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DO CONSELHO DE ESTA DO 
THEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI 
1. Introdução; 2. Influências. 
1. Introdução 
A existência do Conselho de Estado acha-se intimamente ligada à 
formação histórica da nossa estrutura política constitucional. 
Foi por intermédio dele que o primeiro Imperador elaborou 
o projeto de Constituição e nele certamente se apoiou como uma 
instituição que completaria a estrutura de seu governo. 
O Rei, em Conselho, quer privado ou Parlamento, estaria na 
tradição histórica e na formação das monarquias tradicionais. 
Assim foi na Inglaterra, como também na Monarquia francesa. 
Pedro I, ao dissolver a Constituinte, conscientizou a impor­
tância do seu ato e de suas repercussões. Dissolveu o Conselho 
de Procuradores, mas criou, para ampará-lo, um Conselho de Es­
tado, a quem atribuiu, desde logo, a tarefa de redigir uma nova 
Constituição (13 de novembro de 1823). 
Como foi redigido o projeto, quais os responsáveis pela sua 
elaboração? A perda de todos os documentos relacionados com 
esta fase da nossa vida constitucional, com a perda de todos os 
documentos com ela relacionados, torna impossível a restauração 
dos fatos mais importantes então ocorridos, bem como dos autores 
das iniciativas principais na elaboração do texto. 
Extinguiu-se o primeiro Conselho com a promulgação da 
Constituição, mas foi restabelecida por força do artigo 137 da pró­
pria Constituição. 
Foram os primeiros conselheiros os seguintes, compreendendo 
os ministros em exercício e quatro nomeados: Barão de Santo 
Amaro; Antonio Luiz Pereira da Cunha; José Joaquim Correia 
R. Cio poI., Rio de Janeiro, 6 (3) : 3-20, juI./set. 1972 
de Campos; Manuel Jacinto Nogueira da Gama; João Severiano 
Maciel da Costa; Luiz José de Carvalho e Melo; Clemente Pe­
reira França; Mariano José Pereira da Fonseca; João Gomes da 
Silveira Mendonça; Francisco Vilela Barbosa. 
Sem regulamento e, portanto, sem uma disciplina de trabalho 
e uma competência mais específica, o Conselho de Estado funcio­
nou mal até a sua extinção em 1834, nessa sua primeira fase. 
Em nosso País, o Conselho de Estado foi sempre um ponto 
de discórdia entre conservadores e liberais - os primeiros, para 
fortalecer o poder moderador, defendiam a sua criação, enquanto 
que os segundos, consideravam-no obstáculo ao desenvolvimento 
político, núcleo de reação, instituição retrógada, uma espécie de 
oligarquia que rodeava o Imperador. Daí as suas flutuações e a 
precaridade do seu prestígio durante todo o Império. 
Para os conservadores, na frase de Uruguai era o "automural 
do Poder Moderador", enquanto que para os liberais, como Tito 
Franco e Cristiano Ottoni, era o baluarte do imperialismo, pelo 
menos quando se achavam em oposição. 
Flutuou, assim, entre as duas tendências - desapareceu com 
os liberais e descentralizadores, voltou com os conservadores e 
com o fortalecimento do poder central. 
Os conservadores viam na sua existência o próprio espírito 
do poder moderador, base do regime constitucional do Império. 
"A supressão do Conselho de Estado", dizia um político libe­
ral, Teófilo Ottoni, em um de seus ataques àquela instituição, 
"era também um grande triunfo da idéia liberal, pois que anulava 
em sua essência o poder moderador, causa de tantas apreensões 
durante o primeiro reinado". 
Por outro lado, o Visconde de Uruguai, grande político con­
servador e autor de um dos nossos melhores e mais antigos en­
saios de direito administrativo, atribuía o fracasso do Conselho 
aos elementos que o integravam. 
O precursor do Conselho de Estado no Brasil foi, como já vi­
mos, o Conselho dos Procuradores-Gerais das Províncias. Foi cria­
do pelo Príncipe Regente Pedro I, pelo Decreto de 16 de fevereiro 
de 1822, movido por uma necessidade justificável de se rodear de 
uma corporação de homens que o auxiliasse, com a sua experiên­
cia e pareceres, na obra difícil da administração. 
O Conselho dos Procuradores era nomeado pelos eleitores das 
paróquias e tinha como atribuições: 
"a) aconselhar o Príncipe que fosse solicitado em todos os negó­
cios mais importantes e difíceis; 
4 R.C.P. 3/72 
b) examinar os grandes projetos de reforma, que se deveriam 
realizar na administração geral ou particular do Estado; 
c) propor ao Príncipe as medidas que julgasse urgentes e van­
tajosas à administração; 
d) zelar pelas utilidades de suas Províncias." 
A Assembléia Constituinte, pela Lei de 20 de outubro de 
1823, extinguiu esse Conselho e não admitiu procuradores do povo, 
que não fossem os seus deputados, e conselheiros do Imperador, 
outros que não os seus ministros. 
A dissolução da Constituinte impôs novamente ao Regente a 
criação de um Conselho que o assistisse na administração e cuidas­
se com ele das coisas públicas. O Decreto de 13 de novembro de 
1823, criou um Conselho de Estado composto de 10 membros, in­
cluídos os ministros, seus membros natos, que tinham como atri­
buição, ainda, a elaboração da Constituição. 
A primeira Constituição do Império manteve a mesma orga­
nização dada pela Lei de 1823, fixando a sua competência e atri­
buições no art. 137 e seguintes: 
"Art. 137 - Haverá um Conselho de Estado composto de 
conselheiros vitalícios nomeados pelo Imperador. 
Art. 138 - O seu número não excederá a 10. 
Art. 138 - Não são compreendidos neste número os Minis­
tros de Estado, nem estes serão reputados conselheiros sem espe­
cial nomeação do Imperador para esse cargo. 
Art. 142 - Os conselheiros serão ouvidos em todos os negócios 
graves e medidas gerais da pública administração, principalmente 
sobre a declaração de guerra, ajustes de paz, negociações com 
as nações estrangeiras, assim como em todas as ocasiões em que 
o Imperador se proponha exercer qualquer das atribuições próprias 
do poder moderador indicadas no art. 101, à exceção da sexta". 
Por aí pode-se ver como era restrita a função administrativa 
do Conselho. As suas atribuições eram mais de caráter político. 
Bem longe dos Conselhos de Estado, como o da França, onde r"1úl­
tiplas sempre foram as atribuições contenciosas administrativas. 
A sua própria composição tirava-lhe qualquer possibilidade 
de eficiência. 1 
1 Pimenta Bueno. Direito público brasileiro. p. 286; Uruguai. Ensaio sobre 
o direito administrativo. p. 238; Souza Bandeira. Evocações e outros escritos. 
p. 134. 
Do Conselho de Estado 5 
A reação liberal tinha como ponto capital do seu programa 
a extincão do Conselho de Estado. Estava isto logicamente dentro 
de suas· finalidades. E assim o Ato Adicional, em seu art. 32, não 
podendo suprimir o poder moderador, devido em grande parte à 
resistência do Senado, suprimiu o Conselho de Estado: 
"Fica suprimido o Conselho de Estado, de que trata o título 
5.°, capítulo 7.° da Constituição". 
Não acabou, porém, aí a luta em torno do conselho. O debate 
doutrinário continuou até que em 1841 o Imperador, em sua fala 
de 13 de maio, por ocasião da abertura das câmaras, chamava a 
atenção delas para a necessidade da criação do Conselho de Estado. 
Neste mesmo ano, projeto foi apresentado e teve andamento. 
O debate foi longo e a discussão versou principalmente sobre a 
sua composição, a constitucionalidade do restabelecimento do Con­
selho diante do Ato Adicional, a perpetuidade do exercício de seus 
membros, e a sua amovibilidade. 
Alves Branco, Bernardo de Vasconcelos, Paula Souza, distin­
guiram-se particularmente nos memoráveis debates. Veio por fim 
a Lei de 23 de novembro de 1841 regulamentada em 5 de fevereiro 
de 1842. 
Por essa lei, o Conselho de Estado tinha 12 membros ordiná­
rios, além dos Ministros de Estado. 
As suas sessões seriam conjuntas ou em secções, as primeiras 
presididas pelo Imperador e as últimas pelos Ministros a quem 
pertencessem os objetos das consultas. 
O regulamento de 1842 dividiu o Conselho em quatro secções: 
l.a) negócios do Império; 
2.a ) negócios da Justiça e dos estrangeiros; 
3. a) negócios da Fazenda; 
4.a ) negócios da Guerra e da Marinha.!! 
!! Art. 7 da Lei de 23 de novembro de 1842 - "Incumbeao Conselho de 
Estado consultar em todos os negócios em que o Imperador houver por bem 
ouvi-lo, para resolvê-los; e principalmente: 
1.0 em todas as ocasiões em que o Imperador se propuser exercer qualquer 
das atribuições do Poder Moderador indicadas no art. 101 da Constituição; 
2.0 sobre declaração de guerra, ajustes de paz e negociações com as nações 
estrangeiras; 
3.° sobre questões de presas e indenizações; 
4.° sobre conflitos de jurisdição entre as autoridades administrativas e entre 
estas e as judiciárias; 
5.° sobre abusos das autoridades eclesiásticas; 
6.° sobre decretos, regulamentos e instruções para a boa execução das leis, 
e sobre propostas que o Poder Executivo tenha de apresentar à Assembléia­
Geral. 
6 R.C.P. 3/72 
Quanto à vitaliciedade, prevaleceu um critério intermediário. 
A Lei de 1841 admitia, em princípio, a perpetuidade, podendo en­
tretanto o Imperador dispensar o Conselheiro de Estado, por tem­
po indeterminado, do exercício de suas funções. 
A vitaliciedade foi sempre matéria controvertida, principal­
mente porque aos liberais repugnava a perpetuidade do poder. 
Ao contrário, os conservadores e moderados achavam con­
veniente uma continuidade impedindo uma substituição em 
cada administração. 
O Visconde de Uruguai justificava essa posição com as se­
guintes palavras: 
"A vitaliciedade oferece garantias de independência, de luzes 
de experiência, de justiça, de imparcialidade e de segredo". 
O Conselho de Estado é meramente consultivo. Não lhe com­
pete resolver os negócios, sobre os quais consulta, que são decidi­
dos pelo Poder Moderador ou Executivo. 
As vantagens e garantias que pode trazer e traz essa institui­
ção consistem na independência, acerto, justiça e imparcialidade 
dos conselhos e opiniões, que iluminam, e podem servir de estorvo 
a desacertos e injustiças, especialmente no contencioso adminis­
trativo. 
Todas as vezes que for posto o Conselho de Estado à mercê 
dos ministros e dos partidos, não poderá ter a indispensável inde­
pendência. Não é possível que debatam, com liberdade, inferiores 
e dependentes com superiores. 
Como há de o Conselheiro de Estado interpor e sustentar opi­
niões contrárias às dos ministros; como, em recurso interposto 
destes, há de opinar livremente, e demonstrar que deve ser refor­
mada a decisão ministerial; como, no caso de conflito entre a Câ­
mara dos Deputados e o Ministério, há de aconselhar livremente 
à Coroa que o demite, se é deste criatura e dependente? 
É somente na vitaliciedade dos Conselheiros de Estado que 
se pode fundar a independência deste Corpo para poder resguar­
dar e sustentar a independência do Poder Moderador. 
O direito administrativo, e sobretudo o contencioso, apenas 
pode fundar-se e desenvolver-se em um país por meio de arestos 
e tradições, que formam o que se chama jurisprudência adminis­
trativa. Exige luzes, certo traquejo dos negócios, que somente lon­
gos estudos e longa prática podem fornecer. E isto muito princi­
palmente, em um país como o nosso, onde a ciência administrativa 
ainda está na infância, e onde as disposições de direito administra-
Do Conselho de Estado 7 
tivo existentes não estão coligidas e coordenadas, mas sim espalha­
das e confundidas por toda a legislação. 
A amovibilidade do Conselho de Estado do Tribunal Adminis­
trativo Superior e de Recurso, e que tão poderosamente pode con­
correr para fundar a nossa jurisprudência administrativa, não po­
deria contribuir senão para embaraçar ainda mais esse resultado. 
Para criar é preciso tempo, estabilidade e perseverança.a 
05 liberais, por sua vez, dividiam-se. Pretendiam uns a su­
pressão do Conselho de Estado, outros a redução de sua compe­
tência, bem como as condições para a sua nomeação. 
Fazia, assim, reservas às suas atribuições, por meio de consi­
derações da maior importância, dada a situação peculiar de uma 
personalidade revestida de atributos políticos e de uma compe­
tência técnica indiscutível no campo da administração. 
Analisando as atribuições do Conselho de Estado, teceu sobre 
elas considerações que importaram em meras reservas na acumu­
lação de funções políticas e administrativas. 
Dizia Visconde de Uruguai: 
"A lei do Conselho de Estado foi vigorosamente impugnada 
no Senado, porque acumulava, nas mesmas pessoas, funções po­
líticas e administrativas". 
Na minha opinião tinham razão os que por esse motivo com­
batiam a lei. É um dos principais senões que ela tem. 
Diziam: 
Que sendo o conselho político de uma esfera superior, não po­
dia ser ao mesmo tempo, administrativo, que é de uma esfera 
inferior. 
Que as funções políticas do Conselho de Estado eram muito 
distintas das administrativas. Que o Conselho de Estado político 
tinha por fim auxiliar o monarca e não auxiliar o ministério. 
Que no sistema da monarquia representativa era essencial a 
existência de um chefe não só vitalício, como hereditário, o qual, 
representando a Nação, supõe-se, tem o maior interesse por ela, 
e trabalha para que seu governo se haja pelo modo mais condu­
cente para fazer a sua fidelidade, procurando que o mesmo governo 
conforme-se com a opinião dominante; e que o modo pelo qual 
esse chefe exercia o governo é por meio dos mi:üstros. 
3 Ensaio sobre o direito administrativo. Rio, 1862 t. 1, p. 266-67. 
8 R.C.P. 3/72 
Que segundo essa organização política, a corporação política 
dos Conselheiros da Coroa devia ser considerada como fiscal do 
ministério, por isso que o monarca a consulta para não ser somente 
dirigido pela ação ministerial. 
Que essa mesma corporação é destinada a julgar os conflitos 
que muitas vezes se dão entre os representantes da Nação e os 
ministros que representam o governo. Em tal caso, aquela corpo­
ração auxilia o monarca nas funções que tem a desempenhar e, 
por conseqüência, um Conselho tal não deve ser subordinado aos 
ministros, porque seus membros têm, em certas circunstâncias, de 
apresentar a sua opinião, e seu voto em oposição ao ministério, 
para o que, como Conselho administrativo também, não podem 
ter a necessária independência. 
Que outro tanto não acontecia a respeito do Conselho de Es­
tado como corporação administrativa, porque como tal não pode 
deixar de ser subordinado ao ministério, visto que pode ser con­
siderado como uma estação, por meio da qual o ministério elabora 
as propostas que o Poder Executivo tem de apresentar, à Assem­
bléia-Geral, os decretos, regulamentos e instruções que o mesmo 
Executivo tem de dar para a boa execução das leis. Tem mesmo 
a seu cargo o desempenho das leis; e de outras funções adminis­
trativas, e até o conhecimento de julgamentos, de maneira que 
casos há em que o Conselho de Estado tem ao mesmo tempo de se 
constituir Tribunal de julgação, pois pelo projeto se lhe dá a atri­
buição de ser ouvido sobre questões de presas, indenizações, sobre 
conflitos de jurisdição em autoridades administrativas e entre es­
tas e as judiciárias. 
Contudo, por várias razões que me parecem ponderosas, in­
clino-me muito à separação pela qual pugnou a oposição na dis­
cussão da lei. 
Eu teria criado um Conselho Privado e um Conselho de Es­
tado. O Conselho Privado para aconselhar o Imperador no exer­
cício das funções do Poder Moderador e o Poder Executivo no 
exercício das atribuições de dirigir as negociações políticas com 
as nações estrangeiras, de fazer tratados de aliança ofensiva e de­
fensiva, e de subsídio, de declarar a guerra e fazer a paz. 
O Conselho de Estado auxiliaria o Poder Executivo no exer­
cício de todas as outras atribuições políticas e em todas as admi­
nistrativas. 
Digo em todas as outras atribuições políticas, porque algumas 
prendem por tal modo com o administrativo, que não é possível 
instituir uma separação completa e minuciosa. 
Do Conselho de Estado 9 
As atribuições do Poder Moderador e as do Executivo que 
dizem respeito a relações com o exterior, à paz e à guerra, têm 
um caráter político tão pronunciado, tão extremado, prendem-se 
a considerações tão vastas, que muitobem podem formar um grupo 
separado, muito mais desligado do que é puramente administra­
tivo. 
Julgo conveniente a separação indicada. 
a) porque convém separar o político e o administrativo, tanto 
quanto for possível sem inconveniente, ao menos nas grandes me­
didas, pelos motivos já em outro lugar expostos; 
b) porque o direito administrativo é positivo e determinado pe­
las leis administrativas, e os assuntos que ficariam reservados ao 
Conselho Privado são justamente aqueles que não podem ser 
prevenidos por leis, mas dependem quase exclusivamente de vasta, 
larga e prática apreciação das circunstâncias, que atuam na oca­
sião, em geral, ou a respeito de uma hipótese; 
c) porque o Conselho Privado, atenta a vastidão e a importância 
das apreciações que é chamado a fazer, deve ser composto de 
estadistas, dos homens políticos mais eminentes pela sua posição, 
pelo interesse que tenham pela estabilidade das instituições, pela 
força moral que as suas luzes, posição, caráter e serviços possam 
dar aos seus conselhos, sem diferença de opiniões, uma vez que 
não sejam exageradas e possuam eles a indispensável qualidade 
da prudência; 
d) porque, conquanto convenha que essas qualidades se dêem, 
quanto for possível, também nos conselheiros administrativos, não 
é tão necessário que as tenham todas, bastando que, além da con­
sideração pública que pode dar força moral aos seus conselhos e 
mais requisitos que a lei exigir, sejam versados no conhecimento 
e prática das matérias administrativas; 
e) porque devendo ser escolhidos, sobretudo para aconselharem 
a Coroa no exercício das atribuições do Poder Moderador, os ho­
mens mais respeitáveis e versados no manejo prático dos negócios 
políticos e que tenham ocupado os mais altos cargos do Estado, 
não podem deixar de ser avançados em idade e, portanto, menos 
próprios para o aturado e, às vezes, quase-material trabalho, que 
exige o exame e solução de miúdas e numerosas questões adminis­
trativas, que o Conselho de Estado em França faz examinar e 
desbastar pelos Ouvidores e Maitres des requêtes e que muitas ve­
zes versam sobre negócios de uma importância muito secundária 
para o bem do Estado; 
10 R.C.P. 3/72 
f) porque o homem político e de partido, senador, deputado, é 
o menos próprio para auxiliar na administração o seu êmulo, o 
seu adversário, que subiu ao poder. Embora não o traia, não o 
hostilize no que é administrativo, será muito exigir que o ajude 
a brilhar, a fazer servir certas medidas a uma política que condena, 
a uma administração que combate e quer derrubar para subir. 
Um Conselheiro de Estado, dada a colisão entre a Câmara dos 
Deputados e o Ministério, acaba de aconselhar o Imperador para 
que dissolva o Ministério, cuja continuação sustenta, no Conselho 
de Estado e na Câmara à qual pertence, ser perniciosa e fatal ao 
país. Não prevalece essa opinião. Irá no dia seguinte esse conse­
lheiro, muito fiel e lealmente, fazer o papel de auxiliar daquele 
ministério em negócios administrativos? 
O Conselho de Estado na França desde a Restauração, no tem­
po de EI-Rei Luis Felipe, e ainda hoje, é uma corporação em que 
predomina muito mais a cor administrativa do que a política. Na 
França não tem havido, nem há Poder Moderador distinto e se­
parado. O Conselho de Estado tinha e tem outro Presidente, que 
não o Imperador. É auxiliar do Poder Executivo. As suas princi­
pais atribuições são puramente administrativas. São importantes, 
muito bem definidas, explicadas e desenvolvidas, principalmente 
as que dizem respeito ao contencioso. 
N a Espanha, o Conselho de Estado não é uma instituição po­
lítica, mas sim puramente administrativa. "Estranho à política e 
também à justiça (isto é, ao que pertence ao Poder Judiciário) ", 
diz Colmeiro, 4 "não participa nem das veleidades daquela, nem 
da mobilidade desta, porém obedece ao espírito de transformação 
lenta e gradual que domina no maior número dos atos administra­
tivos" . 
O Conselho de Estado de Portugal é porém, como o nosso, 
e como já vimos, político e administrativo. Provém isso de que 
tendo a sua Constituição um Poder Real ou Moderador como a 
nossa, acumularão como nós no mesmo conselho as atribuições de 
aconselhar o Poder Moderador e o Administrativo. Coisas tão di­
ferentes! 
"Um Conselho de Estado em uma monarquia representativa 
deve ser uma corporação exclusivamente ou quase exclusivamente 
administrativa. A corporação que aconselha o Poder Moderador e 
4 Direito administrativo espanhol .. 
Do Conselho de Estado 11 
que é política deve ser distinta, chamem embora a esta Conselho 
de Estado e aquela o que quiserem". 5 
Desdobrando as atribuições conferidas pela lei e pelo regula­
mento de 1842 ao Conselho de Estado, Uruguai divide assim, as 
suas funções: 
a) do Poder Moderador; 
b) do Poder Executivo, político ou governamental; 
c) do Poder Administrativo gracioso; 
d) do Poder Administrativo contencioso. 
I. Junto ao Poder Moderador. Era talvez esta a função mais 
delicada do conselho. O exercício do Poder Moderador ficava em 
grande parte apoiado sobre a responsabilidade do conselho, em 
assunto da mais alta relevância política para a Coroa. 
A convocação das assembléias-gerais, aprovação ou suspensão 
das resoluções das assembléias provinciais, a pensão dos magistra­
dos, a concessão da anistia, a escolha dos senadores, eram assuntos 
sobre os quais sempre poderia ser ouvido o Conselho de Estado, 
cuja opinião era ou não acatada, mas que nem por isso influía 
menos na política geral do país. 
A sua vinculação ao Poder Moderador decorria também da 
sua competência para aconselhar o Imperador prontamente quan­
do ele devia exercer o Poder Moderador. 
O responsável era o Conselho de Estado, por esses conselhos, 
(art. 143 da Constituição) como eram os ministros, pelos atos do 
Poder Executivo. 
Intangível era apenas a pessoa do Imperador. 
I!. O Poder Executivo, político ou governamental compreen­
dia importantes matérias como a declaração de guerra, os ajustes 
de paz, as relações e negociações com as nações estrangeiras ou 
com o poder espiritual. 
lI!. Com relação à jurisdição administrativa graciosa, Pi­
menta Bueno chama de quase contenciosa. Este talvez o ponto 
mais interessante sob o aspecto que se relaciona com o direito 
administrativo. 
5 Uruguai. op. cito p. 275-85. Estas palavras do douto e atilado Paulino 
mostram por si a complexidade da questão. 
12 R.C.P. 3/72 
Neste terreno verifica-se a intervenção do Conselho de Estado 
como função consultiva, mas sobre matéria acentuadamente admi­
nistrativa, diz ele: 6 
"Há alguns assuntos administrativos que participam do cará­
ter contencioso sem que, todavia, possa este predominar sempre, 
já porque se dá propriamente litígio, já por que alguma vez 
é necessário conservar à administração uma certa liberdade ou 
latitude de ação a respeito, como indispensável aos interesses 
públicos. Neste caso estão as questões de guerra, os conflitos de 
atribuições, as questões de competência entre autoridades admi­
nistrativas e os recursos por abusos das autoridades eclesiásticas". 
A intervenção do Conselho de Estado é, em todos casos, po­
rém, sempre facultativa, cabendo ao Imperador sempre a iniciativa 
da consulta. 
IV. Nos negócios contenciosos. Afinal, relativamente a esses 
assuntos ainda prevê a lei a intervenção do Conselho de Estado 
com o caráter meramente consultivo e facultativo. 
Verifica-se, entretanto, a sua audiência: 
a) nos conflitos entre a jurisdição administrativa e a judiciária; 
b) nos recursos interpostos das resoluções dos presidentes das 
províncias em matéria contenciosa ou das decisões dos Ministros 
de Estado; 
c) nos embargos opostos às resoluções imperiais. 
Os art. 24 e seguintes do Regulamento de 5 de fevereiro de 
1842 estabelecem a forma de processo e os casos em que se veri­
ficam o recurso e a intervenção do Conselho de Estado. 7 
Sob o ponto de vista administrativo, duvidosa foi a eficiência 
do Conselho de Estado na monarquia. O contenciosoadministrati­
vo, ou melhor, a jurisdição administrativa praticamente não tinha 
existência, faltando-lhe os elementos indispensáveis ao funciona­
mento normal e obrigatório dos órgãos jurisdicionais inerentes 
àquele sistema. 
Prestou, entretanto, o Conselho de Estado grandes benefícios 
ao regime. Di-lo muito bem, citando fatos, o nosso Souza Ban­
deira. 8 
6 Direito público brasileiro. p. 294. 
7 Ver Pimenta Bueno. op. cito p. 204 e sego 
8 Evocações e outros escritos. p. 146. 
Do Ccmselho de Estado 13 
A lei de 1842 extinguiu-se com o regime, não obstante as ten­
tativas de reforma, entre as quais deve ser citada a do Marquês 
de São Vicente, em 1867. 9 
Não é possível deixar sem lembranças os inúmeros benefícios 
prestados ao país pelo Conselho de Estado. 
Além do portentoso trabalho legislativo em torno à legislação 
sobre concessões de estradas de ferro, ainda acrescenta Souza 
Bandeira, o seguinte: 10 
"Examinem-se todas as grandes questões nacionais, em que 
andou envolvida a responsabilidade do governo imperial, ou se 
trate das nossas infindáveis complicações com as repúblicas pla­
tinas, ou das medidas financeiras em que se debatia a argúcia dos 
ministros da fazenda, ou das variadas reformas propostas ao Par­
lamento, e sempre nas discussões do conselho encontrar-se-á o 
apanhado fiel das várias correntes de opinião, expostas com cla­
reza, competência e lealdade. O governo podia errar e errou mui­
tas vezes. Nunca, porém, poderia dizer que o fez por não estar 
devidamente aconselhado, tendo perfeitamente pesado o pró e o 
contra". 
Rebentou subitamente, em 1864, a grande crise provocada pela 
quebra do banqueiro Souto. Alastrou-se a crise, perturbando a 
vida econômica do país, e ameaçando arrastar a fortuna pública 
e particular. O comércio reclamava providências, todas as classes 
se deixavam dominar por um pânico, cujos resultados não se po­
diam prever. O Conselheiro Furtado, Presidente do Conselho, era 
um velho e honesto magistrado, conhecedor da lei, afeito a julgar 
e, por isso, mesmo cheio de escrúpulos de natureza jurídica. As 
câmaras tinham-se fechado e a opinião angustiada exigia uma so­
lução urgente. Reuniu-se o Conselho de Estado, e depois de longa 
discussão, pode o govêrno tomar as medidas de exceção que sal­
varam a praça do Rio de Janeiro e a Nação inteira. Os dissídios 
entre o Duque de Caxias, Comandante-em-chefe das forças em­
penhadas na Guerra do Paraguai, e Zacarias, Presidente do con­
selho, colocaram o Governo, em 1867, na mais melindrosa questão 
militar que já tivemos, atenta a posição política dos dois adversá­
rios e a existência da guerra em que um deles era general vito­
rioso. Foi o Conselho de Estado quem salvou a situação, achando 
uma saída airosa para o caso. Surgiu, em 1872, a questão dos 
Bispos de Olinda e do Pará, que, revoltados contra as leis do 
país, provocaram, numa nação essencialmente católica, uma tre-
li Ver Nabuco, Joaquim. Um estadista do Império. ed. 1936, v. 2, p. 6 e 316. 
10 Souza Bandeira. op. cito p. 145. 
14 R.C.P. 3/72 
menda questão religiosa. As excomunhões e as interdições repeti­
das, revividas das antigas querelas medievais, punham os juízes 
e funcionários na terrível contingência de escolherem entre a sua 
consciência de católicos e o seu dever de cidadãos. Em memorá­
veis discussões do Conselho de Estado, católicos e maçons, amigos 
e adversários do Governo, procuraram lealmente fornecer-lhe os 
meios legais com que finalmente se restabeleceu o princípio da 
autoridade. Ainda hoje constitui um precioso monumento, o longo 
e trabalhoso preparo da Lei de 28 de setembro de 1871, feito no 
Conselho de Estado. Relembrar as vezes em que ele se teve de 
manifestar, seria refazer toda a história constitucional e adminis­
trativa do segundo Império, de cujas ruínas subsiste como um 
glorioso legado de esclarecido patriotismo. 
2. Influências 
o nosso Conselho de Estado da monarquia sofreu duas influências 
preponderantes - a que vinha de nossa tradição política jurídica, 
ligada a Portugal e a que encontrou no modelo francês e na legis­
lação desse país um elemento essencial à construção do nosso 
sistema. 
Em ambas, de origens muito antigas, pois que a de Portugal 
remontava ao século XIV, a influência do poder Real e o caráter 
consultivo e de Conselho imprimiram a feição originária do nosso 
Conselho de Estado. 
Somente no correr do século XIX definiu-se a sua ação juris­
dicional, com que multiplicou a competência daquele órgão. 
Também aqui os dois modelos assemelhavam-se - o francês e 
o português - e dificilmente seria possível descobrir qual a fonte 
mais preponderante na organização e no funcionamento do nosso 
Conselho de Estado. 
A leitura das suas decisões, entretanto, mostra bem a influên­
cia marcante do direito administrativo francês, pelo menos em al­
gumas questões sobre as quais versavam pareceres e decisões da­
quele órgão. 
Em matéria processual, no regime dos contratos e concessões, 
nas questões puramente teóricas e doutrinárias, os autores fran­
ceses são freqüentemente citados, enquanto que as questões terri­
toriais e de domínio, bem como nas fianças, e em certas peculiari­
dades de instituições que não encontram similar no direito estran­
geiro, o velho direito português, as nossas leis civis e administra-
Do Conselho de Estado 15 
tivas ainda em formação constituem o apoio máximo das decisões 
e pareceres do Conselho. 
Não seria, entretanto, demasiado dizer que, em relação ao 
Conselho de Estado, em si, na sua estrutura, na sua função polí­
tica e administrativa, preponderou a influência do modelo francês, 
por intermédio de autores familiares aos nossos juristas de então, 
especialmente Cormenin, Macarel, Regnault em sua história do 
Conselho de Estado, Dalloz, Vivien, etc. 
Na elaboração da Lei de 1842, houve sempre a preocupação 
de evitar o modelo francês, ou pelo menos, afirmou-se muito rei­
teradamente este propósito. 
O autor do projeto, Ministro do Império e Senador Bernardo 
Pereira de Vasconcelos, por exemplo, insistia na originalidade do 
nosso Conselho de Estado, como órgão consultivo, função que na 
França exerceu, excepcionalmente, em períodos muito transitó­
rios, como na Restauração. 
No Brasil, foi entretanto esta a sua competência maior, desde 
a sua organização, lembrando mais talvez o Conselho Privado da 
Coroa Inglesa. 
Mas, o certo é que na organização do Conselho de Estado, no 
Brasil, sempre houve a preocupação de examinar o modelo fran­
cês; era natural que assim tivesse sido, porque da legislação fran­
cesa sempre nos aproximamos muito em matéria administrativa, 
por ser mais acessível aos nossos conhecimentos. 
A reação, contra uma cópia muito liberal de qualquer modelo 
estrangeiro, era também natural, embora seu sucesso fosse muito 
duvidoso. 
Além do mais, a idéia do Conselho de Estado estava, no Brasil, 
ligada à do Poder Moderador, inspirada na concepção de Benja­
mim Constant. 
Foi, por isso mesmo, em torno do Imperador que a idéia cres­
ceu, e construiu-se o Conselho de Estado pelo menos em sua forma 
mais primitiva. 
Não há, entretanto, como negar-se a influência francesa no 
desenvolvimento do conselho como órgão administrativo e princi­
palmente jurisdicional. 
Foi com a atenção voltada para o Conselho de Estado na Fran­
ça que nos enveredamos por um caminho perigoso e de difícil 
execução, isto é, o da ampliação da competência do Conselho de 
Estado à matéria contenciosa administrativa, convertendo-se timi-
16 R.C.P. 3/72 
damente, por falta de preparo prévio, em uma espécie de tribunal 
administrativo. 
Desvirtuava-se com isto o objetivo político de sua criação, 
lançando-se numa aventura cujo sucesso só seria possível por uma 
atuação ousada e decidida. Neste setor jurisdicional, a tentativa 
resultou em fracasso. 
O mesmo, entretanto, não ocorreu nos demais setores, espe­
cialmente no exercício da função normativa e regulamentar, bem 
como no estudo dos nossos grandes problemas administrativos. 
Aí foi o seu trabalhoda maior importância, e nele se encontra 
a base do nosso direito administrativo. 
Sem o Conselho de Estado, pouco nos teria ligado o Império. 
Tal como na França, discutiu-se muito a legitimidade do Con­
selho de Estado, como poder criado pela lei, sem a origem cons­
titucional. 
Na prática, ele se interpunha entre os poderes, não só no 
exercício da função jurisdicional, reduzindo de alguma forma a 
competência própria e específica do poder judiciário, mas também 
na ação política dos ministros e do Parlamento. 
Como admitir-se o sistema, quando a organização dos poderes 
e o seu funcionamento dependiam da estrutura constitucional? 
Dizia-se também que o Conselho de Estado limitava até o 
direito reconhecido ao Imperador de consultar quem entendesse, 
ficando, pelo órgão criado, limitado o número dos seus conselheiros. 
Objetivam outros, que tendo a Constituição abolido o Conse­
lho de Estado, não seria lícito restabelecê-Io; quando muito, seria 
tolerável criar outro. 
As objeções não tinham razão de ser. O único obstáculo apre­
ciável à sua criação era o de natureza constitucional, mas apenas 
no que dizia respeito ao funcionamento dos poderes constitucio­
nais, inatingível por outros órgãos criados pela lei ordinária. 
Outro motivo de oposição era a vitaliciedade do conselho, que 
criava uma oligarquia, sempre consultada, sempre a recomendar 
ao monarca, sempre as mesmas figuras, somente substituíveis pela 
morte de um, escolhidos por vontade única do Imperador. 
Mas, a vitaliciedade no caso era uma proteção contra o arbí­
trio do Imperador, uma garantia da liberdade do voto e da opinião 
dos conselheiros. Um conselho à mercê da vontade do Imperador 
não teria o prestígio e a independência necessários para manifestar 
em qualquer assunto, mesmo de natureza política, a sua opinião. 
Do Conselho de Estado 17 
Houve, entretanto, sempre duas preocupações no Brasil, como 
em Portugal, na organização e no funcionamento do Conselho de 
Estado: a) manter o Conselho de Estado na dependência do Poder 
Executivo, considerando o órgão auxiliar da administração ativa; 
b) respeitar o princípio da separação dos poderes, pela indepen­
dência da administração em face ao judiciário e deste perante o 
Poder Executivo. 
Não obstante esta preocupação, o contencioso administrativo 
não tomou o desenvolvimento que seria de esperar. 
Em matéria consultiva também desapareceu o Conselho de 
Estado com a República. 
Compreende-se bem esta orientação, se considerarmos a tra­
dição real dos Conselhos de Estado, a sua função protetora do 
soberano, o que levou um político brasileiro a chamar o Conselho 
de Estado de pára-raios do Imperador. Era natural, por isso, que 
a República pelo menos em seus primeiros anos o suprimisse. 
Tentativas, entretanto, foram feitas com os projetos Arnolfo 
Azevedo e Afrânio de Mello Franco para revivê-Io, ajustado à 
forma republicana de governo. 
Não lograram êxito as tentativas, mas os conselhos técnicos 
e consultivos apareceram sob formas novas, bem conhecidas no 
direito administrativo moderno, principalmente no setor econô­
mico. 
A Constituição atual prevê mesmo a criação de um conselho 
econômico, embora com caráter antes de tudo consultivo (o Con­
selho Nacional de Economia). 
Com o advento da República, suprimiu-se entre nós o con­
tencioso administrativo; adotamos um regime judiciarista que ex­
clui a dualidade do sistema jurisdicional. Uma justiça única, so­
mente os tribunais judiciários que integram a justiça ordinária 
decidem as controvérsias. 
Uma única exceção tivemos, mas já foi em parte abolida, em 
relação às causas federais, não pelo critério ratione materiae, da 
natureza jurídica da controvérsia, mas pela presença no processo 
do Poder Federal - ratione personae. 
Qualquer decisão administrativa, mesmo as proferidas pelas 
instâncias administrativas estão sujeitas ao controle da legalidade. 
Se, por um lado, amplia-se a competência da jurisdição co­
mum, incluindo sob o seu controle todos os atos administrativos, 
por outro, restringe-se a sua competência na profundidade e na 
18 R.C.P. 3172 
medida desse controle, reduzida à apreciação da legalidade dos atos 
e da sua conformidade com a lei. 
Elimina-se a jurisdição administrativa própria, mas também 
para alterar a natureza do controle adstrito à função própria aos 
órgãos judiciais. 
E este é um dos aspectos peculiares ao sistema - a instância 
judicial não se envolve no mérito do ato, mesmo quando de natu­
reza administrativa, nas razões de conveniência, de oportunidade, 
de interesse, mas apenas da sua conformidade com a Constituição 
e a lei. 
Neste particular, a instância administrativa esgota-se nos pró­
prios órgãos administrativos, sujeitos ao poder judiciário apenas 
no que diz com a legalidade do ato ou decisão. 
O recurso por excesso de poder, o abuso do poder, são ex­
pressões de compreensão restrita porque não envolvem, na sua 
apreciação judicial, os motivos, as razões, que determinaram o 
ato, mas unicamente a competência da autoridade, a conformidade 
do seu ato com os preceitos legais aplicáveis à espécie. 
Há uma diferença de técnica no julgamento dos atos adminis­
trativos pelos tribunais especializados, que os franceses conhecem, 
como todos aqueles que têm um regime contencioso administra­
tivo, mas que desconhecem os que unificaram o seu poder juris­
dicional. 
No Brasil, esta diferença de técnica só se encontra na justiça 
do trabalho, autônoma, ou em certa forma, na justiça eleitoral. 
também independente. 
Na órbita administrativa, porém, essa distinção não existe, 
porque mesmo os tribunais administrativos, ou melhor, os órgãos 
coletivos a que estão afetas as questões administrativas, têm os 
seus atos sujeitos ao controle judicial, como qualquer autoridade 
administrativa. 
Este sistema tem provocado certas reações tendentes à criação 
de algumas jurisdições administrativas especializadas. Principal­
mente, nos Estados Unidos desenvolveu-se esta tendência para 
criação de commissions relacionadas não só com a exploração dos 
serviços públicos (public utilities) , mas também com o comércio 
interestadual e internacional (Interstate Commerce Commission). 
Na Inglaterra tembém verificou-se a mesma tendência. 11 
11 Robson, W. A. Justice and administrative (Law). 
Do Conselho de Estado 19 
No Brasil, porém, todas as instâncias e "tribunais" adminis­
trativos estão sujeitos ao controle judicial e com uma intensidade 
talvez excessiva. 
Nos Estados Unidos, por exemplo, em matéria de tarifas do 
serviço público, decidem soberanamente os commissions sem re­
curso judicial. Mas, este será cabível todas as vezes que essas 
tarifas forem consideradas confiscatórias, isto é, forem tão baixas 
que levem a empresa à falência, ou tão altas que sejam inacessí­
veis ao usuário. 
Não será o princípio da estrita legalidade que orientará o 
juiz, mas um elemento quase imponderável cujo nome é a cláusula 
due process, por meio da qual todos os direitos e liberdades não 
expressas encontram a sua proteção. Somente a sensibilidade de 
um juiz anglo-saxônico, educado na aplicação da common law e 
do costume, poderia manejar instrumento tão sutil. 
Tenho sustentado, mas devo confessar, sem grande sucesso 
perante os tribunais, que a parte técnica das decisões proferidas 
pelos tribunais administrativos especializados é inacessível ao exa­
me judicial. Por exemplo: as condições técnicas de um abalroa­
mento de navios para efeito da responsabilidade, o resultado de 
uma perícia sobre produtos minerais realizada por uma instância 
de tarifas aduaneiras, etc. 
Os tribunais brasileiros, entretanto, têm considerado tais de­
cisões administrativas como sujeitas à apreciação, como prova, 
como elementos de informação, sem reconhecer a natureza deci­
sória desses atos. 
Todas essas dificuldades teriam sido sobrepujadas com a cria­
ção de tribunais administrativos ou, pelo menos, com o reconheci­
mento do valor de certas decisões administrativas, como res judi­
cata, pelomenos no que se refere ao merecimento dessas decisões 
na sua parte técnica e especializada. 
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