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Apresentação Quem somos nós? Por que existimos? Por que nos organizamos em sociedade? 
Como deve se pautar a sociedade? Qual é o papel do Direito na sociedade? Essas e tantas 
outras indagações vêm sendo propostas pelos mais importantes pensadores desde o 
nascimento da Filosofia, na Grécia Antiga. Dos pré-socráticos aos contemporâneos, as questões 
da Ética e do Direito sempre estiveram presentes, ajudando a iluminar o caminho dos 
indivíduos que buscam critérios para agir e viver melhor, conduzindo com excelência a própria 
existência. Mas, para viver melhor, além de compreender com mais funcionalidade o Direito, 
verificando quando as regras e instituições contribuem para o desenvolvimento e quando 
precisam ser atualizadas, é necessário antes aprofundamento ontológico (o que é o real) e 
epistemológico (como o homem conhece o real). Precisamos saber quem somos e o que é a 
realidade, para então começarmos a tomar decisões assertivas no cotidiano. Buscar o real 
significa encontrar a dimensão do ser aqui e agora. Cada um de nós, enquanto indivíduo, tem 
uma lógica de base que nos atualiza a todo instante, sempre indicando as passagens 
existenciais e práticas que produzem crescimento e satisfação. A Filosofia, quando utilizada 
com profundidade, é prática e visceral; vai no âmago de todas as questões que impactam nossa 
existência. Como devo me relacionar com os outros? Como devo conduzir meus pensamentos 
e emoções? Como devo interagir com as instituições? Como posso auxiliar o Direito a ser mais 
humanista e promotor de desenvolvimento? Para tudo isso, a Filosofia pode oferecer respostas 
adequadas, porque ela ensina o ser humano a pensar o real, separando aquilo que é essencial 
do que é acidental em cada situação. A Filosofia diz constantemente: busque o real (a 
ontologia), aprenda a identificar o real (epistemologia) e então poderá decidir com 
funcionalidade para si (ética) e para os outros (Direito). A proposta desta obra é apresentar as 
concepções de Justiça na história da Filosofia, desde suas origens na mitologia até os 
pensadores contemporâneos. O diferencial é que cada autor, cada passagem, é aprofundado 
com reflexões existenciais, que ajudam o leitor a trazer os argumentos apresentados para os 
dias de hoje. A Filosofia, em sua busca incessante por respostas, traz intuições atemporais, que 
podem ser utilizadas com inteligência em qualquer contexto e período histórico. Da Grécia 
Antiga aos dias de hoje, a cada capítulo deste livro, você terá a oportunidade de conhecer os 
principais argumentos dos filósofos acerca da Justiça e do Direito. Trata-se de uma obra que 
interessa não somente às lideranças organizacionais, mas também àqueles que buscam uma 
compreensão mais profunda sobre a posição do homem na sociedade e o papel das 
organizações da sociedade civil e do Estado na criação de uma sociedade livre, justa e 
igualitária. Boa leitura! 1 Introdução ao pensamento filosófico Esta obra pretende apresentar 
fundamentos da Filosofia que depois podem ser utilizados de modo muito prático no dia a dia, 
da esfera econômica dos negócios ao cuidado com o corpo, da arte de cultivar amizades e 
relações superiores ao amor pelo conhecimento. Com a Filosofia, podemos entender melhor 
nossa posição no cosmos, na vida em geral, percebendo que cada indivíduo nasce com um 
potencial a expandir e, à medida que evolui, constrói o próprio projeto. O homem é parte de 
uma grande sinfonia que estrutura toda a realidade. Uma orientação prática importante na 
leitura deste livro é que, a cada capítulo, o leitor busque indagar a si mesmo o que pode mudar 
na própria vida a partir daqueles argumentos, quais aspectos abandonar, quais ações começar 
a implementar. Com isso, não apenas se estuda Filosofia, mas vive- -se a Filosofia. A Filosofia 
do Direito é uma parte da Filosofia. Assim, para entender adequadamente o movimento dos 
pensadores que articularam conceitos e ideias referentes a categorias como justiça, ética, 
direito, Estado, é importante esboçar algumas considerações preliminares acerca da Filosofia, 
para depois ser possível entrar com mais segurança no terreno da Filosofia do Direito. Algumas 
indagações são essenciais: o que é Filosofia? A Filosofia é uma ciência? Qual é a sua função? 
Qual é o método que utiliza para analisar seus conteúdos? Como a Filosofia pode contribuir 
com o Direito? Essas são questões que tentaremos responder neste primeiro capítulo. 
Veremos, no decorrer dos capítulos, que os filósofos possuem visões muitas vezes até opostas 
em relação à mesma matéria, o que poderia ser uma desvantagem à Filosofia, sob a 
argumentação de que ela não é exata e nem é capaz de ter unanimidade naquilo que se 
propõe a responder. Contudo, é justamente a partir dessa dialética contínua entre os 
pensadores que a humanidade foi aperfeiçoando sua capacidade de compreensão de si e do 
mundo. Primeiro, para entendermos adequadamente o que seria a Filosofia, é preciso vê-la em 
sua totalidade de movimento, ou seja, em todo o seu percurso, sem se ater a este ou aquele 
filósofo. Talvez a melhor maneira de compreender esse conceito seja voltando justamente ao 
momento de sua criação, no tempo dos filósofos pré-socráticos na Grécia Antiga, pois, como 
veremos, a tônica que gerou a Filosofia foi a mesma que atravessou os séculos: a Filosofia 
como admiração/amor ao saber. Nossa pesquisa pretende apresentar a concepção de justiça 
na história da Filosofia, de forma que o princípio originário da Filosofia não se torna aqui tão 
fundamental. Partiremos do fato de que, mesmo em povos anteriores já tendo sido despertado 
o pensamento acerca da verdade e a busca pela explicação da estruturação do universo e da 
vida em geral, é somente com os gregos que a pesquisa pela verdade recebe seus maiores 
contornos racionais, isto é, um estudo que diga como, de onde e por que as coisas são como 
são. Essa forma de pensar é criação própria dos gregos (HIRSCHBERGER, 1969). Nas culturas 
anteriores aos gregos, como os egípcios, os indianos e os povos da antiga Mesopotâmia, o 
pensamento 12 Filosofia do Direito e a verdade não eram refletidos e construídos pelo 
indivíduo comum, membro da comunidade, mas por sentenças irrefutáveis proferidas pelos 
grandes sacerdotes religiosos. Os gregos, por outro lado, trouxeram o estudo da verdade para a 
dimensão humana, para dentro da vida humana, incluída aqui a vida política. Contudo, a 
passagem do pensamento religioso para o filosófico se dá também na passagem do mito à 
Filosofia. Antes da Filosofia, eram os mitos que traziam os grandes ensinamentos morais e de 
conhecimento, de forma que entender essa mudança é entender o nascimento da 
racionalidade filosófica. 1.1 A passagem do mito à Filosofia e a admiração ao saber Precisar o 
limiar transitório entre o pensamento mítico e o pensamento filosófico é uma tarefa difícil. De 
fato, conforme atesta Aristóteles no primeiro livro da Metafísica, os mitos gregos já eram um 
modo de identificar o mundo racionalmente. Sobre essa questão, Muñoz (2008) salienta: [...] a 
fronteira entre o pensamento mítico e o pensamento racional nunca foi inteiramente clara. 
Muitos procuraram indicar que as explicações dos primeiros “cientistas” eram o 
prosseguimento, se não em termos de conteúdo, ao menos de forma, das explicações 
oferecidas pelos mitos. As aspas são necessárias, pois suas investigações diferem daquelas 
produzidas pela comunidade científica de nossos dias por um aspecto crucial: não havia uma 
pesquisa experimental sistemática e, em muitos casos, sequer rudimentar. Se as fronteiras 
entre o pensamento racional e o pensamento mítico que o precedeu não são nítidas, havendo 
inúmeros pontos de continuidade entre ambos, isso não significa, porém, que não haja ruptura 
entre eles. O pensamento racional, aplicado para oferecer explicações sobre o funcionamento 
da comunidade política e do cosmo, é algo totalmente novo, ainda que sobalguns aspectos 
avance as características do pensamento mitológico que o precedeu. A originalidade desse 
novo pensamento [...] é algo fundamentalmente grego, inexistente até então. (MUÑOZ, 2008, 
p. 57) Entre os fatores que favoreceram os gregos a serem os protagonistas dessa importante 
passagem, destacamos que eles não possuíam um sistema religioso absolutamente definido, 
baseado em um livro de revelações ou com dogmas essenciais que somente eram dominados 
pela classe sacerdotal. Os principais escritos que fundamentavam sua religião eram os de 
Homero e Hesíodo, de onde extraíram seus modelos de vida, matéria de reflexão e estímulo à 
fantasia. Ademais, conforme assevera Reale (1993), existem características que diferenciam os 
poemas homéricos daqueles que estão nas origens dos vários povos; nessas obras já se 
manifestam algumas das características do espírito grego que criaram a Filosofia. Os poemas 
gregos se estruturam segundo o sentido da harmonia, da eurritmia e da proporção, do limite e 
da medida, uma constante da filosofia grega que erigirá a medida e o limite até mesmo em 
princípios metafisicamente determinantes. A arte da motivação também é uma constante, no 
sentido de que as ações, os acontecimentos, ocorrem porque tiveram um motivo, uma causa 
que lhes deu origem. Não relatamos somente uma cadeia Introdução ao pensamento filosófico 
13 de fatos, mas buscamos em nível fantástico-poético as suas razões, buscamos determinar 
pelo mito a relação entre causa e efeito. Pelos mitos buscamos, por exemplo, explicar a 
passagem das estações, os fenômenos naturais, bem como os sucessos e insucessos humanos. 
Outra característica é o retrato da realidade em sua totalidade de forma mítica. A posição do 
homem no universo estava presente no mito e será assunto marcante do pensamento 
filosófico, dessa vez sob bases puramente racionais. Considerado todo esse contexto favorável, 
a passagem do mito à Filosofia, operada por Tales de Mileto, é marcada pela substituição da 
crença nas explicações dos relatos míticos pela compreensão racional do homem e do mundo 
que o rodeia. Os mitos já eram explicações do homem e do mundo baseadas em um profundo 
saber, contudo suas explicações das causas que geravam todos os efeitos no mundo baseavam-
se na crença em um modelo que representava aquela situação. A Filosofia, avançando nessa 
estrada já aberta, apresentou de modo nítido desde seu nascimento as seguintes 
características: quanto ao conteúdo, busca explicar a totalidade das coisas, toda a realidade; 
quanto ao método, busca uma explicação puramente racional da totalidade, o que vale para a 
Filosofia é o argumento da razão, a motivação lógica, o logos; por fim, o escopo da Filosofia, 
seu caráter é puramente teórico, ou seja, contemplativo, visa simplesmente à busca da verdade 
por si mesma, por isso é livre, não está vinculada a qualquer utilização pragmática, apesar de 
que suas conclusões influenciam todo o mundo prático (REALE, 1993). Buscar as explicações de 
modo racional não significa que a Filosofia dissocie-se por completo do divino, posto que, por 
meio dela, é possível alcançar a dimensão do divino racionalmente. Conforme Aristóteles 
(2002), “pode-se chamar a filosofia de ‘divina’, pois além de levar o homem a conhecer Deus, 
possui as mesmas características que deve possuir a própria ciência que Deus possui, a 
desinteressada, livre, total contemplação da verdade”. Constatamos, portanto, que a busca da 
explicação do mundo por meio do logos é o que há de revolucionário no nascimento da 
Filosofia, e quem pela primeira vez buscou conhecer a realidade desse modo, sendo, portanto, 
o primeiro filósofo, foi Tales de Mileto, o qual concluiu que a água é o elemento essencial de 
todas as coisas da natureza. A Filosofia é uma atividade tanto teórica quanto prática, tanto 
especulativa quanto existencial. É teórica porque busca a verdade, a determinação das causas 
dos fenômenos, mas também essencialmente prática porque é dela que podemos extrair 
conceitos, ideias, orientações sobre como viver, como se relacionar com os outros, como 
interagir na sociedade, como exercer a dimensão política, como defender e construir os 
próprios direitos. O fato de se dizer que a Filosofia é atividade de busca pela verdade de modo 
desinteressado não quer dizer que ela pretenda ser inútil, mera reflexão teórica, e sim que 
busca a verdade se desprovendo de todo tipo de estereótipo, preconceito e modos 
inadequados de se pensar e viver. A busca desinteressada pela verdade quer dizer isto: buscar 
a verdade acima de todas as coisas, tendo a coragem de transcender cada modelo de pensar e 
viver que o sujeito identifica como não mais essencial para uma existência ordenada, feliz, 
satisfatória. A Filosofia nasce da perplexidade. Portanto, são justamente os grandes 
questionamentos que suscitam o progresso filosófico, a íntima necessidade de penetrar cada 
vez mais a essência do problema, conforme explica Reale (2002): 14 Filosofia do Direito A 
Filosofia, por ser a expressão mais alta da amizade pela sabedoria, tende a não se contentar 
com uma resposta, enquanto esta não atinja a essência, a razão última de um dado “campo” 
de problemas. Há certa verdade, portanto, quando se diz que a Filosofia é a ciência das causas 
primeiras ou das razões últimas: trata-se, porém, mais de uma inclinação ou orientação perene 
para a verdade última, do que a posse da verdade plena. (REALE, 2002) Essa paixão pela 
verdade se torna uma incansável busca por encontrar as causas primeiras de todas as coisas, 
aquelas causas que respondem os grandes questionamentos e ainda geram todos os outros. A 
necessidade de responder com maior perfeição é aquilo que gera o caminho histórico 
percorrido pela Filosofia. A história nos coloca novas interrogações, seja por determinados 
eventos, mudanças culturais, avanços das ciências, seja por mudanças de concepções das 
próprias pessoas, e todo esse universo influencia o exercício do pensar filosófico, exigindo do 
filósofo novas respostas, novas indagações. Podemos nos arriscar a dizer que enquanto o 
homem não conhecer com plenitude a verdade última das coisas, a Filosofia prosseguirá sua 
marcha histórica. A história da Filosofia tem o grande valor de mostrar que esta não pode se 
estiolar em um sistema cerrado, onde tudo já esteja pensado, muitas vezes antecipadamente 
resolvido. Quando um filósofo chega ao ponto de não ter mais dúvidas, passa a ser a história 
acabada das suas ideias, o que não quer dizer que não gere a Filosofia nos espíritos uma 
serenidade fecunda, apesar da incessante pesquisa. (REALE, 2002. p. 8-9) Esse é o grande 
mérito da história da Filosofia: apresentar o panorama geral da estupefação diante do saber, da 
necessidade existencial, talvez até metafísica, de o homem conhecer, chegar mais próximo da 
verdade última das coisas, inclusive aquilo que é idêntico, útil e funcional. Acompanhar o 
percurso histórico, o que nos ocupa aproximadamente 28 séculos de esforço intelectual em 
busca da verdade e do que é justo, adequado, de direito, ajuda-nos ainda a pensar melhor 
quais são as nossas grandes questões contemporâneas, em suas diversas esferas sociais, 
econômicas, políticas, culturais, jurídicas etc. Talvez nenhuma frase seja tão ilustrativa para 
essa condição humana como aquela empregada por Aristóteles para abrir a obra que, para ele, 
era dedicada ao conhecimento do saber supremo: a Metafísica. “Todos os homens, por 
natureza, tendem ao saber” (ARISTÓTELES, 2002). 1.2 Os poetas Homero e Hesíodo Homero é 
certamente o maior nome da literatura grega. As duas epopeias que a sua autoria são 
creditadas, Ilíada e Odisseia1 , repercutiram na formação do espírito grego como nenhum 
outro autor tão longe alcançou. A Ilíada imortalizou-se como, possivelmente, a mais 
impressionante 1 A discussão sobre se Homero de fato escreveu ambas as epopeias já alcança 
mais de um século.Entre os eruditos surgem as mais diversas opiniões, desde aqueles que 
afirmam que Homero sequer existiu até que as epopeias seriam compilações de autores 
posteriores de versos passados oralmente de geração a geração; outros afirmam que ele 
existiu, sim, mas que apenas escreveu ou compilou uma das poesias, já que ambas contêm 
construções e estilos literários diferentes; por fim, existem aqueles que creditam a real autoria 
de ambas as epopeias ao poeta Homero. Para este trabalho, tais questões não chegam a ser de 
vital importância, pois o essencial aqui é captar a influência dessas epopeias no espírito grego, 
como auxiliaram nas construções dos conceitos de ética, justiça, direito etc. Introdução ao 
pensamento filosófico 15 guerra já retratada literariamente. A força com que o autor apresenta 
os emocionantes combates, as inesperadas e precisas intervenções divinas, os dramas dos 
heróis envolvidos, as grandes questões que movimentam ambos os exércitos combatentes 
(gregos e troianos), tudo isso a torna uma obra de caráter único na literatura universal. Figura 1 
– Estátua de Homero itechno/Shutterstock. A Ilíada apresenta a narração da célebre Guerra de 
Troia2 . Páris, príncipe troiano, rapta Helena, esposa de Menelau, famoso monarca grego, e 
leva-a para suas terras. Decidido a recuperar sua esposa, Menelau pede auxílio ao seu irmão 
Agamemnon. Em pouco tempo, a raiva que se apossa de Menelau toma conta de todo o povo 
grego e os grandes chefes e guerreiros de todos os reinos são convocados a participar da 
guerra contra os troianos. Entre esses ilustres guerreiros estão, além de Menelau e 
Agamemnon, o enorme e forte Ajax, o sábio e velho Nestor, o astuto e protegido dos deuses 
Ulisses e o célebre personagem principal da obra, Aquiles, filho da deusa Tétis. A Ilíada inicia-se 
já no nono ano de combates, no famoso episódio da discussão entre Agamemnon e Aquiles, 
que resultou na retirada do segundo do campo de batalha. São 24 cantos, que terminam com 
os funerais de Heitor, o troiano que matou Pátroclo, melhor amigo de Aquiles, morto por este 
por vingança. A violência final de Aquiles é a explosão de sua ira, tema central de toda a obra. 
Aquiles estava fora das batalhas, foi apenas quando seu amigo morreu que violentamente 
retornou aos campos e vingou Pátroclo. Já a Odisseia narra as proezas de Ulisses em seu 
retorno após a Guerra de Troia. Ulisses comete um grande erro, devido à soberba, ao declarar 
não necessitar da ajuda dos deuses, o que irritou 2 Aqui também os estudiosos se dividem. 
Seria a Guerra de Troia apenas uma construção literária, uma epopeia elaborada para enaltecer 
o povo grego? Ou poderia de fato ter acontecido? Algumas descobertas arqueológicas desde o 
século passado alimentam a discussão, abrindo a possibilidade de as famosas muralhas de 
Troia se localizarem no que hoje é território turco. 16 Filosofia do Direito profundamente 
Posêidon, o deus dos mares. Diante disso, o deus decide causar o maior número possível de 
problemas ao herói, atrasando seu retorno em dez anos. Entre as aventuras enfrentadas por 
Ulisses e sua tripulação estão a ilha do Ciclope, gigante de um olho só, a ilha de Circe, a 
feiticeira que transforma todos em animais, as belíssimas sereias, que com seus cantos 
irresistíveis atraem todos os marinheiros à morte, o célebre estreito dos monstros de Posêidon, 
Cila e Caríbdes, entre outros problemas que envolvem fenômenos naturais. Ao término da 
saga, Ulisses ainda precisa enfrentar os pretendentes de sua esposa, Penélope, que tentavam 
forçar o casamento com ela para se apossarem do trono. Expomos o resumo geral das obras. 
Agora, apresentaremos algumas análises de como esses versos influenciam a Filosofia e o 
Direito. Para Schüler (2004), a Ilíada foi produzida numa época em que o homem ainda não 
havia tomado completamente consciência de si mesmo, de forma que mais lhe impressionam 
as façanhas de heróis e deuses, no campo externo, que os dilemas psicológicos que 
aterrorizam a dimensão interna do indivíduo. Para esse autor, seria um período histórico em 
que o homem ainda se maravilhava com o mundo que o rodeava, entusiasmava-se por 
participar dele3 . Isso não significa que contornos psicológicos e pessoais não estejam 
presentes na obra. Por exemplo, a epopeia se inicia e termina com a ira de Aquiles, a emoção 
que lhe impulsiona e dá a tônica dos relatos. A arrogância de Agamemnon nos primeiros cantos 
desperta preocupação e resistência em seus próprios aliados, ao verem como ele facilmente 
entrou em contenda com Aquiles, fazendo com que este último se retirasse do combate. Até 
mesmo os deuses, como já é frequente nas lendas gregas, não escapam de questões 
psicológicas, opiniões e preferências que por vezes os aproximam dos humanos. Logo no início, 
Apolo, o deus Sol, lança epidemia aos gregos, devido à rejeição de Agamemnon em devolver 
sua escrava Criseida, filha de Criseis, sacerdote de Apolo. Depois, vendo Aquiles, seu filho, 
sendo humilhado perante os gregos, Tétis implora a Zeus que dê a vitória aos troianos, até que 
se arrependam e peçam perdão a Aquiles. Também por várias vezes, Atena é enviada ao campo 
de batalha e aconselha um ou outro guerreiro. Logo no Canto II, inclusive, vemos Zeus com 
dificuldades para dormir diante das reflexões que lhe vinham à mente, provocadas pelo 
inesperado pedido de Tétis. Contudo, é na Odisseia que vemos sinais mais evidentes dos 
dilemas humanos, vestígios de aspectos psicológicos que circundam aquela obra; na Ilíada, não 
obstante, ainda se presencia sobretudo o fascínio do homem pela descoberta de si mesmo e 
do mundo. Na Ilíada não se pensa em limites para a ação heroica, mas na vontade e no ato de 
conquistar por inteiro esse mundo. É nesse cenário que surge a figura do herói, a clássica 
imagem da poesia homérica. Em um primeiro momento, como Schüler observou, é importante 
notar que, no proêmio, o objeto principal da narração da Ilíada, a causa primeira da história 
heroica, é a ira de Aquiles, e somente secundariamente aparece 3 Sintaticamente o objeto (ira, 
o herói, Ílion) precede o sujeito. A atenção, tanto do poeta como do ouvinte, está presa no 
objeto. O objeto mantém o sujeito oculto. Vive-se num período em que o homem ainda não 
tomou inteira consciência de si mesmo: entusiasma-se pelo grande espetáculo do mundo, é 
fascinado pelas obras dos deuses e dos heróis, sente prazer em nomear o mundo rico que se 
desdobra diante de seus olhos e não se apercebe de si. Não lhe ocorrem suas dúvidas, dores 
ou conflitos pessoais. Não olha para dentro de si mesmo. O mundo o absorve inteiro. Na 
cultura em que o homem só tem olhos e ouvidos para o mundo e para o outro, nasce a 
epopeia com as estupendas façanhas dos heróis e deuses. Introdução ao pensamento filosófico 
17 como causa a vontade de Zeus. O homem ainda não havia olhado para dentro de si 
completamente, de forma que seus limites não estavam completamente estruturados. Não tão 
dependente de Zeus, o homem aparecia a si mesmo como ilimitado, e nisso consistia a façanha 
heroica. O significado de colocar a causa principal do ciclo da Ilíada na ira humana, e não na 
vontade divina, revela que o destino, ainda que existente na cultura helênica, não absorvia de 
modo integral o homem, de forma que suas ações e seus resultados eram responsabilidades 
suas. Também se situa aqui o episódio do Canto II, em que Zeus envia um sonho a 
Agamemnon, na forma do confiável Nestor, no qual este aconselha o herói a invadir 
imediatamente Troia, pois aí teria a vitória. Porém Agamemnon, após uma breve exaltação, 
deu-se conta da falsidade da mensagem, que na verdade tratava-se de uma armadilha. Zeus 
preferia Aquiles a Agamemnon, e o chefe dos gregos era consciente disso. Os deuses, sim, 
interferem, mas os humanos são livres para aceitar ou mudar seus destinos. Na exaltação do 
herói, encontramos ainda outra característica marcante da poesia homérica,em especial a 
Ilíada: a presença do destino. Contudo a ideia homérica de destino não se confunde com um 
ciclo fechado, em que a vida do indivíduo está previamente estabelecida. Para Homero, o 
destino, as moiras4 , assemelha-se a uma ordem superior à que não somente os humanos, mas 
inclusive os deuses submetem-se. É por isso que tanto na Ilíada como na Odisseia, nem os 
deuses podem criar o destino por suas próprias vontades, mas agem e criam caminhos. Na 
ideia de destino dos gregos está aberta a responsabilidade do indivíduo, da livre escolha, o 
homem pode criar uma nova via dentro do cenário predeterminado pelo destino, que não é, 
portanto, um roteiro inflexível. Esse destino possui relação com a ordem das coisas, e aqueles 
que adentram seus mistérios são, de fato, os homens mais corajosos, heroicos e sábios5 . 
Nesse sentido, os poemas homéricos não estão situados tanto no conhecimento do homem a 
si mesmo, mas no desvelar de seu espírito impetuoso e heroico. A Homero não interessam 
tanto os dilemas que afetam a vida humana, embora reconheça que existam, mas a 
necessidade de estender o domínio do homem nesse mundo que serve de palco e cenário para 
conquistas. É por isso que a figura que se glorifica é a do herói, que não pode temer o destino 
nem enfrentar a ordem natural das coisas, mas adentrá-la e ali criar a história. Homero cria um 
mundo limitado, mas que permite atitudes ilimitadas nesse círculo, ainda que o homem não 
possa tudo fazer, pode, dentro do seu possível, ter atitudes heroicas. Homero “louva e exalta o 
que no mundo é digno de elogio e de louvor. Assim como os heróis de Homero reclamam, já 
em vida, a devida honra e estão dispostos a conceder a cada um a estima que tem direito, 
assim todo o autêntico feito heroico é sedento de honra” (JAEGER, 2003, p. 68). Como se vê, 
Homero enaltece e louva a atitude heroica, porque esta é digna de honra, de forma que o herói 
passa a constituir o ideal de homem para o grego em geral. As palavras de Homero ecoaram 
por 4 Na mitologia grega, eram as três Parcas, divindades do mundo dos mortos, governado 
por Hades, que fiavam o destino dos homens e a qualquer momento poderiam extinguir a vida 
de qualquer mortal, bastando para isso que cortassem determinado fio. 5 A preocupação com 
o destino e com a ordem imanente do universo inspiraria vários fenômenos sociais e religiosos 
no mundo grego, como as famosas sentenças do Oráculo de Delfos, a religião dos Mistérios de 
Elêusis e a seita órfica. Era comum a compreensão de que havia uma ordem natural, da qual 
nem homens nem deuses poderiam escapar. O espírito grego aspirava a compreender essa 
realidade. Relembremos, também, que tanto Platão como Aristóteles situavam a máxima 
felicidade na contemplação da realidade, no pleno entendimento do mundo. 18 Filosofia do 
Direito toda a história helênica, transformando-o em um educador de toda a Grécia, e a 
educação homérica baseava-se justamente na educação do herói, de sua honra e coragem, da 
sua nobreza de espírito ao deixar-se guiar pelas virtudes e atitudes de louvor, que somente o 
homem ativo e criador é capaz de realizar, ao contrário do herói passivo, que somente deixa 
viver, conforme foi citado anteriormente. Jaeger, ao comentar a proposta pedagógica de 
Homero, assinala que “os mitos e as lendas heroicas constituem um tesouro inesgotável de 
exemplos e modelos da nação, que neles bebe o seu pensamento, ideais e normas para a vida” 
(JAEGER, 2003, p. 68). Esse ideal de herói se tornaria, posteriormente, uma espécie de lei para 
o cidadão grego, pois a poesia e o mito, antes mesmo da lei, foram as primeiras manifestações 
da educação. Antes de o membro da polis obedecer ao Direito, ele já havia se habituado a 
cultivar-se no ideal de homem difundido pela poesia homérica, que tem na ira de Aquiles sua 
mais alta representação. A Ilíada celebra a glória da maior aristeia da guerra de Troia, o triunfo 
de Aquiles sobre o poderoso Heitor, em que a tragédia da grandeza heroica votada à morte se 
mistura com a submissão do homem ao destino e às necessidades da sua própria ação. É o 
triunfo do herói, não a sua ruína, que pertence à autêntica aristeia. (JAEGER, 2003, p. 75) Nessa 
ação ousada e deliberada de colocar a própria vida em risco para elevar-se à glória heroica 
consiste toda a força educadora da Ilíada. Os gregos não viam em Aquiles um herói comum, 
realizador de grandes feitos, mas que perece no ato de tentar mais uma ação, mas o mais 
nobre dos heróis, aquele que é capaz de antecipadamente saber que o maior dos feitos exige 
também o maior dos sacrifícios. É essa moral, centrada essencialmente na figura heroica, no 
Aquiles da Ilíada homérica, que consolidará historicamente o ideal de homem da cultura grega. 
A moral homérica não estava preocupada com o cidadão comum, desejoso tão somente de 
uma vida prazerosa e tranquila, como teria sido a vida de Aquiles, mas com o herói, capaz de 
entregar a própria vida pelo ato heroico, de estar sempre pronto a arriscar sua existência desde 
que seja em prol de uma causa nobre. O heroísmo e o destino do herói ligado à morte6 
revelam ainda outro traço marcante de Homero, que influenciaria o pensamento grego em 
geral: a ideia de uma lei superior e universal. Há um ritmo uniforme, permanente, em que todo 
o movimento se realiza por ação própria, e nisso entram as ações de homens e deuses, heróis e 
não heróis. Trata-se de uma lei maior que governa a vida em geral e que se situa no limiar da 
Moral e da Ética. Homero preenche seus poemas com temas morais e naturalistas, descreve 
não somente as lutas, mas também a natureza, o cenário dos episódios, e a passagem dos 
tempos, demonstrando que além das façanhas humanas existe um limite imposto por uma lei 
universal. Dentro desse limite situa-se a Ética, como ciência que estuda a conduta humana. 6 
Contudo, há uma passagem importante na Odisseia, de um diálogo entre Ulisses e a psykhé de 
Aquiles no mundo dos mortos. Nesse trecho, constante no Canto XI, a sombra de Aquiles 
declara, quase em um alento de saudade, que as honras e lembranças dos grandes feitos só 
possuem validade entre os vivos, e tudo não passaria de sombras entre os mortos. Por esse 
pensamento, qualquer vida, ainda que miserável, poderia ser entendida como superior à 
morte. Seria preferível uma vida longa e sem glórias a um reinado no mundo dos mortos. Tal 
interpretação modificaria a visão de um Aquiles resoluto por uma vida trágica. (ASSUNÇÃO, 
2003). polis: cidade�estado na Grécia Antiga. Introdução ao pensamento filosófico 19 Para 
Homero, como para os gregos em geral, as últimas fronteiras da Ética não são convenções do 
mero dever, mas leis do ser. É na penetração do mundo por esse amplo sentido da realidade, 
em relação ao qual todo “realismo” aparece como irreal, que se baseia a força ilimitada da 
epopeia homérica. (JAEGER, 2003, p. 78) Há uma ligação do humano com o divino que permeia 
os poemas homéricos, tanto nas inúmeras interferências dos deuses na Guerra de Troia como 
nas inspirações provocadas por Atena na viagem de Ulisses. Homero não está preocupado em 
invadir o mundo interior de suas personagens, explorando suas emoções, mas sim as ações, os 
movimentos do mundo exterior que constituem a realização heroica. Cada ação, mesmo a 
cólera de Aquiles, tem dois lados: um humano, a motivação psicológica da personagem, e 
outro divino, que em geral se baseia em vontades dos deuses ou na causa primeira de tudo, a 
vontade de Zeus, o deus supremo. Há, portanto, uma ordem estável, que na Ilíada chega 
inclusive a ser descrita na forma de concílios entre os deuses, que, ainda que em alguns 
momentos se revele conflituosa entre as próprias figuras divinas, demonstra como além do 
protagonista existe sempre outra ordem a julgar e decidir o futuro. Também a Odisseia é 
repleta delas. Toda a saga de Ulisses é permeada tanto pelo dilema psicológico, a sua soberba 
contra osdeuses, como pela vontade divina, de Posêidon, em prejudicar o herói. Contudo, 
nesse limiar do humano com o divino, existe uma ordem que supera inclusive tal ligação. Por 
exemplo, mesmo Posêidon desejando aniquilar Ulisses por sua soberba, assim não pode fazê-
lo, pois o destino do herói já estava traçado, já estava determinado que ele deveria retornar à 
sua terra natal. Nesse contexto, Posêidon poderia apenas causar-lhe mais problemas e atrasar 
sua viagem. Tal situação poderia parecer ao leitor contraditória, pois para que Posêidon 
provocaria tantos problemas se Ulisses estava destinado a triunfar? Porém, somente quando 
alcançou o limite de seu sofrimento existencial, Ulisses compreendeu que era sua soberba 
quem lhe provocava tantos problemas. Ao realizar a passagem de humildade tornou-se novo 
homem, mais preparado para os novos desafios. Há uma justiça superior em Homero, que liga 
o humano ao divino e inclusive apresenta consequências além dessa dimensão. Tal justiça 
surge ainda em sua mais profunda acepção, aquela em que a Ética se preocupa com a 
formação do homem. É nesse sentido espiritual, que inclusive antecipa muitas ideias da 
filosofia grega em geral, que se encontra a ideia de justiça em Homero. A justiça homérica está 
estabelecida em um patamar elevado em que se liga o humano ao divino, nos limites éticos da 
ação humana que, embora motivada a expandir-se ao infinito e à arete do herói, chega sempre 
a um momento em que a ordem natural e superior das coisas, a lei universal, põe um fim. A 
ação ética não pode ser separada do movimento natural do universo, da fluidez do mundo 
exterior. O homem grego cultuado por Homero é aquele que, dentro desse cenário 
aparentemente limitado, é capaz de, por meio das virtudes do herói, realizar e construir uma 
vida sublime. A justiça está nesse agir ético, é uma concepção de justiça que se define a partir 
de um ideal de homem formado pelo cultivo das virtudes do herói, tendo a coragem arete: na 
poesia homérica, é a virtude heroica, a excelência na realização de atos corajosos e vitoriosos. 
20 Filosofia do Direito como cerne. Nesse sentido, a justiça é uma virtude interna, e sua prática 
não é uma obediência às leis, mas o ato de se guiar pelas virtudes éticas do herói e do ideal de 
homem grego, do homem nobre. Depois de Homero, houve outro grande poeta que 
influenciou bastante a formação do ideal grego de homem justo e ético: Hesíodo. Contudo, 
havia diferenças marcantes entre os dois. Hesíodo vivia em um tempo que não era tão dourado 
quanto o de Homero. Se em Homero era essencial cantar as façanhas dos heróis, em Hesíodo 
era mais importante cantar mensagens que ajudassem o povo agricultor e trabalhador a levar 
uma vida mais digna. Em Hesíodo se vê o segundo grande educador, agora não dos heróis e 
nobres, mas do povo e dos cidadãos comuns. O ideal de heroísmo trazido por Homero persiste, 
mas agora não revelado apenas nas lutas e guerras grandiosas, mas também no árduo trabalho 
cotidiano. Figura 2 – Retrato de Hesíodo Georgios Kollidas/Shutterstock. De Hesíodo nos 
chegaram duas poesias: a Teogonia e Os trabalhos e os dias. A primeira narra, em forma de 
mitos, a origem genealógica dos deuses, desde os deuses primordiais, que participaram da 
criação do universo, segundo a visão religiosa da Grécia Antiga, e depois as gerações seguintes 
de deuses, até os deuses olímpicos, como Zeus, Posêidon, Hades, Hera, Atena, entre outros. 
Também apresenta a lenda que dá origem aos humanos: o roubo do fogo sagrado por 
Prometeu e a criação de Pandora, a primeira mulher. Já Os trabalhos e os dias possui conotação 
bastante diversa. Aqui, é o próprio poeta, falando em primeira pessoa, com o dom da palavra e 
da verdade inspirado pelas musas7 , que procura dizer algumas verdades ao seu irmão Perses, 
com quem o poeta discute alguns bens a serem distribuídos em sucessão. Hesíodo procura 
demonstrar ao seu irmão como Zeus deseja a justiça e pune os 7 Na mitologia grega, as musas 
eram as nove filhas da união de Zeus com Mnemósina, que personifica a memória. Nasceram 
logo após a grande vitória dos deuses olímpicos contra os titãs, para justamente cantar as 
enormes façanhas dos vencedores. “As musas são apenas as cantoras divinas, cujos coros e 
hinos alegram o coração dos Imortais, já que sua função era presidir ao pensamento sob todas 
as suas formas: sabedoria, eloquência, persuasão, história, matemática, astronomia. Para 
Hesíodo, são as musas que acompanham os reis e ditam-lhes as palavras de persuasão, capazes 
de serenar as querelas e restabelecer a paz entre os homens. (BRANDÃO, 1997, p. 150-151) 
Introdução ao pensamento filosófico 21 injustos, de como a justiça está pautada na medida, e 
a hýbris (excesso) é aquilo que os deuses não aceitam. O poeta também fala a seu irmão do 
valor do trabalho, que representa a vitória pessoal dentro de um caminho honesto. Tudo isso 
traz o poeta por meio de relatos míticos: as duas lutas, Prometeu e Pandora e o mito das cinco 
raças. É, portanto, em Os trabalhos e os dias que concentraremos os nossos estudos, 
sobretudo na importância que o poeta dedicou às categorias justiça e trabalho e em como elas 
se entrelaçam numa conotação pedagógica para seu povo. Em Hesíodo revela-se a segunda 
fonte de cultura: o valor do trabalho. O título de Os Trabalhos e os Dias dado pela 
posterioridade ao poema rústico didático de Hesíodo, exprime isso perfeitamente. O heroísmo 
não se manifesta só nas lutas em campo aberto, entre os cavaleiros nobres e seus adversários. 
Também a luta silenciosa e tenaz dos trabalhadores com a terra dura e com os elementos tem 
o seu heroísmo e exige disciplina, qualidades de valor eterno para a formação do Homem. Não 
foi em vão que a Grécia foi o berço de uma humanidade que põe acima de tudo o apreço pelo 
trabalho. A vida despreocupada da classe senhorial em Homero não deve induzir-nos em erro: 
a Grécia exige dos seus habitantes uma vida de trabalho. (JAEGER, 2003, p. 85) Hesíodo centra 
seus esforços na formação do cidadão comum, o cidadão de seu tempo, ligado a uma época 
ainda agrária da história helênica. A região grega não possui um solo rico, os benefícios que 
podem ser tirados dele somente surgem se arrancados mediante o trabalho árduo, uma 
verdadeira luta do homem com a natureza. Hesíodo narra a “idade do ferro”, um período 
distante dos tempos dourados, que em sua passagem cronológica teve como resultado a 
“subversão do direito, da moral e da felicidade humana nos duros tempos atuais” (JAEGER, 
2003, p. 87). A passagem da história das cinco idades do mundo, que Hesíodo narra em Os 
trabalhos e os dias, revela esse sentimento pessimista que tem na idade do ferro seu ápice8 . 
Existiram cinco raças de humanos: a raça de ouro, a raça de prata, a raça de bronze, a raça dos 
heróis e a raça de ferro. Cada raça possui uma vida mais breve e mais sofrida, mais abalada 
pelas misérias do mundo do que a raça anterior (na ordem apresentada). Ainda assim, esses 
camponeses a quem Hesíodo se dirigia de modo algum devem ser confundidos com sujeitos 
incultos. Na Grécia hesiódica, em particular na Beócia, região onde vivia o poeta, ainda não 
existiam as grandes metrópoles. As cidades eram ainda bastante rurais, o que não impediu que 
a população já cultivasse o espírito político, ético e jurídico. Na região da Beócia, os cidadãos 
reuniam-se em grande número nas cidades para discutir as questões políticas e impedir a 
opressão das classes mais elevadas da sociedade. Exemplo disso está no poema de Hesíodo em 
8 Um rápido resumo das cinco raças é importante também para compreender a diferença de 
“eras” que Hesíodo via na sua era, em comparação àquela narrada por Homero. A primeira 
raça é a de ouro, nela os homens viviam com os deuses, e por isso não conheciam miséria nem 
dor. A segunda raça é a de prata, bastante inferior à primeira, pois aqui os homens vivem 100 
anos como crianças juntoàs mães, e logo quando alcançam a adolescência morrem porque 
não conseguem conter a louca hýbris dentro de si, o excesso provocado pelas paixões 
arrebatadoras. A terceira raça é a de bronze, dedicada às práticas de guerra e à violência; 
trabalham o bronze na confecção de armas, e vivem e morrem lutando; a quarta raça é a dos 
heróis, dos semideuses, que perecem como heróis mas depois suas almas habitam tranquilas a 
Ilha dos Bem-Aventurados; aqui se situam os heróis da Ilíada, por exemplo, e por isso a poesia 
homérica situa-se nessa era; por fim, a quinta raça é a do ferro, aquela em que vive Hesíodo, 
quando os homens são obrigados a trabalhar durante toda a vida para não morrerem de fome 
e miséria. (HESÍODO, 1996, p. 79-80). 22 Filosofia do Direito que o autor critica severamente o 
seu irmão Perses, que entregava a vida à preguiça, à inveja e às reclamações9 . Em outra 
passagem, não menos incisiva, o poeta denuncia os corruptos juízes de seu tempo, utilizando-
se de uma fábula, a do gavião e do rouxinol. Essa fábula abre a seção de seu texto intitulada A 
justiça: Agora uma fábula falo aos reis mesmo que isso saibam. Assim disse o gavião ao 
rouxinol de colorido colo no muito alto das nuvens levando-o cravado nas garras; ele miserável 
varado todo por recurvadas garras gemia enquanto o outro prepotente ia lhe dizendo: 
“Desafortunado, o que gritas? Tem a ti um bem mais forte; tu irás por onde eu te levar, mesmo 
sendo bom cantor; alimento, se quiser, de ti farei ou até te soltarei. Insensato quem com mais 
fortes queira medir-se, de vitória é privado e sofre, além de penas, vexame. (HESÍODO, 2002, p. 
39-40) Essa é uma crítica feroz de Hesíodo, que, ao se tornar porta-voz de seu tempo, denuncia 
a opressão que vivia grande parte da população diante daqueles que mantinham os poderes 
políticos e econômicos. A denúncia é pontual, direta aos corruptos. Tal crítica não pode ser 
resumida a uma classe da comunidade, mas a todos aqueles indivíduos que detêm mais poder 
e representação, sejam posições sociais, jurídicas, econômicas, políticas, e por essa vantagem 
se aproveitam da vida dos demais indivíduos e brincam com ela, tal como o gavião brinca com 
o rouxinol. Outra mensagem importante nessa citação é que Hesíodo aconselha a não se medir 
com aqueles considerados mais fortes, pois, assim como o rouxinol nada pode fazer com o 
gavião, um homem comum só tem a perder se decidir enfrentar alguém de maior poder e 
influência social. Hesíodo reprova o caminho dos conflitos e das intrigas e aconselha a todos a 
percorrerem o caminho do trabalho, que é mais digno, honesto, e os frutos são merecidos, pois 
são conquistados pelo próprio esforço e mérito, além de não exigir se medir com indivíduos 
mais poderosos. Percebemos, então, como a ética de Hesíodo distancia-se da ética homérica 
por tentar situá- -la em um plano mais terreno, material, diferente da grandiosidade da Ilíada e 
da Odisseia, que buscam um ideal elevado de homem, talvez difícil de ser alcançado. O ideal de 
Hesíodo relaciona-se diretamente à situação histórica de seu povo, tem efeitos práticos 
imediatos, é a luta cotidiana contra o solo, contra a natureza, contra a opressão, é a luta dos 
cidadãos comuns pela aplicação do Direito. Nesse sentido, Hesíodo diferencia-se ainda mais de 
Homero, sua poesia abandona a objetividade da epopeia e encarna o ideal de seu povo, 
passando a defender o Direito e atacar a injustiça em primeira pessoa. Em Hesíodo introduz-se 
pela primeira vez o ideal que serve como ponto de cristalização a todos esses elementos e 
adquire uma elaboração poética em forma de epopeia: a ideia do Direito. A propósito da luta 
pelos próprios Direitos, contra as usurpações do seu irmão e a venalidade dos nobres, 
expande-se no mais pessoal dos seus poemas, “Os Erga”, uma fé apaixonada pelo Direito. A 
grande novidade dessa obra está em o poeta falar na primeira pessoa. Abandona a tradicional 
objetividade da epopeia e torna-se porta-voz de uma doutrina que maldiz a injustiça e bendiz o 
direito. É o enlace imediato do poema com a disputa 9 Vejamos um trecho de Hesíodo: 
“trabalha, ó Perses, divina progênie, para que a fome te deteste e te queira a bem coroada e 
veneranda Deméter, enchendo-te de alimentos o celeiro; pois a fome é sempre do ocioso 
companheira; deuses e homens se irritam com quem ocioso vive”. (HESÍODO, 2002, p. 45) 
Introdução ao pensamento filosófico 23 jurídica sustentada contra o seu irmão Perses, que 
justifica essa ousada inovação. Fala com Perses e dirige a ele admoestações. Procura convencê-
lo de mil maneiras de que Zeus ampara a justiça, ainda que os juízes da Terra a espezinhem, e 
de que os bens mal adquiridos nunca prosperam. (JAEGER, 2003, p. 91) Tal como o poeta da 
Ilíada e da Odisseia, Hesíodo também concebe o Direito e a Justiça como bens divinos, 
relacionados a Zeus, e as injustiças terrenas como meros fatos existenciais humanos. Hesíodo 
se põe como interlocutor das musas, e não como o autor propriamente dito, de forma que em 
várias partes de seu poema há prodigiosas preces a Zeus e argumentos tentando convencer 
Perses da condição divina da Justiça, por ser esta obra do senhor do Olimpo. O fato de se pôr 
ainda em primeira pessoa revela esse caráter apelativo, de compreender Os trabalhos e os dias 
não somente como poema didático, mas também como clamores de todo um povo por justiça. 
A veemência com que Hesíodo maldiz a injustiça e as condutas de Perses corroboram essa 
ideia. Àqueles que a forasteiros e nativos dão sentenças retas, em nada se apartando do que é 
justo, para eles a cidade cresce e nela floresce o povo; sobre esta terra está a paz nutriz de 
jovens e a eles não destina penosa guerra o longevidente Zeus: nem a homens equânimes a 
fome acompanha nem a desgraça: em festins desfrutam dos campos cultivados; a terra lhes 
traz muito alimento; nos montes, o carvalho no topo traz bálanos e em seu meio, abelhas; [...] 
Àqueles que se ocupam do mau excesso, de obras más, a eles a Justiça destina o Cronida, Zeus 
longevidente. Amiúde pega a cidade toda por um único homem mau que se extravia e que 
maquina desatinos. Para eles do céu envia o Cronida grande pesar: fome e peste juntas, e 
assim consomem-se os povos [...]. (HESÍODO, 2002, p. 39-41) Um governante corrupto, 
portanto, atrai sozinho toda a desgraça para o seu povo, pois pratica atos injustos que são 
odiados por Zeus. Hesíodo pontua aqui a responsabilidade maior dos líderes, que, por 
representarem interesses de toda uma população, não devem pensar somente em si mesmos, 
mas na coletividade, pois o fracasso deles é também fracasso de muitas outras pessoas. 
Hesíodo lamenta ter nascido em um momento histórico em que vigora unicamente o direito do 
mais forte, e não a justiça em seu sentido pleno e divino. Essa passagem também pode ser 
transportada para a esfera jurídica da contemporaneidade, como crítica aos juízes que não 
exercem suas profissões com a devida ética que deles se espera. Em muitos casos impera o 
direito do mais forte, dos juízes que, comandando o Direito, fazem da Justiça um instrumento 
para alcançar seus interesses e satisfações. O gavião não está preocupado com a vida e o 
destino do rouxinol, assim como muitos juízes não se interessam pela vida das partes que 
chegam até ele querendo resolver um conflito. Essa atitude autoritária reduz o Direito a um 
simples instrumento, longe de sua antiga acepção divina e nobre que tanto foi sustentada por 
Homero ao enaltecer as virtudes do herói. Salienta-se, porém, que o objetivo de Hesíodo é 
pedagógico, é demonstrar a fraqueza do Direito de seu tempo, ensinando aos indivíduos 
comuns como interagir no processo judicial e tentando romper com o autoritarismo dos juízes 
e senhores do poder. Ao mesmo tempo que critica os poderosos senhores corruptos, orienta o 
cidadão a não travar essa guerra, a seguir sua vida trabalhando arduamente dia a dia. 24 
Filosofia doDireito Ainda na temática Justiça, Hesíodo trabalha a questão do Direito na ideia de 
um processo. Nesse sentido, a luta divina dos heróis em Homero converte-se na luta pelo 
Direito em Hesíodo, representada na forma do processo. Porém a luta divina em Hesíodo é 
diferente daquela em Homero, no que concerne à participação dos deuses nos grandes 
eventos. Se na Ilíada e na Odisseia os deuses faziam intervenções no decorrer da história, 
favorecendo esse ou aquele personagem, Hesíodo se limita a rogar a Zeus para que se faça a 
justiça, pois sua condição humana, pertencente à raça de ferro, não lhe garante acesso a esse 
nível de conhecimento, o das ações e intenções divinas. Os heróis podiam recorrer e pedir 
auxílio aos deuses, os homens da raça de ferro, não, por se situarem em uma posição inferior, 
se comparada à das raças anteriores. Entretanto, a ação judicial também pode ser 
compreendida como um conflito divino. Ainda que de fato um processo não receba dos deuses 
a mesma atenção que merece uma epopeia, a ação judicial envolve a aplicação humana da 
Justiça, ou seja, a aplicação daquilo que deseja Zeus para os humanos. A poesia desenvolve-se 
na história de um processo resultante de uma herança, em que Perses, após subornar o juiz, 
consegue contrair para si mais da metade dos bens a que tinha direito. Hesíodo desfere severas 
críticas a Perses, devido à sua cobiça, assinalando ainda que o único caminho aceitável para a 
obtenção de riquezas é pelo trabalho. “O trabalho é, de fato, uma necessidade dura para o 
Homem, mas uma necessidade. E quem por meio dele provê sua modesta subsistência recebe 
bênçãos maiores do que aquele que cobiça injustamente os bens alheios” (JAEGER, 2003, p. 
93). O trabalho não constitui por si só uma benção, mas seus resultados consentem realização 
e paz. Ainda que árduo e cansativo, é somente o trabalho que possibilita ao homem conquistar 
seus bens sem ferir a justiça divina implementada por Zeus. Esse caráter aparentemente 
contraditório, de sofrimento de um lado e tranquilidade de outro, revela-se em Hesíodo 
também de forma religiosa e mítica, por meio do mito de Prometeu. Para Hesíodo, o 
sofrimento advindo do labor não pode ser algo natural ao homem, pois a dor e o sofrimento 
não condizem com a natureza divina nem com a ordem das coisas. Sendo assim, o trabalho e o 
sofrimento só podem ter surgido em algum dado momento da história da humanidade. 
Hesíodo aplica a forma “causal” de pensar, própria da Teogonia, à história de Prometeu, nos 
Erga, e aos problemas éticos e sociais do trabalho. O trabalho e os sofrimentos devem ter 
aparecido algum dia no mundo. Não podem ter feito parte, desde a origem, da ordem divina e 
perfeita das coisas. Hesíodo assinala- -lhes que encara do ponto de vista moral. Como castigo, 
Zeus criou a primeira mulher, a astuta Pandora, mãe de todo o gênero humano. Da caixa de 
Pandora saíram os demônios da doença, da velhice, e outros males mil que hoje povoam a 
Terra e mar. (JAEGER, 2003, p. 85) Como se percebe, o sofrimento provocado pelo trabalho 
advém desse fato anterior cometido, que possui também relação com o mundo jurídico – o 
roubo do fogo sagrado cometido por Prometeu. É devido a esse espírito religioso que o 
trabalho recebe a conotação de ser exaltado; para o homem comum, trabalhar não significa 
somente o árduo esforço de se livrar de uma vida preguiçosa e desviante, mas também 
vivenciar a humildade dos mortais perante os deuses do Olimpo. Aqui clareia-se ainda mais o 
ideal pedagógico da poesia hesiódica. O primeiro mito narrado nos Erga, a narração das cinco 
idades do mundo, com suas cinco raças, demonstra o processo de degeneração do Introdução 
ao pensamento filosófico 25 homem através dos tempos, passando de uma raça feliz e sem a 
necessidade de recorrer ao trabalho até a raça de ferro, a humanidade do período em que vive 
Hesíodo. Esse mito depois é seguido pelo mito de Prometeu, que narra o início do trabalho e 
do sofrimento do homem. Como síntese, então, Hesíodo vê o trabalho como uma condição 
sofrida e árdua aos humanos, mas que é a única via aberta pelos deuses à riqueza justa. 
Concluindo essa análise, temos o final da primeira parte da obra: Não faças maus ganhos, maus 
ganhos granjeiam desgraça. Ama a quem te ama e frequenta quem te frequenta; Dá a quem te 
dá e a quem não te dá, não dês. Ao que dá se dá e ao que não dá, não se dá. Doar é bom, 
roubar é mau e doador de morte; Pois o homem que dá de bom grado, mesmo doando muito, 
Alegra-se com o que tem e em seu ânimo se compraz. Confiando na impudência, quem para si 
próprio furta, Mesmo sendo pouco, deste se enrijece o coração, Pois se um pouco sobre um 
pouco puseres E repetidamente o fizeres logo grande ficará. Quem acrescenta ao que já tem 
ardente fome afastará; O armazenado em caso desassossego ao homem não traz; Melhor é o 
de casa, o de fora danoso é. Bom é pegar do que se tem; para o ânimo é provação Precisar do 
que não há; convido-te a nisto pensar! [...] Facilmente imensa fortuna forneceria Zeus a 
muitos: Quanto maior for o cuidado de muitos, maior o ganho. Se nas entranhas riqueza 
desejar teu ânimo, Assim faze: trabalho sobre trabalho trabalha. (HESÍODO, 2002, p. 49-51) 
Segundo o autor, aquele que enriquece pelo próprio esforço é agraciado por Zeus, e aquele 
que procura enriquecer com base na injustiça é desgraçado pelo senhor dos deuses. Quadro 1 
– Distinções entre Homero e Hesíodo Homero Hesíodo • Viveu em uma época de glórias do 
povo grego • Exaltava façanhas dos heróis • Educador dos heróis e nobres • Heroísmo provém 
de lutas e guerras grandiosas • Época menos afortunada para a sociedade grega • Mensagens 
para ajudar o povo agricultor e trabalhador a levar uma vida mais digna • Educador do povo e 
do cidadão comum • Heroísmo provém de guerras, mas também do árduo trabalho cotidiano 
Fonte: Elaborado pelo autor. No quadro apresentado, podemos notar como as mudanças 
sociais entre as épocas vividas por Homero e Hesíodo influenciaram sua produção literária, 
alterando o alvo de suas obras e, principalmente, o ideal de herói a ser perseguido pela 
população. 26 Filosofia do Direito 1.3 Filosofia e política na Grécia Antiga A admiração pelo 
saber tornou-se maior, sobretudo, com os gregos antigos, que viviam um período de profunda 
busca pelo saber. Da Teologia à Política, passando pelas várias artes e ciências, tudo era objeto 
de grandes investigações e reflexões. Fervilhava o espírito crítico, reflexivo e investigador da 
natureza no mundo grego. Esse momento, talvez único na história humana, surge juntamente 
com a figura do homem político. O fato de tanto a Filosofia como a Política terem nascido no 
mesmo período e no mesmo lugar merece algumas reflexões, pois ajuda a demonstrar que, no 
fundo, os gregos viviam uma época de liberdade de pensamento. O primeiro pensador a 
empregar o termo filosofia foi Pitágoras, que juntou as palavras philos (amor) e sophia (saber), 
ou seja, o amor ao saber, à sabedoria. “O termo é deveras expressivo. Os primeiros filósofos 
gregos não concordaram em ser chamados sábios, por terem consciência do muito que 
ignoravam. Preferiam ser conhecidos como amigos da sabedoria, ou seja, filósofos” (REALE, 
2002, p. 5). O historiador Diôgenes Laêrtios, que viveu a antiguidade helenista, mostra que 
para os gregos a sabedoria era considerada algo supremo, e que somente os deuses eram 
capazes de possuí-la em sua completude. Os homens nunca conseguiriam alcançar o completo 
entendimento do mundo, das coisas, do universo, da vida, dos deuses ou de si mesmos 
(LAÊRTIOS, 1987, p. 15). Contudo, isso não era desmotivador, pois a exigência de aprender, 
aliada à humildade de reconhecer que pouco se sabe, era a força que impulsionava aqueles 
pensadores ao desconhecido, a tentar chegar cada vez mais próximo da sabedoria. Essa noção 
de humildade e necessidade de conhecer nasceu da incrível estupefação que os pensadoressentiam diante das maravilhas que a natureza apresentava. Não por acaso, essa estupefação 
conduzia os filósofos a pesquisarem a Matemática, a Ética, a Teologia, a Astronomia, a Música, 
e tantas outras matérias do conhecimento. O completo entendimento de todo esse universo 
que nos rodeia é possível somente aos deuses, de forma que buscarmos avançar cada vez mais 
nesse anseio é também trilhar um caminho divino. Na Metafísica, Aristóteles afirma que a 
“Filosofia era a admiração pelo saber, e por isso mesmo aqueles que amavam os mitos eram 
filósofos, porque nutriam nos mitos essa admiração pelo saber” (ARISTÓTELES, 2002). Os mitos 
não eram, para os gregos, apenas um conjunto de crenças, aspectos culturais e religiosos de 
um povo, eram manifestações do íntimo humano na tentativa de explicar os fenômenos 
naturais, sociais, o cosmos, os deuses. Portanto os mitos também exprimiam a admiração ao 
saber e, por isso, é imprescindível que partamos deles para depois explorarmos a história do 
pensamento filosófico. Para compreendermos o percurso histórico da Filosofia do Direito, 
acompanhando a construção de conceitos como Direito, Justiça, liberdade, cidadania, Ética, 
igualdade, é importante partir do momento que lançou as bases para a formação da 
racionalidade ocidental: o mundo grego. Foi na Grécia que surgiram os primeiros filósofos do 
Ocidente, que influenciam inclusive os pensadores contemporâneos. Os primeiros filósofos 
foram os chamados pré-socráticos, que se tornaram célebres por realizarem grandiosas 
argumentações sobre a ordem e o princípio das coisas, pela tentativa de Introdução ao 
pensamento filosófico 27 explicar a natureza, a existência humana, e mesmo questões divinas 
e transcendentais. É com os pré-socráticos que a Ontologia se origina. Antes, é importante 
compreender os movimentos que influenciaram a criação do pensamento filosófico e 
contribuíram enormemente para isso, pois os pré-socráticos não poderiam conceber seus 
grandes conceitos sem a influência dos poetas, em especial Homero e Hesíodo. Depois houve 
outros poetas que também foram importantes, como Tirteu, Arquíloco, Alceu, Safo e inclusive 
o grande Sólon, que também foi célebre político ateniense10. Para compreendermos a origem 
da filosofia grega, é preciso, além de recorrer aos poetas, buscar também entender o processo 
cultural e político enfrentado pelos gregos, conforme vimos durante a explicação das obras dos 
poetas. Não há como separar: a filosofia grega, em sua forma racional e sistemática mais bem 
acabada, surge juntamente com as cidades-Estado. O filósofo surge junto com o político. As 
culturas anteriores possuíam a figura do político e suas organizações político-jurídicas, mas não 
eram analisadas sistematicamente e racionalmente tal como faziam os gregos. A Política como 
ciência, que concebia as formas de organização social, de governo, do problema da validade e 
da imposição das leis, de quem e como deve governar, tudo isso é criação grega. Não há entre 
os hebreus, egípcios, chineses ou indianos um estudo tão sistemático da Política como aquele 
realizado por Aristóteles, nem uma preocupação da união indissolúvel entre política e 
educação como faz Platão na República. Os gregos se atreveram a trazer o conceito de Justiça 
para o âmbito público, social, do cidadão da polis, situação impensável no mundo anterior, que 
remetia a uma divindade transcendente toda a problemática da verdade e da Justiça, de forma 
que o homem, como adorador dos deuses, existia para praticá-la e aperfeiçoá-la no mundo 
terreno, sem contudo ter poder para contestá-la ou mesmo modificá- -la. No mesmo período e 
no mesmo lugar nasceram a Filosofia e a Ciência Política. Vejamos agora como se dá esse 
processo e a que ponto o político contribui com o surgimento do pensamento filosófico. 1.4 A 
Justiça como questão filosófica Com a explosão do comércio marítimo e a expansão dos 
domínios gregos, a vida pública tornou-se progressivamente mais importante, com as 
discussões políticas e jurídicas ocupando grandes centros de debate da polis. O novo cenário 
ampliou os horizontes dos gregos e foi propício para o surgimento de novas ideias e discussões 
sobre questões éticas, jurídicas e políticas. Embora a esfera religiosa jamais tenha deixado de 
influenciar a sociedade grega, vivia-se um momento em que o homem cada vez mais ousava 
contrair para si diversos assuntos. Entre essas ideias ousadas está a alta estima tanto pelos 
poetas como depois também pelos filósofos acerca dos conceitos de Direito e Justiça e a 
atribuição da importância dessas categorias para a organização da comunidade. A grande 
novidade trazida pelos gregos está no fato de conceber a comunidade como uma organização 
essencialmente humana, tendo suas concepções e determinações político-jurídicas como 
materialização da vontade de seus próprios cidadãos. 10 Para maiores informações sobre esses 
outros poetas, é interessante observar o capítulo dedicado a eles na Paideia, de Jaeger, e 
também a obra de Donaldo Schüler, Literatura Grega (SCHÜLER, 1985). 28 Filosofia do Direito 
Ainda que nos séculos seguintes a administração do Direito permanecesse nas mãos dos 
nobres, que controlavam leis não escritas e aplicadas a toda a população, a nova concepção 
humanista de Direito permitiu aos cidadãos em geral contestar esse abuso político por parte 
dos magistrados. A oposição entre nobres e cidadãos livres acabou gerando o movimento de 
positivação dos direitos, em que as leis passaram de não escritas a escritas, de forma que 
poderiam valer igualmente para todos. “Direito escrito era direito igual para todos, grandes e 
pequenos” (JAEGER, 2003, p. 134). Nesse processo, os grandes porta-vozes da violência 
causada pelos magistrados foram justamente os poetas, em particular Hesíodo. A luta pela diké 
seria então a luta pela aplicação do Direito, o que envolveria, inclusive, a luta de classes. “Hoje, 
como outrora, podem continuar a ser os nobres, e não os homens do povo, os juízes. Mas 
estão submetidos no futuro, nas suas decisões, às normas estabelecidas na diké” (JAEGER, 
2003, p. 134). Contudo, inclusive antes de Hesíodo, a vontade de conceber a Justiça como uma 
fonte indispensável para a organização social já se via nos poemas homéricos. Homero 
representa ainda o início desse longo processo que é a passagem do Direito de sua condição 
essencialmente divina para uma construção humana. Em Homero, o Direito é designado com o 
termo themis, um “compêndio da grandeza cavaleiresca dos primitivos reis e nobres senhores. 
Etimologicamente significa ‘lei’” (JAEGER, 2003, p. 134). A themis era concedida por Zeus aos 
reis nos tempos homéricos. Tão antigo quanto o conceito de themis é também o de diké. O 
conceito de diké não é etimologicamente claro. Vem da linguagem processual e é tão velho 
quanto themis. Dizia-se das partes contenciosas que “dão e recebem diké”. Assim se 
compendiava numa só palavra a decisão e o cumprimento da pena. O culpado “dá diké”, o que 
equivale originariamente a uma indenização, ou compensação. O lesado, cujo direito é 
reconduzido pelo julgamento, “recebe diké”. O juiz “reparte diké”. Assim, o significado 
fundamental de diké equivale aproximadamente a dar a cada um o que lhe é devido. Significa 
ao mesmo tempo, concretamente, o processo, a decisão e a pena. (JAEGER, 2003, p. 134-135) 
Nesse sentido, enquanto a themis está relacionada à autoridade da lei, à sua validade e 
aplicabilidade a todos os cidadãos, a diké se refere à sua própria aplicação. Na themis observa-
se muito mais um princípio primeiro da fundamentação jurídica, da qual provém a legitimidade 
para imposição da lei, enquanto na diké vemos o próprio movimento de realização do Direito e, 
por isso, abrange na mesma palavra as ideias de processo, sentença e pena. Ademais, a 
aproximação da diké a uma ideia de equidade, em que o Direito se reparte de forma justa a 
todos os cidadãos,tornou-se o fundamento principal para as lutas de todos em nome de seus 
direitos. Como cada um tem parte nessa ideia de Justiça, possui também o direito de lutar por 
seu direito. Dessa forma, a diké representa também o direito de cada cidadão a lutar contra a 
hybris, que por sua vez equivale à ação contrária ao Direito. Significa que há deveres para cada 
um e que cada um pode exigir, e, por isso, significa o próprio princípio que garante essa 
exigência e no qual se poderá apoiar quem for prejudicado pela hybris – palavra cujo 
significado original corresponde à ação contrária ao Direito. Enquanto themis refere-se 
principalmente à autoridade do Direito, à sua legalidade e à sua validade, diké significa o 
cumprimento da Justiça. Assim se compreende que a palavra diké se tenha convertido 
necessariamente em grito de combate de uma época em hybris: violação dos limites que o 
homem deve manter na relação consigo e com os outros, a perda do equilíbrio nas ações. 
Introdução ao pensamento filosófico 29 que se batia pela consecução do Direito a uma classe 
que até então o recebera apenas como themis, quer dizer, como lei autoritária. O apelo à diké 
tornou-se de dia para dia mais frequente, mais apaixonado e mais premente. (JAEGER, 2003, p. 
135) Na diké o cidadão encontrava o fundamento para poder reclamar a Justiça, o que significa 
enfrentar o próprio Direito estabelecido naquele momento. O Direito dessa forma já não era 
algo consolidado como uma manifestação divina, que não podia ser contestado pelo cidadão 
comum, mas um movimento formado, também, pela luta pelo Direito11. Como síntese, o 
Direito entre os gregos tornou-se um processo de formação, o homem desenvolvia-se ao 
mesmo tempo que desenvolvia a ideia de Direito. A igualdade é o conteúdo principal da diké, o 
objetivo de se dar a cada um o que é seu, uma prerrogativa de fazer todos os cidadãos livres 
iguais perante o Direito. A partir daí a igualdade ocuparia sempre lugar central nas discussões 
jurídicas e políticas, chegando a influenciar os grandes filósofos Platão e Aristóteles: “A 
exigência de um Direito igualitário constitui a mais alta meta para os tempos antigos” (JAEGER, 
2003, p. 136). Nessa nova concepção de Direito, os nobres tiveram que também se submeter à 
igualdade de todos. Essa igualdade, contudo, não poderia ser resumida em uma igualdade de 
todos perante a lei, mas sim da própria acepção de Direito. O Direito assemelha-se a uma 
medida para decidir as questões entre o “‘meu’ e o ‘teu’” (JAEGER, 2003, p. 136), de tal forma 
que se possa fixar o Direito, atribuindo a cada um o que é seu. Essa mudança, visando a uma 
igualdade jurídica e política, operou-se ao mesmo tempo em que se delimitava, na esfera 
econômica, a fixação de medidas e pesos para o intercâmbio de mercadorias. Assim como a 
economia fixava a medida e o peso, o Direito fixava as normas. Logo, trata-se de um 
movimento amplo no qual o que se apresenta é a própria formação do povo grego, um 
desenvolvimento cultural sem o qual seria impensável o surgimento, por exemplo, da 
democracia, que para ser instituída depende do princípio de que todos são iguais perante a lei. 
“Procurava-se uma ‘medida’ justa para a atribuição do Direito e foi na exigência de igualdade, 
implícita no conceito de diké, que se encontrou essa medida” (JAEGER, 2003, p. 136). A 
delimitação de medidas foi essencial para a construção do Direito, não somente no sentido 
positivo, da produção e aplicação de normas, mas também na própria esfera moral, na 
delimitação e fixação de condutas que não poderiam ser praticadas. Desde os tempos 
primitivos encontram-se na literatura e na mitologia menções a delitos, como o assassínio, o 
adultério, o furto e o rapto.12 Essa delimitação de condutas, de limites às ações humanas, 
inclusive anteriores à fixação de normas, provém de um conceito ligado à ideia de diké, o 
termo díkayosine, que não possui uma tradução moderna equivalente. A dikayosine representa 
a medida abstrata, mas amplamente efetiva, que constituía o conteúdo essencial das primeiras 
leis escritas. 11 Percebe-se já entre os gregos o fundamento principal para a luta pelo Direito 
como condição para a existência do próprio Direito, antecipando em muitos séculos a 
concepção do Direito como luta, de Jhering. 12 Ésquilo narra em Prometeu Acorrentado a 
história do furto do fogo dos deuses por Prometeu, que o entregou aos mortais, assim como na 
Ode a Deméter vemos o relato do rapto de Perséfone por Hades, e inclusive a conclusão do 
Direito como uma medida justa, em que a vítima permaneceria metade do ano na Terra e a 
outra metade no mundo dos mortos, gerando as quatro estações. Percebe-se como as noções 
de medida e delimitação já estavam desde sempre presentes na mentalidade grega. 30 
Filosofia do Direito O novo termo proveio da progressiva intensificação do sentimento da 
Justiça e da sua expressão num determinado tipo de homem, numa certa arete. 
Originariamente, as aretai eram tipos de excelência que se possuíam ou não. Nos tempos em 
que a arete de um homem equivalia à sua coragem, colocava- -se no centro esse elemento 
ético, e todas as outras excelências que um homem possuísse se subordinavam a ele, e deviam 
pôr ao seu serviço. A nova dikayosine era mais objetiva. Tornou-se a arete por excelência, 
desde o instante em que se julgou ter na lei escrita o critério infalível do justo e injusto. Pela 
fixação escrita do nomos, isto é, do direito consuetudinário válido para todas as situações, 
ganhou conteúdo palpável. Consistia na obediência às leis do Estado, como mais tarde a 
“virtude cristã” consistiria na obediência às ordens do divino. (JAEGER, 2003, p. 137-138) A 
dikayosine, nesse sentido, era a expressão positiva e mesmo ética de um ideal de homem, de 
um elevado tipo de homem dotado de certas virtudes, tal como o guerreiro antigo que deveria 
guiar-se pela coragem. As leis do Estado não seriam obedecidas simplesmente por sua 
autoridade coercitiva, mas por serem a expressão desse sentimento de Justiça, dessa fixação 
do justo e do injusto ao qual o homem grego se submetia. As leis escritas refletiam os 
costumes, que por sua vez representavam esse critério criado em um processo histórico e 
espiritual da Justiça como uma virtude. Nessa perspectiva, o Direito era resultado da Justiça, da 
medida e do critério que delimita o justo e o injusto, e seguir o Direito significaria viver 
conforme esse ideal virtuoso de homem. Delineia-se aqui o essencial papel que cumpre o ideal 
de formação de homem na cultura grega, em que mesmo o Direito deveria ser utilizado para a 
formação do homem, do cidadão, do membro da polis. Com a Justiça sendo inserida como 
virtude central da polis, abandonou-se a concepção anterior da valentia como arete máxima, 
advinda da sociedade espartana, voltada principalmente às guerras, mas surgiu a necessidade 
de cultivar um novo tipo de homem, aquele relacionado essencialmente às atividades públicas, 
sejam elas jurídicas, políticas, artísticas ou intelectuais em geral. Não era mais a guerra o centro 
das disposições de vontade do homem grego, mas a cultura e a organização social. “O conceito 
de Justiça, tida como a forma de arete que engloba e satisfaz todas as exigências do perfeito 
cidadão, supera naturalmente todas as formas anteriores” (JAEGER, 2003, p. 139). A Justiça 
como virtude cardeal, que resume todas as demais, tal como afirmariam posteriormente 
Platão e Aristóteles, apresenta essa nova forma de pensar criada pelo homem grego, derivada 
do crescimento tanto econômico como cultural da polis. Desse processo advém todo o valor de 
o homem grego sentir-se parte de seu Estado; seu sentimento pátrio estava em viver conforme 
aquelas virtudes preceituadas por ele e inseridas no espírito da constituição. Também por esse 
motivo, o Estado deveria promover a educação a todos os jovens, com ensino público, porque 
somente assim teria a certeza deque a juventude seria formada dentro do seu ideal de 
homem, conforme as virtudes que determinavam o conteúdo de sua constituição. O ensino 
público não existia simplesmente por ser uma obrigação estatal, mas por essa necessidade 
pedagógica (JAEGER, 2003, p. 141). É por essa razão que Platão e Aristóteles afirmam que cada 
Estado, pela lei, expressa e interioriza nos seus cidadãos o seu ideal de homem. Para os gregos, 
como vemos, a legislação possuía por conteúdo sua mais elevada condição. Sua existência não 
estava apenas na regulamentação da sociedade, mas essencialmente na educação, no cultivo 
de seu tipo ideal de homem. Introdução ao pensamento filosófico 31 A herança de normas 
jurídicas e morais do povo grego encontrou na lei a sua forma mais universal e permanente. 
Platão culminou a sua obra, de Filosofia Pedagógica com a sua conversão em legislador, na 
última e maior das suas obras; e Aristóteles conclui a Ética com o apelo a um legislador que lhe 
realize o ideal. A lei é também uma introdução à Filosofia, na medida em que, entre os Gregos, 
a sua criação era obra de uma personalidade superior. Com razão, o legislador era considerado 
educador de seu povo, e é característico do pensamento grego que ele seja frequentemente 
colocado ao lado do poeta, e as determinações da lei junto das máximas da sabedoria poética. 
Ambas as atividades são estreitamente afins. (JAEGER, 2003, p. 143) Ética e Direito entrelaçam-
se a tal maneira que quase passam a entender-se como sinônimos. Pela Ética, o Estado tinha a 
garantia à educação de seu Direito, de suas leis; e pelas leis, pelo Direito, o Estado garantia 
também a formação do seu ideal de homem, cultivado naquelas virtudes que sua Ética 
consagrou. Nessa comunidade ética, o cidadão vivia conforme a vida política, cívica, em que ele 
próprio existia no Estado e participava do bem comum, dos interesses gerais da polis. Essa 
existência pública e política imprimia no espírito do cidadão um dever ético de realizar e viver 
também para a evolução do Estado, da comunidade. Como o Estado lhe concedia inúmeros 
direitos, oriundos da antiga diké e do seu princípio da igualdade, entre eles a educação pública, 
era seu dever contribuir com o crescimento do Estado. Dessa necessidade resultou o 
crescimento intelectual, profissional e espiritual do homem grego. Em sentido prático, isso 
inclui a grande transformação na sociedade grega, a passagem da antiga sociedade rural dos 
tempos hesiódicos a uma polis urbana, voltada essencialmente aos interesses citadinos. A 
habilitação profissional não era apenas dever por ser o trabalho uma atividade que desenvolve 
a si próprio, mas também para contribuir com a polis. Se o cidadão recebia a educação, sentia-
se no dever de tornar-se cada vez mais um melhor profissional. O Estado é a essência do 
cidadão grego para onde dirigem todas as suas atividades espirituais. Para esse modelo de 
homem, fazer parte do Estado era sentimento de felicidade, de viver conforme o ethos. É um 
cosmos legal segundo esse velho modelo helênico – onde o Estado seria o próprio espírito e a 
cultura espiritual visaria o Estado como seu fim último – o que Platão esboça nas Leis. Ali ele 
define como oposta ao saber especializado dos homens de ofícios, negociantes, merceeiros, 
armadores, a essência de toda a verdadeira educação ou paideia, a qual é educação na arete 
que enche o homem do desejo e da ânsia de se tornar um cidadão perfeito, e o ensina a 
mandar e obedecer, sobre o fundamento da Justiça. (JAEGER, 2003, p. 146-147) A educação 
política, ou ainda a techné política, não pode ser ensinada como se faz com o ensino das 
profissões especializadas em uma atividade, porque nesses casos exige-se sobretudo a parte 
técnica, enquanto na arte política não basta o caráter técnico, os saberes teóricos e práticos, 
mas a educação do ethos, da arete. Não se pode medir o cidadão pelo seu conhecimento, mas 
pelo seu caráter, pelo cultivo que fez das virtudes e da educação político-humanista concedida 
pelo Estado. 1.5 As principais disciplinas da Filosofia Após estudarmos o surgimento da 
Filosofia, é importante apresentá-la de forma geral em suas principais disciplinas, que depois 
se aprofundam e fundamentam as grandes discussões sobre a verdade, techné: ofício, 
habilidade, arte, ciência aplicada. 32 Filosofia do Direito o conhecimento, a justiça, entre outras 
categorias fundamentais. Esse estudo introdutório é essencial para compreendermos os 
pensamentos elaborados pelos filósofos que ainda serão abordados. A Filosofia pode ser 
dividida em três grandes disciplinas, partindo destas todas as demais áreas do conhecimento 
filosófico e, por conseguinte, também todo o conhecimento científico, dada sua vinculação 
genealógica com a Filosofia. Essas três grandes áreas são a Ontologia, a Epistemologia e a Ética. 
A Ontologia13, o estudo do ser, pode ser entendida como o estudo que busca conhecer o ser e 
seus modos. É a disciplina da Filosofia que pretende identificar as essências dos seres e seus 
acidentes, aquilo que especifica qualquer coisa, individuando-a ante as demais, bem como os 
acidentes, os elementos que qualificam essa substância individuada. Trata-se da mais abstrata, 
porém mais profunda das áreas da Filosofia, pois estuda os elementos que constituem toda a 
realidade. Por tal motivo, a Ontologia ocupa-se também do estudo das causas dos fenômenos, 
até encontrar um princípio primeiro, de onde partem todos os demais, sendo chamada, assim, 
de Filosofia Perene. Com a Ontologia, entra-se no estudo da causalidade, sendo o ser humano 
um efeito de uma vasta lógica que se origina no Ser. A natureza humana é conferida pelo Ser, 
de tal modo que o aprofundamento dos estudos ontológicos facilita a compreensão da própria 
natureza humana. Outra grande área de estudo da Filosofia é a Teoria do Conhecimento14, 
também chamada de Epistemologia15 e de Gnoseologia16, que se ocupa do modo de 
conhecimento do homem e de como esse conhecimento poderá ou não ser considerado 
verdadeiro, científico (episteme), caracterizando-se na segunda situação meramente como 
uma opinião (doxa). Busca encontrar a evidência que ateste a veracidade de um conhecimento, 
pressuposto essencial para se fazer Filosofia ou ciência. Dentro da Epistemologia, estudamos o 
limite do conhecimento humano e quais instrumentos o homem utiliza para conhecer o real. 
Além da compreensão de que o homem existe (Ontologia) e conhece (Teoria do 
Conhecimento), a Filosofia também compreende a Ética17, a qual enfrenta o problema de qual 
comportamento se deve adotar. A Ética é a doutrina da Filosofia que, centrada no próprio 
homem enquanto indivíduo e enquanto sociedade e na sua conduta, pressupondo a orientação 
da conduta humana a um padrão ideal, tem em vista simplesmente o agir ideal ou o alcance de 
uma finalidade maior. A Ética é a dimensão filosófica que estuda como agir, como viver, como 
orientar a própria existência rumo à felicidade. O homem deve aprimorar seus modos de 
contatar (Epistemologia) a realidade (Ontologia) e a partir daí discernir as ações adequadas a 
cada momento (Ética). A Ética é certamente uma das áreas que mais desperta interesse na 
Filosofia, tendo em vista sua conotação essencialmente prática, de ação diária, mas ela 
somente alcança máximo significado e funcionalidade quando é coordenada em harmonia com 
a Epistemologia e a Ontologia. Se o sujeito não capta a partir da realidade o que é melhor para 
ele a cada instante, como poderá agir de modo funcional para si? 13 Palavra composta pelas 
raízes gregas ontos, genitivo do particípio presente do verbo ser, e logos, ciência, estudo. 14 
Termo comumente usado na língua portuguesa, francesa (théorie de la connaisance) e alemã 
(Erkennthistheorie). 15 Do grego episteme (conhecimento, ciência) e logos. Esse termo é mais 
utilizado pelos filósofos ingleses. 16 Do grego gnosis (conhecimento) e logos. Termo mais 
usado

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