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- Qui est là!...perguntou na rouquidão do estremunhamento uma voz de 
mulher. 
- Preciso falar a esse rapaz que aí está, o Amâncio! 
Ouviu-se um farfalhar de panos, chinelas arrastaram, e em seguida a porta 
abriu-se cautelosamente, mostrando pela fisga um rosto gordo, de olhos azuis. 
- Qui est là... 
Mas o Coqueiro, em vez de responder, afastou a porta com um murro e 
atirou-se para dentro do quarto; ao passo que a Jeanete, esfandogada de medo, 
desgalgava em fralda o escadarão que ia ter ao primeiro andar. 
Amâncio, em uma cama muito cortinada e muito larga, dormia 
profundamente, de barriga para o ar, pernas abertas e braços atirados sobre a 
desordem das colchas e dos lençóis. No chão, ao lado do escarrador, um 
travesseiro caído, e em torno, por todo o desarranjo da alcova, roupas espalhadas. 
O Coqueiro olhou um instante para ele, sem pestanejar; depois, sacou 
tranqüilamente o revólver da algibeira e deu-lhe um tiro à queima – roupa. 
Amâncio soltou um ai. 
A segunda bala já o não pilhou, mas o irmão de Amélia, abstrato, pateta, 
continuava a disparar os outros tiros até que a arma lhe caiu das mãos. 
Nisto, como se acordasse de uma vertigem, saiu a correr tropeçando em 
tudo. No primeiro andara um polícia lançou-lhe as garras aos cós das calças e o 
foi conduzindo à sua frente, sem lhe dizer palavra. 
Entretanto, Amâncio despertou com um novo gemido e levou ao peito as 
mãos que se ensoparam no sangue da ferida. Olhou em torno, à procura de 
alguém; mas o quarto estava abandonado. 
Então, fechou novamente os olhos estremecendo, esticou o corpo - e uma 
palavra doce esvoaçou-lhe nos lábios entreabertos, coimo um fraco e lamentoso 
apelo de criança: - Mamãe!.. 
E morreu. 
XXII 
 
 
Começou logo a reunir povo na porta do hotel. Faziam-se grupos; os 
repórteres andavam num torniquete; via-se o Piloto por toda a parte, irrequieto, 
farisqueiro; e o fato ia ganhando circulação, com uma rapidez elétrica. Pânico 
sobressalto quebrava violentamente a plácida monotonia da Corte; mulheres de 
toda a espécie e de todas as idades empenhavam-se com a mesma febre na sorte 
dramática do infeliz estudante, e o Coqueiro, alado pela transcendência de seu 
crime, principiava a realçar no espírito público, sob a irradiação simpática e 
brilhante de sua corajosa desafronta.

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