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Fundamentos Histórico Teórico Metodológicos do Serviço Social – dimensão histórica Aula 03 Profa Jussara Marques de Medeiros CONVERSA INICIAL Olá, seja bem-vindo(a) à terceira aula de Fundamentos Histórico Teórico Metodológicos do Serviço Social – dimensão marxista. Nosso objetivo, neste encontro, é analisar as condições históricas associadas às relações de produção capitalista, à influência doutrinária da Igreja Católica e à gênese da profissão de serviço social no Brasil, apontando sua interlocução com as políticas sociais. Para tanto, vamos: Explicar a transição do sistema agroexportador para a consolidação do capitalismo, no Brasil Apresentar a gênese da profissão de serviço social no Brasil e sua relação com a questão social Apontar as características do serviço social brasileiro e seus aspectos interventivos, de 1930 a 1950 Neste percurso, realizaremos um diálogo com a história do Brasil, considerando a grande riqueza cultural produzida historicamente pelos grandes artistas, escritores e cantores brasileiros, assim, convidamos a todos para acompanhar essa aula, conhecendo nossas músicas e nosso arsenal cultural. CONTEXTUALIZANDO Curso de Ética em movimento no interior do Estado do Paraná. A assistente social participante conta a seguinte história: “Professora, não sei se está certo, mas gostaria de perguntar... já que estamos estudando ética, né? Foi uma ação que observei, gostaria de saber se é certo ou errado. — Pode contar. — Bom, quando a gente visita as pessoas, elas sempre nos pedem para olhar os armários, né. Dizem que a gente pode olhar tudo, porque elas não têm nada. Bem, essa minha colega olhou os armários um a um. Questionou que tinha comida lá, a dona da casa, que se encontrava sozinha com os filhos, justificou timidamente que ganharam doações de vizinhos. Parecendo satisfeita, a assistente social deixou a cesta básica. Quando ela saiu, encontrou o marido da usuária no bar da esquina. Não teve dúvidas: voltou, pegou novamente a cesta básica e afirmou: se vocês têm dinheiro para comprar bebida, certamente têm para comprar comida. Ao acabar a história, a assistente social perguntou: “Essa ação é antiética?” Como você responderia? Reflexão Ao acompanhar essa aula e conhecer a conjuntura e os aportes teóricos do serviço social no Brasil, pense sobre quais características essa história tem comum com a gênese da profissão. Como seria a ação de um assistente social na década de 1940? Reflita sobre a prática do assistente social. Ao final, voltaremos a esta questão. Tema 1 - A gênese do serviço social: duas teses sobre a natureza profissional, de acordo com Montaño No início desta aula, é importante contextualizar sobre as duas teses do professor Montaño (2007), que discutem sobre a forma como os autores que discorrem sobre o Serviço Social abordam o surgimento da profissão. O autor discute que não há um debate sobre esse assunto que tenha sido apropriado pelo conjunto da profissão e as duas teses são alternativas e excludentes entre si. Embora este debate faça referência à história do Serviço Social de forma mais ampla, ele tem início no item que apresenta a profissão no cenário brasileiro porque o autor faz menção à literatura dos teóricos brasileiros, que serão discutidos neste tema. Assim, vamos apresentar as teses discutidas pelo autor: Perspectiva endogenista Perspectiva histórico-crítica Vamos ver cada uma delas em detalhes, a seguir! Perspectiva endogenista Para Montaño (2007, p. 30), “sustenta a origem do Serviço Social na evolução, organização e profissionalização das formas anteriores de ajuda, caridade e filantropia, vinculada agora a intervenção na questão social.”. As bases desta tese são as várias formas de ajuda, tendo como marco as obras de São Tomás de Aquino e Vicente de Paula, apontado como precursores. Um desses expoentes é o livro de percursores e pioneiros do Serviço Social, de Balbina Ottoni Vieira, cujo material foi disponibilizado no nosso primeiro tema. Esta autora seria um membro tradicional e outros autores brasileiros que buscam romper com o serviço social tradicional, porém ainda apresentam um caráter conservador (como Ana Augusta de Almeida, que discorre sobre a fenomenologia, Boris Alexis Lima, entre outros). O autor realiza uma análise de vários destes autores, mostrando que eles partem de concepções teóricas, filosóficas e ideológicas díspares, então, como podem coexistir nesta tese endogenista? Para Montaño, todos estes autores têm postura endógena, visto que tratam o Serviço Social com uma autonomia histórica com respeito à sociedade, às classes e às lutas sociais. Também têm visão particularista ou focalista, visto que associa o surgimento do Serviço Social às ações particulares. (grifo meu) (MONTAÑO, 2007). O autor afirma: Aqui não aparece uma análise do contexto social, econômico e político como determinante ou condicionante do processo de criação desta profissão; apenas, na melhor das hipóteses, situa-se historicamente este fenômeno sem que ele redunde em uma análise exógena, estrutural, do surgimento do Serviço Social” (MONTAÑO, 2007, p. 30). Importante destacar que essas análises perdem a concepção crítica e histórica, ou seja, apresentam fatos consecutivos sem realizar análise mais ampla, relacionando o contexto histórico e os fatos que políticos, históricos e sociais. Perspectiva histórico-crítica Esta tese entende o surgimento da profissão como “um produto de síntese dos projetos político-econômicos que operam no desenvolvimento histórico, onde se reproduz material e ideologicamente a fração de classe hegemônica, quando, no contexto do capitalismo na sua idade monopolista, o Estado toma para si as respostas a questão social” (MONTAÑO, 2007, p. 30). Nesta citação, encontramos vários elementos de análise. Quando foi discutido o Serviço Social na América Latina, foram utilizados dois autores: Ezequiel Ander- Egg e Manuel Manrique Castro. O primeiro autor parte de uma perspectiva histórica de ajuda e apresenta no seu livro alguns métodos de atendimento, enquanto forma de qualificar a profissão, mas estes não estão relacionados a uma análise conjuntural. O segundo apresenta os fatos da história da profissão na América Latina, apresentando os contextos e relacionando com a profissão. Um destes fatos é a questão social, amplamente discutida, mas situada em um cenário de luta de classes e emergência da profissão. A primeira autora a pensar numa perspectiva histórico-crítica foi Marilda Vilella Iamamoto, nos anos de 1980. Ela aponta que o Serviço Social “tem um papel a cumprir dentro da ordem social e econômica – como uma engrenagem da divisão sociotécnica do trabalho – na prestação de serviços...” (MONTAÑO, 2007, p. 31). A autora aponta que o profissional tem uma demanda pela qual foi criada a profissão: participar da reprodução da força de trabalho, das relações sociais e da ideologia dominante. No vídeo a seguir há um resumo das ideias do autor. Assista e preste atenção nas diferentes formas de análise! https://www.youtube.com/watch?v=_wRHC81zQao Tema 2 - Brasil Colônia e o sistema agroexportador até a questão social no Brasil A formação social no Brasil e o modo de produção surgiram e se consolidaram como lenta transição que ocorreu na Europa Ocidental, entre aproximadamente finais do século XV, no regime feudal e o século XVIII, com a consolidação do sistema capitalista (WOLKMER, 2010). Wolkmer (2010) cita Álvaro de Vita: “enquanto o trabalho servil – a forma de trabalho obrigatória própria do feudalismo – desaparecia na Europa, os europeus recriaram a escravidão em suas colônias. A produção de gêneros tropicais para o comércio no Brasil foi organizada com base na exploração do trabalho escravo” (WOLMER, 2010, p. 47).Embora o trabalho servil não fosse considerado trabalho escravo, o sistema de exploração dos servos para o autor, foi recriado como forma de escravidão nas colônias, sendo que a produção foi explorada com enriquecimento da metrópole, pois nada do que era produzido era utilizado no desenvolvimento da colônia. A metrópole revendia os produtos com lucro. Assim, o período colonial foi marcado pela polarização entre imensos latifúndios e o trabalho escravo. Em relação a este fato, Pereira (2008, p. 125) afirma que “Diferente, pois, das políticas sociais dos países capitalistas avançados, que nasceram livres da dependência econômica e do domínio colonialista, o sistema de bem-estar brasileiro sempre expressou as limitações decorrentes dessas https://www.youtube.com/watch?v=_wRHC81zQao injunções”. Podemos afirmar que o Brasil, neste período, é agroexportador, ou seja, um país agrário, de monocultura e voltado à exportação. Este fato confere uma forma de organização das primeiras políticas sociais: Naquele momento o Brasil tinha uma economia basicamente fundada na monocultura do café voltada para a exportação - eis aqui a base da nossa heteronomia - produto responsável por cerca de 70% do PIB nacional. Por isso os direitos trabalhistas e previdenciários foram reconhecidos para aquelas categorias de trabalhadores inseridas diretamente nesse processo de produção e circulação de mercadorias (BEHRING E BOSCHETTI, 2006, p. 80). A professora Potyara Pereira (2008) afirma que o Estado não exercia a ação de agente regulador na área social, deixando essa função para o mercado, a iniciativa privada não mercantil e a polícia. A autora chama esse período de laissefariano e afirma que “Efetivamente, a ação do estado perante as necessidades sociais básicas limitava-se, nesse período, a reparações tópicas e emergenciais de problemas prementes ou a respostas morosas e fragmentadas a reivindicações sociais dos trabalhadores e de setores empobrecidos dos grandes centros urbanos” (PEREIRA, 2008, p. 128). Uma legislação importante neste período foi a Lei Elói Chaves, em 1923. Sobre isso, Behring e Boschetti (2006, p. 80) afirmam que: O ano de 1923 é chave para a compreensão do formato da política social brasileira no período subsequente: aprova-se a lei Eloy Chaves, que institui a obrigatoriedade de criação de Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) para algumas categorias estratégicas de trabalhadores, a exemplo dos ferroviários e marítimos, dentre outros. Dessa forma, as políticas são contributivas e atendem, prioritariamente, a categoria de trabalhadores que eram primordiais para a economia, de exportação, ou seja, ferroviários e marítimos. Podemos considerar que a questão social no Brasil inicia na década de 1930, com a industrialização no país. Com a crise de 1929, cresce a industrialização e o mercado nacional, intensificando o surgimento de uma nova classe que promove o crescimento da urbanização no país e suas contradições, com estas, dentre outras: Agudização da pobreza Pessoas que moram em condições precárias Trabalho infantil Vimos nas aulas anteriores o conceito de questão social. Com o aumento da classe trabalhadora, há necessidade de o Estado tratar desta de forma diferenciada, que não fosse pela repressão. Tema 3 - Governo Getúlio Vargas e sua relação com as políticas sociais Do ponto de vista econômico, temos a passagem, na década de 1930, de um modelo agroexportador para um modelo urbano industrial. Em 1930, por meio de um golpe militar, assume Getúlio Vargas, essencial para a compreensão do modelo das políticas sociais e do início do Serviço Social no Brasil. Uma das bases de apoio de Getúlio Vargas era a Igreja Católica, que levou a população a apoiar o governo. Fausto (2006) afirma que as ações de Getúlio Vargas tinham o objetivo de reprimir esforços organizatórios da classe trabalhadora urbana e atraí-la para o apoio do governo. Getúlio Vargas apresenta várias ações voltadas para a dimensão trabalhista. Cisne (2012, p. 33) afirma que: As políticas sociais se constituem, desse modo, como um campo contraditório, pois, ao mesmo tempo que garantem o atendimento de necessidades concretas da população usuária, que da outra forma lhe é negado, configuram-se como instrumento que assegura a reprodução do capital, via garantia da força de trabalho e ameniza os conflitos de classe. Assim, em relação às mudanças trabalhistas, temos as seguintes mudanças: • Centralização política e administrativa do Estado • Favorecimento do processo de acumulação capitalista • Adoção de medidas paliativas para atender as questões mais gritantes e emergenciais • Utilização de técnicas de propaganda para obter o aval da população • Introdução de ampliação dos direitos trabalhistas (salário mínimo, estabilidade no emprego, indenização por dispensa sem justa causa, CLT) • Instituição da LBA (1942) – atender os familiares dos pracinhas que foram para a II Guerra Mundial Depois, voltou sua atuação para: • Crianças, PcDs e idosos • Apoio judiciário • Ações comunitárias • Geração de emprego e renda Em relação às políticas sociais criadas na época, Pereira (2008, p. 130) afirma que: Embora a questão social não fosse mais considerada uma questão de polícia, ela não foi alçada a questão de política maior que merecesse a mesma atenção que o governo dispensava à área econômica. Na verdade, a política social brasileira deste período, não obstante encapada pelo Estado, funcionava, no mais das vezes, como uma espécie de zona cinzenta, onde se operavam barganhas populistas entre Estado e parcelas da sociedade e onde a questão social era trans formada em querelas reguladas jurídica ou administrativamente e, portanto, despolitizada. Assim, Getúlio Vargas, conhecido como Pai dos Pobres, ao mesmo tempo em que cria as políticas sociais, subordina o sindicato ao governo, ou seja, quem quisesse ter acesso às políticas tinha que se inscrever no Sindicato e contribuir. O sindicato, neste contexto, perde o caráter de protesto e de luta e se torna um apêndice do governo, com a responsabilidade de organizar eventos, ir ao dentista, dentre outros, se tornando um espaço de sociabilidade. Veja o vídeo de Getúlio Vargas a seguir e aponte as principais características de seus governos: https://www.youtube.com/watch?v=SJcwwgI0Wog Tema 4 - Relação da questão social com o serviço social De acordo com Iamamoto e Carvalho (1983), as obras caridosas mantidas pelo clero e pelos leigos tem longa tradição no Brasil, que inicia no período colonial. A pequena infraestrutura hospitalar e assistencial é quase exclusivamente da ação das ordens religiosas europeias. A Igreja também possui ação na organização e no controle do proletariado, sendo que no século XIX observa-se a presença de religiosos nas unidades industriais, onde os trabalhadores eram obrigados a assistir missas e liturgias. A partir da ação católica, iniciam-se as ações assistenciais, com um objetivo de resolver a questão social, visto que havia um grande temor em relação ao surgimento da primeira nação socialista e o fortalecimento do movimento operário. Assim, para os Iamamoto e Carvalho (1983, p. 170): As instituições assistenciais que surgem nesse momento, como a Associação das Senhoras Brasileiras (1920), no Rio de Janeiro e a Liga das Senhoras Católicas (1923), em São Paulo, possuem já-não apenas no nível da retórica- uma diferenciação face as atividades tradicionais de caridade. Desde o início são obras que envolvem de forma mais direta e ampla os nomes das famílias que integram a grande burguesia https://www.youtube.com/watch?v=SJcwwgI0Wog paulista e carioca e, as vezes, a própria militância de seus elementos femininos. Possuem um aporte de recursos e potencial de contratos a nível de Estado que lhes possibilita oplanejamento de obras assistenciais de maior envergadura e eficiência técnica. Veja este vídeo da Sociedade de Organização da Caridade, precursora das ações de ampliação da visão da Igreja Católica: https://www.youtube.com/watch?v=_hHk_TDiwV4 Estas Instituições são extremamente fortes no Brasil, orientando o trabalho social a ser realizado no Brasil. Em 1932, surge o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo (CEAS), considerado uma manifestação original do Serviço Social. “Seu início será a partir do ‘Curso Intensivo de Formação Social para Moças’ promovido pelas Cônegas de Santo Agostinho, para o qual fora convidada mlle Adèle Loneux da Escola Católica de Serviço Social de Bruxelas” (IAMAMOTO E CARVALHO, 1983, p. 172). Para os autores, “as atividades do CEAS se orientarão para a formação técnica especializada de quadros para a ação social e a difusão da doutrina social da Igreja” (IAMAMOTO E CARVALHO, 1983, p. 177). Ao CEAS intervém como dinamizador do povo laico organizando a associação de moças católicas para atuação junto ao proletariado. A partir dessas ações, surge em 1936 a Escola de Serviço Social de São Paulo. Porém, os autores destacam que não é uma atitude exclusiva do Movimento Católico Leigo, pois há uma demanda a partir do Estado (IAMAMOTO E Carvalho, 1983). Cisne (2012, p. 34) destaca que muitos são os direitos conquistados nesse período que são produtos da luta dos trabalhadores, mas cria-se uma necessidade do Estado amenizar os conflitos de classe atender a necessidade do capital de atenuar a pauperização existente, criando a relação entre o Serviço Social e a Assistência Social: A relação entre o Serviço Social e a assistência social pode ser considerada orgânica à medida que o processo de institucionalização da profissão se dá enraizada com a história da assistência social. No momento em que ela passa a ser responsabilidade do Estado, este https://www.youtube.com/watch?v=_hHk_TDiwV4 demanda a necessidade de profissionais capacitados tecnicamente para a execução dessa política via procedimentos racionais e científicos. No Rio de Janeiro, foi fundada a segunda Escola de Serviço Social do país, que contou com uma equipe da Congregação das Filhas do Coração de Maria, que chegou ao Brasil em 1937 (AGUIAR, 2011). Para Aguiar, as características da formação do assistente social nesse período são: • Importância da formação doutrinária e moral, pois o aspecto técnico só terá importância com a influência americana • A ideologia que fundamentará a formação doutrinária é a reconstrução da sociedade em bases cristãs • Os católicos dizem não ao laicismo, ao liberalismo e ao comunismo e pretendem que uma nova ordem onde a família, o Estado, a economia, a política e os costumes tenham por base o evangelho e que a sociedade seja organizada por bases corporativas O Serviço Social tem uma base católica que apresenta uma ideologia própria neste período. Aguiar (2011) mostra os conceitos sobre a profissão que foram criados nessa época: “Adéle de Loneaux assim define o Serviço Social: Conjunto de esforços feitos para adaptar o maior número possível de indivíduos a vida social, ou para adaptar as condições de vida social às necessidades dos indivíduos. O Serviço Social é, portanto, uma parte da Ação Social” (FERREIRA apud AGUIAR, 2011, p. 46). Esta visão remete a adaptação dos indivíduos a vida social, ou seja, não se questiona a ordem estabelecida, mas as ações estão interligadas com o individual (grifo meu). A partir dos anos 1940/50, a questão social - expressão das desigualdades decorrentes do aprofundamento do capitalismo no Brasil - passa por grandes transformações, especialmente a partir do final da II Guerra Mundial. A aceleração industrial as migrações campo-cidade, o intenso processo de urbanização, exigem novas respostas do Estado e do empresariado. No contexto da ditadura de Vargas é criada, em 1942, a Legião Brasileira de Assistência (LBA), e o sistema "S" – SESI, SENAI, SESC, SENAC. Este sistema mostra a atuação do estado vinculada a categorias que eram consideradas produtivas para o país, como os comerciários, industriários. Com a LBA, cunha- se a figura do chamado "primeiro damismo" (que resiste até os dias atuais), que tem sua origem vinculada à presidência de honra da LBA assumida pela primeira dama Darcy Vargas. Cisne (2012) afirma que sucessivamente, em estatuto, esta instituição garantia sua presidência as primeiras damas, e que a assistência social foi associada com a questão de gênero: “[...] há uma vinculação histórica entre as mulheres e a responsabilidade para com os problemas sociais, com a prática de caridade e da ajuda, com o equilíbrio e harmonia sociais, enfim, com a reprodução social voltada para o controle da classe trabalhadora (CISNE, 2012, p. 37). O Serviço Social foi regulamentado como profissão liberal em 1949, sendo que este profissional tem seu desempenho majoritariamente vinculado a instituições públicas e privadas, passando a se responsabilizar pela implementação das políticas sociais. Tema 5 - Seminário de teorização do serviço social em Araxá e Teresópolis Os documentos de Araxá (1967), Teresópolis (1970) e Sumaré (1978) constituem-se "marcos históricos" do fazer Serviço Social e são resultado de estudos de profissionais competentes reunidos em Seminários promovidos pelo Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais - CBCISS. Neste bloco, vamos conhecer o documento de Araxá. Com o agravamento da pobreza no período de ditadura militar, é necessário para os profissionais pensarem em ações tenham mais impacto na atuação. Para Aguiar (2011) após o golpe, de 1964 a 1967 há no discurso do Serviço Social a presença da linguagem do nacional desenvolvimentismo. O Serviço Social em 1968 assume um caráter assistencialista, mesmo com todo o rigor técnico e científico (AGUIAR, 2011). Em 1966, o CBCISS propõe um seminário para estudar a metodologia do Serviço Social. Aconteceu um encontro em Araxá/MG no período de 19 a 26 de março de 1967 e participaram 38 assistentes sociais formadas em diversas cidades país. O resultado do Seminário consubstanciou-se em um documento. No capítulo I, faz-se a seguinte discussão: a) Se o Serviço Social é ou não uma ciência Parece haver, porém, um certo consenso em caracterizar o Serviço Social no plano do conhecimento especulativo prático, conquanto se coloca ao nível da aplicação de conhecimentos próprios, ou tomados de outras ciências. Justifica-se, também considerá-lo como uma técnica social, porquanto influencia o comportamento humano e o meio, nos seus inter-relacionamentos. (AGUIAR, 2011, p. 151) b) As peculiaridades do Serviço Social são o caráter corretivo, preventivo e promocional Caráter corretivo – se define como intervenção na realidade para fins de remoção de causas que impedem ou dificultam o desenvolvimento do indivíduo, grupo, comunidade e populações. Caráter Preventivo - se define como um processo de intervenção que procura antepor-se às consequências de um determinado fenômeno. Caráter promocional – O Serviço Social promove quando atua para habilitar indivíduos, grupos, comunidades e populações, fazendo- os atingir uma plena realização de suas potencialidades (AGUIAR, 2011, p. 152) No Capítulo II, faz-se a seguinte discussão: • Fala de princípios e postulados que fundamentam o Serviço Social, sendo que postulados são “princípios éticos e metafísicos” e princípios operacionais são “aqueles norteadores da atuação do agente profissional e normas de ação de validade universal a prática de todos os processos do Serviço Social”. (AGUIAR, 2011, p. 154). Os Postulados do Serviço Social são baseados em uma visão tomista, advinda de São Tomás de Aquino, da igreja Católica. Leia o texto A Presença de Postulados Tomistas na Gênese do Serviço Social da professoraClaudia Neves da Silva, para aprofundar o assunto: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/seminasoc/article/view/3839/3083 • Da natureza do Serviço Social decorrem funções em diferentes níveis de atuação: Política Social, Planejamento, Administração de Serviço Social e Serviços de Atendimento direto, corretivo, preventivo e promocional a indivíduos, grupos populações e organismos (AGUIAR, 2011) José Paulo Netto, um grande teórico do Serviço Social, vai realizar críticas a esse documento, considerando o momento histórico que ele foi construído. Ele afirma, que apesar dos assistentes sociais expressarem uma preocupação com uma anunciada Teorização do Serviço Social, eles não a enfrentam explicitamente. Para ele, o documento reduz a teorização a uma abordagem técnica operacional modelo baseado na modernização (NETTO, 1996, p. 168). Veja o vídeo, que é uma animação sobre o Seminário de Araxá: https://www.youtube.com/watch?v=3EK1nCBz15s Aguiar (2011) destaca que neste momento histórico, a postura tradicional não era assumida por todos os profissionais da época. Já haviam vozes discordantes. Há uma reflexão sobre a prática profissional e um questionamento sobre a serviço de quem ela está. Porém, em Araxá, a maioria dos profissionais assumiam a posição de integração e não de transformação. Na década de 1970 foi realizado o Seminário de Teresópolis. Neste Seminário, tem 3 documentos debatidos na plenária, sendo um deles de José Lucena Dantas: A teoria Metodológica do Serviço Social. Uma abordagem sistemática. http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/seminasoc/article/view/3839/3083 https://www.youtube.com/watch?v=3EK1nCBz15s Ele apresenta o Serviço Social como um “método científico aplicado”. Esse método se constitui de duas categorias básicas: diagnóstico e intervenção planejada. Neste modelo se aplica um “status” de ciência para a profissão. Netto (1996) afirma em relação a esse seminário: no texto de Teresópolis o moderno fica mais destacado que o tradicional, “cristalizando operativa e instrumentalmente” (NETTO, 1996, p.178). Assim, a característica deste Seminário é destacar o viés da modernização. Leia atenciosamente o documento disponível no link. Ele aprofunda a diferença entre os Seminários. Estude-os, compare-os, mas acompanhe a crítica de Netto, para compreender seu processo naquele momento histórico. https://estudantesdeservicosocial.files.wordpress.com/2013/03/araxa-e- teresopolis.pdf TROCANDO IDEIAS Converse com pessoas mais velhas com as quais tenha contato e pergunte o que pensam sobre Getúlio Vargas. A partir das respostas, faça um fórum e discuta as seguintes questões: Discuta as respostas obtidas em relação a Vargas Estabeleça o que é um governo populista e porque o Governo de Vargas é considerado desse jeito Qual é a relação do governo Vargas com a frase: “a pobreza não pode mais ser vista como um caso de polícia, mas como um caso de política” Posicione-se com os colegas em relação a posturas autoritárias no trato com a questão social, que acontecem na atualidade https://estudantesdeservicosocial.files.wordpress.com/2013/03/araxa-e-teresopolis.pdf https://estudantesdeservicosocial.files.wordpress.com/2013/03/araxa-e-teresopolis.pdf NA PRÁTICA Primeiramente, escute a música O Bêbado e o Equilibrista, na interpretação da Elis Regina, escrita por João Bosco & Aldir Blanc e lançada em 1978: https://www.youtube.com/watch?v=6kVBqefGcf4 Agora, leia um pouco sobre a sua história: Lançada em 1978, a música tem forte teor político. Mas surgiu, na verdade, como um desejo de João Bosco homenagear Charles Chaplin. Chaplin tinha morrido no Natal de 1977. “Estava em Minas, naquelas festividades de Natal e Ano Novo, e as pessoas entrando já no clima carnavalesco. Comecei a querer fazer no violão algo que ligasse o Chaplin àquele momento musical brasileiro, carnavalesco”, disse João numa entrevista. “Todos sentiram muito porque ele divertiu muito e de maneira incomum. Tratando os temas eminentemente humanos e se posicionando dentro desses temas a favor dos miseráveis, do vagabundo. Mas com uma alegria, algo invejável, e no final dos filmes havia sempre um horizonte onde você podia chegar a pensar em um dia viver em um mundo diferente. Não tão desfavorecido como este”, explicou. Fonte: <http://jornalggn.com.br/blog/joao/conheca-a-historia-de-o-bebado-e-a-equilibrista>. Acesso em: 17 nov. 2015. O período da ditadura militar apresenta forte reação de artistas ao sistema instituído. De acordo com o texto citado, foi realizada na música uma homenagem a Charles Chaplin, mas esta também é um ícone de protesto a ditadura militar no Brasil. Baseado nestes fatos históricos, faça o que se pede a seguir: 1. Escreva o trecho que homenageia Chaplin 2. Pesquise o significado da estrofe, fazendo relação com o período militar https://www.youtube.com/watch?v=6kVBqefGcf4 3. Discorra sobre o Seminário de Araxá na década de 1960, relacionando-o com o período militar SÍNTESE Chegamos ao final de mais uma aula. Neste encontro, estudamos o contexto histórico do serviço social e a gênese da profissão. Para isso, discorremos sobre o governo de Vargas, a relação do serviço social com as políticas sociais e com a assistência social. Em seguida, conhecemos dois importantes seminários históricos, de cunho conservador da profissão: o Seminário de Araxá e o Seminário de Teresópolis. Em relação ao desafio colocado no início da aula, sobre a ação do assistente social que olhou os armários e pegou a cesta básica de volta, será que está correta esta atitude? Para tomar uma decisão, compara esta situação com o atendimento da assistente social que passou pelo Encontro de Araxá. Até a próxima! Referências AGUIAR, Antônio G. de. Serviço Social e Filosofia das origens a Araxá. 6 ed. São Paulo: Cortez: 2011. BEHRING, E. R.; BOSCHETTI. Política social fundamentos e história. São Paulo: Cortez, 2006. CISNE, Mirla. Gênero, divisão sexual do trabalho e serviço social. Outras Expressões, 2012. FAUSTO, Boris. História concisa do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006. IAMAMOTO, Marilda V.; CARVALHO, Raul. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. São Paulo: Cortez, 1983. MONTAÑO, Carlos. A Natureza do Serviço Social: um ensaio sobre sua gênese, a “especificidade” e sua reprodução. São Paulo, Cortez, 2007. NETTO, J. Paulo. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. São Paulo: Cortez, 1996. NETTO, J. Paulo. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64. Cortez, 1996. PEREIRA, Potyara A. Necessidades humanas: subsídios a crítica dos mínimos. São Paulo: Cortez, 2008. WOLKMER, Antonio C. História do Direito no Brasil. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. WORMS, Luciana S.; COSTA, Wellington B. Brasil século XX ao pé da letra da canção popular. Nova Didática, 2002.
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