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Neurofisiologia da Visão Responsável pelo Conteúdo: Prof. Esp. Henrique Barros Barroso Revisão Textual: Prof. Me. Luciano Vieira Francisco Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Movimentos Oculares e Reflexos Oculares • Compreender a neurofisiologia de processos principalmente acomodativos e pupilares, relacionando-os a quadros sintomatológicos ametrópicos; • Aprimorar a semiologia refrativa com base no conhecimento neurofisiológico dos processos acomodativos e pupilares. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Colunas de Dominância Ocular; • Bolhas de Citocromo Oxidase; • Colunas de Orientação; • Seletividade de Sentido; • Módulos Corticais; • Eferências do Córtex Estriado; • Eferências Corticais Extraestriatais; • Inervação da Musculatura Intrínseca e Extrínseca Ocular; • Reflexos Oculares; • Estudo de Caso. UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Colunas de Dominância Ocular Em 1970, um estudo desenvolvido por dois neurocientistas da Escola de Medicina de Harvard demonstrou as relações sinápticas entre a retina e o Núcleo Geniculado Lateral (NGL), e entre o NGL e córtex estriado. Foi injetado um aminoácido radioativo nos olhos de macacos e, através de técnicas radiográficas que permitissem rastrear o fluxo desse aminoácido, pelo movimento anterógrado axoplasmático, foi possível determinar quais áreas, tanto do NGL quanto do córtex estriado, eram estimuladas pelo olho que recebeu o aminoácido radioativo. Figura 1 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 346 O estudo demonstrou a clara relação entre a retina do olho analisado e as cama- das específicas (1, 4 e 6) do NGL contralateral. Além disso, pôde-se identificar qual é o padrão de sinapse entre NGL e a camada IVC, no córtex estriado. Como bem demonstrado na Figura 1, as eferências geniculofugais (“que saem do corpo geniculado”) não se segregam em uma única região na IVC, tampouco se misturam aleatoriamente. Há um padrão sináptico similar às listras de uma zebra, intercalando sinais advindos dos dois olhos na camada IVC. Importante! Os sinais visuais advindos de um dos olhos não se espalham de maneira aleatória pela camada IVC do córtex estriado, mas sim, com um padrão similar às listras de uma zebra. Vimos que os neurônios do córtex estriado se organizam perpendicularmente à sua superfície, de forma que há alinhamento de neurônios das demais camadas com a camada IVC. Pensando dessa forma, sabendo que há padrão sináptico de listras de zebra na camada IVC, faz sentido inferir que os neurônios das demais camadas 8 9 do córtex estriado farão sinapses ou com o Olho Direito (OD), ou com o Olho Es- querdo (OE), dependendo do alinhamento dessas células com o padrão de listras de zebra da camada IVC. Esperamos que um neurônio hipotético, da camada III, fará sinapses exclusiva- mente com o OE, caso este esteja alinhado com uma listra do OE, na camada IVC. Caso esteja alinhado com uma listra do OD, esperamos que faça sinapses exclusiva- mente com o OD. O que acontece, todavia, é que as células estreladas, da camada IVC, projetam os seus axônios para a camada III, mais superficial, onde, pela primeira vez no sistema visual, as informações visuais de ambos os olhos começam a se misturar. Se o neurônio da camada III estiver alinhado a uma região da camada IVC que recebe aferências do OD, fará sinapses predominantemente com esse olho; mas, as células estreladas, advindas da camada IVC, fazem com que esse neurônio, da cama- da III, faça também conexão com o OE. Dizemos, para este caso, que os neurônios são dominados pelo OD. O mesmo exemplo se aplica para regiões que estão alinhadas com aferências do OE, na camada IVC. Os neurônios da camada III fazem sinapses principalmente com o OE, mas também com o OD, por influência das células estreladas. Dizemos, para este segundo exemplo, que são dominados pelo OE. Figura 2 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 347 No que tange à aferência do OD e OE, por encontrarmos um padrão de listras de zebra na camada IVC, acharemos também um padrão alternado na camada III, quanto à dominância de um dos olhos. Para essa alternância de dominância da camada III 9 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares damos o nome de colunas de dominância ocular, consistindo na primeira interação de sinais entre OD e OE no sistema visual. Dizemos, dessa forma, que os neurônios das camadas mais superficiais do córtex estriado, em especial os neurônios da camada III, são neurônios binoculares, já que recebem aferência de ambos os olhos. Pelo fato de o mapa retinotópico ser preservado em V1, dizemos ainda que es- ses neurônios apresentam um campo receptivo binocular, de modo que campos receptivos de CG das duas retinas estimularão o mesmo neurônio na camada III do córtex estriado. Caso o mesmo estímulo visual seja percebido por colunas de dominância ocular diferentes, haverá esforço do sistema nervoso central para ajustar a posição dos olhos, através da contração dos músculos extraoculares, até que o mesmo estímulo, interpretado pelos dois olhos, seja processado pelas mesmas colunas de dominância ocular, garantindo, assim, a fusão de imagens. Em Síntese Sigamos com o exemplo da caneta, observada pelo hemicampo direito: • Hemicampo direito: estimula as retinas nasal do OD e temporal do OE; • Células M: • Nasal OD: projeta-se para a camada magnocelular 1 do NGL contralateral (NGL esquerdo); • Temporal OE: projeta-se para a camada magnocelular 2 do NGL ipsilateral (NGL esquerdo). O NGL esquerdo é responsável pelo processamento do hemicampo contralateral. • Eferência geniculofugal: camadas magnocelulares 1 e 2 do NGL projetam-se para a camada IVCα do córtex estriado; • Colunas de dominância ocular: células estreladas da camada IVC projetam os seus axônios para a camada III, fazendo com que os neurônios, lá encontrados, recebam aferência de ambos os olhos, unindo os campos receptivos das duas retinas (nasal do OD e temporal do OE), estimuladas pela caneta. Bolhas de Citocromo Oxidase Citocromo oxidase é uma enzima mitocondrial. Se uma célula apresenta grande quantidade de citocromo oxidase, significa que está extremamente ativa, com alto metabolismo. Sabendo que as camadas II e III de V1 são as que projetam eferências para outras áreas corticais, pesquisar a citocromo oxidase em tais camadas nos permite saber quais grupos de células são responsáveis pela eferência corticofugal. Ao se corar essa enzima, pode-se identificar que há colunas radiais, que se estendem pelas camadas II, III, V e VI de V1. 10 11 À microscopia óptica, é possível observar essas colunas vistas de cima, no forma- to de bolhas – por isso são chamadas de bolhas de citocromo oxidase. Figura 3 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 348 (a) A organização das bolhas de citocromo oxidase no córtex estriado de um macaco. O tecido que apresenta coloração mais escura para a citocromo oxidase tem aparência de pilares radiais nas camadas II, III, V e VI. Uma secção transversal tangencial à superfície mostra os segmentos individuali- zados que dão às bolhas esse nome (na parte inferior da camada III). (b) Uma fotografia de uma secção histológica da camada III, corada para citocromo oxidase e vista de cima. Os pontos escuros são bolhas de citocromo oxidase. Muito embora saiba-se que os neurônios das bolhas disparem potenciais de ação com maior frequência do que os neurônios interbolhas (aqueles que estão entre as bolhas de citocromo oxidase), pouco ainda se sabe sobre as diferenças funcionais entre os quais. Colunas de Orientação Sabemos, como já exaustivamente visto, que os CR da retina e do NGL são cir- culares. Da mesma maneira, os CR da camada IVC de V1 também são circulares. Contudo, os neurônios das demais camadas do córtex estriado não seguem esse padrão, respondendo melhor a uma barra de luz, alongada. Ao estudarmos um único neurônio, dessas demais camadas de V1, percebemos que dispara mais potenciais de ação para uma angulaçãoespecífica dessa barra de luz apresentada, chamada de orientação ótima. 11 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Figura 4 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 349 (a) As respostas de um neurônio com seletividade de orientação são monitora- das à medida que estímulos visuais são apresentados em seu campo receptivo. O estímulo visual é uma barra de luz. (b) As barras de luz de várias orientações (à esquerda) determinam respostas muito diferentes (à direita). A orientação ótima para este neurônio é de 45º no sentido anti-horário a partir da vertical. Conforme a orientação dessa barra luminosa muda, a resposta do neurônio ao estímulo também muda, notando-se a ausência de disparos de potenciais de ação para o ângulo perpendicular ao de maior sensibilidade. Chamamos, dessa forma, de seletividade de orientação o fato de determinados neurônios (fora de IVC), respon- derem melhor a barras com determinadas angulações. O que se faz verdadeiramente notório na organização do córtex estriado é que os neurônios sensíveis a determinados ângulos estão radialmente alinhados por todas as camadas corticais. Camada após camada, desde que alinhados, a orientação ótima de todos os neurônios do córtex estriado é a mesma. Formam-se, dessa maneira, as colunas de orientação. “Assim, acredita-se que os neurônios com seletividade de orientação sejam especializados na análise da forma dos objetos” (BEAR; CONNORS, 2017, grifo nosso). É interessante notar ainda que a distribuição de tais colunas de orientação é organizada de forma tangencial à superfície do córtex estriado. Há evolução progressiva da orientação ótima, conforme afere-se a coluna de orientação pela superfície cortical. Seletividade de Sentido Alguns neurônios do córtex estriado são sensíveis ao sentido percorrido pelos estímulos visuais. Respondem com frequência de disparos de potenciais de ação maior para estímulos exibidos na orientação ótima, movendo-se perpendicularmente 12 13 a essa, em determinado sentido. “Acredita-se que os neurônios com seletividade de sentido sejam especializados na análise dos movimentos de objetos”. (BEAR; CONNORS, 2017, grifo nosso) Figura 5 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 352 Com um estímulo em forma de barra na orientação ótima, o neurônio res- ponde fortemente quando a barra é deslocada para a direita, mas responde fracamente quando ela é deslocada para a esquerda. Módulos Corticais Ao longo de nossos estudos, vimos que um único fotorreceptor possui Campo Receptivo (CR). Vários fotorreceptores podem fazer sinapses com uma única Célula Bipolar (CB), esta que terá um CR tão grande quanto for o número de fotorreceptores que se conectarem a qual. Várias CB podem ainda se conectar com apenas uma Célu- la Ganglionar (CG), de forma que o seu CR será delimitado por esse número de cone- xões. Da mesma maneira, os neurônios do NGL possuem, cada um, o seu próprio CR. Vimos também que, no próprio córtex estriado, alguns neurônios, como aqueles encontrados na camada III, possuem CR binoculares, processando sinais visuais ad- vindos das camadas IVCα e IVCβ. Sob tal perspectiva, é possível determinar o CR de V1 como um todo. A menor área de neurônios que é ativada perante um ínfimo estímulo visual é chamada de módulo cortical. Figura 6 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 356 13 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Na Figura 6, cada módulo cortical contém colunas de dominância ocular, colunas de orientação e bolhas de citocromo oxidase, de modo a analisar completamente uma parte do campo visual. O cubo idealizado mostrado aqui difere do arranjo verdadeiro, que não é tão regular ou ordenado. Medindo aproximadamente 2 × 2 mm, o módulo cortical contempla uma série de neurônios, distribuídos pelas seis camadas do córtex estriado, de forma a contemplar dezesseis bolhas de citocromo oxidase, e dois conjuntos de seletividade de orientação de 180°, podendo, assim, interpretar qualquer orientação de qualquer estímulo na cena visual. Por conter vários tipos de neurônios, essa unidade funcional de V1 apresenta características específicas desses neurônios: análise de cor, forma, orientação e sen- tido de movimento. Calcula-se que o córtex estriado seja composto por um milhar de módulos corticais (BEAR; CONNORS, 2017). Eferências do Córtex Estriado Mencionamos que existem, no córtex estriado, dois tipos principais de neurônios, as i) células piramidais, e as ii) células estreladas. Vimos que as células estreladas participam ativamente da mesclagem do sinal advindo dos dois olhos, na camada III. As células piramidais, como já mencionado, projetam os seus axônios para fora do córtex estriado. Células piramidais em dife- rentes camadas projetam-se para diferentes estruturas do encéfalo. • Células piramidais das camadas II, III e IVB: sinapses com outras áreas corticais; • Células piramidais da camada V: sinapses com o colículo superior e com a ponte; • Células piramidais da camada VI: sinapses com o NGL, participando do pro- cesso de atenção visual e supressão seletiva do NGL. Eferências Corticais Extraestriatais O termo eferências corticais extraestriatais pode traduzir-se em toda a informa- ção que parte de V1. O córtex estriado também é chamado de V1 por ser a primeira área cortical a receber aferências visuais. Não cabe apenas a esse, contudo, o mérito de todo o processamento cortical do amplo sentido da visão. As eferências de V1, para outras áreas corticais, acontece, predominantemente, por dois fluxos, ou vias: i) dorsal, que se dirige ao lobo parietal, e ii) ventral, que se dirige ao lobo temporal. 14 15 Figura 7 Fonte: Adaptado de BEAR; CONNORS, 2017, p. 357 (a) Fluxos de processamento visual dorsal e ventral. (b) Áreas visuais extraestriatais. (c) O caminho da informação nos fluxos dorsal e ventral. Via Dorsal – Via do “Onde?” A via dorsal converge para V5, conhecida também como MT – Middle Temporal area. A pequena área V5, localizada no lobo parietal, correspondente a apenas 3% do tamanho do córtex estriado, não percebe cores, mas apresenta alta sensibilidade para contrastes em movimento. Ademais, apresenta cerca de 90% de neurônios com seletividade de sentido, organizados retinotopicamente em colunas, de forma similar à organização das colunas de orientação de V1. Muito embora receba sinais de entrada de uma miríade de regiões encefálicas, a que predomina é a eferência corticofugal extraestriatal (RIECANSKÝ, 2004). A percepção de movimento, pela área V5, acontece pela apresentação do estímulo a todas as colunas com seletividade de sentido. Aquelas que forem mais sensíveis ao sentido que o estímulo percorre, dispararão mais potenciais de ação, sinalizando, assim, o sentido que o objeto está tomando. Além de V5, ainda na via dorsal, existe outra área responsável pela interpretação do movimento, a área MST – Middle Superior Temporal area. É possível encontrar, na literatura, casos de pacientes com a visão normal, mas que, após lesão nessa área, perderam a capacidade de perceber objetos em movimento. Por se tratar de uma eferência corticofugal extraestriatal especializada em perceber o movimento de objetos na cena visual, é igualmente conhecida como via do “onde?”. Via Ventral – Via do “Quê?” Enquanto a via dorsal caracteriza-se especialmente pela percepção do movimento dos objetos, a via ventral caracteriza-se pela percepção de formas e cores, sendo a área V4 a responsável. Lesões em V4 levam à acromatopsia, síndrome rara em humanos, provocando a não percepção de cores, quase sempre acompanhada pela dificuldade em perceber formas, muito embora os cones, células P e camadas parvo- celulares do NGL e V1, estejam preservados. 15 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Após o processamento por V4, o fluxo de informações se encaminha para a última área da via ventral, a área IT – Inferior Temporal. Fortemente relacionada a outras áreas corticais, a área IT está intimamente envolvida como reconhecimento de faces. Figura 8 Fonte: Adaptado de RIECANSKÝ, 2004 Em Síntese Concluindo o nosso exemplo da caneta: • Hemicampo direito: estimula as retinas nasal do OD e temporal do OE; • Células M: • Nasal OD: projeta-se para a camada magnocelular 1 do NGL contralateral (NGL esquerdo); • Temporal OE: projeta-se para a camada magnocelular 2 do NGL ipsilateral (NGL esquerdo). O NGL esquerdo é responsável pelo processamento do hemicampo contralateral; • Eferência geniculofugal: camadas magnocelulares 1 e 2 do NGL projetam-se para a camada IVCα do córtex estriado; • Colunas de dominância ocular (V1): células estreladas da camada IVC projetam os seus axônios para a camada III, fazendo com que os neurônios, lá encontrados, re- cebam aferência de ambos os olhos, unindo os campos receptivos das duas retinas (nasal do OD e temporal do OE), estimuladas pela caneta; • Colunas de orientação (V1): a orientação do estímulo visual (caneta) é determina- da por neurônios sensíveis à orientação apresentada na cena visual; • Seletividade de sentido (V1): o movimento do estímulo visual (caso a caneta esti- vesse se movendo) é percebido com base no movimento perpendicular à orientação ótima das colunas de orientação; • Via dorsal (extraestriatal): analisa, através da área V5 (ou MT) e da área MST o movimento do estímulo visual; • Via ventral (extraestriatal): analisa, simultaneamente à via dorsal, por intermé- dio da área V4, as cores, formas e faces dos estímulos visuais. 16 17 Inervação da Musculatura Intrínseca e Extrínseca Ocular O termo extrínseco, no contexto visual, refere-se a todas estruturas que se en- contram fora do globo ocular, enquanto o termo intrínseco refere-se a todas as estruturas que se encontram dentro desse. Ao estudarmos a musculatura envolvida no sistema visual, podemos as classificar, portanto, em intrínseca (músculo ciliar e músculos da íris) e extrínseca (musculatura oculomotora e palpebral). O sistema oculomotor tem, por objetivo principal, estabilizar as imagens de inte- resse em nossas retinas, mais especificamente na fóvea. São seis músculos estriados esqueléticos que controlam cada um dos olhos, distribuídos em três pares de agonis- tas e antagonistas. Todos esses seis músculos são inervados por apenas três Nervos Cranianos (NC), cujos núcleos se encontram no tronco encefálico: 1. NC III – nervo oculomotor: tem o seu núcleo localizado na altura do colículo superior, no mesencéfalo; inerva o m. Reto Medial (RM), m. Reto Superior (RS), m. Reto Inferior (RI) e m. Oblíquo Inferior (OI); 2. NC IV – nervo troclear: tem o seu núcleo localizado na altura do colí- culo inferior, no mesencéfalo; inerva o m. Oblíquo Superior (OS); 3. NC VI – nervo abducente: tem o seu núcleo localizado na ponte, no assoalho do quarto ventrículo e inerva o m. Reto Lateral (RL). Figura 9 Fonte: Adaptado de Kandel e colaboradores, 2014, p. 781 17 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Na Figura 9, os núcleos são mostrados em um corte parassagital através do tálamo, da ponte, do mesencéfalo e do cerebelo de um macaco rhesus. O núcleo oculomotor (nervo craniano III) encontra-se no mesencéfalo, no nível da formação reticular mesencefálica. O núcleo troclear (nervo IV) é levemente caudal, e o núcleo do nervo abducente (nervo VI) encontra-se na ponte, no nível da formação reticular pontinha paramediana, adjacente ao fascículo do nervo facial (VII). Entre os três nervos responsáveis pela motricidade ocular, faz-se necessário es- tudo mais aprofundado sobre o oculomotor, quem inerva quatro dos seis músculos oculomotores, além de inervar o m. levantador da pálpebra superior, o esfíncter da pupila e o músculo ciliar. O núcleo do nervo oculomotor, localizado na altura do colículo superior do mesencéfalo, é composto por dois núcleos motores distintos: i) núcleo mo- tor somático do oculomotor, pertencente ao sistema nervoso motor somático; e ii) nú- cleo de Edinger-Westphal, pertencente ao sistema nervoso autônomo parassimpático. O núcleo motor somático do oculomotor é classificado, por alguns autores, como pertencente à própria substância cinzenta periaquedutal do mesencéfalo (subs- tância cinzenta que circunda o aqueduto do mesencéfalo), enquanto outros o classifi- cam como pertencente ao tegmento do mesencéfalo. Figura 10 Fonte: Adaptado de MARIEB; WILHELM; MALLAT, 2014, p. 396 Independentemente da classificação quanto à sua localização, é importante sa- lientar que se localiza entre a substância cinzenta periaquedutal e o ponto de passa- gem do Fascículo Longitudinal Medial do mesencéfalo (FLM), conhecido também como formação reticular. Trata-se de um feixe de fibras que atravessa todo o tronco encefálico, comunicando, assim, os núcleos de alguns dos NC. O núcleo motor somático do oculomotor “[...] consiste em dois grupos de células nervosas que suprem todos os músculos extrínsecos do olho, exceto o oblíquo supe- rior e o reto lateral”. (SNELL, 2013). Dessa forma, o núcleo somático do oculomotor é responsável pela inervação do RM, RS, RI, OI e m. levantador da pálpebra. 18 19 Quando estudamos a aferência do núcleo de um NC, estamos entendendo quem o controla. Sob tal perspectiva, o núcleo motor somático do oculomotor recebe afe- rência de três regiões diferentes do encéfalo: i) fibras corticonucleares, que trazem informações das áreas motoras do córtex cerebral, possibilitando o controle voluntá- rio do movimento dos olhos; ii) fibras tetobulbares, advindas dos colículos superiores, coordenando os reflexos visuais corporais; e aferência do iii) FLM, recebendo, dessa forma, aferência do IV, VI e VIII NC. O núcleo de Edinger-Westphal, conhecido também como núcleo acessório do oculomotor, dispõe-se póstero-lateralmente ao núcleo motor somático do oculomotor. Dá origem às fibras parassimpáticas pré-ganglionares, que farão sinapses com o gân- glio ciliar, localizado dentro da órbita, posterior ao globo ocular. A partir do gânglio ciliar, os neurônios pós-ganglionares, chamados de nervos ciliares curtos, inervam o esfíncter da pupila, controlando a sua miose, e a muscula- tura ciliar, controlando o estado acomodativo. Recebe aferência de duas regiões en- cefálicas: i) fibras corticonucleares, que controlarão o reflexo acomodativo; e ii) fibras do núcleo pré-tectal, que controlarão os reflexos fotomotores direto e consensual. Figura 11 Fonte: Adaptado de NETTER, 2019, p. 133 Os dois núcleos, portanto, dão origem ao nervo oculomotor, terceiro par de NC, que se projeta anteriormente em direção à órbita, penetrando-a pela fissura orbital superior, do osso esfenoide. 19 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Imediatamente antes de entrar na órbita, o III NC se ramifica em dois: i) ramo superior, que inerva o RS e o levantador da pálpebra; e ii) ramo inferior, que inerva o RM, RI, OI, além das fibras parassimpáticas, que fazem sinapses no gânglio ciliar que, através das fibras pós-ganglionares, inervará a musculatura intrínseca ocular (esfíncter da pupila e musculatura ciliar). Tabela 1 Núcleo Aferência Controle Motor Somático Fibras corticonucleares Controle voluntário dos olhos Fibras tetobulbares (colículos superiores) Reflexo visual corporal FLM (IV, VI e VIII NC) Interação com outros mm. extraoculares Edinger-Westphal Fibras corticonucleares Reflexo acomodativo Fibras pré-tectais Reflexos fotomotor direto e consensual Figura 12 Fonte: Adaptado de NETTER, 2019, p. 103 Reflexos Oculares O sistema visual, através de uma complexa integração com os nervos cranianos que participam de sua composição, apresenta vários reflexos ou, em outras palavras, res- postas motoras involuntárias a determinados estímulos, sejam visuais ou não. Abordare- mos, a seguir, os principais reflexos oculares, sob a perspectiva da clínica optométrica. Não se esqueça de consultar a bibliografia recomendada no Material Complementar desta Unidade, pois lá você encontrará todos os reflexos oculares para aprofundar os seus estudos. 2021 Reflexo Fotomotor Direto e Consensual O reflexo fotomotor, como o próprio nome sugere, é responsável por controlar o diâmetro pupilar, a partir de um estímulo visual luminoso, regulando a quantidade de luz que chega aos fotorreceptores, prevenindo potenciais danos à retina por excesso de energia luminosa, em situações de excessiva luz. A eferência retinofugal, através de fibras retino-pré-tectais, passa pelo NGL, sem fazer sinapses com o qual, atravessando o braço do colículo superior do mesencéfalo, fazendo sinapses finalmente com os núcleos pré-tectais, um par de núcleos localizados na periferia dos colículos superiores do mesencéfalo. Esse núcleo, por sua vez, faz sinapses com ambos os núcleos de Edinger-Westphal – tanto o ipsilateral, quanto o contralateral. A sua sinapse ipsilateral proporciona o reflexo fotomotor direto, ou seja, aquele que é responsável pela miose pupilar do olho iluminado. Por fazer sinapses também com o núcleo de Edinger-Westphal contralateral, a iluminação de um dos olhos provoca a miose pupilar contralateral, gerando, assim, o reflexo fotomotor consensual, ou seja, a miose do olho contralateral ao olho iluminado. A partir das sinapses com os núcleos de Edinger-Westphal, a eferência paras- simpática é levada por fibras parassimpáticas pré-ganglionares, que compõem a periferia do III NC, até o gânglio ciliar, onde fazem sinapses. Em seguida, as fibras pós-ganglionares, os nervos ciliares curtos, inervam finalmente o músculo esfíncter da pupila, responsável pela miose pupilar frente ao estímulo luminoso. Reflexo de Acomodação e Convergência A acomodação, responsável pela focalização da cena visual, é o processo pelo qual a musculatura ciliar se contrai, reduzindo, assim, a tensão capsular do cristalino exerci- da pelas fibras zonulares, permitindo, dessa forma, que o cristalino aumente a sua cur- vatura e, consequentemente, o poder dióptrico convergente do sistema óptico ocular. Em Neurociências, o termo reflexo comumente é empregado para designar res- postas a estímulos em caráter automático, integradas apenas pela medula espinal ou pelo tronco encefálico e que não passam pelo processamento de níveis superiores. O reflexo da acomodação e convergência, contudo, é mediado pelo córtex cerebral. A aferência a esse tipo de reflexo, ao contrário dos reflexos fotomotores, não é ape- nas a luz, mas sim a luz embaçada. Ao longo de nossos estudos, vimos que o córtex estriado pode fazer conexões eferentes, com três regiões distintas: i) NGL; ii) colículos superiores e ponte; e iii) outras áreas corticais. Sabemos também que na altura dos colículos superiores do mesencéfalo localizam-se os núcleos do III NC. Assim, essa eferência corticofugal de V1 para os colículos superiores, no contexto acomodativo, dá-se pelas sinapses com os núcleos da motricidade ocular. Uma das conexões eferentes de V1 com outras regiões corticais é com o campo ocular pré-frontal, no lobo frontal, responsável pelo controle do olhar conjugado 21 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares voluntário. O campo ocular pré-frontal e as eferências corticofugais de V1, sob in- fluência de uma imagem desfocada, interpretada pelo córtex estriado, coordenam, através do núcleo do III NC, em sincronia: i) contração dos mm. RM de cada olho, causando a convergência ocular; ii) contração da musculatura ciliar, proporcionando o processo de acomodação; e iii) a contração do m. esfíncter da pupila, proporcio- nando a miose pupilar. A esses três eventos é dado o nome de tríade proximal. Em Síntese Imagine que um objeto é aproximado dos olhos de um indivíduo. A Lei dos focos conju- gados nos diz que, pela aproximação do objeto, a imagem será deslocada a uma região posterior à retina, reduzindo, assim, a Acuidade Visual (AV). A redução da AV é um estímulo acomodativo, fazendo com que o núcleo do III NC, por influência do córtex visual pré-frontal, e de eferências diretas corticofugais de V1, cause a contração dos músculos retos mediais, ciliares e esfíncter da pupila, evento conhecido como tríade proximal, que garantirá tanto o foco do objeto observado, bem como o seu alinhamento com cada uma das fóveas de cada olho. Reflexos Corporais Visuais As fibras retino-pré-tectais, que passam pelo NGL sem fazer sinapses com o qual, dirigindo-se pelos braços do colículo superior, até o próprio colículo superior, fazem sinapses em dois locais. Além das sinapses com os núcleos pré-tectais, que dão origem aos reflexos foto- motores direto e consensual, fazem sinapses com os neurônios do próprio colículo superior, que dá origem aos tratos tetoespinal (entre teto do mesencéfalo e medula espinal) e trato tetonuclear (entre teto do mesencéfalo e núcleos de NC). Enquanto o trato tetoespinal controla os neurônios motores do corno anterior da medula, o trato tetonuclear controla os núcleos de alguns nervos cranianos, tais como os núcleos do III, IV e VI pares de NC que, como já visto, controlam o movimento ocular. É o colículo superior, portanto, quem controla não apenas o rápido direcionar do olhar a um estímulo visual no campo periférico (movimentos sacádicos), mas tam- bém reações reflexivas a estímulos nocivos, tal como o piscar frente a algum objeto que se projeta rapidamente em direção aos nossos olhos. Reflexos Vestíbulo-Oculares São os únicos reflexos oculares que independem de aferência visual. São respon- sáveis por manter a fixação do olhar em um objeto de interesse enquanto a cabeça e/ou o corpo se movimentam, por aferência do VIII NC, o nervo vestibulococlear. Os núcleos vestibulares, localizados no assoalho do IV ventrículo, enviam fibras até a formação reticular da ponte que, como já vimos, percorre todo o tronco ence- fálico, intercomunicando núcleos de NC entre si. Dessa maneira, o sistema nervoso 22 23 consegue perceber quando há movimentação do corpo e ajustar a posição dos olhos no sentido contrário ao movimento, de modo a fixar as imagens dos objetos de inte- resse nas fóveas de cada olho. Estudo de Caso Para concluirmos o nosso raciocínio clínico neurofisiológico, será apresentado um caso extremamente comum no dia a dia clínico refratométrico, que engloba várias áreas do conhecimento optométrico. Sob o escopo da neurofisiologia da visão, tente, antes de ler a análise do seguinte caso, deduzir o que se passa com este paciente: JDS, 36 anos de idade, previamente hígido, relata cefaleia frontal ao uso pro- longado da visão de perto. Ao exame físico, apresenta excelente convergência e pupilas mióticas. Análise: O paciente, de 36 anos de idade, muito embora tenha acomodação suficiente para suprir e manter a sua demanda acomodativa na visão de perto, apresenta perda gra- dativa de amplitude acomodativa em início de manifestação na leitura prolongada. Pelo fato de o sintoma surgir aos 36 anos, presumivelmente esse paciente teve, ao longo de sua vida adulta, hipermetropia latente, “escondida” pela outrora grande amplitude acomodativa que tinha. Por exercer considerável esforço acomodativo, há grande inervação parassimpática realizada, a fim de se manter a imagem do objeto focalizado na visão de perto sob a fóvea. Tal esforço parassimpático pode ser “visto” pela pupila miótica, evidenciando a ação da tríade proximal, desencadeada por esse esforço acomodativo. Conhecer os mecanismos neurofisiológicos da visão nos mune de ferramentas valio- sas na semiologia optométrica, além de ser alicerce de diversas áreas do conhecimen- to visual, tais como terapias e reabilitações visuais, patologias e síndromes visuais. A respeito da complexidade do tema abordado, é válido salientar a importância de reler o material fornecido, bem como atentar-se ao aprofundamento do conheci- mento, através da leitura complementar sugerida, munindo-se de perspectivas di- ferentes sobre o vasto tema que é a neurofisiologia da visão. 23 UNIDADE Movimentos Oculares e Reflexos Oculares Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nestaUnidade: Livros Anatomia Humana MARIEB, E.; WILHELM, P.; MALLAT, J. Anatomia humana. 7. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014. Vídeos Neurofisiologia – Reflexos Visuais e Oculares | Neurofisiologia Humana https://youtu.be/0ThHtHXUmXs Nervo Óptico (II Nervo Craniano) e o Sistema Visual – Neuroanatomia https://youtu.be/tZbMIhKuS78 Leitura Extrastriate Area V5 (MT) and its Role in the Processing of Visual Motion RIECANSKÝ, I. Extrastriate area V5 (MT) and its role in the processing of visual motion. Ceskoslovenská Fysiologie/Ústrední Ústav Biologický, v. 53, n. 1, p. 17-22, 2004. https://bit.ly/3132rre 24 25 Referências BEAR, M. F.; CONNORS, M. A. Neurociências desvendando o sistema nervoso. v. 4. 4. ed. Porto Alegre, RS: Artmed, 2017. DORLAND. Dorland: dicionário médico. 25. ed. São Paulo: Roca, 1997. GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de fisiologia médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. KANDEL, E. R. et al. Princípios de Neurociências. 5. ed. Porto Alegre, RS: Artmed, 2014. MARIEB, E.; WILHELM, P.; MALLAT, J. Anatomia humana. 7. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014. NETTER, F. H. Atlas de anatomia humana. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. RIECANSKÝ, I. Extrastriate area V5 (MT) and its role in the processing of visual motion. Ceskoslovenská Fysiologie/Ústrední Ústav Biologický, v. 53, n. 1, p. 17-22, 2004. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 7. ed. Porto Alegre, RS: Artmed, 2017. SNELL, R. S. Neuroanatomia clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. 25
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