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Campo Geral
João Guimarães Rosa, 1956
João Guimarães 
Rosa (1908 – 1967)
3ª Geração Modernista
João Guimarães Rosa
• Seu pai, Seu Floduardo, tinha
uma venda em Cordisburgo, e
por lá passavam vaqueiros,
tropeiros, povo do sertão
mineiro que buscava se
abastecer.
• Desde a infância, Guimarães
conviveu com os tipos que
retrata em suas obras.
• Depois de formado médico,
também trabalha alguns anos no
interior de Minas, aumentando
ainda mais seu contato com o
povo.
• Cultíssimo, sabia cerca se 19
idiomas. Por isso, suas obras
possuem neologismos,
arcaísmos, estrangeirismos.
Tudo de tal forma misturado,
que exige estudo detalhado.
• Todos os seus romances
retratam um mesmo espaço,
que ele chama de Sertão
(interior de Minas Gerais,
proximidades de Goiás e Bahia)
O que é o Sertão de Rosa?
1) Região geográfica do Brasil =
descrição dos espaços, dos
tipos sociais, da pobreza e do
patriarcado.
2) Universo simbólico e mítico
onde tudo que é milagroso
pode acontecer. Crescimentos
humanos, pactos com o diabo,
grandes amores etc.
Sertão = desertão / ser - tão
“O sertão está dentro da gente.
Alguns têm um sertão
pequenininho, outros têm um
sertão grande: cada um tem que
viver de acordo com seu sertão”.
Regionalismo transcendente
1) A prosa de Guimarães é
herdeira do Regionalismo dos
anos 30, na medida que
denuncia a pobreza e a
violência.
O interior de Minas, o Sertão
mineiro não é aquele da seca ou
da decadência, representado nas
obras de Graciliano Ramos.
Há a ausência do Estado e de
recursos, mas os homens
conseguem o que comer e água
para beber.
Regionalismo transcendente
2) Europa surgia o romance
introspectivo/existencialista/
espiritualista
- Tendência que retrata os
problemas existenciais da
travessia humana (temas como:
morte, Deus, dramas
psicológicos)
- Foco subjetivo e existencialista
• Do olhar regional universal
• Presença da fé, da religiosidade e do
fantástico.
• Misto de descrição regionalista e
reflexão transcendente
• O homem humilde e miserável do
sertão de MG assume o lugar do
herói
• Milagres acontecem no meio da
miséria
Fundo real de todas as narrativas
https://www.youtube.com/watch
?v=vCS12dSe2yM&start_radio=1&
list=RDvCS12dSe2yM
https://www.youtube.com/watch?v=vCS12dSe2yM&start_radio=1&list=RDvCS12dSe2yM
A história do livro
• “Corpo de baile” foi publicado a
primeira vez em 1956. Segunda
obra de Guimarães, era
composta por várias novelas, ao
modo se “Sagarana”.
• Em 1964, o autor desmembra o
livro e assim, cria-se “Manuelzão
e Miguilim”, cuja primeira parte
é chamada “Campo geral”
• Nessa edição, “Campo geral” e
“Uma estória de amor” passam
a ser chamados de poemas, mas
não porque sejam escritos em
versos.
Seu sentido é obscuro, necessita
interpretação simbólica.
Personagens – “Campo Geral”
Miguilim (Miguel) – protagonista da narração. Menino
com cerca de 8 anos de idade
Dito (Expedito) – irmão mais querido de Miguilim, que
apesar de ter 5 anos, possuía grande firmeza moral.
Morre de tétano.
Nhô Bero (Bernardo Caz) - pai de Miguilim, homem
rude, trabalhador e violento. Costumeiramente agride
as crianças e a esposa.
Tio Terês – irmão de Bero e amigo de Miguilim. Foi
expulso de casa por Vó Izidra por suposta relação
adúltera com Nhanina.
Tomezinho (Tomé de Jesus) - quatro anos, tinha mania
de esconder tudo o que encontrava.
Nhanina, mãe de Miguilim, era muito bonita, não
gostava do Mutum, sentia muita tristeza em ter que
viver ali. Bastante infeliz com o casamento.
Vovó Izidra, tia-avó de Miguilim, parteira. Sempre
séria, brava e muito religiosa.
Chica – irmã de Miguilim, tinha os cabelos pretos
como a mãe.
Rosa – empregada que vivia com a família
Liovaldo – irmão mais velho de Miguilim, mas não
morava com a família no Mutum. Miguilim o considerava
desrespeitador. Criado pelo tio Osmundo Cessim.
Mãitina – empregada da casa, preta velha, gostava de
cachaça e cultuava rituais pagãos africanos.
Drelina – apelido da irmã mais velha de Miguilim. Seu
nome era Maria Adrelina Cessim Caz. Era bonita e tinha
cabelos compridos.
Patori – filho de Deográcias, é mal educado e acaba
matando um homem.
Grivo – menino muito pobre que é defendido por
Miguilim quando é agredido ou humilhado por Liovaldo.
Luisaltino – sócio de Bero e por ele assassinado, em
razão de ciúmes.
Saluz – vaqueiro de Nhô Bero. Casado com Siarlinda que
sabe contar histórias.
Jé – empregado, que foge com a empregada Maria
Pretinha.
Seo Aristeo – o melhor em grego, contador de histórias,
que ajuda na cura de Miguilim
Dr. Jośe Lourenço – médico, descobre a miopia de
Miguilim e o leva para cidade estudar
Estrutura narrativa
• Narrado em 3ª pessoa
(onisciente seletiva) colado a
perspectiva do menino Miguilim
o mundo é representado através de
Miguilim
Menino sensível, atento às miudezas do
mundo, empático ao sofrimentos de
todos os seres
Narração retrata momentos 
definitivos para a formação do 
menino
A) Momentos de perdas: a cachorra Pingo-
de-Ouro, Dito, os passarinhos, o pai.
B) Coragem para não ter medo de morrer
 Ao fim, Miguilim, vendo melhor,
sabe reconhecer a si mesmo e a sua
história. Além de poder afirmar que o
Mutum é bonito.
Epígrafe
“Num círculo, o centro é naturalmente
imóvel; mas se a circunferência também
o fosse, não seria ela senão um centro
imenso."
Plotino
"Vede, eis a pedra brilhante dada ao
contemplativo; ela traz um nome novo,
que ninguém conhece, a não ser aquele
que a recebe."
Ruysbroeck, o Admirável
• Como o pequeno pode ser na 
verdade grande
• Descoberta individual
A cachorra Pingo-de-Ouro
• O pai não se preocupa com o
universo afetivo dos filhos.
• Miguilim só consegue assimilar a
perda da cachorra com uma
cantiga, de um menino que
perdera sua “Cuca”  aprende o
que é perder para sempre.
 Cuca Pingo-de-Ouro.
“Mas, para o sentir de Miguilim, mais primeiro havia a Pingo-
de-Ouro, uma cachorra bondosa e pertencida de ninguém,
mas que gostava mais era dele mesmo. Quando ele se
escondia no fundo da horta, para brincar sozinho, ela
aparecia, sem atrapalhar, sem latir, ficava perto, parece que
compreendia. Estava toda sempre magra, doente da saúde,
diziam que ia ficando cega. Mas teve cachorrinhos. Todos
morreram, menos um, que era tão lindo.”
“Logo então, passaram pelo Mutúm uns tropeiros, dias que
demoraram, porque os burros quase todos deles estavam
mancados. Quando tornaram a seguir, o pai de Miguilim deu
para eles a cachorra, que puxaram amarrada numa corda, o
cachorrinho foi choramingando dentro dum balaio. Iam para
onde iam. Miguilim chorou de bruços, cumpriu tristeza,
soluçou muitas vezes. Alguém disse que aconteciam casos,
de cachorros dados, que levados para longes léguas, e que
voltavam sempre em casa. Então ele tomou esperança: a
Pingo-de-Ouro ia voltar. Esperou, esperou, sensato. Até de
noite, pensava fosse ela, quando um cão repuxava latidos.
Quem ia abrir a porta para ela entrar? Devia de estar
cansada, com sede, com fome. ― "Essa não sabe retornar,
ela já estava quase cega..." Então, se ela já estava quase
cega, por que o pai a tinha dado para estranhos? Não iam
judiar da Pingo-de-Ouro?”
• Pai expulsa Tio Terês
• Morrer e o pacto com Deus (3 dias)
Pequeno se acidentou, cresce meio
fraco, sempre dores e tem muito medo
de morrer. Não sabemos, mas em parte,
sua falta de jeito, é por conta da miopia.
- Acidente com o boi Rio-Negro = o boi 
tem o capeta no corpo?
- A carta de Tio Terês = o que é o certo a 
fazer?
“― "Vamos ver o que é que o menino tem, 
vamos ver o que é que o menino tem?!... Ei 
e ei, Miguilim, você chora assim, assim ― 
p'ra cá você ri, p'ra mim!..." Aquele homem 
parecia desinventado de uma estória. ― "O 
menino tem nariz, tem boca, tem aqui, tem 
umbigo, tem umbigo só..." ― "Ele sara, seo
Aristeo?" ― "... Se não se tosar a crina do 
poldrinho novo, pescoço do poldrinho não 
engrossa. Se não cortar as presas do 
leitãozinho, leitãozinho não mama direito... 
Se não esconder bem pombinha do menino, 
pombinha voa às aluadas... Miguilim ― bom 
de tudo é que tu 'tá: levanta, ligeiro e são,Miguilim..." ― Eu ainda pode ser que vou 
morrer, seo Aristeu... ― Se daqui a uns 
setenta anos! Sucede como eu, que também 
uma vez já morri: morri sim, mas acho que 
foi morte de ida-e-volta... Te segura e pula, 
Miguilim, levanta já! Miguilim, dividido de 
tudo, se levantava mesmo, de repente são, 
não ia morrer mais, enquanto seo Aristeu 
não quisesse. Todo ria. Tremia d alegrias.”
Dilemas de Miguilim
O boi tem o capeta no corpo?
"O ruim tem raiva do bom e do ruim. O bom tem pena do ruim e do bom...
Assim está certo." ― "E os outros, Dito, a gente mesmo?" O Dito não sabia. "Só
se quem é bronco carece de ter raiva de quem não é bronco; eles acham que é
moleza, não gostam... Eles têm medo que aquilo pegue e amoleça neles
mesmos ― com bondades..." ― "E a gente, Dito? A gente?" ― "A gente cresce,
uai. O mole judiado vai ficando forte, mas muito mais forte! Trastempo, o bruto
vai ficando mole, mole..." Miguilim tinha trazido a mula de cristal, que acertava
no machucado da mão, debaixo das cobertas ― "Dito, você gosta de Pai, de
verdade?" ― "Eu gosto de todos. Por isso é que eu quero não morrer e crescer,
tomar conta do Mutúm, criar um gadão enorme."
Dito
• Melhor amigo e conselheiro
• Sábio e corajoso
• Sabia de tudo que acontecia ao seu
redor e tinha o sonho de ser
fazendeiro
• Morre de tétano
• Todos os conhecidos vêm visitar a
família. O corpo é enterrado em
outro cidade
• Depois de sua morte, Miguilim fica
triste e quieto, quer que todos
contem o que lembram do irmão
• A certa altura, o pai e a avó se
incomodam com a tristreza de
Miguilim. O pai o força a trabalhar
carpindo e desconta nele sua raiva.
“Os irmãos já estavam acostumados com aquilo, nem esbarravam
mais dos brinquedos para vir ver Miguilim sentado alto no
tamborete, à paz. Só Dito, de longe distante, pela porta espiava
leal. Mas Dito não vinha, não queria que Miguilim penasse
vergonha.”
“Uma hora o Dito chamou Miguilim, queria ficar com Miguilim
sozinho. Quase que ele não podia mais falar. — "Miguilim, e você
não contou a estória da Cuca Pingo-de-Ouro..." — "Mas eu não
posso, Dito, mesmo não posso! Eu gosto demais dela, estes dias
todos..." Como é que podia inventar a estória? Miguilim soluçava.
— "Faz mal não, Miguilim, mesmo ceguinha mesmo, ela há de me
reconhecer..." — "No Céu, Dito? No Céu?!" — e Miguilim
desengolia da garganta um desespero. — "Chora não, Miguilim,
de quem eu gosto mais, junto com Mãe, é de você..." E o Dito
também não conseguia mais falar direito, os dentes dele
teimavam em ficar encostados, a boca mal abria, mas mesmo
assim ele forcejou e disse tudo: — "Miguilim, Miguilim, vou
ensinar o que agorinha eu sei, demais: é que a gente pode ficar
sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa ruim que acontece
acontecendo. A gente deve de poder ficar então mais alegre,
mais alegre, por dentro!..."
Dito
“E precisava de perguntar a outras pessoas — o que pensavam do Dito, o que achavam dele, de tudo por
junto; e de que coisas acontecidas se lembravam mais. Mas todos, de Tomezinho e Chica a Luisaltino e
Vovó Izidra, mesmo estando tristes, só respondiam com lisice de assuntos, bobagens que o coração não
consabe. Só a Rosa parecia capaz de compreender no meio do sentir, mas um sentimento sabido e um
compreendido adivinhado. Porque o que Miguilim queria era assim como algum sinal do Dito morto
ainda no Dito vivo, ou do Dito vivomesmo no Dito morto. Só a Rosa foi quem uma vez disse que o Dito
era uma alminha que via o céu por detrás do morro, e que por isso estava marcado para não ficar muito
tempo mais aqui. E disse que o Dito falava com cada pessoa como se ela fosse uma, diferente; mas que
gostava de todas, como se todas fossem iguais. E disse que o Dito nunca tinha mudado, enquanto em
vida, e por isso, se a gente tivesse um retratinho dele, podia se ver como os traços do retrato agora
mudavam.”
“Depois ele conversou com Mãitina. Mãitina era uma mulher muito imaginada, muito de constâncias.
Ela prezava a bondade do Dito, ensinou que ele vinha em sonhos, acenava para a gente, aceitava louvor.
Sempre que se precisava, Mãitina era pessôa para a qualquer hora falar no Dito e por ele começar a
chorar, junto com Miguilim. O que eles dois fizeram, foi ela quem primeiro pensou. Escondido,
escolheram um recanto, debaixo do jenipapeiro, ali abriram um buraco, cova pequena. De em de,
camisinha dele e calça do Dito furtaram, para enterrar, com brinquedos dele.”
O pai
• Força Miguilim ao trabalho
pesado por horas.
• Pai se irrita com os tombos de
Miguilim ou com o fato de que
ele não vê aquilo que o pai vê
• Briga com Liovaldo e surra do pai
• Pai solta todos as passarinhos de
Miguilim
“O ódio de Miguilin foi tanto, que ele mesmo não sabia o
que era, quando pulou no Liovaldo. Mesmo menor, ele
derrubou o Liovaldo, esfregou na terra, podia derrubar
sessenta vezes! E esmurrou, esmurrou, batia no Liovaldo de
todo jeito, dum tempo só até batia e mordia. Matava um
cão?! O Liovaldo, quando pôde, chorava e gritava, disse
depois que Miguilim parecia o demo. Era dia-de-domingo,
Pai estava lá, veio correndo. Pegou Miguilim, e o levou para
casa, debaixo de pancadas. Levou para o alpendre. Bateu de
mão, depois resolveu: tirou a roupa toda de Miguilim e
começou a bater com a correia da cintura. Batia e xingava,
mordia a ponta da língua, enrolada, se comprazia. Batia
tanto, que Mãe, Drelina e a Chica, a Rosa, Tomezinho, e até
Vovó Izidra, choravam, pediam que não desse mais, que já
chegava. Batia. Batia, mas Miguilim não chorava. Não
chorava, porque estava com um pensamento: quando ele
crescesse, matava Pai. Estava pensando de que jeito era que
ia matar Pai, e então começou a rir. Aí, Pai esbarrou de bater,
espantado: como tinha batido na cabeça também, pensou
que Miguilim podia estar ficando dôido.”
Miguilim doente
• Cai doente durante o
trabalho.
• Ninguém sabe o que ele
tem, nem como se cura. É
tratado com ervas, banhos e
rezas.
• Pai mata Luisaltino e se
enforca no meio da mata.
“Estava com um pouquinho de dor-de-cabeça, o corpo não sustentava
bem; mas não fazia mal: era só do sol. Tinha de assoar o nariz. — "É
sangue, Miguilim, que você está botando..." Luisaltino trazia água,
levava Miguilim para a sombra, ajudava-o a levantar um braço. — "É
melhor você esbarrar e voltar para casa." — "Não. Eu capino." Já não
estava botando sangue mais. Em quanto refrescava o dia, o ar dos
matos se retrasava bom, trespassava.”
“De repente, no outro dia, Miguilim estava capinando, só sentia
aquele mal-estar, tonteou: veio um tremor forte de frio e ele começou
a vomitar. Deitou-se ali mesmo, no chão, escondendo os olhos, como
um bichinho doente. — "Que é isso, Mi? Afrouxou?" Doença. Era uma
dor muito brava, na nuca, também. Tremura de frio não esbarrava.
Luisaltino levantou-o do chão e teve de o levar para casa carregado.
— "Miguilim, Miguilim, só assim, que é?" — a mãe aflita indagava.
Vovó Izidra olhava-o e ia derreter o purgante. — "Mãe, que é que
fizeram com o resto da roupinha do Dito?" — agora ele queria saber.
— "Está guardada, Miguilim. Depois ela ainda vai servir para
Tomezinho." — "Mãe, e as alpercatinhas do Dito?" — "Também,
Miguilim. Agora você descansa." Miguilim tinha mesmo que
descansar, perdera a força de aluir com um dedo. Suava, suava. O
latido dos cachorros no pátio vinha de muito longe, junto com a
conversa da Rosa na cozinha, o cló das galinhas no quintal, a correria
de Tomezinho, a fala de Papaco-o-Paco, o rumorzinho das árvores.
Tudo tão misturado e macio, não se sabia bem, parecia que o dia
tinha outras claridades.”
Miguilim doente
• Miguilim se cura novamente 
depois da visita de seo
Aristeo
• Tio Terês volta e se casa com 
a mãe de Miguilim
“Seo Aristeu, quando deu de vir, trazia um favo
grande de mel de oropa, enrolado nas folhas
verdes. ― "Miguilim, você sara! Sara, que já estão
longe as chuvas janeiras e fevereiras... Miguilim,
você carece de ficar alegre. Tristeza é agouría..."
― Foi o Dito que ensinou isso ao senhor, seo
Aristeu? ― Foi o sol, mais as abelhinhas, mais
minha riqueza enorme queainda não tenho,
Miguilim.”
“De repente lá vinha um homem a cavalo. Eram
dois. Um senhor de fora, o claro da roupa.
Miguilim saudou, pedindo a benção. O homem
trouxe o cavalo cá bem junto. Ele era de óculos,
corado, alto, com um chapéu diferente, mesmo.
— Deus te abençoe, pequenino. Como é teu
nome? — Miguilim. Eu sou irmão do Dito. — E
seu irmão Dito é o dono daqui? — Não, meu
senhor. O Ditinho esta em glória.”
Os óculos
“O senhor alto e claro se apeou. O outro, que vinha com ele, era um camarada. O
senhor perguntava à Mãe muitas coisas do Miguilim. Depois perguntava a ele
mesmo: — "Miguilim, espia daí: quantos dedos da minha mão você está
enxergando? E agora?" Miguilim espremia os olhos. Drelina e a Chica riam.
Tomezinho tinha ido se esconder. — Este nosso rapazinho tem a vista curta. Espera
aí, Miguilim... E o senhor tirava os óculos e punha-os em Miguilim, com todo o jeito.
— Olha, agora! Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade,
tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas. Via os
grãozinhos de areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas
passeando no chão de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta coisa,
tudo... O senhor tinha retirado dele os óculos, e Miguilim ainda apontava, falava,
contava tudo como era, como tinha visto. Mãe esteve assim assustada; mas o
senhor dizia que aquilo era do modo mesmo, só que Miguilim também carecia de
usar óculos, dali por diante.”
O Mutum de novo
“Mas, então, de repente, Miguilim parou em frente do doutor. Todo tremia, quase sem
coragem de dizer o que tinha vontade. Por fim, disse. Pediu. O doutor entendeu e
achou graça. Tirou os óculos, pôs na cara de Miguilim. E Miguilim olhou para todos,
com tanta força. Saiu lá fora. Olhou os matos escuros de cima do morro, aqui a casa, a
cerca de feijão-bravo e são-caetano; o céu, o curral, o quintal; os olhos redondos e os
vidros altos da manhã. Olhou, mais longe, o gado pastando perto do brejo, florido de
são-josés, como um algodão. O verde dos buritis, na primeira vereda. O Mutúm era
bonito! Agora ele sabia. Olhou Mãitina, que gostava de o ver de óculos, batia palmas-
de-mão e gritava: — "Cena, Corinta!..." Olhou o redondo de pedrinhas, debaixo do
jenipapeiro. Olhava mais era para Mãe. Drelina era bonita, a Chica, Tomezinho. Sorriu
para Tio Terêz: — "Tio Terêz, o senhor parece com o Pai..." Todos choravam. O doutor
limpou a goela, disse: — "Não sei, quando eu tiro esses óculos, tão fortes, até meus
olhos se enchem d´água..." Miguilim entregou a ele os óculos outra vez. Um
soluçozinho veio. Dito e a Cuca Pingo-de-ouro. E o Pai. Sempre alegre, Miguilim...
Sempre alegre, Miguilim... Nem sabia o que era alegria e tristeza. Mãe o beijava. A
Rosa punha-lhe doces-de-leite nas algibeiras, para a viagem. Papaco-o-Paco falava,
alto, falava.”
Síntese
• Romance de formação: a vida dura e bruta =
“Sempre alegre, Miguilim...” (lição do Dito)
• Miguilim escolhe sempre viver
• Ao final, sabemos que Miguilim irá crescer e ter
novas experiências na cidades, mas levando com
ele todo o amadurecimento que tivera no
Mutum.
• Os resíduos do patriarcado no interior do Brasil:
pai = lei/violência; mulher não tem voz; as
crianças crescem no contexto violento.
Não existe Estado.
• Os óculos do médico: fazem o menino ver a
si mesmo e à sua origem
• Prosa de Guimarães faz com que vejamos
Miguilim, seu pai, sua mãe, a dureza de
suas vidas.
• Guimarães, diferente de Graciliano, escolhe
operar um milagre, para que o fim de
Miguilim não seja como o de Luís da Silva.
• Contar e ouvir histórias é uma forma de
sabedoria.
Morte do pai
A fala do papagaio
Os óculos e a ida para a cidade.
Fuvest 2021 Leia o texto e responda à questão.
Só a Rosa parecia capaz de compreender no meio
do sentir, mas um sentimento sabido e um
compreendido adivinhado. Porque o que Miguilim
queria era assim como algum sinal do Dito morto
ainda no Dito vivo, ou do Dito vivo mesmo no Dito
morto. Só a Rosa foi quem uma vez disse que o
Dito era uma alminha que via o Céu por detrás do
morro, e que por isso estava marcado para não
ficar muito tempo mais aqui. E disse que o Dito
falava com cada pessoa como se ela fosse uma,
diferente; mas que gostava de todas, como se
todas fossem iguais. E disse que o Dito nunca tinha
mudado, enquanto em vida, e por isso, se a gente
tivesse um retratinho dele, podia se ver como os
traços do retrato agora mudavam. Mas ela já
tinha perguntado, ninguém não tinha um
retratinho do Dito. E disse que o Dito parecia uma
pessoinha velha, muito velha em nova.
João Guimarães Rosa. Campo Geral.
a) Sabendo que o quiasmo é uma figura
de estilo formada por uma dupla
antítese cujos termos se cruzam,
identifique um exemplo de quiasmo no
texto e explique a sua construção.
b) Nas palavras do crítico Paulo Rónai, o
escritor Guimarães Rosa sonda as suas
personagens "num momento de crise,
quando, acuadas pelo amor, pela
doença ou pela morte, procuram
desesperadamente tomar consciência
de si mesmas e buscam o sentido de sua
vida". Como a ausência de Dito
desperta a inquietação de Miguilim?

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