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Teoria da norma jurídico-penal

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DESCRIÇÃO
A norma penal, suas espécies, características, fontes, formas de interpretação e sua
aplicabilidade no tempo e espaço.
PROPÓSITO
Compreender as características da lei penal, para obter conhecimento sobre o que lhes
constitui e sobre a forma como devem ser interpretadas e quando (tempo) e onde (espaço) são
aplicáveis é fundamental para atuar no sistema de justiça criminal e, especialmente, para
resolver situações de conflitos entre normas.
PREPARAÇÃO
Antes de iniciar a leitura deste conteúdo, tenha em mãos a Constituição, o Código Penal (CP) e
Leis Penais extravagantes indicadas, tais como: Lei 7.716/89, Lei 9.455/97, Lei 11.346/06, Lei
13.964/2019 e Decreto 56.435/65.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Reconhecer as características gerais das normas penais, suas espécies, fontes e técnicas de
interpretação e integração
MÓDULO 2
Identificar a aplicabilidade no tempo da lei penal e os princípios regentes
MÓDULO 3
Definir a aplicação da lei penal no espaço
INTRODUÇÃO
Neste material, estudaremos a norma penal, que é o objeto de estudo próprio da dogmática
das ciências criminais. Vamos conhecer suas características, espécies, fontes, refletir sobre
como são estruturadas e debater o que rege a sua aplicabilidade no tempo e espaço.
Considerando o caráter essencial dessas matérias, justamente porque as leis penais são
nosso centro de estudo em Direito Penal, é que refutamos ser ainda mais importante
dispensar especial atenção a essas lições.
MÓDULO 1
 Reconhecer as características gerais das normas penais, suas espécies, fontes e
técnicas de interpretação e integração
CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Em todo estudo das disciplinas que são dogmáticas, torna-se fundamental conhecer seu
objeto por excelência: as normas. Logicamente, no caso das ciências criminais, nossa atenção
deverá se concentrar sobre as normas de conteúdo jurídico-penal, que são nossa fonte formal
imediata.
Lembrando que, como somente as leis podem criar crimes e cominar penas, dado o princípio
da reserva legal (inciso XXXIX do art. 5º da Constituição Federal e o art. 1º do Código Penal),
são as leis penais que representam o limite básico de atuação do Estado no que concerne ao
exercício do seu poder punitivo.
Quer dizer, por mais reprovável que seja, socialmente, uma conduta, se não houver uma lei
proibindo-a, não caberá qualquer responsabilização penal caso seja praticada. Por isso,
podemos dizer que as leis penais ditarão como várias outras matérias serão recebidas em
nosso curso de Direito Penal, em que vamos nos dedicar a refletir sobre o que cada elemento
que nela esteja contido significa.
Dito isso, passamos para a explicação por partes do nosso conteúdo:
Apresentando as espécies de norma penal

Depois, as suas características e fontes

Exporemos as técnicas de interpretação e integração
ESPÉCIES DE NORMAS PENAIS
Há três espécies de normas penais:
Incriminadoras
Permissivas
Explicativas
NORMAS PENAIS INCRIMINADORAS
As normas penais incriminadoras criam crimes, ou seja, definem as infrações penais, e
cominam as respectivas penas. Elas estão previstas na parte especial do Código Penal e na
legislação extravagante e, por serem as normas por excelência em nosso campo, também são
chamadas de normas penais em sentido estrito, proibitivas ou mandamentais. Elas
necessariamente são estruturadas em duas partes: a do preceito primário e do preceito
secundário.
No preceito primário de uma norma penal incriminadora, o legislador prevê aquilo o que
chamamos de conduta típica, detalhando os elementos necessários para que uma conduta seja
considerada criminosa. Ali encontraremos cada um dos requisitos para que um fato possa ser
considerado crime, como no caso do crime de lesão corporal, que prevê “Ofender a integridade
corporal ou a saúde de outrem” (CÓDIGO PENAL, art. 129).
No preceito secundário, encontraremos a consequência da prática da conduta descrita no
preceito primário, isto é, qual a sanção penal aplicável caso os elementos do preceito anterior
sejam demonstrados. No mesmo exemplo citado, do crime de lesão corporal, temos a seguinte
redação “Pena - detenção, de três meses a um ano” (CÓDIGO PENAL, art. 129).
Assim, em síntese, uma pessoa, ao praticar a conduta descrita no preceito primário de um
crime, previsto no Código Penal ou na legislação especial, terá como consequência a aplicação
da pena também nele prevista, em seu preceito secundário. E é desse total que se constitui a
norma penal incriminadora em sua plenitude.
NORMAS PENAIS PERMISSIVAS
Voltando às espécies de norma penais, além das incriminadoras, podemos ter também as
normas penais permissivas. Elas têm o condão de afastar o caráter criminoso de uma
conduta que poderia ter a aparência de infração penal.
Imagine que uma pessoa tenha agredido fisicamente outra. Nesse caso, realmente ela
pareceria ter “ofendido a integridade corporal ou a saúde de outrem” e, portanto, violado o art.
129 do Código Penal que mencionamos antes.
Mas imagine que essa agressão tenha se dado em legítima defesa; ou então a pessoa estava
sendo irresistivelmente coagida a fazê-lo. Pense na hipótese de que uma terceira pessoa lhe
estivesse ameaçando de morte. Ela não deixaria de ter ofendido a integridade de outra pessoa,
fato incontestável, mas o fizera de modo “justificável”, certo? Foi pensando nesse conjunto de
hipóteses que o legislador criou as normas penais permissivas, que têm o potencial de
transformar uma suposta infração penal, satisfeitas as suas próprias condições, em uma
conduta “permitida”.
As normas penais permissivas se subdividem em duas subespécies: justificantes e
exculpantes, diferenciando-se em relação ao momento em que incidem.
 COMENTÁRIO
Você provavelmente ainda não conhece essa condição, mas vamos adiantar que, para que
uma conduta seja considerada criminosa, ela precisa ser típica, antijurídica e culpável (fique
tranquilo pois oportunamente você estudará cada um desses elementos).
São três fases de análise de um fato e todas elas devem estar satisfeitas para que impliquem
na resposta criminal. Sem detalhar cada uma delas, o que nos importa aqui dizer é que:
As normas penais permissivas justificantes são as que afastam a ilicitude (antijuridicidade)
da conduta do agente, incidindo na segunda fase mencionada. São exemplos aquelas previstas
nos arts. 23, 24 e 25 do Código Penal, como no caso que citamos, que opera a legítima defesa.

Já as normas penais permissivas exculpantes destinam-se a eliminar a culpabilidade
(terceira fase) isentando o agente de pena, como nos casos dos arts. 26, caput, e 28, §1º, do
Código Penal.
Ambas, justificantes e exculpantes, têm o condão de sobrepor-se à proibição a ponto de excluir
a possibilidade da resposta criminal pela prática de uma conduta, já que embora típica, estaria
justificada por uma causa de exclusão ou isenção de responsabilidade.
NORMAS PENAIS EXPLICATIVAS
São as normas penais explicativas, também chamadas de complementares, que
esclarecem o conteúdo de outras normas ou limitam o âmbito de sua aplicação.
Vamos a um exemplo: você já deve ter ouvido falar do crime de violação de domicílio, que
está previsto no art. 150 do Código Penal sob as seguintes condições: “Entrar ou permanecer,
clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em
casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.” (grifo
nosso).
MAS SERÁ QUE A ENTRADA EM QUALQUER
PROPRIEDADE PRIVADA CONSTITUI ESSE CRIME?
RESPOSTA
Na verdade, não, posto que o legislador expressamente limitou-se aos casos, para fins de
configuração deste ilícito, da entrada em casa.
QUAL SERIA, ENTÃO, A DEFINIÇÃO DESSE
ELEMENTO PARA QUE SE POSSA ENSEJAR A
RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL? USAMOS QUE TIPO
DE CRITÉRIO DE DEFINIÇÃO? PODEMOS IMPORTAR,
SIMPLESMENTE, ALGUM CONCEITO DE OUTRA ÁREA,
COMO DO DOMICÍLIO CIVIL?
RESPOSTA
Não, jamais olvidem do princípio da legalidade.
javascript:void(0)
javascript:void(0)Então, no caso específico desse crime, o legislador mesmo decidiu, nos §§4º e 5º do art. 150
do Código Penal, esclarecer o que está e o que não está contido no significado daquela
palavra:
§4º - A EXPRESSÃO "CASA" COMPREENDE:
I - QUALQUER COMPARTIMENTO HABITADO;
II - APOSENTO OCUPADO DE HABITAÇÃO COLETIVA;
III - COMPARTIMENTO NÃO ABERTO AO PÚBLICO,
ONDE ALGUÉM EXERCE PROFISSÃO OU ATIVIDADE.
§5º - NÃO SE COMPREENDEM NA EXPRESSÃO
"CASA":
I - HOSPEDARIA, ESTALAGEM OU QUALQUER OUTRA
HABITAÇÃO COLETIVA, ENQUANTO ABERTA, SALVO
A RESTRIÇÃO DO N.º II DO PARÁGRAFO ANTERIOR;
II - TAVERNA, CASA DE JOGO E OUTRAS DO MESMO
GÊNERO.
É por isso que esses parágrafos podem ser considerados como normas penais explicativas. E
já tome nota, há alguns casos em que isso pode ser feito até mesmo por um outro ato, que não
legislativo.
 EXEMPLO
É quando atos normativos do executivo assumem o condão de definir o sentido de uma
expressão empregada como elemento de um crime.
Em suma, portanto, há três espécies de normas penais: incriminadoras, permissivas
(exculpantes ou justificantes) ou explicativas. Todas elas são marcadas pelas características
básicas de toda norma penal, que passamos a expor em seguida.
CARACTERÍSTICAS
Normas penais são marcadas por algumas características que neste módulo apenas
mencionaremos, mas que voltarão a ser trabalhadas ao longo deste conteúdo. Elas são
caracterizadas pela exclusividade, já que, como visto, só a lei pode criar crimes e cominar
penas (princípio da reserva legal).
Além disso, têm como marca a anterioridade, dado que a lei penal deve ser anterior ao fato
que se pretende punir – conforme veremos no módulo Lei penal no tempo –, e, ainda, a
impessoalidade, pois projeta seus efeitos para fatos futuros, podendo, em regra, atingir
qualquer pessoa que venha a praticá-los – como veremos no tópico Lei penal e os sujeitos.
Correlata a essa, e quase que com ela confundindo-se, está a generalidade, pelo fato de
dirigir-se indistintamente a todas as pessoas. Por fim, normas penais são caracterizadas pela
imperatividade, uma vez que o seu descumprimento tem como efeito a aplicação de uma
sanção legalmente prevista (preceito secundário).
Conhecidas, então, estrutura, espécies e características das leis penais, podemos passar para
o tópico seguinte, em que descobriremos quais as fontes das normas.
AS NORMAS PENAIS
A especialista Luciana Fernandes aprofundará, no vídeo a seguir, o conceito das espécies de
normas penais e suas características.
FONTES
Ao estudar as fontes das normas penais, queremos descobrir de onde emanam. Por isso,
passamos a investigar que sujeitos foram responsáveis pela sua previsão e quais as suas
referências de conhecimento.
Começando pelo segundo item, que dá conhecimento às normas, a primeira fonte formal
imediata é a própria lei penal, aí incluídas as normas que estão no Código Penal e na
legislação extravagante. Isso decorre, como você já sabe, do princípio da legalidade (art. 5º,
inciso II e XXXIX), dado que apenas a lei pode criar infrações penais.
Embora pareça redundante, é necessário frisar o papel dessa fonte, já que o legislador, ao criar
uma norma, irá voltar-se a todo arcabouço de leis penais pré-existentes para dali poder
responder a perguntas como:
“Essa conduta já foi criminalizada?”
“A pena cominada é proporcional a outra conduta parecida?”
“É razoável a incriminação, considerando o estágio de proteção do bem jurídico afetado?”
Assim é que determinamos como o próprio estado jurídico normativo impacta – e por isso serve
como fonte – na atividade criativa das leis penais.
Também como espécie de fonte formal, temos a Constituição. Em um Estado Democrático de
Direito, a Carta Constitucional impõe que, tanto a redação (forma e conceitos trazidos pelas leis
jurídico-penais) quanto a interpretação estejam em harmonia com a sistemática constitucional.
A matriz que emerge da Constituição é limite e possibilidade de existência de qualquer norma
penal, emplacando o fato de que todo dispositivo que violá-la estará sujeito à revisão (controle
de constitucionalidade) pelos nossos Tribunais. Por isso, é sem dúvida nenhuma uma das
suas principais e mais importantes fontes.
Um exemplo prático emana do art. 5º, XLII, da CRFB/88, que dispõe: “A prática do racismo
constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”. A Lei
7.716/89, nesse sentido, surgiu em decorrência desse mandado constitucional, sendo aí
atravessada em sua totalidade pelo comando constitucional.
Outros exemplos de fontes formais imediatas são os tratados e convenções internacionais
de direitos humanos, que impõem disciplinas e inspiram formas de interpretação das normas
penais.
Veja o seguinte exemplo: em razão dos diversos tratados de vedação à tortura que o Brasil se
tornou signatário, tais como a Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas
cruéis, desumanos ou degradantes (1984), temos não só um dispositivo constitucional que
veda o seu emprego (art. 5º, III, CRFB/88), como também uma lei penal que prevê as diversas
formas de responsabilização criminal que qualquer prática nesse sentido estará sujeita (Lei
9.455/97).
Outro exemplo de fonte formal são os complementos normativos, que apontam o sentido de
um conceito trazido por uma norma penal. Agora você já sabe que aqui estamos falando de
uma norma penal explicativa e estará lembrado que o complemento pode advir de outra
esfera de poder, funcionando muitas vezes como requisito fundamental para a implementação
de um tipo.
É o caso da Portaria 344 da Anvisa, que tem sido atualizada constantemente e cumpre o papel
de informar o que são drogas, para fins de aplicação da Lei 11.346/06 – conhecida como Lei
de drogas.
Outras espécies dessas fontes são:
JURISPRUDÊNCIA
Jurisprudência como conjunto de entendimentos dos Tribunais, informando a forma como
dispositivos são aplicados ao longo do tempo.
PRINCÍPIOS
Estes serão estudados à frente. Alguns autores os classificam como fontes formais mediatas.
 COMENTÁRIO
Produções teóricas sobre a nossa disciplina, constantes de livros, artigos científicos, entre
outros, são referidos comumente como “doutrina” e são fonte das normas, agora classificadas
como formal mediata.
Outra espécie de fonte são os costumes, como normas de comportamento culturalmente
localizadas e que irão impactar diretamente no que se refere a consideração de determinadas
práticas como criminosas.
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É o caso do adultério, por exemplo, que foi crime previsto até 2005 e, na prática, apenas
atingia a mulheres. Ao longo do tempo, e da revisão sobre como o machismo informava esse
crime, essa deixou de ser uma prática afeta a responsabilidade criminal.
 ATENÇÃO
Mas vejam o seguinte: um costume jamais poderá substituir a lei penal para criminalizar, por si
só, condutas. Não se esqueça que, nesse caso, apenas a lei pode fazê-lo.
Agora que já conhecemos o que pode inspirar seu conteúdo, podemos discorrer sobre o órgão
produtor das normas penais, também nomeadas como fontes de produção ou substanciais.
No caso do Direito Penal, segundo o art. 22, I, da CRFB/88, a fonte material é a União.
Sendo assim, anote esta característica da lei penal brasileira: ela é sempre Federal. Isso nos
difere de outros países que contemplam a possibilidade de estados terem autonomia para
disporem livremente sobre crimes, como nos EUA.
O constituinte brasileiro trouxe apenas uma hipótese excepcional, no parágrafo único daquele
dispositivo, permitindo que, através de lei complementar que autorize, estados-membros
legislem sobre questões específicas. Mas veja: essa é uma disposição que jamais, em toda
nossa história, foi efetivada.
Agora que já sabemos como a norma penal se apresenta e o que lhe informa, passamos a um
último momento, em que vamos pensar sobre quais as técnicas de interpretação e integração
que a ela são aplicáveis.
INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DA LEI
PENAL
Começaremoseste tópico com um exercício de imaginação.
Imagine que você se depare, estudando esta disciplina, com uma norma penal que possui um
termo bastante amplo em sua redação.
Você fica se perguntando sobre a imensidade de fatos que estariam contemplados por ela, mas
incerto sobre o que efetivamente deveria ser considerado uma lesão “criminosa”.
Imagine, ainda, que em um mesmo título, no qual há vários crimes protegendo um mesmo
bem, o legislador tenha silenciado sobre uma conduta que em outros dispositivos houvera
criminalizado.
Como você deve, então, proceder à sua interpretação? E como integrá-la ao ordenamento?
É isso que estudaremos nos dois momentos seguintes.
INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL
Quando falamos de interpretação da norma penal estamos nos referindo ao estudo dos
instrumentos que podem auxiliar na determinação do significado de uma expressão ou de uma
palavra, servindo para delimitar o alcance da lei. E veja como isto é fulcral para a
implementação de um sistema de garantias no campo das ciências criminais, já que o Direito
Penal deve ser regido pela taxatividade da norma penal.
Há algumas espécies de interpretação possíveis, e que vamos apresentar explicando os
grupos em que estão contidas.
Em primeiro lugar, a interpretação pode ser classificada em função da origem, isto é, do
órgão/entidade que a interpreta. Nesse caso, podemos estar diante de uma interpretação
autêntica (ou legislativa), quando a própria lei trouxer a forma “correta” de interpretação –
como explicamos com o §4º do art. 129 ou, para trazer um outro exemplo de interpretação
autêntica, o do art. 327, ambos do Código Penal. A interpretação autêntica pode ser
subdividida quanto ao momento, caso em que pode ser nomeada como contextual, quando o
dispositivo surge com a própria lei penal que o constitui; ou posterior, quando o objeto da
interpretação for incorporado ao ordenamento em momento que precede a edição da norma
que demanda ser interpretada.
Um segundo caso de interpretação quanto à origem é a doutrinária, aqui sendo responsável
por determinar o sentido da norma àquelas pessoas que sejam teóricas, estudiosas do Direito
Penal. Nós mesmos estamos fazendo isso, constantemente, neste material.
O terceiro e último caso é o da interpretação jurisprudencial (ou judicial), que nos fala sobre
o papel que os Tribunais têm de dar um significado às leis, função que cada vez mais vem
sendo protagonizada pelas nossas cortes. Então, veja, quando não sabemos como interpretar
um termo de um dispositivo penal, podemos pesquisar como juízes vêm entendendo o caso.
OUTRO EXEMPLO DE INTERPRETAÇÃO
AUTÊNTICA
Há todo um título de crimes no nosso Código Penal que demandam uma qualidade específica
de seus autores: que sejam funcionários públicos. Mas o que significa essa qualidade? A
própria lei definiu, explicando quem pode ser agente de todas as infrações daquele grupo,
conforme encontramos no artigo 327 do Código Penal.
São inúmeros os exemplos possíveis de serem mencionados, e um deles está na ADPF 442,
caso em que o STF vem julgando se as hipóteses de crime de aborto são ou não
constitucionais; e, se forem, se deve-se considerar outros casos, além das disposições já
incluídas no Código Penal, como exceções descriminantes.
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Outro exemplo está nas Súmulas, que nada mais são que entendimentos consolidados pelos
nossos Tribunais que ganham a forma de um enunciado.
Quanto ao modo, a interpretação pode ser:
Gramatical ou literal, quando considerar o sentido expresso, explícito, dos termos contidos na
norma penal, uma função muito basilar ao amparo do princípio da legalidade.
Teleológica, quando a interpretação buscar considerar a vontade da lei, ou seja, quando se
investigar qual seria o próprio fundamento de existência da norma e assim o seu sentido. Uma
observação importa aqui: vontade da lei não se confunde, necessariamente, com a vontade do
legislador que lhe propôs (voluntas legislatoris).
Histórico, quando se perquire o contexto histórico em que esteve inscrita a lei, de modo a
compreender o que interpelava a sociedade no momento da sua edição.
Sistemática (ou sistêmica), em que se considera a lei como parte de um coletivo,
demandando que a lei esteja, com o conjunto de disposições ao qual faz parte (sistema), em
coesão e coerência.
Progressiva (adaptativa), quando se observa o contexto atual da aplicação da lei, que muitas
vezes transcende ao de sua edição, e se demanda que os elementos nela contidos possam
fazer sentido na contemporaneidade.
Outro grupo de classificação das interpretações é quanto ao resultado:
Havendo a interpretação restritiva, quando se reduz o alcance da norma, através de um
entendimento mais limitado dos seus termos.
Ou extensiva, quando se entende cabível ampliar o alcance dos seus termos, assim atribuindo
um maior espectro de incidência à lei. É preciso mencionar que, em virtude do princípio da
legalidade, essa última é, em regra, descabida para as normas penais incriminadoras,
sobretudo quando implicarem em um prejuízo à pessoa acusada.
Por fim, vale mencionar a interpretação conforme a Constituição, método a partir do qual se
verifica a compatibilidade da lei penal com a sistemática da Constituição. Essa é talvez uma
das técnicas mais importantes para a implementação de um sistema jurídico-penal
democrático, já que afere a sintonia de uma lei com a Carta Constitucional (GRECO, 2017, p.
121).
INTEGRAÇÃO DA LEI PENAL
Os casos que visitamos nos itens anteriores, referentes às modalidades de interpretação, falam
de hipóteses em que há uma norma e uma dúvida quanto ao sentido de um termo constante de
seu conteúdo. Diferente é a hipótese em que não há uma lei propriamente aplicável a um caso
concreto, havendo um “vazio legislativo”, também chamado de “lacuna legislativa”, em que se
demanda criar uma norma a partir de outra.
 RELEMBRANDO
Nas disciplinas introdutórias ao estudo das ciências jurídicas em geral, aprendemos que a
analogia é a forma como se resolve essas questões, implicando na necessidade de se
socorrer de um outro dispositivo, existente e referente a uma situação similar, tornando-o
aplicável ao caso sem socorro.
Como voltaremos a expor no tópico sobre princípios deste conteúdo, a analogia é, em regra,
vedada no campo das ciências criminais em virtude do princípio da reserva legal que tanto
temos citado. No entanto, trata-se de uma garantia da pessoa e, por isso, quando a analogia
for a ela favorável, ela torna-se possível.
Com isso, queremos dizer: jamais será empregada a analogia, por exemplo, para incriminar
condutas que não tenham sido explicitamente consideradas como criminosas, caso em que
incorreria em prejuízo para a pessoa socorrida pelo princípio da legalidade; porém, caso haja
uma dúvida quanto ao espectro de incidência, vamos supor, de uma excludente de ilicitude ou
de culpabilidade, que citamos anteriormente no material, há a anulação da responsabilização,
então pode ser empregada a analogia.
Por exemplo, existe uma causa de exclusão da responsabilidade para os crimes patrimoniais
não violentos em nosso Código Penal, constantes do art. 181, I, e 183, para os “cônjuges”
(referente a pessoas que sejam civilmente casadas). Estaria o “companheiro” (referente a
situação de fato da união estável) também abrangido pelo dispositivo, podendo beneficiar-se do
dispositivo para eximir-se da resposta penal, supridas as demais condições legais? A lei
silencia sobre o caso do “companheiro”, tratando-se de uma lacuna, que demanda o exercício
da “integração” (não interpretação). E, veja, a analogia, aqui, se empregada, seria em benefício
à pessoa acusada (in bonan partem). Por isso é, sim, possível fazer essa aproximação.
Uma última ressalva deve ser feita neste tópico:
Analogia, que descrevemos anteriormente, não se confunde com interpretação analógica.
Nessa última, há uma norma, redigida em termos genéricos, que indicam que situações
similares à algumas que estejamna mesma linha de inscrição que as demais antecedentes
podem ser abrangidas pela norma penal.
 EXEMPLO
Uma das hipóteses de homicídio qualificado é quando o assassinato ocorre por meio de “outro
meio que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido” (art. 121, §2º, IV, CP). A
“emboscada, dissimulação e a traição”, que vêm antes nesse mesmo inciso, são fórmulas
casuísticas que demonstram ataques que são dirigidos quando a vítima não espera ser
surpreendida. O “outro recurso”, assim, é uma cláusula genérica que, pela interpretação
analógica, precisa se inscrever na lógica dos anteriores expressamente previstos.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 2
 Identificar a aplicabilidade no tempo da lei penal e os princípios regentes
PRINCÍPIOS
Até o presente momento, estivemos nos referindo ao princípio da legalidade penal, previsto no
inciso XXXIX do art. 5º da CRFB/88 e art. 1º do Código Penal, na sua acepção mais geral, isto
é, a de que “não se fala na existência de crime se não houver uma lei definindo-o como tal”
(GRECO, 2017, p. 174). Esse princípio atribui segurança jurídica à nossa sociedade,
assentando que ninguém será responsabilizado criminalmente se não houver uma previsão
legal criando um tipo incriminador.
Mas como esse preceito impacta de maneira mais direta na estrutura da lei penal e como ele
pode nos ajudar a resolver situações que envolvam conflitos de normas penais no tempo?
É para refletir sobre essas questões que vamos apresentar o conteúdo mais completo deste
princípio. A legalidade tem quatro efeitos imediatos, dois inclusive já tratados neste módulo.
São eles:
 A proibição da criação de crimes e penas pelos costumes;
 A proibição do emprego de analogia para criar crimes, fundamentar ou agravar penas.
Ambos decorrem da regra referida em latim como nullum crimen nulla poena sine lege scripta,
que nos informa que não há crime sem uma lei escrita.

Além disso, o princípio da legalidade também impõe que as leis penais precisam ser certas, ou
seja, precisam ser redigidas de forma clara e precisa (nullum crimen nulla poena sine lege
certa). Assim, como terceiro efeito, proíbe incriminações vagas e indeterminadas, tornando
impositiva a obrigação da norma penal ser taxativa.
O último efeito é o que mais importa para este módulo, versando sobre a proibição da
retroatividade da lei penal mais gravosa (nullum crimen nulla poena sine lege praevia). Aqui,
falamos que a lei penal precisa preexistir para que possa surtir os seus efeitos criminalizantes.

Nessa acepção, o princípio da legalidade dá ensejo a um outro, o da irretroatividade da lei
penal, que está em íntima relação com aquilo que sustenta o primeiro, a proteção que cada
indivíduo deve ter contra os arbítrios do poder punitivo do Estado. Trata-se aqui do corolário do
princípio da anterioridade da lei penal, que nos informa que a norma penal só tem
aplicabilidade em um caso concreto na hipótese em que esteja em vigor quando da prática da
conduta.
 COMENTÁRIO
Nós falaremos um pouco mais sobre isso no próximo tópico, mas já perceba o enorme
problema que teríamos caso fosse possível que a burocracia estatal pudesse arbitrariamente
criar um tipo penal ou uma espécie de sanção casuisticamente a fim de submeter ao poder
estatal uma determinada pessoa de modo distinto. Aí reside o potencial garantidor desta
disciplina e o nosso interesse em vê-la sempre prestigiada.
Esse assunto nos leva a tematizar um outro conjunto de casos, regidos pelo conhecido
princípio da retroatividade da lei mais benigna.
Imagine o seguinte caso:
Uma pessoa, na data X praticou uma determinada conduta que era tipificada – e por isso
considerada criminosa –, até então, pela L1.
Ao longo do processamento da ação penal, a L1 foi revogada pela L2, que passou a
descriminalizar – isto é, considerar irrelevante penalmente aquilo que antes era considerado
crime – a conduta praticada.
Na data da sentença, a magistrada do caso, então, depara-se com este conflito (aparente) de
normas.
QUAL LEI DEVE ELA ESCOLHER? L1, QUE REGIA A
PRÁTICA QUANDO DA CONDUTA OU A L2, QUE REGIA
O FATO QUANDO DO JULGAMENTO E TORNAVA
IMPOSSÍVEL A RESPOSTA PENAL?
RESPOSTA
Essa matéria, conhecida como conflito de direito intertemporal, é regulada pelo inciso XL do art.
5º da CRFB/88, assim redigido: “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Esse
princípio nos ensina uma técnica fundamental: para saber a norma aplicável, no conflito entre
mais de uma possivelmente incidente, deve-se investigar qual a mais favorável para o réu.
A lei penal que trouxer um benefício, seja ele qual for, para a pessoa acusada, sempre será
aplicável:
Tanto em termos retroativos, atingindo condutas que antes eram regidas por outra lei, mas
quando da decisão emergente outra norma.

Quanto ultrativos, quando estiver em vigor quando da prática, mas na aplicação já tiver sido
revogada.
É assim que podemos resolver o exemplo descrito: a L2 é a norma a ser aplicada, dado que a
descriminalização sempre beneficia o réu, já que o isenta da resposta penal.
Agora, imagine que fosse o contrário: que a L1, lei da época da conduta, não considerasse um
fato criminoso, mas que por qualquer motivo foi levado à conhecimento do judiciário que,
quando da decisão, depara-se com a L2 que considera a prática criminosa. Nesse caso,
falamos em ultratividade da lei mais benéfica, dado que a lei anterior se prolonga para ser
aplicável em data posterior à sua superação.
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 ATENÇÃO
Atenção ao que dissemos no parágrafo anterior. Falamos de uma lei que verse sobre qualquer
benefício, sendo esse o caso de ser retro e ultrativa.
Isso pode ocorrer quando houver:
ABOLITIO CRIMINIS
Que é a retirada de um crime do ordenamento, importando em uma causa extintiva da
punibilidade.
LEX MITIOR (NOVATIO LEGIS IN MELLIUS)
Que é aquela que favorece o agente de alguma maneira, por exemplo, que reduz a pena
mínima de um crime ou o tempo para concessão de um benefício.
Nesses casos, a lei será retroativa e ultrativa, ou seja, sempre que estiver em debate em um
conflito aparente de norma, deverá ser escolhida. O avesso delas é, respectivamente, a novatio
legis incriminadora, quando há tipificação de um comportamento que até então não era crime, e
a lex gravior (novatio legis in pejus), quando prejudica de alguma maneira o réu.
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 EXEMPLO
Criando uma causa de agravamento de pena ou dificultando a obtenção de um benefício.
Essas duas últimas hipóteses (norma incriminadora e norma que prejudica) são aplicáveis
apenas a fatos posteriores à entrada em vigor que não sejam impactados pela ultratividade da
lei mais branda, sendo então irretroativas e não tendo efeitos de ultratividade.
Essas duas hipóteses são explicitamente tratadas pelo Código Penal, que detalha o conteúdo
da norma constitucional, prevendo que:
ART. 2º - NINGUÉM PODE SER PUNIDO POR FATO QUE
LEI POSTERIOR DEIXA DE CONSIDERAR CRIME,
CESSANDO EM VIRTUDE DELA A EXECUÇÃO E OS
EFEITOS PENAIS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA.
PARÁGRAFO ÚNICO - A LEI POSTERIOR, QUE DE
QUALQUER MODO FAVORECER O AGENTE, APLICA-
SE AOS FATOS ANTERIORES, AINDA QUE DECIDIDOS
POR SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM
JULGADO.
Em suma, podemos dizer que:
A retroatividade da lei penal mais benéfica é uma consequência da ponderação entre a
segurança jurídica, quebra da coisa julgada e o direito à liberdade.

A irretroatividade da lei mais gravosa é o seu avesso. Através dela, a lei revogada regula fatos
ocorridos durante a sua vigência.

A lei posterior retroage e alcança fatos anteriores à sua entrada em vigor, quando em benefício
do acusado.
E mais: a aplicabilidade da lei mais benéfica pode acontecer a qualquer tempo, mesmo que um
caso tenha transitado em julgado, ou seja, que não caiba mais nenhum recurso da decisão que
aplicou a lei mais gravosa. Nessa hipótese, é o juiz da execução penal (que funciona depois
que a pena de uma condenação se torna definitiva)quem será responsável por fazer incidir a
norma mais favorável, como nos informa a Súmula 611 do STF: “Transitada em julgado a
sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna”.
Essas questões, que estão aqui apresentadas de modo sistematizado, podem ser difíceis de
serem aferidas em um caso concreto, especialmente quando em parte um dispositivo legal for
benéfico e em parte prejudicial.
Então, imagine que:
Uma lei (L1) preveja um crime com pena mínima de X anos, sem mencionar qualquer caso de
diminuição da sanção.
Uma lei posterior (L2) preveja para o mesmo crime pena mínima de X+2 anos, inovando ao
criar uma causa de diminuição de até 2/3 da pena.
Haja a possibilidade do conflito, quer dizer, conduta praticada durante a vigência da L1 e
sentenciamento durante a L2.
Seria possível a combinação das leis penais para fazer incidir a pena mínima da L1 com a
causa de diminuição da L2?
Pense na resposta antes de prosseguir.
O caso apresentado é exatamente o que aconteceu entre duas leis de drogas brasileiras, a Lei
6.368/76 e a atual Lei 11.343/06, no que concerne ao crime de tráfico de drogas. A pena
mínima, na Lei 6.368/76, para esse crime, era de 03 anos (enquanto a atual é de 05 anos), mas
a Lei 11.343/06 prevê no §4º do art. 33 uma causa de diminuição que pode reduzir em até 2/3 a
pena aplicada. Convidado a manifestar-se sobre o tema, o STF determinou que a combinação
não seria possível, já que a ultratividade ou retroatividade deveria ser sempre “em bloco”, sob
pena de constituir atividade legiferante. A Corte disse que aplicar parcialmente as disposições
implicaria na criação de um novo dispositivo legal pelo judiciário, formado pelos dois
fragmentos, implicando em atividade legislativa e, assim, violando a separação dos poderes.
Espelhando essa tese, o STJ editou a Súmula 501, segundo a qual:
É CABÍVEL A APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI N.
11.343/2006, DESDE QUE O RESULTADO DA
INCIDÊNCIA DAS SUAS DISPOSIÇÕES, NA ÍNTEGRA,
SEJA MAIS FAVORÁVEL AO RÉU DO QUE O ADVINDO
DA APLICAÇÃO DA LEI N. 6.368/1976, SENDO VEDADA
A COMBINAÇÃO DE LEIS.
Restou consolidado o entendimento da impossibilidade de combinação de leis, construindo o
conteúdo do princípio da ponderação unitária usado por muitos Tribunais. De forma
pragmática, a tese diz que deve ser a lei analisada caso a caso na sua inteireza, para que seja
possível determinar se beneficia ou não o agente.
 
Esse entendimento segue sendo debatido, com a possibilidade da combinação sendo alegada
por diversos defensores, inclusive para casos envolvendo outras leis que não as de drogas.
Aqueles que o defendem sustentam que a retroatividade da lei mais benéfica, que é direito
constitucional, não foi limitada pelo constituinte. Isso resta claro na redação do mencionado
inciso XL do art. 5º da CRFB/88, que não traz nenhuma limitação para a retroatividade da lei
que atenua a resposta penal nos casos de conflito de direito intertemporal.
 
A defesa é de que, se o Constituinte tivesse a intenção de excepcionalizar o princípio, teria
expressamente previsto cláusula tal como “com exceção às hipóteses de combinação das leis”.
Não o tendo feito, há que se interpretar o dispositivo em sua máxima efetividade, pelo que não
haveria óbice para a combinação. Trata-se, portanto, de matéria ainda em disputa e que
convidamos você a posicionar-se, principalmente tomando em conta o papel de um Direito
Penal constitucional para a concretização do Estado Democrático de Direito.
VIGÊNCIA, VALIDADE, ATIVIDADE E
EXTRATIVIDADE DA LEI PENAL
Se alguns dos exemplos que apresentamos anteriormente tiverem ficado um pouco confusos,
convidamos você a, antes de revisar a matéria, prosseguir com a leitura, já que dois temas que
apresentaremos com mais calma neste e o próximo tópico são fulcrais para entender a matéria
completamente.
Aqui, vamos lembrar-lhe que uma lei pode ter sido “promulgada”, mas não estar em “vigor”,
caso em que não se insere nos debates de conflito aparente de normas referidos, sendo a
vigência da lei o primeiro requisito para o conflito de normas no tempo.

No próximo tópico, vamos expor o termo inicial a partir do qual analisa-se qual legislação pode
ser aplicável a um caso, sendo o momento da atividade criminosa o segundo requisito de
avaliação.
Então, vamos começar com o seguinte debate:
Quais leis são elegíveis para serem aplicadas em um caso? Basta que estejam sancionadas?
Todos os casos que tratamos como solucionáveis pela irretroatividade da lei penal prejudicial
são hipóteses que colocam em choque duas leis em vigor e plenamente válidas. Mas o que
seriam essas características?
Uma lei penal formalmente editada pelo Estado, redigida e aprovada pelo Legislativo e
Executivo é considerada como promulgada após a assinatura do texto legal na fase final da
aprovação legislativa (promulgação). Em regra, essa lei passa por um período de vacância,
para que a sociedade dela tome conhecimento, e só com o seu transcurso é que poderá ser
considerada em vigor.
 EXEMPLO
A Lei 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”, aprovada pelo Congresso Nacional, foi
sancionada pelo Presidente da República, em 24 de dezembro de 2019, data da sua
promulgação. No entanto, ficou em vacância e só em 23 de janeiro de 2020 é que passou a
estar em vigor. Então todas as disposições do Pacote só passaram a ser aplicadas livremente
ou submetidas ao exame do conflito aparente de normas após esta data de 2020. O marco,
portanto, para a cobrança da obediência à lei penal é, em tese, a data de sua vigência.
Todos os casos que estamos avaliando demandam leis que já estejam em vigor quando da
prática. Não obstante, a sua vigência não é suficiente, já que ela pode ser sempre questionada
quanto a sua compatibilidade com o texto constitucional, o que chamamos de aferição de sua
validade. Muitas vezes, assim, entendendo que um dispositivo em vigor é inconstitucional, se
interrompe a sua aplicabilidade definitiva ou temporariamente.
 EXEMPLO
É o caso do chamado “juiz de garantias” (art. 3º da lei 13.964/19, que acrescentou os artigos
3º-A a 3º-F ao Código de Processo Penal, que estava em vigor quando foi levado para
avaliação do Supremo através da ADI (Arguição Direta de Inconstitucionalidade) de nº 6.298.
Nesse julgamento, o STF suspendeu a sua aplicabilidade, debruçando-se sobre a validade
dessa norma, adiando (suspenção liminar) a implementação dessas disposições em virtude de
“impactarem na organização judiciária”.
Outras disposições dessa mesma lei vêm sendo questionadas ainda na sua validade, e em
breve assistiremos a Corte falar sobre a compatibilidade ou não de outros artigos. Então, uma
lei que estivesse suspensa, que tivesse sido entendida como inconstitucional, por exemplo,
sendo inválida, não é elegível para o conflito de leis.
 ATENÇÃO
É importante dizer que esse exame de validade feito pelos Tribunais, ou até juízes de 1ª
instância, não tem o condão de revogar a lei penal. Conforme o último princípio de que
falaremos, o da continuidade das leis, a norma jurídico-penal só pode ser revogada por outra
lei, formalmente falando.
Uma decisão judicial pode – e deve, considerando a eficácia plena da Constituição – afastar
uma norma quando não for compatível com nosso sistema de garantias constitucionais, mas
isso implica na retirada da sua eficácia, não em uma revogação.
Portanto, neste estágio, podemos dizer que todas as leis em vigor e válidas são aplicáveis nos
termos da extratividade da lei penal mais benéfica que versamos no tópico anterior.
Precisamos, ainda, mencionar que as leis penais também podem ser classificadas como
excepcionais e temporárias.
LEIS PENAIS EXCEPCIONAIS
São aquelas que são criadas para serem válidas apenas em um determinado contexto pré-
estabelecido, como ocorreu conosco com a chamada Lei da Copa.
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LEIS PENAIS TEMPORÁRIAS
Essas estão já limitadas quanto à vigência na sua redação, que prevê que a partirde um
determinado dia não terão mais vigor.
Embora já tenham sido questionadas quanto à sua constitucionalidade, há muito entende-se
que, resguardadas pela proporcionalidade, são constitucionais.
 ATENÇÃO
Vale notar que, em matéria penal, ambas também são regidas pela extratividade da lei penal
mais benéfica, impondo dizer que se aplicam aos fatos cometidos em sua vigência, mesmo
que, quando da aplicação, já não estejam mais em vigor (art. 3º do CP).
Agora que você já sabe quais leis são elegíveis para a solução dos casos de direito
intertemporal, como prometemos, vamos falar sobre o termo inicial para aferir as leis em vigor
que tratam sobre um determinado contexto de ilícito penal. Trata-se aqui do tópico “tempo do
crime”, cuja relevância está independentemente dos casos em que haja conflito.
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VIGÊNCIA, VALIDADE, ATIVIDADE E
EXTRATIVIDADE DA LEI PENAL
Vamos acompanhar quais são as características de cada um desses termos?
TEMPO DO CRIME
Neste tópico, vamos de forma bastante pragmática responder à questão:
“Como sabemos qual é o tempo da infração penal?”
ESTIVEMOS MENCIONANDO NESTE MATERIAL O
TERMO MOMENTO DA ATIVIDADE OU PRÁTICA DO
CRIME, MAS O QUE ISSO SIGNIFICA?
RESPOSTA
Segundo o art. 4º do Código Penal, dentre as diversas teorias aplicáveis, nossa legislação
adotou a chamada teoria da atividade. Com isso, o legislador nos informa que não importa o
momento em que o resultado de um crime tenha se dado, caso ocorra em momento diverso do
momento da conduta. Para determinação do tempo do crime, é necessário perceber o período
da prática da ação/omissão.
Vejamos como isso se aplica em um exemplo prático.
Você deve saber que a responsabilização difere entre pessoas jovens e pessoas adultas, já
que as primeiras atendem ao ECA e as segundas ao CP/legislação extravagante.
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Imagine que uma pessoa tenha desferido um golpe contra outra na véspera do seu aniversário
de 18 anos, mas a vítima só morrera após passar por diversos procedimentos médicos, dias
depois de alcançada a chamada “maioridade penal”.
QUAL SERIA O TEMPO DO CRIME NESSE CASO, T1
OU T2? E QUAL A RESPOSTA A SEU PRINCIPAL
EFEITO: APLICAMOS, ENFIM, O CP OU O ECA?
RESPOSTA
Segundo o critério da atividade, o que importa é o momento da conduta, a que nos referimos
como teoria da atividade. Desprezamos para essa finalidade o momento do resultado. Portanto,
nesse caso, torna-se aplicável todo o sistema do Direito Penal juvenil, tornando-se impossível a
responsabilização nos termos do CP.
Agora, vamos voltar para nossos casos de sucessão de leis penais no tempo. Quando nos
referimos a duas leis aplicáveis, sempre falamos que uma lei estava regendo o caso, porque
em vigor quando da atividade, e outra porque estava em vigor quando da decisão.
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 EXEMPLO
Quando um juiz, anos depois do crime, sentencia a ação penal.
Então, imagine que houvesse existido uma lei (L1) que entrou em vigor em 2015 e que atribuía
como pena para um crime “reclusão de 1 a 4 anos”.
Suponha que em 2020 entra em vigor uma legislação (L2), que tenha modificado apenas o
preceito secundário do crime da L1, alterando a sanção para “reclusão de 3 a 7 anos”.
A descrição da conduta não foi, nesse exemplo, alterada de qualquer forma (quer dizer, não
houve abolitio ou novatio criminis).
Imagine, então, que a pessoa tenha cometido o crime descrito nas Leis em 2019, isto é, na
vigência da L1. Porém, o julgamento do fato tenha acontecido apenas em 2021, na vigência da
L2.
QUAL PENA DEVERIA SER CONSIDERADA PELO
MAGISTRADO?
RESPOSTA
Como aprendemos com o tópico anterior, trata-se de um caso de novatio criminis in pejus, por
isso a L1 é que será aplicada, considerando a sua extratividade, nos termos do art. 2º do CP.
Uma última hipótese deve ser trabalhada por nós. Embora pareça simples, há alguns casos
específicos em que definir o momento da “atividade” criminosa é um tanto mais complexo,
como nos chamados crimes permanentes e continuados. Esses conceitos serão mais bem
trabalhados em outro módulo, quando estudaremos as espécies de crime, mas vamos fazer
uma breve introdução apenas para que fique claro o ponto. Na continuidade delitiva, há uma
pluralidade de crimes que por ficção jurídica são tratados como se um só fossem, por razão de
equidade (art. 71 do CP).
Suponha aqui, como ilustração, que uma pessoa pratique, toda sexta-feira, um furto na mesma
esquina de uma rua em um centro urbano.
Suponha também que isso aconteça de modo ininterrupto, por dois meses seguidos, praticando
o agente o fato de forma idêntica em todas as ocasiões.
Nessa hipótese, o legislador escolheu tratar o contexto como de cometimento de um só crime
repetidamente, e não de diversos crimes, alterando a forma como a resposta penal deve se
dar.
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Mas quando será que consideramos a atividade? Naquela primeira conduta ou na última, dois
meses após?
Já os crimes permanentes são os em que a execução se prolonga no tempo por vontade do
agente.
Pense no crime de sequestro (art. 148 do CP), por exemplo. A cada segundo que a vítima fica
segregada de sua liberdade, está-se praticando o crime.
Qual seria o momento da atividade, quando a vítima foi capturada ou quando foi encontrado o
agente, o que pode ocorrer em tempos diversos?
Vamos supor que em qualquer um desses casos haja, entre a primeira conduta e a última, uma
sucessão de leis no tempo. Como determinar a legislação aplicável? O STF também foi
chamado a falar sobre o assunto, tendo editado a Súmula 711, que responde à questão da
seguinte forma: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente,
se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. Há que se
considerar, assim, para fins de determinação do tempo do crime, para ambas as situações, o
momento em que cessou a continuidade ou permanência do crime. Esse será sempre o
termo inicial em que avaliaremos o que regulava, à época, aquela prática.
Vimos neste tópico, assim, a regência do chamado tempo do crime, disciplina que é
fundamental para todos aqueles que querem atuar na área criminal.
Antes de falarmos sobre o “espaço” do crime, vamos fazer dois exercícios para treinar o
assunto.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
MÓDULO 3
 Definir a aplicação da lei penal no espaço
PRINCÍPIOS
Quando falamos sobre o espaço do crime, debatemos qual ambiente consideramos enquanto
lugar da infração penal, inclusive para determinar qual é a legislação aplicável em caso de
dúvida.
Então, voltando para os exemplos de conflito de normas...
Imagine que uma pessoa tenha postado, no Brasil, uma carta-bomba para um desafeto seu na
Argentina.
O objeto teria surtido efeito, provocando lesões graves na vítima, apenas na cidade de Buenos
Aires, na Argentina, sendo aí portanto o lugar do resultado.
Agora, suponha que a autora do crime seja brasileira e a vítima seja chilena.
Qual lei penal é aplicável: brasileira, argentina ou chilena?
É para refletir sobre esses casos que falaremos sobre extraterritorialidade do crime e sobre a
relação entre norma jurídico-penal e pessoas.
Antes de entrarmos nos princípios reitores da disciplina, precisamos saber como o legislador
decidiu definir o que determinaria o “lugar do crime”. Diferentemente do que aprendemos no
item sobre tempo do crime, aqui optou-se por uma teoria chamada mista, também conhecida
como teoria da ubiquidade, conforme preceitua o art. 6º do Código Penal: “Considera-se
praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou a omissão, no todo ou em parte, bem
como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”.
Se no tempo do crime o que importa é o momento da atividade, e não do resultado, para
definirmos qual o espaço do ilícito penal podemos considerar tanto o lugar da atividade, quanto
o resultado.
Então, no exemplo que formulamos, da carta-bomba, a lei penal brasileira já seria aplicável. E
se fosse o contrário também, ou seja, se a carta tivesse sidopostada na Argentina e aberta
apenas no Brasil, sendo aqui o lugar do resultado.
O princípio fundamental regente do assunto “lei penal no espaço” é o da territorialidade
mitigada, cujo conteúdo está inscrito no art. 5º do Código Penal, segundo o qual: “Aplica-se a
lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime
cometido no território nacional”. Isso implica em dizer que a lei penal será aplicada em todo
território nacional, entendido como espaço em que o Estado exerce a sua soberania política,
compreendido por sua base geográfica, o espaço aéreo e o mar territorial.
Mas veja que pontuamos que o princípio é adotado de forma mitigada, sendo também referido
como princípio da territorialidade temperada. Isso porque o legislador previu que o Brasil pode
abrir mão da aplicação de sua legislação, em virtude de convenções, tratados e regras de
direito internacional. As exceções, portanto, atribuem-lhe essa característica moderada.
O próprio artigo também define por extensão outros espaços que serão considerados território
e que, por isso, caso neles seja praticado um ilícito penal, atrairão a lei nacional. São eles:
§1º - PARA OS EFEITOS PENAIS, CONSIDERAM-SE
COMO EXTENSÃO DO TERRITÓRIO NACIONAL AS
EMBARCAÇÕES E AERONAVES BRASILEIRAS, DE
NATUREZA PÚBLICA OU A SERVIÇO DO GOVERNO
BRASILEIRO ONDE QUER QUE SE ENCONTREM, BEM
COMO AS AERONAVES E AS EMBARCAÇÕES
BRASILEIRAS, MERCANTES OU DE PROPRIEDADE
PRIVADA, QUE SE ACHEM, RESPECTIVAMENTE, NO
ESPAÇO AÉREO CORRESPONDENTE OU EM ALTO-
MAR.
§2º - É TAMBÉM APLICÁVEL A LEI BRASILEIRA AOS
CRIMES PRATICADOS A BORDO DE AERONAVES OU
EMBARCAÇÕES ESTRANGEIRAS DE PROPRIEDADE
PRIVADA, ACHANDO-SE AQUELAS EM POUSO NO
TERRITÓRIO NACIONAL OU EM VOO NO ESPAÇO
AÉREO CORRESPONDENTE, E ESTAS EM PORTO OU
MAR TERRITORIAL DO BRASIL.
De forma esquematizada, podemos dizer que:

Navios ou aeronaves públicas ou à serviço do governo são consideradas território, não
importando o lugar onde estejam.
Se privados, quando em alto-mar ou nesse espaço (onde nenhum país é soberano), seguem a
lei da bandeira.


Se privados, em território brasileiro, serão assim considerados.
Assim, podemos dizer que territorialidade é a regra apriorística que temos para determinar o
lugar do crime.
Mas, como veremos no tópico seguinte de forma mais esmiuçada, em algumas hipóteses o
Estado opta pela extraterritorialidade, casos que são justificados por demais princípios
regentes. São hipóteses em que, mesmo não sendo o crime praticado em território brasileiro, a
norma nacional terá incidência.
PRINCÍPIO DA DEFESA OU PROTEÇÃO
O princípio da defesa ou proteção informa que, por ser o Estado titular de um determinado
bem considerado fundamental, mesmo quando a prática transcender seus limites de espaço
brasileiro, caberá aplicação da nossa lei penal (art. 7º, I do CP).
PRINCÍPIO DA NACIONALIDADE
Por sua vez, o princípio da nacionalidade, também referido como da personalidade, ensina
que, quando for um nacional brasileiro envolvido, como vítima ou autor do fato, pode o Estado
exigir a aplicação da sua lei, independentemente do local da atividade ou resultado. Isso
porque é quanto a essa norma que a pessoa está sujeita, enquanto parte da nossa sociedade
(art. 7º, II, b e §3º do CP).
PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE
O princípio da universalidade (justiça universal ou cosmopolita) denota que todos os
Estados podem punir os autores de determinados crimes que se encontrem em seus territórios,
de acordo com as convenções ou tratados internacionais, independentemente da nacionalidade
do agente, do local do crime ou do bem jurídico atingido (art. 7º, II, a, CP).
PRINCÍPIO DA REPRESENTAÇÃO
Já o princípio da representação (ou bandeira ou pavilhão ou de substituição) explicita um
critério subsidiário para solução dos casos em que não se saiba qual legislação aplicar,
devendo-se optar pela lei do Estado que registrou uma determinada embarcação ou aeronave,
o que se conhece como “bandeira” (art. 7º, II, c, CP).
PRINCÍPIO DO DOMICÍLIO
Por fim, temos o princípio do domicílio, que assenta que o autor do crime deve ser julgado
pela lei do país onde for domiciliado, independentemente de sua nacionalidade (Art. 7º, I, d,
CP). Vamos estudar cada um desses casos detalhadamente no item seguinte, mas agora já
sabemos o que justifica a opção do legislador.
TERRITORIALIDADE E
EXTRATERRITORIALIDADE DA LEI PENAL
Como mencionamos, a regra que temos para a determinação do lugar em que se aplica a lei
penal brasileira é a da territorialidade mitigada. Segundo essa, haverá aplicação da lei
brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de Direito Internacional ao crime
cometido no território nacional. Como território nacional, vimos, tanto o seu conceito, importado
do direito internacional público, quanto também os critérios de extensão, que estão no art. 5º
§§2º e 3º, cuja explicação remetemos o leitor ao item anterior.
Temos interesse aqui de focar nos casos de extraterritorialidade, isto é, de aplicação da lei
brasileira às infrações penais cometidas além de nossas fronteiras.
Há duas espécies de extraterritorialidade, a incondicionada e a condicionada.
EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA
EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA
Nesta espécie, basta a situação fática para aplicação da lei penal. Por exemplo: crime contra a
vida praticado contra o presidente da República ou crime de genocídio praticado por brasileiro.
Vejamos a íntegra:
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de território, de
município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída
pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil.
EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA
Na extraterritorialidade condicionada, o legislador impõe uma série de requisitos para a
incidência da norma penal nacional. Esses são cumulativos, têm natureza de “condições
objetivas de punibilidade” e estão previstos no art. 7º, §2º, “a”, “b”, “c”, “d”, “e” e §3º. Já os
casos que dão ensejo a essa modalidade de extraterritorialidade estão no Art. 7º, II e art. 7º,
§3º. Um exemplo: crime praticado por brasileiro fora do território nacional, mas desde que este
entre no Brasil + desde que no país da prática também o fato seja considerado criminoso +
este seja um dos casos em que está autorizada a extradição + não ter sido absolvido no
estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena + não haver qualquer causa de extinção de
punibilidade. São os casos e as condições:
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: II - os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada,
quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados. §1º - Nos casos do inciso I, o agente
é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro. §2º - Nos
casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a
punibilidade, segundo a lei mais favorável.
§3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora
do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior:
a) não foi pedidaou foi negada a extradição;
b) houve requisição do ministro da justiça.
O texto legal é inteligível por si só, por isso sugerimos que leiam com cuidado cada uma das
hipóteses e não se esqueçam que as condições são cumulativas.
 ATENÇÃO
Essas regras referem-se à prática de crimes. É inaplicável o princípio da extraterritorialidade às
contravenções penais, havendo, aliás, proibição expressa na lei especial (art. 2º da Lei
3.688/41).
Por fim, vale fazer algumas notas gerais sobre o assunto.
1
2
1
Uma pena cumprida no estrangeiro, nos termos do art. 8º do CP, pode atenuar a “imposta no
Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”. Aqui, o
assunto impacta na determinação da quantidade de pena.
2
Uma sentença estrangeira, nas hipóteses do art. 9º precisa ser homologada para produzir
efeitos jurídicos no Brasil:
Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as
mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para:
I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis;
II - sujeitá-lo a medida de segurança;
Parágrafo único - A homologação depende
a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada;
b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade
judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do ministro da Justiça.
Para terminar este tópico, então, vamos solucionar os casos com atenção às pessoas,
ensinando como normas de Direito Público podem afetar as disposições que trouxemos até
aqui. Essas são hipóteses em que, mesmo que, em tese, a pessoa deva responder frente à lei
brasileira, haverá um impacto na própria possibilidade ou processamento da responsabilização
criminal.
TERRITORIALIDADE E
EXTRATERRITORALIDADE DA LEI PENAL
No vídeo a seguir, acompanharemos as considerações do especialista acerca do assunto.
LEI PENAL E PESSOAS
Vimos nos itens anteriores quais os sistemas de determinação da legislação aplicáveis em um
caso concreto, determinados pela territorialidade mitigada e pelos casos específicos de
extraterritorialidade. O que nos resta falar é como condições de determinadas pessoas podem
alterar essa dinâmica, por implicar em normas de direito público que demandam afastamento
ou suspensão da lei penal.
Esse assunto nos faz refletir sobre as hipóteses em que a igualdade, prevista no art. 5°, caput,
e inc. I, da CRFB/88, é sopesada, formulando o grande gênero das imunidades.
A primeira espécie de imunidade que trataremos é a imunidade diplomática, que é
prerrogativa de direito internacional público, prevista na Convenção de Viena, e incorporada em
nossa legislação nos termos do art. 31 e seguintes do Decreto 56.435/65:
O AGENTE DIPLOMÁTICO GOZARÁ DE IMUNIDADE DE
JURISDIÇÃO PENAL DO ESTADO ACREDITADO.
GOZARÁ TAMBÉM DA IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO
CIVIL E ADMINISTRATIVA, A NÃO SER QUE SE TRATE
DE:
A) UMA AÇÃO REAL SOBRE IMÓVEL PRIVADO
SITUADO NO TERRITÓRIO DO ESTADO ACREDITADO,
SALVO SE O AGENTE DIPLOMÁTICO O POSSUIR POR
CONTA DO ESTADO ACREDITADO PARA OS FINS DA
MISSÃO;
B) UMA AÇÃO SUCESSÓRIA NA QUAL O AGENTE
DIPLOMÁTICO FIGURE, A TÍTULO PRIVADO E NÃO EM
NOME DO ESTADO, COMO EXECUTOR
TESTAMENTÁRIO, ADMINISTRADOR, HERDEIRO OU
LEGATÁRIO;
C) UMA AÇÃO REFERENTE A QUALQUER PROFISSÃO
LIBERAL OU ATIVIDADE COMERCIAL EXERCIDA PELO
AGENTE DIPLOMÁTICO NO ESTADO ACREDITADO
FORA DE SUAS FUNÇÕES OFICIAIS.
2. O AGENTE DIPLOMÁTICO NÃO É OBRIGADO A
PRESTAR DEPOIMENTO COMO TESTEMUNHA.
3. O AGENTE DIPLOMÁTICO NÃO ESTÁ SUJEITO A
NENHUMA MEDIDA DE EXECUÇÃO A NÃO SER NOS
CASOS PREVISTOS NAS ALÍNEAS "A", "B" E "C" DO
PARÁGRAFO 1 DESTE ARTIGO E DESDE QUE A
EXECUÇÃO POSSA REALIZAR-SE SEM AFETAR A
INVIOLABILIDADE DE SUA PESSOA OU RESIDÊNCIA.
4. A IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO DE UM AGENTE
DIPLOMÁTICO NO ESTADO ACREDITADO NÃO O
ISENTA DA JURISDIÇÃO DO ESTADO ACREDITANTE.
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Podemos dizer que os diplomatas têm imunidade de jurisdição penal e ficam sujeitos à
jurisdição do Estado que representam, caso em que a atribuição da diplomacia constitui causa
pessoal de exclusão de pena irrenunciável – salvo pelo próprio Estado acreditante, segundo
art. 32 daquele diploma legal.
Por isso, o agente diplomático não pode também ser objeto de detenção ou prisão (art. 29 do
Decreto 56.435/65).
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Essas imunidades se estendem a todos os agentes diplomáticos e funcionários das
organizações internacionais em serviço, incluindo os seus familiares – e excluindo os seus
empregados particulares.
A segunda espécie é a imunidade parlamentar, que decorre da função pública exercida pelo
sujeito, “assegurando a liberdade necessária para o exercício do mandato” (CUNHA, 2016, p.
129).
Ela se subdivide em duas sessões.
IMUNIDADE MATERIAL
A primeira é a imunidade material (real, imunidade parlamentar absoluta, indenidade), prevista
na Constituição, segundo art. 53: “Os deputados e senadores são invioláveis, civil e
penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Trata-se de uma imunidade
absoluta e que demanda a demonstração da conexão entre as palavras e/ou opiniões
proferidas com o exercício do cargo. Isso implica na necessidade, sempre, de se ponderar se
um discurso feito por um parlamentar subjazia ao mandato, ao cargo em exercício, ou lhe
extrapolava, sendo que apenas no primeiro caso haverá a imunidade.
IMUNIDADE FORMAL
A segunda subespécie é a imunidade formal, que se refere aos casos que serão aprendidos
em Processo Penal, que determinam os Tribunais que serão competentes para julgar-lhes,
quando integrarem uma ação penal, e demais regras de processamento a que estão sujeitos.
Por exemplo, segundo art. 53, §1º da CRFB/RR: “Os Deputados e Senadores, desde a
expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal”.
Além disso, quanto à prisão, esses, nos termos do §2º, ficam
Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos,
salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte
e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva
sobre a prisão.
Outras regras de processamento estão previstas ao longo desse artigo, como nos §§3º-5º, e
todas são aplicáveis da diplomação até o fim do mandato. Com cada uma delas vocês
provavelmente terão contato em Direito Processual Penal. Aqui, o que desejamos é que vocês
tomem notícia.
Por fim, vale anotar que, caso o parlamentar esteja licenciado, não a manterá e, conforme o
§8º do referido dispositivo constitucional, elas subsistem mesmo em estado de sítio,
demandando, para que sejam suspensas, aprovação após votação da Casa respectiva por 2/3.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste conteúdo estudamos a norma penal, compreendendo suas características, princípios
regentes e procedimentos de interpretação e integração. Debatemos, ainda, questões
referentes a “quando” (tempo do crime) e “onde” (espaço do crime) podemos aplicar o conjunto
de normas jurídico-penais brasileiras. Mais do que solucionar casos de conflitos aparentes,
esperamos que você possa ter agora uma boa dimensão daquela que é a nossa principal fonte
– a lei penal – e possa, a partir de então, estar preparado para os nossos próximos ciclos, em
que estudaremos cada um de seus estratos.
 PODCAST
Agora, a especialista Luciana Fernandes encerra o conteúdo com riquíssimas reflexões sobre
imunidade penal, infração penal, dentre outras.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
BITENCOURT, C. R. Tratado de Direito Penal 1: Parte Geral. São Paulo: Saraiva Jur, 2018. 
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Centro Gráfico, 1988. 
BRASIL. Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos
ou degradantes. 1984. Consultado na internet em: 22 abr. 2021. 
BRASIL, MINISTÉRIO DA SAÚDE. Aprova o Regulamento Técnico sobre Substâncias e
MedicamentosSujeitos a Controle Especial. In: Portaria nº 344. Brasília: Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, 1998. 
CIRINO DOS SANTOS, J. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba: Conceito Editorial, 2014. 
CUNHA, R. S. Manual de Direito Penal: Parte Geral. Salvador: JusPodivm, 2016. 
DELMANTO, E. D. et al. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2017. 
GRECO, R. Curso de Direito Penal: Parte Geral — Volume I. Niterói: Impetus, 2017. 
PEREIRA, J. R. G. Interpretação Constitucional e Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005. 
ZAFFARONI, E. R. et al. Direito Penal Brasileiro — Volume I. Rio de janeiro: Revan, 2003. 
ZAFFARONI, E. R. Derecho Penal: Parte General. Buenos Aires: Ediar, 2002.
EXPLORE+
Ouça o podcast da plataforma Vire a Chave, do IBCCRIM. 
Para debater as origens das imunidades diplomáticas, consulte:
NEDER, G.; CERQUEIRA FILHO, G. Cultura Jurídica, Cultura Religiosa no Brasil e
Criminologia & Poder Político. In: Diálogos-Revista do Departamento de História e do
Programa de Pós-Graduação em História, v. 11, n. 3, p. 19-37, 2007. 
Para uma visão mais crítica sobre o princípio da legalidade, consulte:
DUARTE, E. P. Direito Penal, Criminologia e Racismo. In: Revista Brasileira de
Ciências Criminais, v. 135, p. 17-48, 2017. 
Conheça também a forma como institutos da dogmática penal podem ser interpelados de
forma crítica:
DE ANDRADE, V. R. P. Flagrando a Ambiguidade da Dogmática Penal com a Lupa
Criminológica: que Garantismo É Possível do Compasso Criminologia–Penalismo
Crítico?. In: Sequência: Estudos Jurídicos e Políticos, v. 30, n. 59, p. 161-192, 2009. 
Na página da internet do Empório do Direito você pode ler o artigo de opinião Supremo
Ativismo como Contrapoder Desconstituinte: O Caso do Foro “Privilegiado”, dos
professores Enzo Bello e Lucas Pontes.
CONTEUDISTA
Luciana Costa Fernandes
 CURRÍCULO LATTES
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