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Governança na prática de enfermagem

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LUANA SILVEIRA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
GOVERNANÇA NA PRÁTICA DE ENFERMAGEM NA 
ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE 
 
 
Dissertação de mestrado acadêmico 
submetida ao Programa de Pós-Graduação 
em Enfermagem da Universidade Federal de 
Santa Catarina para obtenção do título de 
Mestre em Enfermagem. 
Área de Concentração: Filosofia e 
Cuidado em Saúde e Enfermagem. 
Linha de Pesquisa: Políticas, Gestão e 
Avaliação do Cuidado em Saúde e 
Enfermagem. 
Orientador: Prof. Dr. José Luís Guedes dos 
Santos. 
 
 
 
 
 
 
 
FLORIANÓPOLIS 
2019 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho à minha família, por me 
ensinar os caminhos para o alcance dos meus 
sonhos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
À Universidade Federal de Santa Catarina, pela oportunidade de 
acesso a um ensino de excelência e por me acolher. 
Ao meu orientador, José Luís Guedes dos Santos, por ter 
acreditado em mim, compartilhar seus conhecimentos, guiar minha 
pesquisa, compreender minhas limitações e dificuldades e mesmo assim 
me incentivar a seguir em frente. 
Às professoras Selma Regina de Andrade e Alacoque Lorenzini 
Erdmann, que me oportunizaram ser aluna especial do Programa de 
Pós-Graduação em Enfermagem desta Universidade, na disciplina de 
Gestão e Política em Serviços de Saúde e Enfermagem, quando 
despertei o interesse em continuar minha trajetória acadêmica e tomei a 
decisão de participar do processo de seleção para este mestrado. 
Aos colegas do Laboratório de Pesquisa, Tecnologia e Inovação 
em Políticas e Gestão do Cuidado e Educação de Enfermagem e Saúde 
(GEPADES), pelas trocas de experiência, parceria em artigos e 
momentos de dificuldades, em especial a Caroline Peiter Chechinel, 
Greici Capelari Fabrizio e Márcia Daniele Schmitt por terem sido, além 
de colegas, amigas. 
A Deus que me deu sabedoria e fortaleza para traçar diferentes 
caminhos nesta jornada. Obrigada por renovar a minha Fé. 
 Ao meu marido João Augusto Brancher Fuck, que esteve ao 
meu lado nos momentos mais difíceis, compreendeu minha ausência e 
me fez acreditar que era possível, quando nem eu acreditava. 
 À minha família, que compreendeu minha ausência nos finais 
de semana, feriados e dias de festas, em especial meus pais, Fatima 
Maria Silveira, Jairo Luiz Silveira e Giancarlo Silveira. 
 À Secretaria Municipal de Saúde de Canelinha/SC e à empresa 
Qualirede® que incentivaram minha formação durante o período de 
mestrado. 
A todos os participantes da pesquisa, que contribuíram para a 
efetivação deste trabalho e compartilharam comigo suas mais diversas 
vivências profissionais. Obrigada pela confiança! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
No Brasil, a prática de enfermeiros que atuam na Atenção Primária à 
Saúde está pautada em atividades assistenciais e gerenciais 
desenvolvidas concomitantemente. Os enfermeiros neste contexto 
promovem a organização das atividades da Estratégia Saúde da Família, 
gerenciamento da unidade básica de saúde e a realização do cuidado. No 
exercício gerencial, de enfermeiros que atuam na Atenção Primária à 
Saúde têm-se desenvolvido estratégias próprias de governança. Esta 
pesquisa teve como objetivo compreender como vem ocorrendo a 
governança na prática de enfermagem na Atenção Primária à Saúde. 
Trata-se de um estudo qualitativo, com o referencial teórico-
metodológico da Teoria Fundamentada nos Dados em sua vertente 
construtivista. O cenário de investigação foi a Atenção Primária à Saúde 
na microrregião de Tijucas/SC. A amostragem teórica foi composta por 
22 participantes divididos em três grupos amostrais: O primeiro 
composto por 13 enfermeiros, o segundo composto por três agentes 
comunitários de saúde e três técnicos de enfermagem e o terceiro 
composto por três gestores municipais de saúde. A coleta de dados 
ocorreu entre abril e julho de 2018, por meio de entrevistas intensivas. A 
análise dos dados foi realizada concomitante à coleta, seguindo as etapas 
de codificação inicial e focalizada, com auxílio do software NVIVO®. 
Do processo de análise dos dados, surgiram seis categorias: 
“Desenvolvendo atividades assistenciais”, “Gerenciando a unidade 
básica de saúde”, “Conquistando autonomia profissional”, 
“Organizando a interação entre os profissionais de saúde por meio do 
diálogo e trabalho em equipe”, “Tomando decisões coletivamente com a 
equipe de saúde” e “Lidando com limitações do contexto político-
organizacional”. A partir da inter-relação das categorias construiu-se o 
fenômeno: “Promovendo a funcionalidade da unidade básica de saúde”. 
Assim, evidenciou-se que a governança na prática de enfermagem na 
Atenção Primária à Saúde ocorre com a articulação de habilidades e 
competências do enfermeiro para a funcionalidade do ambiente de 
trabalho, em meio a limitações no contexto político-organizacional. 
Com a governança, o enfermeiro articula a realização do trabalho da 
equipe de saúde à realidade do contexto na busca de melhores 
resultados. Considera-se que a governança na prática de enfermagem 
tem impacto na integração dos profissionais e seu envolvimento nos 
processos decisórios que refletem na corresponsabilização para com o 
cuidado. 
 
Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Enfermagem; Gestão em 
Saúde; Teoria Fundamentada. 
 
 
ABSTRACT 
 
In Brazil, the practice of nurses working in Primary Health Care is based 
on assistential and managerial activities developed concomitantly. 
Nurses in this context promote the organization of Family Health 
Strategy activities, the management of the basic health unit and the 
implementation of care. In the management exercise of nurses who work 
in Primary Health Care, their own governance strategies have been 
developed. This research had as objective to understand how has been 
occurring the governance in the practice of nursing in Primary Attention 
to Health. This was a qualitative study, with theoretical-methodological 
reference anchored in the Constructivist Grounded Theory in its 
constructivist side. The research scenario was Primary Health Care in 
the Tijucas / SC micro-region. The theoretical sample consisted of 22 
participants divided into three sample groups: The first group consisted 
of 13 nurses, the second was composed of three community health 
agents and three nursing technicians, and the third was composed of 
three municipal health managers. The data collection took place between 
April and July of 2018, through intensive interviews. The data analysis 
was carried out concomitantly with the collection, following the steps of 
initial and focused coding, with the aid of NVIVO® software. From the 
data analysis process, six categories emerged: "Developing care 
activities", "Managing the basic health unit", "Conquering professional 
autonomy", "Organizing the interaction between health professionals 
through dialogue and teamwork" , "Making decisions collectively with 
the health team" and "Dealing with limitations of the political-
organizational context". From the interrelationship of the categories the 
phenomenon was created: "Promoting the functionality of the basic 
health unit". Thus, it was evidenced that the governance in nursing 
practice in Primary Health Care occurs through the articulation of 
nurses' skills and competences to the work environment functionality, 
amid limitations in the political-organizational context. With 
governance, the nurse articulates the accomplishment of the work of the 
health team to the reality of the contextin search of better results. It is 
considered that governance in nursing practice has an impact on the 
integration of professionals and their involvement in the decision-
making processes that reflect in the responsibility for care. 
Palavras-chave: Primary Health Care; Nursing; Health Management; 
Grounded Theory. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1 - Principais marcos da Atenção Primária à Saúde no 
Sistema Único de Saúde. Florianópolis, 
2019................................................................................ 33 
Figura 2 - Codificação Inicial Software NVIVO® 11. Florianópolis, 
2019................................................................................ 53 
Figura 3 - Codificação Focalizada Software NVIVO® 11. 
Florianópolis, 2019........................................................ 54 
Figura 4 - Exemplo de memorando. Florianópolis, 
2019................................................................................ 55 
Figura 5 - Exemplo de diagrama. Florianópolis, 
2019................................................................................ 56 
Figura 6 - Modelo teórico. Florianópolis, 
2019................................................................................ 84 
Figura 7 - Representação gráfica da tomada de decisão coletiva 
como estratégia para governança de enfermagem na 
atenção primária à saúde. Florianópolis, 
2019.............................................................................. 102 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
Quadro 1 - Relação dos manuscritos elaborados a partir dos 
resultados da pesquisa. Florianópolis, 2019............. 59 
Quadro 2 - Categorias e subcategorias do fenômeno. 
Florianópolis, 2019................................................... 64 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1 - Distribuição de enfermeiros da Estratégia Saúde da 
Família na Microrregião de Tijucas/SC, 2018. 
Florianópolis, 2019........................................................ 50 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
ACS Agentes Comunitários de Saúde 
APS Atenção Primária à Saúde 
CAAE Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 
CBO Classificação Brasileira de Ocupações 
CEPON Centro de Pesquisas Oncológicas 
CIAP Classificação Internacional de Atenção Primária 
CNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde 
COREN Conselho Regional de Enfermagem 
DAB Departamento da Atenção Básica 
DATASUS Departamento de Informática do SUS 
DECS Descritores em Ciências da Saúde 
DST-AIDS Doenças Sexualmente Transmissíveis – Síndrome 
da Imunodeficiência Adquirida 
ESF Estratégia Saúde da Família 
eSF Equipe de Saúde da Família 
E-SUS Sistema de Informação da Atenção Básica 
GEPADES Laboratório de Pesquisa Tecnologia e Inovação em 
Políticas e Gestão do Cuidado e da Educação em 
Enfermagem e Saúde 
GT Grounded Theory 
HGT Hemoglicoteste 
HIPERDIA Grupo de pessoas com Hipertensão e Diabetes 
Mellitus 
NASF Núcleo Ampliado de Saúde da Família 
PACS Programa dos Agentes Comunitários de Saúde 
PMAQ/ PMAQ-
AB 
Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade 
PNAB Política Nacional de Atenção Básica 
SAI Sistema de Informação Ambulatorial 
SIAB/ SISAB Sistema de Informação da Atenção Básica 
SUS Sistema Único de Saúde 
TFD Teoria Fundamentada nos Dados 
UBS Unidade Básica de Saúde 
UDESC Universidade do Estado de Santa Catarina 
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina 
USF Unidade de Saúde da Família 
 
 
 
 
 
 
APRESENTAÇÃO 
 
O objetivo de pesquisa desta Dissertação é compreender como 
vem ocorrendo a governança na prática de enfermagem na atenção 
primária à saúde. 
Este estudo vincula-se à linha de pesquisa Políticas, Gestão e 
Avaliação do Cuidado em Saúde e Enfermagem do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem (PEN) da Universidade Federal de Santa 
Catarina (UFSC) e Laboratório de Pesquisa, Tecnologia e Inovação em 
Políticas e Gestão do Cuidado e Educação de Enfermagem e Saúde 
(GEPADES). 
Esta Dissertação está estruturada da seguinte forma: 
Capítulo 1 – Consta da introdução, em que problematizo e 
justifico o objeto de pesquisa, bem como apresento a questão de 
pesquisa. 
Capítulo 2 – Apresenta o objetivo da pesquisa. 
Capítulo 3 – Traz a sustentação teórica da pesquisa, que está 
organizada em quatro eixos: o Sistema Único de Saúde e a Atenção 
Primária à Saúde; atuação do enfermeiro na Atenção Primária à Saúde; 
Governança e enfermagem; e Complexidade organizacional. 
Capítulo 4 – Corresponde ao método empregado, um estudo 
qualitativo com o referencial teórico-metodológico da Teoria 
Fundamentada nos Dados. 
Capítulo 5 – Apresenta os resultados e a discussão, por meio do 
Manuscrito 1, intitulado “Governança na prática de enfermagem na 
Atenção Primaria à Saúde”, que corresponde ao modelo teórico sobre a 
temática; e do manuscrito 2, intitulado Tomando Decisões 
Coletivamente: estratégia de enfermeiros para a governança na prática 
de enfermagem na Atenção Primária à Saúde. Esse artigo é um recorte 
dos achados do estudo. 
Capítulo 6 – Nele está uma síntese dos principais resultados, 
sugestões, contribuições e limitações desta pesquisa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 25 
2 OBJETIVO ....................................................................................... 30 
3 SUSTENTAÇÃO TEÓRICA .......................................................... 31 
3.1 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE E A ATENÇÃO PRIMÁRIA À 
SAÚDE ................................................................................................. 31 
3.2 ATUAÇÃO DO ENFEMEIRO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À 
SAÚDE ................................................................................................. 35 
3.3 GOVERNANÇA E ENFERMAGEM ............................................. 39 
3.4 COMPLEXIDADE ORGANIZACIONAL..................................... 41 
4 MÉTODO .......................................................................................... 46 
4.1 DELINEAMENTO DO ESTUDO .................................................. 46 
4.2 CONTEXTO DO ESTUDO ............................................................ 48 
4.3 PARTICIPANTES .......................................................................... 50 
4.4 ANÁLISE COMPARATIVA CONSTANTE ................................. 52 
4.5 USO DE MEMORANDOS E DIAGRAMAS ................................ 55 
4.6 VALIDAÇÃO DO MODELO TEÓRICO ...................................... 56 
4.7 PRINCÍPIOS ÉTICOS .................................................................... 57 
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ..................................................... 59 
5.1 MANUSCRITO 1 ........................................................................... 60 
5.2 MANUSCRITO 2 ........................................................................... 98 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................ 116 
REFERÊNCIAS ................................................................................ 118 
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA INTENSIVA – 
PRIMEIRO GRUPO FOCAL .......................................................... 135 
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA INTENSIVA – 
SEGUNDO GRUPO FOCAL ...........................................................137 
APÊNDICE C – ROTEIRO DE ENTREVISTA INTENSIVA – 
TERCEIRO GRUPO FOCAL ......................................................... 138 
APÊNDICE D – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E 
ESCLARECIDO ............................................................................... 139 
ANEXO A – DECLARAÇÃO DE CIÊNCIA E CONCORDÂNCIA 
DA INSTITUIÇÃO ........................................................................... 142 
ANEXO B – PARECER CONSUBSTNCIADO DO CEP ............. 143 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
25 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A Atenção Primária à Saúde (APS), no Brasil, desenvolve-se 
por meio do exercício de práticas de cuidado e gestão, sendo estas 
democráticas e participativas, sob a forma de trabalho em equipes que 
compõem a Estratégia Saúde da Família (ESF), ponto central do modelo 
atual de saúde (BRASIL, 2017). Por meio da ESF, a organização do 
trabalho na APS é fundamentada para garantia da universalidade, do 
acesso e da integralidade (GALAVOTE et al., 2016). Caracteriza-se por 
ações de saúde em âmbito individual e coletivo, abarcando a promoção, 
proteção, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação, 
redução de danos e manutenção da saúde. Assim, tem como objetivo 
desenvolver uma atenção integral com impacto na saúde e autonomia 
das pessoas, além de influenciar nos determinantes e condicionantes de 
saúde das coletividades (BRASIL, 2012). 
No Brasil, a Política Nacional da Atenção Básica (PNAB), que 
estabelece a revisão de diretrizes e normas para a organização da 
atenção básica para a ESF e o Programa de Agentes Comunitários de 
Saúde (PACS), considera os termos Atenção Básica e Atenção Primária 
à Saúde como equivalentes (BRASIL, 2012a). O Descritor em Ciência 
da Saúde (DECS) aponta o termo Atenção Básica como sinônimo de 
Atenção Primária à Saúde e define como: 
A assistência sanitária essencial baseada 
em métodos e tecnologias práticas, 
cientificamente fundados e socialmente aceitáveis, 
postos ao alcance de todos os indivíduos e 
famílias da comunidade mediante a sua plena 
participação e a um custo que a comunidade e o 
país possam suportar, em todas e cada etapa do 
seu desenvolvimento, com um espírito de 
autorresponsabilidade e autodeterminação (DECS, 
2019). 
 
No contexto da APS, o enfermeiro realiza ações de prevenção e 
tratamento de doenças e agravos, promoção da saúde para pessoas de 
todas as faixas etárias na forma de demandas espontâneas e 
programadas. Além disso, planeja, gerencia e avalia as ações 
desenvolvidas pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), técnicos de 
enfermagem e Agentes de Combate a Endemias (ACE), contribui com a 
educação permanente e gerencia insumos (BRASIL, 2017). 
Os dados do Conselho Federal de Enfermagem indicam que há, 
no Brasil, 511.458 enfermeiros (COFEN, 2019). Destes, 51.280 constam 
http://decs.bvs.br/cgi-bin/wxis1660.exe/decsserver/?IsisScript=../cgi-bin/decsserver/decsserver.xis&previous_page=homepage&task=exact_term&interface_language=p&search_language=p&search_exp=Assist%EAncia
http://decs.bvs.br/cgi-bin/wxis1660.exe/decsserver/?IsisScript=../cgi-bin/decsserver/decsserver.xis&previous_page=homepage&task=exact_term&interface_language=p&search_language=p&search_exp=M%E9todos
http://decs.bvs.br/cgi-bin/wxis1660.exe/decsserver/?IsisScript=../cgi-bin/decsserver/decsserver.xis&previous_page=homepage&task=exact_term&interface_language=p&search_language=p&search_exp=Crescimento%20e%20Desenvolvimento
 26 
no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES, 2019) 
como Enfermeiros da ESF. Na Região Sul do Brasil, estão cadastrados, 
com esta descrição, no mês de dezembro de 2018, 7.324 profissionais e 
no Estado de Santa Catarina, 1.888 enfermeiros vinculados às 1.777 
Equipes de Saúde da Família (CNES, 2019). Ao encontro disso, a taxa 
de crescimento de enfermeiros entre 2008 e 2013 na APS no Brasil foi 
de 42% (CARVALHO et al., 2018). Esses números retratam a 
magnitude da inserção profissional dos enfermeiros no cenário de 
cuidado na APS. 
A inserção do enfermeiro e sua prática, tanto gerencial quanto 
assistencial, apontam destaque deste profissional nas equipes de saúde e 
na organização do trabalho no contexto mencionado (MATUMOTO et 
al., 2011; BACKES et al., 2012; FERNANDES; SILVA, 2013; 
HALCOMB et al., 2016; GALAVOTE et al., 2016). 
Estudos apontam que a atuação do enfermeiro na APS está 
pautada em duas vertentes: produção do cuidado e gestão, sendo esta 
última predominante. Dessa forma, além de competências técnicas, 
espera-se desses profissionais a execução de ações de acordo com as 
políticas públicas de saúde e gestão do trabalho. Estas ações referem-se, 
respectivamente, à busca pela universalidade, ampliação do acesso, 
integralidade, coordenação do cuidado e à liderança no processo de 
trabalho da equipe multidisciplinar (MATUMOTO et al., 2011; 
FERNANDES; SILVA, 2013; GALAVOTE et al., 2016). A Lei que 
regulamenta o exercício profissional do enfermeiro, publicada em 1986, 
também aponta para essa questão, ao estabelecer que o planejamento, 
organização, execução e avaliação dos serviços da assistência são 
privativos do enfermeiro, ou seja, estreita a relação da atuação do 
enfermeiro à prática gerencial (BRASIL, 1986). 
Em revisão integrativa da literatura, realizada por Halcomb et 
al. (2016), com o objetivo de relatar as habilidades dos enfermeiros que 
trabalham na Atenção Primária, foi identificado que, em países como 
Nova Zelândia, Austrália, Reino Unido, Tailândia, África do Sul, Brasil 
e Canadá, as práticas de enfermeiros neste contexto assemelham-se 
pelas suas habilidades clínicas e gerenciais, como: técnica de cuidado, 
boa comunicação, capacidade de resolutividade, trabalho em equipe, 
supervisão de equipes, educação continuada, orientações aos usuários e 
atuação no ensino de enfermagem, participação em pesquisas de 
avaliação e qualidade do trabalho de enfermagem, demonstrando 
domínio no uso de informações referentes à gestão, tecnologia e 
sistemas para informar cuidados clínicos (HALCOMB et al., 2016). 
Para Backes et al. (2012), o enfermeiro é considerado um profissional 
27 
 
fundamental como integrante da ESF, assumindo um papel cada vez 
mais autônomo e proativo no que se refere à identificação das 
necessidades de cuidado da população, bem como na promoção e 
proteção da saúde dos indivíduos. 
Diante da dimensão do caráter gerencial do enfermeiro, a 
governança é considerada um campo a ser explorado nas pesquisas 
relacionadas à gestão em enfermagem na América Latina, especialmente 
no contexto da APS (SANTOS et al., 2013a). Esse termo tem sido 
introduzido nas discussões que envolvem gestão/gerência de 
enfermagem, principalmente a partir dos anos 2000 (OLIVEIRA et al., 
2014). 
Para tanto, faz-se necessária a compreensão da inter-relação dos 
termos “gestão”, “gerência” e “governança” em suas diferentes 
dimensões. Motta (2007) descreve gestão e gerência como sinônimos, 
que compreendem a ação, o pensar e a decisão, levando a compreendê-
las como a arte de fazer acontecer e obter resultados que podem ser 
definidos, previstos, analisados e avaliados. Logo, gestão e gerência são 
tratadas como científicas e racionais, das quais procedem análises e 
relações de causa e efeito. Ainda que compreendidas como algo passível 
de imprevisibilidades e de interações humanas, o que lhes confere uma 
dimensão do intuitivo, do emocional e do espontâneo (MOTTA, 2007). 
Para Mororó et al. (2017), a gestão, ou gerenciamento, do 
cuidado é aplicada à articulação entre as dimensões gerencial e 
assistencial no processo de trabalho do enfermeiro. Assim, quando o 
enfermeiro atua na dimensão gerencial, ele desenvolve ações voltadas 
para a organização do trabalho e de recursos humanos cujo propósito é 
de viabilizar as condições adequadas tanto para a oferta do cuidado ao 
paciente, como para a atuação daequipe de enfermagem. No entanto, 
concluem que a articulação e integração da prática gerencial com o 
cuidado são características essenciais da gestão desse cuidado. 
Destacam ainda a liderança, o trabalho em equipe, a comunicação, a 
articulação e a cooperação exercida pelo enfermeiro com os integrantes 
da equipe de enfermagem, demais profissionais de saúde e usuário como 
características essenciais da gestão do cuidado (MORORÓ et al., 2017). 
A governança envolve as interações entre estruturas, processos 
e normas que determinam como o poder é exercido, como as decisões 
são tomadas e como os envolvidos têm responsabilidades sobre suas 
decisões (PLUMPTRE; GRAHAM, 1999). Um de seus princípios é a 
participação e a inclusão dos profissionais nos processos de gestão e 
tomada de decisão, nos quais estes devem estar tão comprometidos 
quanto os gestores com os resultados assistenciais a serem alcançados 
 28 
(ANTHONY, 2004). Ao contrário de governabilidade, que sugere 
atividades sustentadas por uma autoridade formal, a governança refere-
se a atividades apoiadas em objetivos comuns, que podem ou não 
derivar de responsabilidades legais e formais e que não dependem, 
necessariamente, do poder de autoridade para que sejam aceitas e 
vençam resistências (ANDRADE, 2012). 
Genericamente, governança é entendida como o 
estabelecimento, a aplicação e o cumprimento de regras. Apesar de o 
termo estar sendo equiparado por algumas organizações internacionais 
aos conceitos de diretoria, gestão e governabilidade, observam-se 
discrepâncias semânticas importantes entre elas (DÍAZ-CASTRO et al., 
2017). Na área da saúde, a maioria das definições tratam a governança 
como sendo o conjunto de funções que se adaptam à realidade e 
políticas que norteiam o serviço de saúde, bem como os resultados que 
são desejados. (DÍAZ-CASTRO et al., 2017). Para Dodgson et al. 
(2002), apesar de o termo ser utilizado de maneiras diferentes, como 
governança corporativa, clínica e boa governança, seu aspecto central é 
a capacidade de uma sociedade de promover ações coletivas e fornecer 
soluções para objetivos comuns. 
Em revisão integrativa da literatura sobre governança em 
enfermagem, Santos et al. (2013a) encontraram somente um artigo sobre 
governança na APS dentre os 25 analisados. Os autores destacaram que 
os impactos advindos da adoção de modelos de governança nos serviços 
de saúde e enfermagem apontam para a necessidade de realização de 
estudos sobre a temática na América Latina, com o intuito de analisar e 
avaliar sua pertinência e aplicabilidade em diferentes contextos. 
Entre os impactos advindos da adoção de modelos de 
governança para os serviços de saúde destacam-se: melhoria da 
qualidade assistencial, criação e manutenção de uma rede de 
comunicação entre os gerentes e os profissionais, promoção da liderança 
do enfermeiro, maior autonomia dos enfermeiros nos processos 
decisórios, maior satisfação profissional com diminuição da rotatividade 
entre enfermeiros, maior reconhecimento e visibilidade profissional dos 
enfermeiros e diminuição dos custos assistenciais (SANTOS et al., 
2013a). 
O Sistema Único de Saúde (SUS) tem como principais desafios 
a garantia da qualidade da atenção e a gestão eficiente. Logo, a produção 
do cuidado pelo enfermeiro e a sua inserção nos espaços de gestão deste 
sistema de saúde e de participação social assinalam para a pertinência da 
discussão sobre a temática da governança no contexto. 
29 
 
Além da importância das habilidades gerenciais pelos 
enfermeiros na APS e da lacuna sobre a relação da governança e a 
prática de enfermeiros na APS na literatura, o interesse por essa temática 
também está relacionado à minha trajetória acadêmica e profissional na 
enfermagem. Durante a Graduação em Enfermagem com ênfase em 
Saúde Pública, na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), 
percebia o trabalho do enfermeiro em Saúde da Família imerso na 
gestão do serviço, atuando como coordenador das equipes, do cuidado e 
também assumindo cargos de gestão de Secretarias Municipais de 
Saúde. 
Em 2011, iniciei minha vivência como enfermeira da ESF, 
desempenhando competências técnicas, atuando na coordenação do 
cuidado, sendo responsável pelo desenvolvimento dos instrumentos de 
planejamento e gestão municipais junto ao Ministério da Saúde (Plano 
Municipal de Saúde, Programação e Relatórios de Gestão). Inquietava-
me o fato de a gestão municipal não cumprir com seu papel gerencial, 
acontecendo apenas em movimentos para provimento e manutenção de 
recursos. Percebia que os processos decisórios, de planejamento, de 
monitoramento e de avaliação não eram compartilhados com os 
enfermeiros e demais profissionais, o que remete a um modelo de gestão 
centralizado e verticalizado, sem comprometimento e motivação dos 
envolvidos. 
A partir dessa vivência profissional, busquei aperfeiçoar minha 
prática realizando uma especialização em Saúde da Família, na 
modalidade de residência e com objetivo de compreender como 
aconteciam os processos de gestão em enfermagem e saúde, e desafiei-
me a ingressar no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da 
Universidade Federal de Santa Catarina, como membro do Laboratório 
de Pesquisa, Tecnologia e Inovação em Políticas e Gestão do Cuidado e 
da Educação em Enfermagem e Saúde (GEPADES). A partir disso e da 
inserção nas discussões sobre governança, surgiu o interesse pelo tema 
em questão. 
Diante dessas considerações, delineou-se como questão de 
pesquisa: Como vem ocorrendo a governança na prática profissional de 
enfermagem no contexto da Atenção Primária à Saúde? 
 30 
2 OBJETIVO 
 
Este estudo teve como objetivos: 
 Compreender como vem ocorrendo a governança na prática 
profissional de enfermagem no contexto da Atenção Primária à 
Saúde; 
 Elaborar um modelo teórico sobre a governança na prática do 
profissional de enfermagem no contexto da Atenção Primária à 
Saúde. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
31 
 
3 SUSTENTAÇÃO TEÓRICA 
 
Esta seção apresenta alguns conceitos e eixos de pensamento 
que dão sustentação teórica à problemática investigada. Para tanto, 
organizou-se o texto em quatro tópicos: 1) O Sistema Único de Saúde e 
a Atenção Primária à Saúde; 2) Atuação do enfermeiro na Atenção 
Primária à Saúde; 3) Governança e Enfermagem; e 4) Complexidade 
Organizacional. 
 
3.1 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE E A ATENÇÃO PRIMÁRIA À 
SAÚDE 
 
A Constituição Federal de 1988 considera a saúde como direito 
social da população e estabelece competências comuns para seu alcance 
entre as três esferas do governo (municipal, estadual e federal) para 
legislar sobre a proteção e defesa da saúde (BRASIL, 2016). A 
Constituição instituiu o SUS para operacionalizar essas determinações, 
sendo a Lei 8.080/1990 o marco legal que determina as Políticas do SUS 
no Brasil. A Lei surgiu com a busca de reformulação do sistema de 
saúde a partir das considerações da 8ª Conferência Nacional de Saúde 
em 1986, frente à situação de deterioração das condições de saúde 
pública, como epidemias de febre amarela, varíola, cólera, a mortalidade 
crescente e constante pela tísica (doença associada às condições de 
pobreza da população pelos médicos da época). Além de contribuir para 
a criação do SUS, foi ponto de partida para a participação popular com o 
intuito de avaliar a situação de saúde da população e propor diretrizes 
posteriormente consolidadas na Lei 8.142/90 (BRASIL, 2012). 
A Lei 8.080/1990 “Dispõe sobre as condições para a promoção, 
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos 
serviços correspondentes e dá outras providências”. Regula as ações e 
serviços de saúde, em todo o território nacional, sejam elas executadas 
isoladamente ou conjuntamente, de caráter temporário ou permanente, 
por pessoas naturais ou jurídicasde direito público ou privado. 
Considera a saúde como direito fundamental do ser humano, cabendo ao 
Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. No 
entanto, não exclui o dever das pessoas e famílias, das empresas e 
sociedade para com a saúde (BRASIL, 1990). 
Como forma de orientar os serviços de saúde, a legislação em 
questão adota princípios doutrinários fundamentais e organizacionais 
para o SUS, sendo a universalidade, integralidade e equidade os 
estruturantes da institucionalidade do sistema. Entre os organizacionais 
 32 
destaca-se a descentralização de meios e responsabilidades, com 
prioridade municipal de execução, além da participação social na 
elaboração e controle da política nacional. Estabelece como fatores 
determinantes e condicionantes da saúde: alimentação, moradia, 
saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, transporte, lazer, 
acesso aos bens e serviços essenciais. Dessa forma, os níveis de saúde 
da população expressam a organização social e econômica do país 
(BRASIL, 1990). 
Após 21 anos da sua promulgação, em 2011, o Decreto 7.508 
regulamenta a Lei 8.080/1990. Dispõe sobre a organização do SUS por 
meio das Regiões de Saúde, o planejamento da saúde, a assistência à 
saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. Nesse 
sentido, as Regiões de Saúde devem ser compostas por municípios 
limítrofes, por ato conjunto dos respectivos estados em articulação com 
os municípios. Sendo referência para as transferências de recursos entre 
os entes federativos. Para ser instituída, a Região de Saúde deve conter, 
no mínimo, ações e serviços de: atenção primária; urgência e 
emergência; atenção psicossocial; atenção ambulatorial especializada e 
hospitalar; e vigilância em saúde. A porta de entrada para as ações e 
serviços de saúde nas Redes de Atenção à Saúde deve dispor dos 
serviços de atenção primária; de atenção de urgência e emergência; 
atenção psicossocial; e especiais de acesso aberto. Sendo o acesso a 
estes serviços universal, igualitário, completando-se na rede 
regionalizada e hierarquizada, de acordo com a complexidade do serviço 
(BRASIL, 2011). 
As Redes de Atenção à Saúde (RAS) são consideradas arranjos 
organizativos de ações e serviços de saúde, de diferentes densidades 
tecnológicas que, integradas por meio de sistemas de apoio técnico, 
logístico e de gestão, buscam garantir a integralidade do cuidado 
(BRASIL, 2011). A APS desenvolve-se com o mais alto grau de 
descentralização e capilaridade da rede, sendo considerada principal 
porta de entrada no sistema e centro de comunicação da RAS, 
coordenadora do cuidado e ordenadora das ações e serviços 
disponibilizados na rede (BRASIL, 2017). 
Em âmbito internacional, as conferências sobre cuidados 
primários em saúde vêm sendo realizadas desde o final dos anos de 
1970. Em 1978 a primeira conferência internacional de saúde é chamada 
de conferência de Alma-Ata, que adotou o seguinte conceito de saúde: 
 
Estado de completo bem-estar físico, mental e 
social e não simplesmente a ausência de doença 
33 
 
ou enfermidade, é um direito humano 
fundamental e que a consecução do mais alto 
nível possível de saúde é a mais importante meta 
social mundial, cuja realização requer a ação de 
muitos outros setores sociais e econômicos, além 
do setor saúde (Declaração de Alma-Ata, 1978, 
p.1). 
 
A Atenção Primária, nessa conferência, foi entendida como ponto-
chave para alcançar essa meta e, para que fosse idealizada, este serviço 
deveria ser levado o mais próximo do local onde as pessoas vivem e 
trabalham (Declaração de Alma-Ata, 1978). 
No Brasil, o SUS é tido como uma conquista da sociedade civil, 
descrita anteriormente pelos marcos legais, que modifica os paradigmas 
até então utilizados para pensar a saúde da população, e busca-se 
representar na Figura 1 os principais marcos da APS neste sistema. 
 
Figura 1 - Principais marcos da Atenção Primária à Saúde no Sistema Único de 
Saúde. Florianópolis, 2019 
 
Fonte: elaborado pela autora (2019). 
 
Considerando a necessidade de revisar e adequar as normas da 
APS, para a ESF e PACS relacionado ao contexto social e econômico 
em constante transformação no Brasil, a Portaria 2.488, de 21 de 
outubro de 2011, aprova a Política Nacional da Atenção Básica 
(BRASIL, 2012). Em setembro de 2017, a Portaria 2.436 revoga a 
portaria anterior e aprova a Política Nacional da Atenção Básica com 
vistas à revisão da regulamentação de implantação e operacionalização 
 34 
vigentes, no âmbito do SUS, estabelecendo-se as diretrizes para a 
organização do componente Atenção Básica, na Rede de Atenção à 
Saúde (BRASIL, 2017). 
As principais alterações revisadas na atual portaria estão 
relacionadas com a integração da Vigilância em Saúde à APS, inclusão 
do Agente de Combate à Endemias nas equipes de saúde da família, 
mesmo que este esteja submetido à vigilância em saúde, a 
recomendação de um gerente de atenção primária, dados de cobertura e 
financiamento da APS (BRASIL, 2017). 
Nessa portaria está descrito que a APS tem como princípios: 
universalidade, equidade e integralidade. E como diretrizes: 
regionalização e hierarquização, territorialização, população adscrita, 
cuidado centrado na pessoa, resolutividade, longitudinalidade do 
cuidado, coordenação do cuidado, ordenação da rede e a participação da 
comunidade (BRASIL, 2017). A APS organiza-se em Unidades Básicas 
de Saúde (UBS), compostas por equipes nas modalidades de equipes de 
saúde da família, equipe de atenção básica, equipe de saúde bucal e 
núcleo ampliado de saúde da família e atenção básica. As equipes 
multiprofissionais são compostas por médicos e enfermeiros, 
preferencialmente especialistas em saúde da família, cirurgiões-
dentistas, auxiliar ou técnico em saúde bucal, auxiliar de enfermagem ou 
técnico de enfermagem, agentes comunitários de saúde, agentes de 
combate a endemias, entre outros profissionais em função da realidade 
epidemiológica, institucional e das necessidades de saúde da população. 
Indica-se que cada equipe seja responsável por 2.000 mil a 3.500 
pessoas, e que cada ACS não ultrapasse o acompanhamento de 750 
pessoas (BRASIL, 2017). 
Para Galavote et al. (2016), a APS deve utilizar tecnologias de 
cuidado complexas e variadas para auxiliar no manejo das demandas e 
necessidades de saúde de maior frequência e relevância em seu 
território, observando critérios de risco, vulnerabilidade e resiliência e o 
imperativo ético de que toda demanda, necessidade de saúde ou 
sofrimento devem ser acolhidos. Ao encontro do modelo de saúde 
brasileiro, encontra-se o modelo de saúde português. Em 2005 iniciou-se 
a reforma dos cuidados de saúde primários portugueses considerada uma 
das mais bem-sucedidas reformas de serviços públicos em Portugal nas 
últimas décadas. Este sistema organiza-se em Unidades de Saúde 
Familiar (USFs) compostas por equipes multidisciplinares (médicos, 
enfermeiros e secretários clínicos) de constituição voluntária e auto-
organizadas, estas operam em centros de saúde geridos pelo Estado e 
que dão resposta com autonomia e de um modo flexível às necessidades 
35 
 
de saúde de um conjunto de pessoas, com especial foco nos cuidados 
médicos e de enfermagem personalizados (BISCAIA; HELENO, 2017). 
Ainda para os autores Biscaia e Heleno (2017), o processo de 
mudança dessa reforma envolveu a governança clínica para dar 
consistência e sustentabilidade, procurando obter ganhos em saúde 
através da melhoria da qualidade e da participação e responsabilização 
de todos. Dessa forma, a reforma portuguesa foi considerada moderna e 
inovadora. Moderna, pois se aliou à tecnologia e inovadora, 
principalmente para um sistema público, porque quebrou com o modelo 
vertical e hierarquizado tradicional e apostou em equipes 
autosselecionadas e auto-organizadas, com autonomia funcional e 
responsabilização,que podiam concentrar-se nas pessoas e comunidades 
que serviam e focar-se nas suas atividades nucleares. 
Sendo assim, percebe-se que a APS, como principal ponto de 
atenção, porta de entrada no sistema de saúde brasileiro e ordenadora do 
cuidado, tem sido campo de atuação para enfermeiros tanto com 
competências assistenciais, como gerenciais. Descrevem-se a seguir 
exemplos de estudos que envolveram enfermeiros no contexto estudado. 
 
3.2 ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À 
SAÚDE 
 
No Brasil, o enfermeiro inserido na APS cada vez mais 
incorpora atividades administrativas às práticas de assistência direta ao 
usuário, apontando para a ampliação dos seus limites. Exemplo disto é 
que, além da coordenação da equipe de enfermagem e supervisão dos 
agentes comunitários de saúde, inúmeras atividades de manutenção e 
controle dos serviços estão sob a gestão desse profissional. No contexto 
do cuidado integral, espera-se que as atividades de gestão façam parte da 
prática do cuidado de forma que sejam práticas complementares e não 
excludentes. As atividades gerenciais apontam para uma diversificação 
das possibilidades do mercado de trabalho, exigências do capital, 
desenvolvimento de políticas e capacitação pelos enfermeiros para 
atuação com qualidade neste contexto (GALAVOTE et al., 2016). 
Para Lanzoni, Meirelles e Cummings (2016), em um estudo 
sobre a prática de liderança do enfermeiro na APS, este profissional é 
considerado diferenciado nos serviços de APS, pois possui um conjunto 
de habilidades único, incorporando ações de promoção da saúde e de 
prevenção de doenças, além de articular as atividades de vários outros 
trabalhadores de saúde. Descrevem como um desafio a organização de 
lideranças clínicas e gerenciais pelos enfermeiros. No entanto, os 
 36 
reconhecem como líderes, devido às suas características naturais e/ou 
formação profissional, destacando sua forte influência no complexo 
sistema de saúde brasileiro. Nesse mesmo estudo, os participantes, 
enfermeiros, apontaram as condições inadequadas de trabalho, o número 
insuficiente de trabalhadores e a presença de profissionais com 
orientações diferentes das preconizadas pelas políticas públicas como 
influências negativas no exercício da liderança. Embora existam 
fragilidades no trabalho em equipe na APS, as melhores práticas de 
saúde estão associadas a esse método, sendo os enfermeiros 
especialistas em promover este trabalho (LANZONI; MEIRELLES; 
CUMMINGS, 2016). 
Ashley, Halcomb e Brown (2016) apontam que o ambiente de 
saúde em que os enfermeiros atuam está em constante mutação para 
atender às necessidades sociais, como, por exemplo, o envelhecimento 
populacional e aumento das doenças crônicas. Isso fornece desafios 
contínuos para garantir que os trabalhadores estejam habilitados com os 
conhecimentos e aptidão adequada para atender essas mudanças. Em 
uma revisão integrativa da literatura, os autores identificaram um 
número limitado de estudos com o tema da transição de cuidados agudos 
para os cuidados de saúde primários pelos enfermeiros. Escrevem que 
estes precisam ser preparados para a mudança, para sentirem-se seguros 
e aptos e identificaram a limitação do enfoque de enfermagem em APS 
nos programas de graduação. Concluem que os impactos de incluir a 
teoria e prática de enfermagem em APS nesse aprendizado têm impacto 
positivo no cuidado e que os enfermeiros que prestam cuidados 
primários foram identificados como satisfeitos em sua revisão. 
Ao explorar e descrever as percepções dos enfermeiros de APS 
sobre suas necessidades motivacionais para adquirir liderança nos locais 
de trabalho, Jooste e Hamani (2017) consideram que os enfermeiros 
precisam ter reconhecimento, responsabilidade organizacional, 
planejamento estratégico e promoção, bem como apoio por membros da 
equipe e gerentes. Segundo as autoras, um padrão de motivação 
particular, que denominam de motivação de liderança, é necessário para 
que os indivíduos sejam gerentes eficazes. 
Com objetivo de identificar os fatores que influenciam a carga 
de trabalho, a produtividade e o tamanho da agenda dos profissionais de 
enfermagem em ambientes de cuidados de saúde primários de base 
comunitária no Canadá e internacionalmente, Martin-Misener et al. 
(2016) destacam que: o número médio de pacientes atendidos por 
profissionais de enfermagem varia entre os países, os profissionais 
atendem em média 9-15 paciente por dia, as características dos pacientes 
37 
 
e suas condições de saúde parecem influenciar o número de pacientes 
atendidos por dia e que existem poucos sistemas para rastrear e medir as 
atividades de enfermeiros em ambientes de cuidado de saúde primários 
de base comunitária. 
Diante do exposto, considera-se que os profissionais de 
enfermagem são fundamentais na composição da equipe de saúde na 
APS e na gestão desse serviço. Esta afirmativa baseia-se no perfil de 
liderança, gestão da equipe e do serviço, supervisão dos agentes 
comunitários de saúde, além de destacarem-se como atores na 
produção/promoção de cuidado e saúde no Brasil e no mundo. Conclui-
se que os estudos recentes, discutidos por pesquisadores dedicados à 
compreensão da enfermagem e sua relação com a governança, assinalam 
para a necessidade de identificar como os profissionais entendem seu 
papel, as estruturas de saúde, os processos contemporâneos que 
permeiam as transformações nos estilos ou modelos da profissão. 
A lei que regulamenta o exercício profissional do enfermeiro 
considera que a enfermagem é exercida privativamente pelo enfermeiro, 
pelo técnico de enfermagem, pelo auxiliar de enfermagem, e pela 
parteira, respeitados os respectivos graus de habilitação. Suas práticas 
estão presentes nas instituições que prestam serviços de saúde e 
representam, geralmente, o maior percentual dos profissionais de saúde 
dentro de um estabelecimento (BRASIL, 1986). Desde a segunda 
metade do século XIX, quando ocorre a institucionalização da 
enfermagem por meio do trabalho de Florence Nightingale, na guerra da 
Crimeia, surgem contextualizações do gerenciamento de enfermagem 
(FORMIGA; GERMANO, 2005). 
As Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação 
em Enfermagem (DCN/ENF), que direcionam a formulação do currículo 
de enfermeiros nas instituições de educação superior no Brasil, 
demonstram a relação do ensino de enfermagem com a administração e 
gerência dos serviços de saúde, considerando os mais diversos contextos 
de atuação. Exemplo disso é o estabelecimento da Administração de 
Enfermagem como conteúdo curricular. Espera-se que o egresso do 
curso de enfermagem esteja apto a fazer o gerenciamento e 
administração tanto da força de trabalho, como dos recursos físicos e 
materiais e de informação, da mesma forma que devem estar aptos a 
serem gestores, empregadores ou lideranças na equipe de saúde 
(BRASIL, 2001). 
Mororó et al. (2017) corrobora que investir no componente de 
gestão durante o processo de formação dos enfermeiros pode 
instrumentalizá-los para o desenvolvimento da liderança, trabalho em 
 38 
equipe, comunicação, relacionamento interpessoal, tomada de decisão, 
planejamento e organização, dentre outras competências necessárias ao 
seu perfil profissional. Os atributos essenciais à gestão do cuidado em 
enfermagem devem ser trabalhados e desenvolvidos durante o processo 
de formação do enfermeiro através da aproximação entre o 
conhecimento teórico e a prática (MORORÓ et al., 2017). 
Diferentes autores descrevem a ação gerencial do enfermeiro no 
contexto da APS (MATUMOTO et al., 2011; FERNANDES; SILVA, 
2013; GALAVOTE et al., 2016). Para Fernandes e Silva (2013), entre as 
ações de gerenciamento do enfermeiro na APS destacam-se a 
participação na elaboração, coordenação e articulação do planejamento 
da unidade de saúde. Os mesmos autores exemplificam essas práticas 
quandodescrevem que: 
 O enfermeiro é capaz de identificar os recursos (estrutura física, 
sistema de informação, localização de documentos da unidade) 
e os fatores (perfil demográfico e epidemiológico da população 
descrita) relacionados com o planejamento da ESF; 
 O enfermeiro promove a integração e o bom relacionamento 
das equipes de saúde sob sua responsabilidade, investe nas 
relações interpessoais, valorizando o desempenho dos 
profissionais, almejando com isso a qualidade do cuidado 
prestado (FERNANDES; SILVA, 2013). 
Santos et al. (2013b) escreve que, a partir da década de 1990, 
com as novas demandas exigidas pelo exercício de cuidar do ser 
humano, o advento do SUS e as transformações no mundo do trabalho, é 
preciso intensificar o debate acerca das mudanças necessárias na gestão, 
gerência e organização do trabalho em saúde. Para Sousa e Bernardino 
(2015) os recentes modelos gerenciais recomendam a participação de 
todos no processo decisório e a modificação dos organogramas 
tradicionais, criando unidades de produção, excluindo departamentos e 
seções organizados por profissões e substituindo por unidades conforme 
a lógica de trabalho, compostas por equipes multiprofissionais. 
Nesse sentido, Fernandes e Silva (2013) apontam que as ações 
gerenciais do enfermeiro na APS sofrem influências do modelo 
tradicional (diálogo vertical e exclusão da participação dos usuários na 
construção das atividades gerenciais). Os autores escrevem que essas 
ações tradicionais do gerenciamento são pautadas nos modelos 
tayloristas, fordistas e weberianos. As ações gerenciais do enfermeiro, 
como ferramenta essencial para a organização do ambiente de trabalho, 
planejamento das técnicas de cuidado e coordenação dos membros da 
39 
 
equipe de saúde da ESF, não são implementadas com eficiência e 
eficácia, uma vez que os modelos administrativos tradicionais são 
frequentes, conforme as discussões dos autores, sendo fator limitante 
para a integralidade das práticas do enfermeiro no âmbito da Atenção 
Básica (FERNANDES; SILVA, 2013). 
Santos et al. (2013b) destacam oito ações principais de gerência 
do cuidado do enfermeiro:1) Dimensionar a equipe de enfermagem; 2) 
Exercer liderança no ambiente de trabalho; 3) Planejar a assistência de 
enfermagem; 4) Educar/Capacitar a equipe de enfermagem; 5) Gerenciar 
os recursos materiais; 6) Coordenar o processo de realização do cuidado; 
7) Realizar o cuidado e/ou procedimentos mais complexos; e 8) Avaliar 
o resultado das ações de enfermagem. Diante das necessidades 
assentadas nas mudanças nos modelos gerenciais na atualidade e nas 
práticas gerenciais do enfermeiro, considera-se que a compreensão de 
governança na prática do enfermeiro no contexto estudado possa trazer 
contribuições para o sistema de saúde. 
 
3.3 GOVERNANÇA E ENFERMAGEM 
 
Para que os enfermeiros possam gerenciar o cuidado, devem ter 
autonomia e participar dos processos de decisão que envolvem os 
processos de governança no ambiente de trabalho. Esse tema representa 
uma possibilidade a ser explorada no campo das pesquisas de gestão e 
gerenciamento em enfermagem (SANTOS et al., 2013a). 
Em uma revisão integrativa da literatura, Santos (2013a) 
identifica três tipos de governança na enfermagem: compartilhada, 
clínica e pública. O primeiro modelo de gestão é projetado para 
promover o controle dos enfermeiros sobre a sua prática e o ambiente no 
qual ela é realizada. No segundo, os padrões elevados de atendimento 
são esperados pelas organizações nacionais de serviços de saúde. No 
terceiro, a administração do estado regula o serviço de saúde (SANTOS 
et al., 2013a; SANTOS; OLIVEIRA, 2016). 
Relatada pela primeira vez em 1980, a governança 
compartilhada é considerada um modelo que tem influência sobre a 
prática de enfermagem atual. E a complexidade do sistema de saúde 
evidencia a necessidade de que o enfermeiro esteja pronto para a tomada 
de decisões. Neste sentido, a governança compartilhada tem sido 
adotada por muitas organizações como um veículo para capacitar os 
enfermeiros. Este modelo de envolvimento dos trabalhadores aumenta o 
controle dos profissionais sobre sua prática e é um componente integral 
 40 
para os hospitais que atingiram a acreditação pela sua excelência 
assistencial (GERARD; OWENS; OLIVER, 2016). 
Com objetivo de avaliar os resultados de mudanças (abordagem 
generalista para uma abordagem baseada em equipes, semelhante à do 
Reino Unido) ocorridas na enfermagem em saúde pública, na Irlanda, 
em relação à qualidade, segurança, risco, governança clínica, supervisão 
por duas equipes de enfermeiros e supervisão clínica, gestão ativa do 
número de casos e efeito financeiro, Hanafin e O’reilly (2015) apontam 
como positivas as mudanças ocorridas. Alguns exemplos dessas 
mudanças são: poder compartilhar o atendimento aos clientes, maior 
transparência e distribuição mais equitativa da carga de trabalho, 
benefícios aos cuidados clínicos de enfermagem devido à partilha de 
informações e apoio a visitas conjuntas (HANAFIN; O’REILLY, 2015). 
O estudo citado anteriormente descreveu mudanças semelhantes 
ao modelo de governança clínica. Recentemente, Hess (2017) escreveu 
uma crítica sobre outro novo conceito de governança profissional, 
considerando esta terminologia já existente há mais de 30 anos e muito 
próxima do modelo de governo tradicional. Dessa forma, não valoriza a 
necessidade de explorar este novo conceito. Destaca que a governança 
compartilhada é entendida como um componente de um conceito maior 
de governança profissional. 
Porter-O’Grady (2017) corrobora com o editorial de Hees 
(2017) do ponto de vista conceitual de governança profissional e 
compartilhada. Além disso, compartilha ideias adicionais como a de que 
o termo “governança compartilhada” refere-se ao mesmo que o termo 
“governança profissional”, e passou a ser utilizado apenas por 
conveniência. Compartilha a ideia de que a governança profissional se 
distingue das funções gerenciais como um mecanismo para que as 
profissões não sejam controladas ou gerenciadas por organizações ou 
fora da profissão. Uma das características únicas das profissões é que 
elas são autogeridas e têm controle exclusivo sobre sua própria prática e 
trabalham como parceiros de organizações e outros para atender às 
necessidades daqueles a quem servem. Seu relacionamento é um acordo, 
não uma hierarquia. 
A liderança de enfermagem, quando envolve um bom 
relacionamento com a equipe, é considerada essencial na promoção e 
manutenção de um ambiente de governança compartilhada que capacita 
outros enfermeiros para assumir um papel ativo no processo de 
mudança. A parceria, a responsabilização, a propriedade e a equidade, 
que são a base da governança compartilhada, refletem-se no sucesso de 
implementação e sustentabilidade das diretrizes de dimensionamento da 
41 
 
equipe. Uma instituição que investe na governança compartilhada como 
um componente importante de sua estrutura organizacional promove a 
colaboração entre a liderança de enfermagem e todos os enfermeiros, o 
que resulta em maior satisfação do paciente, satisfação do pessoal e num 
ambiente de trabalho saudável (BIEBER; JOACHIM, 2016). A 
governança compartilhada fornece uma oportunidade para promover a 
liderança dos enfermeiros assistenciais por meio do envolvimento e do 
controle sobre as decisões de prática. Este modelo tem sido 
empiricamente associado a melhores resultados de cuidados aos 
pacientes (GERARD; OWENS; OLIVER, 2016). 
Para Hess (2017), o modelo burocrático de organizações 
domina a área da saúde e grupos profissionais lutam constantemente 
junto a seus gerentes e administradores profissionais com a finalidade de 
alcançar as fontes necessárias para prover assistência ao paciente. 
Enquanto mudanças não ocorrem, deve-se destacar o sucesso da 
enfermagem como um exemplo de um poderoso grupo profissionalque 
trabalha em equipe para melhorar a prática e os resultados dos pacientes 
dentro de ambientes burocráticos e continuar a aprimorar o sucesso em 
oferecer um serviço inclusivo modelo de governo compartilhado. 
Aponta que as pesquisas futuras irão apurar a governança compartilhada 
e os resultados dos pacientes. 
 
3.4 COMPLEXIDADE ORGANIZACIONAL 
 
Neste estudo, adota-se como perspectiva teórica a complexidade 
organizacional. A lógica da gestão é representada predominantemente 
pelo planejamento, controle, direção, ordem, normas, hierarquia, 
competitividade e sobrevivência. No entanto, em meio a instabilidades, 
pode-se questionar como a Teoria da Complexidade contribui para 
novos modelos organizacionais que demandam as gestões ou 
organizações atuais (BAUER, 2009). 
O advento do pensamento complexo, desde os anos 1970, tem 
influenciado as lentes de estudos sobre organizações contemporâneas. 
Nesse sentido, é importante destacar o trabalho de Morin (2006, p. 83), 
que “não renuncia a ideia sobre clareza, a ordem, o determinismo. Ele as 
considera insuficientes, ou seja, que não se pode programar a 
descoberta, o conhecimento, nem a ação”. Pondera, então, que a 
realidade é mutante, inconstante e que o novo vai surgir. 
Ao longo dos anos a função gerencial e a organização do 
trabalho produziam a ideia de que o dirigente poderia ser capaz de 
comandar e coordenar um trabalho coletivo. A visão ordenada do 
 42 
mundo organizacional implícita na própria ideia de “organização” 
induzia a pensar a realidade administrativa como racional, controlável e 
passível de ser uniformizada (MOTTA, 2007). No entanto, com a 
velocidade com que as mudanças acontecem, é inevitável que gestores 
estejam abertos para considerar a complexidade encontrada na 
“desordem” (SILVA, SERRALVO, 2015). 
Leone, Dussault e Lapão (2014) consideram as organizações de 
saúde as mais complexas, pela diversidade dos seus serviços, variedade 
de profissionais com competências distintas, vários processos ocorrendo 
simultaneamente e pela necessidade de uma abordagem holística. Ao 
encontro disso, o setor da saúde responde a uma pluralidade de 
necessidades e especificidades, sejam elas relativas às mudanças 
demográficas, às condições sociais, às mudanças epidemiológicas e às 
epidemias, quer sejam de caráter individual ou coletivo, o que demanda 
a união de esforços para fins mais resolutivos (ERDMANN; 
SCHLINDWEIN; SOUSA, 2006). Diante disso, a crescente 
complexidade dos desafios do setor da saúde implica um aumento das 
responsabilidades para aqueles que nele assumem funções de gestão. 
Nesse sentido, considera-se que a cultura organizacional pode ser um 
fator relevante no desempenho de organizações na saúde (LEONE; 
DUSSAULT; LAPÃO, 2014). 
Ao exemplo do sistema de saúde português, o funcionamento de 
uma administração pública com tendência centralista, com décadas de 
funcionamento, passou por um processo de reforma. Esse processo 
aumentou a complexidade, pois o sistema precisou adaptar-se às novas 
forças intrínsecas à mudança, ao mesmo tempo em que procura 
diferentes soluções para responder às mais recentes exigências da saúde. 
Com as mudanças, o sistema de saúde português pretende transitar de 
uma velha lógica de funcionamento hierárquico e vertical, para uma 
dinâmica alicerçada na contratualização e em redes de serviços 
partilhados. Essa dinâmica depende, em grande parte, do contexto da 
situação, da natureza e extensão do processo de mudança e da forma 
como este foi iniciado ou implementado (LEONE; DUSSAULT; 
LAPÃO, 2014). 
Ao encontro disso, nas décadas de 70 e 80, importantes 
mudanças sociais, econômicas, estruturais aconteceram no mundo e, 
simultaneamente, a ortodoxia da teoria das organizações, pautada no 
paradigma funcionalista, cartesiano, apontou para revoluções 
43 
 
paradigmáticas
1
, pouco questionadas até os anos 80 (SERVA; DIAS; 
ALPERSTEDT, 2010). Ao interrogar o enfoque tradicional, do até então 
progresso científico, Thomas Kuhn (1987) revela que a ciência está em 
constante estado de evolução. 
 Diante dessas mudanças, organizações “mecanicistas” presas a 
velhos paradigmas não são capazes de acompanhar as mudanças no 
ambiente (SILVA; SERRALVO, 2015). Portanto, a visão sistêmica, 
globalização, multiplicidade de variáveis e critérios, falta de 
informações e a diversificação de objetivos levam os gestores a rever 
práticas gerenciais, não sendo possível elaborar planos baseados em uma 
única ordem. Para Bauer (2009), é na constante desorganização e 
reorganização dos ambientes de trabalho que acontecem a evolução e o 
aprendizado. É preciso que os filósofos contemporâneos leiam-se uns 
aos outros e discutam entre si. O ruído dessa discussão, dessa desordem, 
é que leva a uma nova ordem, a um conhecimento novo (SERVA; 
DIAS; ALPERSTEDT, 2010). 
Nesse contexto de desordem, o advento da adoção dos 
princípios da complexidade parece ter fomentado profundas 
transformações no desenvolvimento científico dos últimos 40 anos, 
tanto nas ciências da vida, como a biologia e a fisiologia, como nas 
ciências mais tradicionais, como a física e a química, e também nas 
ciências humanas (SERVA; DIAS; ALPERSTEDT, 2010). 
Complexidade não , de forma alguma, completude; ao contrário, ela diz 
respeito impossibilidade de se chegar a qualquer conhecimento 
 completo . Assim, a complexidade não traz certezas sobre o que 
incerto, ela pode apenas propor-se a reconhecer a incerteza, e a dialogar 
com ela (BAUER, 2009 p.19). Ainda para o autor, a complexidade 
difere-se de um sistema linear onde é permitida somente uma solução, 
no sistema complexo são permitidas várias leituras de um mesmo 
fenômeno. 
Para Etkin (2003) a complexidade é um enfoque que considera 
a organização como um espaço no qual coexistem ordem e desordem, 
motivo e sem motivo, harmonia e dissonâncias. As relações entre essas 
 
1
 O conceito de paradigma, remete ideia de “caracterização e definição de 
uma visão de mundo e ao compartilhamento de uma linguagem conceitual 
comum, na busca de fundar um edifício conceitual comum” (BEZERRA; 
SILVA 2011). Ou ainda, uma premissa fundamental entre os pesquisadores que 
o compartilham (KUHN, 1987). A revolução paradigmática inicia-se quando o 
paradigma instaurado já não consegue dar explicações acerca dos fenômenos 
estudados (KUHN, 1987). 
 44 
forças operam em um sentido de complementaridade, mas também de 
divergência e indiferença. O complexo também se refere a ambientes 
incertos e variantes, em que a inovação tecnológica leva ao 
encurtamento dos ciclos de renovação de métodos e equipamentos de 
produção, como também de bens e serviços finais. 
As organizações são consideradas sistemas complexos, de base 
social, política e técnica, não mecanismos (programado) ou organismos 
(natural). São complexos porque no sistema operam múltiplas lógicas e 
forças diversas que não se conjugam para a estabilidade. O sistema tem 
um método e um acordo constitutivo que apresentam a capacidade de se 
redefinir e se adaptar através da reflexão e dos processos de 
aprendizagem. Suas mudanças nem sempre resultam da autoridade e 
decisão política, mas do diálogo, do debate e interação social cotidiana 
(ETKIN, 2003). 
A mesma incerteza que comprometia ou inviabilizava as antigas 
explicações simplificadoras torna-se agora parte indissociável da 
explicação complexa, reconhecendo-se que a desordem concorre para a 
produção da ordem (order from noise) (BAUER, 2009, p.174). Segundo 
Etkin (2003), apesar de a desordem estar ligada às incertezas, 
comportamentos, variáveis internas e externas nas organizações, a 
criatividade e inovação têm a ver com atitudes espontâneas, emergentes 
dos integrantes que se afastam do caminho estabelecido (ordem), que 
questionam as políticas e avançam para além do que é programado. A 
desordemé considerada a expressão de uma visão inovadora, de uma a 
sabedoria disponível nos indivíduos ou grupos que lutam contra os 
processos burocráticos e uniformes que também operam os sistemas. 
Para exemplificar a intenção da desordem (complexidade) dos 
sistemas, Bauer (2009, p.53) relaciona a ela que “são os choques 
aleatórios e a agitação deles decorrente que produzem tanto os átomos 
quanto as estrelas, e que produziram o primeiro ser vivo”. E, claro, a 
desordem concorre tamb m para a destruição da ordem, tanto 
externamente (destruição por acidente) quanto internamente (aumento 
da entropia, degeneração). A auto-organização , pois, simultaneamente 
desorganização e reorganização, ordem e desordem. Se tudo fosse 
desordem no universo, certamente haveria muita criação e inovação, 
mas nenhuma organização delas decorrente e, portanto, nenhuma 
evolução. E, se tudo fosse ordem, não haveria criação ou inovação e, 
tampouco, evolução (BAUER, 2009). 
As mudanças apontam para construir organizações que se 
caracterizem por serem democráticas, transparentes e participativas. Isso 
depende das formas de governo e dos espaços de que os grupos dispõem 
45 
 
para expressar e sustentar suas ideias sobre o estado e a marca das 
organizações. Depende também da possibilidade de criar ambientes de 
trabalho equitativos e motivadores (ETKIN, 2003). No que diz respeito 
à vida e saúde, a ótica da totalidade nos exige um pensamento 
complexo, capaz de conceber o que nos une, contextualizando o 
pensamento no sentido de que todo acontecimento, informação ou 
conhecimento seja considerado na relação da inseparabilidade com seu 
meio ambiente, seja cultural, social, econômico, político ou natural 
(ERDMANN; SCHLINDWEIN; SOUSA, 2006). Logo, faz-se 
necessário um pensamento que considere o tempo, espaço e contexto 
(social, ético, político, econômico e outros) que constituem o real, num 
movimento dialético, complexo e de múltiplas determinações 
(ERDMANN; SCHLINDWEIN; SOUSA, 2006). 
Portanto, considera-se possível compreender as relações 
humanas, estratégias organizacionais, movimentos internos e externos 
das organizações com a perspectiva teórica da complexidade 
organizacional. A complexidade das organizações, no setor da saúde, 
requerem uma visão multidimensional (do todo) e das partes que 
compõem o todo, da ordem e da desordem, das relações e interações, 
das estratégias e habilidades que fazem com que este setor inove para 
abarcar as necessidades de saúde em constantes transformações. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 46 
4 MÉTODO 
 
Esta seção apresenta o percurso metodológico trilhado 
buscando a compreensão da problemática da governança na prática de 
enfermagem na Atenção Primária à Saúde. 
 
4.1 DELINEAMENTO DO ESTUDO 
 
Realizou-se uma investigação de abordagem qualitativa, com 
referencial metodológico da Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) ou 
Grounded Theory (GT). A pesquisa qualitativa procura entender e 
interpretar os significados e percepções que as pessoas constroem sobre 
fenômenos alocados em contextos naturais. Para apreender a variedade 
de significados que podem ser atribuídos a fatos ou experiências, a 
coleta de dados acontece por meio do contato direto com os 
participantes que vivenciam o problema em estudo (MINAYO, 2014). 
A TFD, como uma estratégia qualitativa de investigação, 
paulatinamente destaca-se na enfermagem pela possibilidade de 
construção de conhecimento com maior cientificidade a partir de suas 
características sistemáticas e complexas (DANTAS et al., 2009; 
GOMES et al., 2015; SILVA et al., 2018). 
Para contrapor o paradigma positivista predominante na década 
de 60, Barney G. Glaser e Anselm L. Strauss desenvolveram a TFD 
como uma alternativa à tradição hipotético-dedutiva da época durante 
estudos relacionados ao processo de morte em hospitais americanos. Em 
1967, publicaram o livro The discovery of Grounded Theory 
(CHARMAZ, 2009). 
Com o decorrer do tempo, Glaser e Strauss adotaram caminhos 
diferentes, discordando quanto ao significado e percurso metodológico 
da TFD, ainda que o método tenha se consolidado como exitoso. 
Enquanto Glaser manteve-se em uma posição inflexível quanto à TFD, 
Strauss incorporou novas formas de análise, como a codificação axial, 
bem como empregou recursos de informática para a coleta e análise dos 
dados (CHARMAZ, 2009). Strauss escreveu como se o propósito da 
teoria fundamentada fosse reconfigurado, porque os fenômenos sociais 
são tão complexos que gerar conceitos explicativos únicos que 
transcendem todo o contexto impossível (APRA IAN et al., 2016). 
Em conjunto com Juliet Corbin, por meio do livro Basics of 
Qualitative Research: Techniques and Procedures for Developing 
Grounded Theory, Strauss seguiu seus trabalhos e a sua linha de TFD. 
Ambos tratam a TFD como um método científico subsidiado por novos 
47 
 
instrumentos, concluindo que a construção da teoria ocorre a partir da 
relação colaborativa entre pesquisadores e participantes do estudo, o que 
futuramente dá margem à perspectiva construtivista do método 
(CHARMAZ, 2009). 
Kathy Charmaz, no ano 2000, introduziu a Teoria 
Fundamentada Construtivista. Charmaz não se opõe às origens da TFD 
de Glaser, Strauss e Corbin, pois considera que a TFD “alia duas 
tradições opostas e concorrentes” que intermediam o pensamento 
positivista e inflexível de Glaser e a flexibilidade relativista e 
subjetivista de Strauss e posteriormente Corbin (CHARMAZ, 2009). Ela 
valoriza as representações autênticas das palavras, ações e histórias em 
que a teoria fundamentada pode ser usada para "revelar vínculos entre 
experiências concretas de sofrimento e estrutura social, cultura e práticas 
ou políticas sociais” (APRA IAN et al., 2016). 
Diferentemente da vertente objetivista clássica de Glaser, no 
enquadramento da Grounded Theory de Charmaz, entre as suas próprias 
características, reconhece que as realidades e os fenômenos estudados 
são construções coletivas, que seus preceitos respondem fortemente à 
tradição interpretativa e afastam-se das bases objetivistas da abordagem 
de seus fundadores. Em outras palavras, Charmaz (2009) descreve que 
somos parte do mundo o qual estudamos e dos dados que coletamos, 
construímos as nossas teorias a partir de nossa interação e envolvimento 
com as pessoas, as perspectivas e práticas no processo da pesquisa. 
Nesse sentido, o proceder de suas investigações propõe um olhar atento 
ao movimento que parte do raciocínio indutivo ao abdutivo (LEITE, 
2015). 
Entre os m todos de pesquisa qualitativa, a TFD “viabiliza a 
construção de uma teoria assentada em dados que podem ser 
provenientes de diferentes fontes e é elaborada a partir de uma dada 
vivência social” (GO ES et al., 2015, p.473). O m todo permite, ainda, 
a compreensão do fenômeno a partir da realidade na qual ele se insere 
pela identificação, desenvolvimento e relação de conceitos, por meio de 
uma minuciosa análise comparativa, estritamente relacionada com a 
coleta de dados, processo que não parte de pressupostos, assim como 
não tem a finalidade de testar seus achados, porém que possa acrescentar 
novas perspectivas de atuação (GOMES et al., 2015). 
 A TFD possibilita a compreensão das experiências e interações 
de indivíduos que compõem um mesmo contexto social, buscando 
evidenciar estratégias diante de situações vivenciadas gerando 
conhecimentos, aumentando a compreensão e proporcionando um guia 
significativo para a ação (DANTAS et al., 2009; SANTOS et al., 2016). 
 48 
O método potencializa a expansão do conhecimento em enfermagem, 
administração, odontologia e de áreas como psicologia, sociologia e 
outras (DANTAS et al., 2009; GOMES et al., 2015; TORRES et al., 
2015; SILVA et al., 2018). 
 A TFD pode apresentar fases e características variadas, de 
acordo com a vertente utilizada. Entre ascaracterísticas centrais do 
método destacam-se: o processo de indução e dedução, análise 
comparativa constante, circularidade de dados, sensibilidade teórica, 
saturação teórica dos dados, uso de memorandos e diagramas 
(DANTAS et al., 2009; DIAS DO NASCIMENTO et al., 2016; SILVA 
et al., 2018). Além dessas, vale ressaltar que a TFD permeia e suporta 
todo processo da pesquisa (GOMES et al., 2015). 
Diante da crença de que é a vertente metodológica mais 
adequada para responder ao objetivo deste estudo, optou-se por utilizar a 
vertente construtivista da TFD, representada por Kathy Charmaz. 
Espera-se que a intimidade com o tema de pesquisa e a bibliografia com 
ele relacionada intensifiquem a compreensão do contexto a ser estudado, 
além disso, que permitam à pesquisadora estar aberta à sensibilidade dos 
dados que emergem. Para elucidar como desenvolveu-se esta pesquisa, 
descreve-se a seguir o contexto em que ela foi realizada e as principais 
características da TFD. 
 
4.2 CONTEXTO DO ESTUDO 
 
O contexto do estudo foi a Atenção Primária à Saúde na 
microrregião de Tijucas/SC, que tem a Estratégia Saúde da Família 
como modelo de organização exclusivo. Para compreender a 
conformação da Rede de Atenção à Saúde desta microrregião 
apresentam-se na sequência dados da APS no Brasil, Estado de Santa 
Catarina e contexto investigado. Além disso, características 
demográficas e a inserção/distribuição dos enfermeiros que atuam na 
APS nesta microrregião. 
 No Brasil, a cobertura populacional da APS é de 62,5%, sendo 
representada por 39.228 equipes de saúde da família (BRASIL, 2017). 
No Estado de Santa Catarina (SC), os serviços de APS estão sendo 
oferecidos por 1.846 equipes, distribuídos em 1.468 centros de saúde 
com gestão da esfera municipal e 18 centros de saúde com gestão 
municipal e estadual (DATASUS, 2019). O estado apresenta cobertura 
de Atenção Primária à Saúde de 84,26%, considerando a Estratégia 
Saúde Família em 83,57% dos municípios (DAB, 2019). Visando à 
49 
 
operacionalização do modelo de gestão regionalizado, foram criadas 
nove macrorregiões e 16 regiões de saúde, estabelecendo, dessa forma, 
um sistema de referência e contrarreferência, respeitando os diversos 
níveis de complexidade da assistência. Com a regulamentação da Lei nº. 
8.080/90 por meio do Decreto nº. 7.508/11, criou-se o Contrato 
Organizativo de Ação Pública (COAP), que deverá organizar e integrar 
as ações e serviços de saúde dos entes federativos em uma Região de 
Saúde, com a finalidade de garantir a integralidade da assistência aos 
usuários. Nesse sentido, o planejamento em saúde deve ser realizado de 
forma regionalizada, expressando o desenho das regiões de saúde 
instituídas e das redes de atenção em saúde existentes no território 
(SANTA CATARINA, 2012). 
As Regiões de Saúde são compostas por macrorregiões de 
saúde. Para análise espacial de informações de saúde por meio de 
malhas municipais, o Departamento de Informática do SUS 
(DATASUS) realizou recortes de municípios em microrregiões. No 
Estado de SC a microrregião de Tijucas é formada por sete municípios, 
cada qual com responsabilidade exclusiva de garantir a Atenção 
Primária à Saúde local. Os municípios que compõem esta microrregião 
são: Angelina, Canelinha, Leoberto Leal, Major Gercino, Nova Trento, 
São João Batista e Tijucas (DATASUS, 2019). 
A população residente nesta microrregião, conforme o último 
censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE, 2010), é 
de 95.238 pessoas, com cobertura de 100% dos serviços da APS, com 
modelo de organização orientado pela Estratégia Saúde da Família. 
Sobre esta população, 67.248 pessoas são alfabetizadas e a taxa de 
analfabetismo é de 5,4%. A renda média domiciliar per capita é de 
R$763,39, 50.064 pessoas têm 16 anos ou mais, são economicamente 
ativas, 1.009 delas desocupadas e 14,9% da população com renda menor 
que ½ salário mínimo. O abastecimento de água, instalações sanitárias e 
coleta de lixo estão disponíveis para 95,8% desta população (IBGE, 
2010). Diante disso, destaca-se que o estado de saúde de um indivíduo 
ou uma população é determinado por sua combinação genética, porém 
“grandemente modificado pelo ambiente social e físico, por 
comportamentos que são cultural ou socialmente determinados e pela 
natureza da atenção saúde oferecida” (STARFIELD, 2002, p.23). 
A microrregião conta com 47 estabelecimentos de saúde 
denominados centro de saúde, unidade básica de saúde, posto de saúde e 
unidade de saúde da família (DATASUS, 2019). Entre os profissionais 
que atuam nesses estabelecimentos, o padrão de referência é de no 
mínimo um trabalhador de cada categoria (médico, enfermeiro, cirurgião 
 50 
dentista, técnico ou auxiliar de enfermagem, técnico ou auxiliar de saúde 
bucal e agente comunitário de saúde), com exceção do agente 
comunitário de saúde, em que é considerado o mínimo de quatro 
profissionais em cada equipe (BOUSQUAT et al., 2017). 
Dados do Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA), 
informados no Plano Nacional de Saúde em 2016, demonstram destaque 
para o aumento (número de vezes) do número de atendimentos do 
enfermeiro na APS de 2014 em relação a 2002, sendo 4,65 milhões de 
vezes mais (BRASIL, 2016). Enfatiza-se que o trabalho do enfermeiro, 
na APS, além das atividades assistenciais, agrega as atividades 
administrativas; de 1.041 enfermeiros no Estado de Santa Catarina, 94% 
destes desempenham a função de coordenação ou gerência 
(GALAVOTE et al., 2016). Na microrregião em questão, conforme a 
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), encontram-se 44 
Enfermeiros da Saúde da Família. A distribuição destes profissionais 
por municípios que compõem a microrregião está representada na 
Tabela 1. 
 
Tabela 1 - Distribuição de enfermeiros da Saúde da Família na Microrregião de 
Tijucas/SC, 2019. Florianópolis, 2019 
Município Quantidade de enfermeiros da Saúde da Família 
Angelina 2 
Major Gercino 2 
Leoberto Leal 3 
Canelinha 5 
Nova Trento 6 
São Joao Batista 10 
Tijucas 16 
Total 44 
Fonte: Ministério da Saúde - Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, 
2019. 
 
O detalhamento do rigor metodológico da Teoria Fundamentada 
nos Dados pelo paradigma construtivista, de acordo com o contexto 
exposto, está descrito nos tópicos em sequência. 
 
4.3 PARTICIPANTES 
 
 Considerando que na TFD a amostragem teórica é dirigida à 
construção da teoria e não visando à representação populacional, 
primeiramente foram entrevistados enfermeiros que atuavam na APS. A 
51 
 
partir da análise dos dados das entrevistas iniciais, foram incluídos 
profissionais da equipe de enfermagem, agentes comunitários de saúde e 
gestores. Ressalta-se que o foco da análise não está no indivíduo, mas 
em suas ações, experiências, eventos e questões, ou seja, nos dados a 
serem fornecidos para a construção da teoria (CHARMAZ, 2009). Os 
participantes foram provenientes de UBS de cinco municípios 
(Angelina, Canelinha, Major Gercino, São João Batista e Tijucas) que 
fazem parte da microrregião de Tijucas/SC e pertencem à 
Macrorregional de saúde da Grande Florianópolis/SC, conforme termo 
de autorização institucional (ANEXO A). 
Os entrevistados foram escolhidos de forma intencional e 
subsidiaram a amostragem teórica. Ou seja, orientaram os caminhos 
conceituais explorados até a conquista suficiente de dados que apoiaram 
a explicação de suas categorias, resultando, assim na “saturação 
teórica”, ou tamb m entendida como “suficiência teórica” (CHAR AZ, 
2009, p. 158). 
Para a amostragem teórica, foram construídos três grupos 
amostrais, totalizando 22 participantes, selecionados pelo seguinte 
critério de inclusão: compor uma Equipe de Saúde da Família (eFS) 
vinculada às Secretarias Municipais de Saúde da microrregião de 
Tijucas/SC e com experiência de no mínimo um ano na APS. Esse 
período foi definido

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