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Livro - Como Fazer Inimigos e Irritar as Pessoas

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See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/279886703
COMO FAZER INIMIGOS E AFASTAR PESSOAS.
Book · January 2011
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Some of the authors of this publication are also working on these related projects:
Business schools and social impact: mechanisms and practices of valorisation and dissemination of knowledge View project
The Management Industry View project
Thomaz Wood Jr.
Fundação Getulio Vargas
196 PUBLICATIONS   1,977 CITATIONS   
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All content following this page was uploaded by Thomaz Wood Jr. on 02 May 2020.
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https://www.researchgate.net/publication/279886703_COMO_FAZER_INIMIGOS_E_AFASTAR_PESSOAS?enrichId=rgreq-0317e50a7a2911ba0236bbedd6694c1f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzI3OTg4NjcwMztBUzo4ODY4MDk1MTcxMDUxNTdAMTU4ODQ0MzI3Mzg3OQ%3D%3D&el=1_x_2&_esc=publicationCoverPdf
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https://www.researchgate.net/project/Business-schools-and-social-impact-mechanisms-and-practices-of-valorisation-and-dissemination-of-knowledge?enrichId=rgreq-0317e50a7a2911ba0236bbedd6694c1f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzI3OTg4NjcwMztBUzo4ODY4MDk1MTcxMDUxNTdAMTU4ODQ0MzI3Mzg3OQ%3D%3D&el=1_x_9&_esc=publicationCoverPdf
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https://www.researchgate.net/profile/Thomaz_Wood_Jr?enrichId=rgreq-0317e50a7a2911ba0236bbedd6694c1f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzI3OTg4NjcwMztBUzo4ODY4MDk1MTcxMDUxNTdAMTU4ODQ0MzI3Mzg3OQ%3D%3D&el=1_x_4&_esc=publicationCoverPdf
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https://www.researchgate.net/institution/Fundacao_Getulio_Vargas?enrichId=rgreq-0317e50a7a2911ba0236bbedd6694c1f-XXX&enrichSource=Y292ZXJQYWdlOzI3OTg4NjcwMztBUzo4ODY4MDk1MTcxMDUxNTdAMTU4ODQ0MzI3Mzg3OQ%3D%3D&el=1_x_6&_esc=publicationCoverPdf
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COMO FAZER INIMIGOS E AFASTAR PESSOAS 
 
Thomaz Wood Jr. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Este livro é dedicado a todos os colegas e amigos q ue conseguiram 
preservar o senso crítico e o bom humor durante o p eríodo de 
trevas do culto do management e do conformismo... 
 
Sumário 
Apresentação 
PARTE 1: FALANDO MAL DOS GENTIOS 
Homo ignobilis 
Os cavernícolas 
Clientes selvagens 
Heróis em baixa 
Empurrando com a barriga 
O erro tipo três 
O erro tipo quatro 
Voyeurs em fúria 
Distopia virtual 
A turma Y 
Na contramão 
Sexo verde 
PARTE 2: FALANDO MAL DAS CORPORAÇÕES 
Enxofre e naftalina 
A praga de Colbert 
Insensatez e insensibilidade 
Pulmões e cérebros 
Mal amadas, mal entendidas 
Na beira do abismo 
Depois das horas 
A armadilha do groupthinking 
Déficit de atenção 
O futuro em cores 
O encontro das águas 
Homo mobilis 
PARTE 3: FALANDO MAL DA GESTÃO 
A vida como extensão da empresa 
Na turma do fundão 
RH negativo 
Clonagem arriscada 
Salsicheiros e pasteleiros 
Leituras fugazes 
O futuro do management 
Revolucion ! 
Impostos em fúria 
Corrida de obstáculos 
Empregos vitalícios 
PARTE 4: FALANDO MAL DA CRISE 
A crise e os bodes 
Troca de cena 
Humores em transe 
Tragédia nórdica 
Marolas e vagalhões 
Apresentação 
Como Fazer Inimigos e Afastar Pessoas reúne ensaios escritos a 
partir de um olhar crítico sobre as organizações e seus 
habitantes. O título, naturalmente, é uma paródia d o conhecido 
Como fazer amigos e influenciar pessoas, de Dale Carnegie. De 
fato, se pensarmos em uma “célula tronco” dos livro s de auto-
ajuda empresarial, este seria a obra de Carnegie. 
O fato é que há sete décadas o curioso volume manté m uma carreira 
de sucesso. Nada menos do que 15 milhões de cópias foram 
vendidas. Os preceitos contidos no livro venceram a s fronteiras 
do espaço e do tempo. Os clones Carnegie espalharam -se pelo 
comércio e pela indústria, pelo litoral e pelo plan alto 
(central), pelas letras e pela mídia. 
Este escriba prefere tomar a rota oposta e apresent ar aos 
leitores uma visão crítica sobre a vida nas organiz ações. Os 
ensaios deste libro estão divididos em quatro parte s: a primeira 
parte é composta por 12 textos focados no indivíduo , suas 
posturas e seus comportamentos; a segunda parte tam bém é composta 
por 12 textos, voltados para o estranho mundo das o rganizações; a 
terceira parte é composta por 11 textos, que focali zam as 
práticas de gestão; e a quarta parte compreende cin co textos, que 
tratam do momento de crise vivido a partir do final de 2008. 
Como Fazer Inimigos e Afastar Pessoas, da mesma forma que outros 
volumes que o antecederam, foi escrito para o leito r de tempo 
escasso, porém determinado a buscar conhecimento be m 
fundamentado. Os capítulos são curtos, porém foram escritos com 
base em pesquisas. Todos os textos foram norteados pelo dever e 
pelo prazer de exercer um olhar crítico sobre a vid a executiva. 
 
Boa leitura! 
 
São Paulo, julho de 2009. 
PARTE 1: FALANDO MAL DOS GENTIOS 
 
 
Homo Ignobilis 
 
Na chamada era do conhecimento, segmentos considerá veis da 
população parecem sofrer de anorexia intelectual: e les hostilizam 
o saber e celebram a ignorância. 
 
Circulam freqüentemente pela Internet listas de atr ocidades 
lingüísticas cometidas por estudantes em exames ves tibulares. Há 
alguns anos, uma safra auspiciosa, embalada por que stões 
ambientais, produziu impagáveis reflexões sobre a “ dificuldade de 
achar os pandas na Amazônia”, a “extinção do micro- leão dourado” 
e a poluição das “bacias esferográficas”. Muito ant es de Al Gore, 
nossos jovens já haviam chegado à conclusão de que a questão 
ambiental “é um problema de muita gravidez” e que, para resolvê-
lo, não se deve preservar “apenas o meio ambiente, e sim todo 
ele”. Em suma, como bem sumariou um luminar: “vamos deixar de 
sermos egoístas e pensarmos um pouco em nós mesmos” . Sejam 
verdadeiras ou apenas fruto de algum malicioso bem humorado, o 
fato é que tais pérolas bem representam a condição educacional 
das hordas locais. 
Frente a tais manifestações de “exuberância intelec tual”, 
conservadores e nostálgicos costumam deplorar a deg radação do 
ensino público e relembrar momentos passados, não t ão soturnos, 
da educação pindoramense. Os lamentadores bem poder iam se 
associar aos vizinhos do norte. Lá como cá, a tendê ncia para a 
lamúria é perene, a cruzar gerações e a produzir re flexões e 
provocações. 
Em 1963, Richard Hofstadter publicou sua seminal ob ra “Anti-
intellectualism in American Life” , relacionando a tendência anti-
intelectual da sociedade à ação dos religiosos, dos políticos e 
dos empresários. Segundo o autor, tais atores envol vem sua 
retórica como conceitos como moralidade, democracia ,utilidade e 
praticidade para fomentar nos indivíduos desconfian ça e 
ressentimento contra o mundo da mente e a vida inte lectual. 
Em 1987, Allan David Bloom lançou “Closing of the A merican Mind” . 
A obra trazia uma crítica da universidade contempor ânea e da 
sociedade centrada no interesse individual. Bloom l amentava a 
desvalorização dos grandes livros do pensamento oci dental e a 
emergência de uma cultura popular que embalava os n ovos 
estudantes, incapazes de buscar um sentido filosófi co para a 
vida, e movidos apenas pela satisfação de desejos i mediatos de 
reconhecimento e sucesso comercial. 
Vinte anos depois, uma nova obra – “The Age of Amer ican Unreason” 
– assinada por Susan Jacoby, faz eco às duas primeir as. Em 
declarações sobre o livro, a autora se mostra assus tada com 
demonstrações de ignorância na mídia e na vida coti diana. Ainda 
pior é o que percebe como uma hostilidade geral ao conhecimento, 
uma mistura catastrófica que combina anti-intelectu alismo – a 
percepção de que muito conhecimento pode ser algo p erigoso – e 
anti-racionalismo – que reflete o primado da opiniã o sobre os 
fatos e as evidências. Segundo declarou ao The New York Times , os 
cidadãos de hoje não são apenas ignorantes sobre co nhecimento 
científico, cívico e cultural, como não acreditam q ue tal 
conhecimento tenha alguma importância. A tenebrosa frase “não 
sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe” nu nca foi tão 
popular. 
Jacoby alinha três causas para o estado das coisas: primeiro, as 
deficiências do sistema educacional, que segue prol ongando os 
anos de escolaridade, porém não gera evidências de que os 
estudantes estejam aprendendo mais; segundo, a forç a do 
fundamentalismo religioso, com sua antipatia pela c iência; e 
terceiro, a influência dos liberals (esquerdistas) norte-
americanos sobre as universidades, a promover a cul tura pop, e a 
tornar trivial e superficial o aprendizado no ensin o superior. 
Em um artigo publicado no jornal The Washington Post , a própria 
Jacoby condena o inexorável movimento ladeira abaix o, catalisado 
pela superação da cultura escrita pela cultura do v ídeo. A autora 
relaciona a popularização do uso deste tipo de tecn ologia ao 
decréscimo da capacidade de concentração por períod os mais longos 
de tempo. A onipresença da mídia eletrônica e visua l estimula a 
cultura da distração, e avança contra indivíduos su sceptíveis, 
sem defesas. Conforme o público se torna mais impac iente com o 
processo de conseguir informação por meio da lingua gem escrita, 
aceleram-se os processos de comunicação, o que cont ribui para a 
erosão do conhecimento geral. Enquanto as taxas de leitura 
declinam, o uso de computadores, de Internet e de v ideogames 
sobe. 
Em um mundo cada vez mais dependente do conheciment o, é paradoxal 
que o reconhecimento da importância da educação e d o intelecto 
conviva com o anti-intelectualismo, com o obscurant ismo 
corporativo ou religioso e com celebrações sem pudo r da mais pura 
ignorância. É como se inexoráveis forças ambientais induzissem os 
indivíduos a um novo tipo de patologia: a anorexia intelectual. 
 
 
Os cavernícolas 
 
Só Platão explica o comportamento de alguns publici tários e de 
seus pares nos domínios mercadológicos corporativos . 
 
Em meados de agosto, o Conselho Superior do Audiovi sual (CSA) 
francês anunciou que proximamente os canais de TV d as terras de 
Voltaire não poderão mais exibir programas com a in dicação de que 
são destinados a crianças com menos de três anos de idade. Havia 
causado irritação nos franceses as declarações veic uladas por 
dois canais – Baby TV, lançado na França em 2005, e Baby First, 
criado em 2007, com emissões a partir da Grã-Bretan ha – de que a 
programação para a audiência infantil traria supost os benefícios. 
Segundo o jornal Le Monde , especialistas consultados pela CSA 
avaliaram que a TV representa uma ameaça ao desenvo lvimento de 
crianças com menos de três anos de idade. Assistir TV favorece a 
passividade, provoca agitação, gera problemas de so no, dificulta 
a concentração e retarda o desenvolvimento da lingu agem. 
Na França e em outros países a TV é há muito tempo objeto de 
preocupação para educadores, psicólogos e formulado res de 
políticas públicas. No Brasil, as crianças de quatr o a 11 anos de 
idade passam quase cinco horas por dia diante da TV , mais tempo 
do que convivendo com a família ou na escola. A inf ormação é 
assinada por Ana Lucia Villela, presidente do Insti tuto Alana, 
uma organização sem fins lucrativos, no website www.alana.org.br . 
O Instituto Alana desenvolve, desde 2005, o Projeto Criança e 
Consumo, que tem como objetivo fomentar “a consciên cia crítica da 
sociedade brasileira a respeito das práticas de con sumo de 
produtos e serviços por crianças e adolescentes”. A 
mercantilização da infância e da juventude, o consu mismo, a 
erotização precoce, a obesidade infantil, a violênc ia na 
juventude, o materialismo excessivo e o desgaste da s relações 
sociais são os temas prioritários do Projeto. O Pro jeto visa 
disseminar a informação apoiar a educação, porém su a equipe 
também realiza uma ação direta de denúncia contra a busos dos 
meios de comunicação. basta Ligar a TV para confirm ar que 
crianças são alvos costumeiros de publicitários e p rofissionais 
de marketing. 
Significativamente, o website do Instituto Alana registra dezenas 
de notificações e ações jurídicas contra empresas q ue endereçam 
mensagens publicitárias a crianças. A lista inclui pesos pesados 
do cenário corporativo local, tais como C&A, CadBur y Adams, 
Cartoon Network, Coca-Cola, Editora Abril, Kellog, Nestlé, Sadia 
e Unilever. Muitas das empresas mencionadas possuem listas de 
valores e códigos de ética, mas parecem ignorar ou interpretar de 
forma “peculiar” o Estatuto da Criança e do Adolesc ente e outros 
instrumentos legais que tratam da matéria. 
As peças relacionadas no website revelam um quadro triste da 
“criação” publicitária. Uma peça para TV mostra o D VD de bordo do 
Renault Scénic como a solução perfeita para “discip linar” 
crianças em uma suposta viagem de férias. O próximo passo talvez 
seja promover diretamente pílulas tranqüilizantes p ara crianças 
ativas. Comerciais de sandálias Havaianas e de serv iços 
telefônicos da Claro projetam jogos sensuais, própr ios dos 
adultos, em grupos de crianças de seis ou sete anos de idade. O 
que deveria ser visto como constrangedor torna-se “ engraçadinho”. 
A Mattel coloca suas tradicionais Barbies a serviço do consumismo 
kitsch e do mau gosto, enquanto a Candide persegue o mesm o fim, 
porém usando um personagem mais ou menos real: a ap resentadora 
Xuxa. 
Alguns publicitários e seus pares dos domínios merc adológicos 
parecem ter enveredado pelo século 21 como caverníc olas do século 
20, herdeiros do laissez-faire de outras eras. Assemelham-se aos 
prisioneiros da célebre caverna de Platão, acorrent ados ao chão e 
impossibilitados de sair. Seguem a interpretar o mu ndo segundo as 
sombras projetadas na parede à frente. 
Caso deixassem a caverna, se espantariam com um mun do exterior 
cheio de implicações e conseqüências. Borboletas ba tem asas na 
Amazônia e já se forma um tornado no Texas. Talvez se 
surpreendessem ao saber que fumar causa danos à saú de, que 
dirigir alcoolizado causa acidentes e que fixar outdoors 
emporcalha a cidade. Quiçá até notassem que os urso s polares 
andam reclamando do calor e que “tirar vantagem de tudo” não é 
mais o lema de algumas profissões. 
No entanto, a vida segue tranqüila dentro da cavern a. Na caverna 
não há borboletas amazônicas, ameaça à camada de oz ônio, 
aquecimento global, infância roubada, consumismo e outros temas 
aborrecidos da vida real. Na caverna, a conversa gi ra em torno de 
insights geniais, campanhas criativas, verbas espetaculares e 
platéias deslumbradas comtanta criatividade. Não h á crise de 
consciência, porque não há consciência. Não há cris e moral, 
porque não há moral. Na caverna, há somente caverní colas, muitos 
deles. 
 
 
 
Clientes selvagens 
 
A considerar o comportamento de alguns clientes, ta lvez seja 
pertinente criar o Provicon – o Programa de Proteçã o e Defesa das 
Vítimas dos Consumidores. 
 
Ouço, constrangido, gravações de um call center. A seqüência, que 
une quatro chamadas e soma 20 minutos, retrata a ep opéia de um 
cliente mal atendido. O ritmo é de filme policial. Os diálogos 
são de teatro do absurdo. O primeiro ato (ou chamad a) revela o 
despreparo do atendente, que não registra a solicit ação do 
cliente, confunde seu nome e coloca-o repetidamente em espera. O 
cliente responde com desmedida irritação: recusa-se a repetir as 
informações prestadas, insinua as limitações mentai s do 
atendente, ameaça processá-lo e exige falar com um superior. De 
cliente mal atendido, transforma-se em destemido gu erreiro, a 
invocar códigos e regulamentos: “aos amigos, tudo; aos inimigos a 
lei”. 
O segundo ato traz o cliente em embate com o requis itado 
superior. Belicoso, ele delata o atendente, exige r etratação e 
clama por compensação. Ciente de sua limitada auton omia, o 
superior, que, afinal, não é assim tão superior, es mera-se na 
retratação, porém nega a compensação. Em um crescen do de 
irritação, o guerreiro pragueja e esbraveja. Transf orma o 
superior em “mané”, lembra-o de seu minguado salári o e ameaça 
suprimir, pela força de suas relações pessoais, seu emprego. 
O terceiro ato mostra o cliente triunfante. Sua com pensação é 
autorizada pelo superior do superior. Seu pedido se rá atendido. 
Vitória, afinal. Porém, a conquista não lhe é sufic iente. É 
preciso que o inimigo seja humilhado e aprenda uma inesquecível 
lição. O massacre, impetrado pelo sádico, atravessa bons cinco 
minutos. O superior é levado seguidamente às cordas , nocauteado 
até sentir o peso do adversário, aceitar a derrota e suplicar por 
perdão. O cliente já não é um simples guerreiro. É também 
inquisidor e justiceiro. Sua missão é sagrada, rede ntora: usar o 
chicote e a palmatória para salvar a alma dos pecad ores. 
O quarto ato conclui o drama. O cliente – guerreiro , justiceiro, 
inquisidor e missionário – é traído pelo destino. D epois de 
contundentes vitórias, sua entrega sofre um atraso, o que lhe 
remove o chão e a razão. A quarta ligação é marcada pelo delírio. 
Sua ira transborda na forma de um fluxo trôpego e i ninteligível 
de blasfêmias. A vítima é uma humilde atendente que , sem defesa, 
agarra-se ao seu script como a uma bóia salva-vidas. A tensão 
cresce até o esperado desfecho: o corte seco da lig ação. Desce a 
cortina. 
Os call centers constituem um fenômeno emergente no mundo do 
trabalho. Suas condições de trabalho são comumente comparadas 
àquelas das tecelagens inglesas da Revolução Indust rial: a mão de 
obra é abundante e tem baixa qualificação, o trabal ho é árduo e 
estafante, o controle é impiedoso e a remuneração é ínfima. 
Na pré-história dos call centers encontra-se Murray Roman, um 
norte-americano que, em meados da década de 1960, c riou uma nova 
técnica de vendas. Roman reuniu um grupo de atores desempregados, 
coloco-os em uma sala repleta de telefones e pagou salários de 
fome para que dessem vida a um tosco roteiro de ven da. Foi um 
sucesso. Nos anos 1980 e 1990, o desenvolvimento do setor foi 
catalisado pelo avanço das tecnologias de informaçã o e de 
comunicação. Empresas especializadas cresceram vert iginosamente, 
cruzando barreiras regionais e nacionais, em busca de mão de obra 
barata. 
Quem viu um, viu todos. Call centers são geralmente alojados em 
salões amplos, o espaço dividido em dezenas ou cent enas de 
cubículos. A inspiração das linhas de montagem é ní tida: os 
atendentes têm seus tempos e movimentos minuciosame nte 
controlados; as gravações são monitoradas e o tempo de 
atendimento é acompanhado. As falas, do “bom dia” a té o “obrigado 
por ligar”, são determinadas por scripts pré-definidos. As 
conseqüências do sistema são conhecidas: alto nível de estresse, 
distúrbios mentais, altas taxas de absenteísmo e de rotatividade. 
Os dois tipos de call centers – as centrais de televendas e as 
centrais de atendimento – são alvos comuns de recla mações. As 
primeiras são criticadas por invasão de privacidade . Quem não foi 
interrompido no trabalho ou no repouso por uma ofer ta irrecusável 
de um novo (e inútil) cartão de crédito? As últimas são 
criticadas pela dificuldade de conseguir contato e pela má 
qualidade dos serviços. Alguns países vêm estabelec endo controles 
para evitar abusos. 
Porém, quem controla a incivilidade dos clientes? S eqüências, 
como a descrita acima, são cada vez mais comuns, a revelar que 
Pindorama ecoa ainda costumes e abusos da casa gran de e da 
senzala. Talvez, além do Procom, deva-se criar o Pr ovicom: o 
Programa de Proteção e Defesa das Vítimas dos Consu midores. 
 
 
Heróis em baixa 
 
O culto aos executivos-chefes transformou-os em cel ebridades e 
engordou suas contas bancárias. No entanto, estudos científicos 
trazem dúvidas sobre o seu impacto no desempenho da s empresas. 
 
Se formos ingênuos a ponto de acreditar nas manchet es das 
revistas de negócios, concluiremos que Carlos Ghosn salvou a 
Nissan, Lou Gerstner fez o elefante IBM dançar, e J ack Welch 
levou as ações da General Electric aos céus. Por de trás da 
despudorada adoração, repousa uma premissa: executi vos-chefes são 
peças vitais nas engrenagens corporativas. Sua insp iração e sua 
transpiração abrem trilhas e levam suas empresas ao sucesso. 
Honras e glórias lhes são devidas. 
Tome-se o caso emblemático de Steve Jobs e da Apple . Jobs foi um 
dos fundadores da icônica organização, em 1976. Uma década e 
muitos computadores vendidos depois, foi afastado d a própria 
empresa. Retornou nos anos 1990, para comandar uma reviravolta 
coroada por sucessos com o iMac, o iPod e o iPhone. O turn-around 
e os novos produtos iluminaram a estrela de Jobs e inflaram sua 
legião de adoradores. Em 2004, Jobs anunciou um dia gnóstico de 
tumor no pâncreas. Desde então, sua saúde tornou-se tema público, 
acompanhado de perto pelo mercado financeiro. Anúnc ios oficiais 
da empresa, boatos e até mesmo notícias falsas sobr e a condição 
física de Jobs fazem as ações da Apple oscilar, rou bando em 
poucas horas bilhões de dólares do valor da empresa . 
Harris Collingwood, em um artigo para o periódico The Atlantic, 
parte do caso de Jobs para introduzir uma intrigant e questão: 
quanta diferença um executivo-chefe pode realmente fazer? Até a 
década de 1970, os presidentes de empresa eram figu ras apagadas, 
tecnocratas que eram vistos, e se viam, como peças de uma 
engrenagem maior. Sua missão era manter, com discri ção, a máquina 
em funcionamento. Porém, a partir do final dos anos 1970 
começaram a surgir celebridades no mundo corporativ o. Lee 
Iacocca, na Chrysler, e Bill Gates, na Microsoft, a lém dos 
citados Steve Jobs Jack Welch, Lou Gerstner e Carlo s Ghosn 
tiveram seus feitos registrados em incontáveis capa s de revistas, 
artigos e livros. Além de beneficiar os próprios ex ecutivos, o 
fenômeno movimentou a indústria editorial, fomentou as atividades 
das empresas de eventos corporativos e alimentou co nsultores de 
recursos humanos, estratégia e gestão da mudança. 
 Apesar da crescente oferta de fábulas de sucesso, Collingwood 
observa que a importância do executivo chefe não é obvia. As 
investigações sobre o tema começaram na década de 1 930 e seus 
resultados são polêmicos. Chester Barnard, pioneiro estudioso da 
vida corporativa, considerava o executivo chefe com o uma força 
vital, a prover sentido e direção para a empresa, i nduzindo os 
liderados a fazerem mais do que a simples obrigação profissional.Nem todos os seus pares concordam. Em um estudo emp írico 
publicado em 1972 na revista científica American Sociological 
Review, Stanley Lieberson e James O’Connor argumentam que a 
influência do executivo-chefe sobre o desempenho or ganizacional é 
relativamente pequena. Os pesquisadores investigara m 167 empresas 
e constataram que fatores ligados ao ambiente (por exemplo, 
disponibilidade de capital e grau de estabilidade d o mercado) e à 
organização (por exemplo, posição da empresa frente aos 
concorrentes) têm maior efeito sobre os resultados do que a ação 
do executivo-chefe. 
James March, professor de Stanford e decano do estu do das 
organizações, afirma que em qualquer organização be m gerenciada 
os candidatos ao posto de executivo-chefe são tão p arecidos em 
termos de educação, competências e perfil psicológi co que a 
escolha é irrelevante. O que importa é ter alguém n o cargo. 
Arremata March: “é difícil dizer a diferença entre duas lâmpadas; 
porém, se você retirar todas elas, fica difícil ler no escuro”. 
Jeffrey Immelt, atual presidente da General Electri c, faz coro a 
March, afirmando, literalmente, que nos anos 1990 q ualquer um 
poderia ter gerenciado bem a GE, até mesmo um pasto r alemão! 
Mostrando as nuanças do tema, mm estudo conduzido p or três 
professores de Harvard – Noam Wasserman, Bharat Ana nd, e Nitin 
Nohria – concluiu que os executivos-chefes podem fa zer mais 
diferença em algumas indústrias do que em outras. S etores muito 
regulados ou estáveis dão pouca margem de manobra à ação 
gerencial. Setores instáveis e competitivos, por ou tro lado, 
exigem criatividade, iniciativa e agilidade de seus líderes. 
Collingwood fecha seu artigo com uma frase de Jeffr ey Pfeffer, um 
professor de Stanford notório por suas posturas crí ticas: “Bons 
líderes podem fazer uma pequena diferença positiva; maus líderes 
podem fazer uma enorme diferença negativa”. A consi derar a 
conduta de certos líderes pindoramenses, a máxima d e Pfeffer vale 
também ao sul da Linha do Equador. 
 
 
Empurrando com a barriga 
 
Trabalho científico procura lançar luzes sobre um d os nossos mais 
irritantes hábitos: a mania de deixar para o dia se guinte o que 
deveríamos fazer hoje. 
 
No patoá cotidiano, empregamos a expressão “empurra r com a 
barriga”. Ela vem assim mesmo, no infinitivo, ou en tão no 
gerúndio, como no título deste capítulo. No entanto , o termo 
apropriado na fala pátria é procrastinar. Substituí mos o segundo 
pelo primeiro para tornar a pouco edificante mania mais 
simpática. Empurrar com a barriga é coisa de boa-pr aça. 
Procrastinar soa quase delinqüente. E é difícil de falar, como se 
a língua lutasse para sincronizar seus movimentos c om os músculos 
faciais, o palato a reprimir, sem sucesso, a sublev ação das 
partes inferiores. O significado tampouco é dos mai s dignos. 
Procrastinar ( apud Houaiss) é adiar, deixar para depois, 
delongar, postergar. Em suma, coisa boa não é. 
Não obstante, a feiúra não lhe subtrai popularidade : 
procrastinamos o início da dieta, as resoluções de ano novo e o 
check-up médico; procrastinamos tudo que parece enfadonho e tudo 
que demanda muito trabalho; procrastinamos decisões difíceis e 
ações impopulares; procrastinamos no trabalho e na vida pessoal; 
procrastinamos o namoro (por temer o casamento) e o casamento 
(por temer o divórcio); as vezes procrastinamos a v ida e até 
tentamos procrastinar a morte. 
A popularidade e a irracionalidade do ato – a procr astinação – 
sempre despertaram a curiosidade dos estudiosos do comportamento 
humano. Porque, afinal, sabotamos ou prejudicamos a nós mesmos 
deixando para amanhã o que devemos fazer hoje? Porq ue preferimos 
a agonia da espera em lugar de fazer de uma vez o q ue precisamos? 
Terá nossa herança genética nos programado para adi ar e 
postergar? Terá nossa mente uma perversão instalada que nos isola 
do senso de urgência? 
Alguns psicólogos apostam em nossa baixa auto-estim a e em nossa 
insegurança. Se estivermos incertos do sucesso ou t emermos os 
resultados, adiaremos o quanto pudermos a tarefa. O utros 
pesquisadores notam a falta nossa falta de autocont role. Sem 
disciplina, tendemos a agir de forma impulsiva e po uco racional, 
adiando atividades para as quais deveríamos dar pri oridade. 
Naturalmente, embora às vezes seja completamente ir racional, 
aceitamos como deveras humano tentar adiar atividad es pouco 
estimulantes, difíceis ou simplesmente aborrecidas. 
Em um número da revista científica Psychological Science , Sean M. 
McCrea e mais três colegas pesquisadores tentam uma outra 
explicação. A conclusão, que recebeu atenção da imp rensa européia 
e norte-americana, é que agimos em tempo quando rec ebemos tarefas 
concretas, porém tendemos a adiar o trabalho quando enxergamos as 
tarefas de uma forma mais abstrata, ou seja, quando percebemos 
uma atividade como distante do aqui e agora, tendem os a confiná-
la em um futuro vago e longínquo. 
Em um experimento realizado com estudantes, os pesq uisadores 
observaram que quase todos que foram induzidos a pe nsar em termos 
concretos completaram suas tarefas dentro do prazo, enquanto que 
mais da metade daqueles que foram induzidos a pensa r de forma 
mais abstrata perderam seus prazos. Se os resultado s forem 
generalizáveis, então simplesmente apresentar certa s tarefas de 
forma mais detalhada e objetiva pode aumentar a pos sibilidade de 
tê-las resolvidas dentro do prazo. 
Os resultados têm inegável interesse para o mundo c orporativo, no 
qual o comportamento de empurrar com a barriga cheg a a ser 
endêmico. Nos últimos anos, mudanças no ambiente de trabalho, com 
a introdução de novos sistemas e modelos de gestão, de 
incontáveis prêmios e certificações, criaram uma ca mada de fumaça 
e vapor sobre as organizações. Administrar perdeu p arte de seu 
caráter prático para se transformar em atividade ab strata, cheia 
de metáforas, estórias e fábulas. Muita reunião par a pouca ação. 
Em suma, um ambiente que não só favorece a procrast inação, como 
também premia os procrastinadores. Neste novo ambie nte, para cada 
decisão banal, é preciso penetrar no obscuro mundo dos modelos 
teóricos e discutir coerências improváveis. Mais ab stração 
levando a mais procrastinação. 
O pior é que a torpe mania gera efeito dominó. As o rganizações 
são hoje sistemas fortemente interconectados, nos q uais cada área 
ou profissional depende de outros, e condiciona o t rabalho de 
outros. Se uma dessas “peças” atrasa sua tarefa ou deixa de 
cumprir seu prazo, gera uma onda de ineficiência em toda o 
sistema. Somem-se estas ineficiências e chega-se ao resultado: 
custos altos, baixa rentabilidade, serviços de má q ualidade, 
clientes mal atendidos e imagem prejudicada. Conclu são: 
procrastinar pode ser humano, mas é feio; portanto, usemos com 
moderação. 
 
O erro tipo três 
 
Segundo renomados pesquisadores, na raiz de algumas grandes 
catástrofes contemporâneas está nossa tendência de resolver da 
forma certa os problemas errados. 
 
Há pouco mais de dez anos, as montadoras instaladas em Pindorama 
viviam um momento bem diferente do atual. Diante da situação 
econômica desfavorável e da retração do consumo, el as tinham seus 
pátios inundados com um mar de veículos novos e red uziam a 
produção. Enquanto isso, um grande fornecedor de au topeças, 
embora ligado por cordão umbilical às montadoras, a gia como se 
habitasse um planeta distante. Seu diretor industri al, orgulhoso 
de seus quadros e de suas máquinas, comemorava mais um recorde de 
produção. O paradoxo era óbvio: como seria possível para um 
fornecedor quebrar recordes se seus principais clie ntes estavam 
reduzindo drasticamente a produção? De fato, milagr e não havia. A 
empresa em questão produzia, mas não vendia. Os est oques de 
produto acabado lotavam seus armazéns e eram levado s para 
armazénsexternos, alugados em ritmo de emergência e a preço de 
ouro. A queda do faturamento obrigava a empresa a c aptar dinheiro 
em bancos para comprar matéria prima. A situação er a, de fato, 
surreal: a empresa tomava empréstimos para produzir em 
velocidades cada vez maiores, e estocar, a um custo cada vez mais 
alto, um produto que seus clientes não queriam. Fel izmente, a 
insensatez foi descoberta e o prejuízo contido. 
Situações como esta são muito comuns. A todo o mome nto, nas 
empresas, é possível identificar esforços sinceros para resolver 
da forma mais eficaz possível determinados problema s. No entanto, 
em muitos casos, esses problemas são os problemas e rrados. No 
caso acima, um enorme esforço da equipe de produção havia sido 
realizado para eliminar gargalos e maximizar o uso dos 
equipamentos e recursos. A questão real, no entanto , situava-se 
além da fronteira da produção: era uma questão de m ercado. 
Esse é o tema do novo livro dos veteranos pesquisad ores Ian I. 
Mitroff e Abraham Silvers: Dirty Rotten Strategies: How We Trick 
Ourselves and Others into Solving the Wrong Problem s Precisely , a 
ser lançado em 2008 pela Stanford University Press. Mitroff e 
Silvers denominam a conduta acima de erro tipo três . Os erros do 
tipo um e dois tiveram seu uso consagrado pela esta tística: o 
erro tipo um refere-se a rejeitar como falsa uma hi pótese 
verdadeira e o erro tipo dois refere-se a aceitar c omo verdadeira 
uma hipótese falsa. Em síntese, o erro tipo três re fere-se a 
solucionar de forma correta o problema errado. 
A idéia do erro tipo três veio do estatístico John Tukey, que 
argumentava que a maior parte dos erros ocorrem por que tentamos 
resolver os problemas errados e não porque falhamos em conseguir 
as soluções certas para os problemas certos. A deno minação de 
erro tipo três foi dada por Howard Raiffa, um pesqu isador da 
teoria das decisões. 
O ponto de partida de Mitroff e Silvers foi o traba lho de Jerome 
Groopman, um hematologista de Harvard. Groopman ana lisou a 
questão dos erros médicos. Seu argumento é que part e considerável 
desses erros resulta da forma padronizada como os m édicos são 
formados e da pressão a que são submetidos para agi r com 
assertividade e rapidez. Em lugar de considerar div ersas 
possibilidades de problemas e diagnóstico, a formaç ão e a prática 
dos médicos os força a usar certas rotinas para tra tar problemas 
complexos. Falta análise crítica. Os resultados pod em ser, 
eventualmente, fatais. 
A dificuldade com a maior das situações nas quais s urgem os erros 
tipo três é que nós acreditamos saber, de antemão, qual é a raiz 
de um problema. Parte considerável dessa questionáv el premissa, 
segundo os autores, se deve ao sistema de “des-educ ação” (sic). 
Explica-se: na escola, em todos os níveis, somos in duzidos a 
confundir “exercícios” com “problemas”. Somos trein ados para 
resolver exercícios, que tem soluções lógicas e úni cas, e não 
problemas, que são complexos, exigem análises ampla s e podem 
levar a múltiplas soluções. Então, levamos tal dist orção para a 
vida profissional e tentamos resolver situações com plexas com o 
uso de ferramentas simples. 
Ambiciosa, a obra de Mitroff e Silvers procura ir a lém dos casos 
específicos e compreender os padrões que permeiam a s situações 
que levam ao erro tipo três. Seu foco ultrapassa as fronteiras 
corporativas e repousa sobre grandes temas da atual idade norte-
americana: o caro e criticado sistema de saúde (obj eto de um 
documentário de Michael Moore), as meias verdades e inverdades 
utilizadas para justificar a guerra do Iraque, o fi asco do 
atendimento das vítimas do furacão Katrina, e o pol êmico fenômeno 
das mega-igrejas e a “reinvenção de Deus”. Além do erro tipo 
três, os autores também mencionam o erro tipo quatr o. Deste, 
trataremos no próximo capítulo. 
 
O erro tipo quatro 
 
Mais grave do que resolver da forma certa os proble mas errados é, 
visando benefício próprio, induzir intencionalmente os outros a 
resolver os problemas errados. 
 
No capítulo anterior, este escriba comentou o livro de Ian I. 
Mitroff e Abraham Silvers: Dirty Rotten Strategies: How We Trick 
Ourselves and Others into Solving the Wrong Problem s Precisely , a 
ser lançado em 2008 pela Stanford University Press. O argumento 
central da obra é que as distorções do sistema educ acional e 
certas condições na prática profissiomal nos levam a cometer o 
que os autores denominam de erro tipo três. Os erro s do tipo um e 
dois tiveram seu uso disseminado pela estatística: o erro tipo um 
refere-se a rejeitar como falsa uma hipótese verdad eira e o erro 
tipo dois refere-se a aceitar como verdadeira uma h ipótese falsa. 
O erro tipo três refere-se a solucionar de forma co rreta o 
problema errado. 
A obra explica também o erro tipo quatro, que signi fica 
intencionalmente resolver os problemas errados. O e rro tipo três 
é produto da simples ignorância ou de uma prática p rofissional 
irrefletida. O erro tipo quatro, por sua vez, ocorr e quando, em 
detrimento dos outros e para benefício próprio, cer tos indivíduos 
ou grupos intencionalmente forçam outros a resolver problemas 
segundo sua própria definição dos problemas. 
Segundo Mitroff e Silvers, o erro tipo quatro ocorr e quando, por 
exemplo, as grandes corporações utilizam táticas et icamente 
condenáveis para gerar lucros desmedidos às custas do bem estar 
da população, afirmando que tudo faz parte da “orde m natural das 
coisas”; ou ainda quando o governo utiliza técnicas de 
manipulação da informação para promover políticas d esastrosas 
para a sociedade. A antipatia com o governo republi cano norte-
americano e com as grandes corporações marca boa pa rte do livro. 
O capítulo cinco é dedicado à mídia. Para Mitroff e Silvers, a 
mídia é um exemplo contundente do erro tipo quatro, ao induzir a 
tolerância a abusos do governo. Os autores também a condenam por 
utilizar as mais sofisticadas formas de “irrealidad e” para nos 
distrair, reduzindo nossa habilidade de lidar com as cada vez 
mais complexas formas de realidade. A irrealidade m ediática, 
observam, não faz apenas com que o irreal pareça re al, mas também 
com que o irreal, povoado por celebridades, pseudo- problemas e 
pseudo-soluções, pareça melhor do que o real. 
Segundo os autores, a mídia parece ter abandonado s eu papel 
fundamental de reportar a realidade, migrando tenaz mente para a 
atividade de criação e a disseminação da irrealidad e. Para 
determinar se um problema – social, cultural ou cor porativo – 
precisa de solução ou não, primeiro temos que recon hecê-lo. No 
entanto, a existência de problemas parece cada vez mais 
determinada pelo reconhecimento pela mídia. A mídia em geral, e a 
TV, em especial, se tornaram as principais fontes d e legitimação 
de agendas políticas, sociais e culturais. Se não a parece na 
mídia, simplesmente não aconteceu. 
No Brasil, a mídia de negócios teve, a partir dos a nos 1990, um 
papel marcante na mudança dos valores e comportamen tos. Ela 
promoveu o indivíduo-marca de sabão, sempre preocup ado com a 
própria aparência e com a própria carreira; ela tam bém ajudou a 
disseminar incontáveis modas gerenciais, de grande apelo e 
benefício duvidoso; ajudou a tornar empresários e e xecutivos 
modelos de conduta e, principalmente, contribuiu pa ra levar a 
linguagem dos negócios para o governo, a sociedade e a cultura. 
Em suma, a mídia de negócios criou, por meio de seu s textos, 
prêmios e rankings de empresas , uma irrealidade contra a qual a 
realidade das organizações e dos profissionais pass ou a ser 
medida. 
Mitroff e Silvers listam cinco fatores responsáveis pela ascensão 
da irrealidade: primeiro, o fato de que a vida mode rna ganhou um 
nível de complexidade além da nossa capacidade indi vidual de 
compreensão; segundo, a incapacidade da educação, f ragmentada ereducionista, de fazer frente a tal contexto; terce iro, o aumento 
exponencial dos anestesiantes “sistemas de produção de 
irrealidade” – shows da TV, jogos eletrônicos etc.; quarto, 
forças econômicas, sociais e culturais que transfor mam a 
sociedade em unidade produtora e consumidora da irr ealidade; e 
quinto, a dificuldade de refletir e agir de forma s istêmica, 
pensando nos problemas a partir de múltiplas perspe ctivas. 
Para os autores, o processo contínuo de criação da irrealidade 
vem acompanhado do emburrecimento da população, da 
comercialização das coisas e das pessoas, da aceita ção de 
comportamentos bizarros e anti-sociais como coisas normais, e da 
distorção da realidade e da verdade. Mitroff e Silv ers não são 
pessimistas. Porém, a leitura de seu livro deixa a amarga 
sensação de que o excesso de luzes parece estar lev ando a uma 
nova idade das trevas. 
 
 
Voyeurs em fúria 
 
A cada quatro anos, turbas de conformistas, de vari adas latitudes 
e idênticas atitudes, unem-se em uma orgia comunal, a celebrar a 
superioridade da euforia sobre a alegria. 
 
Hoje, uma boa medida de popularidade é o número de citações 
obtidas no Google . Tome-se, por exemplo, o termo football e 
retornarão nada menos do que 564 milhões de citaçõe s, superando 
God (545 milhões) e Christ (apenas 131 milhões). Significativo! 
Insira-se o nome das celebridades relacionadas ao c itado esporte 
e resultarão cifras igualmente astronômicas. O ingl ês Beckham 
conta com mais de 31 milhões de citações e o brasil eiro Ronaldo 
chega a quase 24 milhões. Outro inglês, Harry Potte r, com 162 
milhões de citações, supera-os com folga. Entretant o, é bruxo e 
pratica outro esporte. Do outro lado da fama, este pobre escriba 
não chega a insignificantes 60 mil citações, o que leva a deduzir 
que duas chuteiras valem aproximadamente 500 penas. 
Trata-se, sem dúvida, de um fenômeno. O New York Times , há quatro 
anos, dedicava apenas espaços secundários ao mais g lobalizado dos 
esportes. Hoje, o diário mais lido da Internet faz chamadas na 
primeira página, traz longas matérias e mantém um blog exclusivo. 
Da pátria mãe do esporte, o semanário The Economist advoga que a 
Copa do Mundo é o principal evento esportivo do mun do, superando 
as Olimpíadas. Rationale : a Copa é mais igualitária, mais 
surpreendente e menos propensa a manipulações por g overnos e 
ditadores. Será? 
Aos excêntricos, que teimam em ignorar o fenômeno, restam o 
isolamento e a perplexidade. É o caso deste escriba , que na vida 
assistiu a uma única peleja. Foi no ano de 1998, na terra de 
Asterix, em uma abertura festiva de Copa do Mundo. No pasto plano 
à frente perfilaram-se 22 atletas, sendo que 11 rep resentavam 
Pindorama e 11 outros defendiam a pátria dos saiote s. Aberta a 
partida, a curiosidade de marciano não durou mais d o que doze 
minutos. Então, a vista se perdeu a atenção se esva iu. Teria sido 
diferente com uma partida de críquete ou um torneio de bocha? 
Provavelmente, não. 
Exercitar esqueleto e músculos é uma maneira muito prazerosa e 
saudável para manter o espírito alerta, a coluna re ta, a mente 
aberta e o coração tranqüilo. Espiar trotes cansado s, alternados 
com desabaladas correrias e pontapés, é meramente e nfadonho. Não 
menos bizarro é testemunhar os malabarismos romanes cos de 
talentosas penas, a acrescentar genialidade e poesi a a movimentos 
incertos e desarmônicos. Nas linhas desses magos, e ncontros 
aborrecidos transmutam-se em lutas épicas, momentos insossos 
ganham matizes políticas e ascensões fortuitas ress urgem como 
tratados sociológicos. Tudo isso ficaria recolhido aos 
subterrâneos da civilização, não fosse a incontrolá vel histeria 
da mídia, a fazer eco em parcela considerável da po pulação. 
Então, por motivos que escapam ao senso comum, emba tes de pouco 
brilho transformam voyeurs em selvagens, a brandir buzinas e 
explodir rojões madrugada afora. 
Na entrada do terceiro milênio, o esporte em questã o soma 
religião, mercado e espetáculo. É religião, porque é marcado por 
uma fé de fanático, que turva a razão e a sensibili dade. É 
mercado, porque é dominado pelo comércio das pernas , da imagem e 
dos sonhos. É espetáculo, por que foi transformado em show 
mundial, com mídias especializadas e celebridades p róprias , tudo 
acompanhado em tempo real por turbas globais, confo rmistas e 
esbaforidas. 
A perseverar as tendências atuais de hiper-especial ização e 
hiper-comercialização, o futuro será ainda mais fre nético e 
eufórico. Aos atletas, assessorias e entourage , serão acrescidos 
torcedores profissionais. Eles serão recrutados em todo o mundo, 
ganharão maquiagem e fantasia, e preencherão ordena damente as 
arenas esportivas. De Liverpool e de São Paulo, ser ão trazidos 
exemplares mais violentos, destinados a erupções co ntroladas de 
selvageria. Do Rio de Janeiro, virão os tagarelas p rofissionais, 
mestres da incontinência verbal. De Estocolmo e de Buenos Aires, 
virão exuberantes loiras, postas a adornar pontos e stratégicos 
das arquibancadas. Da África e da China, virão os a tletas, em 
grande quantidade e com baixo custo. Da Califórnia e da Índia, 
virão os gurus da auto-ajuda, para garantir a harmo nia e a auto-
estima das equipes. Fotógrafos e cinegrafistas, dir igidos por 
magos da publicidade, ensaiarão e produzirão moment os de 
espontaneidade e vivacidade. Escritores de grande t alento e baixa 
renda serão recrutados para elaborar épicos e fábul as. 
Fabricantes de cerveja e de tênis comandarão todo o espetáculo, 
explorando cada oportunidade de merchandising . Pelas TVs, 
Internet e fones móveis, as hordas continuarão a ac ompanhar o 
show, uivando e disparando rojões em momentos precisos. Ao menos 
não estarão pelas ruas roubando, dirão as avós. 
 
 
Distopia virtual 
 
A Internet ampliou extraordinariamente nosso acesso a 
informações. Porém, sua influência sobre a forma co mo lemos e 
pensamos pode ser menos gloriosa. 
 
A edição de julho e agosto da revista The Atlantic traz na capa 
uma incômoda questão: “estará o Google nos tornando estúpidos?” 
Nicholas Carr assina a matéria de 4.193 palavras e muitas 
provocações. A perspectiva crítica não é nova. Nos anos setenta, 
a IBM e seus paquidérmicos mainframes serviram de inspiração para 
o temível HAL, o computador de “2001: Uma Odisséia no Espaço”, de 
Stanley Kubrick. Nos anos noventa, não faltaram teo rias 
conspiratórias contra a Microsoft ou libelos contra os efeitos 
danosos do PowerPoint e do MS-Word. O alvo do momen to é a 
onipresente Google, por seus ambiciosos planos de “ organizar o 
conhecimento humano”. 
O incômodo humano com os avanços tecnológicos é ant igo. Como 
lembra Carr, Sócrates lamentava o desenvolvimento d a escrita. O 
ateniense viveu entre 470 a.C. e 399 a.C. e foi um dos fundadores 
da filosofia ocidental, mas não deixou registros. S alvou-nos 
Platão, que o transformou em personagem de seus diá logos. 
Sócrates temia que as pessoas passassem a contar co m a palavra 
escrita como um substituto para o conhecimento que antes levavam 
em suas mentes, tornando-se portadoras de grandes q uantidades de 
informações, mas sem lhes compreender propriamente o significado. 
Isso faria com que fossem consideradas sábias, quan do na verdade 
eram essencialmente ignorantes. 
No século XV, com o desenvolvimento dos sistemas de impressão, 
por Johannes Gutenberg, uma nova onda de temores af ligiu os 
pensantes. O medo que então se instalou foi que a a mpliação da 
disponibilidade de livros provocasse preguiça intel ectual, 
tornasse os indivíduos menos estudiosos e enfraquec esse suas 
mentes. 
Não se pode dizer que os medos eram infundados. Mui tos efeitos 
negativos foram comprovados como verdadeiros, assim como enormes 
benefícios que não foram inicialmente previstos. Da mesma forma, 
não se deve ignorar os incômodos gerados peladisse minação das 
novas tecnologias, ainda que as vantagens percebida s sejam 
inegáveis. 
Em 1882, lembra Carr, a visão de Friedrich Nietzsch e começara a 
falhar. Escrever, para o filósofo, transformara-se em agonia. 
Salvou-o uma máquina de escrever. Porém, a tecnolog ia cobrou seu 
preço. O texto de Nietzsche tornou-se mais compacto e 
telegráfico. O meio havia transformado o conteúdo, a forma de 
escrever e, portanto, a forma de pensar. Se o mesmo é verdade 
para as tecnologias atuais, então estamos diante de um novo 
desafio. 
A convivência intensa com websites , emails , orkuts , facebooks e 
you - tubes está alterando o uso que fazemos da memória e 
interferindo em nossa atividade cerebral. As novas mídias provêm 
informações e ainda influenciam a forma como reflet imos sobre o 
que vemos e lemos. Temos cada vez mais dificuldade para enfrentar 
textos longos e densos. Concentração e contemplação tornaram-se 
capacidades raras. A atenção se dispersa, os olhos lacrimejam, a 
cabeça pesa. Estamos nos acostumando a pensar em so luços, em 
ziguezague. 
Estudos mostram que adotamos na Internet um comport amento similar 
ao zapping diante da TV. Saltamos de página em página de form a 
quase randômica. Não lemos, no sentido tradicional da palavra, 
acompanhando uma trajetória ou mergulhando, pela pe na do autor, 
em imagens e sentidos. Na Internet, embarcamos em u ma navegação 
desorientada, por um mar de signos que nem sempre s e relacionam. 
Terminamos as jornadas como o turista que visita ci nco países em 
sete dias e retorna considerando-se conhecedor da c ultura 
européia. Maryanne Wolf, uma psicóloga da Tufts Uni versity, teme 
que o novo estilo de leitura enfraqueça nossa capac idade de 
leitura mais profunda. Na Internet, segundo ela, ap enas 
decodificamos informações. Por excesso de informaçã o e pressão de 
tempo, não avaliamos ou interpretamos os textos. 
Para Carr, o quartel general da Google, na Califórn ia – o 
Gloogleplex – é a igreja maior da Internet, e sua r eligião é o 
taylorismo. Carr se refere à administração científi ca e aos 
estudos de tempos e movimentos desenvolvidos no iní cio do século 
XX por Frederick Winslow Taylor. Seus métodos, ao b uscar ganhos 
de produtividade, transformavam operários em autôma tos. Segundo a 
visão dos senhores da Google, a Internet deve ser u ma máquina 
hiper-eficiente, um algoritmo perfeito, a permear t oda a 
atividade cerebral da nossa Era do Conhecimento. O que Taylor fez 
pelo trabalho manual, a Google está fazendo pelo tr abalho mental, 
dispara o autor. Talvez estejamos, de fato, nos tra nsformando em 
“homens panqueca”, amplos e finos, capazes de nos c onectarmos com 
uma vasta rede, mas sem profundidade alguma. Como a firmava o 
filósofo praiano Bordallo, muito antes da Internet: no fundo, é 
raso. 
 
 
A turma Y 
 
Nem tão parecida, nem tão diferente das que a antec ederam, a 
geração que agora trilha os primeiros passos da car reira 
profissional traz oportunidades e desafios para as empresas. 
 
Todos os anos, as escolas de administração, engenha ria e 
similares despejam centenas e centenas de novos rec rutas no 
mercado de trabalho. A fauna é rica e variada em te rmos de 
formação, ambição e vontade de trabalhar. 
Há pelo menos duas décadas as grandes empresas dedi cam grande 
atenção a este grupo. Os programas de trainees buscam 
identificar, entre os mais promissores talentos das melhores 
escolas, aqueles que supostamente conduzirão as org anizações pelo 
século XXI. 
As expectativas de parte a parte são altas. Os novi ços desejam 
boas condições de trabalho e esperam remuneração co mpatível. As 
empresas querem que seus escolhidos tornem-se verda deiros agentes 
de mudança, a espanar as teias de aranha e a lubrif icar as 
engrenagens enferrujadas. 
Apesar dos recursos empregados na seleção e na prep aração dos 
noviços, frustrações são comuns. Boca-a-boca, circu lam histórias 
sobre trainees que se demitem no meio do processo de 
desenvolvimento e sobre choques entre trainees e veteranos. 
Conhecer o perfil e as demandas deste grupo é prior idade para as 
empresas. Afinal, projeta-se (ou teme-se), a eles o futuro 
pertence. 
Estudos têm denominado a turma nascida entre o fina l da década de 
1970 e o início da década de 1990 de geração Net ou de geração Y. 
Ainda que imperfeita, a classificação ajuda a ident ificar alguns 
traços comuns a esta lavra demográfica do final do milênio 
passado. 
Grown Up Digital: How the Net Generation is Changin g Your World 
(Editora McGraw-Hill), livro do guru de gestão Don Tapscott, 
ocupa-se dessa questão. A obra é atraente e fácil d e ler, porém é 
também reducionista e apresenta um retrato excessiv amente róseo 
da realidade. Portanto, a leitura exige boa dose de desconfiança 
e aguçado olhar crítico. 
Tapscott considera a turma Y mais esperta e ágil qu e suas 
antecessoras, e também mais preocupada com a socied ade e com a 
justiça. Em suma, a safra recente, muito superior à geração 
anterior, de sacos de batatas, educada diante da TV e acostumada 
a atividade cerebral mínima. A turma Y valoriza a l iberdade de 
escolha, gosta de personalizar tudo que têm e faz, avalia 
criticamente tudo e todos, exige integridade e tran sparência, 
espera que o trabalho (ou o estudo) seja agradável e divertido, 
gosta de trabalhar em grupo, espera que tudo aconte ça rápido e 
crê que a inovação deve fazer parte do cotidiano. 
Naturalmente, este perfil gera impactos para as emp resas, nem 
todos positivos. Primeiro, o gosto pela velocidade alimenta a 
impaciência. A turma Y acredita que a carreira é um a montanha a 
ser escalada com rapidez. Sempre com pressa, aposta nas redes de 
contatos e no gerenciamento da impressão para mater ializar seus 
desejos. Frequentemente, domina mais a retórica do que o métier. 
Continuamente pressionadas, as empresas cedem às su as vontades, 
promovendo os mais ambiciosos. Frustrações e tombos rondam o 
horizonte. 
Segundo, a visão crítica e a expectativa de integri dade e 
transparência podem facilitar mudanças positivas. D e fato, elas 
ecoam tendências recentes em gestão, de adoção de c ondutas 
éticas, de sistemas abertos de governança, de progr amas de 
responsabilidade social e de comunicação mais abert a. Entretanto, 
muito do que se vê nas empresas é maquiagem. A coli são entre a 
utopia tímida e jovem da turma Y e o pragmatismo ca lejado das 
empresas pode gerar conflitos e atitudes cínicas, p or parte dos 
noviços. 
Terceiro, o desejo que o trabalho seja agradável e divertido, 
nutrido por um hedonismo juvenil, que é, aliás, sin al dos tempos, 
pode privilegiar o presente em detrimento do futuro . De fato, o 
mundo parecer existir para que a turma Y o goze, aq ui e agora. 
Tal postura dificulta a realização de projetos de l ongo alcance, 
que exigem disciplina e tolerância a pequenos fraca ssos. 
Quarto, a tendência de trabalhar em grupo, também l ouvável, pode 
transformar-se em prática para inglês ver. Hoje, po ucos problemas 
corporativos podem ser resolvidos sem uma perspecti va coletiva. 
No entanto, para trabalhar em grupo é preciso somar postura 
cooperativa com boa dose de disciplina. Quando tais 
características estão ausentes, prevalece um simula cro de 
trabalho em grupo: muitas reuniões e comitês, avala nches de 
mensagens eletrônicas e celulares eternamente em fú ria. Porém, 
muito pouco trabalho produtivo. 
Com a turma Y, tudo mudará para ficar como exatamen te como está? 
Talvez não. A turma Y quiçá não seja assim diferent e das 
anteriores. Entretanto, ao mergulhar em organizaçõe s construídas 
por e para suas antecessoras, surgirão tensões e co nflitos, que a 
transformarão e às empresas que à absorverem. 
 
 
Na contramão 
 
Para fazer frente aos tediosos Jogos Olímpicos, nad a melhor do 
que o Campeonato Mundial de Ciclismo de Marcha Únic a. 
 
Poucos eventos sãomais aborrecidos do que as Olimp íadas. 
Provavelmente só a Copa do Mundo de Futebol e os co ncursos de 
beleza com os jogos podem rivalizar. Durante alguma s semanas, 
rebentos privilegiados de todo o mundo, submetidos a intenso 
condicionamento físico e opressiva lavagem cerebral , comportam-se 
como ciborgues, exibindo-se em movimentos mecânicos diante de 
platéias hipnotizadas. Alguns já retornam destruído s, física e 
psicologicamente. Outros duram ainda alguns anos e sobrevivem a 
outros jogos, usando o nome e a fama para vender bu gigangas e 
espalhar exemplos duvidosos para hordas de consumid ores. 
Não foi diferente na versão chinesa. Entre uma aber tura kitsch e 
um encerramento idem, o tempo foi preenchido com sa ltos, 
cambalhotas, números, gritos e lágrimas. Consta que a festa 
serviu ao propósito chinês, de mostrar ao mundo a a scensão da 
nova potência. Afinal, nada mais apropriado para si nalizar o 
culto da competitividade que abraçou a gigantesca n ação asiática. 
Competitividade é uma idéia central na vida dos atl etas 
olímpicos. Competitividade é também uma idéia centr al em economia 
e em administração de empresas. O conceito costuma referir-se ao 
desempenho de uma empresa, de um setor de atividade s ou de um 
país, ou à sua capacidade de vender e distribuir be ns ou serviços 
em um determinado mercado. Nas últimas décadas, com petitividade 
tornou-se um conceito fetiche. Ser competitivo é se r melhor que 
os outros. N´algumas plagas, os mais promissores sã o atazanados 
desde a primeira infância. As escolas, os clubes e a mídia pisam 
e repisam valores relacionados à competitividade e à vitória. Um 
pouco mais de flexibilidade ou velocidade podem con denar uma 
criança a anos de disciplina militar, tutores rigor osos e 
horizontes estreitos. 
Nos século XX, as olimpíadas foram, aos poucos, rev ertendo a 
máxima de Pierre de Frédy, o Barão de Coubertin, pa i dos jogos 
modernos. A primazia da participação cedeu lugar à busca 
insaciável por vitórias e recordes. O papel educaci onal e 
inclusivo dos esportes cedeu lugar para as fábricas de ciborgues 
hiper-alimentados e hiper-treinados. Política e “ca rtolagem” 
avançaram sobre as quadras, campos e raias. A merca ntilização e a 
espetacularização completaram o trabalho. 
Entretanto, ainda há esperanças. Na contramão das t ediosas 
olimpíadas situa-se o fabuloso Campeonato Mundial d e Ciclismo de 
Marcha Única (Single Speed World Championship). Con sta que a 
“disputa” teve início em 1999, quando diversos cicl istas 
aglutinaram-se no Rancho Cucamonga (sim, ele existe e fica na 
Califórnia). Desde então, o campeonato teve edições em Berlim, 
Estocolmo e diversas cidades norte-americanas. 
Os organizadores são extremamente zelosos quanto ao nível de 
desorganização da prova. Afinal, não querem perder a aura 
alternativa. As linhas de partida e de chegada são cuidadosamente 
incertas e uma piscina infantil é cuidadosamente pr eenchida com 
gelo e cerveja. Não beber é equivalente ao doping , pois confere 
vantagem desleal aos concorrentes sóbrios. Juízes p ostam-se 
durante o trajeto penalizando os mais velozes com t apas na bunda. 
Os mais afoitos, que escapam da fiscalização, são v aiados pelos 
expectadores. Os patrocinadores corporativos são ev itados com 
galhardia, especialmente os fabricantes de automóve is, que, 
segundo alguns participantes, “estão arruinando o p laneta”. 
Matéria veiculada no New York Times registra que Ra chel Lloyd, a 
primeira mulher a completar a prova em 2008, parou e desmontou de 
sua bicicleta antes da linha de chegada, relutante de ganhar o 
primeiro prêmio, uma tatuagem alusiva à “conquista” . Porém, 
convencida pela multidão, cruzou a linha e recebeu o prêmio. 
Naturalmente, usar bicicleta de marcha única para s ubir e descer 
morros pode parecer um estúpido, mas não faltam int eressados. 
Afinal, nos aclives mais acentuados basta descer da bicicleta e 
empurrá-la, sob os aplausos entusiasmados da audiên cia. Como 
prova da popularidade, na corrida de 2008 as 400 va gas foram 
preenchidas nove minutos após a abertura das inscri ções. 
Em lugar das coloridas e aerodinâmicas roupas de ci clismo, os 
participantes do Campeonato Mundial de Ciclismo de Marcha Única 
apresentam-se para a prova paramentados de forma cr iativa: eles e 
elas participam vestidos como escoteiros, com orelh as de coelho, 
usando pijamas e até mesmo fantasiados com sungas i nspiradas pelo 
personagem Borat. A idéia é não levar a prova a sér io. O que 
importa é que o local seja aprazível, a companhia a gradável e a 
diversão garantida. Para os interessados no espírit o anti-
olímpico ou melhor, no verdadeiro espírito olímpico , recomenda-se 
o blog da prova: http://sswc08.blogspot.com/ . 
 
 
Sexo verde 
 
Se o prezado leitor não é capaz de deter o desmatam ento da 
Amazônia ou salvar da extinção o antílope tibetano, que ao menos 
seja ecológico na cama. 
 
Circulou pelo mundo virtual um decálogo de práticas sexuais 
criado pelo Greenpeace. Se o prezado leitor havia s e entusiasmado 
com o vídeo da campanha Forest Love, estrelado por plantas que se 
acariciavam sensualmente, e também produzido pela d ecana ONG, 
então chegou o momento de levar a luta pelo meio am biente para 
uma nova frente: sua cama. 
Comece pela questão energética. Apague as luzes e d ê sua 
contribuição para a preservação da camada de ozônio . Mais sexo no 
escuro significa menor consumo de energia. No entan to, se o 
leitor é do tipo visual, que precisa ver para ter, a solução é 
simples: basta transar de dia. Resolvida a matriz e nergética, 
enfrente à não menos crítica questão da água. Afina l, além do 
petróleo, a água também está se tornando um bem car o e raro. 
Estima-se que mais de um bilhão de pessoas no mundo não tem 
acesso à água limpa. Solução: banho a dois. A natur eza agradece. 
O casal gosta de temperar sua paixão com frutas? Ót imo, nada mais 
natural, mas não deixem de observar a procedência g enética dos 
suprimentos. Afinal, sabe-se pouco sobre os efeitos do uso de 
alimentos geneticamente modificados sobre a saúde e menos ainda 
sobre o seu uso em atividades íntimas. Não corram r iscos. 
O mar inspira o romance? Excelente, mas não esqueça que, embora 
certas iguarias marinhas tenham fama de afrodisíaco s, os oceanos 
estão sendo destruídos. A saída é apelar para a flo ra amazônica, 
rica em substâncias milagrosas. Mares limpos, consc iência 
tranqüila e prazer vitaminado: combinação perfeita. 
O leitor é do tipo que se entusiasma com acessórios ? Perfeito, 
mas cuidado com os materiais. A produção de PVC, po r exemplo, 
cria e libera dioxina, um dos componentes químicos mais tóxicos 
que existe. Prefira couro e borracha. Se o caso for de 
equipamentos de madeira, garanta a origem certifica da e o selo 
verde. Afinal, você não quer ver seu prazer ligado ao 
desmatamento da Amazônia. A ocasião pede o uso de l ubrificantes? 
Tudo bem, mas cuidado com os derivados de petróleo. As empresas 
petrolíferas estão destruindo o planeja, mas você n ão precisa 
fazer o mesmo. Opte por similares naturais. 
O Greenpeace nasceu no início da década de 1970 par a se tornar a 
mais conhecida organização de defesa do meio ambien te do mundo. 
No início dos anos 1990, a organização chegou a con tar com quase 
cinco milhões de membros. Hoje, são quase três milh ões de 
membros, um número ainda impressionante. América La tina e Ásia, 
regiões nas quais o desenvolvimento econômico mais ameaça o meio 
ambiente, estão no centro de seu alvo estratégico. 
Durante muitos anos, a organização foi marcada pela personalidade 
de David McTaggard, um canadense de origem escocesa . McTaggard 
era fascinado pelo Sul do Pacífico, tinha um pequen o barco e 
velejava de ilha em ilha. Em 1972, fez contato o Co mitê Não Faça 
Onda, que protestava contra os testes nucleares fra nceses no Atol 
de Mururoa, na Polinésiafrancesa. McTaggard aderiu à causa e 
rapidamente se tornou seu mais fiel guerreiro. Seus 
enfrentamentos com os franceses lhe renderam alguma s escoriações 
e fama mundial. 
Sob seu comando, Não Faça Onda transformou-se em Gr eenpeace, 
galvanizou milhares de indivíduos ao redor do mundo em torno da 
causa ambiental e deu origem a um estilo espetacula r de ação. Sua 
estética sempre explorou a audácia, o choque e o co nfronto. Seus 
meios sempre foram a comunicação de impacto e a pub licidade. 
Com os anos, o Greenpeace cresceu e se internaciona lizou. Tornou-
se, segundo alguns observadores, grande e complexo demais para 
uma organização cuja imagem ainda era de um grupo d e idealistas 
em botes de borracha enfrentando inimigos poderosos para salvar 
baleias e protestar contra o lixo radioativo: os “g uerreiros do 
arco-íris”. McTaggard deixou o comando e retirou-se para uma 
fazenda italiana em 1991. 
Como outras organizações similares, o Greenpeace pr ocura manter 
sua identidade e seus valores diante de um mundo em 
transformação. Seus métodos espetaculares perderam força em uma 
sociedade dominada pelo espetáculo do consumo. Sua retórica foi 
absorvida pelo mundo corporativo e adotada por seus mais 
tradicionais inimigos. Algumas companhias petrolífe ras agora se 
declaram campeãs da causa das energias limpas. A en ergia nuclear 
deixou de ser o bicho-papão dos anos 1970 e até fab ricantes de 
tabaco hoje publicam balanços sociais. Os fatos con tinuam milhas 
náuticas atrás do discurso, mas fatos são pouco rel evantes na 
sociedade do espetáculo. Felizmente, o lema “faça a mor, não faça 
a guerra” continua atual. 
 
PARTE 2: FALANDO MAL DAS CORPORAÇÕES 
 
Enxofre e naftalina 
 
Com freqüência irritante, o mundo corporativo ofend e nossas 
narinas com odores desagradáveis. Deixar de respira r não é opção. 
 
Segundo a Wikipedia, a enciclopédia livre, que afir ma facilitar a 
nossa vida, o enxofre é um elemento químico de símb olo S, número 
atômico 16 e que se encontra, à temperatura ambient e, em estado 
sólido. Trata-se de um não-metal de coloração amare la, frágil e 
que desprende um conhecido odor de ovo podre, ao mi sturar-se ao 
hidrogênio. Segundo a mesma fonte, a naftalina, ou naftaleno, é 
um hidrocarboneto aromático. Trata-se de uma substâ ncia 
cristalina branca, volátil, que se obtém por destil ação do 
alcatrão da hulha. A naftalina é um híbrido de ress onância de 
três estruturas canônicas e, como o enxofre, tem od or peculiar, 
reconhecido nas populares esferas anti-traça. 
Além das propriedades odoríferas óbvias, enxofre e naftalina têm 
também propriedades metafóricas. O enxofre é comume nte associado 
a Mefistófeles, ao mundo subterrâneo e às trevas. R ecentemente, o 
enxofre foi também associado a um alto dignitário d e uma nação 
amiga; no caso, o presidente George W. Bush, dos Es tados Unidos. 
A associação, de cunho irônico, foi feita por um ou tro alto 
dignitário de uma nação também amiga, o presidente Hugo Chávez, 
da Venezuela. 
Por sua vez, a prosaica naftalina não se presta a a ssociações tão 
marcantes. Perde em dramaticidade, porém rivaliza e m 
popularidade. Conserva até mesmo certa brejeirice, provavelmente 
por despertar sentimentos de nostalgia nas narinas crescidas no 
último quartil do século passado. O cheiro de nafta lina está 
associado ao que é velho, anacrônico, fora de propó sito ou 
deslocado no tempo. Não há registro que o alto dign itário norte-
americano tenha retrucado o intempestivo colega ven ezuelano, mas 
poderia tê-lo associado, por seu estilo e retórica, ao cheiro de 
naftalina. 
Além das bancadas de laboratório e da tribuna da ON U, enxofre e 
naftalina também disputam a primazia odorífera no m undo 
corporativo. Muitos executivos hoje abraçam causas filantrópicas, 
comemoram balanços sociais e juram proteger a fauna e a flora. 
Porém, não escapa às narinas mais treinadas um inde lével cheiro 
de enxofre. De seu lado, os sindicatos rosnam, uiva m e 
esbravejam. O som e a fúria continuam a entorpecer os ouvidos, 
mas o que chega ao olfato é o odor que emana do dis curso antigo e 
gasto: o cheiro de naftalina. 
A crise econômica arrancou os telhados dos bancos d e 
investimentos e das montadoras de automóveis. Das e xóticas e 
sofisticadas práticas bancárias desprendeu-se nause abundo odor 
sulfuroso, que rapidamente atormentou governos e pe quenos 
investidores. Das linhas de montagem emanou inconfu ndível odor de 
naftalina, embora não se saiba se a origem é a gest ão arcaica ou 
os produtos anacrônicos. 
Os bancos de investimento talvez se juntem ao clube dos 
sulfurosos históricos: os fabricantes de armas, de bebidas 
alcoólicas e de tabaco; um seleto e poderoso grupo, formado por 
especialistas em evasão lógica e flexibilidade mora l. Pelo 
noticiário, nota-se que o clube está em franca expa nsão. Os 
próximos associados provavelmente serão os laborató rios 
farmacêuticos, acusados, em um relatório da União E uropéia, de 
utilizar táticas condenáveis para proteger suas dro gas mais 
lucrativas contra a entrada de genéricos. No dito c lube, os 
sócios blasfemarão contra os órgãos reguladores, or ganizações não 
governamentais e outros detratores. Objetivos e mat reiros, 
discutirão métodos para manipulação da opinião públ ica, evasão 
fiscal e lavagem verde. 
Por sua vez, as montadoras de automóveis provavelme nte ganharão 
título e carteirinha do clube da naftalina. Talvez seus 
executivos estranhem as instalações decadentes, a p iscina 
abandonada, as salas mofadas e os carpetes puídos. Entretanto, lá 
encontrarão seus camaradas das empresas estatais e das 
universidades públicas. Corteses, trocarão longos m onólogos e 
discretos bocejos, discorrerão com pompa sobre glór ias passadas, 
invocarão heróis e feitos d’outras gerações e lamen tarão as 
injustiças e a má sina. Em ocasiões especiais, eles alugarão 
arranjos florais e convidarão autoridades eclesiást icas, civis e 
militares para a outorga de honrarias e a entrega d e prêmios. 
Então, se submeterão a discursos longos e vazios, e ntremeados por 
aplausos formais. 
Enquanto o clube do enxofre e o clube da naftalina crescem e 
prosperam, diminui a nossa sensibilidade nasal. Ent orpecidos, 
percebemos cada vez menos as emissões gasosas e hab ituamo-nos ao 
mau cheiro. Neutralizado o olfato, as emissões turv arão nossa 
visão, paladar, tato e audição. Aos poucos, elas em botarão nosso 
senso crítico e corromperão nosso julgamento. Haver á resistência 
possível? Não se sabe, mas deixar de respirar não é opção. 
 
 
A praga de Colbert 
 
A burocracia nasceu para estruturar o Estado modern o e atender os 
cidadãos. Porém, com o tempo, as organizações buroc ráticas 
costumam se desvirtuar e se voltar para os interess es de seus 
próprios funcionários. 
 
Balzac deixou a frase para a história: “A burocracia é um sistema 
gigantesco gerido por pigmeus” . Seu país, a França, teve a 
duvidosa honra de cunhar o termo. A palavra burocra cia combina o 
termo bureau (escritório ou mesa de trabalho, em francês) com o 
termo krátos (poder, regra ou governo, em grego). 
Consta que origem remonta ao ano de 1665, quando o rei Luís XIV 
nomeou Jean-Baptiste Colbert como controlador geral das finanças. 
Colbert reorganizou o comércio e a indústria e pers eguiu os 
corruptos. Para garantir a atuação justa do Governo , exigiu que 
os funcionários seguissem regras rígidas, aplicadas a todos. O 
rigor e a inflexibilidade de Colbert levaram Jean C laude Marie 
Vincent, administrador do comércio, a criticar as r esoluções, as 
quais considerava impeditivas para a atividade come rcial. Para 
ilustrar a sua crítica, Vincent criou o termo bureaucratie , 
referindo-se, de forma pejorativa, à concepção e ap licação de 
regras, sem considerar as consequências práticas. 
A burocracia fundamenta-se na idéia de que todas as funções são 
executadaspor profissionais habilitados e balizada s por certos 
princípios: o caráter legal das normas e regulament os, a 
formalização da comunicação e a divisão racional do trabalho. O 
sistema nasceu para ser a materialização da raciona lidade. Porém, 
pelas mãos dos burocratas, converteu-se em um monst ro que todos 
aprendemos a temer e a abominar. 
A lista de disfunções e vícios associados à burocra cia é longa. A 
burocracia afirma que, diante dela, todos somos igu ais. No 
entanto, a igualdade de tratamento costuma vir acom panhada pela 
impessoalidade, pela negligência e pela ineficácia. A burocracia 
sacraliza as regras, que passam de meios a fins. En tre resolver 
um problema e seguir uma norma, o burocrata comumen te opta por 
seguir a norma. Lixe-se o cidadão. A burocracia mud a apenas 
lentamente, quando muda. O ambiente pode transforma r-se 
radicalmente, mas a burocracia não se adapta. Tende a tornar-se 
anacrônica. A burocracia organiza-se como um sistem a neutro e 
justo. Entretanto, a sua complexidade e o seu porte facilitam o 
nepotismo, os abusos de poder e a corrupção. O resu ltado é um 
sistema central em nossas vidas, do qual não conseg uimos escapar, 
mas que costumamos odiar. A burocracia consegue som ar a 
ineficiência ao poder ameaçador, a incompetência do s amanuenses 
lerdos à manipulação interesseira dos funcionários corruptos. 
Dentro do sistema, os burocratas buscam incessantem ente a 
“expansão geográfica e demográfica”. Quadros inchad os significam 
mais gente a coordenar, mais serviço a controlar e mais poder a 
exercer. Assim, a burocracia combina negligência no serviço ao 
cidadão com a capacidade de inventar trabalho para si mesma. 
John Kenneth Galbraith registrou para a posteridade : “A tendência 
da burocracia é achar objetivo em qualquer coisa qu e se esteja 
fazendo” . 
Na burocracia pública ou na burocracia privada, os burocratas 
procriam sem parar. Donald Keough, ex-CEO da Coca-C ola e autor de 
TheTen Commandments for Business Failure , comentou em alusão à 
própria multinacional: “Tendo despendido os meus primeiros anos 
no negócio de gado de meu pai, verifiquei que se co locarmos a 
mistura certa de machos e fêmeas, acabaremos por ob ter muito mais 
animais. As burocracias multiplicam-se do mesmo mod o. Eis como 
funcionam: põe-se um gestor em um lugar e, decorrid os dezoito 
meses, ele tem uma assistente. A assistente torna-s e um gestor 
júnior – e o que se observa? Outra assistente. O ri tmo continua”. 
Nas burocracias, as regras originalmente estabeleci das para 
garantir clareza e eficiência, deixam de ser meios e se 
transformam em fins. Por sua vez, os burocratas con trolam o 
sistema como se protegessem sua própria vida, pois sentem que 
mudanças podem reduzir seu poder ou sua autoridade. Com o tempo, 
os burocratas isolam-se em seus castelos, os abusos tornam-se 
corriqueiros e eventuais mudanças enfrentam barreir as 
intransponíveis. 
Em Pindorama, muitas empresas e órgãos públicos man têm padrões 
inaceitáveis de atendimento e de relacionamento com os cidadãos. 
Do poder judiciário às estatais, do sistema de saúd e ao sistema 
de educação, observemos casos gritantes de desperdí cio de 
recursos e de desrespeito aos contribuintes. Todos temos 
histórias de horror para contar. A situação não é d iferente em 
algumas empresas privadas. Além de vitimar os seus clientes e 
funcionários, estas organizações também vitimam a s i próprias. No 
embate entre as forças para mudança e os interesses 
estabelecidos, os últimos continuam vencendo. 
 
 
Insensatez e insensibilidade 
 
Certas organizações tratam seus parceiros e colabor adores com mal 
disfarçado desdém, como se fizessem um grande favor por permitir 
que eles a elas se associem. 
 
Para ter um bom hospital, é preciso ter bons médico s; para ter 
uma boa escola, é preciso ter bons professores; par a ter uma boa 
empresa é preciso ter bons profissionais e forneced ores; e para 
ter uma boa editora, é preciso ter bons autores ... ou não? A 
considerar o caso narrado em seguida, para alguns a premissa pode 
não ser tão óbvia. 
Tome-se o caso da prestigiosa editora X. Sim, vamos manter-lhe o 
nome incógnito, que de nada nos serviria granjear a ntipatias. 
Pois ocorre que X é uma das mais respeitadas editor as de 
Pindorama. Seu catálogo contém admiráveis clássicos , suas capas 
são esmeradas e suas obras exalam cultura e bom gos to. Sua 
excelência editorial merece aplauso e seu crescimen to nos resgata 
a crença de que ainda existem adultos que lêem. 
Porém, aquele que visitar sua página de “envio de o riginais” na 
Internet descobrirá que naquela casa do saber autor es não são bem 
vindos. Estranho e paradoxal, porém verdadeiro. Poi s lá consta: 
“Não publicamos auto-ajuda, esoterismo, marketing, ficção-
científica, guias de turismo, culinária, didáticos e livros 
técnico-científicos”. Bravo! Até aqui, um bom começ o. E a esta 
bem vinda escolha, segue-se: “livros e projetos em versão 
eletrônica não serão avaliados”. Ótimo! Nada como o velho papel 
para marcar a tradição das belas letras. Então, esc apa-lhe de uma 
linha a outra a civilidade: “A editora se reserva o direito de 
não confirmar o recebimento de originais, seja por telefone, fax 
ou e-mail”. Puxa, será que custa tanto enviar uma c arta 
simpática, reconhecendo o esforço do autor, a sua d edicação e o 
seu idealismo? E a prosa fica ainda pior: “Dado o g rande número 
de originais que nos chegam, caso queira confirmar o recebimento 
utilize o serviço de carta registrada dos Correios” . Direto e 
duro: quer saber da sua amada criança? Vire-se. E, por fim, o 
golpe final: “Os originais não aceitos serão remeti dos a empresas 
de reciclagem de papel. Por favor, não telefone ou envie 
mensagens sobre o envio de sua obra, pois elas não serão 
respondidas”. Bonito, não? Então, o idolatrado rebe nto, depois de 
longa gestação e terríveis dores de parto vai termi nar é no 
lixão. E não adianta reclamar ou procurar os desalm ados, porque 
resposta não haverá mesmo. 
A esta altura, estará a se perguntar o gentil leito r: de onde 
veio tanta deselegância e insensibilidade? Terão si do os 
iluminados funcionários da prestigiosa editora arre matados entre 
os mais empedernidos matutos do serviço público fed eral, entre 
aqueles que rosnam para o público e esmeram-se em d ificultar a 
vida dos semelhantes? Pior, e se a moda pega? E se alastra pelos 
hospitais, que passam a destratar seus médicos e a esnobar seus 
fornecedores. E se alastra pelas escolas, que passa m a maltratar 
seus professores. E se alastra pelas empresas, que passam a 
desdenhar suas legiões de terceiros e a assediar se us prestadores 
de serviços. Talvez os ditos estabelecimentos opere m por algum 
tempo sem perceber os danos causados, o quanto dure o instável 
equilíbrio entre o estoque de sádicos e a quantidad e de 
masoquistas. Então, o clima organizacional se deter iorará, a 
gestão entrará em declínio e os resultados iniciarã o uma firme 
trajetória, rumo ao solo. 
Nesse nosso mundo de mercados e corporações, indiví duos assumem 
alternativamente os papéis de produtores e de consu midores. Hoje, 
indivíduos e comunidades estão entrelaçados na aren a de produção 
e consumo, seus membros comunicam-se, espalham impr essões. O 
autor da nossa editora X pode ser no momento seguin te o professor 
que indica os seus livros. O fornecedor de uma empr esa pode ser 
no momento seguinte um cliente importante. Se forem maltratados, 
eles talvez prefiram buscar as obras e serviços de um concorrente 
mais simpático, ou menos obtuso. Tratar mal um auto r, um 
fornecedor ou um terceiro pode gerar consequências negativas, que 
se propagam e transcendem a relação original. 
O que provoca o rude comportamento? Simples: miopia e 
incivilidade. Miopia, pela incapacidade de perceber o que está a 
além de alguns poucos palmos do nariz. Incivilidade

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