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609 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO: ambiguidade e contingência Fabio M. Serrano Pucci* Maura P. B. Véras** * Universidade Federal de São Carlos. Departamento de Sociologia. Rod. Whashington Luís 235. Monjolinho. Cep: 13565-905. São Carlos – São Paulo – Brasil. Caixa-postal: 676. fabiosop@msn.com https://orcid.org/0000-0001-9817-7864 ** Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Departa- mento de Sociologia. Programa de Estudos Pós Graduados em Ciências Sociais. Rua Monte Alegre, n. 984. Perdizes. Cep: 05014-001. São Paulo – São Paulo – Brasil. mauraveras9@gmail.com / mmveras@pucsp.br https://orcid.org/0000-0003-3927-6787 http://dx.doi.org/10.9771/ccrh.v32i87.25345 Este artigo tem como objetivo refletir sobre a questão da moradia entre imigrantes bolivianos em São Paulo, buscando investigar até que ponto existe uma correlação entre a “ilusão do provisório” – inerente à condi- ção do imigrante (Sayad, 1998) – e as formas precárias de habitar na cidade. Tais formas podem ser defini- das como moradias da pobreza e (ou) “nomadismo urbano” (Véras, 2003b; 2016a). A pesquisa, utilizando-se da combinação de método qualitativo, pelas entrevistas com bolivianos (nos bairros do Brás e Grajaú), e o quantitativo, por meio de levantamento dos dados de Censos Demográficos do IBGE, indica uma interde- pendência entre as formas precárias de habitar dos bolivianos e a ideia de provisoriedade que eles têm de sua permanência no país. Palavras-chave: Imigração. Bolivianos. Cidade. Moradia. Provisoriedade. INTRODUÇÃO São Paulo é, em certa medida, uma cida- de construída por imigrantes. Desde a segunda metade do século XIX, espanhóis, italianos e portugueses se firmaram ao longo das “orlas ferroviárias”, nos bairros de Belém, Brás, Bom Retiro, Pari, Mooca, Lapa e Ipiranga, inseridos no ciclo do café e de nossa primeira industria- lização, ensejando quase uma nova fundação da cidade (Rolnik, 2001; Véras, 2003a). Por vol- ta de 1900, dois terços da população residente na cidade eram estrangeiros (Véras, 2003a). Na segunda metade do século XX, após a se- gunda grande guerra, como se sabe, diminuiu a imigração estrangeira e houve um aumen- to no número de migrantes nacionais nesses bairros, especialmente nordestinos e mineiros. Em 1970, já ganhava importância o ramo da confecção no cenário econômico da capital, o qual era preenchido por imigrantes coreanos (Véras, 2000), embora, nas décadas de 1990 e 2000, mais e mais bolivianos estivessem inse- ridos nesse setor da costura. A imigração boliviana teve início na dé- cada de 1950, formada por jovens que queriam estudar e trabalhar no Brasil (principalmente trabalhadores liberais). A partir de 1980, no en- tanto, os bolivianos passam a constituir nume- rosa mão de obra no ramo da costura, indo tra- balhar para os coreanos (Silva, 1997). Depois, alguns bolivianos também acabam se tornando patrões e empregando seus compatriotas. No Gráfico 1, observa-se que a maior frequência entre os imigrantes bolivianos é masculina, e as faixas etárias predominantes nesse subconjunto são de 20 a 34 anos. Para as mulheres, predominam as faixas de 20 a 29 anos. No que se refere ao total da presen- ça boliviana, há divergências e dificuldades de mensuração quanto ao seu número real na cidade, pois existem muitos indocumentados, além de retornos, idas e vindas, o que preju- dica a elaboração de estimativas corretas. A 610 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 Pastoral do Imigrante estimava que, em 2005, havia perto de 80 mil na cidade de São Paulo (Silva, 2005). Segundo consulta realizada com a Polícia Federal, durante o período de 2006 a 2012, mais 73.377 bolivianos ingressaram no Brasil portando vistos. Em São Paulo, ainda se- gundo a Polícia Federal, há 59.526 nacionais da Bolívia efetivamente registrados no Sistema Nacional de Cadastro e Registro de Estrangei- ros (SINCRE). Segundo o censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís- tica (IBGE) de 2010, os bolivianos constituem o segundo grupo de imigrantes na cidade de São Paulo, precedidos apenas pelo contingente de portugueses. São considerados oficialmen- te como residentes no município paulistano 21.680 pessoas oriundas da Bolívia, que re- presentam 14,3% dos estrangeiros registrados nesse recenseamento, na primeira década do século XXI. Gráfico 1 – Pirâmide etária dos nascidos na Bolívia, residentes no Município de São Paulo Fonte: IBGE (2010) Em uma tentativa de resgatar o tema na literatura existente, o primeiro trabalho sobre bolivianos em São Paulo é de Sidney Antô- nio da Silva (Silva, 1997), no qual ele analisa a diáspora boliviana na cidade, as condições precárias de trabalho, a difícil inserção cultu- ral, entre outros dados. Em seguida, o autor estudou a religiosidade e as festas tradicionais desses imigrados (Silva, 2003). Além disso, há pesquisas que relacionam a subcontratação de mão de obra de bolivianos com a reestrutura- ção produtiva que ocorre no setor das confec- ções em São Paulo (Freire da Silva, 2008; Frei- tas, 2009; Preturlan, 2012). Outro grupo de trabalhos se debruça so- bre os assuntos do tráfico de pessoas e da es- cravização de bolivianos (Azevedo, 2005; Illes; Timóteo; Fiorucci, 2008; Timóteo, 2011). Ain- da há um conjunto de pesquisas que focaliza a questão da territorialidade e das trajetórias residenciais dos bolivianos, procurando com- preender sua mobilidade espacial e sua confi- guração socioespacial na Região Metropolitana de São Paulo (Souchaud, 2011; Xavier, 2010). Quanto à questão da moradia, há o trabalho de Simone (2014), que versa sobre a relação entre o “encortiçamento” de imóveis nos bairros do Belenzinho e Brás, e a presença de imigrantes bolivianos em oficinas de costura. Pucci (2011) e Vidal (2012) abordam a presença dos bolivianos nos bairros do Bom Retiro, Brás e Pari sob a perspectiva da alte- ridade, ou seja, a partir de como a vizinhança percebe a presença desses imigrados, por meio de reações muitas vezes preconceituosas e xe- nófobas. Baeninger e Simai (2010) se aproxi- mam dessa temática ao estudar o discurso de bolivianos e brasileiros sobre o preconceito. Este estudo identifica que os bolivianos aca- bam internalizando um discurso de estigma- tização produzido pelos brasileiros, encon- trando-se também trabalhos que enfocam a questão da segunda geração de bolivianos e dos conflitos produzidos, tanto entre bolivia- nos de primeira e segunda geração, como entre bolivianos de segunda geração e os brasileiros de mesma idade (Camargo de Oliveira, 2012; Huayhua, 2007; Paes, 2011). Outros estudos se voltam para a socia- bilidade entre bolivianos e brasileiros nas es- colas públicas, bem como no acesso deles às políticas de educação (Pucci, 2011; Pontedei- ro Oliveira, 2012; Magalhães, 2010). Por fim, há um grupo de trabalhos cujo objetivo é es- 611 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 tudar o acesso desses imigrantes à saúde, em São Paulo (Aguiar, 2013; Aguiar; Mota, 2014; Faleiros, 2012; Khouri, 2010; Martinez, 2010; Mascaro, 2014; Silveira et al., 2014). Entre tantos assuntos abordados pe- las teses e dissertações sobre bolivianos em São Paulo, nos interessa, especificamente, as questões relativas a territorialidade, moradia e alteridade. Este artigo se baseia em reflexões e em pesquisa de campo1 que estudou duas regiões paulistanas: um bairro central (Brás, por concentrar grande contingente de bolivia- nos e abrigar um importante espaço de socia- bilidade desse grupo, a Rua Coimbra), e um distrito periférico (Grajaú, por ter havidoum importante aumento de bolivianos na região, formando uma “ilha” com significativo con- tingente deles.). Tal estudo objetivou analisar as condições de moradia dos bolivianos em São Paulo, a exclusão desse grupo das políti- cas sociais (principalmente, as de habitação e saúde) e o seu envolvimento em movimentos de luta por moradia. Ao tratar da questão do acesso e condições de moradia desse grupo, pretende-se aqui, mais especificamente, obser- var a questão de como a “ilusão do provisório” (Sayad, 1998) – inerente à própria condição do imigrante – predispõe esses imigrados a se deslocarem, tornarem-se “nômades urbanos” (Véras, 2003b), condição caracterizada pela rotatividade de residência em moradias muito precárias e, na maioria das vezes, provisória. PRINCIPAIS REFERÊNCIAS CON- CEITUAIS Apresenta-se, a seguir, o breve quadro te- órico que fundamentou a pesquisa, ao enlaçar os temas da imigração, sua provisoriedade, ter- 1 A pesquisa empírica, para dissertação de mestrado, sob a orientação de Maura Véras, envolveu 22 entrevistas com imigrantes bolivianos nos dois bairros. Adotou-se como es- tratégia de campo o estabelecimento de contato com orga- nizações não-governamentais de assistência aos imigrantes e as governamentais. Foram realizadas entrevistas em duas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) no município de São Paulo, uma no Grajaú e outra no Brás. Foi obtido o consen- timento livre e esclarecido dos entrevistados. (Pucci, 2016) ritorialidade, alteridade e segregação. A ques- tão da habitação foi tomada como âncora de fixação dos bolivianos em um território e sua possibilidade de inserção na sociedade recep- tora, observando-se o paradoxo de ser um imi- grante. Tomou-se, como principal referência, a obra A Imigração ou os Paradoxos da Alterida- de, de Sayad (1998), que resgata a ambiguidade de pertencer e não pertencer a nenhum lugar. Para o autor, a contradição constitutiva do imi- grante se dá no sentimento de provisoriedade com que é vivida sua imigração: [...] não se sabe mais se se trata de um estado provi- sório que se gosta de prolongar indefinidamente ou, ao contrário, se se trata de um estado mais duradou- ro, mas que se gosta de viver com um intenso senti- mento do [de] provisoriedade (Sayad, 1998, p. 45). Analisar-se-ão, neste artigo, as conse- quências da ambiguidade em que vivem esses imigrados, suas formas de habitar em São Pau- lo e suas escolhas contingentes. No que se refere ao tema das migrações internacionais, em tempos de globalização, considera-se a teoria da transmigração, segun- do a qual se superam as antigas categorizações, como as do imigrante “temporário”, “de retor- no” ou “permanente”, uma vez que ele ainda mantém relações com a sociedade de origem (Sasaki; Assis, 2000). Além disso, busca-se le- var em conta tanto a abordagem neoclássica, segundo a qual a motivação para migrar se ba- seia em um cálculo individual racional, quan- to a histórico-estrutural, pela qual o indivíduo vê as suas escolhas limitadas pelo contexto so- cial mais amplo (Muniz, 2002; Patarra, 2006). Nesse sentido, é possível ainda optar por uma terceira alternativa, uma abordagem domici- liar (ou familiar), que considera que as deci- sões são tomadas por grupos de pessoas, como famílias e domicílios (Muniz, 2002). Já sobre a territorialidade, tomam-se Véras (2003a), San- tos (1987) e Carneiro (2009) como referências. Os territórios, considerados como lugares em que há identificação de seus ocupantes (San- tos, 1987), são “espaços de permanência e si- 612 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 multaneamente de passagem dos imigrantes que promovem sua adaptação às novas condi- ções de vida” (Silveira et al., 2014, p. 97). Por isso, a moradia é de grande importância, pois fixa em um território, quer como opção, quer como contingência possível. Em seu amplo significado, morar vai além de ocupar uma edificação em si (teto, pa- rede e piso), mas abrange o acesso ao solo urba- no e suas benfeitorias de infraestrutura (abas- tecimento de água, saneamento, serviços de eletricidade, transporte, sistema viário), equi- pamentos sociais (principalmente educação, saúde e cultura) e paisagem. No capitalismo, as classes trabalhadoras precisam, com seus salá- rios, buscar condições de vida e, em especial, o acesso à moradia e a reprodução da força de trabalho, representada pela habitação adequa- da, que é obstaculizada pelos altos preços no mercado de terra e da construção civil. A casa, encarada como propriedade privada, torna-se mercadoria cara e custosa, e segmentos nume- rosos necessitam de subsídios ou financiamen- tos para sua aquisição ou mesmo locação. O solo urbano, produzido coletivamen- te, é apropriado individualmente e por quem pode pagar e se distribui por estratos sociais que dispõem ou não dos meios de consumo coletivo. Tais espaços são discriminados pelo preço da terra, apresentando contrastes entre bairros de excelentes localizações e outros vistos como malditos, jogados na subalterni- dade. O jogo entre capital e Estado desempe- nha grande papel nisso, resultando em cidades heterogeneamente divididas, geralmente pela renda de seus moradores, eventualmente se- gregados por razões étnicas e culturais (Véras, 1980, 2003b). O Estado, ao favorecer as condições necessárias ao capital, implanta os serviços e equipamentos urbanos de forma desigual, acentuando as desigualdades sociais e no ter- ritório. Políticas sociais, no tocante à habitação popular no Brasil, sempre se mostraram anco- radas em mecanismos seletivos e financeiros, exigindo estabilidade de emprego e de renda, o que alijou parcelas consideráveis da população que não dispunham de tais condições. Grande parte da demanda por habitações para a faixa de baixa renda não é atendida, e a saída des- sa situação é a busca por soluções precárias, como favelas, cortiços, loteamentos irregula- res de periferia, ocupações de áreas de risco e zona de mananciais, além de outras formas do mercado informal, constituindo-se uma cida- de ilegal, ao arrepio das exigências e posturas municipais. Um quadro com estatísticas esti- mativas sobre tais segmentos da precariedade em São Paulo, oscilando em cerca de 40% dos residentes no município, pode ser buscado em diversas fontes e na própria municipalidade (Pasternak, 2016; Véras, 1987, 2003b, 2016a). Para tratar a questão da ausência de di- reitos na cidade, especialmente no que tange à questão de moradia, Kowarick (2009) nos apon- ta que se vive em um contexto de “fragilização da cidadania”, que pode ser entendido como a: [...] perda ou ausência de direitos e [...] precarização de serviços coletivos que garantiam uma gama mí- nima de proteção pública para grupos carentes de recursos – dinheiro, poder, influência – para enfren- tar intempéries nas assim denominadas metrópoles do subdesenvolvimento industrializado (Kowarick, 2009, p. 76, grifos do autor). A maior parcela da massa assalariada não consegue adquirir habitação no mercado regular. Disso decorre o fato de que a “crise de habitação”, ou o seu “déficit”, “nada mais é do que a existência de grandes faixas populacio- nais sem meios para comprá-la” (Véras, 2003b, p. 327). Assim, o que leva a isso é a escassez da produção de moradia, o encarecimento do cus- to de vida e o preço elevado da terra, acima do seu valor real (potenciado pela mercantiliza- ção, financeirização e especulação imobiliária). No que tange à questão do significado da casa própria e sua matriz conservadora, segun- do Bonduki (1998), resgata-se a origem: “para o trabalhador urbano, a casa própria simboliza- va o progresso material. Ao viabilizar o acesso à propriedade, a sociedade estaria valorizando o trabalho, demonstrando que ele compensa, 613 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S alva d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 gera frutos e riqueza” (Bonduki, 1998, p. 84). Contudo a produção de moradia – sob a ótica capitalista – se conforma às leis de oferta e pro- cura e enfoca a “demanda solvável”, ou seja, aquela parcela que, de fato, tem condições de quitar um imóvel em um período de tempo razoável (já que é um investimento de longo prazo). A ausência ou os vícios mercantis da intervenção do Estado causam um “estrangu- lamento das condições de reprodução da força de trabalho” (Véras, 2003b, p. 329). “Em síntese, a cidade capitalista difi- culta seu consumo para os pobres, pois é vis- ta como capital constante pelos proprietários que usam o ‘ambiente construído’, assim como usaram a máquina na produção fabril” (Véras, 2003b, p. 334). Assim, surgem pessoas designadas pela condição precária em que vivem – favelados, encortiçados, moradores da periferia, além dos moradores de rua, “homeless, sansabris, under- class” (Véras, 2003b, p. 332, grifos da autora). Ou ainda, segundo termo usado pela autora, constituem os “novos nômades urbanos”. Nes- se conceito se abrigam os moradores da preca- riedade, que costumam ser removidos, quer pe- los chamados projetos de obras públicas, como no caso de favelados, de loteamentos irregula- res, sem a legalidade da posse de um lote, quer para os inquilinos informais despejados dos cortiços. Há ainda a população moradora de rua – todos sem direito à raiz, ao território, con- tinuamente expulsos, desalojados, removidos, relegados e vítimas de discriminação. Marques (2005) reforça o conceito de “se- gregação” como separação e desigualdade de acesso, destacando que quanto maior é a segre- gação de um grupo, mais se reforça o discurso do racismo em relação a ele. No tema da alteri- dade, considera-se a importância do outro em nossa própria formação identitária; há certa gra- dação entre o outro próximo e o outro distante, e nesse caso, um “não-nós”. Assim, as relações com o “outro-nós” e o com o “outro-estranho” vêm sofrendo mudanças nas cidades de hoje, que nos apresentam uma diversidade de pesso- as e possibilidades de conhecimento. O outro aparentemente vai se tornando comum, mas nem sempre acolhido e, mesmo que não inusi- tado, quando esse estranho passa a frequentar espaços antes exclusivos de determinados gru- pos, ou sua aparência não representar vanta- gens aos dominantes, será visto como ameaça- dor. No momento em que terminar o encontro espontâneo, o estigma irá se explicitar (Jodelet, 1998). Ainda como referência importante, há os conceitos de estabelecidos e outsiders, que nos revelam como um grupo mantém o outro em condição de subalternidade por meio da estig- matização (Elias; Scotson, 2000). No que se refere ao conceito de “identi- dade”, remete-se a Castells (1999), que formula o conceito de “identidade de resistência”, que é “criada por atores que se encontram em po- sições/condições desvalorizadas e/ou estigma- tizadas pela lógica da dominação” (Castells, 1999, p. 24). Para Hall (2003), um tema caro na abordagem sobre imigrantes é a identidade cultural, ou as possibilidades de mudança, que se imbricam no “hibridismo” e se referem a “um processo de tradução cultural, agonístico, uma vez que nunca se completa”, mas que per- manece sem uma decisão. (Hall, 2003, p. 74). Esse processo implica uma revisão por parte da cultura de seus próprios sistemas de refe- rência, normas e valores. O reconhecimento das diferenças, ou a intolerância e, no limite, o racismo, surgem nesse contexto. Atualmente, existe uma nova forma de estigmatizar, que Wieviorka (2006) denomina “novo racismo”: [...] o “novo racismo” descreve diversos grupos a partir de suas particularidades culturais que os constituem como subconjuntos considerados inassi- miláveis, perigosos e nocivos, prontos a espezinhar os valores morais da nação e a abusar dos sistemas que ela elaborou para assegurar a seus membros uma certa solidariedade (Wieviorka, 2006, p. 169). Daí a necessidade de resgatar o conceito de “assimilação”, nos termos de Truzzi (2012), no que se refere à capacidade de recuperar a problemática de incorporação de imigrantes. 614 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 No entanto, é necessário fazer isso sem incor- rer no que esse conceito pode carregar de etno- centrismo – quando considera que os imigran- tes devem fatalmente ser assimilados a um pa- drão cultural vigente na sociedade receptora. Esse conceito de “assimilação ressignificada” aborda a relação dos imigrantes com a socieda- de receptora como uma via de mão dupla, na qual ambos os lados se influenciam reciproca- mente; aponta subconjuntos que nunca serão assimilados totalmente, como a “segmentada”. CONDIÇÕES DE MORADIA DOS BO- LIVIANOS EM SÃO PAULO: proviso- riedade, ambiguidade e contingência Nesse conjunto, os imigrantes de baixa renda vêm convivendo historicamente com a precariedade (Véras, 2016a). Das 4.805 unida- des domiciliares na cidade de São Paulo cujo responsável é boliviano, 77,3% são alugadas, enquanto 22,3% adquiriram ou financiaram a casa própria. A fonte (IBGE, 2010) não especi- fica se esse aluguel é pago pelos próprios mo- radores bolivianos ou se eles recebiam o valor do aluguel como parte integrante do salário2 (IBGE, 2010). Os indícios atuais apontam que os boli- vianos vivem em condições habitacionais ina- dequadas. A maioria reside de aluguel em mo- radias coletivas mistas, com o uso de atividade da confecção de oficinas de costura, improvi- sando adaptações nos imóveis, o que os torna inseguros. Segundo o IBGE (Censo Demográfi- co de 2010), há diferentes variáveis que podem ser levadas em conta no momento de avaliar a adequação ou não de um domicílio.3 No Mu- 2 Segundo o IBGE, em suas notas metodológicas relativas ao Censo Demográfico de 2010, considerou-se o domicílio como “alugado” quando “o aluguel era pago por um ou mais moradores”, mas também quando “o empregador (de qualquer um dos moradores) pagava, como parte integran- te do salário, uma parcela em dinheiro para o pagamento do aluguel.” (Grifos nossos). Disponível em:<ftp://ftp.ibge. gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Familias_e_Do- micilios/censo_fam_dom.pdf>. 3 Segundo as notas técnicas do Censo Demográfico de 2010, a moradia é considerada adequada quando atende “a todas as seguintes condições: até dois moradores por nicípio de São Paulo (MSP), dos 11.253.504 habitantes em 2010, 7.237.446 (64,3%) vivem em moradias adequadas. Enquanto isso, do to- tal de bolivianos que viviam na cidade de São Paulo em 2010 (21.680), apenas 8.988 (41,5%) estavam alojados em moradias adequadas. Isso revela uma porcentagem muito menor de bo- livianos vivendo em moradias adequadas do que a média no MSP (41,5% contra 64,3%). Segundo o Censo Demográfico de 2010, a média de moradores por dormitório nos do- micílios dos bolivianos residentes no muni- cípio de São Paulo é 2,62, enquanto a média no MSP é de 2,16 moradores por dormitório4. Esses dados sugerem a presença de quartos su- perlotados nos domicílios de bolivianos. Ainda para essa fonte, dos 15.812 bolivianos que têm alguma ocupação no município de São Paulo, dois terços (67,7%) trabalham no próprio do- micílio. Segundo alguns autores de referência (Dornelas, 2009; Illes; Timóteo; Fiorucci, 2008; Silva, 1997), a conjugação dos espaços de tra- balho com o de moradia gera promiscuidade, convivência forçada e, em alguns casos, até mesmo danos à saúde dos trabalhadores. É relevante destacar que o aluguel é um problema para os bolivianos, sendo os princi- pais óbices encontrados a formalidade exigida pelos contratos, os altos preços cobrados e a resistência de alguns proprietários. Como con- sequência, procuram por alternativas como o apoio dos parentes. No entanto, Xavier (2010) revela que esses imigradostêm o desejo de se tornar independentes de seus patrões e pa- dormitório; abastecimento de água por rede geral de distri- buição; esgotamento sanitário por rede geral de esgoto ou pluvial, ou por fossa séptica; e lixo coletado, diretamente por serviço de limpeza ou em caçamba de serviço de lim- peza” (IBGE, 2010, p. 34). 4 O IBGE (2010) considera adequados os domicílios com até 02 moradores por dormitório. Entretanto, segundo a metodologia da Fundação João Pinheiro (FJP, 2018) – que é adotada oficialmente pelo Governo Federal do Brasil –, há “densidade excessiva de moradores por dormitório” quan- do há, em média, mais de três moradores por dormitório. Já para a Organização Mundial da Saúde (WHO, 2018), esse número pode variar a depender do tamanho e do tipo de moradia, do tamanho dos quartos e das características de seus moradores (idade, gênero e tipo de relacionamento que estabelecem entre si). Assim, por exemplo, uma mo- radia pode ser considerada com densidade excessiva caso haja dois moradores por dormitório, mas não será no caso de esses moradores serem cônjuges (WHO, 2018, p. 22). 615 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 rentes, ou seja, querem poder bancar a pró- pria moradia. Como consequência, é cada vez maior a presença de bolivianos que residem em cortiços, favelas e ocupações (Pucci, 2011, 2016; Xavier, 2010). Muitas constatações apontam que os bolivianos podem ser considerados como “nô- mades urbanos” (Véras, 2003b). A principal característica é o aluguel e a rotatividade. Os bolivianos relatam dificuldades de adquirir a casa própria e até mesmo de alugar imóveis. Tanto no bairro do Brás quanto no do Grajaú, eles sofrem uma “discriminação das imobiliá- rias”. A fala seguinte ilustra bem esse fato: Geralmente, aqui no Brasil, ou aluga uma casa para moradia ou aluga uma casa comercial. Ou é resi- dencial ou é comercial. Mas nós, bolivianos, que trabalhamos em casa, alugamos a casa para traba- lhar e para morar. Ou seja, que muitas imobiliárias, a maioria, não aceita isso. A discriminação começa em que eles pedem fiador. (Rodriguez, boliviano, dono de um empreendimento no Brás, há 33 anos no país) Os bolivianos apresentam uma pecu- liaridade com a qual as imobiliárias não estão acostumadas a lidar, que é a conjugação de trabalho com moradia. Muitos imigrantes pro- curam alugar casa com o objetivo de montar um negócio, e não simplesmente morar. As imobiliárias, então, colocam como condição o pagamento de três a cinco aluguéis adiantados, para evitar que os locatários permaneçam me- nos tempo do que isso. A alternativa, muitas vezes, é alugar um quarto de cortiço no mer- cado informal, o que ocorre principalmente no bairro do Brás. A “discriminação das imo- biliárias”, no entanto, é ainda maior quando se trata da aquisição de casa própria. Os boli- vianos dificilmente possuem meios para com- provar estabilidade no país, como um emprego registrado, que os permita adquirir um finan- ciamento de longo prazo. A maior parte deles trabalha no ramo da costura, na informalidade. Os bancos não aceitam oferecer crédito imo- biliário aos migrantes, uma vez que receiam decisão de não residir mais no país. Esse “descrédito” dificulta muito a aquisição da casa própria e impulsiona os bo- livianos a praticarem todas as formas de “no- madismo urbano”, seja a autoconstrução nas periferias (como o Grajaú), seja o aluguel de cortiços nos bairros centrais (como o Brás). Os altos preços dos aluguéis no Brás fazem com que muitos bolivianos acabem se mudando, assim que decidem montar a própria oficina e trabalhar por conta própria. Observe-se que, ao chegarem ao país, eles costumam morar na oficina de um patrão e, portanto, não necessi- tam pagar um aluguel. As trajetórias residen- ciais dos imigrantes – a partir desse primeiro impulso de sair da casa do patrão – são marca- das por muitas inconstâncias, descontinuida- des e incertezas. Mesmo no Grajaú, onde o aluguel é mais acessível do que no Brás,5 os preços fazem com que eles tenham de viver em regiões cada vez mais afastadas. Isso ocorreu com um casal de bolivianos residente no distrito do Grajaú, que só conseguiu adquirir uma casa própria próxi- ma à represa Billings, no bairro do Jardim Bel- cito, considerando-se que as áreas mais próxi- mas do Terminal Grajaú da CPTM valorizaram muito, e se tornaram inviáveis financeiramen- te. A seguinte fala exemplifica a dificuldade desse casal em adquirir a casa própria, devido ao “descrédito” dado aos bolivianos e à própria especulação imobiliária: Tem uma imobiliária aqui, no Parque América. As- sim que a gente entrou, ele falou assim: “Você quer [o] que?”. Aí eu falei: “Eu to procurando casa”. [Ele respondeu:] “A gente só tem acima de 500 mil”. As- sim, de cara, né? Assim, como pra falar pra gente, né, que a gente não poderia ceder a essa casa de 500 mil, né? Mas ele não sabe o nosso potencial, não sabe como a gente faz para ganhar nosso dinheiro. Aí eles meio que barram a gente, né? Assim, que a gente não pode, ou não merece ganhar, ter uma casa bonita, né? (Tamires, boliviana, trabalha como salgadeira, há 8 anos no país, moradora do Jardim Belcito, no Grajaú) 5 Segundo os entrevistados, o aluguel de uma casa no Brás estava entre R$ 1.500,00 e R$ 2.000,00 em 2015, enquanto, no Grajaú, variava entre R$ 500,00 e R$ 700,00. 616 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 Nessa fala é possível perceber dois ele- mentos. O primeiro é aquele, já mencionado, de que as imobiliárias não confiam crédito aos estrangeiros, uma vez que eles não possuem carteira registrada e, portanto, não conseguem comprovar que possuem meios para pagar um financiamento de longo prazo. O segundo elemento é o de que as empreiteiras só estão interessadas em oferecer casas de alto padrão, acima de R$ 500 mil, pois são mais rentáveis. Isso cria um gargalo no mercado, que não é preenchido pela iniciativa privada, gerando a já mencionada “demanda não solvável” (Véras, 2003b). No entanto, para além desses dois ele- mentos (de natureza lógica, econômica), há outro (de natureza subjetiva, qualitativa). É interessante destacar que a entrevistada cita- da acima menciona que se sentiu subestimada pela imobiliária que procurou. Diz a entrevis- tada que: “Mas ele [o vendedor da imobiliária] não sabe, o nosso potencial, não sabe como a gente faz para ganhar nosso dinheiro.” A entrevistada está reclamando do fato de que as imobiliárias estão engessadas para suprir a demanda de apenas um estilo de vida, de uma forma de se habitar. Mas não estão preparadas para lidar com outras formas de se habitar, de se viver. Os bolivianos possuem outra lógica na forma de habitar, daí a denominação: “viver ou- tramente”. As formas como as construtoras ou imobiliárias entendem que seus consumidores devem morar não se coadunam, entretanto, com esse “viver outramente” dos bolivianos (Pucci, 2016). Eles possuem especificidades, como a conjugação de moradia e trabalho, e maior pre- sença no mercado de trabalho informal. Mas isso não significa que sejam menos capazes de honrar com seus aluguéis ou com suas parcelas de financiamento da moradia. O próprio significado que os bolivia- nos atribuem à casa própria é muito diferen- te do significado que dela têm os brasileiros, por exemplo. Isso tudo faz com que eles sejam vistos como inquilinos ou promitentes com- pradores (de casa própria) indesejáveis pela maior parte de construtoras, imobiliárias ou locadores. Como afirma a entrevistada citada acima: “eles [construtoras, imobiliárias, loca- dores] meio que barram a gente, né? Assim, que a gente não pode, ou não merece ganhar, ter uma casa bonita, né?”. Ou seja, segundo construtoras, imobiliáriase locadores, os bo- livianos não merecem ter uma “casa bonita”, ou de alto padrão, uma vez que a relação deles com a moradia é outra, que não aquela imposta por essas entidades. Como os bolivianos não aceitam a forma padrão de lidar com a mora- dia, então lhes é negada a possibilidade de ter uma “casa bonita”. Esse padrão impositivo obstrui a possi- bilidade de se aprender com esse “viver outra- mente” dos bolivianos. Isso nos impede de: [...] crescer através de processos de encontro com o desconhecido. Coisas e pessoas que são estranhas podem perturbar ideias familiares e verdades esta- belecidas; o terreno não familiar tem uma função positiva na vida de um ser humano. Essa função é a de acostumar o ser humano a correr riscos, [...] [a] enriquecer as suas percepções, a sua experiência, e de aprender a mais valiosa de todas as lições huma- nas: a habilidade para colocar em questão as condi- ções já estabelecidas de sua vida. (Sennett, 1988, p. 359-60, grifos nossos). Ora, a atitude restritiva de construtoras, imobiliárias e locadores vai no sentido contrá- rio, que é o de impedir a reflexão. O encontro com o estrangeiro nos oferece a oportunidade de colocar em questão nossas formas de morar e de lidar com a cidade. Ele nos permite ques- tionar esses padrões e nos perguntar até que ponto existem outras formas de vida urbana e, mais especificamente, outras formas de habi- tar (Silvestri, 2011). Segundo a autora, “o olhar estrangeiro é o da distância, mas essa distân- cia, às vezes, nos revela coisas nas quais nem sequer pensávamos” (Silvestri, 2011, p. 484). Ainda segundo Silvestri (2011), a forma de habitar dos estrangeiros – um tanto nôma- de, sem ter uma residência fixa – pode ser ilus- trada pela metáfora de um barco que viaja por um rio, sendo esse barco entendido como uma “pátria flutuante”. Na viagem de barco: 617 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 [...] não se mede o espaço pelo relógio, mas pelas mudanças da luz ou do clima que anunciam dia e noite; pelas mínimas variações das margens ou pela qualidade da água que anunciam a proximidade de uma cidade; pela cor do horizonte que rapidamente pode ser apagada pelo nevoeiro ou nas nuvens de tormenta. Na viagem de barco se aprecia a verda- deira distância das coisas (Silvestri, 2011, p. 485). Essa metáfora propicia uma forma dis- tinta de refletir sobre o que é habitar, por meio da experiência do tempo e do espaço. Pensar o barco como “pátria flutuante” permite imagi- nar identidades menos rígidas do que as nacio- nalidades fixadas ou endereços estabelecidos. Heráclito6 diz que não nos banhamos duas ve- zes em um mesmo rio. E que é a própria cor- rente que faz do rio o que ele é. Nesse sentido, importa mais o caminho do que o resultado. Assim, pátria, para o imigrante, é esse barco em que ele navega os rios de sua trajetória, uma metáfora para se pensar que importa me- nos o resultado do percurso, mas, antes, o per- correr do caminho. Essa metáfora nos põe a refletir sobre as diferentes formas de habitar dos estrangeiros, a qual se denomina aqui de “viver outramen- te”. Na cidade capitalista, indiferente a essas lógicas diversas, essas diferentes formas de habitar se traduzem em precariedade e provi- soriedade. Os tripulantes da “pátria flutuante” (Silvestri, 2011) se convertem em “nômades urbanos” (Véras, 2003b): os moradores de cor- tiços e também aqueles que improvisam suas moradias nas periferias por meio da autocons- trução. Nesse sentido, Sayad (1998) atentou muito bem para o fato de que o imigrante vi- vencia sua trajetória com um intenso senti- mento de provisoriedade, ainda que ela seja definitiva, de fato. Segundo o autor, essa “ilu- são do provisório” permite que o imigrante es- teja contente com uma moradia degradante, ou seja, permite que ele se resigne à sua condição de “nômade urbano”: 6 Heráclito, filósofo grego pré-socrático, nascido em 535 a. C. [...] posto que o caráter provisório do imigrante e de sua imigração não passa de uma ilusão coletivamente mantida, ele permite a todos que se sintam contentes com a habitação precária degradada e degradante, que se atribui ao imigrante (Sayad, 1998, p. 78). A maior parte dos bolivianos preten- de vir ao país para trabalhar, juntar dinheiro e voltar a seu país de origem. Mesmo quando eles já estão muito bem estabelecidos no país – com filhos na universidade e morando em casa própria – a ideia do retorno não deixa de rondar suas mentes. A seguinte fala exemplifi- ca bem esse fenômeno: Como aqui não é meu país, a gente sempre se consi- dera menos que os brasileiros. Porque não é minha terra aqui. Então sempre tenho esse pensamento de voltar. Mesmo eu estando bem aqui no país, meu pensamento sempre é de voltar. De eu voltar pra lá. Mas tem coisas que também não dá. Eu tenho meu filho, por que minha filha tem 18 anos, então não quer voltar. (Cláudio, boliviano, empresário, bairro do Grajaú, há 20 anos no país) A questão da moradia, portanto, é uma dessas preocupações cotidianas e emergenciais na vida do imigrante. A “ilusão do provisório” (Sayad, 1998) faz com que ele não queira as- sumir compromissos de longo prazo, como a aquisição de uma casa própria. Assim, os imi- grantes vivem no país de destino “como um provisório que se eterniza e impede os projetos de alguma importância” (Champagne, 2012, p. 105). A ideia de adquirir uma casa vai se arras- tando, pois representaria um enraizamento que é ambíguo, desejado e indesejado ao mesmo tempo. Nesse sentido, a presença dos bolivia- nos nos cortiços se justifica, entre outras difi- culdades, por essa decisão pela casa própria: A experiência da oficina-cortiço evidencia que o en- raizamento (em terras brasileiras) não faz parte do projeto migratório dos bolivianos. O objetivo está em trabalhar no Brasil e em gastar o mínimo possí- vel, de maneira a conseguir juntar o capital neces- sário para algum projeto futuro, provavelmente em seu país. Neste sentido, o cortiço continua a atuar como habitação de transitoriedade, que se move e aglutina os tempos em sua materialidade e em sua biografia (Simone, 2014, p. 210). 618 MORADIA PROVISÓRIA ENTRE BOLIVIANOS EM SÃO PAULO ... C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 A “ilusão do provisório” (Sayad, 1998) obstrui a fixação dos bolivianos em terras bra- sileiras, que se consubstanciaria por meio da aquisição da casa própria. Há apenas uma ex- ceção, na qual esse enraizamento passa a fazer parte do projeto do imigrante, quando passa a desejar uma estabilidade para seu filho. Vale dizer que, mediante o desejo de que seu filho se integre à sociedade receptora, o imigrante suspende por um instante o provisório, e passa a cogitar, então, do pertencimento. A seguinte fala ilustra bem esse fenômeno: Aí, esse é trabalho de estilista. Aí, se cobra muito mais. O meu dia de estilista é 500 reais o dia. Então, aí, eu comecei a pensar. Eu estou fazendo trabalho de estilista? Então eu vou estudar para estilista. E seja o que Deus quiser, eu vou fazer isso. E com esse dinheiro vou comprar uma casa. Pra que minha fi- lha tenha estabilidade (Maria, boliviana, modelista, há 15 anos no país, Brás). Maria, por exemplo, quer estudar para se tornar estilista e ganhar mais dinheiro, com o intuito de comprar uma casa própria e ofe- recer estabilidade à sua filha. Segundo ela, a casa própria dá segurança e torna a vida mais simples. Ela diz que quer a casa própria para que nunca mais tenha de pensar em mudar de bairro, ou seja, para que nunca mais ela e a filha sejam deslocadas, em nomadismo cons- tante. A ideia da fixação, da estabilidade, de aportar o barco e experimentar uma pátria me- nos flutuante aparece apenas mediante o dese- jo de integração da segunda geração.O mesmo fenômeno é ilustrado pela fala de um casal: Porque a gente tem um sonho né? [...] Um dia com- prar uma residência pra gente, pelas crianças. Não por nós. Eles perguntam por que a gente se mudou. A gente começou a falar que era por causa do alu- guel (Berenice, boliviana, costureira, há 17 anos no país, Grajaú). Nesse depoimento está presente a ques- tão do “nomadismo urbano”, pois o casal pro- cura sair do aluguel, que faz com que eles te- nham de se mudar. Percebe-se que eles dese- jam esse enraizamento, não por eles, mas por causa dos filhos. Desvenda-se o mesmo desejo de integração de seus filhos na sociedade re- ceptora, como na fala anterior. Portanto, ape- nas mediante a preocupação com os filhos é que surge o desejo de se enraizar no país por meio da aquisição de uma moradia. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para concluir, constata-se que o sentido que a casa própria tem para esses imigrantes aponta para um desejo de que os seus filhos venham a “assimilar-se” (Truzzi, 2012). Ao di- zerem que querem adquirir a casa para seus fi- lhos, revelam que desejam a estabilidade para eles. A estabilidade é, nesse sentido, a motiva- ção de que seus descendentes diretos venham a se integrar à sociedade receptora e sejam aceitos por essa sociedade. Ou seja, almejam que haja uma “mudança de fronteiras” (Truzzi, 2012)7, que seus filhos se integrem plenamente à sociedade brasileira, e que esse processo não seja apenas uma “assimilação segmentada”8 (Truzzi, 2012). Almejam para seus filhos algo que reconhecem que não poder atingir para si próprios. Nesse sentido, há um desejo de que seus filhos sejam vistos como brasileiros, não apenas como descendentes de bolivianos: Pra minha filha [desejo] que ela seja aceita. Que ela se integre nessa sociedade. Ela é brasileira, pelo amor de Deus, discriminada em seu próprio país. Porque chamam a minha filha de boliviana. Bom, depreciativamente [pejorativamente]. (Maria, boli- viana, modelista, há 15 anos no país, Brás). Portanto, o significado que os bolivianos dão à casa própria demonstra que eles dese- jam que seus filhos se integrem à sociedade receptora. Vale dizer, portanto, que a “ilusão do provisório” (Sayad, 1998) deixa de ter vi- 7 Uma “mudança de fronteiras” (Truzzi, 2012) ocorre quan- do um grupo como um todo deixa de ser outsider para se tornar estabelecido (Elias; Scotson, 2000). É um processo lento e duradouro, que ocorre ao longo das gerações. 8 A assimilação segmentada “enfatiza a consolidação de um determinado grupo como minoria prejudicada e mar- ginal, impossibilitada de ascender socialmente” (Truzzi, 2012, p. 547). 619 Fabio M. Serrano Pucci, Maura P. B. Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 gência quando a primeira geração de imigran- tes bolivianos projeta uma estabilidade para a segunda geração. Estabilidade que não conse- guem projetar para si mesmos (uma vez que a ideia do retorno está sempre presente), mas apenas para seus filhos, revelando a ambigui- dade e a contingência de suas escolhas quanto a esse aspecto tão vital para sua sobrevivência na cidade. Recebido para publicação em 12 de janeiro de 2018 Aceito em 27 de novembro de 2019 REFERÊNCIAS AGUIAR, M. E. Tecnologias e cuidado em saúde: a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o caso do imigrante boliviano e coreano no bairro do Bom Retiro – SP. 2013. Dissertação (Mestrado em Ciências) - Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo. AGUIAR, M. E.; MOTA, A. “Os imigrantes bolivianos e coreanos no bairro do Bom Retiro através das lentes do Programa Saúde da Família.” In: MOTA, A.; MARINHO, M. G. S. M. C. (Orgs.) Saúde e História de Migrantes e Imigrantes: direitos, instituições e circularidades. São Paulo: USP, Faculdade de Medicina: UFABC, 2014. AZEVEDO, F. A. G. de. 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Véras C a d e r n o C r H , S al va d or , v . 3 2, n . 8 7, p . 6 09 -6 22 , S et ./D ez . 2 01 9 _____________. “Segregação e alteridade na metrópole: novas e velhas questões sobre cortiços em São Paulo”. In: KOWARICK, L.; FRUGOLI, H. (Orgs.) Pluralidade urbana em São Paulo, vulnerabilidade, marginalidade, ativismos. São Paulo: Editora 34/FAPESP, 2016b. p. 111-140. VIDAL, D. “Convivência,alteridade e identificações: brasileiros e bolivianos nos bairros centrais de São Paulo”. In: BAENINGER, R. (Org.) Imigração Boliviana no Brasil. Campinas: Núcleo de Estudos de População-Nepo/ Unicamp; Fapesp; CNPq; Unfpa, 2012. 316p. Disponível em: http://www.nepo.unicamp.br/textos/publicacoes/ livros/bolivianos/livro_bolivianos.pdf#page=10. Acesso em: 27. 08. 2014. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Housing and health guidelines. Geneva: World Health Organization, 2018. WIEVIORKA, M. Em que mundo viveremos? São Paulo: Perspectiva, 2006. XAVIER, I.R. 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Publicou, entre outros textos, o artigo “Bolivianos em São Paulo: territórios e alteridade”, na Revista PLURAL, Revista do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da USP, São Paulo, v. 24.2, 2017; e o capítulo de livro “Bolivianos: inserção desigual, territórios e alteridade”, no livro Constelações urbanas: Territorialidades, fluxos, manifestações estético-política, pela EDUC - Editora da PUC-SP, em 2018, ambos em coautoria com a Profa. Dra. Maura Pardini Bicudo Véras. Maura P. B. Véras – Doutora em Ciências Sociais (Sociologia Política). Realizou seu Pós Doc, com apoio CAPES, junto ao Institut d’Études Politiques de Paris, Science Po, França. Professora Titular do Departamento de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Coordenadora do Programa de Estudos Pós Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Líder do Núcleo de Estudos e Pesquisas Urbanos (NEPUR), certificado junto ao CNPq e membro do Observatório das Metrópoles-São Paulo, desenvolvendo pesquisas na linha de pesquisa Dinâmica Urbano-Regional, Planejamento e Políticas Públicas, na área de Sociologia da Cidade, Imigração, Alteridade, Habitação Social, Segregação, Desigualdades Sociais. Publicações recentes: Desigualdades urbanas, segregação, alteridade e tensões em cidades brasileiras. Jundiaí, Paco editorial, 2018; Desigualdades urbanas: algum marco conceitual?”. In VERAS, M: Desigualdades urbanas, op.cit. 2018; VÈRAS Maura; DINIZ, Luciano. Reestruturação metropolitana e dinâmicas imobiliárias: transformações recentes na região administrativa Venda Nova de Belo Horizonte-MG”, Cadernos Metrópole, v. 21, n. 44.São Paulo, Observatório das Metrópoles, EDUC, 2019. LOGEMENT PROVISOIRE PARMIS LES BOLIVIENS À SÃO PAULO: ambiguité et contingence Fabio M. Serrano Pucci Maura P. B. Véras Cet article vise à refléchir sur la question du logement parmi les immigrés boliviens à São Paulo, cherchant à déterminer dans quelle mesure il existe une corrélation entre “l’illusion du provisoire” inhérente à la condition de l’immigré (Sayad, 1998) et les formes précaires du logement dans la ville – des formes qui peuvent être définies comme des habitations de pauvreté et (ou) “ nomadisme urbain” (Véras, 2003b, 2016a). La recherche, en utilisant la combinaison de la méthode qualitative, des entretiens avec des Boliviens (dans les quartiers de Brás et Grajaú), et l’enquête quantitative des données du recensement démographique de l’IBGE, indique une interdépendance entre les formes précaires d’habiter des Boliviens et l’idée de leur présence provisoire ou temporaire dans le pays. Mots clés: Immigration. Boliviens. Ville. Logement. Provisoire. TEMPORARY HOUSING AMONG BOLIVIANS IN SÃO PAULO: ambiguity and contingency Fabio M. Serrano Pucci Maura P. B. Véras This article approaches the housing conditions of Bolivian immigrants in São Paulo, inquiring to what extent there is a correlation between the “illusion of the provisional” – which is inherent to the immigrant’s condition (Sayad, 1998) – and the precarious housing solutions of these immigrants in the city, which can be defined as home of poverty and (or) “urban nomadism” (Véras, 2003b; 2016a). Both qualitative methods (mainly composed by interviews conducted with Bolivians in the districts of Brás and Grajaú) and quantitative methods (mainly composed by the study of the Demographic Census of IBGE) were used. The research findings show interdependence between the precarious housing solutions of these immigrants and the idea that they will only stay provisionally in this country. Keywords: Immigration. Bolivians. City. Housing. Provisional.
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