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DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS, INDIVIDUAIS E HOMOGÊNEOS Natália Bertolo Bonfim E-book 2 Neste E-Book: INTRODUÇÃO ����������������������������������������������������������� 3 DISPOSIÇÕES PRELIMINARES ����������������������������4 Doutrina da proteção integral (art. 1º) .....................................4 Definição de criança e adolescente .........................................8 A criança e o adolescente como sujeitos de direitos fundamentais (arts. 3º e 5º) ...................................................10 Dever de efetivação dos direitos da criança e do adolescente (art. 4º) ...............................................................11 Interpretação do ECA (art. 6º) ................................................13 DIREITOS FUNDAMENTAIS ���������������������������������16 Direito à vida e à saúde (arts. 7º a 14) ..................................16 Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (arts. 15 a 18) ............................................................................................19 Direito à convivência familiar e comunitária .........................21 Guarda (arts. 33 a 35) .............................................................23 Tutela (arts. 36 a 38) ...............................................................25 Adoção (arts. 39 a 52) ............................................................26 3.4 Direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer (arts. 53 a 59) ..........................................................................29 3.5 Direito à profissionalização e à proteção no trabalho (arts. 60 a 69) ...........................................................31 PROTEÇÃO JUDICIAL DOS INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS E COLETIVOS ����������� 33 CONSIDERAÇÕES FINAIS �����������������������������������36 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS & CONSULTADAS �������������������������������������������������������37 2 INTRODUÇÃO Neste módulo, vamos analisar o tratamento jurídico conferido à criança e ao adolescente em nosso país. O diploma legal que consolidou os direitos da criança e do adolescente no Brasil foi o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A partir dele, a criança e o adolescente passaram a ser titulares de direitos es- peciais, além daqueles direitos fundamentais já con- feridos a qualquer pessoa pela Constituição Federal. Partindo dessa premissa, iremos analisar as disposi- ções preliminares do ECA, que define o conceito de criança e adolescente, aponta os objetivos da norma e os princípios jurídicos por ela adotados que deverão nortear sua interpretação e aplicação. Em seguida, passaremos ao estudo dos direitos fun- damentais da criança e do adolescente: direito à vida e à saúde; direito à liberdade, ao respeito e à digni- dade; direito à convivência familiar e comunitária, em que abordaremos os institutos da tutela, guarda e adoção; o direito à educação, cultura, esporte e lazer; e o direito à profissionalização e proteção no trabalho. Por fim, verificaremos quais são os instrumentos jurídicos que podem ser utilizados para defender os direitos e os interesses da criança e do adolescente. 3 DISPOSIÇÕES PRELIMINARES O art. 24, inc. XV da Constituição Federal determi- na que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre as normas gerais de proteção à infância e à juventude. Para atender a este dispositivo, editou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), que dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. O Título I do ECA é composto pelos arts. 1º a 6º e trata das disposições preliminares. A seguir, vamos analisar cada um desses artigos. Doutrina da proteção integral (art� 1º) A Constituição Federal alçou à categoria de direito so- cial a proteção à infância (art. 6º), e conferiu à criança e ao adolescente o status de pessoa em situação peculiar de desenvolvimento. (art. 227, §3º, inc. V) O art. 227 da Constituição Federal dispõe que “é de- ver da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de 4 toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Esse dispositivo constitucional representa o me- taprincípio da prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, tendo como destinatá- rios da norma a família, que deve se responsabilizar pela manutenção da integridade física e psíquica; a sociedade, que deve se responsabilizar pela convi- vência coletiva harmônica; e o Estado, que deve se responsabilizar pelo constante incentivo à criação de políticas públicas. (ROSSATO, 2019, p. 62) Nesse sentido, estabelece o §1º do art. 227 da Constituição Federal que o Estado promoverá pro- gramas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais. Para tanto, deverá implementar políticas específicas, obedecendo aos seguintes preceitos: I) aplicação de percentual dos recursos pú- blicos destinados à saúde na assistência materno-infantil; II) criação de programas de prevenção e atendimen- to especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. 5 De acordo com o art. 227, §3º da Constituição Federal, a proteção integral abrange os seguintes aspectos: I. idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII; II. garantia de direitos previdenciários e trabalhistas; III. garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola; IV. garantia de pleno e formal conhecimento da atri- buição de ato infracional, igualdade na relação pro- cessual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica; V. obediência aos princípios de brevidade, excepcio- nalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade; VI. estímulo do Poder Público, através de assistên- cia jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado; VII. programas de prevenção e atendimento espe- cializado à criança e ao adolescente dependente de entorpecentes e drogas afins; VIII. programas de prevenção e atendimento especia- lizado à criança, ao adolescente e ao jovem depen- dente de entorpecentes e drogas afins. Note que o inc. V acima transcrito menciona três subprincípios que integram o princípio da proteção 6 integral: a brevidade, a excepcionalidade e o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, aplicáveis apenas ao menor infrator, quando recebe medida privativa de liberdade. Pela brevidade, a privação da liberdade do adoles- cente deve ser a mais breve possível, tanto na fase de prisão cautelar quanto após a decisão de interna- ção. A excepcionalidade determina que a privação da liberdade deve ser excepcional, ou seja, a última opção. Desse modo, por se tratar de uma pessoa em desenvolvimento, a privação da liberdade pre- cisa ser excepcional e breve, pois é evidente que a segregação pode afetar gravemente a formação da personalidade do jovem. (NUCCI, 2018, p. 6) Como desdobramento dessa proteção especial por parte do Estado, o art. 227, §4º da Constituição Federal impõe que “a lei punirá severamente o abu- so, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”. Fundamentando-se nos dispositivos constitucionais, o ECAadotou expressamente a doutrina da prote- ção integral (art. 1º), assegurando à criança e ao adolescente os mesmos direitos e garantias funda- mentais conferidos aos maiores de 18 anos, com um plus, simbolizado pela completa e indisponível tutela estatal para lhes afirmar a vida digna e próspera, ao menos durante a fase de seu amadurecimento. (NUCCI, 2018, p. 4) 7 Definição de criança e adolescente Para efeitos do ECA, considera-se criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade. (art. 2º) Diante disso, considera-se criança a pessoa até 11 anos completos; e adolescente, a pessoa com 12 anos completo até 17 anos completos, pois, de acordo com o Código Civil, a pessoa que completa 18 anos de idade atinge a maioridade, tornando-se adulto. Além disso, o Código Penal fixa a idade de 18 anos para a responsabilização criminal. É importante observar que o art. 228 da Constituição Federal estabelece que “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”. Esta legislação especial a que faz referência o dispositivo constitucional é o ECA. Assim, não se aplica aos menores de 18 anos a le- gislação penal comum, por mais grave que tenha sido o crime cometido. Trata-se de política crimi- nal do Estado, que visa a proteger a pessoa em desenvolvimento. O parágrafo único do art. 2º do ECA dispõe que “nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente o Estatuto às pessoas entre 18 e 21 anos de idade”. Ocorre a aplicação desse dispositivo legal, por exem- plo, naquelas situações em que a pessoa estiver cumprindo medida socioeducativa. Como o §5º do art. 121 do ECA determina a desinternação compul- 8 sória aos 21 anos de idade, admite-se que pessoas dessa idade permaneçam sob a tutela do Estatuto enquanto estiverem cumprindo medida socioeduca- tiva. (ROSSATO, 2019, p. 77) Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o advento da maioridade não coloca fim às medidas socioeducativas (Súmula 605: “A su- perveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso, inclusive na liberdade assistida, enquanto não atingida a idade de 21 anos”). FIQUE ATENTO A Lei nº 13.257/2016 instituiu o Estatuto da Primeira Infância, estabelecendo princípios e di- retrizes para a formulação e a implementação de políticas públicas para a primeira infância (perío- do compreendido entre 6 anos completos ou 72 meses de vida), em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desen- volvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano. 9 A criança e o adolescente como sujeitos de direitos fundamentais (arts� 3º e 5º) Segundo o art. 3º do ECA, “a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilida- des, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”. Como já mencionamos, a criança e o adolescente gozam dos mesmos direitos e garantias fundamen- tais conferidos aos maiores de 18 anos, acrescidos de um plus em razão de sua condição de pessoa em desenvolvimento. São, portanto, sujeitos de direitos, que poderão exer- cer livremente seus direitos fundamentais, gozando, ainda, de direitos especiais, em virtude de sua con- dição peculiar. Desse modo, tanto o ECA quanto as leis já existentes ou aquelas que ainda estão por vir deverão ser pro- pícias ao desenvolvimento do menor, levando-se em conta sua liberdade e dignidade. Afinal, como sujeito de direitos, o que não concorrer com seu desenvol- vimento, não poderá ser-lhe aplicado. (ELIAS, p. 15) Ademais, o art. 5º do Estatuto dispõe que “nenhu- ma criança ou adolescente será objeto de qualquer 10 forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. O próprio ECA traz as sanções aplicáveis àquele que infringirem os direitos do menor em outros capítulos. Os arts. 225 a 244, por exemplo, tratam dos crimes praticados contra a criança e o adolescente; os arts. 245 a 258 dispõem sobre as infrações administra- tivas; e os arts. 24 e 38 são as sanções aplicadas aos pais e responsável pelo menor, consistentes na perda do poder familiar e na destituição da tutela. Dever de efetivação dos direitos da criança e do adolescente (art� 4º) Segundo o art. 4º do ECA, “é dever da família, da co- munidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”. Esse dispositivo legal está em consonância com o art. 227 da Constituição Federal e dele sobressai a conjugação de esforços entre a família, a comuni- dade, a sociedade em geral e o poder público para assegurar os direitos fundamentais da criança e do adolescente. 11 Obviamente, a base do crescimento e desenvolvi- mento da criança e do adolescente é a família. É o núcleo central, que deve ser tutelado pelo Estado, com vistas à sua continuidade e preservação. As de- cisões tomadas no âmbito familiar, como não pode- riam deixar de ser, devem se pautar pelo princípio do melhor interesse da criança. (ROSSATO, 2019, p. 84) A participação da comunidade se concretiza com o Conselho Tutelar, órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. (art. 131, ECA) A sociedade tem o dever de assegurar a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, pois, no atual contexto constitucional, todos devem se ajudar, contribuindo para a promoção de uma sociedade livre, justa e solidária. (art. 3º, inc. I, CF) Por fim, o poder público desempenha duplo papel na efetivação dos direitos da criança e do adolescen- te. Por um lado, é o responsável por assegurar os meios necessários para que a família, a comunidade e a sociedade cumpram com os seus deveres em relação àqueles direitos. Por outro, cabe ao Estado implementar políticas públicas voltadas à criança e ao adolescente, de acordo com as regras de compe- tência previstas constitucionalmente e na legislação em geral, que poderão ser executadas diretamente pelo Estado, ou, então, por organizações não gover- namentais e associações em geral. (ROSSATO, 2019, p. 85) 12 A teor do parágrafo único do art. 4º do ECA, a ga- rantia de prioridade prevista no caput compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quais- quer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das po- líticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. Esse dispositivo legal apresenta as situações às quais deve ser dada prioridade absoluta à criança e ao adolescente, porém, sem prejuízo da conside- ração que for devida a outros interesses legítimos presentes no caso concreto. (art. 100, inc. IV, ECA) Interpretação do ECA (art� 6º) O art. 6º do ECA determina que “na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direi- tos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”. Esse dispositivo legal estabelece os critérios que de- vem ser observados quando da interpretação do ECA. 13 É claro que, na interpretação de uma lei, deve-se le- var em conta os fins sociais a que ela se dirige,as exigências do bem comum e os direitos e deveres individuais e coletivos. Em se tratando do ECA, essa interpretação deve ir além, atentando para a o melhor interesse do menor. REFLITA Apesar de proibida no art. 42, §1º do ECA, o STJ admitiu a adoção de netos por avós (a chamada adoção avoenga), visando ao melhor interesse da criança. O Tribunal decidiu que, não obstante a regra impeditiva do ECA, revela-se cabível sua miti- gação excepcional quando: (i) o pretenso adotando seja menor de idade; (ii) os avós (pretensos ado- tantes) exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o seu nascimento; (iii) a parentalidade socioafetiva tenha sido devidamente atestada por estudo psicossocial; (iv) o adotando reconheça os adotantes como seus genitores e seu pai (ou sua mãe) como irmão; (v) inexista conflito familiar a respeito da adoção; (vi) não se constate perigo de confusão mental e emocional a ser ge- rada no adotando; (vii) não se funde a pretensão de adoção em motivos ilegítimos, a exemplo da predominância de interesses econômicos; e (viii) a adoção apresente reais vantagens para o adotan- do. Assim, o STJ autorizou a adoção avoenga, “por se mostrar consentânea com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, fim social objetivado pela Constituição da República de 1988 14 e pela Lei 8.069/90, conferindo-se, assim, a devida e integral proteção aos direitos e interesses das pessoas em desenvolvimento, cuja vulnerabilidade e fragilidade justificam o tratamento especial”. (REsp 1587477/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 27/08/2020) 15 DIREITOS FUNDAMENTAIS Como já estudamos, a criança e o adolescente são sujeitos de direito, isto é, são titulares de direitos fundamentais, podendo exercê-los livremente. Tais direitos estão elencados nos arts. 7º a 69 do ECA, e é sobre eles que vamos nos debruçar a partir de agora. Direito à vida e à saúde (arts� 7º a 14) O art. 7º do ECA dispõe que “a criança e o adoles- cente têm direito a proteção à vida e à saúde, me- diante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”. Segundo Nucci (2018, p. 35), o objetivo desse arti- go é garantir que o Poder Público seja obrigado a tutelar o nascimento daqueles que não têm amparo suficiente, seja por falta de recursos financeiros dos pais, seja porque a mãe não deseja mantê-lo sob sua guarda e proteção, zelando para que obtenha um desenvolvimento físico e mental sadio, em família natural ou substituta. O Brasil assinou o Pacto de São José da Costa Rica, que determina em seu art. 4º que a vida é um direito que “deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção”. Há apenas duas exce- ções a essa regra, que autorizam a interrupção da 16 gravidez, afastando a antijuridicidade: na hipótese de feto anencéfalo e de gravidez decorrente de estupro. Os arts. 8º a 10 tratam das políticas de saúde dire- cionadas às mulheres gestantes, determinando que o Estado forneça atendimento médico pré e pós-natal no âmbito do SUS. Assegura-se assistência psicoló- gica à gestante e à mãe, inclusive para aquelas que entregam seu filho para adoção ou que se encontrem privadas de liberdade. Os arts. 11 e 12 garantem acesso integral às linhas de cuidado voltadas à saúde da criança e do adoles- cente, por intermédio do SUS, devendo a criança e o adolescente com deficiência serem atendidos sem discriminação ou segregação. Incumbe ao poder público fornecer os medicamen- tos, próteses e outras tecnologias necessárias ao tratamento do menor, e os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condi- ções para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. O art. 13 determina que os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente deverão ser obrigatoriamente comuni- cados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. O art. 14 estabelece que o SUS promoverá programas de assistência médica e odontológica para a preven- 17 ção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sani- tária para pais, educadores e alunos. Chama a atenção nesse dispositivo legal seu §1º, que determina ser obrigatória a vacinação das crian- ças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. REFLITA Os pais podem deixar de vacinar os seus filhos, tendo como fundamento convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais? A questão está em discussão no STF, no sistema de repercussão geral, objeto do Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) nº 1.267.879. No caso concreto, o Ministério Público de São Paulo propôs ação contra os pais de uma criança para obrigá-los a seguir o calendá- rio de vacinação pois, a seu ver, o bem da criança deve estar acima da vontade familiar. Por outro lado, os pais da criança, que são veganos, alegam que o filho é saudável e é acompanhado por mé- dicos, não havendo que se falar em negligência, uma vez que a escolha pela não vacinação é ide- ológica. O Relator, Ministro Luís Roberto Barroso, apresentou três argumentos para reconhecer a repercussão geral: o aspecto social, considerando a importância das políticas de vacinação infantil determinadas pelo Ministério da Saúde; o aspecto político, reconhecendo o crescimento do movimen- to antivacina e o aspecto jurídico, para discutir a 18 aplicação de diversos dispositivos da Constituição sobre o tema. (MIGALHAS, 2020) Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (arts� 15 a 18) O art. 15 do ECA dispõe que “a criança e o adolescen- te têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvol- vimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis”. Segundo o art. 16 e incisos, o direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; opinião e expressão; crença e culto religioso; brincar, praticar esportes e divertir-se; participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; participar da vida política, na forma da lei; buscar refúgio, auxílio e orientação. Os arts. 17 e 18 tratam do direito ao respeito, que consiste na inviolabilidade da integridade física, psí- quica e moral da criança e do adolescente. Abrange a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos es- paços e objetos pessoais, e impõe a todos o dever de velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. 19 Os arts. 18-A e 18-B proíbem duas condutas em re- lação à criança e ao adolescente: o castigo físico e o tratamento cruel ou degradante. Esses artigos foram incluídos no ECA pela Lei nº 13.010/2014, ini- cialmente denominada de “Lei da Palmada”, e hoje conhecida como Lei Menino Bernardo. O castigo físico diz respeito ao uso de força física da qual resulte sofrimento físico ou lesão ao menor. O tratamento cruel ou degradante refere-se à forma de tratamento que humilhe, ameace gravemente ou ridicularize o menor. Apesar do foco da Lei Menino Bernardo ser as con- dutas abusivas praticadas pelos pais, também está sujeita à proibição qualquer pessoa encarregada de conferir tratamento, educação ou proteção a crianças e adolescentes. (ROSSATO, 2019, p. 155) SAIBA MAIS A Lei nº 13.010/2014 foi promulgada em home- nagem ao menino Bernardo Boldrini, de 11 anos de idade, assassinado pelo pai e pela madrasta, na cidade de Três Passos, no Rio Grande do Sul. À época, o caso chamou a atenção do público pe- los inúmeros episódios de descasoe desatenção aos quais a criança foi submetida, culminando em sua morte por superdosagem de medicamento aplicado pela madrasta. Para saber mais sobre o caso, acesse: 20 https://dracestar i . jusbrasi l .com.br/not i - cias/117368491/cotidiano-de-omissoes-carencia- -e-frieza-culminou-no-assassinato-de-bernardo- -boldrini. Direito à convivência familiar e comunitária O direito à convivência familiar e comunitária está previsto nos arts. 19 a 52-D do ECA e compreende o direito da criança e do adolescente de ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência fa- miliar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. (art. 19) Note que a lei tem como objetivo principal a manu- tenção do menor junto à sua família natural e, por isso, estabelece que sua retirada do seio familiar, nos casos em que o ambiente não é propício ao seu desenvolvimento, deve ser medida excepcional e temporária. E quem compõe a família natural? Segundo o art. 25 do ECA, “entende-se por família natural a comu- nidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes”. O parágrafo único do artigo inclui nessa definição a família extensa ou ampliada, que é “aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetivida- 21 de”. Já a família substitua é aquela formada em razão de tutela, guarda ou adoção. (art. 28) Assim sendo, o menor deverá estar sob os cuidados da família natural. Não sendo isso possível, deverá ser encaminhado a um dos integrantes da família extensa. Se tal providência também for inviável, o menor, então, deverá ser encaminhado a uma família substituta. Sempre que possível, a criança ou o adolescente deverá ser ouvido por equipe interprofissional, antes dos procedimentos de colocação em família substi- tuta (art. 28, §1º). Em se tratando de criança maior de 12 anos, será necessário o seu consentimento, colhido em audiência (art. 28, §2º). Nos termos do art. 28, §3º, o pedido de colocação em família substituta deverá levar em consideração o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade com os membros da família substituta, a fim de evitar ou minorar as consequências decor- rentes da medida (art. 28, §3º). O §4º do art. 28 estabelece que os grupos de irmãos serão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família substituta, salvo comprovada existên- cia de risco de abuso ou outra situação que justifique a separação, procurando-se, em qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais. A colocação em família substituta estrangeira cons- titui medida excepcional, somente admissível na mo- dalidade de adoção (art. 31). A Lei nº 12.010/2009 22 (Lei de Adoção) estabelece a ordem de preferência na adoção: terá prioridade a família extensa; em seguida, a adoção nacional e, após, a adoção internacional. Guarda (arts� 33 a 35) A guarda é uma modalidade de colocação em família substituta, que se destina a regularizar a posse de fato da criança ou do adolescente. Poderá ser defe- rida liminar ou incidentalmente nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no caso de adoção por estrangeiros (art. 33, §1º). O detentor da guarda deve prestar assistência mate- rial, moral e educacional à criança ou adolescente, e ela é sempre provisória, durando até o momento da devolução do menor à sua família natural ou até o seu encaminhamento para uma família substituta. A guarda não se confunde com o dever de guarda decorrente do exercício do poder familiar, que signi- fica o zelo que os pais devem ter com seus filhos, e está previsto nos arts. 1.566, inc. IV; 1.583 e 1.584 do Código Civil. Assim, a guarda apenas existirá se for descumpri- do o dever de guarda pelos pais da criança ou do adolescente. Nesse sentido, o §5º do art. 1.584 do Código Civil dispõe que “se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, 23 o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade”. Excepcionalmente, a guarda poderá ser deferida fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situa- ções peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados (art. 33, §2º). O deferimento da guarda a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de re- gulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público, exceto se houver decisão em sentido contrário da autoridade judiciária competente ou quando a medida for aplicada em preparação para a adoção (art. 33, §4º). De acordo com o art. 35 do ECA, “a guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público”. SAIBA MAIS Como você já estudou, o dever de guarda não se confunde com a modalidade de colocação em família substituta sob a forma de guarda. Nosso ordenamento jurídico prevê quatro tipos de guarda decorrentes do poder familiar: unilateral, compar- tilhada, alternada e o aninhamento. Para conhe- cê-las, assista ao vídeo AGU Explica – Tipos de guarda, disponível em: 24 h t t p s : / / w w w . y o u t u b e . c o m / watch?v=rLNxhLSnTp8&ab_channel=Advocacia- -GeraldaUni%C3%A3oAGU. Tutela (arts� 36 a 38) A tutela é a modalidade de colocação em família substitua que, além de regularizar a posse de fato da criança ou do adolescente, também permite ao tutor exercer atos de representação, permitindo a ad- ministração de bens e interesses do menor. A tutela será deferida a pessoa de até 18 anos incompletos, e seu deferimento pressupõe a prévia decretação da perda ou suspensão do poder familiar, implicando, necessariamente, o dever de guarda (art. 36 e pará- grafo único). O art. 37 do ECA prevê a hipótese de instituição de tutela testamentária. Nessa modalidade, os pais, em conjunto, nomeiam um tutor para a criança ou ado- lescente em um ato de disposição de última vontade (testamento, codicilo ou legado). De acordo com esse dispositivo legal, aberta a su- cessão, o tutor terá o prazo de 30 dias para ingressar com pedido judicial de colocação da criança ou do adolescente em família substituta. Essa exigência tem por objetivo propiciar o controle judicial do ato, permitindo que sejam verificados os requisitos e con- dições que devem ser respeitados para a formaliza- ção da tutela. (ROSSATO, 2019, p. 198) 25 O parágrafo único do art. 37 determina que, na apre- ciação do pedido, deverão ser observados “os requi- sitos previstos nos arts. 28 e 29 dessa Lei, somente sendo deferida a tutela à pessoa indicada na dispo- sição de última vontade, se restar comprovado que a medida é vantajosa ao tutelando e que não existe outra pessoa em melhores condições de assumi-la”. Segundo o art. 38, aplica-se à destituição da tutela o disposto no art. 24, que impõe que “a perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas judi- cialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obri- gações a que alude o art. 22”. (dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores) Adoção (arts� 39 a 52) A adoção constitui medida de colocação em família substituta, gerando parentesco civil entre o adotante e o adotado, e é disciplinada pelo ECA. É medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manuten- ção da criança ou adolescente na família natural ou extensa. (art. 39 e §1º) O ECA veda a adoção por procuração, o que ocorria muito nas adoções internacionais. A presença dos adotados perante o Magistradopermite-lhe uma me- lhor avaliação para a concessão da adoção e evita eventual distorção, que poderia ser prejudicial ao adotado. (ELIAS, 2010, p. 51) 26 A adoção atribui a condição de filho ao adotado, que passará a ter os mesmos direitos e deveres, inclusi- ve sucessórios, que os filhos biológicos. O adotado deixa a família de origem, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais. (art. 41) O §1º do art. 41 dispõe que, se um dos cônjuges ou concubinos (companheiros) adota o filho do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante e os respec- tivos parentes. O §2º do art. 41 ressalta a existência de direito suces- sório entre o adotado, seus descendentes, o adotan- te, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o 4º grau, observada a ordem de vocação hereditária. Para a adoção conjunta, é indispensável que os ado- tantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (art. 42, §2º) Quanto aos requisitos para a adoção, Rossato (2019, p. 216) divide-os em subjetivos e objetivos. Os requisitos subjetivos para a adoção são: (i) idoneidade do adotante; (ii) existência de motivos legítimos para a adoção, que se traduz no desejo de filiação, ou seja, na von- tade de ter a pessoa em desenvolvimento como filha; (iii) reais vantagens para o adotando (art. 43), isto é, a convivência familiar e estabelecimento de vínculo 27 adequado à formação e ao desenvolvimento da per- sonalidade do adotando; (iv) prevalência dos interesses do adotando (art. 39, §3º). São requisitos objetivos para a adoção: (a) idade: podem adotar os maiores de 18 anos, mas o adotante deve ser, pelo menos, 16 anos mais velho que o adotando (art. 42 e §3º); (b) consentimento dos pais ou destituição do poder familiar e consentimento do adolescente: o consenti- mento é dispensado no caso de pais desconhecidos ou de destituição do poder familiar (art. 45, §1º), e obrigatório em se tratando de adotando maior de 12 anos de idade; (c) estágio de convivência: a adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adoles- cente, pelo prazo máximo de 90 dias, observadas a idade da criança ou adolescente e as peculiarida- des do caso (art. 46). O estágio será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar (art. 46, §4º); (d) prévio cadastramento: em regra, a família substi- tuta que não estiver cadastrada no cadastro de ado- ção não poderá adotar. A inscrição no cadastro é feita por meio de um procedimento específico, regulado a partir do art. 179-A do ECA. 28 Quanto aos impedimentos para a adoção, não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando. (art. 42, §1º) O vínculo da doação se constitui por sentença judi- cial, que será inscrita no registro civil (art. 47), e o prazo máximo para conclusão da ação de adoção será de 120 dias, prorrogável uma única vez por igual período, mediante decisão fundamentada da autori- dade judiciária. (art. 47, §10) Para concluirmos o estudo da adoção, vamos anali- sar brevemente a adoção internacional. Adoção internacional não significa a adoção por estrangeiros, mas sim, que alguém que mora em determinado país pretende adotar uma pessoa que mora em outro país (art. 51). Assim, se um brasileiro que mora nos Estados Unidos quiser adotar uma criança brasileira, terá de se submeter às regras da adoção internacional. Aqui, é importante lembrar que a adoção internacio- nal é a exceção, ou seja, deverá ser concedida apenas quando esgotadas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira. Direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer (arts� 53 a 59) O ECA está conforme com a Constituição Federal que, no Capítulo III do Título VIII – Da Ordem Social, trata de três direitos de titularidade de todas as pes- 29 soas: educação, cultura e desporto, neste último es- tando incluído o lazer. As normas constitucionais sobrepõem-se ao ECA, notadamente em relação à educação, pois a redação dos dispositivos 53 a 59 não se encontra em con- sonância com a Constituição, principalmente após as Emendas Constitucionais nº 14/1996 e 59/2009. (ROSSATO, 2019, p. 247) Neste tópico, vamos dar ênfase ao direito à educa- ção, já que este é, sem dúvida, o aspecto mais rele- vante, pois propicia à criança e ao adolescente seu pleno desenvolvimento. O art. 208, inc. I da Constituição Federal estabelece que constitui dever do Estado assegurar “educação básica obrigatória e gratuita dos 4 aos 17 anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade pró- pria”. Portanto, a educação básica englobará o ensino fundamental, o ensino médio e o ensino superior. Nesse contexto, de acordo com o art. 55 do Estatuto, “os pais ou responsável têm a obrigação de matricu- lar seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”. Segundo o art. 54, §2º do ECA, “o não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua ofer- ta irregular importa responsabilidade da autoridade competente”. No que concerne aos demais direitos, o art. 59 do ECA determina que cabe aos municípios, com apoio dos estados e da União, estimular e facilitar a des- 30 tinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infân- cia e a juventude. Direito à profissionalização e à proteção no trabalho (arts� 60 a 69) Em razão da adoção da doutrina da proteção integral, a criança e o adolescente têm os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários que os adultos. (art. 227, §3º, CF) O estudo dos direitos trabalhistas da criança e do adolescente deve levar em consideração a análise conjunta de várias normas jurídicas, dentre elas, a CLT, o ECA e a Constituição Federal. Rossato (2019, p. 258) elaborou um quadro-resumo, que denomina de núcleo do direito fundamental à profissionalização e à proteção do trabalho de crianças e adolescentes: (i) proibição de trabalho aos menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir dos 14 anos; (ii) proibição do trabalho noturno, perigoso, insalubre e penoso, bem como o realizado em locais prejudi- ciais à sua formação e em horários que não permi- tam a frequência à escola; (iii) duração de trabalho diferenciada; (iv) não corre contra eles o prazo prescricional, inde- pendentemente da idade; (v) acesso à escola; 31 (vi) apesar de não completada a maioridade, po- dem receber salários independentemente da assis- tência dos pais, porém não podem receber verbas rescisórias. (viii) excepcionalmente, o ordenamento jurídico ad- mite hipóteses restritivas de direitos trabalhistas, nos casos do estágio e trabalho educativo, bem como uma hipótese diferenciada de contrato de trabalho denominada aprendizagem. 32 PROTEÇÃO JUDICIAL DOS INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS E COLETIVOS Os arts. 208 a 224 do ECA dispõem sobre as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos asse- gurados à criança e ao adolescente. Essas ações devem ser propostas perante as Varas da Infância e Juventude onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão do poder público, ressalvadas a competên- cia da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores. (arts. 208 e 209) São legitimados para a propositura dessas ações (art. 210): I. o Ministério Público; II. a União, os estados, os municípios, o Distrito Federal e os territórios; III. as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institu- cionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por esta Lei, dispensada a autorização da assem- bleia, se houver prévia autorização estatutária. Em caso de desistência ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ououtro legitimado poderá assumir a titularidade ativa (art. 210, §2º). 33 O §1º do art. 210 admite o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União e dos estados na defesa dos interesses e direitos da criança e do adolescente. Desse modo, se o Ministério Público Federal mover ação contra a União ou ente autárquico federal na Justiça Federal, envolvendo, também, o Estado ou au- tarquia estadual (ou o Município), poderá o Ministério Público Estadual integrar o polo ativo, em litisconsór- cio. (ELIAS, 2010, p. 792) O art. 211 do ECA reproduz o art. 5º, §6º da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), autorizando a celebração de termo de ajustamento de conduta, pelo qual a entidade devedora se compromete a sa- nar a falha ou omissão em determinado prazo. Não o fazendo, pode-se executar o acordo diretamente, sem a necessidade de processo de conhecimento. (ELIAS, 2010, p. 792) De acordo com o art. 212, para a defesa dos direitos e interesses infantojuvenis, são admissíveis todas as espécies de ações pertinentes, inclusive o mandado de segurança (§2º) e as ações de obrigação de fazer e de não fazer (art. 213), aplicando-se subsidiaria- mente o Código de Processo Civil. (art. 212, §1º) FIQUE ATENTO Certo é que a ação civil pública é o instrumento para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos da criança e do adoles- 34 cente. Mas esta ação poderia ser utilizada na de- fesa de interesses de uma só criança? Os direitos fundamentais de crianças e adolescente possuem dupla titularidade, pois pertencem aos próprios indivíduos e também à sociedade, e, portanto, são considerados indisponíveis. Esses direitos não se confundem com direitos patrimoniais, cuja tutela apenas pode ser buscada pelos próprios indivíduos lesados. Logo, tratando-se de direito de persona- lidade, como são os seus direitos fundamentais, dotados de valor social, a sua tutela poderá ser buscada não só pelo próprio indivíduo, mas tam- bém por outros legitimados. Assim, o rol de legiti- mados para a propositura de ação civil pública em defesa dos interesses individuais de uma criança não está adstrito ao art. 210 do ECA, podendo ser proposta, por exemplo, pela Defensoria Pública. (ROSSATO, 2019, p. 591) Nas ações de obrigação de fazer ou não fazer em que for cominada multa diária, o valor apurado deve- rá ser revertido ao fundo gerido pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do respectivo município (art. 214). Novamente reproduzindo a Lei da Ação Civil Pública (art. 8º, §1º), o Ministério Público poderá instaurar inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pessoa, orga- nismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a dez dias úteis. Por fim, o art. 224 estabelece que se aplicam, sub- sidiariamente, no que couber, as disposições da Lei nº 7.347/85. 35 CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste módulo, estudamos os direitos da criança e do adolescente assegurados pela Constituição Federal e pelo ECA. Em 2020, o ECA completou 30 anos de existência, porém, sabemos que ele ainda não é cumprido em nosso país. Os avanços foram vários, não se pode negar. Entretanto, ao invés de estarmos discutindo como assegurar os direitos infantojuvenis já positiva- dos, ainda estamos discutindo temas como proibição do trabalho infantil e redução da maioridade penal. Assim, devemos refletir sobre o que nós podemos fazer por nossas crianças e adolescentes. Afinal, somos membros de uma sociedade, que tem o dever de assegurar, com absoluta prioridade, a proteção integral infantojuvenil. E o insucesso de uma criança ou de um adolescente é, também, o nosso insucesso enquanto sociedade. 36 Referências Bibliográficas & Consultadas ALCÂNTARA, G. K.; MAIA, L. M.; TINÔCO, L. N. Índios, direitos originários e territorialidade. Brasília: Editora ANPR, 2018. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/ portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_ biblioteca/bibli_servicos_produtos/BibliotecaDigital/ BibDigitalLivros/TodosOsLivros/Indios-direitos- originarios-territorialidade.pdf. Acesso em: 13 jul. 2020. BRASIL. Ministério Público Federal. Câmara de Coordenação e Revisão, 6. Manual de jurisprudência dos direitos indígenas. 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais. – Brasília: MPF, 2019. Disponível em: http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr6/docu- mentos-e-publicacoes/manual-de-atuacao/manual- -de-jurisprudencia-dos-direitos-indigenas.pdf. Acesso em: 13 jul. 2020. ELIAS, R. J. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. FIORILLO, C. A. P. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. [Minha Biblioteca] LOYOLA, K. H.; NEVES, G. B.; ROSA, E. Estatuto do idoso. São Paulo: Rideel, 2016. [Biblioteca Virtual] MIGALHAS. Barroso propõe repercussão geral sobre a obrigatoriedade de pais vacinarem fi- lhos. Disponível em: https://migalhas.uol.com.br/ quentes/331828/barroso-propoe-repercussao- -geral-sobre-a-obrigatoriedade-de-pais-vacinarem- -filhos?fbclid=iwar1z-oefwbamijgtdde4_nj-fyvg3cu- 4fknxzy4poe6iarghpov2s6qurty. Acesso em: 25 out. 2020. NUCCI, G. S. Estatuto da criança e do adolescente comentado. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018. [Minha Biblioteca] PHILIPPI JUNIOR, A.; FREITAS, V. P.; SPÍNOLA, A. L. S. Direito ambiental e sustentabilidade. Barueri: Manole, 2016. [Biblioteca Virtual] RAMIDOFF, M. L. Direitos difusos e coletivos IV (esta- tuto da criança e do adolescente). São Paulo: Saraiva, 2012. [Minha Biblioteca] RIBEIRO, L. L. G. et al. Comentários ao estatuto do idoso. São Paulo: Saraiva, 2016. [Minha Biblioteca] ROSSATO, L. A. Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069/90 – comentado artigo por artigo. 11. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. [Minha Biblioteca] SIRVINSKAS, L. P. Legislação de direito ambiental. 11. ed. São Paulo: Rideel, 2016. [Biblioteca Virtual] SIRVINSKAS, L. P. Manual de direito ambiental. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. [Minha Biblioteca] Introdução Disposições preliminares Doutrina da proteção integral (art. 1º) Definição de criança e adolescente A criança e o adolescente como sujeitos de direitos fundamentais (arts. 3º e 5º) Dever de efetivação dos direitos da criança e do adolescente (art. 4º) Interpretação do ECA (art. 6º) Direitos fundamentais Direito à vida e à saúde (arts. 7º a 14) Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (arts. 15 a 18) Direito à convivência familiar e comunitária Guarda (arts. 33 a 35) Tutela (arts. 36 a 38) Adoção (arts. 39 a 52) 3.4 Direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer (arts. 53 a 59) 3.5 Direito à profissionalização e à proteção no trabalho (arts. 60 a 69) Proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos Considerações finais Referências Bibliográficas & Consultadas
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