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Geografia - Livro 3-166-168

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GEOGRAFIA Capítulo 9 África I166
Com esse modelo de colonização, o desencontro entre
as fronteiras políticas e culturais foi, e ainda é, um fator de
desestabilização na África. Quando os europeus se retira-
ram ou foram expulsos dos territórios, o que ocorreu em
grande parte na década de 1960, suas ex-colônias multi-
étnicas tornaram-se países instáveis.
Um exemplo disso é o que ocorreu na região de Ruanda
e Burundi, território que fez parte da colônia alemã na África
Subsaariana até a Primeira Guerra Mundial, quando passou a
ser controlado pela Bélgica. Com a saída dos europeus, os
dois principais grupos étnicos que compõem a população da
área, os tutsis e os hutus, iniciaram uma disputa pelo poder
Até a década de 1950, os tutsis, que representam uma mino-
ria da população, tinham o domínio político garantido pelas
estruturas tradicionais de poder Porém, na década de 1960,
os hutus passaram a controlar a região e estabeleceram a
separação de Ruanda e Burundi, o que deflagrou nesses ter-
ritórios sangrentos conflitos, que tiveram seu auge entre 1993
e 2005. Motivados pelo ódio étnico, vários grupos armados
de origem hutu mataram ou expulsaram milhões de campo-
neses tutsis de Ruanda e de Burundi. Foram criados grandes
campos de refugiados nos países vizinhos para abrigar os
sobreviventes, principalmente na República Democrática
do Congo (ex-Zaire). Em 2005, os grupos mais violentos se
dissiparam, dando espaço para a formação de novos partidos
políticos; acordos de paz se consolidaram em 2008.
As guerras e os movimentos armados em busca de
independência contribuíram para a destruição de parte
da infraestrutura já instalada no continente africano e de
áreas de cultivo, o que comprometeu, também, o desen-
volvimento econômico dos países recém-independentes.
Alguns conseguiram negociar, de modo mais pacífico, a
saída dos colonizadores, como ocorreu em muitas das
colônias francesas e britânicas. Porém, com a decorrente
destruição do sistema produtivo, grande parte desses
países não conseguiu consolidar políticas exitosas de
desenvolvimento social e econômico.
Além disso, conflitos civis eclodiram em muitos países
independentes durante o período da Guerra Fria. Na época,
muitas vezes em reflexo à cisão político econômica mundial
e ao embate entre o socialismo e o capitalismo, grupos com
diferentes ideologias e interesses lutavam pela tomada do
poder Foi o caso de algumas ex-colônias portuguesas que
estão entre as últimas a conquistar a emancipação, como
Angola e Moçambique, que se tornaram independentes
na década de 1970.
A sucessão de governos autoritários, a corrupção e as
perseguições a grupos étnicos adversários são fatos que,
somados às heranças coloniais no território, a uma econo-
mia estruturada na exploração de produção de commodities
e ao pequeno volume de capital estrangeiro investido no
continente, auxiliam a explicar o baixo desenvolvimento
dos países africanos
Divisões do continente
Considerando o posicionamento em relação aos pon-
tos cardeais, o continente africano é dividido em cinco
regiões, identificadas no mapa a seguir.
África: macrorregiões
Fonte: elaborado com base em The six regions of the African Union. West Africa Brief, 6 fev. 2017. Disponível em: www.west-africa-brief.org/content/en/six-
regions-african union. Acesso em: 27 jan. 2021.
Mar Mediterrâneo
M
ar V
erm
elho
Estreito de
Gibraltar
M
er
id
ia
n
o
 d
e 
G
re
en
w
ic
h
Trópico de Capricórnio
Trópico de Câncer
Equador
0°
0°
OCEANO
ATLÂNTICO
OCEANO
ÍNDICO
NORTE
OESTE
SUL
CENTRAL
LESTE
0 750 km
N
Norte (7 países): Argélia, Egito, Líbia, Mauritânia,
Marrocos, Saara Ocidental e Tunísia
Sul (10 países): Angola, Botsuana, Lesoto, Malauí,
Moçambique, Namíbia, África do Sul, Eswatini, Zâmbia
e Zimbábue
Oeste (15 países): Benim, Burkina Fasso, Cabo Verde,
Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné-Bissau, Guiné,
Libéria, Mali, Níger, Nigéria, Senegal, Serra Leoa e Togo
Leste (14 países): Comores, Djibuti, Etiópia, Eritreia,
Quênia, Madagascar, Maurício, Ruanda, Seicheles,
Somália, Sudão do Sul, Sudão, Tanzânia e Uganda
Central (9 países): Burundi, Camarões, República
Centro-Africana, Chade, Congo, República Democrática
do Congo, Guiné Equatorial, Gabão e São Tomé e Príncipe
F
R
E
N
T
E
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Porém, há outra divisão do continente africano, estabelecida por critérios culturais, religiosos e étnicos, que divide a
África em Setentrional e Subsaariana.
A África Setentrional apresenta uniformidade religiosa (islamismo) e uma quantidade relativamente pequena de etnias,
refletida na menor incidência de conflitos, o que se explica, em parte, pela presença do Deserto do Saara, que gera um
ambiente incapaz de sustentar grandes populações. Já a África Subsaariana possui uma grande diversidade religiosa, com
a presença do islamismo, do cristianismo e das religiões animistas locais. Nessa região há também uma enorme diversi-
dade étnica, que contribui para que os conflitos sejam complexos, envolvendo diversos fatores, como o desenvolvimento
de grande diversidade demográfica.
África: regionalização
Fonte: elaborado com base em FRANCISCO, Wagner de Cerqueria e As duas Áfricas Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola
uol.com.br/geograa/as-duas-africas.htm. Acesso em: 27 jan. 2021.
REPÚBLICA
DEMOCRÁTICA
DO CONGO
ZÂMBIA
NAMÍBIA
BOTSUANA
ZIMBÁBUE
ÁFRICA
DO SUL
ANGOLA
MARROCOS
ARGÉLIA
LÍBIA EGITO
SUDÃO
SUDÃO
DO SUL
CHADE
REP.
CENTRO-
AFRICANA
TUNÍSIA
SAARA
ERITREIA DJIBUTI
SOMÁLIA
ETIÓPIA
QUÊNIA
UGANDA
RUANDA
BURUNDI
SEICHELES
MALAUÍ
I. Comores
MOÇAMBIQUE
MADAGASCAR
ESWATINI
LESOTO
TANZÂNIA
 MAURÍCIO
Mar Mediterrâneo
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erm
elho
Estreito de
Gibraltar
M
er
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n
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G
re
en
w
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Trópico de Capricórnio
Trópico de Câncer
Equador
0°
0°
OCEANO
ATLÂNTICO
OCEANO
ÍNDICO
750 km
África Setentrional
A África Setentrional, também
chamada de Norte da África ou África
Mediterrânea, é marcada pela cultura
árabe baseada na religião islâmica. Por
esse e por outros motivos, os países
dessa região, no norte do Deserto do
Saara, têm algumas especificidades que
precisam ser analisadas isoladamente.
Fazem parte dessa área o Egito e a
sub-região do Magrebe, que engloba a
Argélia, a Tunísia e o Marrocos (Magrebe
Central), além da Líbia, da Mauritânia e
do Saara Ocidental (que complementam
o grande Magrebe).
Deserto do Saara: localização
Fonte: elaborado com base em CALDINI, Vera; ÍSOLA, Leda Atlas geográco Saraiva. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 152
Mar Mediterrâneo
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Estreito de
Gibraltar
M
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o
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Trópico de Câncer
0°
MALIMAURITÂNIA
MARROCOS
ARGÉLIA
LÍBIA EGITO
SUDÃO
ERITREIA
CHADE
TUNÍSIA
NÍGER
Área de abrangência do deserto
GEOGRAFIA Capítulo 9 África I168
década de 1950, ocorreram choques entre as colônias e
suas metrópoles europeias.
Nesse contexto, destacam-se as duas principais guer
ras dos africanos contra o imperialismo europeu: a da
Argélia e a de Suez No caso argelino, os nacionalistas lu-
taram duramente contra o exército francês e os pieds noirs
(franceses residentes na Argélia), até que conseguiram con
quistar sua independência em 1962
Esses conflitos do Norte tiveram caráter nacionalis-
ta e anti imperialista, o que também sustentou a política
econômica desses países após seus processos de inde-
pendência. Dessa forma, principalmente o Egito, a Argélia e
a Líbia tiveram um desenvolvimento econômico que permi-
tiu classificá-los como países semiperiféricos, tendo como
elementos marcantes do desenvolvimento econômico a
industrialização, a modernização das infraestruturas de
transporte e de energia e o controle sobre a produção e a
comercialização de petróleo
Sahel
Apesar de suas características naturais inóspitas para
a vida humana, a extensa faixa quente e arenosa do De-
serto do Saara foi percorrida por muitos comerciantes
árabes. Eles buscavam ouro, marfim e escravos na parte
sul do deserto e, como vimos, acabaram tornando-se os
responsáveis por disseminaro islamismo entre os povos
não árabes, o que ajuda a explicar a predominância da
religião muçulmana na região.
Essa área é conhecida como Sahel, uma faixa de terras
que mede de 500 a 700 km de largura por 5 400 km de
extensão e que é marcada pelo clima semiárido, com pre-
cipitação anual variando entre 100 mm e 700 mm.
Nos séculos VII e VIII, a dominação do norte africano
pelos árabes difundiu, além da religião islâmica, a língua e
outros aspectos da cultura árabe pela região Com o enfra-
quecimento do Império Otomano no século XIX, algumas
áreas desse domínio, tanto na África como na Ásia, foram
tomadas pelos europeus. No caso do Norte da África, a
França passou a dominar a Argélia (1840-1962), a Tunísia
(1882-1956) e o Marrocos (1912 1955) Já a Itália conquistou
a Líbia nas guerras que ocorreram entre 1911 e 1931, man-
tendo seu domínio até o fim da Segunda Guerra Mundial
O Egito, por sua vez, foi um protetorado inglês entre 1882 e
1922, continuando sob grande influência britânica até 1953
Como os europeus já conheciam os povos da Áfri-
ca Mediterrânea, tal processo de colonização não foi tão
violento quanto o ocorrido na África Subsaariana. Mesmo
com milhares de mortes nas repressões que os exércitos
europeus efetivavam contra os movimentos rebeldes dos
países do Norte, não houve uma desestruturação completa
nessas sociedades, como ocorreu ao sul do Saara. O prin-
cipal fator responsável por essa diferença nos processos
de colonização foi o fato de os povos do Norte já estarem
organizados da maneira que interessava aos europeus:
eram capazes de produzir alimentos e matérias primas e
de extrair petróleo para enviar à Europa.
Durante a Segunda Guerra Mundial, colonizados e
colonizadores se uniram na luta contra as forças do Eixo,
e muitos marroquinos, argelinos e egípcios participaram
de combates na Europa em favor dos Aliados. Vencida a
guerra, não havia mais como manter intacta a colonização
no Norte da África, uma vez que os movimentos naciona
listas de independência tinham ganhado enorme força. Na
Sahel: precipitação média anual
Fonte: elaborado com base em O Sahel: clima e precipitação. SciencesPo, 2012 Disponível em: http://cartotheque.sciences-po fr/media/Le_Sahel_Climat_et_pluviometrie_2012/1987/.
Acesso em: 27 jan. 2021.
ARGÉLIA
LÍBIA
EGITO
MAURITÂNIA
MALI
CHADE SUDÃO
SUDÃO
DO SUL
ERITREIA
DJIBUTI
ETIÓPIA
REPÚBLICA
CENTRO-AFRICANACAMARÕES
NIGÉRIA
NÍGER
SOMÁLIA
CONGO
REPÚBLICA
DEMOCRÁTICA
DO CONGO QUÊNIA
MARROCOS
SAARA
OCIDENTAL
SENEGAL
GÂMBIA
LIBÉRIA
GUINÉ
-BISSAU
SERRA LEOA
TOGO
BURKINA
FASSO
COSTA
DO
MARFIM
BENIM
GANA
GUINÉ
EQUATORIAL
UGANDA
TUNÍSIA
GUINÉ
OCEANO
ÍNDICO
OCEANO
ATLÂNTICO
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elho
Mar Mediterrâneo
Trópico de Câncer
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0°
CABO
VERDE
0 500 km
N
Precipitação média
anual (em mm)
Sahel
0
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3000
Estreito de
Gibraltar

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