Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 ATENÇÃO INTERDISCIPLINAR NA HUMANIZAÇÃO DO PARTO E NASCIMENTO 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empre- sários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade ofere- cendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a partici- pação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber atra- vés do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 Sumário ATENÇÃO INTERDISCIPLINAR NA HUMANIZAÇÃO DO PARTO E NASCIMENTO ................................................................................................... 1 NOSSA HISTÓRIA ............................................................................................. 2 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 4 1. PSICOLOGIA E SAÚDE ............................................................................. 5 1.1 Modelo Tecnomédico ou Biomédico ..................................................... 7 1.2 Modelo Humanista ................................................................................ 9 1.3 Modelo Holístico .................................................................................. 10 2. PSICOLOGIA HOSPITALAR .................................................................... 12 2.1 Pré-natal psicológico (PNP) .................................................................... 14 2.2 Gestação de alto risco ............................................................................ 15 2.3 Transtornos psíquicos no puerpério........................................................ 16 2.4 Depressão pós-parto .............................................................................. 16 3. HUMANIZAÇÃO ........................................................................................ 18 3.1 Acolhimento ............................................................................................ 21 4. HUMANIZAÇÃO EM PSICOLOGIA PERINATAL...................................... 22 4.1 Gravidez ................................................................................................. 25 4.2 Roteiro de Conversa ........................................................................... 27 4.3 Escuta qualificada ............................................................................... 28 4.4 Manejo da dor ......................................................................................... 29 4.4 Atenção Humanizada ao abortamento ................................................ 30 6.CONCLUSÃO ................................................................................................ 31 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 33 file:///C:/Users/Tatiane/Desktop/PSICOLOGIA%20PERINATAL/ATENÇÃO%20INTERDISCIPLINAR%20NA%20HUMANIZAÇÃO%20DO%20PAROT%20E%20NASCIMENTO/Apostila%20ATENÇÃO%20INTERDISCIPLINAR%20NA%20HUMANIZAÇÃO%20DO%20PARTO%20E%20NASCIMENTO%20.docx%23_Toc60669566 file:///C:/Users/Tatiane/Desktop/PSICOLOGIA%20PERINATAL/ATENÇÃO%20INTERDISCIPLINAR%20NA%20HUMANIZAÇÃO%20DO%20PAROT%20E%20NASCIMENTO/Apostila%20ATENÇÃO%20INTERDISCIPLINAR%20NA%20HUMANIZAÇÃO%20DO%20PARTO%20E%20NASCIMENTO%20.docx%23_Toc60669566 4 INTRODUÇÃO As transformações sociais e tecnológicas que aconteceram nas últimas décadas determinaram importantes modificações no modelo de atenção ao parto e ao nascimento no mundo. Inicialmente, é preciso considerar o contexto histó- rico e social da atenção obstétrica no País, para reflexão crítica sobre a neces- sidade de destacarmos as diretrizes do acolhimento e da vinculação como pro- posta de cuidado e promoção da saúde da gestante e do recém nascido. A his- tória da obstetrícia brasileira testemunha o drástico deslocamento do cenário do parto, da casa, cercado pela forte participação da família e da comunidade, para o ambiente hospitalar, onde ocorrem 98% dos partos atualmente (IBGE, 2006). Pode-se dizer que houve desconstrução da atenção voltada para o cuidado cen- trado na mulher, na família e na sua rede social, a começar pelo local onde o cuidado de saúde se organizava, a casa, com a participação de parteiras, fami- liares e posteriormente o médico. O foco da atenção era a mulher no seu ambi- ente habitual da vida e de suas relações afetivas e familiares. A institucionaliza- ção do parto culminou com a (des) organização da atenção ao parto, que hoje envolve necessariamente o deslocamento da gestante em busca de acesso ao cuidado no parto, percorrendo uma rede de saúde complexa e na maioria das vezes desarticulada. No cenário hospitalar, predomina a organização da atenção eminentemente sob o ponto de vista de atender às necessidades da instituição e dos profissionais, tendo em vista a concentração de pessoas, transformadas aqui em pacientes, apesar da consideração de que gestação e parto transcorrem fisiologicamente em 90% dos casos, sem necessidade de intervenções. Esse novo ambiente do nascer na vida moderna certamente transformou e interferiu nas relações interpessoais mulher-bebê-família e nas relações de cuidado em saúde, deslocando o protagonismo para a equipe de saúde no lugar da mulher e da família. Busca-se o equilíbrio em termos dos riscos e benefícios da atenção 5 hospitalar, que carrega traço inerente de intervencionismo muitas vezes exacer- bado e não justificado sobre um acontecimento fisiológico como o parto e o nas- cimento em uma gravidez de risco habitual. 1. PSICOLOGIA E SAÚDE A Psicologia é uma das mais antigas disciplinas acadêmicas e, ao mesmo tempo, uma das mais recentes. Com a concepção do modelo biopsicos- social em saúde surge a Psicologia da Saúde com o objetivo de ampliar a prática da atuação do psicólogo. Embasada no saber psicológico, a Psicologia da Saúde vai ao encontro de uma ação mais social e abrangente, trabalhando com indiví- duos enfermos na promoção e/ou manutenção da saúde. As representações contemporâneas acerca do fenômeno saúde – doença enquanto fenômeno com- plexo transpõem os princípios do reducionismo, determinismo e universalismo do modelo científico de entendimento e atendimento biomédico do século XIX, que, nos dias atuais, dentro da instituição hospitalar “tem sido o modelo de atu- ação que influencia a conduta de todos os profissionais que a integram, a Orga- nização Mundial de Saúde (OMS), em 2002, norteia as noções de doença e sa- úde, sendo a segunda caracterizada como um estado de bem-estar físico, social e mental, não sendo unicamente a ausência de enfermidade ou doença o que caracteriza a mesma. Segundo a OMS (1946), o conceito atual de saúde é um “estado de completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a au- sência de doença ou enfermidade” (p. 1), ou seja, saúde não é somente a au- sência de doença física, mas sim o bem-estar do indivíduo em todos esses âm- bitos. 6 Consequentemente, a definição do que é doençae, em contraposição, do que é saúde, para o profissional, passa a depender do achado de substratos anatômicos e fisiopatológicos, e, por conseguinte, a percepção subjetiva do do- ente construída a partir de sua experiência da doença é negada. O modelo de assistência obstétrica e neonatal atualmente legitimizado na maioria dos países ocidentais e consequentemente no Brasil, o nascimento é visto como um pro- blema médico, considerando que todas as gestações são potencialmente pato- lógicas, até prova em contrário. O corpo da mulher é encarado como uma má- quina complexa que só pode ser entendida por meio do método científico que separa as partes do todo. A mulher também é tida como incapaz de compreender as intricadas nuances médicas e científicas envolvidas nas decisões. Em relação à tecnologia, tal modelo acredita que, para aumentar a eficiência de uma má- quina imperfeita, ou seja, o corpo da mulher, são necessárias várias outras má- quinas. Em consequência, várias tecnologias sofisticadas são utilizadas sem a devida avaliação da sua real necessidade e eficácia e, principalmente, sobre a sua segurança. O modelo social passa a encarar a saúde como uma solução e não mais como um problema. Essa concepção orienta para a atenção integral à pessoa e, não apenas à doença, visando eliminá-la ou evitá-la, mas também para tirar pro- veito dela. A concepção do nascimento como um evento biopsicossocial é básica para o modelo social. Nesse sentido, o nascimento como evento biológico – ana- tômico, psicológico e bioquímico – está integrado a componentes mentais e es- pirituais, ou seja, é por natureza feminino, intuitivo, sexual e espiritual. 7 Como evento social, tem profundas implicações para a sociedade como um todo, devido à sua visão da reprodução, da posição da mulher, das relações familiares, da socialização e da construção da personalidade. Nesse contexto, crenças religiosas exercem fundamental influência no modo como as pessoas veem esse processo. Quanto ao uso de tecnologias duras, o modelo social busca o seu controle, ou seja, o uso adequado. Estimula práticas simples, bara- tas, que possam ser utilizadas em nível ambulatorial ou em casa, e que sejam preferencialmente não invasivas, social e psicologicamente justas para a mulher e sua família. Didaticamente, os modelos assistenciais podem ser classificados em três paradigmas: o modelo Tecnomédico ou Biomédico, o modelo Humanista e o modelo Holístico. Esta classificação baseia-se na identificação das 12 carac- terísticas básicas, do princípio básico subjacente e do tipo de pensamento de cada modelo. 1.1 Modelo Tecnomédico ou Biomédico É o preponderante atualmente. Baseia-se na visão cartesiana, enfati- zando a separação entre mente e corpo, estabelecendo a máquina como a mais adequada metáfora para o corpo humano e privilegiando a percepção do paci- ente como objeto. Nessa acepção a mulher é dotada de máquina física defectiva em essência. Como consequência, a paciente aliena-se do processo de cura, as intervenções externas tecnológicas ampliam-se em intensidade e profundidade e ela termina por ser segmentada, particionada e desmembrada, como peças avulsas de maquinaria sofisticada, porém passível de compreensão analítica. Características básicas: 1. Separação corpo-mente. 2. O corpo como máquina. 8 3. O paciente como objeto. 4. Alienação do médico em relação ao paciente. 5. Diagnóstico e tratamento de fora para dentro (curando a doença, re- parando uma disfunção). 6. Organização hierárquica e padronização de cuidados. 7. Autoridade e responsabilidade inerente ao médico e não ao paciente. 8. Supervalorização da ciência e tecnologia dura. 9. Intervenções agressivas com ênfase em resultados de curto prazo. 10. A morte como derrota. 11. Um sistema dirigido pelo lucro. 12. Intolerância a outras modalidades. Princípio básico subjacente: separação. Tipo de pensamento: unimodal, lado esquerdo do cérebro e linear. 9 1.2 Modelo Humanista O modelo Humanista entende o corpo humano como organismo (do grego organismós, “conjunto”), extrapolando a compreensão simplista do corpo como máquina complexa. Por ser conjunto, é entendido como a interação de aspectos somáticos com as manifestações anímicas, derivadas da linguagem e da razão. Mais que banal soma de órgãos e tecidos, o corpo humano animado é caracterizado por expressões de ordem simbólica que se manifestam na relação com seus iguais, por meio da troca infinita de conhecimento e histórias contadas, no que se convencionou chamar de “cultura”. Humanistas do nascimento com- preendem o parto como fenômeno integrativo que engloba aspectos emocionais, psicológicos, fisiológicos, sociais e espirituais, extrapolando a visão limitante do biologicismo. O resultado expressa-se na ênfase oferecida aos aspectos relaci- onais, no resgate do afeto como ferramenta de trabalho e na valorização da co- nexão com as pacientes como fundamentais para a obtenção de resultados ade- quados para mãe e para o bebê. Por outro lado, entendem a tecnologia como ferramenta essencial para resgate de casos patológicos que se afastam perigo- samente da rota da fisiologia. Segundo Jones (2012, p. 32): A Humanização do Nascimento vem trazer a síntese entre as conquis- tas recentes da ciência, que nos oferecem segurança, com as forças evolutivas e adaptativas dos milênios que nos antecederam. Esta re- leitura do nascimento humano se faz necessária para acomodar as ne- cessidades afetivas, psicológicas e espirituais das mulheres e seus fi- lhos com as conquistas que o conhecimento nos trouxe através da aquisição crescente de tecnologia Características básicas: 1. Conexão corpo-mente. 2. O corpo como organismo. 3. O paciente como sujeito relacional. 4. Conexão e carinho entre médico e paciente. 5. Diagnóstico e cura de fora para dentro e de dentro para fora. 6. Balanço entre os desejos da instituição e do indivíduo. 10 7. Informação, tomada de decisões e responsabilidade compartilhadas entre o médico e o paciente. 8. Ciência e tecnologia contrabalançada com o humanismo. 9. Foco na prevenção da doença. 10. A morte como resultado aceitável. 11. Cuidados dirigidos pela compaixão. 12. Mente aberta para outras modalidades. Princípios básicos subjacentes: balanço e conexão. Tipo de pensamento: bimodal. 1.3 Modelo Holístico Se baseia na compreensão do corpo humano como sendo formado por um campo energético em constante interação com outros campos de energia. Mais que funções orgânicas, existem relações de “energias”, que perpassam na interação entre sujeitos. Para “holistas”, a origem das enfermidades está na de- sestabilização do sutil balanço que comanda essas energias que, ao se desar- monizarem, produzem doenças, buscando resgatar o equilíbrio perdido. Dessa maneira, as intervenções terapêuticas se dariam mais no nível “energético” e emocional que no veículo físico e denso, diminuindo, assim, os efeitos indesejá- veis da intervenção mecânica ou de drogas sobre o organismo. 11 Características básicas: 1. Unicidade de corpo-mente e espírito. 2. O corpo é um sistema de energia interligado com outros sistemas de energia. 3. Cura da pessoa em sua integralidade em um contexto de vida como um todo. 4. Unidade essencial entre médico e cliente. 5. Diagnóstico e cura de dentro para fora. 6. Estrutura organizacional em rede que facilita a individualização da assistência. 7. Autoridade e responsabilidade inerente a cada indivíduo. 8. Ciência e tecnologia colocadas a serviço do indivíduo. 9. Focalização, a longo prazo, na criação e manutenção da saúde e do bem-estar. 10. A morte é um processo. 11. A cura é o foco. 12. Abarca múltiplasmodalidades de cura. Princípios básicos subjacentes: conexão e integração. Tipo de pensamento: fluido, multimodal e lado direito do cérebro. 12 As fronteiras existentes entre os três modelos não são rígidas e muitos médicos e outros profissionais de saúde transitam de um lado para outro. Alguns tecnocráticos estão incorporando elementos do humanismo e começando a in- corporar elementos holísticos por meio da prática. A medicina holística certa- mente também engloba muitas dimensões da prática humanista e tecnocrática. 2. PSICOLOGIA HOSPITALAR A Psicologia Hospitalar é uma área de produção científica e de prática profissional da Psicologia e, as contribuições que traz aos hospitais, vão além do crescimento e atuação do psicólogo em si, pois proporcionam um novo pata- mar de humanização em saúde. O psicólogo hospitalar se utiliza dos conheci- mentos e técnicas psicológicas, além do olhar diferenciado, com o objetivo de fornecer uma melhor assistência ao paciente internado de forma holística, fo- cando a busca pelo restabelecimento do estado de saúde e minimização dos sintomas desse sujeito. . Além de utilizar os já existentes conhecimentos psicológicos, a Psico- logia Hospitalar diz também do desenvolvimento de teorias e técnicas específi- cas à atuação em hospitais, visando o auxílio ao paciente hospitalizado na ela- boração do seu processo doença-internação-tratamento. Dessa forma, o psicólogo hospitalar nesse contexto e com esses objeti- vos, se encontra inserido em uma equipe multiprofissional de saúde. A equipe de saúde é composta por profissionais de diversas áreas científicas, como me- dicina, enfermagem, nutrição, entre outros, que lidam diretamente com o indiví- duo hospitalizado. Tais profissionais de saúde possuem em mãos um papel que vai além do cuidado à queixa e à doença física do paciente. Antes, devido à complexidade dos cenários e à nova concepção de Saúde, há a necessidade de se trabalhar de forma integrada com outros profissionais da equipe, a fim de identificar as diversas demandas que o paciente possa ter e realizar um plane- jamento terapêutico adequado e humanizado. Logo, a atuação do psicólogo hospitalar junto a uma equipe multiprofis- sional visa o cuidado integrado, o que pode ser definido por “Uma atitude de 13 escuta e ser acolhedor de modo integrado por aqueles profissionais que fazem parte da equipe como partes, mas que funcionam de modo complementar”. É de domínio da atuação do psicólogo hospitalar, além da prática direci- onada ao paciente internado, realizar práticas de cuidado psi com todos aqueles que têm influência e são influenciados por esse paciente. Ou seja, todos os que estão envolvidos no processo da internação, adoecimento e cuidados, a saber: a família do paciente e os profissionais de saúde que dele cuidam. Formando-se assim, a conhecida tríade de atuação da psicologia hospitalar, paciente-família- equipe. 14 O cuidado oferecido pelo psicólogo hospitalar aos profissionais da equipe multiprofissional de saúde pode ser, pois, aqui apresentado como uma atitude de escuta e acolhimento das demandas destes as quais podem emergir de diferentes situações e contextos, como cita Mosimann e Lustosa (2011): “A Psicologia Hospitalar é o esclarecimento dos sentimentos do profissional de sa- úde que se envolve com a dor do paciente e que, igualmente, sofre em níveis organísmicos a dor desse envolvimento” (p. 219). Porém, é necessário explorar com mais profundidade o tema, com o intuito de equilibrar a prática de cuidado com os aspectos éticos da relação entre psicólogo e profissional da mesma equipe de saúde. Deste modo, dentre todos os papéis do psicólogo hospitalar, um dos mais sutis, é o suporte oferecido ao profissional de saúde. A atenção primária na gestação abrange a prevenção de doenças, a pro- moção da saúde e o tratamento dos problemas ocorridos durante o período ges- tacional, até o pós-parto. Tanto na mulher quanto no bebê prevenido agravos comuns durante a gravidez, na qual a gestante sinta-se segura, pois é neste atendimento que a mulher pode prevenir e tratar as intercorrências que podem agravar durante o ciclo gravídico puerperal. 2.1 Pré-natal psicológico (PNP) No período da gestação, observam-se várias alterações no comporta- mento feminino e na vida do casal, as quais envolvem aspectos sociais, familia- res, conjugais, profissionais e, principalmente, pessoais. Nessa fase, é comum que o humor tenha uma característica instável podendo resultar no surgimento de sentimentos conflitantes tanto em relação ao bebê quanto à vida da gestante. É de grande importância a realização do pré-natal, visando a prevenção dos problemas gestacionais e o controle de agravantes psicológicos. Durante esse período ocorre ainda o preparo físico e psicológico para o parto e a mater- nidade, proporcionando um ambiente adequado a uma vivência positiva pela gestante. Nesse contexto, o psicólogo com formação específica é o mais indi- cado para atuar em programas de psicoprofilaxia, na medida em que aborda questões relativas a alterações emocionais capazes de atenuar as angustias 15 próprias deste período, além de considerar aspectos que não apenas os biológi- cos. 2.2 Gestação de alto risco Conforme o Ministério da Saúde, a gestação é considerada um fenô- meno fisiológico, devendo ser vista tanto para as gestantes quanto para a equipe médica como parte de uma experiência de vida saudável que envolve mudanças físicas, sociais e emocionais. Segundo o Manual Técnico de Gestação de Alto Risco, apesar da maioria das gestações evoluir sem nenhuma intercorrência, há gestantes que, por serem portadoras de alguma doença, apresentam maior pro- babilidade de evolução desfavorável, as chamadas “gestantes de alto risco”. A gestação é considerada de alto risco quando há a existência de fatores que impliquem riscos tanto para a mãe quanto para o feto, a saber: trabalho de parto prematuro, síndromes hipertensivas da gestação, diabetes gestacional, amniorrexe prematura, má-formação fetal, óbito fetal, entre outras complicações. 16 2.3 Transtornos psíquicos no puerpério O puerpério é um período marcado pela saída da placenta no momento do parto, prolongando-se até a retomada do organismo materno às condições antes do parto, o que envolve processos anatômicos, fisiológicos e bioquímicos. De acordo com o Ministério da Saúde, esse período pode ser compreendido em três fases: o puerpério imediato que inicia no primeiro e vai até o décimo dia após o parto; em seguida, o puerpério tardio, que abrange desde o décimo até o qua- dragésimo quinto dia, e, por último, o puerpério remoto, aquele que vai além do quadragésimo quinto dia, ou seja, termina quando a mulher retorna a sua função reprodutiva. O puerpério é marcado por um período rico e intenso de vivências emocionais para a puérpera, de grande risco psíquico na vida de uma mulher, nas quais transformações sofridas tanto no aspecto biológico quanto relacionado à adaptação das exigências características do período pós-parto acabam tor- nando a mulher mais vulnerável a desencadear um transtorno mental. Os transtornos mentais no pós-parto incluem: transtornos de ansiedade – devido à existência de sentimentos ambivalentes intensos na maternidade; transtorno afetivo bipolar – doença crônica e recorrente que apresenta caracte- rísticas do episódio depressivo maior; transtornos psicóticos – incidindo em cerca de 1 a 2% das puérperas, sendo caracterizado por intensa labilidade do humor, agitação psicomotora e ideação paranóide de base alucinatória e os transtornos depressivos. 2.4 Depressão pós-parto O nascimento de uma criança representa o rompimento do vínculo rela- cional entre a mãe e o bebê intraútero. Este processo de separação pode de- sencadearvivências depressivas e psicóticas pela mãe, reativadas por conflitos e lutos mal elaborados durante a infância, entre outros motivos. Segundo o DSM-IV, a DPP é um episódio de depressão maior, que ocorre dentro das quatro primeiras semanas após o parto, durante as quais há a presença de um humor deprimido ou perda de interesse ou prazer por quase todas as atividades (anedonia). O indivíduo também deve experimentar pelo me- nos quatro sintomas adicionais, extraídos de uma lista que inclui alterações no 17 apetite ou peso, do sono e da atividade psicomotora, diminuição da energia, sen- timentos de desvalia ou culpa. A puérpera pode apresentar um profundo retraimento e isolamento so- cial, principalmente se ocorrer uma quebra muito grande entre aquilo que a ges- tante imaginava ser, tanto em relação ao bebê idealizado quanto a sua própria figura materna. Ainda podem surgir sentimentos ambivalentes relacionados às dúvidas e medos inerentes a esse momento, devido ao não suprimento das ex- pectativas do mito da mãe perfeita. A DPP tem importantes consequências sociais e familiares, sobretudo para a tríade mãe-pai-bebê, a saber: problemas conjugais, atraso no desenvol- vimento do bebê e grande sofrimento psíquico para a mãe, inclusive com risco aumentado para o suicídio, entre outros. A falta de informação pode gerar ex- pectativas e crenças sobre a sua nova condição, desencadeando sintomas de ansiedade e depressão sendo que o impacto na vida dos envolvidos, requer um trabalho não só remediativo, mas também preventivo, a fim de evitar este grave transtorno. A chamada Escala de Edimburgo serve para a identificação de sinais de depressão pós-parto, sendo acessível para qualquer profissional de saúde. Na 18 opinião da psicóloga neonatal, essa escala deveria ser utilizada como rotina pe- los médicos, tanto no final da gestação, quanto neste período do puerpério. “E a partir da coleta dos dados dessa escala, juntamente com a escuta diferenciada e a observação técnica, que o médico deve fazer esse encaminhamento asser- tivo para um psicólogo e um psiquiatra”. Trata-se de um questionário de apenas dez itens. Ele foi desenvolvido para identificar as mulheres que apresentaram depressão pós-parto. Os itens da escala correspondem a vários sintomas de depressão clínica, tais como: Sentimentos de culpa; Distúrbios do sono; Baixa energia; Anedonia (perda da capacidade de sentir prazer, próprio dos es- tados gravemente depressivos); Ideação suicida Ciente dos fatores que envolvem a DPP e observada a necessidade de adaptação que uma puérpera precisa enfrentar, nada mais válido do que a utili- zação de um instrumento que tente prevenir este distúrbio, como o PNP. A DPP pode dificultar o estabelecimento do vínculo afetivo seguro entre mãe e bebê, podendo interferir nas futuras relações interpessoais estabelecidas pela criança, quando não adequadamente diagnosticada e tratada. Desse modo, conside- rando que as consultas de pré-natal auxiliam a equipe multidisciplinar a identifi- car os fatores de risco e de proteção para a DPP, proporcionando às gestantes melhores condições de enfrentamento, esse tema assume grande importância clínica. 3. HUMANIZAÇÃO O termo humanização do parto refere-se a uma multiplicidade de inter- pretações com abordagens que se baseiam em evidências científicas, em direi- tos, entre outras. Humanização pressupõe considerar a essência do ser, o res- peito à subjetividade e a necessidade de construir um espaço nas instituições de saúde que visem o humano das pessoas envolvidas, sobretudo, àquele que se 19 encontra numa condição menos favorecida. Humanizar torna-se possível se cada um fizer sua parte, propiciando um acolhimento desse sujeito, não o vendo de forma fragmentada, mas um ser por inteiro; a presença solidária do profissio- nal, que apesar de todo um conhecimento técnico-científico e toda tecnologia a sua disposição, não pode descartar a sua postura humana; sensibilidade, vín- culo, confiança e diálogo. Para Fortes (2004), humanizar é compreender cada pessoa singular- mente, como indivíduos que têm necessidades particulares, e dessa forma pro- piciar meios para que se torne viável o exercício da sua autonomia. Neste sen- tido, a complexidade da questão, posta pelo termo humanização, desacomoda a discussão puramente teórica e nos convoca a refletir sobre as práticas que valorizam a singularidade das pessoas no campo da saúde. Neste sentido, a construção da humanização passa para além da construção do conceito, mas pela revisão da concepção do homem necessário para a realização de uma prá- tica humanizada. 20 São recriadas pelos diversos atores sociais, que as utilizam como instru- mento para a mudança, que vem ocorrendo muito lentamente e com enorme resistência. Apesar de o termo humanização vir se incorporando nas políticas de saúde, inclusive com a criação da Política Nacional de Humanização, seus sen- tidos, percepções e significados, dependem das diferentes posições ou papéis que ocupam aqueles que a ele se referem, sejam dirigentes, tomadores de de- cisão, profissionais de saúde, mo- vimentos organizados da socie- dade ou usuários. A Política Naci- onal de Humanização (PNH) foi lançada em 2003 para corroborar os princípios estabelecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que preveem modelos respeitosos de atenção e gestão, incentivando trocas solidárias no âmbito do sistema de saúde. Por humanização, entende-se a valorização dos diferentes sujeitos implicados no processo de produção de saúde: usuários, trabalhadores e gestores. Trata-se de dar voz a todos os atores desse processo, de maneira que o diálogo resultante desta interação faça sen- tido, tanto para a promoção da saúde, quanto para a construção dos mesmos como sujeitos e protagonistas. A PNH estabelece princípios norteadores na condução da assistência à saúde, quais sejam: valorização da dimensão subjetiva e social do usuário e dos profissionais em saúde, em qualquer modelo de assistência e gestão do Sistema Único de Saúde (SUS); fortalecimento do trabalho em equipe; construção de au- tonomia, valorização do protagonismo e corresponsabilidade daqueles inseridos na rede do SUS; gestão e atenção corresponsável; investimento em um controle social que participe em todas as instâncias do SUS; a construção de redes de cooperação e a participação coletiva no processo de gestão, operando com o princípio da transversalidade; compromisso com a democratização das relações de trabalho e valorização dos profissionais de saúde, estimulando processos de educação permanente. 21 Várias ações vêm sendo realizadas a partir da implantação da PNH e compartilhada nos mais diversos cenários. O Ministério da Saúde, afim de com- pilar referências sobre a implantação destes processos, lançou os cadernos Hu- manizaSUS. A política Nacional de Humanização (2003), o Programa de Humaniza- ção no Pré-natal e Nascimento (2002) e a Rede Cegonha (2011) e a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (2004) orientam quanto à as- sistência ofertada às parturientes em trabalho de parto, como também os proce- dimentos a serem adotados durante este processo. Entretanto, diante da reali- dade de muitos hospitais e maternidades no Brasil, percebe-se que essas orien- tações e diretrizes não tem sido realizadas na prática, trazendo prejuízos, algu- mas vezes irreversíveis, tanto a mulher quanto ao bebê, abarcando desde o des- caso no acolhimento, violência obstétrica, deficiência na assistência ofertada, incentivo a passividade da mulher durante o trabalho de parto e parto, procedi- mentos invasivos desnecessários como o descumprimento de leis que assegu- ram os direitos que as mulheres têm durante este processo, dentre outros. 3.1 Acolhimento O termo “acolhimento”, embora tenha sidoempregado apenas no ma- nual mais recente, já vinha sendo discutido em manuais anteriores, especial- mente quando se abordava o tema de elementos que devem pautar a postura dos profissionais de saúde e as relações que eles estabelecem com os usuários dos serviços. Ao conjunto de tais aspectos deu-se o nome “acolhimento”, que é considerado “aspecto essencial da política de humanização”. Como definido no manual, o acolhimento é uma postura ética e solidária, que envolve: apresentar-se e chamar as gestantes pelo nome; incentivar a pre- sença de acompanhante; assegurar os direitos à privacidade e à autonomia; compartilhar as decisões acerca das condutas a serem efetuadas. Acolher en- volve, também, uma escuta aberta, livre de julgamentos e preconceitos, que en- coraje a mulher e seu parceiro a falarem a respeito de sua intimidade e a expres- sarem suas preocupações e angústias. Para tanto, é necessário que o profissi- onal se aproxime da experiência vivida pela gestante, de sua forma de conceber 22 e se relacionar com o mundo, de maneira a compreender um universo que, tal- vez, seja muito diferente do seu; e que valorize o que a gestante e seu compa- nheiro compartilham. “O diálogo franco, a sensibilidade e a capacidade de per- cepção de quem acompanha o pré-natal são condições básicas para que o saber em saúde seja colocado à disposição da mulher e da sua família – atores princi- pais da gestação e do parto” (BRASIL, 2006b, p. 13). Acolher implica, ainda, tentar compreender os significados da gravidez para a mulher e sua família. Talvez, por esse motivo, esse manual tenha um capítulo dedicado aos aspectos emocionais da gravidez e do puerpério, no qual as definições acerca de acolhimento parecem ser complementadas. Aponta-se aí “ser necessário que o profissional de saúde aborde a mulher na sua inteireza, considerando a sua história de vida, os seus sentimentos e o ambiente em que vive, estabelecendo uma relação entre sujeito e sujeito e valorizando a unicidade e individualidade de cada caso e de cada pessoa”. Assim, pode-se afirmar que o acolhimento também inclui a valorização dos aspectos subjetivos envolvidos na assistência. 4. HUMANIZAÇÃO EM PSICOLOGIA PERINATAL Para iniciarmos esse capítulo, podemos inferir que é um princípio funda- mental de acordo com o código de ética do psicólogo o embasamento no res- peito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiando nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. 23 Por gerações e em todas as culturas humanas, o surgimento de um novo ser sempre despertou corações e mentes. Principalmente para a mulher, a gra- videz e o nascimento em particular, são eventos únicos repletos de fortes senti- mentos e emoções. A experiência vivida por ela nesses momentos ficará indele- velmente marcada em sua memória e, por isso, todos os envolvidos na sua as- sistência, desde o pré-natal até o parto, devem lhe proporcionar uma atmosfera de carinho e humanismo. O local onde a mulher é cuidada não pode ser um ambiente hostil, com rotinas rígidas e imutáveis, onde ela não possa expressar livremente seus sentimentos e suas necessidades. Deve receber cuidados indi- vidualizados e flexíveis de acordo com suas demandas. É necessário que se sinta segura e protegida por todos aqueles que a cercam. Tanto na assistência pré-natal como na assistência ao nascimento, a presença do seu companheiro ou outro membro da família deve ser encorajada. A separação mãe-filho deve ser evitada desde o nascimento até a alta, e quando for inevitável, diante da necessidade de internação do recém-nascido em Unidade Neonatal, seus efei- tos devem ser minimizados a partir de uma boa comunicação entre a equipe e a mãe, e da criação de possibilidades para que o encontro seja o mais breve pos- sível. Tanto os fatores científicos que trazem segurança, como os fatores huma- nos que trazem alegria e felicidade devem ser considerados para assegurar uma experiência bem-sucedida e gratificante para todos os envolvidos. Grandes são os desafios em praticar o que pregam as políticas de hu- manização na assistência a mulher no ciclo gravídico-puerperal haja vista a prá- tica biologicista e medicamentosa desnecessária dominante, mas sim, é possível construir uma assistência que integre a mulher biopsicossocialmente, de modo humanizado e especializado, neste período tão ímpar que é a gestação e a par- turição na vida da mesma. 24 Neste modelo, as intervenções psicológicas são realizadas desde o aco- lhimento da paciente na recepção, onde é feita a escuta psicológica breve e anamnese junto à enfermagem, com ênfase na queixa e motivo da ida a mater- nidade. Após o acolhimento, foi realizada uma triagem pelo obstetra plantonista, momento em que se avalia o quadro da paciente e decide se permanece assis- tida ou se é encaminhada para um serviço de alta complexidade. O acompanhamento psicológico, bem como uma escuta especial a todo esse contexto, pode auxiliar a mulher e sua família neste novo mundo de mu- danças e de adaptações. A configuração de medos, angústias e fantasias da mulher nos momentos que antecedem o processo de parto, como medo de per- der o bebê, medo de não sobreviver, receio de ter uma infecção, etc., que devem ser trabalhados da melhor maneira possível, visando um parto com menos dor e sofrimento pelo psicólogo. O papel do psicólogo na maternidade é propiciar um espaço de escuta para que a família possa nomear e atribuir significados àquela situação. A importância deste lugar de escuta deve ultrapassar as fronteiras do contexto hospitalar, os serviços psicológicos e sociais devem facilitar o caminho para que as mulheres possam pedir ajuda para lidar com os fragmentos, “bura- cos” da história de cada gestação e maternagem (IACONELLI, 2012). Segundo Campos (1995) “O ouvir e o sentir, assim como entender em profundidade o cliente é a tarefa primordial de todo profissional de saúde” (p. 61), ou seja, é um trabalho empático e que exige dos profissionais de saúde um volume de competências, tais como comunicação, resolução de problemas e tra- balho em equipe. Assim, para que possa propiciar um cuidado de qualidade ao cliente, é preciso que ele, enquanto pessoa que está exposta diariamente a so- frimentos e angústias alheias, esteja atento e cuide da sua saúde, meta que se torna um desafio, como descreve Amaral, Moraes e Ostermann (2010): “Manter o equilíbrio para poder trabalhar diante de condições tão desafiantes demanda algum esforço e pode gerar um significativo desgaste nesse profissional” (p. 273). 25 4.1 Gravidez A vida de uma mulher muda de várias maneiras quando ela engravida. Neste período gestacional ocorrem grandes modificações que segundo Milbradt (2008), “são modificações físicas, endócrinas, psicológicas e sociais, bem como o início da comunicação materno fetal” (p.113). Nesta fase ocorrem os mais re- pletos tipos de sentimentos que estão intimamente relacionados à história e às experiências vividas pela gestante ao longo da sua vida. Algumas mulheres ex- perimentam sentimentos de desamparo, ansiedade e agradável expectativa, grande vulnerabilidade, sentimentos ambivalentes, de modo que ara Guerchfeld “estar grávida representa alcançar o estado máximo da feminilidade, é a com- provação da fertilidade da mulher, e é uma etapa normal que toda mulher espera alcançar”, em contrapartida Guerchfeld (1996) apud Zugaib e Sancovski (1991, p. 92), afirma que “a maternidade não é um desejo de todas as mulheres, e mesmo quando o é, pode não ocorrer livre de conflitos”. Sendo assim, muitas mulheres sentem-se inadequadas por não estar feliz ou aceitando a gravidez. Deste modo, “a gravidez e a maternidade são fenômenos biológicos, que também abrangem dimensões culturais,históricas, sociais e afetivas” pois, 26 apesar de só as mulheres engravidarem, os significados de uma gravidez são construídos diante de experiências e contextos social, cultural e econômico. Neste sentido, Badinter (1985) fazem uma crítica a ideia de que a mulher é uni- versalmente feita para ser mãe e ainda mais, uma boa mãe e que, portanto, desviar-se disso caracteriza uma natureza anormal ou patológica. Fato é as eta- pas da gestação, parto e o pós-parto são períodos em que a mulher e seus fa- miliares sofrerão intensas transformações, e que cada gravidez em cada mulher é única, e marca uma transição onde mudanças corporais expressam, molda e reflete modificações psíquicas. A gravidez não planejada decorre de alguns fatores, seriam “a falta de informações e dificuldade de acesso aos métodos contraceptivos, do uso inade- quado dos mesmos, descontinuidade na oferta do contraceptivo pelo serviço, oferta limitada na variedade dos métodos e efeitos colaterais adversos que le- vam ao abandono e ao limite de eficácia. Pode estar associado ainda às condi- ções socioeconômicas, baixa escolaridade e baixo poder aquisitivo, podendo ge- rar um elevado número de gravidezes, corroborado com os 42% das mulheres que não planejaram a gestação e que tiveram mais de uma gravidez. As seguintes falas de algumas gestantes apontam esses dados de não planejamento da gravidez: “tive que mudar os planos futuros e me adaptar à nova realidade, algo que no começo foi difícil de aceitar”. “Não era para mim estar grávida agora não sei o que eu vou fazer, pois estou separada”. “Não que- ria mais ter filhos, já não tenho idade para isso”. “No começo foi difícil, mas agora eu já o amo, é um pedacinho de mim” (sic). Percebe-se nessas afirmações, a existência de conflitos e ansiedades, num mix de sentimentos opostos entre si (Maldonado, 2002), num turbilhão de intensas mudanças no corpo e na psique da mulher, além das expectativas, planos e projetos desenvolvidos pela família, além de uma “psicodinâmica de situação de crise evolutiva”. A relação mãe-bebê e a formação do vínculo começam antes da gesta- ção, cujo ápice será alcançado após o parto, é importante ter profissionais pre- parados para atender a demanda dessas mulheres, ajudando-as a compreender esse momento em que elas estão passando, pois, segundo Assis, Borges, 27 Souza e Mendes (2013) “o psicólogo pode atuar colaborando para a compreen- são dos processos intra e interpessoais, utilizando enfoque preventivo e/ou cu- rativo...” (p.84). As gestantes tratavam da futura relação mãe-bebê, se referindo a atos como acariciar, beijar, tocar e olhar e também a intenção de amamentar, sendo este último um “marco importante para a formação do vínculo mãe-bebê” mo- mento decisivo na relação afetiva mãe e seu e uma possibilidade de comunica- ção psicossocial entre a mãe e seu filho, posto que para Montagu (1971), “a pele é o órgão sensorial primário do bebê e a experiência tátil é fundamental para seu desenvolvimento” (p.85). Portanto, as expectativas que essas futuras mamães têm relação ao filho, são extremamente relevantes tanto para o desenvolvimento da criança quanto para o estabelecimento do vínculo entre a mãe e o bebê, o que serve de pistas para a intervenção do psicólogo. 4.2 Roteiro de Conversa Do ponto de vista da escuta e da orientação oferecida pela psicologia, alguns aspectos podem ser aprofundados a depender da disponibilidade da mu- lher e das condições do serviço para esse atendimento. Podem estar incluídas no roteiro de conversa questões como: a maternidade e o desejo de ser e não ser mãe, sexualidade, relacionamento com o parceiro. Assim como, na perspec- tiva da prevenção da repetição do abortamento, é importante o espaço para ela- boração subjetiva da experiência, com a verbalização dos sentimentos, a com- preensão dos significados do abortamento no contexto de vida de cada mulher e dos motivos que levaram ao surgimento de uma gravidez não planejada. . Nesse sentido, podem ajudar: discussões coletivas, supervisões clínicas, troca de preocupações, o confrontar de atitudes e convicções implícitas no atendi- mento, reuniões e oficinas de sensibilização e capacitação sobre sexualidade e práticas reprodutivas. 28 4.3 Escuta qualificada Todos os profissionais de saúde devem promover a escuta privilegiada, evitando julgamentos, preconceitos e comentários desrespeitosos, com uma abordagem que respeite a autonomia das mulheres e seu poder de decisão, pro- curando estabelecer uma relação de confiança. É responsabilidade da equipe • Respeitar a fala da mulher, lembrando que nem tudo é dito verbal- mente, auxiliando-a a contatar com os seus sentimentos e elaborar a experiência vivida, buscando a autoconfiança. • Organizar o acesso da mulher, priorizando o atendimento de acordo com necessidades detectadas. • Identificar e avaliar as necessidades e riscos dos agravos à saúde em cada caso, resolvendo-os, conforme a capacidade técnica do serviço, ou enca- minhando para serviços de referência, grupos de mulheres e organizações não governamentais (ONGs) feministas. 29 • Dar encaminhamentos aos problemas apresentados pelas mulheres, oferecendo soluções possíveis e priorizando o seu bem-estar e comodidade. • Garantir a privacidade no atendimento e a confidencialidade das infor- mações. • Realizar os procedimentos técnicos de forma humanizada e infor- mando às mulheres sobre as intervenções necessárias. Informar e orientar: • Estar atento às preocupações das mulheres, aceitando as suas per- cepções e saberes, passando informações que atendam às suas necessidades e perguntas. • Estabelecer uma comunicação efetiva, estando atento à comunicação não verbal (gestos, expressões faciais). Utilizar linguagem simples, aproxima- tiva, inteligível e apropriada ao universo da usuária. • Informar sobre os procedimentos e como serão realizados, sobre as condições clínicas da usuária, os resultados de exames, os cuidados para evitar complicações posteriores e o acompanhamento pós-abortamento( se for o caso). 4.4 Manejo da dor A necessidade de uma mulher em trabalho de parto utilizar algum mé- todo de alívio da dor pode ser influenciada por muitos fatores, incluindo suas expectativas, a complexidade do seu trabalho de parto e a intensidade da sua dor. Para muitas, alguma forma de alívio pode ser necessária. Expectativas fle- xíveis e a preparação para o parto podem influenciar o bem-estar emocional da mulher após o parto. A dor extrema pode resultar em trauma psicológico para algumas, enquanto para outras os efeitos indesejáveis dos métodos farmacoló- gicos de controle podem influenciar negativamente na experiência do nasci- mento. O importante é que as necessidades individuais da mulher sejam reco- nhecidas por meio de um bom processo de apoio e comunicação, devendo-se estar alerta para as mudanças de comportamento durante o trabalho de parto, notadamente para sinais graves de estresse, o que pode indicar a necessidade de utilização de um método efetivo de alívio da dor. Para muitas mulheres, tal 30 alívio pode ser obtido apenas com um suporte físico e emocional adequado. Deve-se transmitir segurança à parturiente, assim como orientá-la adequada- mente sobre a evolução do parto. A presença de um familiar pode contribuir so- bremaneira para a redução da intensidade dolorosa. As massagens corporais, banhos (de chuveiro ou imersão), deambulação ativa, técnicas de respiração e relaxamento, toques confortantes, utilização das bolas de nascimento e outras medidas de suporte físico e emocional também devem ser utilizadas para alívio da dor. Complementamos que o desempoderamento da mulher no nascimento de seus filhos tem repercussões na sociedade como um todo, pois será ela a principal guardiãdos seus valores, e quem vai lhes ensinar as primeiras ideias. O parto é momento pleno de afeto e sexualidade e a intervenção desmedida pode ter efeitos devastadores – físicos e psicológicos para a mãe e seu bebê. 4.4 Atenção Humanizada ao abortamento Conforme já visto anteriormente promover o acolhimento e fornecer as informações deve ser uma prática de todos os profissionais da equipe multipro- fissional e devem estar presentes de forma transversal durante todo o contato com a mulher. Mais do que um dos passos do atendimento, o acolhimento é uma prática educativa que deverá refletir a qualidade da relação profissional de sa- úde/ usuária na perspectiva de construção de um novo modelo de atendimento. Para isso, os profissionais deverão estar devidamente sensibilizados e capacita- dos para incorporar o acolhimento e a orientação como uma prática cotidiana da assistência. Devemos considerar que o papel de cada profissional de saúde na promoção do acolhimento e da orientação está relacionado à sua formação pro- fissional. No tocante à escuta, é fundamental considerar a atenção psicossocial às mulheres em abortamento, integrando assistentes sociais e psicólogos no atendimento, com suas respectivas especificidades na atenção à saúde, quando possível. Deve-se considerar que os enfoques da psicologia e do serviço social podem ser diferenciados no trato das questões emocionais, relacionais e sociais. A enfermagem também tem um papel diferenciado por estar presente na porta de entrada, durante o procedimento obstétrico e na fase de recuperação clínica da mulher na unidade de saúde. 31 A mulher com complicações de abortamento, espontâneo ou por decisão pessoal, tem necessidade de cuidados destinados a protegê-la das consequên- cias físicas e psicológicas do processo que está sofrendo, assim como evitar que volte a ser acometida do mesmo problema no futuro. 6.CONCLUSÃO Com a crescente humanização do parto, os hospitais preocupam-se cada vez mais em transformar os centros obstétricos em ambientes mais aco- lhedores.O nascimento de um filho transforma definitivamente o psiquismo de cada um dos pais. Essas mudanças ocorrem em função das projeções e repre- sentações parentais sobre o bebê e também mudanças nas interações entre esse bebê e seus pais. A gestação, parto e puerpério são fases na vida de uma mulher em que ocorrem importantes mudanças físicas e emocionais, ocasionando vários senti- mentos ambíguos devido a esta intensa transformação. O trabalho da psicologia é auxiliar a mulher a lidar e reconhecer seus sentimentos de forma legítima, au- xiliando na adaptação ao novo momento, às dificuldades e a desconstrução de uma idealização da maternidade. Propiciamos um espaço de escuta e auxílio emocional para que o casal parental possa enfrentar essas intensas transformações da melhor forma possí- vel, buscando favorecer a transição para o novo papel de mãe / pai. O profissio- nal da psicologia contribui para a humanização da assistência ao parto em todos os sentidos, tanto com aqueles que vão se tornar pais, como com a equipe hos- pitalar, contribuindo para uma visão mais profunda do processo dinâmico e emo- cional de cada nascimento. Portanto, entende-se que existe uma importância em acompanharmos o que está sendo produzido concernente ao tema proposto neste material, para 32 que possamos vislumbrar quais contribuições vem sendo acrescentadas, sobre- tudo advindas do trabalho do psicólogo, já que humanizar como vimos não de- pende apenas de um conjunto de conceitos e regras, mas de um sujeito à frente destas. 33 REFERÊNCIAS RESOLUÇÃO CFP Nº 010/05. XIII Plenário do Conselho Federal de Psicologia. Brasília, agosto de 2005 ASSIS. Cleber Lizardo de. SANTOS. Nádia Valéria Moreira. PSICOLOGIA E GRAVIDEZ: O PAPEL DO PSICÓLOGO A PARTIR DE UMA PESQUISA-IN- TERVENÇÃO JUNTO A MULHERES GRÁVIDAS DO INTERIOR DE RONDÔ- NIA, BRASIL (acesso em 04/11/2020) PETRONI. Isabela Nunes Ananias.Noções de Saúde e de Cuidado: O olhar do psicólogo sobre a equipe de saúde. https://pebmed.com.br/desafios-psicologicos-nas-pacientes-gravidas-e- no-pos-parto/ acesso em (04/11/2020) Brasil. Ministério da Saúde. (2006). Área Técnica de Saúde da Mulher. Pré-natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada. Brasília, DF: o autor. Arrais, A. R., Mourão, M. A., & Fragalle, B. (2014). O pré-natal psicoló- gico como programa de prevenção a depressão pós-parto. Saúde e Sociedade, 23(1), 251-264. doi:10.1590/S0104-12902014000100020 https://sinhajunqueira.com.br/atuacao-do-psicologo-no-parto-humani- zado/(acesso em 04/11/2020) Baró. M. I. (1996). O papel do psicológo. Estudos de Psicoogia, 2,7-27. Benevides, R. (2005). A Psicologia e o Sistema Único de Saúde: quais interfaces? Psicologia & Sociedade, 17(2), 21-25. Arrais, A. R. (2005). As configurações subjetivas da depressão pós- parto: para além da padronização patologizante (Tese de doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, Brasília, DF. Benevides, R. & Passos, E. (2003). Complexidade, transdisciplinari- dade e produção de subjetividade. In T. M. G. Fonseca & P. G. Kirst (Orgs.), Cartografias e devires. A construção do presente (pp.81-89). Porto Alegre: UFRGS https://pebmed.com.br/desafios-psicologicos-nas-pacientes-gravidas-e-no-pos-parto/ https://pebmed.com.br/desafios-psicologicos-nas-pacientes-gravidas-e-no-pos-parto/ https://sinhajunqueira.com.br/atuacao-do-psicologo-no-parto-humanizado/(acesso https://sinhajunqueira.com.br/atuacao-do-psicologo-no-parto-humanizado/(acesso 34 Benevides, R. & Passos, E. (2005). Humanização na saúde: um novo modismo? Interface, Comunicação, Saúde, Educação, 9, 389-394
Compartilhar