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Para Anna Biller, e meus pais R.G. Para Pat Steir, Andreas Landshoff e Mien Elffers J.E. A Treasury of Jewish Folklore, Nathan Ausubel. Copyright ©1948, 1976 by Crown Publishers, Inc. Reedição autorizada por Crown Publishers, Inc. The Chinese Looking Glass, Dennis Bloodworth. Copyright © 1966, 1967 by Dennis Bloodworth. Com autorização de Ferrar, Straus and Giroux. The Book of the Courtier, Baldesar Castiglione, tradução para o inglês de George Bull; Penguin Books (Londres). Copyright © George Bull, 1967. The Golden Dream: Seekers of El Dorado, Walker Chapman; Bobbs-Merrill. Copyright © 1967 by Walker Chapman. The Borgias, Ivan Cloulas, tradução para o inglês de Gilda Roberts; Franklin Watts, Inc. Copyright © 1987 by Librairie Artheme Fayard. Translation Copyright © 1989 by Franklin Watts, Inc. Various Fables from Various Places, organizado por Diane Di Prima; Capricorn Books / G. P. Putnam’s Sons. © 1960 G. P. Putnam’s Sons. Armenian Folk-tales and Fables, tradução para o inglês de Charles Downing; Oxford University Press. © Charles Downing, 1972. The Little Brown Book of Anecdotes, organizado por Clifton Fadiman; Little, Brown and Company. Copyright © 1985 by Little, Brown and Company (Inc.). The Power of the Charlatan, Grete de Francesco, tradução para o inglês de Miriam Beard. Copyright © 1939 by Yale University Press. Com autorização de Yale University Press. The Oracle: A Manual of the Art of Discretion, Baltasar Gracián, tradução para o inglês de L. B. Walton; Orion Press. Behind the Scenes of Royal Palaces in Korea (Yi Dynasty), Ha Tae-hung. Copyright © 1983 by Ha Tae-hung. Com autorização de Yonsei University Press, Seul. The Histories, Herodotus, tradução para o inglês de Aubrey de Sélincourt, revista por A. R. Burn; Penguin Books (Londres). Copyright © the Estate of Aubrey de Sélincourt, 1954. Copyright © A. R. Burn, 1972. Hollywood, Garson Kanin (Viking). Copyright © 1967, 1974 by T. F. T. Corporation. Fables from Africa, coletadas por Jan Knappert; Evan Brothers Limited (Londres). Collection © 1980 Jan Knappert. The Great Fables of All Nations, selecionadas por Manuel Komroff; Tudor Publishing Company. Copyright © 1928 by Dial Press, Inc. Selected Fables, Jean de La Fontaine, tradução para o inglês de James Michie; Penguin Books (Londres). Translation copyright © James Michie, 1979. The Romance of the Rose, Guillaume de Lorris, tradução para o inglês de Charles Dahlberg; Princeton University Press. The Complete Essays, Michel de Montaigne, tradução para o inglês de M. A. Screech; Penguin Books (Londres). Translation copyright © M. A. Screech, 1987, 1991. A Book of Five Rings, Miyamoto Musashi, tradução para o inglês de Victor Harris; Overlook Press. Copyright © 1974 by Victor Harris. The New Oxford Annotated Bible with the Apocrypha, versão standard revista, organizada por Herbert G. May and Bruce M. Metzger; Oxford University Press. Copyright © 1973 by Oxford University Press, Inc. Makers of Rome: Nine Lives, Plutarch, tradução para o inglês de Ian Scott-Kilvert; Penguin Books (Londres). Copyright © Ian Scott-Kilvert, l965. The Rise and Fall of Athens: Nine Greek Lives, Plutarch, tradução para o inglês de Ian Scott- Kilvert; Penguin Books (Londres). Copyright © Ian Scott-Kilvert, l960. Cha-no-yu: The Japanese Tea Ceremony, A. L. Sadler; Charles E. Tuttle Company. © 1962 by Charles E. Tuttle Co. Amoral Politics: The Persistent Truth of Machiavellism, Ben-Ami Scharfstein; State University of New York Press. © 1995 State University of New York. Caravan of Dreams, Idries Shah; Octagon Press (Londres). Copyright © 1970, 1980 by Idries Shah. Tales of the Dervishes, Idries Shah. Copyright © Idries Shah, 1967. Usado com autorização de Penguin Putnam Inc. and Octagon Press (Londres). The Craft of Power, R. G. H. Siu; John Wiley & Sons. Copyright © 1979 by John Wiley & Sons, Inc. The Subtle Ruse: The Book of Arabic Wisdom and Guile, tradução para o inglês de Rene R. Khawam; East-West Publications. Copyright © 1980 tradução inglesa East-West Publications (U.K.) Ltd. The Art of War, Sun-tzu, tradução para o inglês de Thomas Cleary; Shambhala Publications. © 1988 by Thomas Cleary. The Art of War, Sun-tzu, tradução para o inglês de Yuan Shibing. © 1987 by General Tao Hanshang. Usada com autorização de Sterling Publishing Co., Inc., 387 Park Avenue South, Nova York, NY 10016. The History of the Peloponnesian War, Thucydides, tradução para o inglês de Rex Warner; Penguin Books (Londres). Translation copyright Rex Warner, 1954. The Thurber Carnival, James Thurber; HarperCollins. Copyright 1945 by James Thurber. The Court Artist: On the Ancestry of the Modern Artist, Martin Warnke, tradução para o inglês de David McLintock. Translation © Maison des Sciences de l’Homme and Cambridge University Press, 1993. Com autorização de Cambridge University Press. The Con Game and “Yellow Kid” Weil: The Autobiography of the Famous Con Artist conforme relatada a W. T. Brannon; Dover Publications. Copyright © l948 by W. T. Brannon. AGRADECIMENTOS Primeiro gostaria de agradecer a Anna Biller, que me ajudou na edição e nas pesquisas necessárias para este livro, e cujas ideias inestimáveis foram essenciais na definição da forma e do conteúdo de As 48 leis. Sem ela, nada disto teria sido possível. Tenho que agradecer também ao meu querido amigo, Michiel Schwarz, responsável por me incluir na escola de arte Fabrika, na Itália, e lá me apresentar a Joost Elffers, meu sócio e produtor de As 48 leis do poder. Foi no mundo intrigante de Fabrika que Joost e eu vimos a intemporalidade de Maquiavel e, de nossas discussões em Veneza, na Itália, nasceu este livro. Gostaria de agradecer a Henri Le Goubin, que durante anos me abasteceu com muitas histórias maquiavélicas, particularmente no que se refere aos inúmeros personagens franceses cujo papel é tão importante neste livro. Gostaria também de agradecer a Les e Sumiko Biller, que me emprestaram a sua biblioteca sobre os japoneses e me ajudaram com a parte da Cerimônia do Chá. Igualmente, devo agradecer a minha boa amiga Elizabeth Yang, que me assessorou a respeito da história da China. Um livro como este dependia em grande parte da pesquisa do material disponível e sou particularmente grato à Biblioteca de Pesquisa da UCLA; passei vários dias prazerosos percorrendo suas incomparáveis coleções. Meus pais, Laurette e Stanley Greene, merecem o meu eterno agradecimento pelo apoio e paciência. E não devo esquecer de prestar uma homenagem ao meu gato, Boris, que me fez companhia nos dias intermináveis em que passei escrevendo. Finalmente, das pessoas que na minha vida foram tão hábeis no jogo do poder manipulando, torturando e me fazendo sofrer por anos a fio, não guardo rancor e agradeço a elas por me terem dado inspiração para As 48 leis do poder. Robert Greene Além disso, gostaríamos de agradecer a Susan Petersen e Barbara Grossman, editoras da Penguin, por acreditarem neste livro; a Molly Stern, editora de texto, por supervisionar todo o projeto para a Viking Penguin. A Sophia Murer, por seu design clássico e inovador. David Frankel, por editar o texto. A Roni Axelrod, Barbara Campo, Jaye Zimet, Joe Eagle, Radha Pancham, Marie Timell, Michael Fragnito e Eng-San Kho. Robert Greene Joost Elffers SUMÁRIO Para pular o Sumário, clique aqui. PREFÁCIO LEI 1 NÃO OFUSQUE O BRILHO DO MESTRE Faça sempre com que as pessoas acima de você se sintam confortavelmente superiores. Querendo agradar ou impressionar, não exagere exibindo seus próprios talentos ou poderá conseguir o contrário – inspirar medo e insegurança. Faça com que seus mestres pareçam mais brilhantes do que são na realidade e você alcançará o ápice do poder. LEI 2 NÃO CONFIE DEMAIS NOS AMIGOS, APRENDA A USAR OS INIMIGOS Cautela com os amigos – eles o trairão mais rapidamente, pois são com mais facilidade levados à inveja. Eles também se tornam mimados e tirânicos. Mas contrate um ex-inimigoe ele lhe será mais �el do que um amigo, porque tem mais a provar. De fato, você tem mais o que temer por parte dos amigos do que dos inimigos. Se você não tem inimigos, descubra um jeito de tê-los. LEI 3 Õ OCULTE AS SUAS INTENÇÕES Mantenha as pessoas na dúvida e no escuro, jamais revelando o propósito de seus atos. Não sabendo o que você pretende, não podem preparar uma defesa. Leve-as pelo caminho errado até bem longe, envolva-as em bastante fumaça e, quando elas perceberem as suas intenções, será tarde demais. LEI 4 DIGA SEMPRE MENOS DO QUE O NECESSÁRIO Quando você procura impressionar as pessoas com palavras, quanto mais você diz, mais comum aparenta ser, e menos controle da situação parece ter. Mesmo que você esteja dizendo algo banal, vai parecer original se você o tornar vago, amplo e enigmático. Pessoas poderosas impressionam e intimidam falando pouco. Quanto mais você fala, maior a probabilidade de dizer uma besteira. LEI 5 MUITO DEPENDE DA REPUTAÇÃO – DÊ A PRÓPRIA VIDA PARA DEFENDÊ-LA A reputação é a pedra de toque do poder. Com a reputação apenas você pode intimidar e vencer; um deslize, entretanto, e você �ca vulnerável, e será atacado por todos os lados. Torne a sua reputação inexpugnável. Esteja sempre alerta aos ataques em potencial e frustre-os antes que aconteçam. Enquanto isso, aprenda a destruir seus inimigos minando as suas próprias reputações. Depois, afaste-se e deixe a opinião pública acabar com eles. LEI 6 CHAME ATENÇÃO A QUALQUER PREÇO Julga-se tudo pelas aparências; o que não se vê não conta. Não �que perdido no meio da multidão, portanto, ou mergulhado no esquecimento. Destaque-se. Fique visível, a qualquer preço. Atraia as atenções parecendo maior, mais colorido, mais misterioso do que as massas tímidas e amenas. LEI 7 FAÇA OS OUTROS TRABALHAREM POR VOCÊ, MAS SEMPRE FIQUE COM O CRÉDITO Use a sabedoria, o conhecimento e o esforço físico dos outros em causa própria. Não só essa ajuda lhe economizará um tempo e uma energia valiosos, como lhe dará uma aura divina de e�ciência e rapidez. No �nal, seus ajudantes serão esquecidos e você será lembrado. Não faça você mesmo o que os outros podem fazer por você. LEI 8 FAÇA AS PESSOAS VIREM ATÉ VOCÊ – USE UMA ISCA, SE FOR PRECISO Quando você força os outros a agir, é você quem está no controle. É sempre melhor fazer o seu adversário vir até você, abandonando seus próprios planos no processo. Seduza-o com a possibilidade de ganhos fabulosos – depois ataque. É você quem dá as cartas. LEI 9 VENÇA POR SUAS ATITUDES, NÃO DISCUTA Qualquer triunfo momentâneo que você tenha alcançado discutindo é na verdade uma vitória de Pirro: o ressentimento e a má vontade que você desperta são mais fortes e permanentes do que qualquer mudança momentânea É de opinião. É muito mais e�caz fazer os outros concordarem com você por suas atitudes, sem dizer uma palavra. Demonstre, não explique. LEI 10 CONTÁGIO: EVITE O INFELIZ E AZARADO A miséria alheia pode matar você – estados emocionais são tão contagiosos quanto as doenças. Você pode achar que está ajudando o homem que se afoga, mas só está precipitando o seu próprio desastre. Os infelizes às vezes provocam a própria infelicidade; vão provocar a sua também. Associe-se, ao contrário, aos felizes e afortunados. LEI 11 APRENDA A MANTER AS PESSOAS DEPENDENTES DE VOCÊ Para manter a sua independência você deve sempre ser necessário e querido. Quanto mais dependerem de você, mais liberdade você terá. Faça com que as pessoas dependam de você para serem felizes e prósperas, e você não terá nada o que temer. Não lhes ensine o bastante a ponto de poderem se virar sem você. LEI 12 USE A HONESTIDADE E A GENEROSIDADE SELETIVAS PARA DESARMAR A SUA VÍTIMA Um gesto sincero e honesto encobrirá dezenas de outros desonestos. Até as pessoas mais descon�adas baixam a guarda diante de atitudes francas e generosas. Uma vez que a sua honestidade seletiva as desarma, você pode enganá-las e manipulá-las à vontade. Um presente oportuno – um cavalo de Troia – será igualmente útil. LEI 13 AO PEDIR AJUDA, APELE PARA O EGOÍSMO DAS PESSOAS, JAMAIS PARA A SUA MISERICÓRDIA OU GRATIDÃO Se precisar pedir ajuda a um aliado, não se preocupe em lembrar a ele a sua assistência e boas ações no passado. Ele encontrará um meio de ignorar você. Em vez disso, revele algo na sua solicitação, ou na sua aliança com ele, que o vá bene�ciar, e exagere na ênfase. Ele reagirá entusiasmado se vir que pode lucrar alguma coisa com isso. LEI 14 BANQUE O AMIGO, AJA COMO ESPIÃO Conhecer o seu rival é importantíssimo. Use espiões para colher informações preciosas que o colocarão um passo à frente. Melhor ainda: represente você mesmo o papel de espião. Em encontros sociais, aprenda a sondar. Faça perguntas indiretas para conseguir que as pessoas revelem seus pontos fracos e intenções. Todas as ocasiões são oportunidades para uma ardilosa espionagem. LEI 15 ANIQUILE TOTALMENTE O INIMIGO Todos os grandes líderes, desde Moisés, sabem que o inimigo perigoso deve ser esmagado totalmente. (Às vezes, eles aprendem isso da maneira mais difícil.) Se restar uma só brasa, por menor que seja, acabará se transformando numa fogueira. Perde-se mais fazendo concessões do que pela total aniquilação: o inimigo se recuperará, e quererá vingança. Esmague-o, física e espiritualmente. LEI 16 USE A AUSÊNCIA PARA AUMENTAR O RESPEITO E A HONRA Circulação em excesso faz os preços caírem: quanto mais você é visto e escutado, mais comum vai parecer. Se você já se estabeleceu em um grupo, afastando-se temporariamente se tornará uma �gura mais comentada, até mais admirada. Você deve saber quando se afastar. Crie valor com a escassez. LEI 17 MANTENHA OS OUTROS EM UM ESTADO LATENTE DE TERROR: CULTIVE UMA ATMOSFERA DE IMPREVISIBILIDADE Os homens são criaturas de hábitos com uma necessidade insaciável de ver familiaridade nos atos alheios. A sua previsibilidade lhes dá um senso de controle. Vire a mesa: seja deliberadamente imprevisível. O comportamento que parece incoerente ou absurdo os manterá desorientados, e eles vão �car exaustos tentando explicar seus movimentos. Levada ao extremo, esta estratégia pode intimidar e aterrorizar. LEI 18 NÃO CONSTRUA FORTALEZAS PARA SE PROTEGER – O ISOLAMENTO É PERIGOSO O mundo é perigoso e os inimigos estão por toda a parte – todos precisam se proteger. Uma fortaleza parece muito segura. Mas o isolamento expõe você a mais perigos do que o protege deles – você �ca isolado de informações valiosas, transforma-se num alvo fácil e evidente. Melhor circular entre as pessoas, descobrir aliados, se misturar. A multidão serve de escudo contra os seus inimigos. LEI 19 SAIBA COM QUEM ESTÁ LIDANDO – NÃO OFENDA A PESSOA ERRADA No mundo há muitos tipos diferentes de pessoas, e você não pode esperar que todas reajam da mesma forma às suas estratégias. Engane ou passe a perna em certas pessoas e elas vão passar o resto da vida procurando se vingar de você. São lobos em pele de cordeiro. Cuidado ao escolher suas vítimas e adversários, portanto – jamais ofenda ou engane a pessoa errada. LEI 20 NÃO SE COMPROMETA COM NINGUÉM Tolo é quem se apressa a tomar um partido. Não se comprometa com partidos ou causas, só com você mesmo. Mantendo-se independente, você domina os outros – colocando as pessoas umas contra as outras, fazendo com que sigam você. LEI 21 FAÇA-SE DE OTÁRIO PARA PEGAR OS OTÁRIOS – PAREÇA MAIS BOBO DO QUE O NORMAL Ninguém gosta de se sentir mais idiota do que o outro. O truque, portanto, é fazer com que suas vítimas se sintam espertas – e não só espertas, mas mais espertas do que você. Uma vez convencidas disso, elas jamais descon�arão que você possa ter segundas intenções. LEI 22 USE A TÁTICA DA RENDIÇÃO: TRANSFORME A FRAQUEZA EM PODER Se você é o mais fraco, não lute só por uma questão de honra; é preferível se render. Rendendo-se, você tem tempo para se recuperar, tempo para atormentar e irritar o seu conquistador, tempo para esperar que ele perca o seu poder. Não lhe dê a satisfaçãode lutar e derrotar você – renda-se antes. Oferecendo a outra face, você o enraivece e desequilibra. Faça da rendição um instrumento de poder. LEI 23 CONCENTRE AS SUAS FORÇAS Preserve suas forças e sua energia concentrando-as no seu ponto mais forte. Ganha-se mais descobrindo uma mina rica e cavando fundo, do que pulando de uma mina rasa para outra – a profundidade derrota a super�cialidade sempre. Ao procurar fontes de poder para promovê-lo, descubra um patrono- chave, a vaca cheia de leite que o alimentará durante muito tempo. LEI 24 REPRESENTE O CORTESÃO PERFEITO O cortesão perfeito prospera num mundo onde tudo gira em torno do poder e da habilidade política. Ele domina a arte da dissimulação; ele adula, cede aos superiores, e assegura o seu poder sobre os outros da forma mais gentil e dissimulada. Aprenda e aplique as leis da corte e não haverá limites para a sua escalada na corte. LEI 25 RECRIE-SE Não aceite os papéis que a sociedade lhe impinge. Recrie-se forjando uma nova identidade, uma que chame atenção e não canse a plateia. Seja senhor da sua própria imagem, em vez de deixar que os outros a de�nam para você. Incorpore artifícios dramáticos aos gestos e ações públicas – seu poder se fortalecerá e sua personagem parecerá maior do que a realidade. LEI 26 MANTENHA AS MÃOS LIMPAS Você deve parecer um modelo de civilidade e e�ciência: suas mãos não se sujam com erros e atos desagradáveis. Mantenha essa aparência impecável fazendo os outros de joguete e bode expiatório para disfarçar a sua participação. LEI 27 JOGUE COM A NECESSIDADE QUE AS PESSOAS TÊM DE ACREDITAR EM ALGUMA COISA PARA CRIAR UM SÉQUITO DE DEVOTOS As pessoas têm um desejo enorme de acreditar em alguma coisa. Torne-se o foco desse desejo oferecendo a elas uma causa, uma nova fé para seguir. Use palavras vazias de sentido, mas cheias de promessas; enfatize o entusiasmo de preferência à racionalidade e à clareza de raciocínio. Dê aos seus novos discípulos rituais a serem cumpridos, peça-lhes que se sacri�quem por você. Na ausência de uma religião organizada e de grandes causas, o seu novo sistema de crença lhe dará um imensurável poder. LEI 28 SEJA OUSADO Inseguro quanto ao que fazer, não tente. Suas dúvidas e hesitações contaminarão os seus atos. A timidez é perigosa: melhor agir com coragem. Qualquer erro cometido com ousadia é facilmente corrigido com mais ousadia. Todos admiram o corajoso; ninguém louva o tímido. LEI 29 PLANEJE ATÉ O FIM O desfecho é tudo. Planeje até o �m, considerando todas as possíveis consequências, obstáculos e reveses que possam anular o seu esforço e deixar que os outros �quem com os louros. Planejando tudo até o �m, você não será apanhado de surpresa e saberá quando parar. Guie gentilmente a sorte e ajude a determinar o futuro pensando com antecedência. LEI 30 FAÇA AS SUAS CONQUISTAS PARECEREM FÁCEIS Seus atos devem parecer naturais e fáceis. Toda a técnica e o esforço necessários para sua execução, e também os truques, devem estar dissimulados. Quando você age, age sem se esforçar, como se fosse capaz de muito mais. Não caia na tentação de revelar o trabalho que você teve – isso só despertará dúvidas. Não ensine a ninguém os seus truques ou eles serão usados contra você. LEI 31 CONTROLE AS OPÇÕES: QUEM DÁ AS CARTAS É VOCÊ As melhores trapaças são as que parecem deixar ao outro uma opção: suas vítimas acham que estão no controle, mas na verdade são suas marionetes. Dê às pessoas opções que sempre resultem favoráveis a você. Force-as a escolher entre o menor de dois males, ambos atendem ao seu propósito. Coloque-as num dilema: não terão escapatória. LEI 32 DESPERTE A FANTASIA DAS PESSOAS Em geral evita-se a verdade porque ela é feia e desagradável. Não apele para o que é verdadeiro ou real se não estiver preparado para enfrentar a raiva que vem com o desencanto. A vida é tão dura e angustiante que as pessoas capazes de criar romances ou invocar fantasias são como oásis no meio do deserto: todos correm até lá. Há um enorme poder em despertar a fantasia das massas. LEI 33 DESCUBRA O PONTO FRACO DE CADA UM Todo mundo tem um ponto fraco, uma brecha no muro do castelo. Essa fraqueza em geral é uma insegurança, uma emoção ou necessidade incontrolável; pode também ser um pequeno prazer secreto. Seja como for, uma vez encontrado esse ponto nevrálgico, é ali que você deve apertar. LEI 34 SEJA ARISTOCRÁTICO AO SEU PRÓPRIO MODO; AJA COMO UM REI PARA SER TRATADO COMO TAL A maneira como você se comporta em geral determina como você é tratado: a longo prazo, aparentando ser vulgar ou comum, você fará com que as pessoas o desrespeitem. Pois um rei respeita a si próprio e inspira nos outros o mesmo sentimento. Agindo com realeza e con�ança nos seus poderes, você se mostra destinado a usar uma coroa. LEI 35 DOMINE A ARTE DE SABER O TEMPO CERTO Jamais demonstre estar com pressa – a pressa trai a falta de controle de si mesmo, e do tempo. Mostre-se sempre paciente, como se soubesse que tudo acabará chegando até você. Torne-se um detetive do momento certo; fareje o espírito dos tempos, as tendências que o levarão ao poder. Aprenda a esperar quando ainda não é hora, e atacar ferozmente quando for propício. LEI 36 DESPREZE O QUE NÃO PUDER TER: IGNORAR É A MELHOR VINGANÇA Reconhecendo um problema banal, você lhe dá existência e credibilidade. Quanto mais atenção você der a um inimigo, mais forte você o torna; e um pequeno erro às vezes se torna pior e mais visível se você tentar consertá-lo. Às vezes, é melhor deixar as coisas como estão. Se existe algo que você quer, mas não pode ter, mostre desprezo. Quanto menos interesse você revelar, mais superior vai parecer. LEI 37 CRIE ESPETÁCULOS ATRAENTES Imagens surpreendentes e grandes gestos simbólicos criam uma aura de poder – todos reagem a eles. Encene espetáculos para os que o cercam, repletos de elementos visuais interessantes e símbolos radiantes que realcem a sua presença. Deslumbrados com as aparências, ninguém notará o que você realmente está fazendo. LEI 38 PENSE COMO QUISER, MAS COMPORTE-SE COMO OS OUTROS Se você alardear que é contrário às tendências da época, ostentando suas ideias pouco convencionais e modos não ortodoxos, as pessoas vão achar que você está apenas querendo chamar atenção e se julga superior. Acharão um jeito de punir você por fazê-las se sentir inferiores. É muito mais seguro juntar- se a elas e desenvolver um toque comum. Compartilhe a sua originalidade só com os amigos tolerantes e com aqueles que certamente apreciarão a sua singularidade. LEI 39 AGITE AS ÁGUAS PARA ATRAIR OS PEIXES Raiva e reações emocionais são contraproducentes do ponto de vista estratégico. Você precisa se manter sempre calmo e objetivo. Mas, se conseguir irritar o inimigo sem perder a calma, você ganha uma inegável vantagem. Desequilibre o inimigo: descubra uma brecha na sua vaidade para confundi-lo e é você quem �ca no comando. LEI 40 DESPREZE O QUE VIER DE GRAÇA O que é oferecido de graça é perigoso – em geral é um ardil ou tem uma obrigação oculta. Se tem valor, vale a pena pagar. Pagando, você se livra de problemas de gratidão e culpa. Também é prudente pagar o valor integral – com a excelência não se economiza. Seja pródigo com seu dinheiro e o mantenha circulando, pois a generosidade é um sinal e um ímã para o poder. LEI 41 EVITE SEGUIR AS PEGADAS DE UM GRANDE HOMEM O que acontece primeiro sempre parece melhor e mais original do que o que vem depois. Se você substituir um grande homem ou tiver um pai famoso, terá de fazer o dobro do que eles �zeram para brilhar mais do que eles. Não �que perdido na sombra deles, ou preso a um passado que não foi obra sua: estabeleça o seu próprio nome e identidade mudando de curso. Mate o pai dominador, menospreze o seu legado e conquiste o poder com a sua própria luz. LEI 42 ATAQUE O PASTOR E AS OVELHAS SE DISPERSAM A origem dos problemas em geral pode estar num único indivíduo forte – o agitador, o subalterno arrogante, o envenenador da boa vontade. Se você derespaço para essas pessoas agirem, outros sucumbirão a sua in�uência. Não espere os problemas que eles causam se multiplicarem, não tente negociar com eles – eles são irredimíveis. Neutralize a sua in�uência isolando-os ou banindo-os. Ataque a origem dos problemas e as ovelhas se dispersarão. LEI 43 CONQUISTE CORAÇÕES E MENTES A coerção provoca reações que acabam funcionando contra você. É preciso atrair as pessoas para que queiram vir até você. A pessoa seduzida torna-se um �el peão. Seduzem-se os outros atuando individualmente em suas psicologias e pontos fracos. Amacie o resistente atuando em suas emoções, jogando com aquilo de que ele gosta muito ou teme. Ignore os corações e as mentes dos outros e eles o odiarão. LEI 44 DESARME E ENFUREÇA COM O EFEITO ESPELHO O espelho re�ete a realidade, mas também é a ferramenta perfeita para a ilusão. Quando você espelha os seus inimigos, agindo exatamente como eles agem, eles não entendem a sua estratégia. O Efeito Espelho os ridiculariza e humilha, fazendo com que reajam exageradamente. Colocando um espelho diante das suas psiques, você os seduz com a ilusão de que compartilha os seus valores; ao espelhar as suas ações, você lhes dá uma lição. Raros são os que resistem ao poder do Efeito Espelho. LEI 45 PREGUE A NECESSIDADE DE MUDANÇA, MAS NÃO MUDE MUITA COISA AO MESMO TEMPO Teoricamente, todos sabem que é preciso mudar, mas na prática as pessoas são criaturas de hábitos. Muita inovação é traumático, e conduz à rebeldia. Se você é novo numa posição de poder, ou alguém de fora tentando construir a sua base de poder, mostre explicitamente que respeita a maneira antiga de fazer as coisas. Se a mudança é necessária, faça-a parecer uma suave melhoria do passado. LEI 46 NÃO PAREÇA PERFEITO DEMAIS Parecer melhor do que os outros é sempre perigoso, mas o que é perigosíssimo é parecer não ter falhas ou fraquezas. A inveja cria inimigos silenciosos. É sinal de astúcia exibir ocasionalmente alguns defeitos, e admitir vícios inofensivos, para desviar a inveja e parecer mais humano e acessível. Só os deuses e os mortos podem parecer perfeitos impunemente. LEI 47 Ã Ó NÃO ULTRAPASSE A META ESTABELECIDA; NA VITÓRIA, APRENDA A PARAR O momento da vitória é quase sempre o mais perigoso. No calor da vitória, a arrogância e o excesso de con�ança podem fazer você avançar além da sua meta e, ao ir longe demais, você conquista mais inimigos do que derrota. Não deixe o sucesso lhe subir à cabeça. Nada substitui a estratégia e o planejamento cuidadoso. Fixe a meta e, ao alcançá-la, pare. LEI 48 EVITE TER UMA FORMA DEFINIDA Ao assumir uma forma, ao ter um plano visível, você se expõe ao ataque. Em vez de assumir uma forma que o seu inimigo possa agarrar, mantenha-se maleável e em movimento. Aceite o fato de que nada é certo e nenhuma lei é �xa. A melhor maneira de se proteger é ser tão �uido e amorfo como a água; não aposte na estabilidade ou na ordem permanente. Tudo muda. BIBLIOGRAFIA PREFÁCIO A sensação de não ter nenhum poder sobre pessoas e acontecimentos é, em geral, insuportável – quando nos sentimos impotentes, ficamos infelizes. Ninguém quer menos poder; todos querem mais. No mundo atual, entretanto, é perigoso parecer ter muita fome de poder, ser muito premeditado nos seus movimentos para conquistar o poder. Temos de parecer justos e decentes. Por conseguinte precisamos ser sutis – agradáveis porém astutos, democráticos mas não totalmente honestos. Este jogo de constante duplicidade mais se assemelha à dinâmica de poder que existia no mundo ardiloso da antiga corte aristocrática. Em toda a história, sempre houve uma corte formada em torno de uma pessoa no poder – rei, rainha, imperador, líder. Os cortesãos que compunham esta corte ficavam numa posição muito delicada: tinham de servir aos seus senhores, mas, se a bajulação fosse muito óbvia, os outros cortesãos notariam e agiriam contra eles. As tentativas de agradar ao senhor, portanto, tinham de ser sutis. E até mesmo os cortesãos hábeis e capazes de tal sutileza ainda tinham de se proteger de seus companheiros que a todo momento tramavam tirá-los do caminho. Enquanto isso, supunha-se que a corte representasse o auge da civilização e do refinamento. Desaprovavam-se as atitudes violentas ou declaradas de poder; os cortesãos trabalhavam em silêncio e sigilosamente contra aquele entre eles que usasse a força. Este era o dilema do cortesão: aparentando ser o próprio modelo de elegância, ele tinha ao mesmo tempo de ser o mais esperto e frustrar os movimentos dos seus adversários da maneira mais sutil possível. Com o tempo, o cortesão bem-sucedido aprendia a agir sempre de forma indireta; se apunhalava o adversário pelas costas, era com luva de pelica na mão e, no rosto, o mais gentil dos sorrisos. Em vez de coagir ou trair explicitamente, o cortesão perfeito conseguia o que queria seduzindo, usando o charme, a fraude e as estratégias sutis, sempre planejando várias ações com antecedência. A vida na corte era um jogo interminável que exigia vigilância constante e pensamento tático. Era uma guerra civilizada. Hoje enfrentamos um paradoxo peculiarmente semelhante ao do cortesão: tudo deve parecer civilizado, decente, democrático e justo. Mas se obedecemos com muita rigidez a essas regras, se as tomamos de uma forma por demais literal, somos esmagados pelos que estão ao nosso redor e que não são assim tão tolos. Como escreveu o grande cortesão e diplomata renascentista, Nicolau Maquiavel, “O homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre os inúmeros outros que não são bons”. A corte se imaginava o pináculo do refinamento, mas sob a superfície cintilante fervilhava um caldeirão de emoções escusas – ganância, inveja, luxúria, ódio. Nosso mundo, hoje, igualmente se imagina o pináculo da justiça, mas as mesmas feias emoções continuam fervendo dentro de nós, como sempre. O jogo é o mesmo. Por fora, você deve aparentar que é uma pessoa de escrúpulos, mas, por dentro, a não ser que você seja um tolo, vai aprender logo a fazer o que Napoleão aconselhava: calçar a sua mão de ferro com uma luva de veludo. Se, como o cortesão de idos tempos, você for capaz de dominar a arte da dissimulação, aprendendo a seduzir, encantar, enganar e sutilmente passar a perna nos seus adversários, você alcançará os píncaros do poder. Vai conseguir dobrar as pessoas sem que elas percebam o que você está fazendo. E se elas não percebem o que você está fazendo, também não ficarão ressentidas nem lhe oferecerão resistência. As cortes são, inquestionavelmente, as sedes da polidez e da boa educação; não fosse assim, elas seriam a sede de matanças e desolação. Os que hoje sorriem e se abraçam, se enfrentariam e apunhalariam, uns aos outros, se os bons modos não se interpusessem... LORD CHESTERFIELD, 1694-1773 Para algumas pessoas, a ideia de participar conscientemente de jogos de poder – não importa se de forma indireta ou não – parece maldade, pouco social, uma relíquia do passado. Elas acreditam que podem optar por ficar fora do jogo, comportando-se como se não tivessem nada a ver com o poder. É preciso cuidado com pessoas assim, pois embora exteriorizem essas opiniões, com frequência são as maiores especialistas no jogo do poder. Utilizam estratégias que disfarçam com habilidade a natureza manipuladora. Tais tipos, por exemplo, costumam exibir a sua fraqueza e falta de poder como uma espécie de virtude moral. Mas a verdadeira impotência, sem que haja um motivo de interesse pessoal, não divulga a sua própria fraqueza para conquistar respeito ou simpatia. Alardear a própria fraqueza é na verdade uma estratégia muito eficaz, sutil e fraudulenta, no jogo de poder (ver Lei 22, a Tática da Rendição). Não é de estranhar que as ovelhas não gostem de aves predadoras, mas isso não é motivo para culpar as grandes aves predadoras de carregarem as ovelhas. E não há nada intrinsecamente errado no argumento das ovelhas quando elas sussurram entre si, “Estasaves predadoras são más, não podemos dizer, portanto, que o oposto de ave predadora deve ser bom?”. As aves predadoras ficam um tanto intrigadas e dizem, “Não temos nada contra estas boas ovelhas; de fato, nós gostamos muito delas; nada é mais saboroso do que uma ovelha de carne macia”. FRIEDRICH NIETZSCHE, 1844-1900 Outra estratégia daquele que se diz fora do jogo é a de exigir igualdade em todas as áreas da vida. Todos têm de ser tratados igualmente, seja qual for o seu status ou força. Mas se, para evitar o estigma do poder, você quiser tratar todos com igualdade e justiça, vai se defrontar com o problema de que algumas pessoas fazem certas coisas melhor do que outras. Tratar a todos igualmente significa ignorar as suas diferenças, elevar o patamar dos menos capazes e rebaixar o daqueles que se sobressaem. Mais uma vez, muitos dos que se comportam assim estão na verdade usando uma outra estratégia de poder, redistribuindo os prêmios da maneira como eles próprios determinam. Uma outra forma ainda de evitar o jogo seria a total honestidade e franqueza, visto que uma das principais técnicas dos que buscam o poder é a fraude e o sigilo. Mas a total honestidade acaba inevitavelmente por magoar e ofender um grande número de pessoas, e algumas vão querer pagar na mesma moeda. Ninguém verá a sua declaração honesta como totalmente objetiva e livre de alguma motivação pessoal. E estarão certos: na verdade, a honestidade é uma estratégia de poder, cuja intenção é convencer os outros de que se tem um caráter nobre, bom e altruísta. É uma forma de persuasão, até uma forma sutil de coagir as pessoas. Finalmente, os que alegam não serem jogadores afetam um ar de ingenuidade para se protegerem da acusação de que estão atrás do poder. Mais uma vez, cuidado, pois a aparência de ingenuidade pode ser um meio eficaz de enganar os outros (ver Lei 21, Pareça mais bobo do que o normal). E até a ingenuidade autêntica não está livre das armadilhas de poder. As crianças podem ser muito ingênuas, mas com frequência agem por uma necessidade básica de controlar os que estão ao seu redor. Elas sofrem muito sentindo-se impotentes no mundo adulto, e usam os meios disponíveis para conseguir o que querem. Pessoas genuinamente inocentes também podem estar no jogo do poder, e costumam ser terrivelmente eficazes nisso, visto que a reflexão não é um obstáculo para elas. De novo, aqueles que fazem alarde ou dão demonstrações de inocência são os menos inocentes de todos. Os únicos meios de conseguir o que se quer das pessoas são a força e a astúcia. O amor também, dizem; mas isso significa esperar que o sol brilhe, e a vida precisa de todos os momentos. JOHANN VON GOETHE, 1749-1832 Você pode reconhecer estes supostos não jogadores pela maneira como ostentam suas qualidades morais, sua piedade, o seu raro senso de justiça. Mas como todos nós queremos o poder, e quase todas as nossas ações visam a obtê-lo, os não jogadores estão simplesmente jogando areia nos nossos olhos, nos distraindo de suas cartadas com seu ar de superioridade moral. Observando bem, você verá de fato que são eles os mais hábeis na manipulação dissimulada, mesmo que alguns a pratiquem sem ter consciência disso. E se ressentem muito de qualquer publicidade que se dê às táticas que usam todos os dias. A flecha lançada pelo arqueiro pode ou não matar uma única pessoa. Mas os estratagemas inventados por um homem sábio podem matar até os bebês no ventre da mãe. KAUTILYA, FILÓSOFO INDIANO DO SÉC. 3 a.C. Se o mundo é como uma gigantesca corte fraudulenta e estamos presos nela, não adianta optar por ficar fora do jogo. Isso só vai deixar você impotente, e a impotência vai deixá-lo infeliz. Em vez de lutar contra o inevitável, em vez de ficar discutindo, se lamentando e cheio de culpa, é muito melhor sobressair no poder. De fato, quanto melhor você lidar com o poder, melhor você será como pessoa, amigo ou amiga, amante, marido ou esposa. Seguindo os passos do perfeito cortesão (ver Lei 24) você aprende a fazer os outros se sentirem melhor a respeito deles mesmos, tornando-se uma fonte de prazer para eles. Eles se tornarão dependentes de suas habilidades e desejarão a sua presença. Dominando as 48 leis deste livro, você poupa aos outros a dor de não saber lidar com o poder – de brincar com o fogo sem saber que ele queima. Se o jogo de poder é inevitável, melhor ser um artista do que negar ou agir desastradamente. Para aprender o jogo do poder é preciso ver o mundo de uma certa maneira, mudar de perspectiva. É preciso esforço e anos de prática, pois grande parte do jogo talvez não surja naturalmente. São necessárias certas habilidades básicas, e uma vez dominando-as você será capaz de aplicar as leis do poder com mais facilidade. A mais importante, e fundamento crucial do poder, é a habilidade de dominar as suas emoções. Reagir emocionalmente a uma situação é a maior barreira ao poder, um erro que custará a você muito mais do que qualquer satisfação temporária que possa obter expressando o que sente. As emoções embotam a razão, e se você não consegue ver com clareza não pode estar preparado e reagir com um certo controle da situação. A raiva é a reação emocional mais destrutiva, pois é a que mais turva sua visão. Também tem um efeito cascata que invariavelmente torna as situações menos controláveis e acentua a decisão do seu inimigo. Se você está tentando destruir um inimigo que o magoou, é bem melhor desarmá- lo fingindo amizade do que mostrando que está com raiva. Amor e afeto também são potencialmente destruidores, quando não permitem que você enxergue os interesses quase sempre egoístas daqueles de quem você menos desconfia de estar fazendo o jogo do poder. Você não pode reprimir a raiva ou o amor, ou evitar sentir raiva ou amor, e nem deve tentar. Mas cuidado com a maneira como você expressa esses sentimentos e, o que é mais importante, eles não devem jamais influenciar seus planos e estratégias. Pensei comigo mesmo com que meios, com que trapaças, com quantas artes diversas, com que habilidade um homem aprimora a sua inteligência para enganar outro e com estas variações o mundo se faz mais belo. FRANCESCO VETTORI, AMIGO E CONTEMPORÂNEO DE MAQUIAVEL, INÍCIO DO SÉC. XVI Relacionada com o controle das suas emoções está a habilidade para se distanciar do momento presente e pensar de forma objetiva no passado e no futuro. Como Janus, a divindade da mitologia romana com duas faces e guardiã de todos os portões e entradas, você deve ser capaz de olhar em ambas as direções ao mesmo tempo, para saber lidar melhor com o perigo, seja lá de onde ele vier. É esse o rosto que você deve criar para si próprio – um que olha sempre para o futuro e o outro, para o passado. Para o futuro, o lema é “Sempre alerta, todos os dias”. Nada deve apanhá-lo de surpresa, porque você está constantemente imaginando problemas antes que eles surjam. Em vez de perder tempo sonhando com o final feliz para o seu plano, você deve calcular todas as possíveis combinações e armadilhas que possam surgir. Quanto melhor a sua visão, quanto mais você planejar etapas com antecedência, mais poderoso se tornará. Não existem princípios; apenas fatos. Não existe o bem e o mal, apenas circunstâncias. O homem superior apoia fatos e circunstâncias a fim de guiá-los. Se houvesse princípios e leis fixas, as nações não as mudariam como mudamos de camisa, e não se pode esperar de um homem que seja mais sábio do que uma nação inteira. HONORÉ DE BALZAC, 1799-1850 A outra face de Janus olha constantemente para o passado – mas não para lembrar de mágoas passadas ou guardar rancores. Isso só limitaria o seu poder. A parte mais importante do jogo é aprender a esquecer essas coisas que aconteceram no passado e que vão consumindo as suas energias e turvando o seu raciocínio. O verdadeiro propósito do olho que espia para trás é o de constantemente se educar – você olha para o passado para aprender com quem viveuantes de você. (Os vários exemplos históricos neste livro serão muito úteis nesse processo.) Depois, tendo visto o passado, você olha mais perto as suas próprias ações e as dos seus amigos. Esta é a escola mais importante para você, porque se baseia na experiência pessoal. Você começa examinando os erros que cometeu no passado, aqueles que mais dolorosamente o impediram de progredir. Você os analisa de acordo com os termos das 48 leis de poder, e extrai daí uma lição e um juramento: “Nunca mais cometo esse erro; não caio mais nessa arapuca.” Se você for capaz de se avaliar e observar assim, vai aprender a romper com os modelos do passado – uma habilidade de enorme valor. O poder requer a capacidade de jogar com as aparências. Com este objetivo, você tem de aprender a usar muitas máscaras e ter uma cartola cheia de truques. A fraude e o disfarce não devem ser vistos como feios e imorais. Todas as interações humanas exigem que se trapaceie em muitos níveis, e de certa forma o que distingue os humanos dos animais é a nossa capacidade de mentir e enganar. Nos mitos gregos, no ciclo do Mahabharata indiano, no épico de Gilgamesh do Oriente Médio, as artes ilusórias são privilégio dos deuses; um grande homem, Ulisses por exemplo, era julgado por sua capacidade de rivalizar com a astúcia dos deuses, roubando parte do seu poder divino quando a eles se igualava na esperteza e na trapaça. A fraude é uma arte que a civilização desenvolveu e a arma mais potente no jogo do poder. Você não consegue trapacear bem se não se distanciar um pouco de si próprio – se não puder ser muitas pessoas diferentes, vestindo a máscara que o dia e o momento exigem. Com essa abordagem flexível a todas as aparências, inclusive a sua, você perde muito do peso interno que mantém as pessoas presas ao chão. Faça com que seu rosto seja tão maleável quanto o de um ator, trabalhe para esconder dos outros as suas intenções, pratique atrair as pessoas para armadilhas. Jogar com as aparências e dominar a arte da ilusão são um dos prazeres estéticos da vida. São também os componentes-chave para conquistar o poder. Se a fraude é a arma mais potente do seu arsenal, então a paciência em tudo é o seu maior escudo. Ela impedirá que você cometa burrices. Como o controle das suas emoções, a paciência é uma arte – ela não surge naturalmente. Mas nada quando se trata de poder é natural; poder é a coisa mais divina no mundo natural. E paciência é a suprema virtude dos deuses, que nada possuem a não ser tempo. Tudo de bom acontecerá – a grama crescerá de novo se você lhe der tempo e prever antecipadamente várias etapas no futuro. A impaciência, por outro lado, só faz você parecer fraco. É o principal empecilho ao poder. O poder é essencialmente amoral e a principal habilidade a adquirir é a de ver as circunstâncias, e não o bem ou o mal. O poder é um jogo – nunca é demais repetir – e no jogo não se julgam os adversários por suas intenções, mas pelo efeito de suas ações. Você mede a estratégia e o poder deles pelo que pode ver e sentir. Quantas vezes as intenções de alguém serviram apenas para perturbar e enganar! O que importa se outro jogador, seu amigo ou rival, tinha boas intenções e só estava pensando no seu interesse, se os efeitos das ações dele levaram a tanta ruína e confusão? É natural que as pessoas disfarcem suas ações com todos os tipos de justificativas, alegando sempre terem agido por generosidade. Você precisa aprender a rir interiormente sempre que ouvir isto e jamais cair na armadilha de avaliar os atos e intenções de alguém usando julgamentos morais que são na verdade uma desculpa para o acúmulo de poder. É um jogo. O seu adversário senta-se na sua frente. Ambos comportam- se como damas ou cavalheiros, observando as regras do jogo e sem levar nada para o lado pessoal. Você joga com a estratégia e observa os movimentos do seu adversário com toda a calma possível. No final, você aprecia a educação de quem está jogando com mais do que boas intenções. Treine o seu olho para acompanhar os resultados dos movimentos dele, as circunstâncias externas, e não se distraia com mais nada. Metade do seu controle do poder vem do que você não faz, do que você não se permite ser arrastado a fazer. Para isso, você deve aprender a julgar todas as coisas pelo preço que terá que pagar por elas. Como Nietzsche escreveu, “O valor de uma coisa às vezes não está no que se consegue com ela, mas no que se paga por ela – o que ela nos custa”. Talvez você alcance o seu objetivo, e um objetivo digno de ser alcançado, mas a que preço? Use este critério para tudo, inclusive para saber se deve colaborar com outras pessoas ou correr em seu auxílio. Afinal, a vida é curta, as oportunidades são poucas, e a sua energia tem limite. E, neste sentido, o tempo é tão importante quanto qualquer outro fator. Não desperdice tempo valioso, ou paz de espírito, com assuntos alheios – o preço é muito alto. O poder é um jogo social. Para aprender a dominá-lo, você deve desenvolver a capacidade de estudar e compreender as pessoas. Como escreveu o grande pensador e cortesão do século XVII, Baltasar Gracián, “Muita gente gasta o seu tempo estudando as propriedades dos animais e das ervas; muito mais importante seria estudar as características das pessoas, com quem temos de viver e morrer!” Para ser um mestre no jogo você deve ser também um mestre na psicologia. Deve reconhecer as motivações e ver através da nuvem de poeira com que as pessoas cercam suas ações. Compreender os motivos ocultos das pessoas é o maior conhecimento de que se precisa para conquistar o poder. É o que abre possibilidades sem fim de logro, sedução e manipulação. As pessoas são de uma complexidade infinita e você pode passar a vida inteira observando-as sem nunca chegar a entendê-las. Portanto, é importantíssimo começar a aprender agora mesmo. E, ao fazer isso, você também tem de ter em mente um princípio: Jamais discrimine quem você estuda e em quem você confia. Jamais confie totalmente em alguém e estude todos, inclusive amigos e pessoas queridas. Finalmente, você precisa aprender sempre a pegar o caminho indireto para chegar ao poder. Disfarce a sua astúcia. Como uma bola de bilhar que ricocheteia várias vezes antes de acertar o alvo, seus movimentos devem ser planejados e desenvolvidos da maneira menos óbvia possível. Treinando para ser dissimulado, você prospera na corte moderna, aparentando ser um modelo de decência enquanto está sendo um consumado manipulador. Considere As 48 leis do poder como uma espécie de manual das artes da dissimulação. As leis baseiam-se nos escritos de homens e mulheres que estudaram e dominaram o jogo do poder. Estes textos cobrem um período de mais de mil anos e foram criados em civilizações tão díspares quanto a antiga China e a Itália renascentista; e, no entanto, elas compartilham fios e meadas, sugerindo em conjunto uma essência de poder que ainda tem de ser plenamente formulada. As 48 leis do poder são uma destilação desta sabedoria acumulada, reunida nos escritos dos mais ilustres estrategistas (Sun-Tzu, Clausewitz), estadistas (Bismarck, Talleyrand), cortesãos (Castiglione, Gracián), sedutores (Ninon de Lenclos, Casanova), e charlatões (“Yellow Kid” Weil) da história. As leis possuem uma premissa simples: Certas ações quase sempre aumentam o poder de alguém (o cumprimento da lei), enquanto outras o diminuem e até os arruínam (o desrespeito à lei). Estas transgressões e obediências são ilustradas com exemplos históricos. As leis são eternas e definitivas. As 48 leis do poder podem ser usadas de várias maneiras. Lendo o livro do princípio ao fim, você aprenderá sobre o poder em geral. Embora várias leis possam não parecer diretamente ligadas à sua vida, com o tempo você provavelmente descobrirá que todas têm alguma aplicação, e que de fato elas estão inter-relacionadas. Com uma visão geral do assunto você será capaz de avaliar melhor as suas próprias açõesno passado e alcançar um grau maior de controle sobre seus problemas imediatos. A leitura completa do livro vai continuar lhe inspirando ideias e reavaliações durante muito tempo ainda. O livro também foi projetado para consultas e exame da lei que no momento lhe parecer mais pertinente ao seu caso. Digamos que você esteja tendo problemas com um superior e não consiga entender por que seus esforços não resultaram num sentimento maior de gratidão ou numa promoção. Várias leis tratam especificamente do relacionamento entre o chefe e o subalterno, e é quase certo você estar transgredindo uma delas. Folheando os parágrafos iniciais sobre as 48 leis no sumário, você identificará a lei pertinente. Por fim, o livro pode ser folheado e lido ao acaso como diversão, como um passeio agradável por entre as fraquezas e grandes feitos de nossos antepassados no poder. Um aviso, entretanto, aos que usarem o livro com este propósito: É melhor voltar atrás. O poder por si só é infinitamente sedutor e ilusório. É um labirinto – sua mente se consumirá na solução de problemas sem fim, e você logo perceberá que está agradavelmente perdido. Em outras palavras, é muito divertido levá-lo a sério. Não seja leviano com um assunto tão importante. Os deuses do poder desaprovam a frivolidade; eles só satisfazem aos que estudam e refletem, e castigam os que procuram se divertir nas espumas flutuantes. O homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre os inúmeros outros que não são bons. Por conseguinte, o príncipe que desejar manter a sua autoridade deve aprender a não ser bom, e usar esse conhecimento, ou abster-se de usá-lo, segundo a necessidade. O PRÍNCIPE, Nicolau Maquiavel, 1469-1527 LEI 1 NÃO OFUSQUE O BRILHO DO MESTRE JULGAMENTO Faça sempre com que as pessoas acima de você se sintam confortavelmente superiores. Querendo agradar ou impressionar, não exagere exibindo seus próprios talentos ou poderá conseguir o contrário – inspirar medo e insegurança. Faça com que seus mestres pareçam mais brilhantes do que são na realidade e você alcançará o ápice do poder. A LEI TRANSGREDIDA Nicolas Fouquet, ministro das Finanças de Luís XIV nos primeiros anos do seu reinado, era um homem generoso que gostava de festas pródigas, mulheres bonitas e poesia. Gostava também de dinheiro, visto o seu estilo de vida extravagante. Fouquet era inteligente e indispensável para o rei, portanto, quando o primeiro-ministro, Jules Mazarin, morreu em 1661, o ministro das Finanças esperava ser nomeado seu sucessor. Mas o rei decidiu abolir esse posto. Este e outros sinais levaram Fouquet a desconfiar de que estava perdendo prestígio, e ele então decidiu agradar ao rei organizando a festa mais espetacular jamais vista no mundo. Aparentemente, a festa era para comemorar o término da construção do castelo de Fouquet, Vaux-le-Vicomte, mas a sua verdadeira função era prestar uma homenagem ao rei, convidado de honra. A nobreza mais ilustre da Europa e alguns dos grandes intelectuais da época – La Fontaine, La Rochefoucauld, Madame de Sévigné – estavam presentes. Molière escreveu uma peça para a ocasião, na qual ele mesmo deveria representar no encerramento da noite. A festa começou com um farto jantar com sete pratos, alguns vindos do Oriente e jamais provados na França, assim como outros criados especialmente para aquela noite. A refeição foi acompanhada de música encomendada por Fouquet para homenagear o rei. Depois do jantar, havia um passeio pelos jardins do castelo. Os pátios e fontes de Vaux-le-Vicomte seriam a inspiração para Versalhes. Fouquet acompanhou pessoalmente o jovem rei pelos canteiros de flores e arbustos alinhados geometricamente. Chegando aos canais dos jardins, eles assistiram a um espetáculo de fogos de artifício, seguido da representação da peça de Molière. A festa entrou pela noite adentro e todos concordaram que nunca tinham visto nada mais espantoso. No dia seguinte, Fouquet foi preso pelo chefe dos mosqueteiros do rei, D’Artagnan. Três meses depois foi a julgamento sob a acusação de ter roubado o tesouro do país. (Na verdade, a maior parte do roubo de que estava sendo acusado ele havia cometido em benefício do rei e com a sua permissão.) Fouquet foi considerado culpado e enviado para a prisão mais isolada da França, no alto dos Pirineus, onde passou os últimos vinte anos da sua vida na solitária. Interpretação Luís XIV, o rei-sol, era um homem orgulhoso e arrogante que desejava ser o centro das atenções sempre; não suportava ser superado em prodigalidade por ninguém, e certamente não por seu ministro das Finanças. Para o lugar de Fouquet, Luís escolheu Jean-Baptiste Colbert, um homem famoso por sua parcimônia e por promover as festas mais insípidas de Paris. Colbert garantiu que todo o dinheiro liberado do tesouro fosse parar direto nas mãos de Luís. Com o dinheiro, Luís construiu um palácio ainda mais magnífico do que o de Fouquet – o glorioso palácio de Versalhes. Ele usou os mesmos arquitetos, decoradores e paisagistas. E em Versalhes, Luís deu festas ainda mais extravagantes do que aquela que custou a Fouquet a sua liberdade. Vamos examinar a situação. Na noite da festa, quando Fouquet ia apresentando a Luís um espetáculo após outro, cada um mais imponente do que o anterior, ele imaginava estar demonstrando a sua lealdade e devoção ao rei. Não só ele achava que a festa o faria cair de novo nas graças do rei, como pensava que ela mostraria o seu bom gosto, as suas relações e popularidade, tornando-o uma figura indispensável ao rei e provando que ele seria um excelente primeiro-ministro. Mas, cada novo espetáculo, cada sorriso de apreço dos convidados dirigido a Fouquet, fazia Luís achar que seus próprios amigos e súditos estavam mais encantados com o ministro das Finanças do que com o próprio rei, e que Fouquet estava na verdade ostentando a sua riqueza e poder. Em vez de lisonjear Luís XIV, a sofisticada festa de Fouquet ofendeu a vaidade do rei. Luís não reconheceria isso diante de ninguém, é claro – pelo contrário, ele encontrou uma desculpa conveniente para se livrar do homem que, inadvertidamente, o fizera se sentir inseguro. É este o destino, de uma forma ou de outra, de todos aqueles que desestabilizam a noção de identidade do mestre, cutucam a sua vaidade, ou o fazem desconfiar da própria superioridade. No início da noite, Fouquet estava no topo do mundo. Quando ela terminou, ele estava no chão. Voltaire, 1694-1778 A LEI OBSERVADA No início do século XVII, o matemático e astrônomo italiano Galileu se viu numa situação precária. Ele dependia da generosidade dos grandes governantes para apoiar a sua pesquisa e, portanto, como todos os cientistas do Renascimento, às vezes presenteava com suas invenções e descobertas os principais patronos da época. Certa ocasião, por exemplo, ele ofereceu uma bússola militar que havia inventado ao duque de Gonzaga. Depois dedicou um livro explicando o uso da bússola aos Medici. Ambos os governantes ficaram gratos, e por intermédio deles Galileu conseguiu arranjar mais alunos. Mas, não importava o tamanho da descoberta, seus patronos costumavam lhe pagar com presentes, não com dinheiro. Isto resultava numa vida de constante insegurança e dependência. Devia haver um jeito mais fácil, ele pensou. Galileu achou uma nova estratégia em 1610, quando descobriu as luas de Júpiter. Em vez de dividir a descoberta entre seus patronos como havia feito no passado – dando a um o telescópio que havia usado, dedicando a outro um livro, e assim por diante –, ele decidiu se concentrar exclusivamente nos Medici. Ele os escolheu por um motivo: pouco depois de estabelecer a dinastia dos Medici, em 1540, Cosimo I tinha escolhido Júpiter, o mais poderoso dos deuses, como seu símbolo – um símbolo de poder que ia além da política e dos bancos, um símbolo que estava associado à Roma Antiga e às suas divindades. Galileu transformou a sua descoberta das luasde Júpiter num acontecimento cósmico homenageando a grandiosidade dos Medici. Logo após a descoberta, ele anunciou que “as estrelas brilhantes [as luas de Júpiter] se apresentaram nos céus” ao seu telescópio ao mesmo tempo em que Cosimo II era entronizado. Ele disse que o número de luas – quatro – se harmonizavam com o número dos Medici (Cosimo II tinha três irmãos) e que as luas giravam em torno de Júpiter como estes quatro filhos giravam em torno de Cosimo I, fundador da dinastia. Mais do que uma coincidência, isto mostrava que os próprios céus refletiam a ascendência da família Medici. Depois de dedicar a descoberta aos Medici, Galileu encomendou um emblema representando Júpiter sentado numa nuvem com as quatro estrelas girando em torno dele, e o presenteou a Cosimo II como um símbolo do seu vínculo com as estrelas. Em 1610, Cosimo II nomeou Galileu filósofo e matemático oficial da corte, com um ótimo salário. Para um cientista este era o golpe da sua vida. Os dias de mendicância por um patrocínio tinham chegado ao fim. Interpretação De uma só tacada, Galileu ganhou mais com sua nova estratégia do que com todos os anos de mendicância. A razão é simples: todos os mestres querem brilhar mais do que os outros. Eles não estão preocupados com a ciência ou a verdade empírica, ou a mais recente invenção; estão interessados é no seu próprio nome e na sua própria glória. Galileu deu aos Medici infinitamente mais glória associando o nome deles a forças cósmicas do que fazendo-os patronos de alguma nova engenhoca ou descoberta científica. Os cientistas não estão livres dos caprichos da vida na corte e da proteção de um patrono. Eles também precisam servir a senhores que controlam os cordões da bolsa. E os seus grandes poderes intelectuais podem fazer o senhor se sentir inseguro, como se estivesse ali apenas para suprir fundos – uma tarefa feia, ignóbil. O produtor de uma grande obra quer sentir que é mais do que apenas o financiador. Ele quer parecer criativo e poderoso, e também mais importante do que a obra produzida em seu nome. Em vez de insegurança, você deve lhe dar glória. Galileu não desafiou a autoridade intelectual dos Medici com a sua descoberta, ou os fez se sentirem inferiores de alguma forma; ao associá-los com as estrelas, ele os fez resplandecer fulgurantes entre as cortes italianas. Ele não ofuscou o brilho do seu senhor, ele o fez brilhar mais do que todos. AS CHAVES DO PODER Todos têm as suas inseguranças. Quando você se expõe ao mundo e mostra os seus talentos, é natural que isso desperte todos os tipos de ressentimentos, invejas e outras manifestações de insegurança. É de se esperar que isto aconteça. Você não pode passar a vida se preocupando com os sentimentos mesquinhos dos outros. Mas, com quem está acima de você, é preciso adotar outra abordagem: quando se trata de poder, brilhar mais do que o mestre talvez seja o maior erro. Não se iluda pensando que a vida mudou muito desde a época de Luís XIV e dos Medici. Quem conquista um alto status na vida é como os reis e as rainhas: quer se sentir seguro da sua posição e superior aos que o cercam em inteligência, perspicácia e charme. É uma falha de percepção mortal, porém comum, acreditar que exibindo e alardeando os seus dons e talentos você está conquistando o afeto do senhor. Ele pode fingir apreço, mas na primeira oportunidade vai substituir você por alguém menos brilhante, menos atraente, menos ameaçador, assim como Luís XIV substituiu o reluzente Fouquet pelo apagado Colbert. E, como no caso de Luís XIV, ele não admitirá a verdade, mas arranjará uma desculpa para se livrar da sua presença. Esta Lei implica duas regras que você precisa entender. Primeiro, é possível inadvertidamente brilhar mais do que o senhor sendo simplesmente você mesmo. Existem senhores que são mais inseguros do que outros, monstruosamente inseguros; você pode naturalmente brilhar mais do que eles com seu charme e a sua graça. Ninguém possuía mais talentos naturais do que Astorre Manfredi, príncipe de Faenza. O mais belo de todos os jovens príncipes da Itália, ele cativava seus súditos com sua generosidade e espírito liberal. Em 1500, César Bórgia sitiou Faenza. Quando a cidade se rendeu, os cidadãos esperaram o pior do cruel Bórgia, que, entretanto, resolveu poupá-la: ele simplesmente ocupou a sua fortaleza, não executou nenhum dos seus cidadãos e permitiu que o príncipe Manfredi, com dezoito anos na época, permanecesse com a sua corte em total liberdade. Mas, poucas semanas depois, os soldados arrastaram Astorre Manfredi para uma prisão romana. Passou-se um ano e o seu corpo foi pescado no rio Tibre, com uma pedra amarrada no pescoço. Bórgia justificou o ato terrível com uma história inventada de traição e conspiração, mas o verdadeiro problema foi que ele era notoriamente fútil e inseguro. O jovem brilhava mais do que ele sem fazer nenhum esforço. Devido aos talentos naturais de Manfredi, a sua simples presença fazia Bórgia parecer menos atraente e carismático. A lição é simples: se não for possível evitar ser charmoso e superior, você deve aprender a evitar esses monstros de vaidade. É isso, ou descobrir um jeito de apagar as suas boas qualidades quando estiver na companhia de um César Bórgia. Segundo, não imagine que pode fazer tudo que quiser porque o senhor gosta de você. Livros inteiros poderiam ser escritos sobre favoritos que caíram em desgraça por considerar garantido o seu status, por ousar brilhar. No Japão do final do século XVI, o favorito do imperador Hideyoshi era um homem chamado Sem no Rikyu. Principal artista da cerimônia do chá, que tinha se tornado uma obsessão da nobreza, ele era um dos conselheiros de maior confiança de Hideyoshi, tinha o seu próprio apartamento no palácio e era homenageado por todo o Japão. Mas, em 1591, Hideyoshi mandou prendê-lo e condenou-o à morte. Rikyu preferiu se suicidar. A causa desta repentina mudança de sorte foi descoberta mais tarde: parece que Rikyu, antes um camponês e depois favorito da corte, tinha mandado esculpir uma estátua de madeira retratando-o de sandálias (sinal de nobreza) e com uma pose arrogante. Ele tinha mandado colocar a estátua no templo mais importante dentro dos muros do palácio, bem à vista da realeza que costumava passar por ali. Para Hideyoshi, isto significava que Rikyu não tinha senso de limite. Presumindo ter os mesmos direitos da mais alta nobreza, ele se esqueceu de que a sua posição dependia do imperador, e chegou a acreditar que a havia conquistado por si próprio. Este foi um erro de cálculo imperdoável, e ele pagou com a vida. Lembre-se do seguinte: não considere garantida a sua posição e jamais deixe que um favor recebido lhe suba à cabeça. Sabendo dos perigos de brilhar mais do que o seu senhor, você pode tirar vantagem desta Lei. Primeiro, você precisa elogiar e cortejar o seu senhor. A bajulação explícita pode ser eficaz, mas tem seus limites; é por demais direta e óbvia, e causa má impressão nos outros cortesãos. Cortejar discretamente é muito mais eficaz. Se você é mais inteligente do que o seu senhor, por exemplo, aparente o oposto: deixe que ele pareça mais inteligente do que você. Mostre ingenuidade. Faça parecer que você precisa da habilidade dele. Cometa erros inofensivos que não afetarão você a longo prazo, mas lhe darão chance de pedir a sua ajuda. Os senhores adoram essas solicitações. O mestre que não conseguir presenteá- lo com a sua experiência pode deixar cair sobre você a sua ira e a sua má vontade. Se as suas ideias são mais criativas do que as do seu mestre, atribua-as a ele, da maneira mais pública possível. Deixe claro que o seu conselho está simplesmente repetindo um conselho dele. Se você for mais esperto do que o seu mestre, tudo bem em representar o papel do bobo da corte, mas não o faça parecer frio e mal-humorado em comparação. Apague um pouco o seu senso de humor, se necessário, e descubra como fazer parecer que é ele queestá divertindo e alegrando os outros. Se você for naturalmente mais sociável e generoso do que seu senhor, atenção para não ser a nuvem que vai toldar o seu brilho aos olhos dos outros. Ele deve parecer como o sol em torno do qual todos giram, irradiando poder e brilho, o centro das atenções. Se você for responsável por distraí-lo, a exibição dos seus meios limitados conquistará a simpatia dele. Qualquer tentativa de impressioná-lo com a sua graça e generosidade pode ser fatal; aprenda com Fouquet ou arque com as consequências. Em todos estes casos, não é fraqueza disfarçar a sua força se, no final, eles o levarem ao poder. Deixando que os outros empanem o seu brilho, você permanece no controle da situação, em vez de ser vítima da insegurança deles. Isto será muito útil no dia em que você decidir elevar o seu status inferior. Se, como Galileu, você conseguir que o seu senhor brilhe ainda mais aos olhos dos outros, então você é um enviado dos deuses e será imediatamente promovido. Imagem: As Estrelas no Céu. Só pode haver um sol de cada vez. Não ofusque a luz do sol, ou rivalize com seu brilho; pelo contrário, vá desaparecendo no céu e descubra como tornar mais intensa a luz do mestre. Autoridade: Evite brilhar mais do que o senhor. Toda superioridade é odiosa, mas a superioridade de um súdito com relação ao seu príncipe não só é estúpida como fatal. Esta é uma lição que as estrelas no céu nos ensinam – elas podem ser aparentadas com o sol, e tão brilhantes quanto ele, mas nunca aparecem em sua companhia. (Baltasar Gracián, 1601- 1658) O INVERSO Você não pode ficar se preocupando em não aborrecer todas as pessoas que cruzam o seu caminho, mas deve ser seletivamente cruel. Se o seu superior é uma estrela cadente, não há perigo nenhum em brilhar mais do que ele. Não tenha misericórdia – seu senhor não teve escrúpulos na sua própria ascensão a sangue-frio até o topo. Calcule a força dele. Se for fraco, apresse discretamente a sua queda: supere-o, seja mais encantador, mais inteligente do que ele nos momentos-chave. Se ele for muito fraco e estiver prestes a cair, deixe a natureza seguir o seu curso. Não arrisque brilhar mais do que um superior frágil – pode parecer crueldade ou despeito. Mas se o seu senhor está firme na sua posição, e você sabe que é mais capaz do que ele, tenha paciência e espere o momento mais propício. O curso natural das coisas é o poder acabar enfraquecendo. O seu senhor cairá um dia e, se jogar direito, você vai sobreviver e, um dia, brilhar mais do que ele. LEI 2 NÃO CONFIE DEMAIS NOS AMIGOS, APRENDA A USAR OS INIMIGOS JULGAMENTO Cautela com os amigos – eles o trairão mais rapidamente, pois são com mais facilidade levados à inveja. Eles também se tornam mimados e tirânicos. Mas contrate um ex-inimigo e ele lhe será mais �el do que um amigo, porque tem mais a provar. De fato, você tem mais o que temer por parte dos amigos do que dos inimigos. Se você não tem inimigos, descubra um jeito de tê-los. A LEI TRANSGREDIDA Em meados do século IX, um jovem chamado Miguel III assumiu o trono do Império Bizantino. Sua mãe, a imperatriz Teodora, fora banida para um convento, e seu amante, Teoctisto, assassinado; encabeçando a conspiração para depor Teodora e colocar no trono Miguel estava o tio de Miguel, Bardas, homem inteligente e ambicioso. Miguel era agora um jovem e inexperiente soberano, rodeado de conspiradores, assassinos e devassos. Neste momento de perigo, ele precisava de alguém em quem pudesse confiar para seu conselheiro, e pensou em Basílio, seu melhor amigo. Basílio não tinha nenhuma experiência em governo e política – de fato, ele era o chefe dos estábulos reais – mas tinha provado o seu amor e gratidão diversas vezes. Para um bom inimigo, escolha um amigo. Ele sabe onde atacar. DIANE DE POITIERS, 1499-1566, AMANTE DE HENRIQUE II, DA FRANÇA Os dois haviam se conhecido há poucos anos, quando Miguel estava visitando os estábulos na hora em que um cavalo selvagem se soltou. Basílio, jovem cavalariço de uma família de camponeses da Macedônia, salvou a vida de Miguel. A força e a coragem do rapaz impressionaram Miguel, que imediatamente elevou Basílio da sua função obscura de treinador de cavalos para a de chefe dos estábulos. Ele cobriu o amigo de presentes e favores e os dois se tornaram inseparáveis. Basílio foi mandado para a melhor escola de Bizâncio, e o rude camponês se transformou num cortesão culto e sofisticado. Sempre que ofereço um posto vago, faço centenas de descontentes e um ingrato. LUÍS XIV, 1638-1715 Agora Miguel era imperador e precisava de alguém fiel. A quem mais ele poderia confiar o posto de camareiro-mor e conselheiro-chefe senão ao jovem que lhe devia tudo? Basílio poderia ser treinado para a função e Miguel o amava como a um irmão. Ignorando os conselhos de quem recomendava Bardas, muito mais qualificado, Miguel preferiu o amigo. Assim, eu mesmo já fui mais de uma vez iludido pela pessoa a quem mais amava e em cujo amor, acima de qualquer outra pessoa, eu mais confiava. Acredito, portanto, que seja certo amar e servir a uma pessoa mais do que a todas as outras, segundo o mérito e o valor, porém jamais confiar tanto nesta tentadora armadilha da amizade a ponto de ter de se arrepender mais tarde. BALDASSARE CASTIGLIONE, 1478-1529 Basílio aprendeu bem e em breve estava aconselhando o imperador em todas as questões de Estado. O único problema parecia ser o dinheiro – Basílio nunca tinha o suficiente. A exposição aos esplendores da corte bizantina o tornaram ávido pelos privilégios do poder. Miguel dobrou, depois triplicou o seu salário, deu-lhe um título de nobreza e o casou com sua própria amante, Eudóxia Ingerina. Um amigo e conselheiro tão confiável valia qualquer preço. Mas os problemas não pararam por aí. Bardas estava chefiando o exército, e Basílio convenceu Miguel de que o homem era ambicioso demais. Com a ilusão de que poderia controlar o sobrinho, Bardas havia conspirado para colocá-lo no trono, e poderia conspirar novamente, desta vez para se livrar de Miguel e assumir ele mesmo a coroa. Basílio destilou veneno nos ouvidos de Miguel até que o imperador concordou em mandar assassinar o tio. Durante uma importante corrida de cavalos, Basílio se acercou de Bardas no meio da multidão e matou-o com uma punhalada. Logo depois, Basílio pediu para substituir Bardas no posto de chefe do exército, de onde poderia controlar o reino e sufocar as rebeliões. Isso lhe foi concedido. Ora, o poder e a riqueza de Basílio só aumentavam e, passado algum tempo, Miguel, em dificuldades financeiras por causa das suas próprias extravagâncias, pediu ao amigo que lhe devolvesse parte do dinheiro que durante vários anos lhe emprestara. Para espanto de Miguel, Basílio recusou com tamanha desfaçatez que o imperador percebeu de repente a encrenca em que se metera: o ex-cavalariço tinha mais dinheiro, mais aliados no exército e no senado e, no final, mais poder do que o próprio imperador. Passadas algumas semanas, depois de uma noitada bebendo muito, Miguel acordou cercado de soldados. Basílio ficou assistindo enquanto eles matavam a punhaladas o imperador. E aí, proclamando-se imperador, ele atravessou a cavalo as ruas de Bizâncio, brandindo a cabeça do seu ex-benfeitor e melhor amigo espetada numa lança. A SERPENTE, O FAZENDEIRO E A GARÇA Uma serpente perseguida pelos caçadores pediu a um fazendeiro que salvasse a sua vida. Para escondê-la de seus perseguidores, o fazendeiro se agachou e permitiu que a serpente rastejasse para dentro da sua barriga. Mas, quando o perigo passou e o fazendeiro pediu para a serpente sair, ela se recusou. Estava quente e seguro lá dentro. No caminho de casa, o fazendeiro viu uma garça, aproximou-se dela e lhe contou baixinho o que tinha acontecido. A garça lhe disse para se agachar e fazer força para botar o bicho para fora. Assim que a serpente espichou a cabeça, a garça agarrou-a com o bico e, puxando-alá de dentro, matou-a. O fazendeiro ficou preocupado, com medo de que o veneno da serpente ainda estivesse na sua barriga, e a garça lhe disse que para curar veneno de cobra era preciso cozinhar e comer seis aves brancas. “Você é uma ave branca”, disse o fazendeiro. “Para começar, serve.” Agarrou a garça, colocou-a numa sacola e a levou para casa, onde a pendurou enquanto contava para a mulher o que tinha acontecido. “Você me surpreende”, disse a mulher. “A ave é boa com você, o livra de uma coisa ruim dentro da sua barriga, na verdade salva a sua vida, e você a traz até aqui para matá-la.” E imediatamente soltou a garça, que saiu voando. Mas, no caminho, lhe bicou os olhos. Moral: Se você vir o rio subindo o morro, é sinal de que alguém está retribuindo uma gentileza. CONTO FOLCLÓRICO AFRICANO Interpretação Miguel III apostou o seu futuro na gratidão que ele achava que Basílio deveria sentir por ele. Sem dúvida, Basílio lhe serviria melhor; ele devia ao imperador a sua fortuna, a sua educação e a sua posição. Depois, uma vez Basílio no poder, tudo que ele precisasse era melhor lhe dar, reforçando os vínculos entre os dois homens. Só naquele dia fatídico, ao ver o sorriso descarado no rosto de Basílio, é que o imperador percebeu o erro fatal que tinha cometido. Havia criado um monstro. Tinha permitido que um homem visse o poder de perto – um homem que depois quis mais, que pediu tudo e conseguiu, que se sentiu carregando o peso da caridade que recebera e simplesmente fez o que muita gente faz nessa situação: esqueceu os favores que recebeu e imaginou ter conquistado o sucesso por seus próprios méritos. No momento da revelação, Miguel ainda poderia ter salvo a sua vida, mas a amizade e o amor cegam os homens e eles não enxergam o que é do seu próprio interesse. Ninguém acredita que um amigo possa trair. E Miguel continuou não acreditando até o dia em que a sua cabeça foi parar na ponta de uma lança. Senhor, proteja-me dos meus amigos; que dos meus inimigos, cuido eu. Voltaire, 1694-1778 A LEI OBSERVADA Durante vários séculos após a queda da dinastia Han (222 d.C.), a história da China seguiu o mesmo modelo de violência e golpes sangrentos, um após o outro. O exército conspirava para matar um imperador fraco, depois o substituía no Trono do Dragão por um general forte. O general iniciava uma nova dinastia e se coroava imperador; para garantir a própria sobrevivência ele matava os generais, seus companheiros. Alguns anos depois, entretanto, o modelo voltava a funcionar: novos generais se sublevavam e o matavam, ou matavam seus filhos. Ser imperador da China era ser uma pessoa solitária, cercada por um bando de inimigos – era o posto de menos poder, de menos segurança do reino. Em 959 d.C., o general Chao K’uang-yin se tornou imperador Sung. Ele sabia das suas chances, da probabilidade de em um ano ou dois ser assassinado; como romper com esse modelo? Logo depois de se tornar imperador, Sung ordenou um banquete para comemorar a nova dinastia e convidou os comandantes mais poderosos do exército. Depois de beberem muito vinho, ele dispensou os guardas e todos os outros, exceto os generais, que agora temiam que ele os assassinasse a todos de um só golpe. Em vez disso, ele falou: “Passo o dia inteiro com medo, e me sinto infeliz tanto à mesa quanto na minha cama. Pois quem de vocês não sonha em subir ao trono? Não duvido da sua aliança, mas se por acaso seus subordinados, em busca de riqueza e posição, insistirem em colocar sobre seus ombros o manto amarelo, como vocês poderiam recusar?” Bêbados e temendo por suas vidas, os generais proclamaram sua inocência e fidelidade. Mas Sung tinha outras ideias: “A melhor maneira de viver é usufruir pacificamente de riquezas e homenagens. Se vocês estiverem dispostos a renunciar aos seus comandos, estou pronto para lhes dar as melhores terras e as moradias mais belas, onde poderão ter o prazer da companhia de cantores e de moças.” Muita gente pensa que um príncipe sábio deveria, tendo oportunidade, incentivar astuciosamente uma inimizade, de forma que, ao eliminá-la, ele possa aumentar a sua grandeza. Os príncipes, especialmente os novos, encontraram mais fé e utilidade naqueles homens a quem, no início do seu poder, viam com suspeita, do que naqueles em quem começaram confiando. Pandolfo Petrucci, príncipe de Siena, governou seu Estado mais com aqueles de quem desconfiava do que com os outros. NICOLAU MAQUIAVEL, 1469-1527 Os atônitos generais perceberam que, em vez de uma vida de lutas e ansiedades, Sung estava lhes oferecendo riqueza e segurança. No dia seguinte, todos os generais entregaram os seus pedidos de demissão, e se retiraram para as terras que Sung lhes deu. De um só golpe, Sung transformou um bando de “lobos”, que se diziam amigos mas provavelmente o teriam traído, num grupo de dóceis ovelhas, afastados de todo o poder. Nos anos seguintes, Sung continuou a campanha para garantir o seu governo. Em 971 d.C., o rei Liu de Han do Sul finalmente se rendeu, depois de anos de rebelião. Para espanto de Liu, Sung lhe ofereceu um posto na corte imperial e o convidou a ir até o palácio para selarem com vinho a nova amizade. Segurando o copo que Sung lhe oferecia, o rei Liu hesitou, com medo de que estivesse envenenado. “Os crimes de seus súditos certamente merecem a morte”, gritou ele, “mas eu imploro a Sua Majestade que poupe a vida do seu súdito. Na verdade, não ouso beber este vinho.” O imperador Sung riu, pegou o copo de Liu e bebeu. Não estava envenenado. A partir daí, Liu se tornou o seu amigo mais leal e confiável. Um brâmane, grande especialista nos Vedas e que também foi um ótimo arqueiro, oferece os seus serviços ao seu bom amigo, que agora é o rei. O brâmane grita ao ver o rei, “Reconheça- me, meu amigo!” O rei lhe responde com desprezo e depois explica: “Sim, já fomos amigos, mas nossa amizade se baseava no poder que tínhamos… eu era seu amigo, bom brâmane, porque era do meu interesse. Nenhum pobre é amigo do rico; nenhum tolo, do sábio; nenhum covarde, do corajoso. Um velho amigo – quem precisa dele? Só dois homens de igual riqueza e berço ficam amigos e se juntam, não um homem rico e outro pobre… Um velho amigo – quem precisa dele?” MAHABARATA, C. SÉCULO III a.C. Na época, a China se dividira em muitos reinos menores. Quando Ch’ien Shu, rei de um deles, foi derrotado, os ministros de Sung aconselharam o imperador a trancafiar este rebelde. Eles apresentaram documentos provando que ele ainda conspirava para matar Sung. Quando Ch’ien Shu foi visitar o imperador, entretanto, em vez de prendê-lo, Sung o homenageou. Deu-lhe também um pacote, que disse para o ex-rei abrir no caminho de casa. Ch’ien Shu abriu o pacote na viagem de volta e viu que continha todos os documentos sobre a sua conspiração. Percebeu que Sung sabia dos seus planos assassinos, mas mesmo assim o havia poupado. Esta generosidade o conquistou, e ele também passou a ser um dos súditos mais leais de Sung. Interpretação Um provérbio chinês compara os amigos aos dentes e mandíbulas de um animal perigoso: se você não tomar cuidado, eles acabam mastigando você. O imperador Sung conhecia as mandíbulas por entre as quais estava passando ao assumir o trono: seus “amigos” no exército o mastigariam como um pedaço de carne e, se ele conseguisse sobreviver, seus “amigos” no governo o jantariam. O imperador Sung não quis saber de truques com “amigos” – subornou os colegas generais com esplêndidas terras e os manteve afastados. Esse foi um jeito bem melhor de enfraquecê-los sem os matar, o que só levaria os outros generais a buscar vingança. E Sung não quis nada com ministros “amistosos”. Com mais frequência, eles acabariam bebendo o seu famoso copo de vinho. Em vez de confiar em amigos, Sung usou seus inimigos, um após o outro, transformando-os em súditos muito mais confiáveis. Enquanto um amigo espera receber cada vez mais favores, e ferve de inveja, esses antigos inimigos
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