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O recalque por adensamento é o deslocamento vertical da superfície correspondente à variação de volume em qualquer estágio do processo de adensamento. Será verificado o recalque por adensamento, por exemplo, se uma estrutura (exercendo tensão total adicional) for construída sobre uma camada de argila saturada ou se o lençol freático for rebaixado permanentemente a um estrato que esteja sobre uma camada de argila. Por outro lado, se for feita uma escavação (reduzindo, assim, a tensão total) em argila saturada, haverá o levantamento hidráulico (heave, ou deslocamento para cima) do fundo dessa escavação em consequência do inchamento da argila. Nos casos em que ocorre deformação lateral significativa, haverá um recalque imediato, devido à deformação do solo em condições não drenadas, além do recalque por adensamento. A determinação do recalque imediato será analisada com mais detalhes no Capítulo 8. Este capítulo é dedicado à previsão do valor e da velocidade do recalque por adensamento em condições unidimensionais (isto é, em que o solo se deforma apenas na direção vertical). Isso se estende ao caso em que o solo se deforma lateralmente (como aquele abaixo de uma fundação) na Seção 8.7. O progresso do adensamento in situ pode ser monitorado por meio da instalação de piezômetros a fim de gravar a variação da pressão da água nos poros ao longo do tempo (isso será descrito no Capítulo 6). A amplitude do recalque pode ser medida por meio da gravação dos níveis dos pontos de referência adequados sobre uma estrutura ou no terreno: o nivelamento preciso é fundamental, utilizando um referencial comparativo que não esteja sujeito nem mesmo ao mínimo recalque. Devem ser aproveitadas todas as oportunidades de obter dados dos recalques no campo, uma vez que apenas por meio de tais medidas é possível avaliar a adequação dos métodos teóricos. 4.2 O ensaio oedométrico As características de um solo durante o adensamento ou inchamento unidimensional podem ser determinadas por meio do ensaio oedométrico. A Figura 4.1 mostra de forma esquemática a seção transversal de um oedômetro. O corpo de prova tem a forma de um disco de solo, mantido no interior de um anel de metal e conservado entre duas pedras porosas. A pedra porosa superior, que pode se mover no interior do anel com uma pequena folga, está presa abaixo de uma placa de carregamento superior, pela qual a pressão pode ser aplicada ao corpo de prova. Todo aparato localiza-se dentro de uma célula aberta de água, à qual a água dos poros do corpo de prova tem livre acesso. O anel que confina esse corpo de prova pode ser fixo (preso ao corpo da célula) ou flutuante (livre para se mover verticalmente); a parte interna do anel deve ter uma superfície lisa e polida para reduzir o atrito lateral. O anel confinante impõe uma condição de deformação lateral nula para o corpo de prova. A compressão deste quando submetido à pressão é medida em um dial ou por meio de um transdutor que atue sobre a placa de carregamento. O procedimento do ensaio foi padronizado pela norma CEN ISO/TS17892-5 (Europa) e pela ASTM D2435 (Estados Unidos), embora a BS 1377, Parte 5, que permanece em vigor no Reino Unido, especifique que o oedômetro deva ser do tipo com anel fixo. A pressão inicial (tensão total) dependerá do tipo de solo; após isso, uma série de pressões é aplicada ao corpo de prova, tendo cada uma delas o dobro do valor da pressão anterior. Normalmente, cada pressão é mantida por um período de 24 h (em casos excepcionais, pode ser necessário um período de 48 h), fazendo-se leituras do valor da compressão em intervalos adequados. No final do período do incremento, quando a pressão excedente da água nos poros estiver completamente dissipada, a tensão total aplicada se igualará à tensão efetiva vertical do corpo de prova. Os resultados são apresentados em um gráfico que mostra a espessura (ou sua variação percentual) do corpo de prova ou o índice de vazios no final de cada período de incremento em relação à tensão efetiva correspondente. Esta pode ser colocada em um gráfico de escala natural ou logarítmica, embora essa última seja adotada normalmente em consequência da redução na mudança de volume em um determinado incremento quando a tensão total aumenta. Se desejado, a expansão do corpo de prova pode ser medida adicionalmente durante reduções sucessivas da pressão aplicada, a fim de se observar o comportamento da expansão (inchamento). No entanto, mesmo que não sejam exigidas as características de inchamento do solo, deve-se medir a expansão do corpo de prova em consequência da remoção da pressão final. O Eurocode 7, Parte 2, recomenda que sejam realizados, no mínimo, dois 1 Figura 4.1 ensaios em um determinado estrato de solo; esse valor deve ser duplicado se houver diferença acentuada nos valores das compressibilidades medidas, em especial, se houver poucas ou nenhuma experiência relacionada com o solo em questão. O índice de vazios no final de cada período de incremento pode ser calculado com base nas leituras de deflexões (deslocamentos), além de ou no teor de umidade ou no peso seco do corpo de prova ao final do ensaio. Utilizando como referência o diagrama de fases da Figura 4.2, os dois métodos de cálculo são os seguintes: Teor de umidade medido ao final do ensaio = w1 Índice de vazios no final do ensaio = e1 = w1Gs (admitindo que Sr = 100%) Espessura do corpo de prova no início do ensaio = H0 O oedômetro: (a) equipamento de ensaio, (b) esquema de montagem de ensaio (imagem cedida pela Impact Test Equipment Ltd.). Figura 4.2 2 Diagrama de fases. Variação de espessura durante o ensaio = ΔH Índice de vazios no início do ensaio = e0 = e1 + Δe, em que Da mesma forma, Δe pode ser calculado até o final de cada período de incremento. Peso seco medido no final do ensaio = Ms (isto é, massa de sólidos) Espessura no final de qualquer período de incremento = H1 Área do corpo de prova = A Espessura equivalente de sólidos = Hs = Ms/AGsρw Índice de vazios, História de tensões O relacionamento entre o índice de vazios e a tensão efetiva depende da história de tensões do solo. Se a tensão efetiva atual for a máxima à qual o solo já esteve submetido, diz-se que a argila está normalmente adensada. Se, por outro lado, a tensão efetiva, em alguma ocasião do passado, foi maior do que o valor atual, diz-se que o solo está sobreadensado (ou pré- adensado). O resultado da divisão do valor máximo da tensão efetiva no passado pelo valor atual é conhecido como razão de pré-adensamento (RPA) ou taxa de sobreadensamento (TSA) ― também denominado OCR, devido ao termo em inglês, overconsolidation ratio, ou, ainda, razão de sobreadensamento (RSA). Desta forma, um solo normalmente adensado tem uma taxa de sobreadensamento igual à unidade; um solo sobreadensado, por sua vez, tem uma taxa de sobreadensamento maior do que a unidade. Esse valor não pode ser menor do que um. A maioria dos solos é formada, inicialmente, pela sedimentação das partículas, que leva ao adensamento gradual sob o próprio peso crescente. Sob essas condições, as tensões efetivas no interior do solo terão aumento constante enquanto a deposição acontecer, e, assim, o solo será normalmente adensado. Os leitos dos oceanos e dos rios são exemplos comuns de solos que, em geral, estão em um estado normalmente adensado (ou próximo a ele). Em geral, o sobreadensamento é resultado de fatores geológicos ― por exemplo, a erosão das camadas superiores de solo ou rocha (devido ao movimento dos glaciares, ao vento, às ondas ou às correntes marítimas), o derretimento das camadas de gelo (e, portanto, a redução de tensões) depois da glaciação ou o aumento permanente do lençol freático. O sobreadensamento também pode ocorrer devido a processos criados pelo homem, por exemplo: a demolição de uma estrutura antiga para fazer novo uso do terreno removerá as tensões totais que estavam aplicadas em suas fundações, causando o levantamento de fundo (heave), de forma que, para o novo uso, o solo estará inicialmente sobreadensado. Característicasde compressibilidade Gráficos típicos da variação do índice de vazios (e) após o adensamento em relação à tensão efetiva (σ′) para um solo saturado estão representados na Figura 4.3, mostrando uma compressão inicial, seguida de um descarregamento e uma recompressão. Os formatos das curvas estão relacionados com a história de tensões do solo. O relacionamento e–log σ′ para um solo normalmente adensado é linear (ou próximo disso), sendo chamado de reta (ou linha) de compressão virgem (unidimensional; RC1D ou LC1D). Durante a compressão ao longo dessa linha, ocorrem alterações permanentes (irreversíveis) na estrutura do solo, que não retorna à sua forma original durante a expansão. Se um solo estiver sobreadensado, seu estado Figura 4.3 1 será representado por um ponto na parte de expansão ou recompressão do gráfico e–log σ′. As mudanças na estrutura do solo ao longo dessa linha são quase completamente recuperáveis, conforme mostra a Figura 4.3. A curva de recompressão se liga, por fim, à reta de compressão virgem: ocorre, então, uma compressão posterior ao longo da reta virgem. Os gráficos mostram que um solo em estado sobreadensado será muito menos compressível do que um em estado normalmente adensado. Relacionamento índice de vazios–tensão efetiva. A compressibilidade do solo pode ser quantificada por um dos coeficientes a seguir. O coeficiente de compressibilidade volumétrica ou coeficiente de variação volumétrica (mv), definido como a variação de volume por unidade de volume por aumento unitário da tensão efetiva (isto é, razão entre a deformação volumétrica e a tensão aplicada). As unidades de mv são o inverso da pressão (m2/MN). A variação de volume pode ser expressa tanto em termos de índice de vazios quanto de espessura do corpo de prova. Se, para um acréscimo de tensão efetiva, de σ′0 para σ′1, o índice de vazios diminuir de e0 para e1, então 2 3 O valor de mv para um determinado solo não é constante, depende da faixa de valores de tensões na qual é calculado, já que esse parâmetro aparece no denominador das Equações 4.3 e 4.4. A maioria dos ensaios- padrão especifica um único valor do coeficiente mv calculado para um incremento de 100 kN/m2 acima da tensão vertical in situ da amostra de solo na profundidade em que for retirada (também denominada pressão confinante ou pressão das camadas sobrejacentes), embora o coeficiente possa ser calculado, caso assim se queira, para qualquer outra faixa de valores de tensões, selecionada para representar as alterações esperadas de tensões devidas a uma construção geotécnica em particular. O módulo confinado (também chamado de módulo elástico unidimensional ou módulo oedométrico), E′oed, é o inverso de mv (isto é, tem unidade de tensão ou pressão, MN/m2 = MPa), em que: O índice de compressão (Cc) é a inclinação da RC1D (ou LC1D), que é a parte linear do gráfico e–log σ′ e é adimensional. Para dois pontos quaisquer no trecho linear do gráfico, O trecho de expansão do gráfico e–log σ′ pode ser comparado a uma linha reta, cuja inclinação é chamada de índice de expansão Ce (também chamado de índice de inchamento). O índice de expansão é, muitas vezes, menor do que o de compressão (conforme ilustra a Figura 4.3). Deve-se observar que, apesar de Cc e Ce representarem gradientes negativos no gráfico e–log σ′, seus valores são sempre dados como positivos (isto é, eles representam o módulo dos gradientes). Pressão de pré-adensamento Casagrande (1936) propôs um procedimento empírico para obter, com base 1 2 3 4 5 na curva e–log σ′ para um solo sobreadensado, a tensão efetiva vertical máxima que atuou neste solo no passado, chamada de pressão de pré- adensamento (σ′máx). Esse parâmetro pode ser usado para determinar o OCR in situ para o solo examinado: na qual σ′v0 é a tensão efetiva vertical in situ da amostra de solo na profundidade em que foi retirada (pressão confinante efetiva), a qual pode ser calculada pelos métodos mencionados no Capítulo 3. A Figura 4.4 mostra uma curva e–log σ′ típica para um corpo de prova de solo que está inicialmente sobreadensado. A curva inicial (AB) e a transição subsequente a uma compressão linear (BC) indicam que o solo está passando por recompressão no oedômetro, já tendo sofrido expansão (inchamento) em algum estágio de sua história. A expansão do solo in situ pode, por exemplo, ser consequência do derretimento de camadas de gelo, da erosão das camadas superiores ou de uma elevação no nível do lençol freático. O procedimento para estimar a pressão de pré-adensamento consiste nas seguintes etapas: Construa novamente o trecho em linha reta (BC) da curva; Determine o ponto (D) de curvatura máxima no trecho de recompressão (AB) da curva; Desenhe uma linha horizontal passando por D; Desenhe a tangente à curva em D e trace a bissetriz do ângulo entre a tangente e a reta horizontal que passa por D; A vertical que passa pelo ponto de interseção da bissetriz com CB fornece o valor aproximado da pressão de pré-adensamento. Sempre que possível, a pressão de pré-adensamento para uma argila sobreadensada não deve ser ultrapassada em uma construção. Em geral, a compressão não será grande se a tensão efetiva vertical permanecer abaixo de σ′máx, já que o solo sempre estará no intervalo de descarregamento– recarregamento da curva de compressão. A compressão será grande apenas se σ′máx for ultrapassado. Esse é o princípio fundamental que rege o pré- carregamento, que é uma técnica usada para reduzir a compressibilidade dos solos, a fim de torná-los mais adequados ao uso em fundações; isso será analisado na Seção 4.11. Figura 4.4 Figura 4.5 Determinação da tensão de pré-adensamento. A curva e–logσ´ in situ. A curva e–log σ′ in situ Devido aos efeitos de amostragem (Capítulo 6) e preparação do ensaio, o corpo de prova em um ensaio oedométrico estará ligeiramente deformado (perturbado). Demonstrou-se que um aumento no grau de perturbação do corpo de prova resulta em uma pequena redução na inclinação da reta de compressão virgem. Dessa forma, pode-se esperar que a inclinação da linha representando a compressão virgem do solo in situ seja ligeiramente maior do que a da reta virgem obtida em um ensaio de laboratório. Não se cometerá um erro significativo ao se tomar o índice de vazios in situ como igual ao índice de vazios (e0) no início do ensaio de laboratório. Schmertmann (1953) afirmou que podemos esperar que a reta de compressão virgem de laboratório intercepte a reta de compressão virgem in situ em um índice de vazios de aproximadamente 0,42 vez o inicial. Dessa forma, a reta de compressão virgem in situ pode ser admitida como a reta EF da Figura 4.5, na qual as coordenadas de E são log σ′máx e e0, e F é o ponto da reta de compressão virgem de laboratório com um índice de vazios igual a 0,42e0. No caso de argilas sobreadensadas, a condição in situ é representada pelo ponto (G), que tem coordenadas σ′0 e e0, em que σ′máx é a pressão confinante efetiva atual. A curva de recompressão in situ pode ser aproximada da linha reta GH, paralela à inclinação média da curva de recompressão de laboratório. Exemplo 4.1 As seguintes leituras de recompressão foram obtidas de um ensaio oedométrico com um corpo de prova de argila saturada (Gs = 2,73): TABELA F Pressão (kPa) 0 54 107 214 429 858 1716 3432 0 Leitura no medidor 5,000 4,747 4,493 4,108 3,449 2,608 1,676 0,737 1,480 depois de 24 h (mm) A espessura inicial do corpo de prova era 19,0 mm, e, ao final do ensaio, o teor de umidade era 19,8%. Faça o gráfico da curva e–log σ′ e determine a pressão de pré-adensamento. Determine os valores de mv para incrementos de tensão de 100–200 e 1.000–1.500 kPa. Qual é o valor de Cc para esse último incremento? Parte 1 - Desenvolvimento de um modelo mecânico para o solo 4 Adensamento 4.2 O ensaio oedométrico