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Profª. Natália Interpretação de Texto Página 1 de 3 LISTA DE EXERCÍCIOS - INTERPRETAÇÃO DE TEXTO TEXTOS MODERNISTAS 1. (FUVEST 2019) Leia os textos. – Eu acho que nós, bois, – Dançador diz, com baba – assim como os cachorros, as pedras, as árvores, somos pessoas soltas, com beiradas, começo e fim. O homem, não: o homem pode se ajuntar com as coisas, se encostar nelas, crescer, mudar de forma e de jeito… O homem tem partes mágicas… São as mãos… Eu sei… João Guimarães Rosa, “Conversa de bois”. Sagarana. Um boi vê os homens Tão delicados (mais que um arbusto) e correm e correm de um para o outro lado, sempre esquecidos de alguma coisa. Certamente falta-lhes não sei que atributo essencial, posto se apresentem nobres e graves, por vezes. Ah, espantosamente graves, até sinistros. Coitados, dir-se-ia não escutam nem o canto do ar nem os segredos do feno, como também parecem não enxergar o que é visível e comum a cada um de nós, no espaço. E ficam tristes e no rasto da tristeza chegam à crueldade. (...) Carlos Drummond de Andrade, “Um boi vê os homens”. Claro enigma. a) Em ambos os textos, o assombro de quem vê decorre das avaliações contrastantes sobre quem é visto. Justifique essa afirmação com base em cada um dos textos. b) O conto de Rosa e o poema de Drummond valem-se de uma mesma figura de linguagem. Explicite essa figura e justifique sua resposta. TEXTO PARA AS PRÓXIMAS 2 QUESTÕES: Leia o poema de Manuel Bandeira (1886-1968) para responder à(s) questão(ões) a seguir. Poema tirado de uma notícia de jornal João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número. Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu Cantou Dançou Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado. (Libertinagem & Estrela da manhã, 1993.) 2. (UNESP 2019) a) De que modo o fato de morar “num barracão sem número” contribui para a caracterização de João Gostoso? b) Cite dois elementos da linguagem jornalística presentes no poema. 3. (UNESP 2019) a) Cite uma característica distintiva da poesia lírica que não se encontra nesse poema. b) Cite três elementos que evidenciam o caráter narrativo desse poema. 4. (UNICAMP 2017) Leia o seguinte trecho do conto “Amor”, de Clarice Lispector. Então ela viu: o cego mascava chicles... Um homem cego mascava chicles. Ana ainda teve tempo de pensar por um segundo que os irmãos viriam jantar – o coração batia-lhe violento, espaçado. Inclinada, olhava o cego profundamente, como se olha o que não nos vê. Ele mastigava goma na escuridão. Sem sofrimento, com os olhos abertos. O movimento de mastigação fazia-o parecer sorrir e de repente deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir – como se ele a tivesse insultado, Ana olhava-o. E quem a visse teria a impressão de uma mulher com ódio. Clarice Lispector, Laços de família. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p. 21-22. a) Em textos de Clarice Lispector, é comum que um acontecimento banal se transforme em um momento perturbador na vida das personagens. Considerando o contexto do conto “Amor”, indique que tipo de inquietações o acontecimento narrado acima acarreta na vida da personagem. b) A frase “olhava o cego profundamente, como se olha o que não nos vê” sugere uma maneira pouco comum de olhar para as coisas. Explique o sentido que tem esse olhar profundo, a partir dali, na caracterização da personagem Ana. TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO: Leia o texto para responder à(s) questão(ões) a seguir. Muitos anos mais tarde, Ana Terra costumava sentar-se na frente de sua casa para pensar no passado. E no pensamento como que ouvia o vento de outros tempos e sentia o tempo passar, escutava vozes, via caras e lembrava-se de coisas... O ano de 81 trouxera um acontecimento triste para o velho Maneco: Horácio deixara a fazenda, a contragosto do pai, e fora para o Rio Pardo, onde se casara com a filha dum tanoeiro e se estabelecera com uma pequena venda. Em compensação nesse mesmo ano Antônio casou-se com Eulália Moura, filha dum colono açoriano dos arredores do Rio Pardo, e trouxe a mulher para a estância, indo ambos viver num puxado que tinham feito no rancho. Em 85 uma nuvem de gafanhotos desceu sobre a lavoura deitando a perder toda a colheita. Em 86, quando Pedrinho se aproximava dos oito anos, uma peste atacou o gado e um raio matou um dos escravos. Foi em 86 mesmo ou no ano seguinte que nasceu Rosa, a primeira filha de Antônio e Eulália? Bom. A verdade era que a criança tinha nascido pouco mais de um ano após o casamento. Dona Henriqueta cortara-lhe o cordão umbilical com a mesma tesoura de podar com que Profª. Natália Interpretação de Texto Página 2 de 3 separara Pedrinho da mãe. E era assim que o tempo se arrastava, o sol nascia e se sumia, a lua passava por todas as fases, as estações iam e vinham, deixando sua marca nas árvores, na terra, nas coisas e nas pessoas. E havia períodos em que Ana perdia a conta dos dias. Mas entre as cenas que nunca mais lhe saíram da memória estavam as da tarde em que dona Henriqueta fora para a cama com uma dor aguda no lado direito, ficara se retorcendo durante horas, vomitando tudo o que engolia, gemendo e suando de frio. Érico Veríssimo. O tempo e o Vento, “O Continente”, 1956. 5. (FGV 2017) No primeiro parágrafo do texto, o narrador afirma que Ana Terra “... sentia o tempo passar, escutava vozes, via caras e lembrava-se de coisas...” a) Como se organiza no texto a ideia de passagem do tempo? Como isso está relacionado à percepção que a personagem tem da sua vida? b) Há duas perspectivas temporais bastante marcadas no texto, com o emprego de verbos no pretérito imperfeito e no pretérito mais-que-perfeito. Explique a relação de sentido que há entre elas no texto. 6. (PUCRJ 2016) São Paulo, 15 de novembro de 1923 – Viva a República! Tarsila, minha querida amiga: Cuidado! fortifiquem-se bem de teorias e desculpas e coisas vistas em Paris. Quando vocês aqui chegarem, temos briga, na certa. Desde já, desafio vocês todos juntos, Tarsila, Oswald, Sérgio para uma discussão formidável. Vocês foram a Paris como burgueses. Estão épatés*. E se fizeram futuristas! hi! hi! hi! Choro de inveja. Mas é verdade que considero vocês todos uns caipiras em Paris. Vocês se parisianizaram na epiderme. Isso é horrível! Tarsila, Tarsila, volta para dentro de si mesma. Abandona o Gris e o Lhote, empresários de criticismos decrépitos e de estesias decadentes! Abandona Paris! Tarsila! Tarsila! Vem para a mata-virgem, onde não há arte negra, onde não há também arroios gentis. Há MATA VIRGEM. Criei o matavirgismo. Sou matavirgista. Disso é que o mundo, a arte, o Brasil e minha queridíssima Tarsila precisam. Se vocês tiverem coragem venham para cá, aceitem meu desafio. E como será lindo ver na moldura verde da mata a figura linda, renascente de Tarsila Amaral. Chegarei silencioso, confiante e te beijarei as mãos divinas. Com abraço muito amigo do Mário. * Épatés – palavra do francês que significa deslumbrados. AMARAL, Aracy (org.). Correspondência Mário de Andrade & Tarsila do Amaral. São Paulo: Editora da USP/IEB, 2001, pp. 78-80. a) A carta escrita por Mário de Andrade a Tarsila do Amaral aborda importantes questões que fomentaram o debate político e estético entre os artistas da primeira geração modernista no Brasil. Indique dois aspectos presentes no texto que reiteram o que foi afirmado acima. b) Determine dois procedimentos linguísticos, comprovados com exemplos retirados da carta, que evidenciam o espírito iconoclasta do modernismo brasileiro. 7. (UNICAMP 2015) Leia os excertos a seguir. Um dia... Sim, quando as secas desaparecessem e tudo andasse direito... Seria que as secas iriam desaparecer e tudo andar certo? Não sabia. RAMOS, Graciliano, Vidas secas.118ª ed., Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 25. Nunca vira uma escola. Por isso não conseguia defender- se, botar as coisas nos seus lugares. O demônio daquela história entrava-lhe na cabeça e saía. Era para um cristão endoidecer. Se lhe tivessem dado ensino, encontraria meio de entendê-la. Impossível, só sabia lidar com bichos. RAMOS, Graciliano, Vidas secas. 118ª ed., Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 35. a) Nos excertos citados, a seca e a falta de educação formal afetam a existência das personagens. Levando em conta o caráter crítico e político do romance, relacione o problema da seca com a questão da escolarização no que diz respeito à personagem Fabiano. b) “Nunca vira uma escola. Por isso não conseguia defender-se, botar as coisas nos seus lugares.” Descreva uma passagem do romance em que, por não saber ler e escrever, Fabiano é prejudicado e não consegue se defender. 8. (UFMG 2012) Leia estes trechos: TRECHO 1 O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo. O que aqui está é, mal comparando, semelhante à pintura que se põe tia barba e nos cabelos, e que apenas conserva o hábito eterno, como se diz nas autopsias; o interno não aguenta tinta. MACHADO DE ASSIS, J. M. Dom Casmurro. São Paulo: Globo, 1997. p. 3. TRECHO 2 Desse antigo verão que me alterou a vida restam ligeiros traços apenas. E nem deles posso afirmar que efetivamente me recorde. O hábito me leva a criar um ambiente, imaginar fatos a que atribuo realidade. RAMOS, Graciliano. Infância. Rio de Janeiro: Record. 1984. p. 26. A partir da leitura desses trechos, explique como, em cada uma das obras referidas, o narrador aborda as possibilidades de a escrita reconstituir o passado. Profª. Natália Interpretação de Texto Página 3 de 3 9. (UFU 2007) Leia os textos a seguir. TEXTO A "Ela nascera com maus antecedentes e agora parecia uma filha de um não-sei-o-quê com ar de se desculpar por ocupar espaço. No espelho distraidamente examinou de perto as manchas no rosto. Em Alagoas chamavam-se 'panos', diziam que vinham do fígado. Disfarçava os panos com grossa camada de pó branco e se ficava meio caiada era melhor que o pardacento. Ela toda era um pouco encardida pois raramente se lavava. De dia usava saia e blusa, de noite dormia de combinação. Uma colega de quarto não sabia como avisar-lhe que seu cheiro era murrinhento. E como não sabia, ficou por isso mesmo, pois tinha medo de ofendê-la. Nada nela era iridescente, embora a pele do rosto entre as manchas tivesse um leve brilho de opala. Mas não importava. Ninguém olhava para ela na rua, ela era café frio. [...] Só eu a amo." Clarice Lispector. "A hora da estrela". TEXTO B "Uma nordestina Ela é uma pessoa no mundo nascida. Como toda pessoa é dona da vida. Não importa a roupa de que está vestida. Não importa a alma aberta em ferida. Ela é uma pessoa e nada a fará desistir da vida. Nem o sol de inferno a terra ressequida a falta de amor a falta de comida. É mulher é mãe: rainha da vida. De pés na poeira de trapos vestida é uma rainha e parece mendiga: a pedir esmolas a fome a obriga. Algo está errado nesta nossa vida: ela é uma rainha e não há quem diga." Ferreira Gullar. "Melhores poemas". a) Cite dois elementos constitutivos do poema que contribuem para acentuar o seu caráter de apelo "popular". b) Compare os textos e discorra sobre a descrição da nordestina, considerando: - as perspectivas diferentes do narrador e sujeito lírico. - os aspectos convergentes das opiniões do narrador e sujeito lírico. 10. (UNIFESP 2011) Leia o texto. Quando chega o dia da casa cair – que, com ou sem terremotos, é um dia de chegada infalível, – o dono pode estar: de dentro, ou de fora. É melhor de fora. E é a só coisa que um qualquer-um está no poder de fazer. Mesmo estando de dentro, mais vale todo vestido e perto da porta da rua. Mas, Nhô Augusto, não: estava deitado na cama – o pior lugar que há para se receber uma surpresa má. E o camarada Quim sabia disso, tanto que foi se encostando de medo que ele entrou. Tinha poeira até na boca. Tossiu. – Levanta e veste a roupa, meu patrão Nhô Augusto, que eu tenho uma novidade meia ruim, pr’a lhe contar. E tremeu mais, porque Nhô Augusto se erguia de um pulo e num átimo se vestia. Só depois de meter na cintura o revólver, foi que interpelou, dente em dente: – Fala tudo! Quim Recadeiro gaguejou suas palavras poucas, e ainda pôde acrescentar: – ... Eu podia ter arresistido, mas era negócio de honra, com sangue só p’ra o dono, e pensei que o senhor podia não gostar... – Fez na regra, e feito! Chama os meus homens! Dali a pouco, porém, tornava o Quim, com nova desolação: os bate-paus não vinham... Não queriam ficar mais com Nhô Augusto... O Major Consilva tinha ajustado, um e mais um, os quatro, para seus capangas, pagando bem. Não vinham, mesmo. O mais merecido, o cabeça, até mandara dizer, faltando ao respeito: – Fala com Nhô Augusto que sol de cima é dinheiro!... P’ra ele pagar o que está nos devendo... E é mandar por portador calado, que nós não podemos escutar prosa de outro, que seu major disse que não quer. – Cachorrada!... Só de pique... Onde é que eles estão? – Indo de mudados, p’ra a chácara do Major... – Major de borra! Só de pique, porque era inimigo do meu pai!... Vou lá! (João Guimarães Rosa. A hora e vez de Augusto Matraga.) a) No sertão de Guimarães Rosa, frequentemente faz-se referência a aspectos de um código de ética, de caráter tradicional, que rege a vida das personagens. Transcreva as duas falas do diálogo em que se menciona uma situação em que esse código não é quebrado. b) Indique duas palavras ou expressões presentes nos diálogos entre as personagens que não correspondem à norma-padrão da língua. Compare o modo como o autor emprega a língua nos diálogos e no discurso do narrador, explicando as diferenças entre os dois usos.