Prévia do material em texto
Técnicas manuais para dor miofascial e ponto gatilho Manual techniques for the myofascial pain and trigger point Resumo Introdução: Síndrome dolorosa miofascial é uma condição dolorosa regional, caracterizada por bandas musculares tensas, havendo áreas hipersensíveis chamadas de pontos gatilho. Objetivo: Revisar a literatura atual para elucidar os mecanismos de ação, os parâmetros mais adequados e a efetividade dos tratamentos manuais para síndrome da dor miofascial. Métodos: Realizou-se busca nas bases de dados Sciencidirect, Bireme e Pubmed, publicados entre 1980 a 2011, correlacionando as seguintes palavras-chave: dor miofascial, síndrome dolorosa miofascial, ponto gatilho miofacial, técnicas manuais e terapia manual, nos idiomas inglês, português e espanhol. Resultados: Dos artigos encontrados as modalidades manuais de tratamento citadas incluem a massoterapia, alongamento, alongamento com spray de gelo, terapia de liberação miofascial, técnica de energia muscular, thrust de alta velocidade e baixa amplitude, compressão isquêmica e terapia de liberação posicional. Conclusão: Esta revisão evidencia que as técnicas manuais podem contribuir para as ações clínicas no tratamento da síndrome dolorosa miofascial, porém há necessidade de novas pesquisas para esclarecimentos sobre a utilização de novos procedimentos, os reais mecanismos de ação, os efeitos terapêuticos e os parâmetros mais adequados de algumas técnicas. Palavras-chave: Síndromes da Dor Miofascial, Modalidade de Fisioterapia, Manipulações Musculosqueléticas. 938 Tratamento da dor lombar por meio de manipulação. INTRODUÇÃO Síndrome dolorosa miofascial (SDM) é uma condição de hiperirritabilidade em áreas chamadas de pontos gatilho miofasciais (PGM), podendo ser encontradas em ligamentos, tendões, periósteo e pele, sendo mais comum em bandas musculares tensas, gerando dor a compressão e padrões característicos de dor referida que não seguem a distribuição da raiz nervosa ou dermátomos, apresentando aumento da sensibilidade, sintomas de alteração do sistema nervoso autônomo e restrição da amplitude de movimento (ADM) (1-9). Os PGMs são classi cados como ativos ou latentes (1,2,4,8), sendo que os ativos causam dor espontânea e persistente em repouso, com a atividade muscular e à palpação direta, e os PGM latentes são mais comuns e causam dor sob compressão (1-4,6-9). O fundamento etiológico e patogênico da SDM aparenta ser multifatorial, envolvendo estresse postural, biomecânica ine ciente, movimentos repetitivos, hábitos orais parafuncionais, desequilíbrio oclusivo e alimentar, falta de exercício físico, de ciência de vitaminas, distúrbios de sono, problemas articulares, trauma agudo, fatores emocionais e psicológicos (1,2,4,5,8). De acordo com Simons et al.(10) a pato siologia da SDM está relacionada com uma lesão ou aumento do estresse da bra muscular, levando ao encurtamento involuntário, perda do suplemento de oxigênio e nutrientes, e acréscimo da demanda metabólica no tecido local (2,6,9). Simons (11) a rmou que qualquer tratamento que reduza o encurtamento do sarcômero na região do PGM irá também reduzir o consumo de energia e a liberação de substâncias sensibilizantes. Os dados existentes na literatura sobre os tratamentos manuais para a SDM ainda se apresentam de forma inconclusiva. Além Ter Man. 2011; 9(46):937-942 disso, os benefícios para a aplicação desses protocolos não são bem documentados. Dessa forma, o objetivo deste estudo é revisar a literatura atual para elucidar os mecanismos de ação, os parâmetros mais adequados e a efetividade dos tratamentos manuais para síndrome da dor miofascial. MATERIAIS E MÉTODOS Foi realizada uma revisão da literatura nas bases de dados Sciencidirect, Bireme e Pubmed, utilizando artigos publicados entre 1980 a 2011 relacionados ao tratamento manual de ponto gatilhos miofasciais e da síndrome dolorosa miofascial, além de livros textos clássicos sobre o tema. Os descritores de texto utilizados foram: dor miofascial, síndrome dolorosa miofascial, ponto gatilho miofascial, técnicas manuais e terapia manual, no idioma inglês, português e espanhol. Como critério de inclusão para a seleção dos trabalhos pesquisados, levou- se em conta a relação com a patologia e os tratamentos propostos, além da data de publicação desses estudos. RESULTADOS Alongamentos Os métodos que alongam o músculo com PGM e aumentam sua exibilidade são bené cos (10), porém, o alongamento pode aumentar a dor do PGM ativo, tornando-o mais irritável (10,12). Ainda, Moral e Barreiro (12) a rmam que sua utilidade possa não exceder a PGM não muito ativo e irritável. Simons et al.(10) sugerem que é importante após o alongamento realizar 3 ciclos da ADM, estirando e encurtando o músculo tratado, ajudando a normalizar a função muscular ao nível do sarcômero e a restabelecer a coordenação normal com outros músculos de sua unidade funcional, porém, não há estudos que comprovem benefício. Para tornar o alongamento menos dolorido foi desenvolvido um método que combina o alongamento passivo com a aplicação do spray de gelo da origem do músculo que contém o PGM até a inserção e também para a área de dor referida em sucessivas varreduras paralelas (6,12,13). O uso do spray gera uma queda repentina da temperatura da pele e produz analgesia pelo bloqueio dos estímulos nociceptivos proveniente do músculo que está sendo alongado, ajudando a inativar os PGMs, aliviar o espasmo muscular e reduzir a dor referida (2,10,12,13). Algumas pesquisas (13,14) compararam os efeitos do alongamento com spray congelante e o alongamento isolado e concluíram que o alongamento com o spray é mais e caz no aumento da ADM passiva, na redução da dor miofascial(15). Técnicas compressivas Diferentes mecanismos terapêuticos da compressão isquêmica (CI) têm sido propostos para a diminuição da dor do PGM, como a que a pressão local pode normalizar o comprimento do sarcômero pelo resultado da hiperemia no local da compressão ou por um mecanismo de re exo espinhal que alivia o espasmo muscular (7,15). Há diversas variantes da técnica na quantidade de pressão e tempo Ter Man. 2011; 9(46):937-942 empregado (7,16), sendo mais e cazes nos PGMs localizados nos ventres musculares (10) e nos músculos que não são adequado utilizar o spray e o alongamento, nos que são relativamente nos ou estão sobre ossos (6). Ainda há questionamentos em relação a duração da CI, pois Fryer e Hodgson(16) obtiveram resultados positivos utilizando a CI por 60 segundos, Aguilera et al.(4) e Peñas et al. (7) por 90 segundos, porém Hou et al. (6) comparam a amplitude de movimento e a sensibilidade dolorosa pressórica utilizando CI de 30, 60 e 90 segundos e concluiram que a técnica de 90 segundos apresentou alterações bené cas mais signi cantes. Já Simons et al. (10) a rmam que não é indicado a CI nos PGMs, pois já estão hipóxicos e propõe o uso de uma técnica mais suave conhecida como liberação por pressão manual (LPM) do PGM , que emprega o conceito de liberação das barreiras, consistindo em aplicar pressão suave sobre o músculo tenso e aumentar a pressão conforme a tensão é liberada (10,12,17). Alguns estudos sugerem que a LPM é e caz no tratamento da SDM (16), porém, Gemmell et al. (17) não encontraram diferença signi cativa na dor e na amplitude de movimento entre técnicas de CI. Uma das variantes CI é a técnica de liberação posicional (TLP), que envolve a digitopressão de 90 segundos e a aproximação da origem e inserção do músculo tratado, ocorrendo o alívio da tensão e a diminuição da ativação do fuso neuromuscular e, conseqüentemente, o relaxamento muscular a partir da liberaçãodas ligações cruzadas colagenosas e da ruptura das ligações eletroquímicas (10,18-20). Há ainda outras diversi cações da TLP, porém a principal no tratamento do PGM é a de tensão e contratensão de Jones, sendo que Moral e Barrero (12) aconselharam usá-la em combinação com outras modalidades terapêuticas. Meseguer et al. (19), García e Sedín (20) e García et al. (21) relataram diminuição imediata da dor em pontos sensível e em PGM utilizando essa técnica, demonstrando ser e caz no tratamento da SDM. Massoterapia A massagem atua como forma de alongamento local, aumentando a mobilidade, a circulação sanguínea e diminuindo a tensão subcutânea. As técnicas de massagem mais utilizadas são o amassamento (alongamento multidirecional das zonas de PGM), a vibração e a fricção longitudinal profunda aplicada desde o PGM até os extremos do músculo (7,8,22). Alguns tipos de massagem super cial são utilizadas para o relaxamento geral sendo aplicadas na área da dor, não promovendo alívio duradouro pela pressão ser insu ciente para liberar o PGM e as adesões, porém as profundas podem apresentar efeitos colaterais, como dor ou equimose quando aplicado especi camente no PGM, assim, a combinação das massagens super cial e profunda tem mostrado mais efetiva, sendo recomendado iniciar com uma técnica super cial para tornar o tecido mais elástico e quando a área estiver menos sensível aumentar progressivamente a pressão (23). Buttagat et al. (24) utilizou a thai massagem que é Ter Man. 2011; 9(46):937-942 uma técnica profunda por 30 minutos em pacientes com lombalgia e concluiu que houve melhora da exibilidade, tensão muscular e dor miofascial. Técnicas de energia muscular A técnica de energia muscular (ME) também é conhecida como contrai relaxa, relaxamento pós, e envolve uma contração sem dor de 10% a 25% da força máxima mantida por 3 a 10 segundos e em seguida há o alongamento suave passivo ou ativo com o paciente relaxado por completo, realizando a repetição das séries até haver a amplitude de movimento completa sem dor e inativação dos PGMs (10,11,22,25-27). Essa técnica pode ter a e cácia aumentada com o uso da respiração coordenada e movimentos oculares, que aumentam o re exo de relaxamento (10). O mecanismo exato pelo qual há o aumento da exibilidade muscular ainda não é claro, envolvendo provavelmente mecanismos neuro siológicos (incluindo a tolerância ao alongamento) e fatores mecânicos (alterações viscoelástica e plástica dos elementos do tecido conectivo) (26). Estudos comprovam o aumento do alongamento muscular e na ADM utilizando a ME (25,28). Ainda, Escobar et al. (22) relataram melhora imediata na dor dos PGM latentes utilizando ME, porém a e cácia foi limitada 24 horas após o procedimento. Ainda há divergências sobre a quantidade de força, tempo e séries são mais adequados, por exemplo, Smith e Fryer (26) comparam a técnica de ME utilizando 3 ou 30 segundos de alongamento e concluíram que não houve diferença entre elas. Manipulação thrust de alta velocidade e baixa amplitude Manipulação thrust de alta velocidade e baixa amplitude (HVLA) é uma técnica manual que envolve o uso de impulso rápido, porém sem força, geralmente associado a um som audível característico, promovendo aumento da mobilidade articular e do limiar de dor em curto prazo, sendo que o mecanismo pelo qual é produzido é largamente especulativo, envolvendo a teoria das comportas, onde os mecanoreceptores mielinizados de largo diâmetro modula e inibi os nociceptores de pequeno calibre a nível medular, redução da efusão articular zigoapo sária e edema periarticular pela melhora da drenagem intra-articular, ou alongamento das cápsulas articulares zigoapo sárias melhorando a mobilidade articular (27). Possivelmente o aumento da tensão da banda muscular e a facilitação da atividade motora podem manter um estresse articular promovendo uma disfunção, porém a aferência sensorial da articulação em disfunção pode re examente ativar um PGM (9). Sáez et al.9 utilizaram a manipulação HVLA de C3 em sujeitos com PGM latente na região do trapézio, já Hains e Hains (29) associaram a CI com a manipulação HVLA e ambos concluíram haver alterações na sensibilidade dolorosa miofascial dos PGM. Liberação Miofascial Liberação Miofascial (LMF) é uma técnica manual suave que facilita estiramento da fáscia restrita, envolvendo pressão lenta e sustentada de 90 a 120 segundos (30,31). Ter Man. 2011; 9(46):937-942 Essa técnica é baseada em vários estudos que analisaram a matéria plástica, viscoelástico e propriedades piezoelétricas de tecido conjuntivo(30). Após o tratamento utilizando a LMF é possível observar alterações circulatórias, temperatura super cial e metabolismo, re etindo no aumento da exibilidade dos tecidos e ADM, relaxamento muscular, redução do espasmo e edema (31). No estudo realizado Kain et al.(31) foi utilizado a LMF na articulação glenoumeral gerando aumento da ADM nessa articulação. Há poucos estudos utilizando a LMF no tratamento do PGM, porém, segundo Simons et al. (10) a e cácia dessa técnica é evidente na prática clínica. DISCUSSÃO Os principais achados dessa revisão demonstram que são diversi cadas e variadas as técnicas manuais, sendo a maioria e caz no tratamento da SDM, porém há poucos trabalhos a médio e longo prazo, e que envolvem terapias combinadas. Vários métodos de tratamentos são considerados efetivos na resolução da sintomatologia dos PGMs, mas muitos mecanismos de ação são desconhecidos (1,3-5), evidenciando a necessidade de novas pesquisas para con rmar as hipóteses, esclarecer os reais efeitos das manobras, reduzir as variações das técnicas e determinar os parâmetros exatos. Além disso, é necessário con rmar a efetividade de outras manobras que ainda não foram extensivamente estudadas ou que poderiam ser utilizadas como auxílio no tratamento da SDM, por exemplo, a técnica neuro emocional, que incorpora diversos princípios que incluem psicologia comportamental cognitiva, avaliação do pulso pela medicina tradicional chinesa e técnica de feedback chamada teste muscular, com o objetivo de diminuir as respostas emocionais relacionados a estímulos traumáticos (8), a terapia crâniosacra (32) ou a osteopatia craniana (33) por elas in uenciarem o sistema nervoso autônomo, pois a disfunção característica dos PGMs é regulada pela atividade do sistema nervoso simpático (10,34), a téc- nica de inibição recíproca que através da contração de um músculo seu antagonista é re examente inibido (10), e a terapia de banda miofascial que envolve digito compressão e alongamento do músculo tratado (35). As limitações das pesquisas envolvendo técnicas manuais é a in uência que há de diversas variáveis, incluindo as diferenças entre as técnicas, manobras, habilidade manual, experiência, a quantidade de pressão e força realizada pelos terapeutas (23,36). Ainda, pelo fato do diagnóstico dos PGMs ser realizada por meio de sinais físicos, que incluem banda de tensão no músculo esquelético, ponto hipersensível na banda tensa, reconhecimento da dor pelo paciente, restrição dolorosa da amplitude de movimento, exigindo relato preciso do paciente e habilidade manual do terapeuta (1,16), que aumenta de acordo 940Tratamento da dor lombar por meio de manipulação. Ter Man. 2011; 9(46):937-942 com a capacitação e experiência do pro ssional (1,2,10,16), o que evidencia necessidade de alta criteriosidade metodológica nos trabalhos envolvendo terapias manuais. Dessa forma, Peñas et al. (5) realizaram uma revisão sistemática e concluiram que são poucos os estudos controlados randomizadosque analisam o tratamento do PGM utilizando técnicas manuais, e Bueno et al. (3) que todos os dados da sua revisão bibliográ ca indicam a necessidade de aprofundar as investigações, que seria interessante pesquisar os tratamentos frente a placebo em condições similares e também a médio e longo prazo. CONCLUSÃO Esta revisão evidencia que as técnicas manuais podem contribuir para as ações clínicas no tratamento da síndrome dolorosa miofascial. Contudo, ainda há necessidade de novas pesquisas com desenhos metodológicos mais rigoros para esclarecer algumas dúvidas que ainda existem sobre a utilização de novos procedimentos, os reais mecanismos de ação, os efeitos terapêuticos e os parâmetros mais adequados de algumas técnicas. 1.