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A3 – TEORIA LITERÁRIA Leia o trecho a seguir, retirado do conto Viagem à semente, do autor cubano Alejo Carpentier e responda a o que se pede. Transcorreram meses de luto, sombreados por um remorso cada vez maior. A princípio, a idéia de trazer uma mulher para aquele aposento se fazia quase razoável. Mas, pouco a pouco, as necessidades do corpo novo foram deslocadas por escrúpulos crescentes, que chegaram ao flagelo. Certa noite, Dom Marcial se ensangüentou as carnes com um cinturão, sentindo logo um desejo maior, mas de curta duração. Foi então quando a Marquesa voltou, uma tarde, de seu passeio pelas margens do Almendares. Os cavalos da carruagem não traziam nas crinas mais umidade que a do próprio suor. Mas, durante todo o resto do dia, dispararam coices nas tábuas do estábulo, irritados, ao parecer pela imobilidade das nuvens baixas. CARPENTIER, Alejo. Viagem à semente. Trad. de L. Portbou. Arte e Letra: estórias, Curitiba, edição H, p.50-59, dez. 2009. No trecho, é possível identificar a principal motivação que rege todo o conto. Assinale a alternativa que indica corretamente esta motivação b. Motivação estética. O trecho a seguir foi retirado do conto Kholstomér, do autor russo Liev Tolstói. Leia-o e, depois, responda ao que se pede. Compreendi muito bem o que dizia a respeito dos açoites e do cristianismo. Mas ficou completamente obscura para mim a palavra “seu”, pela qual pude deduzir que estabeleciam um vínculo a ligar-me ao chefe das cavalariças. Então, não pude compreender de modo algum em que consistiria tal vínculo. Só muito depois, quando me separaram dos demais cavalos, é que expliquei a mim mesmo o que aquilo representava. Naquela época, eu não era capaz de entender a significação do fato de ser “eu” propriedade de um homem. As palavras “meu cavalo”, referindo-se a mim, um cavalo vivo, pareciam-me tão estranhas como as palavras “minha terra”, “meu ar”, “minha água”. No entanto, elas exerceram sobre mim enorme influência. Sem cessar pensava nelas e só depois de longo contato com.os seres humanos pude explicar-me a significação que, afinal, lhes é atribuída. Querem dizer o seguinte: os homens não dirigem a vida com fatos, mas com palavras. Não os preocupa tanto a possibilidade de fazer ou deixar de fazer alguma coisa, como a de falar de objetos diferentes mediante palavras convencionais. Essas palavras que consideram muito importantes, são, sobretudo, “meu” ou “minha”, “teu” ou “tua”. Aplicam-nas a todas as espécies de coisas e de seres, inclusive à terra, aos seus semelhantes e aos cavalos. Além disto, convencionaram que uma pessoa só pode dizer “meu” a respeito de uma coisa determinada. E aquele que puder aplicar a palavra “meu” a um número maior de coisas, segundo a convenção feita, considera-se a pessoa mais feliz. Não sei por que as coisas são desse modo; mas sei que são assim. Durante muito tempo procurei compreender isso, supondo que daí viria algum proveito direto; mas verifiquei que isso não era exato. Muitas pessoas das que me chamavam “seu cavalo” nem mesmo me montavam; mas outras o faziam. Não eram elas as que me davam de comer, mas outros estranhos. Também não eram as pessoas que me faziam bem, mas os cocheiros, os veterinários e, em geral, pessoas desconhecidas. Posteriormente, quando ampliei o círculo de minhas observações, convenci-me de que o conceito de meu - e não só com relação a nós, cavalos - não tem qualquer outro fundamento além de um baixo instinto animal, que os homens chamam sentimento ou direito de propriedade. O homem diz “minha casa” mas nunca vive nela; preocupa-se só em construí-Ia e mantê-Ia. O comerciante diz “minha loja”, ou “meus tecidos”, por exemplo, mas não faz suas roupas com os melhores tecidos que vende na loja. Há pessoas que chamam “minha” uma extensão de terra e nunca a viram nem passaram por ela. Há outras que dizem serem suas certas pessoas que nunca viram nesta vida e a única relação que têm com elas consiste em causar-Ihes dano. TOLSTÓI, Liev. Kholstomér. Belo Horizonte: Suryara, 2017. Leia os itens a seguir e, tomando por base seus conhecimentos a respeito da crítica formalista russa, assinale a alternativa em que todos os itens estão corretos. I. O primeiro motivo de estranhamento a que se pode chear na leitura do excerto diz respeito ao narrador, “eu” como testemunha, que narra a fábula a partir do ponto de vista de um cavalo. II. Observa-se um processo de singularização (segundo a terminologia de Chklovski) das experiências e objetos, uma vez que estes não são chamados por seus nomes, mas sim, por descritos de uma maneira nova. III. Tomando por argumento a escolha de narrar o conto do ponto de vista de um cavalo, tem-se que a principal motivação observada nesta trama é estética. e. I, II e III. O trecho a seguir foi retirado da Revista Cult, a respeito do Formalismo Russo. Leia-o e, em seguida, leia os poemas de Sá de Miranda e Maria Teresa Horta: Texto I Antes do ensaio de Chklovski, dominava na Rússia a idéia de que fazer arte é pensar por imagens, princípio defendido pelo teórico Potebnia e incorporado pelos poetas simbolistas. Conforme esse princípio, a função da imagem é procurar semelhança entre coisas diferentes para facilitar o conhecimento. Por isso, a imagem devia ser mais simples do que aquilo que explica. Por essa perspectiva, a história dos estilos e das escolas basearse-ia no estudo das imagens características de cada autor nos diversos períodos. Contrariando essas noções, Chklovski negou a idéia da imagem como instrumento conhecido para se atingir o desconhecido, assim como demonstrou que os autores e as escolas não criam as próprias imagens. Ao contrário, as imagens são essencialmente as mesmas ao longo da história, cabendo aos períodos e aos respectivos autores apenas a seleção de velhas imagens em novas combinações. TEIXEIRA, Ivan. O formalismo russo. Cult: Fortuna Crítica 2, São Paulo, p.36-39, ago. 1998. Disponível em: <http://www.usp.br/cje/depaula/wp- content/uploads/2017/03/Ivan_Cult_Formalismo-Russo-ilovepdf- compressed.pdf>. Acesso em: 16 ago. 2019. Texto II COMIGO ME DESAVIM Comigo me desavim, Sou posto em todo perigo; Não posso viver comigo Nem posso fugir de mim. Com dor da gente fugia, Antes que esta assi crecesse: Agora já fugiria De mim, se de mim pudesse. Que meo espero ou que fim Do vão trabalho que sigo, Pois que trago a mim comigo Tamanho imigo de mim? SÁ DE MIRANDA: Comigo me desavim. Lisboa, 1595. Disponível em: <http://www.citador.pt/poemas/comigo-me-desavim-sa-de-miranda>. Acesso em 16. ago 2019. Texto III MINHA SENHORA DE MIM Comigo me desavim minha senhora de mim sem ser dor ou ser cansaço nem o corpo que disfarço Comigo me desavim minha senhora de mim nunca dizendo comigo o amigo nos meus braços Comigo me desavim minha senhora de mim recusando o que é desfeito no interior do meu peito HORTA, Maria Teresa. Minha senhora de mim. Lisboa: Futura, 1974. Tomando por base suas leituras dos poemas e do trecho em destaque, bem como seus conhecimentos a respeito da crítica formalista russa, assinale a alternativa correta em relação à formação de imagens em Sá de Miranda e Maria Teresa Horta e. No poema de Maria Teresa Horta, a imagem da alteridade em descompasso consigo mesma aparece em uma nova roupagem marcada por questões feministas. Observa-se, então, o emprego de uma imagem clássica eu x eu na poesia contemporânea Leia o trecho a seguir, retirado do romance O Conto da Aia, de Margaret Atwood. Duplicada, ando pela rua. (...) Existe a mesma ausência de pessoas, a mesma aparência de estarem adormecidas. A rua é quase como um museu, ou uma rua numa cidade modelo construída para mostrar a maneira como as pessoas costumavam viver. Como naquelas fotografias, naqueles museus, naquelas cidades modelos, não há crianças.Este é coração de Gilead, onde a guerra não pode penetrar nem se intrometer, exceto pela televisão. Onde ficam os limites não sabemos ao certo, eles variam, de acordo com os ataques e contra-ataques; mas este é o centro, onde nada se move. A República de Gilead, dizia Tia Lydia, não conhece fronteiras. Gilead está dentro de você. Houve uma época em que aqui moravam médicas, advogados, professores universitários. Não existem mais advogados, e a universidade está fechada. ATWOOD, Margaret Eleanor. O Conto da Aia. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2017. O romance, publicado em 1985, é considerado um marco da literatura em língua inglesa por, de certa forma, antecipar questões político-filosóficas que apresentariam seus reais desdobramentos mais de trinta anos depois. Tomando como base seus conhecimentos a respeito da crítica literária formalista e a sua leitura do trecho em destaque, assinale a alternativa correta. ~Resposta correta. Não apenas neste trecho, mas em toda a narração de O Conto da Aia estabelecem-se relações entre o modo comportamental das demais personagens e o espaço físico e político da República de Gilead, local onde a narração se desdobra. a. Existe uma relação de espelhamento entre o narrador personagem e a descrição dos espaços, construída sintaticamente pela dupla possibilidade de interpretação do uso da palavra “duplicada” logo no início do parágrafo. Leia o trecho a seguir, do texto Por que ler o clássicos? de Italo Calvino De fato, as leituras da juventude podem ser pouco profícuas pela impaciência, distração, inexperiência das instruções para o uso, inexperiência da vida. Podem ser (talvez ao mesmo tempo) formativas no sentido de que dão uma forma às experiências futuras, fornecendo modelos, recipientes, termos de comparação, esquemas de classificação, escalas de valores, paradigmas de beleza: todas, coisas que continuam a valer mesmo que nos recordemos pouco ou nada do livro lido na juventude. Relendo o livro na idade madura, acontece reencontrar aquelas constantes que já fazem parte de nossos mecanismos interiores e cuja origem havíamos esquecido. Existe uma força particular da obra que consegue fazer-se esquecer enquanto tal, mas que deixa sua semente. CALVINO, Italo. Por que ler os clássicos. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. A respeito do excerto apresentado, assinale a alternativa correta a respeito da visão de leitura e livros clássicos do autor. c. Segundo a concepção de Calvino, uma obra clássica é aquela que pode servir como base na formação de caráter de quem a lê, principalmente durante a juventude. O romance Os Noivos, de Alessandro Manzoni é considerado um marco na literatura italiana. A obra foi tão influente que ditou por séculos a forma que o romance, na Itália, deveria seguir. O trecho a seguir foi retirado da Introdução do romance. Leia-o e responda ao que se pede a seguir. “Mas quando findar este meu trabalho heroico de transcrever esta história de um manuscrito desbotado e meio rasgado, e a trouxer, como se costuma dizer, à luz do dia, achar-se-á depois quem se dê ao trabalho de a ler?” Esta reflexão dubitativa, nascida do esforço de decifrar um rabisco que vinha logo a seguir à palavra acidentes, fez-me suspender a cópia e pensar com maior seriedade no que conviria mais fazer. “É bem verdade - disse para comigo, folheando o manuscrito -, é bem verdade que tal saraivada de floreados e de figuras de estilo não continua assim a fio ao longo de toda a obra. (...) Na verdade, não é coisa que se apresente aos leitores de hoje: estes já estão demasiado fartos, demasiado enfadados com tal género de extravagâncias. Ainda bem que tive esta boa ideia logo ao princípio de tão infeliz trabalho: e daí lavo as minhas mãos”. Contudo, no momento de fechar o cartapácio para o arrumar, custava-me que uma história tão bela tivesse, no entanto, de ficar desconhecida; porque, enquanto história, pode acontecer que ao leitor não o pareça, mas na minha opinião era bela, ou melhor dizendo: muito bela. “Por que razão - pensei - é que não se poderia pegar na série dos factos deste manuscrito e refazer-lhe a linguagem?’ Não se tendo apresentado nenhuma objeção razoável, tal partido foi logo abraçado. E eis aqui a origem do presente livro, exposta com uma ingenuidade que corresponde à importância do próprio livro.” MANZONI, Alessandro (1827). Os Noivos. São Paulo: Paulinas Editora, 2015. Tradução de José Colaço Barreiros. Com base no que se pode depreender da Introdução ao romance, assinale a alternativa que demonstra adequadamente qual é a principal motivação deste trecho. b. Motivação realista. Mayombe é um romance escrito pelo autor angolano Pepetela - pseudônimo de Artur Carlos Mauricio Pestana dos Santos - e publicado em 1980. “O Comissário apertou-lhe mais a mão, querendo transmitir-lhe o sopro de vida. Mas a vida de Sem Medo esvaía-se para o solo do Mayombe, misturando- se às folhas em decomposição. (...) A amoreira gigante à sua frente. O tronco destaca-se do sincretismo da mata, mas se eu percorrer com os olhos o tronco para cima, a folhagem dele mistura-se à folhagem geral e é de novo o sincretismo. Só o tronco se destaca, se individualiza. Tal é o Mayombe, os gigantes só o são em parte, ao nível do tronco, o resto confunde-se na massa. Tal o homem. As impressões visuais são menos nítidas e a mancha verde predominante faz esbater progressivamente a claridade do tronco da amoreira gigante. As manchas verdes são cada vez mais sobrepostas, mas, num sobressalto, o tronco da amoreira ainda se afirma, debatendo-se. Tal é a vida. E que faz o rosto do mecânico ali no tronco da amoreira! Sorri para mim. Os olhos de Sem Medo ficaram abertos, contemplando o tronco já invisível do gigante que para sempre desaparecera no seu elemento verde. O Comissário estremeceu com o estrondo do obus a menos de cinquenta metros. Os homens resmungaram e fizeram um gesto de avançar. O Comissário enfrentou-os, a AKA em posição de fogo, os olhos fulgurando. — Não compreendem que ele morreu? Ele morreu! Sem Medo morreu! Não compreendem que ele morreu? Sem Medo morreu!” PEPETELA., Mayombe. 5. ed. Lisboa: Dom Quixote, 1980. Levando em consideração os aspectos da crítica formalista russa, leia o trecho a seguir e assinale a alternativa correta. b. Analisando-se a escolha dos tempos verbais no trecho em destaque, é possível observar que em “a vida de Sem Medo esvaía-se para o solo do Mayombe” o uso do verbo flexionado em um tempo imperfectivo prolonga a ação, criando uma imagem de fluxo contínuo em contraposição às escolhas verbais no próximo parágrafo, todas perfectivas, indicando, além disso, a passagem da onisciência múltipla. A canção a seguir foi gravada em 1976 pelo sambista Cartola e é considerada um clássico da MPB, tendo sido regravada por grandes nomes da música brasileira como Cazuza, Beth Carvalho e Ney Matogrosso. Ainda é cedo, amor Mal começaste a conhecer a vida Já anuncias a hora de partida Sem saber mesmo o rumo que irás tomar Preste atenção, querida Embora eu saiba que estás resolvida Em cada esquina cai um pouco a tua vida Em pouco tempo não serás mais o que és Ouça-me bem, amor Preste atenção, o mundo é um moinho Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho Vai reduzir as ilusões a pó Muita atenção, querida De cada amor tu herdarás só o cinismo Quando notares estás à beira do abismo Abismo que cavaste com os teus pés O MUNDO É UM MOINHO: Cartola. Cartola. Disponível em: <https://www.letras.mus.br/cartola/44901/>. Acesso em: 16 ago. 2019. Tendo como base seus conhecimentos a respeito das contribuições do formalismo russo para a crítica literária, bem como a contribuição de um de seus precursores, Roman Jakobson, assinale a alternativa em que as características de literariedade, na canção, estão descritas adequadamente.e. Está no uso da metáfora do mundo como um moinho.
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