no exterior, especialmente os da dívida externa” (FAUSTO, Boris. História do Brasil. 13ªed. São Paulo: Edusp, 2009, p. 273). Repare a posição complicada da elite cafeicultora. Por um lado, ela era indiscutivelmente a maior força econômica do país e, por isso mesmo, queria comandar a República Velha como se fosse uma propriedade privada. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 28/29 Por outro lado, ela não podia, digamos assim, “exagerar na dose”. Ou seja: o Brasil era um país muito ameaçado por riscos de separatismo e pontuado por inúmeras oligarquias regionais, por “coronéis” muito poderosos nos seus “currais”. Portanto, o governo republicano precisava ser um espaço de articulação, de integração, dessas várias elites. Se os cafeicultores se tornassem muito intransigentes, corriam o risco de rachar a federação. Claro que sua vontade prevalecia, mas se o Estado se tornasse, nas palavras do autor, um simples “clube dos fazendeiros de café”, as demais oligarquias poderiam desertar. Consegue perceber a contradição sobre a qual a República Velha se apoiava? Nós falamos dela no início da Unidade, você provavelmente se recorda: é aquela velha oposição entre autonomia e centralização. Os primeiros presidentes, os militares da “República da Espada”, tentaram resolver de forma truculenta esse problema político, forçando os estados a obedecer um governo central autoritário. Falharam. Já os oligarcas do café elaboraram uma solução muito mais so�sticada: uma “política de governadores” que agradava as oligarquias regionais e permitiu, assim, que os presidentes do “café-com-leite” governassem com relativa paz. Foram muito mais bem-sucedidos, pois seu modelo de República durou várias décadas. Mesmo assim, a contradição entre estados (oligarquias regionais) e governo central (dominado pelos cafeicultores) ainda estava lá, dormente, esperando por uma oportunidade para despertar e sacudir as bases da República. Uma hora essa oportunidade veio, é claro, mas isso é assunto para nossa próxima unidade. Síntese Chegamos ao �m desta unidade. Aprofundamos nosso conhecimento acerca da conformação da ordem política e econômica de nosso país na virada do século XIX ao XX, compreendendo a transição da monarquia para a república. Observamos os principais atores políticos que construíram o passo a passo de cada processo, seus interesses e os con�itos que tiveram de enfrentar para concretizá-los. 26/02/24, 09:16 EDU_HBCPRV_19_E_1 https://student.ulife.com.br/ContentPlayer/Index?lc=UpnApHHMt3TtEYys8Dm0Nw%3d%3d&l=qBxQ327kl4c3Owxk%2fAbIAA%3d%3d&cd=sz… 29/29 Nesta unidade você teve a oportunidade de: Compreender a ideia de república e as motivações que levaram à queda do império Reconhecer o papel das elites cafeeiras paulistas para moldar a república brasileira em seus primórdios; Observar o processual histórico da tomada de poder por cafeicultores e militares insatisfeitos com o império e con�itos posteriores entre os novos governantes; Estudar a “República da Espada” e as disputas principais que orientariam a conformação política do período; Situar-se diante das contradições e desa�os da república brasileira que se iniciava como uma fachada para os interesses econômicos dos cafeicultores; Compreender as origens e reorientações da política externa brasileira atual como atuante no contexto latinoamericano. Download do PDF da unidade Bibliografia BARRETO, Lima. Os Bruzundangas. Belém: Universidade da Amazônia, 1922, P. 48 e 49. COSTA, Emilía Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 9ªed. São Paulo: Unesp, 2010. FAUSTO, Boris. História do Brasil. 13ªed. São Paulo: Edusp, 2009. NAPOLITANO, Marcos. História do Brasil república: da queda da Monarquia ao �m do Estado Novo. São Paulo: Contexto, 2016. Disponível na Biblioteca Virtual Universitária
Compartilhar