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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
1.0000.23.318033-0/001Número do 5152732-Númeração
Des.(a) Amauri Pinto FerreiraRelator:
Des.(a) Amauri Pinto FerreiraRelator do Acordão:
31/01/2024Data do Julgamento:
01/02/2024Data da Publicação:
EMENTA: APELAÇÃO. REVISIONAL DE CONTRATO. REVISIONAL DE
CONTRATO. CONTRATO DE ADESÃO. CONSENSO MITIGADO.
R E V I S Ã O . P O S S I B I L I D A D E . C D C . I N C I D Ê N C I A . J U R O S
REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO. ENTIDADE QUE INTEGRA O
SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. LICITUDE. Em contrato de adesão o
consenso não é pleno, pois suas disposições são impostas ao consumidor,
sendo, por isso, possível revê-lo, mesmo ante a inexistência de qualquer fato
superveniente a contratação que intervenha na relação jurídica. Materializa-
se, assim, a mitigação do princípio da pacta sunt servanda. É lícita a
capitalização de juros remuneratórios por integrante do sistema financeiro
nacional, se houver expressa contratação ocorrida após 31/03/2000. Os juros
remuneratórios circunscritos a até uma vez e meia a taxa de mercado não
são abusivos, pois refletem a natural oscilação mercadológica.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.23.318033-0/001 - COMARCA DE BELO
HORIZONTE - APELANTE(S): ANDRE EURICK TADEU JUNIOR -
APELADO(A)(S): ITAU UNIBANCO S.A.
A C Ó R D Ã O
 Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. AMAURI PINTO FERREIRA
RELATOR
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
DES. AMAURI PINTO FERREIRA (RELATOR)
V O T O
 Tratam-se os autos de Ação de Revisão Contratual manejada por
ANDRE EURICK TADEU JUNIOR em desfavor de ITAU UNIBANCO S/A, por
meio da qual pretende alcançar provimento jurisdicional final que reduza os
juros dos contratos de empréstimos feitos junto ao banco réu, declarando-os
abusivos, decote a capitalização de juros, restituindo em dobro os valores
pagos indevidamente.
 Adoto o relatório da r. sentença, por representar fidedignamente os fatos
ocorridos em primeira instância.
 Prolatada sentença pelo Juízo da 15ª Vara Cível da Comarca de Belo
Horizonte/MG, fora o processo extinto, com resolução de mérito, de modo
que julgou improcedentes os pedidos.
 Em face aos termos da sentença, a autora manejou recurso de apelação,
requerendo a sua reforma, pleiteando a declaração de abusividade da
capitalização de juros, decotando tal previsão do contrato, além da restituição
em dobro dos valores pagos indevidamente.
 Ofertada vista ao apelado, apresentou contrarrazões.
 É o relatório.
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 JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
 Conheço do recurso por estarem presentes os requisitos de
admissibilidade.
 PRELIMINARES
 Não há preliminares a serem analisadas.
 MÉRITO
 De início, ressalto ser indubitável a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor no presente caso, tendo sido consagrado pelo Superior Tribunal
de Justiça referida questão, consoante consta da Súmula 297: "O Código de
Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
 DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO - MITIGAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA PACTA SUNT SERVANDA
 Ab initio, no que toca a alegação de impossibilidade de se promover a
revisão do contrato havido entre as partes ora litigantes, entendo que não se
pode acolher tal tese, pelo que passo a justificar meu posicionamento.
 O fato de o contrato ter sido celebrado sem que exista qualquer vício de
vontade explicito não significa dizer que se encontra despido de ilicitudes ou
que essas, uma vez existentes, tenham se
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convalidado.
 Além disso, o contrato em comento é de adesão e, sendo assim, suas
disposições são impostas ao consumidor, mitigando o princípio da pacta sunt
servanda, na medida em que não se permite a discussão do que fora
celebrado. Ao consumidor cabe, nessa espécie de contrato, simplesmente
aderir ou não aos seus termos.
 Esse tipo de contratação em uma economia de massa, como é a atual, é
absolutamente essencial para se atribuir dinâmica as relações comerciais. A
confluência de vontades materializada em uma tratativa clássica, não se
alcança nessa espécie de contrato, ex vi:
Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas
pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo
fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou
modificar substancialmente seu conteúdo.(Código de Defesa do Consumidor)
 Entendimento do qual a doutrina não diverge, como se pode abstrair do
abaixo transcrito, in verbis:
"No contrato de adesão uma das partes tem que aceitar, em bloco, as
cláusulas estabelecidas pela outra, aderindo uma situação contratual que
encontra definida em todos os seus termos". (Orlando Gomes, Contratos, 18º
edição, atualizada e anotada por Humberto Theodoro Júnior, Rio de Janeiro
Forense, 1998, p. 109,119)
"...cedo se desenvolveram em larga escala e hoje são grandemente usados
nos negócios comerciais. Significam uma restrição ao princípio da autonomia
da vontade, consagrado pelo Código Civil Francês, já que a vontade de uma
das partes não pode se manifestar-se livremente na estruturação do
contrato..." (Fran Martins, Contratos e Obrigações Comerciais, 8º edição, Rio
de Janeiro, Forense, 1958, p. 99.)
 Logo, em decorrência disso, permite-se a reanálise das
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disposições do contrato, mesmo ante a ausência de causa superveniente
que intervenha na relação.
 Esse entendimento garante o alcance diferido do desejado consenso e,
reflexamente, impede que se erice a nulidade de determinado contrato, tão
somente, por decorrer dessa espécie de contratação, fato que tem imenso
impacto na sociedade moderna.
 Assim, como no caso o contrato firmado entre as partes fora única e
exclusivamente redigido pelo fornecedor, sendo inequivocamente de adesão,
pode ser revisto.
 Friso que eventual ato ilícito somente não pode ser inquinado se a
pretensão da parte prejudicada tiver sido alcançada pela prescrição ou
decadência, o que não ocorreu na espécie.
 DA CAPITALIZAÇÃO
 Quanto à capitalização de juros em operação realizadas por entidades
que integram o sistema financeiro nacional, não há qualquer ilicitude.
 Há expressa previsão legal que permite a incidência de juros nessas
operações, art. 5º da Medida Provisória de 2.170-36/01, a qual se iniciou com
a Medida Provisória nº 1.963/2000, que fora sucessivamente renovada até se
chegar a ela:
 Art. 5o Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema
Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade
inferior a um ano.
 Não pode ser olvidado que o ato normativo em comento está em pelo
vigor, apesar de não mais ter sido renovado, tendo em vista o art. 2º da
Emenda Constitucional nº 32, o 	qual preleciona que as medidas provisórias
em vigência até então continuariam a vigorar até ulterior manifestação
definitiva do Congresso sobre as mesmas: "as medidas provisórias editadas
em data anterior à da publicação desta emenda
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continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue
explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional"
 Ademais, ressalto que a constitucionalidade de tal dispositivo já fora
declarada pelo STF em julgamento em que fora reconhecida a existência de
repercussão geral, in verbis:
Ementa: CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO
DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS
NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA .
SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO.
AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS.
RECURSO PROVIDO. 1. A jurisprudência da Suprema Corte está
consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de
medidas provisórias se exponhamao controle judicial, o escrutínio a ser feito
neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa
presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de
urgência. 2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP
2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria
extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e,
consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida
econômica do país. 3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato
também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para
tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à
época, ou seja, há quinze anos passados. 4. Recurso extraordinário provido.
(RE 592377, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:
Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 04/02/2015, ACÓRDÃO
ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-055 DIVULG 19-03-
2015 PUBLIC 20-03-2015)
 Em que pese o acima afirmado, para que a capitalização possa ser
licitamente praticada no caso em concreto, deve ser pactuada, tendo em
vista não ser uma imposição legal, logo deve decorrer de válida emanação
de vontade. Ademais, a contratação deve ser posterior a data de publicação
da MP 1.963 de 2000 - 31 de março de 2000.
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 O entendimento em comento restou cristalizado, por duas vezes, por
meio de julgamentos do STJ submetidos ao rito dos recursos repetitivos, ex
vi:
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES
REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM
DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS
COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-
36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO.
1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura)
em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-
36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a
circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente,
incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao
capital e sobre eles passam a incidir novos juros.
2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira,
de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na
formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do
contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa
nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas
processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não
é proibido pelo Decreto 22.626/1933.
3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a
capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos
celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n.
1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que
expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade
inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão
no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da
mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual
contratada".
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4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de
permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos
remuneratórios ou moratórios.
5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado
de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade
das cláusulas contratuais questionadas.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.
(REsp 973.827/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/08/2012, DJe 24/09/2012)
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA -
ARTIGO 1036 E SEGUINTES DO CPC/2015 - AÇÃO REVISIONAL DE
CONTRATOS BANCÁRIOS - PROCEDÊNCIA DA DEMANDA ANTE A
ABUSIVIDADE DE COBRANÇA DE ENCARGOS - INSURGÊNCIA DA
CASA BANCÁRIA VOLTADA À PRETENSÃO DE COBRANÇA DA
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS .
1. Para fins dos arts. 1036 e seguintes do CPC/2015.
1.1 A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida
quando houver expressa pactuação.
2. Caso concreto: 2.1 Quanto aos contratos exibidos, a inversão da
premissa firmada no acórdão atacado acerca da ausência de pactuação do
encargo capitalização de juros em qualquer periodicidade demandaria a
reanálise de matéria fática e dos termos dos contratos, providências
vedadas nesta esfera recursal extraordinária, em virtude dos óbices
contidos nos Enunciados 5 e 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
2.2 Relativamente aos pactos não exibidos, verifica-se ter o Tribunal a
quo determinado a sua apresentação, tendo o banco-réu,
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ora insurgente, deixado de colacionar aos autos os contratos, motivo pelo
qual lhe foi aplicada a penalidade constante do artigo 359 do CPC/73 (atual
400 do NCPC), sendo tido como verdadeiros os fatos que a autora
pretendia provar com a referida documentação, qual seja, não pactuação
dos encargos cobrados.
2.3 Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é possível
tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga
indevidamente, independentemente de comprovação de erro no pagamento,
em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito. Inteligência da
Súmula 322/STJ.
2.4 Embargos de declaração manifestados com notório propósito de
prequestionamento não tem caráter protelatório. Inteligência da súmula
98/STJ.
2.5 Recurso especial parcialmente provido apenas ara afastar a multa
imposta pelo Tribunal a quo.
(REsp 1388972/SC, Rel. Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 08/02/2017, DJe 13/03/2017)
 Na situação em estudo, atesto que, as partes previram a pactuação de
juros capitalizados, o que se pode inferir a comparação entre os juros
remuneratórios mensais e anuais constantes na avença, já que estes são
superiores ao duodécimo daqueles. Além disso o contrato foi celebrado após
31 de março de 2000, período a partir do qual a capitalização possui
embasamento normativo.
 Assim, inteiramente lícita a contagem de juros de forma capitalizada na
espécie, não havendo que se falar em reforma da sentença, neste tópico.
 DISPOSITIVO
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 Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
 Fixo honorários recursais em 2%(dois por cento) sobre o valor da causa,
suspensa a cobrança, por ser beneficiaria da justiça gratuita.
DES. BAETA NEVES - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA - De acordo com o(a)
Relator(a).
 SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO"
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